Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 6.ª SECÇÃO | ||
Relator: | MARIA OLINDA GARCIA | ||
Descritores: | INSOLVÊNCIA RECURSO DE REVISTA ADMISSIBILIDADE DE RECURSO VALOR DA CAUSA PRESSUPOSTOS | ||
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Data do Acordão: | 06/28/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA (COMÉRCIO) | ||
Decisão: | RECLAMAÇÃO INDEFERIDA | ||
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Sumário : |
O regime do recurso de revista previsto no art.14º do CIRE, assente na oposição de acórdãos, não prescinde da verificação simultânea dos pressupostos gerais de recorribilidade exigidos pelo art.629º, n.1 do CPC (por remissão do art.17º do CIRE), onde se incluem o valor da causa e da sucumbência. | ||
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Decisão Texto Integral: | Processo n. 3364/12.0TJCBR-G.C1.S1 Recorrente: AA
Acordam em Conferência no Supremo Tribunal de Justiça
I. RELATÓRIO 1. AA, administradora de insolvência nos autos supra referidos, apresentou requerimento para cálculo da sua remuneração variável, no qual computou a majoração prevista no art.23º, n.7 do EAJ em 7.507,03 Euros. 2. A primeira instância, fazendo uma diferente interpretação desse normativo calculou aquela majoração em 2.996,66 Euros. 3. Discordando de tal interpretação, a requerente interpôs recurso de apelação, mas o TRC, por acórdão de 23.01.2023, confirmou a decisão da primeira instância. 4. Inconformada com essa decisão, a apelante interpôs recurso de revista, invocando a respetiva admissibilidade tanto ao abrigo do art.629º, n.2, alínea d), como do art.672º, n.1, alínea c) do CPC – revista excecional. Nas suas alegações formulou as seguintes conclusões: «A) Surgem as presentes alegações no âmbito do recurso de Revista de prazo reduzido, e interposto, ao abrigo dos arts. 629º nº 2 alinea d) e 672º nº 1 alinea c) do CPC do douto acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra com a referência ...28 datado de 23.01.2023, o qual confirmou o despacho recorrido da primeira instância que por sua vez efetuou a fixação da remuneração variável da administradora de insolvência sem clara aplicação de forma de cálculo estabelecida na Lei 9/2022 de 11 de janeiro, em claro prejuízo da recorrente e com o que a recorrente se continua a não poder conformar. B) Nomeada a administradora judicial, nos termos do artigo 52º do CIRE, não só tem direito à remuneração fixa prevista no art. 23º nº 1 do Estatuto do Administrador Judicial, como igualmente à remuneração variável relativa ao resultado do produto da liquidação da Massa Insolvente paga a final – art. 29º n.º5 igualmente do EAJ. C) Conforme dispõe o art. 62º do CIRE, o Administrador de Insolvência procede ao pagamento das custas, sendo a partir daí fixado o montante de retribuição variável, e esta fixação, ou cabe ao administrador de insolvência, quando notificado expressamente para o propor, ou oficiosamente ao Tribunal. D) No caso concreto, a retribuição variável foi proposta pela aqui recorrente a coberto do requerimento com a referência ...19 de 06.07.2022 em que, para além do cálculo da remuneração variável, determinava também a majoração da remuneração variável em função dos créditos satisfeitos, majoração essa feita nos termos do n.º 7 do art. 23º do Estatuto dos Administradores Judiciais, pela aplicação da percentagem de 5% ao montante dos créditos satisfeitos, tal como resulta da Lei n.º 9/2022 de 11 de janeiro. E) A proposta da recorrente foi desconsiderada pelo Tribunal de 1ª Instância e confirmada pelo Tribunal da Relação, tendo sido efetuada a sua fixação em função exclusiva do cálculo realizado pelo próprio tribunal, o qual porém, não foi efetuado no estrito cumprimento da Lei 9/2022 em vigor à data desse cálculo, porquanto o cálculo exposto no douto despacho recorrido e confirmado pelo douto acórdão da Relação em Recurso foi concretizado, começando por fazer uma operação não prevista na redação do art. 23º n.º 7 do estatuto do EAJ introduzida pela Lei 9/2022. F) Especificando, o tribunal de 1ª instância e o acórdão recorrido determinaram o valor dos créditos satisfeitos de €149 833,09 e dividiram esse valor dos créditos satisfeitos pelos créditos reconhecidos, obtendo uma pretensa taxa de satisfação de 40,00%, não imputando, tal como define a Lei nova, a percentagem de 5% diretamente aos créditos satisfeitos, de acordo com o referido art. 23º nº 7 do EAJ, ou seja, a partir do valor de €149 833,09, mas fê-lo a partir do valor não previsto na lei de €59.933,24 que correspondia à aplicação da pretensa taxa de 40,00%, obtida da divisão dos créditos reconhecidos pelos créditos satisfeitos, só aplicando a taxa de 5% a esse valor final. G) Esta forma de cálculo é artificiosa e não aquela que resulta diretamente do art. 23º nº 7 do EAJ, em que o valor da majoração é calculado, em função do grau de satisfação dos créditos reclamados e admitidos, em 5% do montante dos créditos satisfeitos, nada mais a Lei acrescentando. H) Neste enquadramento, sustenta sucessivamente o despacho e o acórdão recorridos que o cálculo da remuneração variável se mostra elaborado em conformidade com o estabelecido no artigo 23º, nºs 4, alínea b), 6 e 7, do EAJ, na redacção dada pela Lei 9/22, de 11/01, tal não acontecendo, pois o cálculo elaborado no despacho recorrido utiliza uma forma de cálculo que não se encontra prevista na Lei, ou seja, obtém a percentagem dos créditos satisfeitos sobre os créditos reconhecidos, que a Lei não prevê, e aplica esta percentagem à remuneração variável obtida antes da majoração. I) A forma de cálculo expressa no processo e apresentada à recorrente não tem qualquer fundamento no decurso da plena vigência da Lei 9/2022 de 11 de janeiro, constituindo uma clara violação de lei, face ao que determina o art. 12º do CC, sendo certo que, na situação concreta, o acórdão recorrido foi mais longe, tentando sustentar-se em que a Lei nova manteve o critério estabelecido na Lei antiga quanto ao grau de satisfação dos créditos em relação aos que haviam sido reclamados e admitidos entendendo que o cálculo da remuneração se mostrava elaborado de acordo com a lei nova, quando assim não acontece pois por isso nem se justificava a alteração legal. J) É facto novo para aplicação da Lei nova o cálculo da remuneração variável dentro do que estabelece o art. 23º nº 7 do EAJ, o qual determina tão só e singelamente a majoração, em função do grau de satisfação dos créditos reclamados e admitidos, em 5% do montante dos créditos satisfeitos, pelo que o cálculo apresentado no despacho recorrido e confirmado pelo douto acórdão recorrido, deveria ter tido unicamente em conta a percentagem em função do valor dos créditos satisfeitos, tal como é previsto no atual art. 23º nº 7 do EAJ. L) Visa a ratio legis do novo critério legal e a partir do resultado da liquidação incentivar a sua remuneração em função dos créditos satisfeitos, sendo a Lei 9/2022, claramente aplicável aos processos pendentes na data da sua entrada em vigor, esse entendimento tem de ser abrangente para a majoração da remuneração variável estipulada em 5% por tal lei. M) O acórdão recorrido, ao manter a efetivação de tal cálculo com a aplicação da percentagem de 5% incidente entre a diferença dos créditos satisfeitos sobre os créditos reconhecidos e não a aplicação direta de tal percentagem aos créditos satisfeitos, está, não só a fazer um despropositado juízo de valor, como a violar claramente o art. 12º do CC, o art. 10º da Lei 9/2022 de 11 de janeiro e ainda, e principalmente, a nova redação dos arts. 23º e 29º nº 8 do Estatuto dos Administradores Judiciais, o que motiva o presente recurso. N) No douto acórdão recorrido e conforme já se alegou e consta no respetivo sumário é decidido que terá sido mantido o critério estabelecido em relação ao grau de satisfação dos créditos, majorando a remuneração de 5% da percentagem de créditos satisfeitos aos que haviam sido reclamados e admitidos. O) Em sentido contrário, milita o douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 20/09/2022, no processo nº 9849/14.6T8LSB – E.L1, proferido pela 1ª Secção de Comércio o qual, por unanimidade e como acórdão fundamento, acordou que “a redacção dada pela Lei 9/22, de 11 de Janeiro, ao artigo 23º do Estatuto do Administrador Judicial, é de aplicação imediata nos processo pendentes; sempre que a fixação da remuneração variável ocorra após a entrada em vigor do diploma deve ser calculada nos termos da nova redacção do mesmo”. P) Acrescenta em consequência que não pode considerar-se a fixação da remuneração variável como um efeito de atos processuais anteriores, constituindo antes um ato processual necessário para chegar ao apuro do montante final a distribuir pelos credores e ao fim do processo como ato a praticar necessariamente antes do rateio final, pelo que a remuneração variável do Administrador da Insolvência deverá ser fixada à luz da redação dada pela Lei 9/2022 na versão alterada por aquela lei que determina o calculo de tal remuneração na percentagem sobre o grau de satisfação de créditos e não em relação aos que haviam sido reclamados e admitidos. Q) Verifica-se assim que, e para efeitos do art. 629º nº 2 alinea d) do CPC, existe uma clara contradição entre o acórdão da Relação de Coimbra aqui recorrido e o anterior acórdão da Relação de Lisboa aqui citado, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, não cabendo recurso ordinário do acórdão recorrido em função da alçada, sendo essa contradição patente quando o acórdão recorrido mantém o critério estabelecido em relação ao grau de satisfação dos créditos em função dos que haviam sido reclamados e admitidos e o acórdão fundamento do Tribunal da Relação de Lisboa determina que o cálculo de tal remuneração é na percentagem sobre o grau de satisfação de créditos e não em relação aos que haviam sido reclamados e admitidos, o que se subsume claramente à alinea d) do nº 2 do 629º e à alinea c) do nº 1 do art. 672º do CPC, para além da violação que se explanou na conclusão M) supra das presentes alegações. Nestes termos e nos mais de direito, deve o presente recurso ser admitido como fixação e definição jurisprudencial pelo Supremo Tribunal de Justiça, bem como ser julgado procedente e provado e, por via dele ser fixada jurisprudência no sentido da definição de que o cálculo da remuneração variável e respetiva majoração, devida ao administrador de insolvência, pelos critérios do art. 23º do Estatuto do Administrador Judicial, com as alterações introduzidas pela Lei 9/2022 de 11/01, respeita à percentagem sobre o grau de satisfação de créditos e não em relação aos que haviam sido reclamados e admitidos.»
5. Distribuídos os autos no STJ e prefigurada a inadmissibilidade da revista, foram as partes notificadas, nos termos do art.655º do CPC, para se pronunciarem. 6. Em resposta, a recorrente veio reiterar o seu entendimento de que o recurso de revista seria admissível independentemente do valor da sucumbência. 7. Em 09.05.2023, foi proferida decisão singular, nos termos do art. 652º, n.1, alínea h) do CPC (ex vi do art.17º do CIRE), que julgou findo o recurso por não haver que conhecer do seu objeto. 8. Contra essa decisão, a recorrente apresentou reclamação, pugnando pela intervenção da Conferência. Sustentou a sua pretensão, em síntese: «por a não admissão do recurso não ter tido minimamente em conta o disposto nos artigos 629º nº 2 alínea d) e 671º nº 1 alínea c) do CPC, e ter-se limitado a não admitir o recurso por aplicação exclusiva do art. 629º nº 1 do CPC, por remissão errónea do art. 14º do CIRE, bem como por entender que o recurso interposto não tinha alçada (…)»
* II. FUNDAMENTOS 1. A questão da admissibilidade da revista 1.1. Pretende a recorrente-reclamante que a Conferência se pronuncie sobre o acerto da decisão singular que não admitiu o recurso de revista, dela discordando por entender que terá sido feita errada aplicação da lei de processo. Pode, desde já, afirmar-se que não assiste razão à reclamante na sua pretensão de ver revogada a decisão reclamada. Efetivamente os argumentos invocados pela reclamante para justificar a admissibilidade do recurso encontram-se cabalmente respondidos nessa decisão, a qual seguiu a jurisprudência que reiteradamente tem sido proferida pelo STJ sobre a matéria em causa.
1.2. É o seguinte o teor da decisão reclamada: «1.1. A recorrente sustentou a admissibilidade do recurso, tanto nos termos do art.629º, n.2, alínea d), como do art.672º, n.1, alínea c) do CPC, ou seja, enquanto revista excecional. 1.2. Sendo a decisão recorrida um acórdão proferido num processo de insolvência, tem aplicação o art.14º do CIRE, e não as hipóteses previstas no art.629º, n.2, alínea d) e no art.672º, n.1, alínea c) do CPC, como a jurisprudência do STJ tem reiteradamente entendido. Nestes termos, como foi comunicado à recorrente, nos termos da notificação a que respeita o art.655º do CPC, corrigiu-se oficiosamente a errada qualificação do recurso, o qual não será tramitado como revista excecional, nem como revista baseada no art.629º, n.1, alínea d) do CPC, mas sim como revista específica prevista no art.14º do CIRE.
1.3. Porém, como a jurisprudência do STJ tem unanimemente decidido, o recurso previsto no art.14º do CIRE, porque é um recurso ordinário, não prescinde da prévia verificação dos pressupostos gerais de recorribilidade, previstos no art.629º, n.1 para os recursos ordinários, como decorre do art.627º, n.2 do CPC (ex vi do art.17º do CIRE), nomeadamente do valor da ação e da sucumbência. Estabelece o art.629º, n.1 que: «O recurso ordinário só é admissível quando a causa tenha valor superior à alçada do tribunal de que se recorre e a decisão impugnada seja desfavorável ao recorrente em valor superior a metade da alçada desse tribunal (…)» Nos termos do art.44º da Lei n.63/2013 [Lei de Organização do Sistema Judiciário], em matéria cível, a alçada do Tribunal da Relação é de 30.000,00 Euros. 1.4. Constata-se que à presente causa foi atribuído valor superior ao da alçada da Relação. Todavia, o acórdão recorrido não foi desfavorável à recorrente em mais de 15.000 Euros. Efetivamente, ainda que o acórdão recorrido tivesse interpretado e aplicado o n.7 do art.23º do Estatuto do Administrador Judicial no sentido defendido pela recorrente, o valor da majoração por ela pretendido seria de 7.507,03 Euros, em vez dos 2.996 Euros que a decisão recorrida lhe atribuiu, por ser esse o resultado da aplicação dos 5% diretamente ao montante dos créditos satisfeitos. 1.5. Constata-se, assim, que faltando o necessário valor da sucumbência, falha um requisito geral de recorribilidade exigido pelo art.629º, n.1 do CPC (aplicável ex vi do art.17º do CIRE), pelo que a revista não pode ser admitida. Este tem sido o entendimento constante do STJ. Vejam-se, por exemplo, os sumários dos seguintes acórdãos: - Ac. do STJ, de 27.02.2018 (relatora Ana Paula Boularot), no processo 1747/17.8T8ACB-A.C1.S1: «Independentemente da ocorrência de oposição jurisprudencial, têm de estar verificados concomitantemente os demais requisitos gerais processualmente exigíveis nesta sede, v.g. o do valor, tendo em atenção o disposto no artigo 629º, nº1 do CPCivil, aplicável por força do artigo 17º, nº1 do CIRE, o qual a conter-se dentro da alçada do Tribunal da Relação impede a impugnabilidade em sede de Revista.»[1] - Ac. do STJ, de 24.04.2018 (relatora Ana Paula Bouralot), no processo n. 3429/16.9T8STS-B.P1.S1: « (…) independentemente da ocorrência de eventual oposição de Acórdãos, não se podem descartar os requisitos gerais processualmente exigíveis nesta sede impugnativa, nomeadamente o do valor, que se não verifica no caso sub judice, circunstância essa que, precisamente, obstou ao recebimento do recurso em primeiro grau, face ao disposto no artigo 629º, nº1 do CPCivil, aplicável por força do artigo 17º, nº1 do CIRE, o qual impede a impugnabilidade ora suscitada, pois o valor da sucumbência é manifestamente inferior ao da alçada deste Supremo Tribunal (como era inferior a metade do da alçada do Tribunal de primeira instância).»[2]
- Ac. do STJ, de 17.07.2018 (relatora Ana Paula Boularot), no processo n. 608/17.5T8GMR-B.G1.S1: «O mencionado ínsito legal – 14º do CIRE - consagra um regime especial no que toca aos recursos interposto em processo de insolvência. Contudo, tal regime especial não afasta os demais requisitos legais gerais processualmente exigíveis, máxime o da alçada, aludido no artigo 629º, nº1 do CPCivil, aplicável ex vi do disposto no artigo 17º, nº1 do CIRE e isto porque embora o artigo 14º, nº1 do CIRE não faça qualquer referência ao valor da causa, tem-se entendido que aqui se aplicam subsidiariamente as regras processuais gerais ex vi do artigo 17º, nº1 do CIRE»[3]
- Ac. do STJ, de 27.02.2018 (relator Fonseca Ramos), no proc. n.10411/15.1T8VNF.G1.S1: «A decisão proferida em processo de insolvência com o valor de €2.000 não é passível de recurso de revista – art.14º, n.1 e 17º, n.1 do CIRE, e 629º, n.1 do CPC» - Ac. do STJ, de 19.06.2018 (relator Henrique Araújo), no proc. n.4426/16.0T8OAZ.P1.S2: «O recurso de revista interposto nos termos do art.14º, n.1 do CIRE não prescinde da verificação dos requisitos gerais de admissibilidade do recurso, entre os quais o do valor da causa. Não cabe recurso do acórdão da Relação para o STJ se o valor da ação foi fixado em €5.000,01, que é valor inferior à alçada do tribunal recorrido.»
1.6. Consagrando o art.14º do CIRE um critério especial de admissibilidade do recurso de revista (e não prescindindo da prévia verificação dos pressupostos gerais de recorribilidade), é óbvio que se encontra afastada a possibilidade de aplicação do art.629º, n.2, alínea d) do CPC, bem como a possibilidade de aplicação da revista excecional prevista no art.672º, n.1, alínea c) do CPC, contrariamente ao defendido pela recorrente.
1.7. Sobre a não aplicação do art.629º, n.2, alínea d) do CPC aos processos de insolvência veja-se, por exemplo: - Acórdão do STJ, de 18.09.2014 (relatora Maria dos Prazeres Beleza)[4], no proc. n. 1852/12.7TBLLE-C.E1.S1: «A justificação para a previsão do art. 629.º, n.º 2, do NCPC (2013) é a de garantir que não fiquem sem possibilidade de resolução conflitos de jurisprudência verificados entre acórdãos das Relações em matérias que nunca podem vir a ser apreciadas pelo STJ, como é o caso das decisões proferidas nos procedimentos cautelares, mas já não dos processos de insolvência.»
1.8. E poderá acrescentar-se que os requisitos gerais de admissibilidade dos recursos ordinários previstos no n.1 do art.629º também teriam aplicação caso o presente recurso caísse no âmbito do art. 629º, n.2, alínea d), pois (diferentemente das outras 3 alíneas desse número) nessa hipótese tem de estar verificado o valor da causa e da sucumbência, como a jurisprudência e a doutrina têm reiteradamente entendido. Veja-se, neste sentido, por exemplo, Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta, Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, página 754; e a jurisprudência aí citada.
1.9. E o mesmo se diga quanto à aplicação do art.629º, n.1 à revista excecional, pois como a doutrina e a jurisprudência do STJ têm unanimemente entendido a revista excecional só é admissível se o valor da causa for superior à alçada da Relação e a sucumbência ultrapassar metade desse valor[5]. Veja-se, por exemplo: Acórdão do STJ, de 24.11.2020 (relator Henrique Araújo), no proc. n. 36/18.5T8PVZ.P1-A.S1: «Só pode haver revista excepcional se os pressupostos gerais da revista normal (tempestividade, legitimidade e relação entre o valor da acção e a alçada) estiverem preenchidos.»
1.10. A título meramente lateral, sempre se pode informar que a matéria sobre a qual versa a substância do recurso, ou seja, a interpretação do art.23º, n.7 do EAJ, já foi alvo de jurisprudência do STJ, concretamente da 6ª Secção, à qual pertence a competência especializada em matéria de insolvência, pronunciando-se em sentido diverso daquele que é sustentado pela recorrente no presente recurso, como se pode ver pelo acórdão proferido em 18.04.2023, no processo n. 3947/08.2TJCBR-AY.C1.S1, publicado no site: www.dgsi.pt[6] DECISÃO: Assim, nos termos do artigo 652º, n.1 alínea h), ex vi do artigo 679º do CPC e do artigo 17º do CIRE, julga-se findo o recurso por não haver que conhecer do seu objeto.»
** 1.3. A reclamante insiste na tese de que basta a existência de oposição de acórdãos para que a revista seja admissível, sendo irrelevante o valor da alçada ou da sucumbência. É manifesto que não lhe assiste razão. Basta uma leitura atenta da fundamentação da decisão reclamada e dos vários acórdãos do STJ sobre a matéria, que naquela decisão são convocados, para perceber que a sua tese não tem qualquer fundamento legal nem acolhimento jurisprudencial. Em situações semelhantes à dos presentes autos, de recursos interpostos por outros administradores de insolvência (e até com base nos mesmos acórdãos fundamento), para apreciação da mesma questão substantiva, o critério de admissibilidade da revista seguido pelo STJ tem sido um só: se os requisitos gerais de admissibilidade dos recursos, previstos no art.629º, n.1, nomeadamente o valor da causa e da sucumbência, se encontram preenchidos e se a oposição de acórdãos existe: as revistas são admitidas (sendo, depois, decididas por acórdão ou por decisão singular); se falhar algum dos referidos pressupostos: as revistas são rejeitadas. É o que se verifica no presente recurso. Falha um dos pressupostos gerais de recorribilidade: precisamente, a sucumbência. Assim, pelas razões que foram claramente expostas na decisão reclamada, a presente revista nunca poderia ser admitida.
*
DECISÃO: Pelo exposto, acorda-se em indeferir a reclamação, confirmando a decisão reclamada. Custas pela recorrente-reclamante.
Lisboa, 28.06.2023
Maria Olinda Garcia (Relatora) Ricardo Costa António Barateiro Martins
umário, art.o 663, n.o 7, do CPC.
_______________________________________________
[3] http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/d6667637fa04c688802582c80050749d?OpenDocument&Highlight=0,exonera%C3%A7%C3%A3o,do,passivo,restante [4] http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/4df750fe9b4a7dc480257d57005ca200?OpenDocument [6] http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/f34907e46eeccf1680258996002ab8f1?OpenDocument |