Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ00002091 | ||
Relator: | RIBEIRO COELHO | ||
Descritores: | HERDEIRO QUOTA INDIVISA DIREITO DE PROPRIEDADE EMBARGOS DE TERCEIRO | ||
Nº do Documento: | SJ200210290032631 | ||
Data do Acordão: | 10/29/2002 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | T REL LISBOA | ||
Processo no Tribunal Recurso: | 465/02 | ||
Data: | 02/28/2002 | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | REVISTA. | ||
Decisão: | MANDADA AMPLIAR A MATÉRIA DE FACTO. | ||
Área Temática: | DIR PROC CIV - PROC ESP. | ||
Legislação Nacional: | CPC95 ARTIGO 351 N1 ARTIGO 910. CCIV66 ARTIGO 1404 ARTIGO 1405. | ||
Sumário : | I - O direito de propriedade sobre determinado imóvel que faça parte de herança deixada pode ser legitimamente defendido, mediante embargos de terceiro, por parte do co-herdeiro desse bem, "ex-vi" do artº. 1404º do C.Civil. II - Podendo o proprietário reivindicar sozinho o bem de que só detém uma quota indivisa, designadamente no caso a que se refere o artº. 910º do CPC, impõe-se interpretar extensivamente o artº. 1405º do CC por forma a abranger a dedução de embargos de terceiro em antecipação àquela reivindicação. | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Em execução para pagamento de quantia certa movida no 9º Juízo Cível do Tribunal Judicial por A contra B e mulher C veio D deduzir embargos de terceiro contra a penhora de um imóvel que diz ter sido construído pelo pai da embargante e pertencer agora a esta e aos demais herdeiros daquele. O exequente contestou os embargos, seguindo-se a demais tramitação conducente à audiência de discussão e julgamento e à subsequente prolacção de sentença que julgou os embargos improcedentes e que a Relação de Lisboa, em apelação da embargante, confirmou. Do respectivo acórdão vem interposto este recurso de revista no qual a recorrente pede a sua revogação e uma decisão que faça proceder os embargos. Ao alegar formula conclusões onde defende que: - Uma vez que a propriedade do imóvel entrou na esfera jurídica de E em 1924 e passou depois por sucessão para os seus herdeiros, entre os quais está a recorrente, e havendo dúvidas sobre se o imóvel pertence ao executado, não pode a sua penhora ser permitida; - O acórdão recorrido enferma de nulidade por contradição entre a fundamentação e a decisão; - Cabe ao embargado o ónus de provar que o imóvel não pertence à embargante. Não houve resposta. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. Vem dado como provado que: 1. Na execução acima mencionada foi penhorado um imóvel sito no lugar de Enxudro, freguesia de Benfeita, concelho de Arganil, descrito na Conservatória de Registo Predial de Arganil sob o nº 01209 e inscrito na matriz predial urbana sob o art. 529; 2. Este imóvel foi construído por E em 1924; 3. O E morreu em 8/9/63, sendo casado, em primeiras núpcias de ambos e em regime de comunhão geral de bens, com F; 4. Eram seus únicos herdeiros os filhos G, H, I, J, L, M, D, N e, ainda, a referida F. Os embargos foram propostos em 29/1/97, já na vigência da reforma processual de 1995/96. De acordo com o art. 351º, nº 1 do CPC, os embargos de terceiro visam a defesa da posse ou de qualquer direito incompatível com a realização ou o âmbito de uma diligência, judicialmente ordenada, de apreensão ou entrega de bens, desde que não seja parte na causa onde tem lugar a diligência o embargante, titular dessa posse ou outro direito. No caso a embargante, aqui recorrente, disse-se compossuidora e também contitular do direito de propriedade sobre o imóvel. Não caracteriza actos reveladores de posse, mas tal não invalida a sua pretensão visto que o seu alegado domínio é, evidentemente, incompatível com uma diligência de penhora que visa a venda do bem sobre que incide. A este propósito alegou que seu pai E construíra o imóvel e que por sua morte o respectivo direito de propriedade se transmitiu para os respectivos herdeiros, um dos quais era ela própria. Não o disse explicitamente, mas é evidente que estas afirmações pressupõem, de forma implícita, uma outra, qual seja a de que à data da morte o E ainda era o proprietário do prédio que adquirira ao construí-lo. E com esta última afirmação implícita está, necessariamente, de acordo o embargado, aqui recorrido, uma vez que na contestação alega - cfr. art. 7º - que H, irmã da embargante e, como esta, co-herdeira daquele E, havia adquirido por partilha o imóvel, que depois decidira vender a seu filho, o executado. Aquisição que, evidentemente, só teria possível se o imóvel ainda pertencesse ao mesmo E quando este faleceu. Pode, portanto, dar-se isto mesmo como assente por acordo das partes, no que se diverge do entendimento seguido no acórdão recorrido. Cabe, então, dizer o seguinte. O direito de propriedade sobre o imóvel aqui em causa fazia parte da herança deixada pelo E. A embargante, ora recorrente, era co-herdeira do mesmo bem. Nessa medida poderia defender triunfantemente o seu direito por embargos de terceiro, não tendo havido quaisquer dúvidas nestes autos sobre a sua legitimidade para o fazer; aliás, nem seria de levantar a esse respeito qualquer dúvida, já que, podendo o comproprietário reivindicar sozinho o bem de que só detém uma quota indivisa, designadamente no caso a que se refere o art. 910 do CPC, impõe-se interpretar extensivamente o art. 1405 do CC por forma a abranger a dedução de embargos de terceiro - meio processual que poderá evitar, por antecipação, aquela reivindicação e apresenta forte similitude com ela. E este regime vale para o co-herdeiro, "ex vi" do art. 1404 do CC. Há, no entanto, alegação nos autos de um facto que pode obstar a este sucesso por parte da embargante, ora recorrente, na medida em que dele tenha resultado a perda, por esta, daquela invocada qualidade de co-herdeira do imóvel penhorado. É o que se passa com a alegação feita no art. 7º da contestação quanto a ter a H adquirido por partilha esse imóvel. Tem este facto notório interesse para a decisão, mas não foi averiguado. A provar-se, os embargos improcederão; a não se provar, os embargos deverão proceder, nos termos do direito material acima descrito. Impõe-se o uso, a seu respeito, da faculdade a que se refere o art. 729º, nº 3 do CPC. Pelo exposto, revoga-se o acórdão recorrido e manda-se que os autos voltem à Relação de Lisboa para que aí, se possível com intervenção dos mesmos Excelentíssimos Desembargadores, se providencie pela ampliação da matéria de facto nos termos indicados e depois se julgue de novo a causa em harmonia com o regime jurídico definido. Custas consoante a responsabilidade que se apurar a final. Lisboa, 29 de Outubro de 2002 Ribeiro Coelho, Ferreira Ramos, Pinto Monteiro (dispensei o visto). |