Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
642/14.7T8VCT.G1.S1
Nº Convencional: 7ª SECÇÃO
Relator: OLIVEIRA ABREU
Descritores: CASO JULGADO
ANULAÇÃO DA VENDA
ERRO SOBRE O OBJECTO DO NEGÓCIO
ERRO SOBRE O OBJETO DO NEGÓCIO
ACÇÃO EXECUTIVA
AÇÃO EXECUTIVA
ACÇÃO DECLARATIVA
AÇÃO DECLARATIVA
COMPRA E VENDA
NULIDADE DO CONTRATO
VENDA JUDICIAL
ANÚNCIO
OFENSA DO CASO JULGADO
AUTORIDADE DO CASO JULGADO
Data do Acordão: 12/13/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL – PROCESSO DE DECLARAÇÃO / SENTENÇA / ELABORAÇÃO DA SENTENÇA / RECURSOS / RECURSO DE REVISTA / JULGAMENTO DO RECURSO.
Doutrina:
- Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, Volume I, Almedina, Coimbra, 1981, p. 203;
- Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, p, 305 e 306;
- Miguel Teixeira de Sousa, O objecto da sentença e o caso julgado material, apud, Boletim do Ministério da Justiça, 325, p. 171 e ss.;
- Rodrigues Bastos, Notas ao Código de Processo Civil, Volume III, p. 60 e 61;
- Teixeira de Sousa, Algumas questões sobre o ónus de alegação e de impugnação em processo civil, in Scientia Iuridica, Tomo LXII, n.º 332, 2013, p. 395, 401 e 402.
Legislação Nacional:
CÓDIGO PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 608.º, N.º 2, 609.º, N.º 1, 635.º, N.º 4, 639.º, N.º 1 E 679.º.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:


- DE 05-12-2017;
- DE 18-09-2018, AMBOS IN WWW.DGSI.PT.
Sumário :
I. O caso julgado traduz-se na insusceptibilidade de impugnação de uma decisão, decorrente do respectivo trânsito em julgado.

II. O conhecimento do caso julgado pode ser perspectivado em duas vertentes distintas, que de todo se podem confundir, mas complementam-se, ou seja, enquanto a força e autoridade do caso julgado tem por finalidade evitar que a relação jurídica material, já definida por uma decisão com trânsito, possa vir a ser apreciada diferentemente por outra decisão, com ofensa da segurança jurídica, a excepção destina-se a impedir uma nova decisão inútil, com ofensa do princípio da economia processual.

III. São requisitos do caso julgado, quando se propõe uma acção idêntica a outra, já transitada em julgado, a identidade quanto aos sujeitos, ao pedido e causa de pedir.

IV. Há identidade de sujeitos quando as partes sejam portadoras do mesmo interesse substancial, não sendo exigível correspondência física e sendo indiferente a posição que adoptem em ambos os processos.

V. Há identidade de pedido quando se verifica coincidência da tutela jurisdicional reclamada e do conteúdo e objecto do direito impetrado. O pedido, não deve ser entendido na pura literalidade em que se declara o petitório, mas com o alcance que decorre da respectiva conjugação como os fundamentos da pretensão arrogada, por forma a compreender o modo específico da pretendida tutela jurídica.

VI. Há identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas demandas procede do mesmo facto jurídico, entendendo-se a causa de pedir como o próprio facto jurídico genético do direito, donde se deverá atender a todos os factos invocados que forem injuntivos da decisão, correspondendo, pois, à alegação de todos os factos constitutivos do direito e relevantes no quadro das soluções de direito plausíveis a que o tribunal deva atender, independentemente da coloração jurídica dada, sendo que a causa de pedir deve ser preenchida com os factos essenciais causantes do efeito jurídico pretendido.

VII. Quando numa acção declarativa, já transitada em julgado, é pedida a nulidade da venda, relativa a determinado imóvel, com fundamento no erro do objecto, e em incidente de anulabilidade da venda, se formula o pedido de nulidade da venda efectuada relativa ao mesmo bem imóvel, sustentando-se o pedido na circunstância de que, acaso o Requerente/Adquirente soubesse que o prédio adquirido, não tinha as características anunciadas e constantes do relatório pericial junto aos executivos, jamais o teria adquirido, sublinhando-se que o prédio anunciado e vendido sofre de limitação na sua área e na sua construção, contrariamente ao publicitado no anúncio de venda, induzindo em erro o proponente, estando desconforme com o anúncio, temos de concluir que os factos jurídicos donde emerge a pretensão arrogada, quer na decisão transitada em julgado, quer no incidente de anulabilidade da venda, são exactamente iguais, traduzidos, ao cabo e ao resto, uma situação de erro sobre a coisa que abrange a identidade ou as qualidades do objecto adquirido.

Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça



I – RELATÓRIO

AA intentou o presente incidente de anulabilidade da venda, alegando que o prédio anunciado e vendido ao ora requerente, sofre de limitação na sua área e na sua construção, contrariamente ao publicitado no anúncio de venda, induzindo em erro o proponente, tendo direito a ser indemnizado no valor correspondente ao preço.

Terminou pedindo que se declare a nulidade da venda do imóvel vendido ao requerente e que tem direito a ser indemnizado.

Notificados o exequente, os credores reclamantes e os executados, vieram apenas pronunciar-se os credores reclamantes BB, Lda., e o Banco CC, S.A., dizendo que a questão da nulidade da venda já foi definitivamente decidida no apenso J, acrescentando a primeira que o requerente carece de legitimidade para formular pedido contra a BB e que o mesmo litiga de má-fé. 

Os autos prosseguiram e foi proferida a seguinte decisão:

“Constituindo a causa de pedir não o facto abstracto configurado na lei mas o facto concreto e particular que no caso sub judice se apresenta, o que se constata é que a causa de pedir numa e noutra acção não é idêntica (a primeira baseava-se em erro sobre o objecto); já a presente acção baseia-se na falta de conformidade entre o que foi anunciado e o que foi vendido ao proponente, pelo que inexiste caso julgado.

Pelo exposto, julga-se igualmente improcedente esta excepção dilatória.

E em conformidade foi decidido o seguinte:

Nestes termos, em face do que vem de ser exposto, anula-se a venda efectuada nestes autos relativa ao bem imóvel descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob 1…0/2…8, com fundamento em desconformidade com o que foi anunciado, mais se declarando que, em consequência, o proponente tem direito a ser indemnizado do valor do respectivo preço (aquando da restituição do dito prédio).”

Inconformado, o Banco CC, S.A. interpôs recurso desta decisão, tendo sido conhecida a apelação interposta, conforme acórdão proferido a 3 de Maio de 2018, onde se consignou, no respectivo dispositivo:

“Pelo exposto, acordam os Juízes desta Secção em julgar a apelação procedente e, em conformidade, revogam a decisão recorrida. Custas pelo requerente”

É contra esta decisão que o Requerente/AA, se insurge, interpondo revista, formulando as seguintes conclusões:

“1 - A figura da excepção de caso julgado tem que ver com um fenómeno de identidade entre relações jurídicas, sendo a mesma relação submetida sucessivamente a apreciação jurisdicional, ignorando-se ou desvalorizando-se o facto de esse mesma relação já ter sido, enquanto objecto processual perfeitamente individualizado nos seus aspectos subjectivos e objectivos, anteriormente apreciada jurisdicionalmente, mediante decisão que transitou em julgado.

2 - A essencial individualidade da causa de pedir tem de aferir-se em função de uma comparação entre o núcleo essencial das causas petendi invocadas numa e noutra das acções em confronto.

3 - Não ocorre a excepção de caso julgado quando as pretensões materiais formuladas nas duas acções em confronto, para além de representarem vias jurídicas alternativas e estruturalmente diferenciadas para alcançar a tutela jurídica de determinado interesse, assentes em pressupostos legais perfeitamente autónomos, impliquem a formulação de pedidos estruturalmente diferentes.

4 – “A causa de pedir delimita o thema decidendum, mas não é ela própria o thema decidendum - daí que, o mesmo thema decidendum possa ser levado a juízo noutra acção sem que tal importe a repetição da causa de pedir. Por outro lado, dada a concepção restrita do caso julgado, a eficácia deste abrange apenas o juízo de mérito dado pelo Tribunal à pretensão do autor, nos moldes em que tenha sido formulado o pedido, e balizado pelo facto jurídico de que procede a pretensão material deduzida” - V. Prof Antunes Varela.

5 - Naquela acção, os AA., ora recorrentes, peticionaram a anulabilidade da venda por erro sobre o objecto quanto às qualidades do imóvel vendido, sendo a sua pretensão inviabilizada por falta de prova da essencialidade do erro, “prova diabólica”, face aos sujeitos processuais que apenas intervieram na execução, com excepção do outro adquirente.

6 - No presente incidente os recorrentes peticionaram a nulidade da venda com fundamento na falta de conformidade entre o que foi anunciado e o que foi vendido ao proponente, ora recorrente, sendo despiciendo a essencialidade.

7 - Ainda que se entenda ser o thema decidendum da presente lide, coincidente com o thema decidendum dos autos que correram termos sob o apenso “J”, tal coincidência, salvo o devido respeito, não é requisito da excepção de caso julgado, e as causas de pedir de uma e outra acção, continuam diferentes.

8 - É que, são factos substantivamente relevantes para a apreciação da matéria litigiosa e afectam, indubitavelmente, o núcleo essencial da causa de pedir que suporta ambas as acções.

9 - Ali a formulação de pedido de reconhecimento e condenação numa obrigação, alicerçada na essencialidade do erro sobre o objecto, ao passo que o pedido aqui formulado opera no plano da falta de conformidade entre o que foi anunciado e o que foi vendido, envolvendo, de forma essencial, um imediato reconhecimento do direito à nulidade da venda e um juízo de reembolso do preço.

10 - A interpretação e aplicação do Tribunal da Relação de … plasmada no douto acórdão em crise, ofende os mais elementares interesses e princípios da justiça, através do cometimento de gritante injustiça e causadora de elevados prejuízos, determinando alarme social e desconfiança perante os tribunais.

11 - In casu, o Tribunal efectuou a venda dum imóvel, cujo anúncio não é conforme com o que foi vendido ao proponente e não por erro sobre o objecto, com inequívoca violação do artigo 202º da Constituição da República Portuguesa, estando afastado o caso julgado.

12 - Destarte, salvo o devido respeito, nenhum dos pressupostos necessários à verificação da excepção de caso julgado ocorrem no caso em apreço, razão pela qual o tribunal recorrido não podia ter julgado, procedente a invocada excepção.

13 - Violou o douto acórdão em recurso, por errada interpretação e aplicação, os artigos 577º, 580º, 581° e 838º do CPC, 247º e 251º, do C. Civil e 202º da CRP.

Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se o douto acórdão recorrido e, consequentemente, manter a decisão proferida pelo Tribunal de Primeira Instância.”

Houve contra-alegações apresentadas pelo Recorrido/Credor/Banco CC S.A., concluindo pela improcedência do recurso apresentado pelo Recorrente/Adquirente/AA, aduzindo, para o efeito as seguintes conclusões

“l. Os adquirentes AA e mulher vieram interpor recurso de revista do Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de …, o qual julgou procedente o recurso de apelação intentado pelo Banco CC, S.A. e, em consequência, revogou a decisão recorrida que decidiu anular a venda do bem imóvel descrito na Conservatória de Registo Predial de … sob o n.º 1...0.

2. Salvo o devido respeito, que é muito, entende o Credor Banco CC, S.A. que o recurso interposto por AA e mulher carece de fundamento, porquanto o Tribunal a quo, no que diz respeito às questões suscitadas pelo mesmo no respetivo recurso, decidiu corretamente a matéria de direito sujeita a apreciação:

3. O bem imóvel descrito na CRP de … sob o n.° 100 foi adquirido pelos Recorrentes pelo montante de €110.500,00 na venda judicial realizada a 30/03/2009.

4. Os Adquirentes AA e DD instauraram um procedimento cautelar de restituição provisória da posse contra os executados EE e FF, tendo sido distribuído ao n.º 134-/09.6TBPCR, o qual veio a ser indeferido com fundamento na falta de verificação da posse e do esbulho.

5. Os adquirentes AA e DD instauraram a ação declarativa com o n.º 27/10.4TBPCR contra os Executados EE e FF, onde peticionaram o reconhecimento do direito de propriedade do bem imóvel descrito na CRP de … sob o n.º 100, composto por diversas construções, a qual foi parcialmente procedente.

6. Por apenso aos presentes autos, os adquirentes AA e DD instauraram, em julho de 2010, uma ação declarativa peticionando a nulidade da venda efetuada a 30 de março de 2009, a qual foi intentada contra os Executados EE e FF e ainda contra os credores GG, BB, Lda., HH, Lda., II, S.A. e Banco JJ, S.A..

7. Os adquirentes AA e DD peticionaram a declaração de nulidade da venda com fundamento na falta de conformidade entre o bem imóvel adquirido e o bem imóvel anunciado, tendo sido a ação julgada improcedente e absolvidos os Réus do pedido de anulação da venda executiva, porquanto não foram alegados e provados os requisitos de que depende a anulabilidade por erro.

8. Os Adquirentes AA e DD vieram aos presentes autos executivos peticionar a nulidade da venda efetuada a 30 de março de 2009, invocando a existência de uma desconformidade entre o imóvel vendido e o anunciado no que respeita à sua área e construção, induzindo-os em erro.

9. O Tribunal de Primeira Instância entende que não se verifica qualquer exceção de caso julgado porquanto a causa de pedir numa e noutra ação não é idêntica, uma vez que a ação que correu termos no apenso, J se baseou em erro sobre o objeto e a presente ação se baseia na falta de conformidade entre o que foi anunciado e o que foi vendido.

10. Por não concordar com a referida decisão, o Banco CC, S.A. apresentou recurso de apelação, o qual veio a ser declarado procedente por considerar que se verifica a tripla identidade de sujeitos, pedido e causa de pedir entre o pedido de nulidade apresentado nos presentes autos e o pedido de nulidade apresentado no apenso J, o qual já foi objeto de decisão transitada em julgado.

11. Os adquirentes AA e DD vieram interpor o presente recurso de revista por entenderem que não se verifica a exceção de caso julgado, uma vez que nos presentes autos foi peticionada a nulidade da venda fundado na falta de conformidade entre o bem que foi anunciado e o que foi vendido, enquanto no Apenso J foi peticionada a anulabilidade do negócio baseada no erro sobre o objeto, pelo que se tratam de causas de pedir distintas.

12. O artigo 581.º do CPC dispõe acerca dos requisitos do caso julgado, entendendo-se que existe uma repetição da causa quando se propõe uma ação idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir.

13. Há uma identidade de sujeitos e de pedido entre a ação declarativa que correu no Apenso J e o presente incidente de anulação da venda, uma vez que é o mesmo efeito jurídico que se pretende obter em ambas as causas e entre as mesmas partes processuais.

14. A identidade de causa de pedir ocorre quando a pretensão deduzida nas duas ações procede do mesmo facto jurídico, sendo que, nas ações constitutivas e de anulação é o facto concreto ou a nulidade específica que se invoca para obter o efeito pretendido.

15. Os Recorrentes AA e DD entendem que a causa de pedir na ação declarativa que correu por apenso aos presentes autos se baseou no erro sobre o objeto, enquanto o presente incidente se baseia na falta de conformidade entre o que foi anunciado e o que foi vendido ao proponente, razão pela qual inexiste caso julgado.

16. A causa de pedir é exatamente igual numa e noutra ação, uma vez que ambas procedem do mesmo facto jurídico que consiste na falta de conformidade entre o bem imóvel vendido e o bem imóvel anunciado.

17. No apenso J, onde correu termos a ação declarativa de anulação da venda de 30 de março de 2009, os ali Autores AA e DD invocaram que adquiriram o bem imóvel convencidos de que o mesmo englobava determinadas construções e edificações e que, se tivessem conhecimento da efetiva composição do bem imóvel, nunca teriam apresentado qualquer proposta de aquisição do mesmo.

18. A causa de pedir da referida ação declarativa assentou na existência de uma desconformidade entre o bem imóvel que foi adquirido pelos Autores e o bem imóvel que foi anunciado para venda, consubstanciando numa situação de erro sobre a coisa que abrange a identidade ou as qualidades do objeto.

19. No presente incidente de nulidade da venda, os adquirentes AA e DD peticionam novamente a anulação da venda efetuada a 30 de março de 2009 e invocam que o bem imóvel adquirido não corresponde ao bem imóvel que foi anunciado, uma vez que dele não fazem parte determinadas construções e edificações.

20. Os fundamentos apresentados numa e noutra ação são exatamente os mesmos, ou seja, a falta de conformidade entre o bem imóvel adquirido e o bem imóvel anunciado, o que, por sua vez, constitui um erro sobre a coisa adquirida.

21. O anterior artigo 908° do CPC (vigente à data dos factos) prevê situações em que, após a venda, se reconhece a existência de erro sobre a coisa transmitida por falta de conformidade com o que foi anunciado e, como tal, concede-se ao comprador a possibilidade de pedir uma indemnização.

22. Verificando-se esta hipótese, os adquirentes podiam ter requerido a anulação da venda no âmbito da ação executiva, mas, ao invés, decidiram instaurar a ação declarativa que correm por apenso aos presentes autos executivos, com as inerentes consequências.

23. No âmbito da referida ação declarativa, os adquirentes tinham necessariamente de alegar e provar os pressupostos gerais da relevância do erro, o que não lograram fazer, razão pela qual a ação decaiu.

24. A causa de pedir é exatamente a mesma entre a referida ação declarativa e o presente incidente, ou seja, a falta de desconformidade entre o bem imóvel anunciado e o bem imóvel adquirido.

25. A única diferença que existe entre o pedido de anulação da venda na ação declarativa e nos presentes autos é o ónus da prova que recai sobre o proponente, uma vez que na primeira têm de ser alegados e provados os pressuspostos gerais do erro, o que já não sucede na ação executiva.

26. Se os adquirentes optaram por instaurar a ação declarativa sabiam que tinham o ónus da prova dos referidos pressupostos, sendo que, se não alegaram e não provaram os pressupostos gerais do erro na ação declarativa, não podem apresentar o mesmo pedido na ação executiva.

27. O erro sobre o objeto consiste precisamente numa situação de desconformidade, ou seja, a vontade declarada está viciada por erro sobre o objecto do negócio ou sobre as suas qualidades, e, por isso, é divergente da vontade que o declarante teria tido sem tal erro.

28. A causa de pedir na ação declarativa que correu por apenso aos presentes autos é precisamente a mesma causa de pedir do presente incidente, razão pela qual estamos perante uma exceção do caso julgado, que constitui uma exceção dilatória que obsta a que o tribunal conheça do mérito da causa.

Termos em que deve ser julgado totalmente improcedente o recurso de revista interposto, mantendo-se o acórdão recorrido, com todas as consequências, conforme é de Justiça”.

Foram colhidos os vistos.

Cumpre decidir.

II. FUNDAMENTAÇÃO

II. 1. A questão a resolver, recortada das alegações apresentadas pelo Recorrente/Adquirente/AA, consiste em saber se:

(1) O Tribunal a quo fez errónea interpretação e aplicação do direito, ao julgar procedente a excepção de caso julgado, impondo-se a revogação dessa decisão, e, em consequência, repristinada a decisão proferida em 1ª Instância que julgou improcedente a excepção de caso julgado, e, nesse conspecto, anulou a venda efectuada, relativa ao bem imóvel descrito na Conservatória do Registo Predial de Paredes de Coura sob 100/280688, com fundamento em desconformidade com o que foi anunciado, e mais declarou, como corolário do decidido, que o proponente tem direito a ser indemnizado do valor do respectivo preço (aquando da restituição do dito prédio)?

II. 2. Da Matéria de Facto

Foi dada como provada a seguinte matéria de facto:

“1. Conforme certidão de fls. 170 e seguintes dos presentes autos e cujo teor se dá por reproduzido foi penhorado nos presentes autos o prédio misto, constituído por habitação, rossios e mata de carvalhos, eucaliptos e mato, com a área global de 3675 m2, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº 001...0/2...8 e inscrito na matriz respectiva sobre o artigo urbano 51 e rústico 570.

2. A venda do aludido bem imóvel por propostas em carta fechada foi anunciada conforme documentos constantes de fls. 259 e seguintes e cujo teor se dá por integralmente reproduzido, constando do respectivo edital que o prédio identificado em 1. tinha uma área global de 3675 m2.

3. Na data designada para a abertura de propostas em carta fechada foi apresentada e aceite a proposta apresentada pelo proponente relativamente ao bem imóvel identificado em 1. – cfr. acta de 276 e seguintes e cujo teor se dá por reproduzido.

4. Após a aludida venda, o aqui proponente AA e a mulher DD intentaram contra o aqui exequente GG uma acção que correu termos sob nº 27/10.4TBPCR, na qual se discutiu a composição e os limites físicos do prédio adquirido no âmbito do presente processo executivo.

5. Por sentença proferida em 18.03.2016 e transitada em 4.05.2016 a mencionada acção foi julgada parcialmente procedente, tendo-se declarado os autores únicos e exclusivos proprietários do prédio inscrito na matriz sob os artigos 151 e 570 composto, além de mata e arvoredo, pelas construções que se veem, lado esquerdo de quem vê, na 1ª fotografia doc. “6 B” a fls. 289 e a do lado direito de que vê a 2ª fotografia doc. “6G” fls. 293, uma casa em ruínas com a área de 29,25m2 e o muro de pedra assinalado como “x” nas fotografias juntas sob o doc “6G” a fls. 293, todos situados no terreno de patamar inferior, condenando-se o réu a reconhecer o direito de propriedade dos autores sobre tal descrito prédio, abstendo-se de praticar quaisquer actos que afectem a propriedade dos autores, sem o seu consentimento, improcedendo o demais peticionado pelos autores, sendo o réu absolvido nessa parte, conforme certidão junta a fls. 238 a 257 do apenso J e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

6. Na aludida acção deu-se como não provado que a área de terreno seja de 3,675m2 e que daquele prédio façam parte outras construções, assim como muros de alvenaria de pedra e bloco que totalizam cerca de 300m2.

7. Por sentença proferida em 4.10.2016, confirmada pelo acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 20.04.2017 foi julgada improcedente a acção intentada pelos ora proponentes com vista à anulação da aludida venda, com fundamento na falta de alegação da essencialidade do erro (apenso J).”

II. 3. Do Direito

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do Recorrente/AA, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso, conforme prevenido no direito adjectivo civil - artºs. 635º, n.º 4, e 639º n.º 1, ex vi, art.º 679º, todos do Código Processo Civil.

II. 3.1. O Tribunal a quo fez errónea interpretação e aplicação do direito, ao julgar procedente a excepção de caso julgado, impondo-se a revogação dessa decisão, e, em consequência, repristinada a decisão proferida em 1ª Instância que julgou improcedente a excepção de caso julgado, e, nesse conspecto, anulou a venda efectuada, relativa ao bem imóvel descrito na Conservatória do Registo Predial de Paredes de Coura sob 100/280688, com fundamento em desconformidade com o que foi anunciado, e mais declarou, como corolário do decidido, que o proponente tem direito a ser indemnizado do valor do respectivo preço (aquando da restituição do dito prédio)? (1)

O thema decidendum do recurso é estabelecido pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo daquelas cujo conhecimento oficioso se imponha, não sendo permitido ao Tribunal de recurso conhecer de questões que extravasem as conclusões de recurso, excepto se as mesmas forem de conhecimento oficioso, conforme resulta da lei adjectiva civil, concretamente, do estabelecido nos artºs. 608º, n.º 2, 609º, n.º 1, 635º, n.º 4, 639º, e 679º, todos do Código de Processo Civil.

O caso julgado traduz-se na insusceptibilidade de impugnação de uma decisão, decorrente do respectivo trânsito em julgado - artºs. 619º, n.º 1, e 628º, ambos do Código de Processo Civil.

Conforme decorre da lei adjectiva civil, o instituto do caso julgado constitui excepção dilatória – art.º 577º alínea i), do Código de Processo Civil - de conhecimento oficioso - artº. 578º, do Código de Processo Civil - que, a verificar-se, obsta que o tribunal conheça do mérito da causa e conduz à absolvição da instância – art.º 576º, do Código de Processo Civil.

O conhecimento do caso julgado pode ser perspectivado através de duas vertentes distintas, que de todo se podem confundir, mas complementam-se, reportando-se uma à excepção dilatória do caso julgado (cuja verificação pressupõe o confronto de duas demandas judiciais - estando uma delas já transitada em julgado - e uma tríplice identidade entre ambas, traduzida na coincidência de sujeitos, de pedido e de causa de pedir), e uma outra vertente que consubstancia a força e autoridade do caso julgado (decorrente de uma anterior decisão que haja sido proferida sobre a objecto em debate).

Como muito bem adianta a este propósito, Rodrigues Bastos, apud, Notas ao Código de Processo Civil, Volume III, páginas 60 e 61.“ (...) enquanto que a força e autoridade do caso julgado tem por finalidade evitar que a relação jurídica material, já definida por uma decisão com trânsito, possa vir a ser apreciada diferentemente por outra decisão, com ofensa da segurança jurídica, a excepção destina-se a impedir uma nova decisão inútil, com ofensa do princípio da economia processual”.

De acordo com o n.º 1, do art.º 580º, do Código de Processo Civil “as excepções de litispendência e do caso julgado pressupõem a repetição de uma causa; se a causa se repete estando a anterior ainda em curso, há lugar à listispendência; se a repetição se verifica depois de a primeira causa, ter sido decidida por sentença que já não admite recurso ordinário, há lugar à excepção do caso julgado”.

Ao definir a aplicação dos conceitos de excepção do caso julgado e de autoridade do caso julgado, Miguel Teixeira de Sousa, apud, O objecto da sentença e o caso julgado material, apud, Boletim do Ministério da Justiça, 325/171 e seguintes, defende que “A excepção do caso julgado visa evitar que o órgão jurisdicional, duplicando as decisões sobre idêntico objecto processual, contrarie na decisão posterior o sentido da decisão anterior ou repita na decisão posterior o conteúdo da decisão anterior: a excepção do caso julgado garante não apenas a impossibilidade de o Tribunal decidir sobre o mesmo objecto duas vezes de maneira diferente (...), mas também a inviabilidade do Tribunal decidir sobre o mesmo objecto duas vezes de maneira idêntica (...).Quando vigora como autoridade do caso julgado, o caso julgado material manifesta-se no seu aspecto positivo de proibição de contradição da decisão transitada: a autoridade do caso julgado é o comando de acção ou a proibição de omissão respeitante à vinculação subjectiva a repetição no processo subsequente do conteúdo da decisão anterior e à não contradição no processo posterior do conteúdo da decisão antecedente”.

Outrossim, o Professor Manuel de Andrade, apud, Noções Elementares de Processo Civil, páginas, 305 e 306, sustentou que a excepção do caso julgado manifesta-se porquanto “a definição dada à relação controvertida se impor a todos os tribunais quando lhes seja submetida a mesma relação, todos tendo de acatá-la, julgando em conformidade, sem nova discussão e de modo absoluto, com vista não só à realização do direito objectivo ou à actuação dos direitos subjectivos privados correspondentes, mas também à paz social”.

De harmonia com o prevenido no art.º 581º, do Código de Processo Civil que estatui sobre os requisitos da litispendência e caso julgado, divisamos consagrado no n.º 1, que “repete-se a causa quando se propõe uma acção idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e causa de pedir”, não deixando de, nos sequentes números do citado normativo, consignar a respectiva previsão quanto à exigida tríplice identidade (sujeitos, pedido e causa de pedir).

“Há identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica” ou seja, as partes são as mesmas sob o aspecto jurídico desde que sejam portadoras do mesmo interesse substancial, não sendo exigível correspondência física e sendo indiferente a posição que adoptem em ambos os processos.

“Há identidade de pedido quando numa e noutra causa se pretenda obter o mesmo efeito jurídico”, isto é, considera-se que existe identidade quando se verifica coincidência da tutela jurisdicional reclamada e do conteúdo e objecto do direito impetrado.

Salienta-se que o pedido, enquanto efeito jurídico pretendido pelo demandante, declarado no efeito prático-jurídico que o autor pretende, não deve ser entendido na pura literalidade em que se declara o petitório, mas com o alcance que decorre da respectiva conjugação como os fundamentos da pretensão arrogada, por forma a compreender o modo específico da pretendida tutela jurídica, neste sentido, Anselmo de Castro, apud, Direito Processual Civil Declaratório, Volume I, Almedina, Coimbra, 1981, página 203 “basta que as partes tenham conhecimento do efeito prático que pretendam alcançar, embora careçam da representação do efeito jurídico. Por outras palavras, o que interessará não é o efeito jurídico que as partes formulem, mas sim o efeito prático que pretendem alcançar; o objeto mediato deve entender-se como o efeito prático que o autor pretende obter e não como a qualificação jurídica que dá à sua pretensão.”.

“Há identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas acções procede do mesmo facto jurídico. Nas acções reais a causa de pedir é o facto jurídico de que deriva o direito real; nas acções constitutivas e de anulação é o facto concreto ou a nulidade específica que se invoca para obter o efeito pretendido”, entendendo-se a causa de pedir como o próprio facto jurídico genético do direito, donde se deverá atender a todos os factos invocados que forem injuntivos da decisão, correspondendo, pois, à alegação de todos os factos constitutivos do direito e relevantes no quadro das soluções de direito plausíveis a que o tribunal deva atender ao abrigo do art.º 5º, n.º 3, e nos limites do art.º 609º, n.º 1, do Código de Processo Civil, independentemente da coloração jurídica dada pelo autor.

O n.º 4 do art.º 581º do Código Processo Civil, atinente à identidade de causa de pedir, acolhe a doutrina da substanciação, pelo que, a causa de pedir deve ser preenchida com os factos essenciais causantes do efeito jurídico pretendido.

Sublinhamos que importa identificar, por um lado, os factos essenciais nucleares da causa de pedir, e, por outro lado, os factos complementares, a par de que se reconhece que, para circunscrever concreta causa de pedir, não basta a mera identidade naturalística da factualidade alegada, havendo sempre que considerar a sua relevância em face do quadro normativo aplicável e em função da espécie de tutela jurídica pretendida, neste sentido, Teixeira de Sousa, apud, Algumas questões sobre o ónus de alegação e de impugnação em processo civil, in Scientia Iuridica, Tomo LXII, n.º 332, 2013, páginas 395, 401 e 402 “A causa de pedir é constituída pelos factos necessários para individualizar a pretensão material alegada. O critério para delimitar a causa de pedir é necessariamente jurídico. É a previsão de uma regra jurídica que fornece os elementos para a construção de uma causa de pedir. (…) Os factos que constituem a causa de pedir devem preencher uma determinada previsão legal, isto é, devem ser subsumíveis a uma regra jurídica: eles não são factos “brutos”, mas factos “institucionais”, isto é, factos construídos como tal por uma regra jurídica. Isto demonstra que o recorte da causa de pedir é realizado pelo direito material: são as previsões das regras materiais que delimitam as causas de pedir, pelo que, em abstracto, há tantas causas de pedir quantas as previsões legais.”

Daqui resulta reconhecermos que será dentro destes princípios que se procurará traçar a identidade objectiva das acções em confronto para efeitos de configuração da excepção de caso julgado, neste sentido, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18 de Setembro de 2018, in, www.dgsi.pt., permitindo-nos também, a este propósito, enunciar o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 5 de Dezembro de 2017, in www.dgsi.pt, onde se consignou “objectivamente, a eficácia do caso julgado material incide nuclearmente sobre a parte dispositiva da sentença; porém, estende-se à decisão das questões preliminares que constituam antecedente lógico indispensável da parte dispositiva do julgado; do ponto de vista subjectivo, em regra, o caso julgado tem eficácia restrita às partes processuais que o provocaram, embora se possa projectar, conforme o caso, na esfera jurídica de terceiros”.

Atendendo ao quadro normativo, doutrinal e jurisprudencial, acabado de expor, conjugado com a facticidade demonstrada, julgamos não merecer censura a decisão escrutinada. Na verdade, é pacífico o reconhecimento da identidade de sujeitos, na medida em que as partes das consignadas demandas - Acção que correu termos por apenso aos presentes autos executivos com o n.º 642/14.7T8VCT - Apenso J - já transitada em julgado, e o Incidente de anulabilidade da venda que corre termos nos presentes autos executivos com o n.º 642/14.7T8VCT - são condizentes e são portadoras do mesmo interesse substancial, de tal sorte que, perante o objecto apreciado, e atendendo à sua qualidade jurídica, são inequivocamente idênticas.

Outrossim, como decorre do decidido nas Instâncias, não ocorre qualquer dúvida acerca da identidade dos pedidos, visto ser o mesmo efeito jurídico que se pretende obter numa e noutra causa.

Naquela acção que correu por apenso aos presentes autos (apenso J), os Autores/Adquirentes peticionaram a nulidade da venda efectuada a 30 de Março de 2009, relativa ao bem imóvel descrito na Conservatória de Registo Predial de … sob o n.º 1…0/2…8, de igual modo, o Requerente/Adquirente veio aos presentes autos executivos, em incidente de anulabilidade da venda, peticionar a nulidade da venda efectuada a 30 de Março de 2009, relativa ao bem imóvel descrito na Conservatória de Registo Predial de … sob o n.º 1…0/2…8, donde se retira, com meridiana clareza que existe identidade de pedidos entre as consignadas demandas, uma vez que ocorre coincidência na enunciação da forma de tutela jurisdicional pretendida pelos demandantes, quer quanto ao conteúdo e objecto do direito a tutelar, quer nos efeitos jurídicos pretendidos, reclamando os demandantes, coincidente em ambas as demandas, obter o mesmo efeito útil, isto é, pedido de anulação da venda efectuada a 30 de Março de 2009, relativa ao bem imóvel descrito na Conservatória de Registo Predial de ... sob o n.º 1…0/2…8.

Reconhecidas, pacificamente, as enunciadas identidades quanto aos sujeitos e pedidos formulados, a dissensão dos intervenientes processuais traduz-se na identidade da causa de pedir aduzida em uma e outra demanda, sendo que a este respeito, a argumentação aduzida pelo Recorrente/AA não convence, daí termos já adiantado que a decisão recorrida não merece reparo.

Atentemos.

Resulta dos autos, terem os Autores/Adquirentes, aqui Recorrente, instaurado em Julho de 2010, a acção declarativa, por apenso aos presentes autos executivos (Apenso J), impetrando a nulidade da venda efectuada a 30 de Março de 2009, relativa ao bem imóvel descrito na Conservatória de Registo Predial de … sob o n.º 1…0/2…8, com fundamento no erro do objecto, sendo que no presente incidente de anulabilidade da venda, o pedido de nulidade da venda efectuada a 30 de Março de 2009, relativa ao bem imóvel descrito na Conservatória de Registo Predial de … sob o n.º 1…0/2…8, está sustentado na circunstância de que, acaso o Requerente/Adquirente e sua mulher soubessem que o prédio adquirido, não tinha as características anunciadas e constantes do relatório pericial junto aos presentes autos executivos, jamais o teriam adquirido, donde o prédio anunciado e vendido sofre de limitação na sua área e na sua construção, contrariamente ao publicitado no anúncio de venda, induzindo em erro o proponente e mulher, estando desconforme com o anúncio.

Daqui decorre, e com facilidade se conclui, que os factos jurídicos donde emerge a pretensão arrogada, quer na decisão transitada em julgado, proferida no Apenso J desta Acção executiva com o n.º 642/14.7T8VCT, quer no presente incidente de anulabilidade da venda, são exactamente iguais, traduzidos na alegada falta de conformidade entre o bem imóvel adquirido e o bem imóvel anunciado para venda, ao cabo e ao resto, uma situação de erro sobre a coisa que abrange a identidade ou as qualidades do objecto adquirido.

Do cotejo da enunciada materialidade, cremos ser intuitivo afirmar, resultar do confronto de duas demandas, quais sejam, o presente incidente de anulabilidade da venda e aqueloutra já identificada como Acção executiva com o n.º 642/14.7T8VCT-J, não só a identidade de sujeitos, pois, as partes são as mesmas, enquanto portadoras do mesmo interesse substancial, adoptando, inclusive, a mesma posição em ambos os processos, mas também a identidade de causa de pedir porquanto a pretensão deduzida nas duas demandas, procede dos mesmos factos jurídicos alegados, identificando-se, por completo, o fundamento sustentado, com os factos jurídicos que suportam as consignadas demandas, ademais, não sofre dúvidas, a identidade de pedidos formulados no presente incidente de anulabilidade em confronto com aqueloutra demanda que constitui a Acção executiva n.º 642/14.7T8VCT-J, pois, numa e noutra causa pretendeu-se obter o mesmo efeito jurídico, qual seja, a declaração de nulidade da venda efectuada a 30 de Março de 2009, relativa ao bem imóvel descrito na Conservatória de Registo Predial de … sob o n.º 1…0/2…8.

Reconhecemos, assim, a excepção dilatória do caso julgado, uma vez verificada, confrontada a decisão proferida na Acção executiva n.º 642/14.7T8VCT-J, com o presente incidente de anulabilidade da venda, estando aquela já transitada em julgado, preenchida que está a enunciada tríplice identidade entre ambas, traduzida na coincidência de sujeitos, de pedido e de causa de pedir, sem deixar de reconhecer a força e autoridade do caso julgado, decorrente de decisão já proferida sobre o objecto em debate, na Acção executiva n.º 642/14.7T8VCT-J.

Na improcedência das alegações trazidas à discussão pelo Recorrente/AA, concluímos que as mesmas não encerram virtualidades no sentido de alterarem o destino da acção, e, neste sentido, este Tribunal ad quem, ao reconhecer o instituto do caso julgado, enquanto excepção dilatória, mantem inalterado o destino da demanda, traçado na Instância recorrida.

IV. DECISÃO

Pelo exposto e decidindo, os Juízes que constituem este Tribunal, acordam em julgar improcedente o recurso interposto, e, consequentemente, nega-se a revista.

Custas pelo Recorrente/AA.

Notifique.

Lisboa, Supremo Tribunal de Justiça, 13 de Dezembro de 2018

Oliveira Abreu (Relator)                                                    

Ilídio Sacarrão Martins

Maria dos Prazeres Beleza