Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
6099/16.0T8VIS-U.C1.S1
Nº Convencional: 6.ª SECÇÃO
Relator: MARIA OLINDA GARCIA
Descritores: RECURSO DE REVISTA
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
OFENSA DO CASO JULGADO
REVISTA EXCECIONAL
FORMAÇÃO DE APRECIAÇÃO PRELIMINAR
DESPACHO DO RELATOR
RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA
Data do Acordão: 06/21/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA (COMÉRCIO)
Decisão: INDEFERIDA A RECLAMAÇÃO.
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO.
Sumário :
Tendo a recorrente interposto revista excecional, com base no art. 672.º, n.º 1, al. a), do CPC e tendo, simultaneamente, invocado a ofensa de caso julgado, cabe ao relator apreciar se a revista normal é admissível com base neste último fundamento.
Decisão Texto Integral:



Processo n. 6099/16.0T8VIS-U.C1.S1

Reclamante: AA

Acordam em Conferência no Supremo Tribunal de Justiça

1. AA foi demandada por quatro autores, em ação destinada a fazer valer a sua responsabilidade enquanto administradora judicial da insolvente “Néri e Castro, Ldª” (nos termos do art. 59º do CIRE).

 Na sua contestação, esta ré excecionou a ineptidão da petição inicial e a ilegitimidade dos autores, e pediu a condenação destes como litigantes de má-fé.

 Em despacho saneador, foi decidido que a petição inicial não era inepta e que três dos autores eram parte ilegítima, os quais foram absolvidos do pedido como litigantes de má-fé.

Quanto ao mais, foi suspensa a instância até ao trânsito em julgado da decisão a proferir no apenso P.

 Contra este despacho saneador, a ré interpôs recurso de apelação, invocando, entre outros argumentos, a existência de caso julgado quanto à legitimidade do autor BB.

 O Tribunal da Relação de Coimbra confirmou integralmente o decidido no apelado despacho saneador.

2. Contra este acórdão, a apelante interpôs recurso de revista, que qualificou como “revista excecional”, baseando-se no art. 672º, n. 1, alínea a) do CPC. Por outro lado, invocou o disposto no art. 629º, n. 2, alínea a) in fine do CPC, ou seja, a ofensa de caso julgado.

3. A relatora apreciou a questão de saber se o recurso poderia ser admitido como revista normal, com base no 629º, n. 2, alínea a) in fine do CPC, e concluiu não se identificar ofensa do caso julgado que pudesse sustentar a admissibilidade do recurso com esse fundamento. Como a recorrente havia invocado a “revista excecional”, a relatora determinou o envio dos autos à Formação a que alude o art. 672º, n. 3 para apreciação dos requisitos de admissibilidade da revista como excecional.

4. A recorrente vem agora reclamar contra esse despacho, por entender que o recurso devia ser admitido com base na ofensa do caso julgado.

Todavia, não se consegue perceber onde é que a reclamante vê a ofensa de caso julgado para sustentar a admissibilidade da revista com esse fundamento.

Como se afirmou no despacho reclamado:

«Constata-se, porém, que, de entre as várias questões suscitadas pela recorrente para sustentar o recurso, a questão do caso julgado surge referida, de modo direto, apenas quanto a uma dessas questões, ou seja, quanto à legitimidade processual do autor BB.

 (…)

Entende a recorrente que o autor BB também devia ter sido considerado parte ilegítima para formular o presente pedido indemnizatório, devendo a sua legitimidade restringir-se ao montante do crédito que lhe havia sido reconhecido em sentença proferida no apenso O dos autos de insolvência. Reconhecer-lhe legitimidade para formular a totalidade do pedido indemnizatório dos presentes autos seria violar o caso julgado formado naquele apenso, nos termos do art. 619º do CPC.

É inequívoco que não se identifica qualquer violação do caso julgado, porque não se encontram preenchidos os requisitos exigidos pelo art. 581º do CPC. Aliás, nem a recorrente invoca, em concreto, o preenchimento de tais requisitos.

É manifesto que o pedido e a causa de pedir de uma ação de condenação baseada em responsabilidade civil (na formulação específica do art. 59º do CIRE) nada tem em comum com o pedido e a causa de pedir de uma ação de verificação e graduação de créditos (que corre por apenso a uma ação de insolvência). Aliás, como bem se notou no acórdão recorrido, a questão de saber se aquele autor apenas teria legitimidade para exigir uma indemnização correspondente ao crédito que lhe foi reconhecido (no referido apenso O) ou de valor superior ainda não foi decidida nos presentes autos

5. A reclamante continua a laborar em confusão quando insiste na admissibilidade da revista com base na ofensa do caso julgado. A este propósito deve ter-se presente o que se afirma no acórdão recorrido:

«Em face da causa de pedir e dos pedidos que formulou o A. é parte legítima. Se a reparação de danos a que alude o artº 59º, nº 1 do CIRE permite a indemnização de outros prejuízos para além dos que foram reconhecidos na sentença de verificação ulterior de créditos é questão a ser apreciada em sede de conhecimento de mérito.

Nada tendo sido decidido a esse propósito ainda, não se vê como é que se pode colocar a questão da ofensa do caso julgado da decisão proferida no apenso O

Efetivamente, a reclamante parece pretender antecipar uma decisão que ainda não foi tomada pelas instâncias, pretendendo impor uma hipotética violação da eficácia do caso julgado quando as instâncias ainda não se pronunciaram sobre a extensão da eventual responsabilidade das administradoras da insolvência (nem, tão-pouco, sobre se essa responsabilidade existirá ou não).

Decisão: Pelo exposto, indefere-se a reclamação e confirma-se a decisão reclamada.

Enviem-se os autos à Formação para apreciação da admissibilidade da revista excecional.

Custas pela reclamante, que se fixam em 3 UCs [Tabela II, penúltima alínea do RCP].

Lisboa, 21.06.2022

Maria Olinda Garcia (Relatora)

Ricardo Costa

António Barateiro Martins

Sumário (art. 663º, nº 7, do CPC).