Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
760/04.OTAEVR.E1.S1
Nº Convencional: 5ª SECÇÃO
Relator: RODRIGUES DA COSTA
Descritores: RECURSO DA MATÉRIA DE FACTO
ÓNUS DA IMPUGNAÇÃO ESPECIFICADA
CONVITE AO APERFEIÇOAMENTO
COMPETÊNCIA DA RELAÇÃO
INDEMNIZAÇÃO
ACIDENTE DE VIAÇÃO
PROPOSTA RAZOÁVEL PARA INDEMNIZAÇÃO
DIREITO À VIDA
UNIÃO DE FACTO
DANOS FUTUROS
DESPESAS PESSOAIS
Nº do Documento: SJ
Data do Acordão: 12/03/2009
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PROVIDO EM PARTE
Sumário : I - Caso a recorrente não impugne a matéria de facto nos termos legalmente prescritos, ou seja
conforme o estatuído pelo art. 412.º, n.ºs 3 e 4, do CPP – nomeadamente indicando os concretos pontos de facto que considerava incorrectamente julgados e, sobretudo, as concretas provas que imporiam decisão diversa da adoptada e, bem assim, relativamente às provas produzidas em audiência de julgamento, as concretas passagens das gravações em que se fundava a impugnação –, e isto quer na motivação, quer nas conclusões da motivação do recurso, o Tribunal da Relação, legitimamente, “limita-se” a fazer o controle do processo lógico e racional seguido na apreciação da prova pelo Tribunal de 1.ª instância e a analisar a matéria de facto do ponto de vista dos vícios do art. 410.º, n.º 2, do CPP.
II - Numa situação como a configurada, não se impõe que o tribunal a quo faça a reapreciação da prova produzida, nem sequer que enderece convite à recorrente para corrigir as conclusões – cf. Acs. de 04-10-2006, Proc. n.º 812/06, de 04-01-2007, Proc. n.º 4093/06, e de 10-01-2007, Proc. n.º 3518/06, todos da 3.ª.
III - Na fixação da indemnização pela perda do direito à vida, seguindo-se o critério da equidade (art. 496.º, n.º 1, do CC), os montantes a arbitrar devem respeitar uma certa proporcionalidade e dignidade, por forma a compensarem adequadamente o dano, sem estreitezas miserabilistas, mas também sem larguezas que representem enriquecimento indevido.
IV - Apurando-se que a morte da vítima resultou de acidente de viação entre o tractor que conduzia e um veículo automóvel ligeiro de mercadorias, com culpa exclusiva deste, se bem que na modalidade de negligência; que o dano ocorrido é o mais precioso dos direitos fundamentais e insusceptível de qualquer remédio, sendo a indemnização em dinheiro uma mera compensação que, de forma alguma, repara o mal causado; que a circunstância da vítima ter 70 anos de idade não mitiga essa perda, e que a situação económica dos lesado e lesante são equivalentes – medianas –, sendo certo que o último transferiu a responsabilidade civil por acidentes causados com a sua viatura para uma empresa de seguros, o quantitativo fixado não se mostra exagerado [€ 50 000, atribuído pelo Tribunal da Relação, que revogara o anteriormente decidido pela 1.ª instância, que fixara € 20000].
V - Não procede a tese da recorrente de que o valor de € 41 040,00 é adequado a compensar o “dano morte”, segundo a Portaria 377/2008, de 26-05, actualizada pela Portaria 679/2009, de 25-06, já que este diploma teve por objectivo, não a fixação definitiva de valores indemnizatórios mas, nos termos do n.º 3 do art. 39.º do DL 291/2007, de 21-08, o estabelecimento de um conjunto de regras e princípios que permita agilizar a apresentação de propostas razoáveis; as suas disposições não afastam o direito à indemnização de outros danos, nos termos da lei, nem a fixação de valores superiores aos propostos (art. 1.º, n.º 2), representando apenas um indicador a ter em conta na fixação da indemnização.
VI - Se esta fosse fixada por tabelas, nem seria preciso que os tribunais perdessem tempo a arbitrar indemnizações, nem se mostrava necessária uma ponderação das circunstâncias que, de acordo com a lei, são relevantes para tal efeito.
VII - Provando-se que o falecido viveu durante anos, até ao seu decesso, com uma companheira e que com a sua morte, esta viu cortado o contributo prestado pelo mesmo, existe fundamento legal – art. 495.º, n.º 3, do CC – para a atribuição de indemnização a título de danos futuros, por privação da fonte de onde promanava o contributo para alimentos e pelo tempo provável de vida, de acordo com padrões médios (estatísticos) do finado, se não tivesse ocorrido a lesão mortal.
VIII - Na determinação deste quantitativo haverá que atender que, em circunstâncias normais, segundo dados que a experiência comum fornece, a vítima consumiria, em despesas pessoais, uma quantia nunca inferior a 2/3 do auferido, aplicando 1/3 no contributo prestado para o sustento da sua companheira.
Decisão Texto Integral: