Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
2204/21.3PKLSB-A.L1.S1
Nº Convencional: 5.ª SECÇÃO
Relator: ANTÓNIO GAMA
Descritores: RECURSO DE REVISÃO
CONDUÇÃO DE VEÍCULO EM ESTADO DE EMBRIAGUEZ
NOVOS MEIOS DE PROVA
REGISTO CRIMINAL
ANTECEDENTES CRIMINAIS
ERRO DE IDENTIDADE
IMPROCEDÊNCIA
Data do Acordão: 11/10/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO DE REVISÃO
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO.
Sumário :

Numa primeira leitura a previsão do art. 449.º/3, CPP, ao estatuir que não é admissível revisão com o único fim de corrigir a medida concreta da pena, parece admitir a revisão para corrigir a escolha da pena. Porém, o art.º 449.º/3, CPP, não pode ser lido desirmanado do precedente n. º1/d, onde relevam as graves dúvidas sobre a justiça da condenação, o que inviabiliza a pretendida subtileza interpretativa, quando está em causa a escolha da pena de prisão que foi substituída por multa.

Decisão Texto Integral:


Processo n.º 2204/21.3PKLSB-A.L1.S1

Acordam em conferência no Supremo Tribunal de Justiça

I

1. O Ministério Público veio interpor recurso extraordinário de revisão da sentença de 11 de janeiro de 2022, proferida no processo sumário 2204/21.3PKLSB, do Juízo Local de Pequena Criminalidade ..., transitada em julgado em 24 de fevereiro seguinte, que condenou o arguido AA, pela prática em de um crime de condução em estado de embriaguez previsto e punido pelo artigo 292º nº 1 do Código Penal na pena de 3 meses de prisão a qual nos termos do artigo 45º nº 1 do Código Penal, substituída por igual tempo de multa, 90 dias à taxa diária de 5 euros o que perfaz 450 euros, com os seguintes fundamentos (transcrição das conclusões do recurso):

«I. O arguido AA foi condenado nos presentes autos, pela prática em autoria material e sob a forma consumada, aos 24 de dezembro de 2021, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelo artigo 292.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 3 (três) meses de prisão, substituída nos termos do artigo 45.º n.º 1 do Código Penal, por igual período de 90 (noventa) dias de multa à taxa diária de € 5,00 (cinco euros), bem como na pena acessória de proibição de conduzir quaisquer veículos motorizados pelo período de 4 (quatro) meses, transitada aos 4 de fevereiro de 2022.

II. Sustentou tal condenação, entre o mais, o certificado de registo criminal junto nos autos, onde constam já inscritas condenações pelos crimes de condução sem habilitação legal praticados aos 8 de janeiro de 2016 e 14 de outubro de 2016, nos autos 152/16.... e 698/16...., nas penas de 60 e 95 dias de multa à taxa diária de 5 euros; por um crime de furto qualificado, praticado a 15 de dezembro de 2020, autos 852/20...., na pena de dois anos e dois meses de prisão, suspensa por igual período, transitada aos 16 de agosto de 2021; e por um crime de furto qualificado na forma tentada, praticado aos 12 de dezembro de 2020, proferida nos autos 1020/20...., na pena de um ano e oito meses de prisão, suspensa por  igual período, transitada aos 6 de dezembro de 2021.

III. Sucede que esse certificado de registo criminal não se refere ao aqui arguido, antes a BB, destinando-se aquele a autos diversos (2210/21....). IV. Do certificado de registo criminal do arguido AA nada constava à data da prática dos autos, hoje apenas constando a condenação aqui sofrida o que, porquanto só agora conhecido, permite considerá-lo como facto novo.

V. A condenação assentou assim em pressupostos errados, ilididos por elementos novos entretanto conhecidos nos autos, conforme art. 449.º, n.º 1, al. a) e d) do Código de Processo Penal.

VI. Como tal ora se suscitando graves dúvidas sobre a justiça da condenação na espécie da pena já transitada.

VII. Situações análogas foram já conhecidas e mereceram acolhimento em Acórdãos proferidos nesse Colendo Tribunal, nomeadamente naqueles 614/09...., de 26 de abril de 2012 e 1191/16...., de 27 de junho de 2019.

VIII. Pelo exposto, deve ser concedida a revisão da sentença proferida aos 11 de janeiro de 2022, transitada aos 24 de fevereiro de 2022 e, em consequência, ser reapreciada a condenação à luz dos novos factos e pressupostos alegados neste recurso, o qual se afigura concretamente mais favorável ao arguido».


2. Pronunciando-se sobre o mérito do pedido (art. 454.º, CPP), disse o juiz do processo (transcrição):

«(…) - compulsados os autos foi junto em 17.12.2021, por manifesto lapso, em sede de inquérito, CRC de terceiro que não o arguido – cfr- 24 a 26 do suporte em papel;

- foram aos autos remetidos para julgamento em processo sumário em 05.01.2022, sendo o julgamento realizado conforme agendamento do Ministério Público em 11.01.2022 – cfr fls. 41, 42, despacho e acta do mesmo de fls. 44 a 47.

. aquando do cumprimento do transito em julgado da sentença, foi constatado que à data do julgamento, ao arguido não eram conhecidos antecedentes criminais.

. contudo na prolação da sentença, foi tido em consideração o CRC junto em 17.12.2021, pertencente a terceiro que não o arguido e do qual constavam anteriores condenações, ao invés de ser tido em consideração o facto de ao arguido não ser conhecido qualquer antecedente criminal, como efectivamente acontecia.

Nestes termos, julgamos que se verificam os fundamentos de admissibilidade da revisão da sentença proferida nestes autos – confrontar artigo 449º, nº 1, alínea d), do Código de Processo Penal».

3. Já neste STJ, o Ministério Público, em síntese, foi de Parecer que «[e]m suma, seja porque o certificado de registo criminal em que se funda o recurso não foi junto aos autos e valorado na sentença em razão da imprevidência dos diversos sujeitos processuais e, como tal, na nossa perspetiva (com ressalva do respeito devido a entendimento contrário), não pode ser considerado novo elemento de prova, seja porque o mesmo não interfere com o juízo condenatório, o mesmo é inaproveitável para efeitos do disposto no artigo 449.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Penal. Daí que se emita parecer no sentido da negação da revisão da sentença proferida no processo sumário 2204/21.3PKLSB».

4. Na minuciosa e imprescindível resenha do PGA, o presente recurso está instruído com as seguintes peças:

- Cópias da ata da audiência de julgamento realizada, realizada na ausência do arguido, em 11 de janeiro de 2022, do certificado de registo criminal de BB (requisitado pela secção de inquéritos da PSP e emitido em 27 de dezembro de 2021) e do certificado de registo criminal do arguido AA (requisitado pelo Juízo Local de Pequena Instância Criminal ... e emitido em 28 de junho de 2022).

- O «auto de notícia por detenção» do arguido AA;

- Uma folha do processado que contém um despacho a ordenar que o expediente proveniente da PSP seja «R.D.A. como ‘processo sumário – fase preliminar’ (Ordem de Serviço n.º ...13, da Procuradoria-Geral da República)» e que os autos sejam apresentados ao defensor do arguido «para consulta e eventual exercício da faculdade prevista no artigo 383.º, n.º 2, do CPP», seguido de um termo em que se consigna que os autos foram apresentados para consulta ao defensor tendo este manifestado «pretender prazo para preparação da defesa do arguido, por 10 dias»;

- A acusação formulada pelo Ministério Público em 5 de janeiro de 2022;

- A transcrição da sentença condenatória;

- A notificação ao arguido, em 25 de janeiro de 2022, da ata da audiência de julgamento que contém o dispositivo da sentença;

- Um termo de informação de 23 de junho de 2022 no qual o Sr. escrivão auxiliar do Juízo Local de Pequena Criminalidade ... – Juiz ... consigna ter constatado «que o Certificado de Registo Criminal junto na fase preliminar de fls. 20 a 26, não diz respeito aos presentes autos, mas ao Processo n.º 2210/21....»

5. Colhidos os vistos e após a realização da conferência cumpre decidir.

II

A

Factos provados na decisão condenatória (transcrição):

«No dia 24.12.2021, pela 01 hora e 30 minutos, o arguido, conduzia o veículo automóvel ligeiro de passageiros, da marca/modelo “Fiat, Punto”, com a matrícula n.º ..-SL-.., na Rua ..., freguesia ..., na área desta comarca ..., quando foi intercetado e fiscalizado pelos agentes da P.S.P., CC e DD, os quais, se encontravam devidamente uniformizados e no exercício das suas funções. O arguido foi então submetido ao teste de alcoolemia no aparelho da marca/modelo “DRAGER 7110 MKIII P”, com o ...”, acusando uma TAS de, pelo menos, 1,852 g/l, correspondente à TAS de 1,95 g/l registada deduzido o erro máximo admissível. Agiu o arguido deliberada, livre e conscientemente, bem sabendo, que se encontrava sob a influência do álcool, em limites superiores aos legais e que, nessas circunstâncias, lhe estava vedada por lei a condução de veículos automóveis. Bem sabendo o arguido que a sua conduta era (é) proibida e criminalmente punida».

O tribunal considerou ainda como provado «o teor do certificado do registo criminal também por remissão para o mesmo».

Para a formação da convicção do tribunal foi determinante: «(…) a análise crítica e conjugada das declarações da testemunha aqui ouvida, agente da P.S.P., a qual descreveu as circunstâncias nas quais intercetou, identificou e submeteu o arguido ao teste de pesquisa de álcool no sangue, conjugadamente com o talão relativo ao mesmo e certificado de verificação do alcoolímetro, considerando-se ainda o certificado de registo criminal do arguido».

Quanto à medida da pena: «Tendo em conta os critérios orientadores da determinação do tipo e medida concreta da pena teremos em consideração que o arguido agiu com dolo bem definido, plena consciência da ilicitude a qual já assume alguma gravidade por verificar-se uma taxa de álcool no sangue que já se afasta bastante do mínimo legal considerado crime. Por outro lado tal como referido pelo Digno Magistrado do Ministério Publico o arguido já sofreu três condenações embora de diferente tipo legal, embora não estradal, (…), sendo certo que, tal como também referido, os crimes ora em apreciação foram praticados no período da suspensão de duas penas de prisão, pelo que, não obstante os princípios da necessidade, proporcionalidade e subsidiariedade inerentes à aplicação de pena de multa, a aplicação de uma mera pena de multa a titulo principal, já não satisfaz de forma suficiente e adequada as finalidades da punição, importando dar um sinal ao arguido de que ou se afasta de uma vez por todas da prática do crime ou correrá sérios riscos de sofrer prisão efectiva. Assim sendo, o tribunal julga proporcional e adequada a condenação do arguido numa pena de 3 meses de prisão, a qual, atento os diferentes tipos legais de crime pelos quais foi condenado e não se tendo logrado circunstâncias que impunham o cumprimento efectivo desta pena de prisão, se substitui nos termos do artigo 45.º n.º 2 do Código Penal, por igual tempo de multa que se julga proporcional e adequada, 90 dias, à taxa diária de 5 euros, o que perfaz 450 euros, julgando-se a taxa diária proporcional e adequada para efeitos do disposto no artigo 47.º n.º 2 do Código Penal considerando que não são ao arguido conhecidas as suas concretas condições económicas e atento o salário mínimo nacional e as condições económicas

B

O Direito

1. A Constituição consagra o direito dos cidadãos injustamente condenados requererem a revisão da sentença, nas condições que a lei prescrever (art. 29.º/6, CRP). Concretizando esse direito, dispõe o art. 449.º, CPP:

1 - A revisão de sentença transitada em julgado é admissível quando:

a) Uma outra sentença transitada em julgado tiver considerado falsos meios de prova que tenham sido determinantes para a decisão;

b) Uma outra sentença transitada em julgado tiver dado como provado crime cometido por juiz ou jurado e relacionado com o exercício da sua função no processo;

c) Os factos que serviram de fundamento à condenação forem inconciliáveis com os dados como provados noutra sentença e da oposição resultarem graves dúvidas sobre a justiça da condenação;

d) Se descobrirem novos factos ou meios de prova que, de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo, suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação.

e) Se descobrir que serviram de fundamento à condenação provas proibidas nos termos dos n.ºs 1 a 3 do artigo 126.º;

f) Seja declarada, pelo Tribunal Constitucional, a inconstitucionalidade com força obrigatória geral de norma de conteúdo menos favorável ao arguido que tenha servido de fundamento à condenação;

g) Uma sentença vinculativa do Estado Português, proferida por uma instância internacional, for inconciliável com a condenação ou suscitar graves dúvidas sobre a sua justiça.

2 - Para o efeito do disposto no número anterior, à sentença é equiparado despacho que tiver posto fim ao processo.

3 - Com fundamento na alínea d) do n.º 1, não é admissível revisão com o único fim de corrigir a medida concreta da sanção aplicada.

4 - A revisão é admissível ainda que o procedimento se encontre extinto ou a pena prescrita ou cumprida.

2. O recurso extraordinário de revisão é o último remédio processual para ultrapassar erros judiciários dando primazia à justiça material, nos casos tipificados pelo legislador, em detrimento da segurança do direito e a força do caso julgado.

3. Em apertada síntese, segundo o requerente, sustentou a condenação, entre o mais, o certificado de registo criminal junto nos autos, onde constam já inscritas condenações (…). Sucede que esse certificado de registo criminal não se refere ao arguido, antes a BB. Do certificado de registo criminal do arguido AA nada constava à data da prática dos autos. E concluiu a condenação assentou assim em pressupostos errados, ilididos por elementos novos entretanto conhecidos nos autos, conforme art. 449.º, n.º 1, al. a) e d) do Código de Processo Penal.

4. A alegação do recorrente de que «sustentou a condenação, entre o mais, o certificado de registo criminal junto nos autos», não é, na sua literalidade, a mais consentânea com os factos provados e a motivação. Nessa alegação, perpassa a ideia, forçada, de que a condenação ocorreu porque o arguido tinha antecedentes, quando não é assim. Mais, os antecedentes, não tiveram sequer a relevância que o recorrente lhes parece outorgar, como veremos adiante. A condenação pelo crime, como resulta de modo claro da sentença, assentou em prova diversa, nomeadamente o depoimento do OPC que intercetou o arguido, o identificou e submeteu a exame de pesquisa de álcool no sangue, conjugadamente com o talão e certificado de verificação do alcoolímetro. Daí que, também a conclusão a que chega o recorrente, a condenação assentou assim em pressupostos errados, não possa ser subscrita. O CRP, consabidamente de outro arguido que não o condenado, sustentou sim o facto provado relativo aos antecedentes criminais que o condenado não tinha. Antecedentes criminais que foram convocados tão só na fundamentação da escolha e medida da pena. Mas daí retirar a conclusão de que a condenação assentou assim em pressupostos errados, é um claro exagero.

5. Como, agudamente, diz o PGA, o «Ministério Público, enquanto promotor da ação penal, não requisitou o certificado de registo criminal do arguido AA e permitiu que fosse incorporado no processo um certificado de registo criminal requisitado pela secção de inquéritos da PSP sem cuidar de verificar se o mesmo respeitava ao arguido. Por sua vez, o defensor do arguido, a quem os autos foram apresentados para consulta e que solicitou o prazo de dez dias para preparar a defesa, não requereu que se requisitasse o certificado de registo criminal do arguido. Por último, o tribunal, antes de elaborar a sentença, não atentou na identidade da pessoa a quem o certificado de registo criminal de que se serviu respeitava. Houve, digamos assim, uma falha coletiva pois ninguém reparou que o certificado de registo criminal coligido nos autos pertencia a um tal BB, nome que sequer se assemelha ao do arguido, falha essa que podia ter sido emendada através da interposição do pertinente recurso ordinário por parte do Ministério Público ou do arguido.

Se é verdade, então, que o certificado de registo criminal do condenado não foi tido em consideração na sentença revidenda, tal ficou a dever-se unicamente à desatenção dos sujeitos processuais». Em conclusão, uma falência de todos e em toda linha. Mas sejamos claros, o remédio proposto pelo recorrente e secundado pelo juiz, iria dar continuidade à falta de rigor que os autos documentam.

6. O fundamento de revisão invocado (art. 449.º/1/d, CPP), como é jurisprudência deste STJ, exige a verificação cumulativa de dois pressupostos (a) que sejam descobertos novos factos ou meios de prova, (b) que esses novos factos ou meios de prova suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação e não tenham como único fim corrigir a medida concreta da sanção aplicada (art. 449.º/3, CPP, ac. STJ de 10.01.2018). Como salienta o PGA, neste contexto, o documento ora apresentado e o facto que dele se extrai, quanto à inexistência de antecedentes criminais do condenado, não constitui uma nova prova, na aceção do artigo 449.º/1/d, CPP, ou seja, uma prova que, justificadamente, era desconhecida ou não pôde ser apresentada e apreciada antes da sentença. Agissem os intervenientes – o OPC e todos sujeitos processuais sem exceção – com o mínimo de diligência e teriam constatado que o CRC do BB não podia ser do arguido AA, não há confusão possível; teriam providenciado pela junção do CRC do arguido. Admitir o recurso extraordinário de revisão com fundamento em tal lapso coletivo é normalizar o recurso extraordinário como ordinário, banalizar o seu uso como válvula de escape do recurso ordinário que devia ter sido interposto da sentença, mas que por descuido dos sujeitos processuais com legitimidade também não foi interposto. Em conclusão não há novo meio de prova. Acresce que não se suscitam graves dúvidas sobre a justiça da condenação, pois não resta sombra de dúvida quanto à correta condenação do arguido pela prática de um crime de condução em estado de embriaguez, previsto e punido pelo artigo 292º/1, CP.

7. Considerou a sentença, quanto ao relevo das condenações anteriores (que julgou que o arguido tinha sofrido, mas sabemos que não tinha), o seguinte:

Por outro lado tal como referido pelo Digno Magistrado do Ministério Publico o arguido já sofreu três condenações embora de diferente tipo legal, embora não estradal, (…), sendo certo que, tal como também referido, os crimes ora em apreciação foram praticados no período da suspensão de duas penas de prisão, pelo que, não obstante os princípios da necessidade, proporcionalidade e subsidiariedade inerentes à aplicação de pena de multa, a aplicação de uma mera pena de multa a titulo principal, já não satisfaz de forma suficiente e adequada as finalidades da punição, importando dar um sinal ao arguido de que ou se afasta de uma vez por todas da prática do crime ou correrá sérios riscos de sofrer prisão efectiva. Assim sendo, o tribunal julga proporcional e adequada a condenação do arguido numa pena de 3 meses de prisão, a qual, atento os diferentes tipos legais de crime pelos quais foi condenado e não se tendo logrado circunstâncias que impunham o cumprimento efectivo desta pena de prisão, se substitui nos termos do artigo 45.º n.º 2 do Código Penal, por igual tempo de multa que se julga proporcional e adequada, 90 dias, à taxa diária de 5 euros, o que perfaz 450 euros.

8. Os antecedentes, tanto quanto resulta da sentença, obstaram a que fosse aplicada ao arguido uma pena originária de multa, o que numa primeira leitura podia convocar a previsão do art. 449.º/3, CPP, – não é admissível revisão com o único fim de corrigir a medida concreta da pena, mas já seria admissível a revisão para corrigir a escolha da pena – pois no caso estaria em causa a escolha da pena e não apenas a sua medida. Porém, o art.º 449.º/3, CPP, não pode ser lido desirmanado do precedente n. º1/d, onde relevam as graves dúvidas sobre a justiça da condenação, o que inviabiliza a pretendida subtileza interpretativa. Acresce que, no caso, a consideração dos antecedentes não constituiu óbice a que a pena de multa fosse aplicada como pena de substituição. Sendo assim, mesmo que se admita por eficácia de raciocínio, a novidade do meio de prova, a justiça da condenação não suscita quaisquer dúvidas e menos ainda graves dúvidas.

III

Decisão:

Pelo exposto, acordam os Juízes da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça em negar a revisão pedida pelo Ministério Público no interesse do arguido AA.

Sem tributação.

Supremo Tribunal de Justiça, 09.11.2022

António Gama (Relator)

João Guerra

Orlando Gonçalves

Eduardo Loureiro (Presidente de secção)