Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
46/03.7TBVNG.P1.S1
Nº Convencional: 2ª SECÇÃO
Relator: MARIA DA GRAÇA TRIGO
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL
MUDANÇA DE DIRECÇÃO
MUDANÇA DE DIREÇÃO
EXCESSO DE VELOCIDADE
ALCOOLEMIA
CONDUÇÃO EM ESTADO DE EMBRIAGUEZ
CONCORRÊNCIA DE CULPAS
INFRACÇÃO ESTRADAL
INFRAÇÃO ESTRADAL
RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA
SEGURADORA
PEDIDO
CÁLCULO DA INDEMNIZAÇÃO
Data do Acordão: 07/05/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA PARCIALMENTE A REVISTA DA DD E NEGADAS AS DEMAIS
Área Temática:
DIREITO CIVIL – DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / FONTES DAS OBRIGAÇÕES / RESPONSABILIDADE CIVIL / RESPONSABILIDADE POR FACTOS ILÍCITOS / RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA.
Doutrina:
- Dario Martins de Almeida, Manual de Acidentes de Viação, 3.ª Edição, Almedina, Coimbra, 1987, p. 279.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGO 497.º, N.º 1.
Sumário :
I - É de confirmar a ponderação feita pelo acórdão recorrido quanto à contribuição causal de ambos os condutores dos veículos para o sinistro – no caso de 70% para o condutor do veículo AM e de 30% para o condutor do veículo XQ – quando resulta dos factos ter sido a manobra irregular de mudança de direcção para a esquerda executada pelo condutor do veículo AM a principal causa da colisão dos dois veículos, sendo que o excesso de velocidade do veículo XQ também contribuiu – mas em menor medida – para a ocorrência do embate e para as consequências do mesmo.

II - Tendo ficado ainda provado que “A circunstância de o condutor do XQ apresentar a descrita TAS de 0,74 g/l concorreu para a velocidade que imprimiu à marcha da viatura”, não se pode concluir, sem mais, que o excesso de velocidade do veículo XQ contribuiu para a ocorrência do acidente e dos danos na mesma medida que a grave violação das regras estradais pelo condutor do veículo AM.

III - Sendo o evento lesivo gerador de responsabilidade civil unitário (colisão entre os veículos AM e XQ, sendo subsequentemente o veículo XQ projectado sobre um terceiro veículo) e havendo mais do que uma seguradora responsável, é aplicável o regime da solidariedade previsto no art. 497º, nº 1, do Código Civil, salvo se outra solução resultar do peticionado pelos AA..

Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça




1. AA e BB intentaram, em 30/12/2002, acção declarativa, sob a forma processo ordinário, contra Companhia de Seguros CC, S.A., a que foi atribuído o nº 46/03.7TBVNG (processo principal).

Pediram a condenação da DD, S.A.. a pagar à A. BB a quantia de € 83.375,00 e ao A. AA a quantia de € 59.875,12, ambas acrescidas de juros de mora desde a citação até efectivo pagamento.

Fundamentam a sua pretensão nos danos decorrentes de acidente de viação em que foram intervenientes o veículo XQ-...-..., propriedade de seu filho, EE, e por este conduzido, e o veículo automóvel ligeiro de passageiros ...-...-AM, conduzido por FF, a quem imputam a responsabilidade pela ocorrência do acidente, por ter efectuado manobra de direcção à esquerda, cortando a linha de trânsito do condutor do veículo XQ, que veio a falecer em consequência das lesões sofridas no embate.

A DD, S.A.. contestou, imputando exclusivamente à conduta culposa do condutor do veículo XQ a eclosão do embate, por circular a velocidade superior a 100 Km/hora, sob o efeito de álcool, impugnando parte dos danos invocados e arguindo a falsidade parcial da participação do acidente junta com a petição. Mais invoca que, no processo-crime que correu termos por virtude do acidente em causa nos autos e em que era arguido o condutor do veículo AM, foi proferido despacho de arquivamento. Concluiu pela improcedência da acção com a sua absolvição do pedido

Os AA. replicaram, concluindo como na petição inicial.


O Instituto de Solidariedade e Segurança Social deduziu pedido de reembolso, com fundamento em sub-rogação legal, pedindo a condenação da R. Companhia de Seguros DD, S.A.. no pagamento da quantia de € 1.500,12, paga ao A. AA a título de auxílio de despesas de funeral, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data da citação até integral e efectivo pagamento.

A DD, S.A.. sustentou a improcedência do pedido, por não ser imputável ao seu segurado a responsabilidade pelo acidente.


Foi determinada a apensação a este processo das acções nº 586/04.0TBVNG, n.º 3125/04.0TBVNG e n.º 835/04.5TBVNG, todas das Varas Mistas de ….


II. Apenso A (anterior processo nº 586/04.0TBVNG):

GG intentou, em 14/01/2004, acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra Companhia de Seguros CC, S.A. e Companhia de Seguros HH, S.A.

Pediu a condenação solidária das RR. no pagamento da quantia de € 12.912,44, a título de danos patrimoniais, e de € 19.000,00, a título de danos morais. Fundamentou a sua pretensão nos danos para si decorrentes do acidente de viação atrás referido, que envolveu também o veículo BM, que circulava no sentido sul-norte, na retaguarda do veículo AM, e no qual o veículo XQ foi embater depois do embate no veículo AM, imputando a culpa do acidente a ambos os condutores: do veículo XQ, por circular a velocidade não inferior a 90km/hora e com uma TAS de 0,74 g/l, e do veículo AM, por circular distraído e ter efectuado repentinamente a mudança de direcção à esquerda, sem se certificar do trânsito que se fazia sentir, considerando ter sido o condutor deste veículo o principal culpado.

A R. Companhia de Seguros CC, S.A. contestou, descrevendo o acidente nos termos em que o fez na contestação apresentada no processo principal, concluindo como aí que a culpa se deveu exclusivamente ao condutor do veículo XQ. Quanto aos danos impugnou por desconhecimento a sua extensão e natureza, reputando, de todo o modo, como exageradas as verbas peticionadas. Concluiu pela improcedência da acção e pela sua absolvição do pedido.

A R. Companhia de Seguros HH, S.A. contestou, imputando a responsabilidade do acidente ao condutor do veículo AM, que efectuou a manobra de direcção à esquerda de forma repentina e invadindo a hemifaixa direita de rodagem, tendo em conta o sentido de marcha do veículo XQ. Impugnou, por desconhecimento, os danos invocados, reputando exageradas as quantias peticionadas. Concluiu pela improcedência da acção e pela sua absolvição do pedido.

O Instituto de Solidariedade e Segurança Social deduziu pedido de reembolso, com fundamento em sub-rogação legal, pedindo a condenação das R. DD, S.A. e HH, S.A. no pagamento da quantia de € 1.278,92, por si paga ao A. GG a título de subsídio de doença no período de 03/11/2001 a 04/04/2002, com juros de mora até ao efectivo reembolso.

Ambas as RR. contestaram o pedido de reembolso, concluindo pela sua improcedência.


III. Apenso B (anterior processo nº 3125/04.0TBVNG):

II intentou, em 06/04/2004, acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra Companhia de Seguros CC, S.A. e Companhia de Seguros HH, S.A.

Pediu a condenação das RR., na proporção das respectivas responsabilidades, a pagar-lhe a quantia global de € 70.879,78, acrescida de juros de mora desde a citação até efectivo e integral pagamento, bem como a quantia, a liquidar em execução de sentença, relativa às despesas e danos que venham ainda a ocorrer em consequência do acidente dos autos. Fundamentou a sua pretensão nos danos para si decorrentes do acidente de viação atrás referido, descrevendo a dinâmica do acidente em termos semelhantes à descrição constante da petição inicial apresentada pelo A. GG, com a ressalva de invocar que o condutor do veículo XQ circulava a velocidade de cerca de 50 km/hora e que o condutor do veículo AM circulava a velocidade não inferior a 90 km/hora. 

As RR. DD e HH contestaram, fazendo-o no que respeita à dinâmica do acidente nos termos das contestações apresentadas, respectivamente, no processo principal e no apenso A. Quanto aos danos impugnaram, por desconhecimento. Concluíram pela improcedência da acção e pela sua absolvição do pedido.


III-. Apenso C (anterior processo nº 835/04.5TBVNG)

JJ intentou, em 23/01/2004, acção declarativa sob a forma de processo ordinário, contra Companhia de Seguros CC, S.A. e Companhia de Seguros HH, S.A.

Pediu a condenação solidária das RR. a pagarem-lhe a quantia de € 14.840,00 a título de danos patrimoniais e de € 35.000,00 a título de danos morais. Fundamentou a sua pretensão nos danos para si decorrentes do acidente de viação atrás referido, descrevendo a dinâmica do acidente em termos semelhantes à descrição constante da petição inicial do A. GG, invocando ainda que o condutor do veículo XQ circulava a velocidade não superior a 50 km/hora.

Ambas as RR. contestaram, fazendo-o no que respeita à dinâmica do acidente nos termos das contestações apresentadas no apenso A. Quanto aos danos impugnaram, por desconhecimento, e a R. DD, S.A.. alegou que a única sequela para o A. decorre das cicatrizes na face, minimizadas pela cirurgia plástica, sem qualquer sequela funcional. Concluíram pela improcedência da acção e pela sua absolvição do pedido.


Elaborou-se despacho saneador, procedeu-se à selecção da matéria de facto assente e da que constituiria a base instrutória (que incluiu a factualidade oportunamente inserida na selecção da matéria de facto efectuada no apenso A), que foi objecto de reclamação por parte da R. CC, S.A., a qual foi indeferida.

Procedeu-se a julgamento, que se iniciou em 17/10/2014, na vigência do Código de Processo Civil aprovado pela Lei 47/2013, de 26 de Junho, obedecendo a sua tramitação e tramitação subsequente ao disposto neste diploma.

Em 05/05/2017 foi proferida sentença, de fls. 1055, que decidiu:

     “  julgar a ação principal e as ações apensas parcialmente procedentes e os pedidos de reembolso efectuados pelo ISSS totalmente procedentes, e, em conformidade:

1) Absolver a Ré Companhia de Seguros HH, SA dos pedidos formulados pelos Autores GG, II, JJ e do pedido de reembolso efectuado Instituto de Solidariedade e Segurança Social da quantia paga a título de subsídio de doença ao Autor GG.

2) Condenar a Ré Companhia de Seguros CC, SA, a pagar:

A) A cada um dos Autores AA e BB a quantia de 59 625,00 (cinquenta e nove mil seiscentos e vinte e cinco euros) - num total de 119 250,00 € (cento e dezanove mil duzentos e cinquenta euros) -, ambas as quantias acrescidas de juros de mora desde a citação até efectiva e integral pagamento, à taxa legal anual de 4%.

B) Ao Autor GG a quantia de 22 781,56 € (vinte e dois mil setecentos e oitenta e um euros e cinquenta e seis cêntimos), acrescida de juros de mora desde a citação até efectiva e integral pagamento, à taxa legal anual de 4%.

C) Ao Autor II a quantia de 70 889,79 (setenta mil oitocentos e oitenta e nove mil euros e setenta e nove cêntimos), acrescida de juros de mora desde a citação até efectiva e integral pagamento, à taxa legal anual de 4%, bem como as quantias, a liquidar futuramente, para ressarcimento das despesas, perdas e danos que venham a ocorrer decorrentes das lesões sofridas no acidente dos autos.

D) Ao Autor JJ a quantia de 21 434,00 € (vinte e um mil quatrocentos e trinta e quatro euros) acrescida de juros de mora desde a citação até efectivo e integral pagamento, à taxa legal anual de 4%.

E) Ao Instituto de Segurança e Solidariedade Social a quantia de 1 500,12 € (mil quinhentos euros e doze cêntimos paga ao Autor AA a título de auxílio de despesas de funeral de seu filho EE;

F) Ao Instituto de Segurança e Solidariedade Social a quantia de € 1 278,92 (mil duzentos e setenta e oito euros e noventa e dois cêntimos) paga ao Autor GG a título de subsídio de doença.”


O A. GG apelou, pedindo que o montante indemnizatório por danos morais fosse aumentado de € 12.000,00 para € 18.000,00.

   O A. JJ apelou, pedindo que o montante indemnizatório por danos futuros fosse aumentado de € 9.000,00 para € 11.500,00 e o montante indemnizatório por danos morais fosse aumentado de € 12.000,00 para € 22.000,00.   

A R. DD – Companhia de Seguros, S.A. (anteriormente designada Companhia de Seguros CC, S.A.), também recorreu, pedindo a modificação da decisão relativa à matéria de facto e a reapreciação da decisão de direito.


Por acórdão de fls. 1278 foi a matéria de facto alterada apenas no que ao facto 1.23 respeita. A final foi proferida a seguinte decisão:

“Julga-se a apelação da Ré DD parcialmente procedente e também parcialmente procedente o recurso do A JJ e improcedente o recurso do GG, consequentemente altera-se a sentença recorrida, nos seguintes termos:

- Condena-se a Ré Companhia de Seguros CC, SA, a pagar a cada um dos AA AA e BB a quantia de € 39 633.75 (trinta e nove mil seiscentos e trinta e três euros e setenta e cinco cêntimos num total de € 79 327,50 (setenta e nove mil trezentos e vinte sete euros e cinquenta cêntimos ), ambas as quantias acrescidas de juros de mora desde a citação até efectiva e integral pagamento, à taxa legal anual de 4%.

- Ao A II a quantia de € 49 622,86 (quarenta e nove mil seiscentos e vinte e dois euros e oitenta e seis cêntimos), acrescida de juros de mora desde a citação até efectiva e integral pagamento, à taxa legal anual de 4%, bem como 70% das quantias, a liquidar futuramente, para ressarcimento das despesas, perdas e danos que venham a ocorrer decorrentes das lesões sofridas no acidente dos autos,

- Ao A JJ a quantia de 23 434,00€ (vinte e três quatrocentos e trinta e quatro euros) acrescida de juros de mora desde a citação até efectiva e integral pagamento, à taxa legal anual de 4%.

Ao Instituto de Segurança e Solidariedade Social as quantia de € 1 050, 08 (mil e cinquenta euros e oito cêntimos).

No mais, absolvição da Ré KK (anterior HH) e condenação da R DD na indemnização do A GG e o reembolso do subsídio de doença relativo a este A, mantém-se a sentença recorrida.”


2. Foram interpostos os seguintes recursos para o Supremo Tribunal de Justiça:

Recurso do A. II, que formulou as seguintes conclusões:

“A) O excesso de velocidade imprimido pelo condutor da viatura XQ (cf. ponto 1.23 C12 da matéria de facto provada) não foi, em momento algum, causa adequada, direta ou necessária da produção do acidente descritos nos autos.

B) Sendo, isoladamente ou por si só, um facto perfeitamente INÓCUO, ao nível da produção do acidente descrito nos autos e respetivos danos.

C) Não fora o atravessamento e a invasão, de um modo súbito, inesperado e inopinado, da hemifaixa de rodagem onde circulava a viatura XQ, por parte do condutor da viatura AM (cf. pontos 1.14, 1.16 e 1.17, da matéria de facto considerada provada), NUNCA se teria produzido o acidente descrito nos autos.

D) Na medida que essa manobra constituiu uma absoluta surpresa, para o condutor da viatura XQ (cf. ponto 1.18, da matéria de facto provada).

E) Que não contava com tal imprevidência, por se tratar de uma manobra absolutamente contrária às condições normais de circulação naquele local.

F) Conforme refere a jurisprudência, "o disposto no artigo 24.º, nº 1, do CE «fazer parar o veículo no espaço livre e visível à sua frente» não é aplicável nos casos de surgimento repentino e inopinado de uma viatura que corte a linha de circulação daquele; nenhum condutor está obrigado a prever a imprudência alheia, nem a contar com a negligência ou inconsideração dos outros".

G) Outrossim, "a regra de o condutor dever especialmente fazer parar o veículo no espaço livre à sua frente significa dever assegurar-se de que a distância entre ele e qualquer obstáculo visível é suficiente para o fazer parar em caso de necessidade, regendo especialmente para a circulação de veículos automóveis à sua vanguarda, pressupondo a não verificação de condições anormais ou obstáculos inesperados, sobretudo os derivados da imprevidência alheia".

H) Não se afigura correto, nem principalmente justo, o propósito declarado de reverter ou transferir para outrem, as consequências ou o resultado da claríssima negligência do condutor da viatura AM.

I) Com reflexo ao nível da acentuada diminuição da reparação dos extensos e relevantes danos físicos, suportados pelo recorrente e provocados pela conduta grosseiramente negligente do condutor da viatura AM.

J) Assim sendo, não tendo a conduta do condutor da viatura XQ contribuído para a produção do sinistro descrito nos autos, mostra-se claramente violada a disposição do citado artigo 570.º, nº 1,1ª parte, onde se admite o concurso de culpas apenas e quando tiver havido concurso na produção dos danos.

K) De igual modo, dos presentes autos não resultam factos que permitam concluir que o referido excesso de velocidade, em que incorria a viatura XQ, contribuiu de algum modo para o agravamento dos danos verificados.

L) Ou seja, não se vislumbra que da matéria de facto provada seja possível concluir, com um mínimo de razoabilidade ou de certeza, que os graves [danos] descritos nos autos não teriam ocorrido, caso o embate entre a viatura XQ e AM tivesse ocorrido a velocidade inferior.

M) Sendo que, de acordo com o disposto no artigo 570.º, nº 1, 1ª parte do Código Civil e por força da conjunção "ou" dela constante, o facto culposo do lesado só pode originar a redução ou exclusão da indemnização em caso de concurso na produção ou agravamento dos danos.

N) Caso conclua, como inelutavelmente sucede nos presentes autos, que a contribuição do excesso de velocidade da viatura XQ para produção do evento era improvável ou de verificação rara, a imputação objetiva (pretendida pelo acórdão recorrido) não deverá ter lugar.

O) A adequação deve, por isso, referir-se a todo o processo causal e não só ao resultado, sob pena de um alargamento excessivo da imputação.

P) É imperativo distinguir entre situações de concorrência efetiva de causas e situações de causalidade hipotética, de molde a apurar se o dano, tal como concretamente se verificou, não se teria verificado se não fossem esses termos.

Q) Na medida em que a causalidade hipotética possui uma relevância meramente negativa.

R) Sempre que o agente (in casu, o condutor da viatura AM) tenha criado um risco não permitido, ou aumentado o risco já existente e esse risco conduza à produção do resultado concreto, este deve ser-lhe objetivamente imputado.

S) Afigura-se imperativo concluir que não existiu um nexo de causalidade adequada entre o excesso de velocidade imprimido à viatura XQ, (enquanto fator causal meramente hipotético) e a produção e/ou agravamento dos danos decorrentes do acidente descrito nos autos, conforme entendeu, e bem, a Mma. Juiz do tribunal de primeira instância.

T) Norma jurídica violada pela decisão recorrida: artigo 570.º, nº 1, do Código Civil.

Termos em que (…) deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado, e por via disso ser revogado o acórdão recorrido na parte em que reconheceu ao recorrente o direito ao recebimento de apenas da quantia de € 49.622,86, acrescida de juros de mora computados desde a citação e até efetivo pagamento, a título indemnizatório, bem como de apenas 70% das quantias a liquidar futuramente, para ressarcimento de despesas, perdas e danos que venham a ocorrer decorrentes das lesões sofridas no acidente dos autos, mantendo-se a sentença proferida em primeira instância, que reconheceu ao recorrente o direito ao recebimento da quantia de € 70.889,70, acrescida de juros de mora computados à taxa legal, desde a citação e até efetivo pagamento, bem como ao reembolso da totalidade das quantias a liquidar futuramente para ressarcimento de despesas, perdas e danos que viessem a ocorrer, decorrentes das lesões sofridas”


   A Recorrida DD, S.A.. contra-alegou, pugnando que a questão da repartição da responsabilidade pelo acidente seja resolvida conforme alegado no respectivo recurso de revista.


Recurso dos AA. AA e BB, que formularam as seguintes conclusões:

“1ª - O excesso de velocidade de que vinha animada a viatura XQ não concorreu, como causa adequada, directa ou necessariamente par o deflagrar do acidente em causa nos autos;

2ª - Pois foi o atravessamento da viatura AM que cortou a linha de trânsito por onde circulava o XQ,, que originou a colisão entre as viaturas;

3ª - Não fora a manobra imprevista, surpreendente e escandalosa da manobra de direcção da viatura AM e o acidente nunca se verificaria;

4ª- De igual modo não é possível determinar que o excesso de velocidade do XQ tenha contribuído para o agravamento dos danos verificados;

5ª - Pois não se afirma rigoroso hipoteticamente considerar que a morte do condutor do XQ não se verificaria, caso a viatura circulasse dentro dos limites legais de velocidade;

6ª - Não havendo, por isso, concurso de responsabilidade para a ocorrência do acidente automóvel;

7ª- Concluindo-se, assim, que não existiu nexo de causalidade adequada entre o excesso de velocidade imprimindo à viatura XQ e a produção ou agravamento dos danos decorrentes do acidente automóvel, conforme foi decidido e bem na sentença de 1ª Instância;

8ª - O Acórdão proferida violou as disposições legais contidas no artigo 570º nº 1 do Código Civil.

Pelo que deverá o douto Acórdão ser revogado na parte em que reduziu em 30% a indemnização fixada em 1ª Instância, ressalvando o lapso cometido no somatório dos itens alcançados naquela sentença, reconhecendo aos Recorrentes o direito ao recebimento da quantia total de 113.325,00 € acrescida dos juros vencidos e vincendos.”


Recurso da R. DD, S.A.., que formulou as seguintes conclusões:

“1) O juízo da responsabilidade de cada condutor pela ocorrência do acidente, tem de ser extraído dos factos dados como provados, levando em consideração a actuação de cada condutor em termos da sua (in)adequação às regras estradais - a ilicitude - da intensidade da omissão do dever de cuidado - culpa - e da relação causal de adequação directa entre a concreta condução de cada condutor e os danos verificados e a sua gravidade;

2) Dos factos provados resulta que a ilicitude estradal do condutor do veículo "XQ" é de muito mais elevada gravidade do que a do condutor do "AM", desde logo porque duplamente ilícita, quer no excesso de velocidade que imprimia ao veículo (cerca do dobro da velocidade máxima permitida, pelo menos 90km/h onde o limite máximo era 50Km/h) consubstanciando contra-ordenação muito grave (violação arts. 24°, 25° n.° 1 alíneas a), c), h) e 1) e art. 46.° alínea i) todos do CE);

3) Quer no TAS e 0,74g/l sob influência do qual conduzia o falecido EE em violação do disposto no art.° 81.° do CE e consubstanciando contra-ordenação grave p.p. art.° 145 alinea 1) do C, TAS que comprovadamente, concorreu para a velocidade excessiva que imprimiu ao veículo (facto provado 1.25);

4) Ao invés ao condutor do veículo seguro na recorrente "AM" apenas é imputável uma ambígua e suposta falta de atenção ao efectuar uma manobra de mudança de direcção onde a mesma era permitida e sem que se possa determinar que, face à velocidade do "XQ" e ausência de prova de o mesmo circular com médios, que o condutor do "AM" o pudesse ter avistado a aproximar-se antes de iniciar a manobra;

5) É também indiscutível a maior gravidade da culpa do condutor do "XQ" que tomou a decisão de conduzir depois de ter consumido bebidas alcoólicas que lhe reduziam como reduziram a capacidade de condução e potenciaram o excesso de velocidade, do que a do condutor do "AM" que deu início a uma manobra de mudança de direcção num cruzamento onde a mesma era permitida, e sem que atenta a velocidade do "XQ" se tenha estabelecido em que ponto e momento surgiu no campo visual do condutor do "AM";

6) Tanto mais que, sendo 5,30h em 3 de Novembro em Vila …, onde é sempre noite escura (a alvorada era às 7,08h), mais compreensível se torna a dificuldade em atempadamente se avistar um veículo que vem ao dobro da velocidade permitida no local do escuro sem que esteja provado que vinha com as luzes ligadas, e mais reprovável a postura do condutor que na mesma escuridão se aproxima de um cruzamento sinalizado com passadeiras para peões a uma velocidade pelo menos 40km/h acima do limite máximo previsto;

7) No apuramento da influência do comportamento de cada condutor, considerando as velocidades e tempos de travagem na forma doutamente explicada na página 20 (fls.1297) do acórdão que sendo as distâncias de travagem de 22,41m para uma velocidade de 50km/h e de 58,75m para uma velocidade de 90km/h, mesmo considerando que o "XQ" estaria a 20 /50m quando o "AM" entrou no cruzamento, muito provavelmente o embate não ocorreria, se o "XQ" seguisse a velocidade moderada e travasse o veículo ao aperceber-se da manobra do "AM";

8) Além disso o douto aresto recorrido parte de uma premissa errada no facto 1.18 já que dele não consta a distância a que o condutor inicia a manobra, mas aquela a que o condutor do "XQ" se apercebe que o "AM" já está a executar a manobra;

9) Por isso, a concluir-se pela concorrência de culpas, não tem sustentação nos fundamentos de facto concluir por uma maior responsabilidade do condutor do "AM", do que do do "XQ" na ocorrência do acidente;

10) Em situação muito similar, concluiu o STJ pela proporção de 60/40 desfavorável ao condutor que muda de direcção no Ac. STJ de 31/3/2009, acima citado mas em que a condutora que muda de direcção desobedece a um sinal de "Stop" que se lhe apresenta e o outro condutor em excesso de velocidade, não segue ao dobro da velocidade máxima como acontece no caso em apreço;

11) Sendo certo que em cumprimento do disposto no art.° 8.° n.° 3 do CCiv "Nas decisões que proferir, o julgador terá em consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo, afim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito", deveria o acórdão recorrido ter fixado uma repartição de 50/50 como se fez no recente Ac. STJ 19/1/2017, em obediência à presunção legal do art.° 506.° n.° 2 do CCiv;

12) Mais do que determinar o nexo entre as causas do evento naturalístico em si e o facto voluntário do agente importa é estudar o trajecto da relação causal de cada facto voluntário dos agentes com culpas concorrentes com os danos verificados e sua gravidade;

13) A elevada quantidade de energia dissipada nos dois embates do "XQ", primeiro no "AM" e depois no "BM" com a violência espelhada nas fotografias de fls.936 a 938, bem evidenciadoras de maior violência destrutiva do segundo embate revelam bem o excesso de velocidade do "XQ" foi o principal factor da gravidade dos danos corporais verificados como consequência do acidente;

14) Tal como no aresto acima invocado de 2009, também aqui em relação agora ao condutor do "XQ "pela elevada velocidade com que conduzia, contribuiu também decisivamente para ele, transformando aquilo que poderia ser um acidente de pequena gravidade, num acidente trágico, de enormes proporções." (Ac.STJ.31/3/2009);

15) Deve, por isso, a responsabilidade da recorrente pela reparação dos danos sofridos por todos os autores incluindo os pedidos de reembolso do ISS,IP, ser reduzida a 50% a par da responsabilidade do condutor do "XQ";

16) A obrigação de indemnizar emergente da responsabilidade civil extracontratual é solidária, sendo a obrigação una, mas com pluralidade de sujeitos do lado passivo, ela tem origem e causa no facto ilícito e culposo gerador do dano;

17) No caso dos autos, em que há mais do que uma relação jurídica de responsabilidade civil extracontratual, porque há mais de um facto ilícito e culposo causador de danos, encabeçados por pessoas diferentes, não há solidariedade entre os diferentes sujeitos das diferentes obrigações precisamente porque elas são mais do que uma e autónomas;

18) "A solidariedade passiva só existe quando a mesma obrigação for encabeçada por uma pluralidade de devedores", o que não acontece no caso em apreço em que temos duas obrigações e dois factos voluntários ilícitos, culposos e autónomos, com sujeitos diferentes;

19) E, como há muito se vem entendendo "não há solidariedade passiva de diversos responsáveis, quando os danos derivam de mais que um facto ilícito";

20) Daí que, andou mal o Tribunal recorrido na parte em que não reduziu as indemnizações fixadas a favor dos autores GG e JJ, bem como do pedido de reembolso do ISS,IP, na proporção da responsabilidade imputável ao condutor do "XQ" no âmbito de uma relação jurídica de responsabilidade civil da qual a recorrente não é titular, devendo agora reduzir todas a metade;

21) De qualquer modo, a solidariedade passiva permite ao credor demandar apenas um ou alguns apenas dos devedores e de cada um exigir a prestação integral, mas, a partir do momento em que demanda ambas as RR. afasta o regime da solidariedade já que determina que o Tribunal fixe a responsabilidade de cada um dos condutores, tendo obviamente que, determinar a graduação da responsabilidade de cada uma das partes;

22) E, estes RR. não tendo recorrido da condenação na primeira instância que não foi solidária, mas apenas da ré que o Tribunal entendeu responsável e nessa medida, não podem agora beneficiar de uma solidariedade à qual renunciaram ao não recorrer;

23) A partir do momento em que a aqui recorrente, interpôs recurso de apelação "«a parte que lhe foi desfavorável, na parte em que considera a recorrente como única responsável pela reparação dos danos do acidente, (quando esta, na sua contestação atribui a responsabilidade ao condutor do "XQ"), a decisão absolutória da "HH" é desfavorável à recorrente, logo não transitou em julgado;

24) Ademais, o recurso da aqui recorrente, estende os seus efeitos em benefício também dos AA. prejudicados com a absolvição desta e é oponível à ré "HH" por força do disposto no art° 634.° n.° 2 do CPCiv:

25) Deve por isso ser alterada a decisão proferida no douto acórdão recorrido, reduzindo a condenação da aqui recorrente a apenas metade do valor da indemnização dos danos sorridos por todos os autores, bem como dos pedidos de reembolsos do ISS, IP, condenando a recorrida HH na outra metade ressalvado o caso dos AA. AA e mulher que estão fora da cobertura daquele;

26) Violou, assim, a decisão recorrida, o disposto nos art.°s 8° n.° 3, 342°, 483°, 497°, 506°, n.° 2 e 563.° do CCiv e 628° e 634.° n.°2 do CPCiv.

Nestes termos e nos mais de direito, deve ser concedida a revista e, consequentemente, alterar-se o acórdão recorrido, de modo a condenar-se a aqui recorrente apenas em metade das indemnização fixadas para os danos de todos os autores no processo principal e apensos, bem como dos pedidos de reembolso do ISS, IP, revogando-se a condenação solidária quanto aos RR. GG e JJ”


   A Recorrida KK, S.A. (anterior HH, S.A., contra-alegou, pugnando pela manutenção do acórdão recorrido e, subsidiariamente, formulando pedido de ampliação do objecto do recurso, concluindo:

“1. Para a hipótese de o recurso da ré vir a ser julgado, ainda que em parte, procedente - o que apenas se admite para efeitos do presente raciocínio - importa referir que a absolvição da ora recorrida sempre se imporia, já que, a responsabilidade pela ocorrência do acidente pertenceu em exclusivo ao condutor do AM.

2. Na verdade crê a ora recorrida que, face à factualidade que vem dada como demonstrada, o Tribunal a quo andou mal, ao considerar que o condutor do XQ também contribuiu, ainda que em menor medida, para a ocorrência do acidente.

3. Apesar de ter resultado provado que o condutor do XQ infringiu o limite de velocidade prescrito para o local, o certo é que, para se poder afirmar que o excesso de velocidade foi causal do acidente, necessário seria que se tivesse demonstrado que se o XQ circulasse a 50 km/h o acidente não se teria dado.

4. Ora, está provado que o condutor do AM mudou subitamente de direcção à sua esquerda, sem antes ter parado o veículo que tripulava e numa altura em que o XQ se encontrava a uma distância compreendida entre os 20 e os 50 metros, obstruindo-lhe a sua linha de marcha.

5. Para o condutor do XQ - que vê uma viatura a circular normalmente em sentido contrário - não era minimamente previsível que o condutor do AM fosse dar início a uma manobra de mudança de direcção à esquerda.

6. À velocidade de 50km/hora, um veículo necessita de, pelo menos, 29 metros para se imobilizar. (vide simulador do site da Prevenção Rodoviária Portuguesa)

7. De acordo com a factualidade vertida no ponto 1.18 dos Factos Provados, é possível que o condutor do AM tenha mudado de direcção à esquerda numa altura em que o XQ se encontrava a 20 metros de distância, hipótese essa mais provável em face do teor dos depoimentos prestados pela testemunha LL e pelo autor JJ, que referiram que maio AM mudou de direcção à esquerda, logo se aperceberam da inevitabilidade da colisão.

8. Assim, ainda que o XQ circulasse a 50 km/h, isso não excluiria a ocorrência do acidente.

9. Nesta hipótese, face à exiguidade da distância, era absolutamente defeso ao condutor do AM iniciar uma marcha que o colocasse em rota de colisão com qualquer outro veículo que viesse a circular na E.N. 1, circulasse ele a 50 ou a 90 quilómetros por hora.

10. Nesta situação, a velocidade de 90 quilómetros por hora é inócua para efeitos de desencadear a produção do acidente, pois o evento só se torna possível e ocorre, porque o condutor do AM não o imobilizou no eixo da via, nem aguardou a passagem do XQ, como era seu estrito dever e movimentou o veículo para o interior da hemifaixa de rodagem destinada ao trânsito que se processa em sentido contrário.

11. Não foi a velocidade imprimida ao XQ que pôs em marcha o acidente, sendo que quer o veículo circulasse a 50 ou a 90 quilómetros por hora, em qualquer caso era absolutamente proibido ao condutor do AM obstruir a sua via, sem que antes o mesmo passasse.

12. Por outro lado, não era previsível para o condutor do XQ que o AM fosse mudar de direcção à esquerda, sendo certo que só a previsibilidade do embate impõe que seja tomada alguma acção destinada a evitá-lo.

13. Em face do que se deixou dito, impõe-se concluir não ser possível estabelecer um nexo de causalidade adequada entre a velocidade imprimida ao XQ e a ocorrência do acidente.

14. Do mesmo modo, também não se demonstrou nos autos que os danos que sobrevieram aos autores se tenham ficado a dever ao excesso de velocidade que era imprimida ao XQ.

15. A este propósito não pode olvidar-se que, no momento do embate, quer o XQ, quer o AM - que não parou antes de mudar de direcção - encontravam-se em circulação, pelo que as lesões sofridas pelos autores foram potenciadas pelas velocidades de ambas as viaturas.

16. De todo o modo, como se deixou referido, nada nos autos induz a ideia de que as lesões sofridas pelos autores se tenham ficado a dever à velocidade imprimida ao XQ.

17. Em suma, tendo em conta a dinâmica do acidente dada como provada, necessária se torna a conclusão de que a única causa adequada do acidente dos autos reside na temerária e contravencional conduta do condutor do AM.

18. Deverá, assim, ser revogada a decisão do Tribunal a quo e substituída por outra que, estabeleça que a responsabilidade pela eclosão do acidente se ficou a dever única e exclusivamente à actuação do condutor do AM.

19. Em face de tudo quanto se deixou dito, deverá ser mantida, na íntegra, a decisão de absolvição da ora recorrida dos pedidos que contra si vêm dirigidos, assim se fazendo justiça!

20. O Tribunal recorrido violou o disposto nos artigos 342.°, 483.°, 487 e 563.° do C. Civil.”


3. Tendo as acções apensadas sido propostas antes de 01/01/2008, e a decisão da Relação sido proferida em 11/01/2018, o regime recursório é o que resulta da norma do nº 1 do art. 7º, da Lei nº 41/2013, de 26 de Junho, que dispõe: “Aos recursos de decisões proferidas a partir da entrada em vigor da presente lei [1 de Setembro de 2013] em ações instauradas antes de 1 de janeiro de 2008 aplica-se o regime de recurso decorrente do Decreto-Lei nº 303/2007, de 24 de agosto, com as alterações agora introduzidas, com exceção do disposto no nº 3 do artigo 671º do Código de Processo Civil, aprovado em anexo à presente lei.” Aos presentes recursos de revista não se aplica, pois, o obstáculo da dupla conforme, previsto no nº 3, do art. 671º, do CPC.


4. Vem provado o seguinte (mantêm-se a identificação e a redacção das instâncias):

1.1.No dia 3 de Novembro de 2001, pelas 05h30m, ao Km 290,9 da Estrada Nacional nº 1, freguesa de …, concelho de Vila …, ocorreu um acidente de viação no qual foram intervenientes os seguintes veículos:

- Ligeiro de passageiros com a matrícula XQ-...-..., conduzido pelo seu proprietário EE

- Ligeiro de passageiros, com a matrícula ...-...-AM, conduzido pelo seu proprietário FF;

- Ligeiro de passageiros, com a matrícula ...-...-BM conduzido pelo seu proprietário LL.

1.2. O veículo XQ-...-... circulava pela Estrada Nacional nº 1, no sentido Sul-Norte, ou seja, no sentido Lisboa-Porto.

1.3. O veículo XQ-...-... circulava pela hemifaixa direita daquela estrada, atento o seu sentido de marcha.

1.4. Em sentido contrário, ou seja, Norte-Sul, circulava o veículo automóvel com a matrícula …- …-AM.

1.5. Quando assim circulava, o veículo ...-...-AM aproximou-se do cruzamento que a Estrada Nacional nº 1 faz com a Rua da … e Rua R….

1.6. Era intenção do condutor do ...-...-AM efectuar a manobra de mudança de direcção para a sua esquerda e passar a circular na Rua da ….

1.7. Nas proximidades do cruzamento referido em 1.5., existe sinalização luminosa, quer para o trânsito que circula no sentido sul-norte, quer para o trânsito que circula no sentido norte-sul.

1.8. A sinalização luminosa ali existente para os veículos que circulam no sentido norte-sul situa-se a cerca de 22 metros do ilhéu existente no cruzamento referido em 1.5.

1.9. A EN nº 1, no local em que ocorreu o acidente, configura uma recta, antecedida de uma lomba, recta essa de inclinação descendente e com cerca de 175 metros de comprimento até ao cruzamento referido em 1.5., tudo atento sentido sul-norte.

1.10. A cerca de 200 metros do cruzamento existe outra sinalização luminosa e uma placa de sinalização de localidade (…) e a cerca de 100 metros dois sinais de perigo, um com indicação de passagem de peões e outro com indicação de aproximação de cruzamento, tudo atento o sentido Sul-Norte.

1.11. A velocidade máxima permitida no local é de 50 km/hora, atravessando uma localidade.

1.12. No local em que ocorreu o acidente, avista-se a respetiva faixa de rodagem em toda a sua largura, numa extensão de mais de 50 metros.

1.13. A largura da faixa de rodagem, junto aos sinais luminosos que imediatamente antecedem o cruzamento referido em 1.15., atento o sentido norte-sul, era, na altura do acidente, de 9,80 metros.

1.14. O condutor do veículo AM, após chegar ao cruzamento referido em 1.15. iniciou a manobra de direcção à esquerda.

1.15. Na altura estava amarelo intermitente a sinalização luminosa que se lhe deparou, atento o seu sentido de marcha norte-sul.

1.16. O condutor do AM não prestava a devida atenção ao trânsito e à condução e efectuou a referida manobra de mudança de direcção à esquerda sem se certificar previamente que o poderia fazer sem perigo para a condução rodoviária.

1.17. Ao efectuar tal manobra, o condutor do AM invadiu, pelo menos, parcialmente a hemifaixa esquerda da EN nº1, atento o seu sentido de marcha, e cortou a linha de trânsito por onde circulava o XQ.

1.18. O condutor do XQ foi surpreendido pela manobra de mudança de direcção à esquerda do veículo AM na altura em que se aproximava do cruzamento referido em 1.5. e deste se encontrava a uma distância entre 20 a 50 metros.

1.19. O condutor do XQ, ao aproximar-se do cruzamento, deparou-se com o veículo AM ocupando, pelo menos, parcialmente a hemifaixa de rodagem por onde circulava.

1.20. Nas circunstâncias referidas, devido a imprevisto da manobra do condutor do AM, o condutor do XQ não conseguiu evitar o embate deste veículo no veículo AM.

1.21. O embate entre o XQ e o AM ocorreu dentro da hemifaixa de rodagem direita, atento o sentido sul-norte, por onde circulava o XQ.

1.22. O veículo XQ era avistável pelo condutor do AM a cerca de 175 metros de distância do local onde se deu o embate e cerca de 200 metros da sinalização luminosa existente antes do início do cruzamento, atento o sentido norte-sul

1.23. O condutor do XQ circulava a uma velocidade não inferior a 90 km/h. [alterado pela Relação]

1.24. O falecido EE, condutor do XQ, conduzia com uma TAS de 0,74 g/l

1.25. A circunstância de o condutor do XQ apresentar a descrita TAS de 0,74 g/l concorreu para a velocidade que imprimiu à marcha da viatura.

1.26. O embate entre o XQ e o AM ocorreu entre a parte frontal direita do XQ e a parte lateral direita do AM.

1.27. Após o embate, o veículo ...-...-AM foi imobilizar-se já fora da faixa de rodagem da Estrada Nacional nº 1, junto à entrada daquela Rua da ….

1.28. Na sequência do primeiro embate, referido em 1.26., o condutor do XQ perdeu o controlo da sua viatura, após o que foi embater com a sua parte lateral esquerda na frente lateral esquerda da viatura ...-...-BM que, nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar, circulava naquela via no sentido Norte-Sul, na hemifaixa direita, atento o seu sentido de marcha.

1.29. O Autor GG circulava como ocupante, transportado gratuitamente, no interior do veículo ligeiro de passageiros com a matrícula XQ-...-..., tripulado por EE.

1.30. O Autor II, nas circunstâncias de tempo e lugar supra referidas, era um dos passageiros do veículo XQ, juntamente com o condutor do mesmo e outros dois ocupantes.

1.31. O transporte do Autor II era feito por mero favor e cortesia do condutor do veículo XQ, não tendo sido solicitada pelo condutor do XQ, ou paga pelo Autor II, qualquer contrapartida por esse transporte.

1.32. Nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar, o Autor JJ circulava, como ocupante, transportado gratuitamente, no interior do veículo ligeiro de passageiros com a matrícula XQ-...-..., conduzido pelo EE.

1.33. No âmbito do inquérito criminal instaurado devido à morte de EE, em que figurou como arguido FF, condutor do veiculo ...-...-AM, foi proferido despacho de arquivamento – cfr. teor da certidão constante de fls. 63/64, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

1.34. O veículo ...-...-AM à data do acidente tinha uma apólice de seguro automóvel com o nº 65…0, válida e eficaz, garantindo a responsabilidade civil, na Companhia de Seguros CC, SA – cfr. documento constante de fls. 101 que aqui se dá por reproduzido.

1.35. Por escritura outorgada em 10.09.2002, a Companhia de Seguros DD SA incorporou por fusão a Companhia de Seguros MM, S.A., passando a nova sociedade resultante da fusão a designar-se Companhia de Seguros CC, SA, para a qual se transmitiram todos os direitos e obrigações das sociedades fundidas – cfr. a certidão constante de fls. 103/109, cujo teor se dá por reproduzido.

1.36. O proprietário do veículo XQ-...-... havia transferido para a Ré Companhia de Seguros HH SA a responsabilidade decorrente da circulação daquele veículo, mediante contrato de seguro titulado pela apólice 00.0…4.


Danos invocados pelos AA no processo principal.

1.37. Devido à violência do embate, o condutor do veículo XQ-...-..., EE, sofreu várias lesões corporais, nomeadamente lesões traumáticas crânio-encefálicas e raquimedulares que foram consequência directa e necessária da sua morte

1.38. Foi transportado de urgência ao Hospital de Vila… e daí transferido para o Hospital … no Porto, vindo a sucumbir no dia seguinte – cfr. certidão de fls. 26, cujo teor se dá por reproduzido.

1.39. EE nasceu em 21.08.1978, era filho dos Autores AA e BB, e faleceu no estado de solteiro – cfr. certidão de óbito de fls. 25 e assento de nascimento de fls. 26.

1.40. EE faleceu sem deixar testamento ou outros herdeiros para além dos seus progenitores.

1.41. À data do óbito EE vivia com a Autora.

1.42. Nas despesas de funeral do falecido filho, despendeu o Autor AA a quantia de € 1500,12.

1.43. O veículo de matrícula XQ-...-..., que era pertença do falecido, ficou completamente danificado, mostrando-se inviável a sua reparação.

1.44. Tratava-se de um veículo marca Citroen, modelo AX GTI, com o ano de fabrico de 1999 tendo à data do acidente o valor comercial de 1. 750 000,00 €.

1.45. Os Autores eram muito afeiçoados ao filho.

1.46. Sendo este também muito afeiçoado aos Autores.

1.47. A perda do filho constituiu para os Autores um forte abalo psicológico e uma imensa dor.

1.48. O falecido, com as múltiplas lesões corporais ocasionadas pelo acidente, sofreu também enormes padecimentos.

1.49. Uma vez que só veio a sucumbir após horas de sofrimento.


Pedido de Reembolso do ISSS/CNP

1.50. Com base no falecimento do beneficiário 13…2 EE, em consequência do acidente a que dizem respeito os autos, foram requeridas no ISSS/Centro Nacional de Pensões pelo Autor AA o reembolso das despesas de funeral

1.51. Em consequência o ISSS/CNP pagou ao referido AA, a título de auxílio de despesas de funeral, o montante de € 1 500,12.


Danos invocados pelo A GG - APENSO A

1.52. Como consequência e directa e necessária do embate o Autor GG sofreu várias lesões.

1.53. Após o embate, o Autor GG foi transportado numa ambulância para o Centro Hospitalar de Vila …, onde deu entrada no respectivo serviço de urgência.

1.54. Apresentando traumatismo craniano e torácico, ferida cortocontusa do couro cabeludo na região occipital, escoriações nos flancos, derrame pleural à direita e fractura de 1/3 médio da clavícula.

1.55. Acabando por ter alta no dia 16 de Novembro de 2011.

1.56. No referido Hospital, o Autor GG foi imobilizado em relação à fractura da clavícula e posteriormente observado na consulta externa, tendo tido alta da consulta externa em 21.02.2002.

1.57. O Autor, era à data do acidente, e é, serralheiro da construção civil, e este seu trabalho exige esforços acrescidos com os membros superiores.

1.58. O Autor GG apresenta, como sequelas das lesões sofridas, fractura da clavícula esquerda consolidada com calo deformante e moderado encurtamento, e continua com dor persistente ao nível do 1/3 médio da clavícula esquerda.

1.59. Tais sequelas, definitivas e irreversíveis, determinam que o Autor GG esteja afectado de uma incapacidade parcial permanente geral fixável em 5%, que implica esforços suplementares para o exercício da sua profissão e são causa de dano estético fixável em grau 1 numa escala de 1 a 7.

1.60. O Autor GG auferia à data do acidente o vencimento base mensal ilíquido de 399,04 €.

1.61. O Autor GG esteve de baixa por doença directa desde 3.11.2001 até 4.04.2002.

1.62. O Autor GG era e é beneficiário do Instituto de Solidariedade e Segurança Social – Centro Distrital do Porto com o nº 13…5.

1.63. A título de subsídio de doença, o Autor GG recebeu da Segurança Social, no período de 3.11.2001 a 4.04.2002, o montante de 1 278,92€.

1.64. Tendo perdido a título de perdas salariais (descontado já o recebido do ISSS) a quantia de € 716,28.

1.65. Desde o acidente até à data da propositura da acção o Autor pagou de taxas moderadoras, pelo menos, o montante de € 8,99 e a título de meios complementares de actos terapêuticos e consultas o montante de 76,24 €.

1.66. Na sequência do acidente, o Autor ficou com a roupa e calçado que envergava destruídos.

1.67. Aquando do embate o Autor viveu momentos de dor e de medo, pensando que ia morrer.

1.68. Quer no hospital, quer em causa, o Autor sofreu dores, sendo o quantum doloris fixável no grau 3 numa escala de 1 a 7.

1.69. Sendo que ainda hoje sente dores, na mudança de temperatura.

1.70. Dores que agravam quando faz esforços, o que acontece diariamente pois continua a exercer a sua profissão de serralheiro da construção civil.

1.71. Desde o internamento o Autor foi-se submetendo a vários exames e tratamentos, tais como entubação nasogástrica, algaliação, vários RX e vários TAC, e foi ingerindo medicamentos vários.

1.72. O Autor ficou internado e acamado durante 13 dias, dependendo, nesse período, de terceiros para assegurar a sua higiene pessoal e estando privado do convívio normal com seus familiares e amigos.

1.73. Tais factos causaram ao Autor tristeza.

1.74. Em razão do acidente o Autor sofreu traumatismo dentário, que foi tratado com a colocação de prótese dentária.

1.75. O Autor GG nasceu em 29.07.80


Danos invocados pels A II  - Apenso B

1.76. Na sequência do sinistro referido, o Autor II sofreu ferimentos.

1.77. O custo de todos os tratamentos fisiátricos realizados até à data da propositura da ação pelo A II foram suportados pela Ré CC, SA;

1.78. No dia 3 de Novembro de 2001, o Autor II deu entrada nos serviços de urgência do Hospital S…), tendo ficado internado.

1.79. Nessa data apresentava as seguintes lesões:

- traumatismo craneo-encefálico (TCE) de que resultou hematoma epicraneano parietal esquerdo e duvidoso foco de contusão hemorrágica frontal esquerda

Traumatismo cervical;

Rotura extra-peritoneal da bexiga;

Traumatismo do rim esquerdo (grau I);

Traumatismo da bacia, com fractura luxação do sacro à esquerda e factura dos ramos isqueopúbico bilateral;

Paresia do nervo ciático poplíteo externo à esquerda

1.80. Foi transferido em 22 de Novembro de 2001 para o Hospital Militar …, do qual teve alta em 9 de Julho de 2002.

1.81. Durante esse período temporal, o Autor foi submetido a diversas intervenções cirúrgicas e hospitalares para correcção de vários danos e traumatismos sofridos, designadamente, em 2.06.02, por apresentar litíase endoviscal, foi submetido a litotrícia endovisical.

1.82. As lesões referidas causaram ao Autor II incómodos e dores, que se prolongaram várias semanas após o sinistro, tendo estado algaliado durante um mês, sendo o quantum doloris fixável no grau 5 numa escala de 1 a 7.

1.83. Na altura do acidente teve a sensação de morte iminente, facto que lhe causou medo e angústia.

1.84. Durante várias semanas, o Autor teve insónias e pesadelo, onde revivia o acidente, e dores e incómodos, o que tudo lhe causou angústia e sofrimento.

1.85. Em consequência das lesões sofridas no acidente, o Autor II claudica da perna esquerda, que ficou 2 cm mais curta que a perna direita, e, apresenta, ainda, as seguintes sequelas no membro inferior esquerdo: amiotrofia marcada dos gémeos e amiotrofia moderada da coxa, atrofia dos nadegueiros esquerdos com hipostetesias dos mesmos e da face lateral e posterior da coxa, limitação articular da coxa-femural (anca), nomeadamente na rotação externa.

1.86. O Autor II apresenta ainda, em consequência das lesões sofridas no acidente, disfunção da articulação sacro - ilíaca esquerda, desvio escoliótico lombar por báscula e assimetria da bacia, dor à apalpação lombar no 1/3 inferior e no sacro e cicatriz viciosa e deformante, iniciando-se na região lombar esquerda a nível de 1.1. e prolongando-se distalmente para a região nadegueira esquerda, com 23 cm de comprimento e 2 cm de largura, vertical e em Sitálico, resultante de cirurgia de fractura-luxação do saco.

1.87. O Autor II apresenta também lesão no nervo ciático poplíteo externo (sequelas de paresia), com pé pendente e uso de tala peronal.

1.88. Em consequências das lesões sofridas no acidente e suas sequelas, o Autor II ficou afectado de uma incapacidade permanente geral de 45%, que, em termos de rebate profissional limitam uma escolha profissional futura, nomeadamente profissões que exijam esforços físicos ou condução automóvel prolongada.

1.89. O Autor teve entretanto de suportar outras operações cirúrgicas directamente relacionadas com as lesões sofridas no acidente.

1.90. No mês de Julho de 2003 teve de sofrer uma intervenção cirúrgica de urgência relacionada com complicações urológicas e renais entretanto surgidas, no decorrer da qual foi aplicada ao Autor um Cateter Uretral à direita em Duplo I.

1.91. Essa intervenção cirúrgica e tratamentos hospitalares e medicamentos com a mesma conexos, resultaram numa despesa para o Autor no montante de 144. 503$00, equivalente a 720,78 €.

1.92. Na mesma altura, o Autor despendeu a quantia de € 100,00 com a realização de Rx pulmonar, exigido para os referidos tratamentos clínicos.

1.93. Em ecografia, realizada em 22 de Dezembro de 2003, foram diagnosticados ao Autor 3 cálculos no húmen da bexiga, sendo um de 19 mm, um de 13 mm, e outro de 10 mm.

1.94. Em Janeiro de 2004, o Autor despendeu a quantia de 59,00 € com a realização de uma consulta de tratamento de Litotricia na urgência do Hospital da Universidade de ….

1.95. Em 6 de Fevereiro de 2004, fez uretrocistoscopia, consistente na extracção de cateter Duplo I e Litotrícia de cálculos vesicais e nova colocação de cateter Duplo J á direita.

1.96. Numa segunda sessão de Litotrícia foi-lhe retirado o cateter Duplo J, por sucesso terapêutico do cálculo renal.

1.97. Tais intervenções implicaram internamento no serviço de urologia do Hospital Distrital de … de 5 a 9 de Fevereiro de 2004.

1.98. As complicações clínicas supra descritas tiveram origem nas lesões sofridas pelo Autor no acidente dos autos, uma vez que tais lesões provocaram danos graves nos rins e bexiga do Autor, que degeneraram e implicaram a necessidade de implantação do referido Cateter Uretral à direita em Dulo J e a realização das descritas cirurgias.

1.99. É previsível o desenvolvimento precoce de alterações artróticas a nível lombar sacrolombar e da bacia e a possibilidade de hérnia discal lombar, além de futuras complicações do foro renal e da bexiga.

1.100. O que implicará dispêndio de mais quantias pecuniárias com internamentos hospitalares, tratamentos médicos e medicamentosos e fisiátricos e é susceptível de originar incapacidade para o trabalho, com a consequente perda de rendimentos provenientes da actividade profissional que o Autor estiver a desempenhar, bem como despesas com deslocações, assim como é susceptível de implicar um agravamento da incapacidade permanente parcial geral de que está afectado.

1.101. Antes do acidente o Autor era um jovem cheio de vigor e alegria de viver.

1.102. Encontrava-se em excelente condição física e praticava regularmente desporto.

1.103. Na sequência do sinistro e das complicações físicas e clinicas de que padece, o Autor II ficou impedido de fazer esforços físicos associados a qualquer prática desportiva regular, tem dificuldade em correr e em subir e descer escadas, sente dores se permanecer muito tempo na posição de pé.

1.104. Sofre perdas de equilíbrio, dores e incómodos na perna esquerda, dores na bacia e nas costas, particularmente com as mudanças de temperatura e no tempo mais frio.

1.105. Sente-se física e psicologicamente diminuído, sendo o prejuízo de afirmação pessoal quantificável no grau 3 numa escala de 1 a 5 e prejuízo sexual fixável em grau 2 numa escala de 1 a 5, tendo ficado ainda com dano estético fixável no grau 4 numa escala de 1 a 7.

1.106. O Autor teve de realizar tratamentos fisiátricos durante vários meses.

1.107. Em consequência das lesões sofridas e suas sequelas, internamentos, tratamentos e incapacidades que determinaram, o Autor padeceu e padece angústias e sofrimentos que irão prolongar-se por toda a sua vida.

1.108. O Autor II nasceu em 9 de Setembro de 1981.


Danos invocados pelo A JJ - Apenso C

1.109. Em consequência directa e necessária do acidente, o Autor JJ sofreu várias lesões.

1.110. Após o embate, o Autor JJ foi transportado numa ambulância para o Centro Hospitalar de Vila …, onde deu entrada no serviço de urgência.

1.111. Apresentava lesões cortocontusas na face e couro cabeludo, tendo sido efectuada sutura de duas feridas extensas: frontoparietal esquerda e lábio superior, respectivamente com 7-8 cm e 4 cm.

1.112. Apresentava também traumatismo torácico, de que resultaram externamente equimoses e edema da região peitoral direita.

1.113. O Autor ficou internado tendo tido alta hospitalar em 7 de Novembro de 2011.

1.114. O Autor fez uma cirurgia consistente em plastia do lábio superior em 17.12.2002 no HPP - … - …, através da companhia de seguros DD.

1.115. O Autor apresenta actualmente as seguintes cicatrizes:

No crânio: cicatriz, localizada na metade esquerda da região frontal, estendendo-se do terço superior da fronte até ao couro cabeludo, por 8 cm, linear, oblíqua; cicatriz estendendo-se da extremidade externa da sobrancelha esquerda até à região superior da orelha, linear, horizontal de 7 cm;

Na face: várias cicatrizes localizadas na região perioral: transversal, estendendo-se da comissura labial esquerda até à região inferior da asa do nariz homolateral, linear, com 3,5 cm; cicatriz de forma aproximadamente estrelada com cerca de 1 por 1 cm de maiores dimensões; área com vários vestígios cicatriciais, localizada infero-lateralmente ao terço lateral direito do lábio inferior, com 1,5 por 1 cm de maiores dimensões.

1.116. O Autor apresenta ainda, em consequência das lesões sofridas no acidente, dismorfia na metade esquerda do lábio superior, o que faz com que ambos os hemilábios esquerdos se toquem quando em repouso, o que lhe causa desconforto.

1.117. O Autor apresenta dor na palpação sobre a face anterior do terço superior do hemitórax direito e sobre o terço superior da região esternal e dor esporádica na região dorsal, que se acentuam quando faz esforços.

1.118. À data do acidente o Autor exercia a actividade de pintor da construção civil, actividade e que exige esforços com os membros superiores, auferindo o salário mínimo nacional então vigente.

1.119. Em razão do acidente, o dente 2.1. acusava mobilidade, verificando-se fractura horizontal da raiz, apresentando hoje dor nesse dente associada a temperatura de alimentos que ingere.

1.120. As sequelas para o Autor decorrentes das lesões sofridas no acidente determinam que esteja afectado de uma incapacidade permanente parcial geral fixável em 4 pontos.

1.121. O Autor esteve incapacitado para o trabalho durante, pelo menos, 30 dias, deixando de auferir qualquer montante (q. 72º, artº 33º e 34º da pi apenso C).

1.122. Na sequência do acidente, o Autor ficou com a roupa, calçado e acessórios destruídos.

1.123. Aquando do embate, o Autor viveu momentos de dor e de medo, pensando que ia morrer.

1.124. Quer no hospital, quer em casa, o Autor foi sofrendo dores.

1.125. Desde o internamento, o Autor foi-se submetendo a vários exames e tratamentos, tais como algaliação, vários RX e vários TAC e ainda uma anestesia.

1.126. Ingerindo medicamentos vários.

1.127. O Autor ficou acamado durante 4 dias, dependendo de terceiros no internamento para assegurar a sua higiene pessoal e estando privado do convívio normal de família e amigos

1.128. Tais factos causaram ao Autor tristeza

1.129. Em 23.04.03 o Autor recorreu ao SU do Centro Hospitalar de Vila … por colecção abcedada do lábio superior, que foi drenada .

1.130. O Autor sente-se diminuído e triste por virtude das cicatrizes acima referidas em 1.115., as quais são visíveis e irreversíveis e lhe causam dano estético no grau 4 numa escala de 1 a 7 .

1.131. O Autor JJ nasceu em 9 de Agosto de 1981.


2. FACTOS NÃO PROVADOS:

Quanto à dinâmica do acidente:

2.1. À data do acidente, o pavimento encontrava-se em bom estado de conservação.

2.2. O falecido EE, condutor do XQ, seguia atento à circulação rodoviária, em tudo quanto exceda o que consta de 1.17 a 1.20.

2.2. O condutor do XQ apercebeu-se apenas a cerca de 15/20 metros da manobra de mudança de direcção do veículo ...-...-AM a ocupar-lhe a hemifaixa de rodagem por onde circulava, tendo-se provado o que consta de 1.17 a 1.19.

2.3. Quanto ao alegado no artº 16º da pi do PP (q. 7º), provou-se o que consta de 1.20 supra.

2.4. Quanto ao alegado no art 10º da resposta no pp (quesito 8ºA), provou-se o que consta de 1.22.

2.5. O condutor do XQ circulava a uma velocidade de cerca de 50 km/hora.

2.6. [eliminado]

2.7. O falecido EE, condutor do XQ, circulava a uma velocidade superior a 100 Km/hora.

2.8. O condutor do AM circulava a velocidade não inferior a 90 Km/hora.

2.9. No local existia placa a assinalar a velocidade máxima de 50 Km/hora, tendo-se provado o que consta de 1.11.

2.10. No local onde ocorreu o acidente, a faixa de rodagem tem a largura de 9,80 metros tendo-se aprovado apenas o que consta de 1.13.

2.11. O condutor do veículo AM antes de iniciar a manobra de direcção à esquerda certificou-se que não se aproximava nenhum veículo em sentido contrário, assinalou a manobra accionando o pisca e aproximou-se do eixo da via

2.12. Vindo co condutor do AM a ser surpreendido pelo veículo XQ a surgir a velocidade superior a 100 km/hora, depois da lomba que antecede o cruzamento no sentido de marcha deste veículo.

2.13. De forma que o condutor do AM imobilizou a sua viatura, por antever que, dada a velocidade a que o XQ se aproximava este não conseguiria parar, e de forma a deixar-lhe espaço livre para passar.

2.14. O condutor do XQ, ao verificar que não conseguia imobilizar o seu veículo, tentou desviar-se do AM, perdendo o controle do veículo vindo a embater junto do eixo da via.

2.15. Projectando o veículo AM para junto do passeio onde veio a ficar imobilizado, tendo-se provado apenas o que consta de 1.27.

2.16. Entre o local do embate e o ilhéu existia uma faixa livre e disponível de 3,20 metros de largura no sentido em que seguia o AM.

2.17. Não fora a velocidade que imprimia ao veículo XQ, o falecido EE poderia ter travado sem embater, como seguir marcha uniforme junto à esquerda da sua hemifaixa e prosseguir a marcha sem embater.

2.18 A velocidade que imprimia ao veículo, conjugada com a falta de visibilidade decorrente da lomba, levaram a que o condutor do XQ, ao aproximar-se do cruzamento e ao aperceber-se da presença do veículo AM, travasse e perdesse o controle do seu veículo.

2.19. Sendo que, em virtude da velocidade a que seguia, o condutor do XQ nem sequer se apercebeu da existência do cruzamento e da existência de semáforos no mesmo.

2.20. Quanto ao alegado no artº 29º da contestação Ré DD, provou-se apenas o que consta de 1.25.

Quanto aos danos invocados pelos Autores na petição inicial do processo principal:

2.21. O falecido EE contribuía com a quantia de 50 000$00 para ajuda das despesas domésticas;

2.22. O falecido EE exercia a profissão de motorista, auferindo um salário superior a 500 €.

Quanto aos danos invocados pelo Autor GG no apenso A:

2.23. O Autor GG ficou afectado de uma incapacidade permanente para o trabalho de 8%, tendo-se provado apenas o que consta de 1.59. supra.

2.24. Desde o acidente e até à data da propositura da acção, o Autor, em deslocações em viatura própria, para consultas e exames, despendeu em combustível montante não inferior a 125,00€.

2.25. Quanto ao alegado no 43º da pi do apenso A (q.104º), provou-se apenas o que consta de 1.66., não se tendo provado os concretos valores da roupa e calçado, e que o autor trouxesse consigo relógio e óculos de sol e estes tivessem ficado destruídos.

2.26. Ainda na sequência do acidente, desapareceu o telemóvel do Autor - Nokia 3310, no valor de 150,00€

2.27. Quanto ao alegado no artº 59º da pi apenso A e na contestação da Ré DD, provou-se apenas o que consta de 1.74.

Quanto aos danos invocados pelo Autor II:

2.28. O Autor tenha quebrado a tala implantada na sua perna esquerda e por esse motivo fosse previsível à data da petição a sua sujeição a intervenção cirúrgica.

2.29. Quanto ao alegado no artº 47º da inicial do apenso B provou-se o que consta de 1.99 e 1.100.

Quanto aos danos invocados pelo Autor JJ

2.30.O Autor auferia à data do acidente o vencimento mensal de 500,00€, tendo-se apenas provado o referido em 1.118.

2.31. O Autor esteve incapacitado para o trabalho durante 60 dias (q. 72º), tendo-se apenas provado o constante de 1.121.

2.32. Desde o acidente até à data da propositura da acção, em deslocações, em viatura própria, para consultas, exames e cirurgia o Autor despendeu em combustível um montante nunca inferior a 125,00 €.

2.33. Quanto ao alegado no 37º da pi do apenso C (q.74º), provou-se apenas o que consta de 1.66., não se tendo provado os concretos valores da roupa e calçado, e que o autor trouxesse consigo relógio e óculos e estes tivessem ficado destruídos.

2.34. Ainda na sequência do acidente, desapareceu o telemóvel do Autor - Nokia 3310 - no valor de € 150,00.

2.35. Quanto ao alegado nos artºs 44º e 45º da pi (q. 78º e 79º), provou-se apenas o que consta de 1.117 supra.

2.36. O Autor tem uma deformação óssea no peito, em razão da fractura sofrida no acidente, visível a um metro e que tal dano acompanhará o Autor ao longo da sua vida.

2.37. Deformação que deixa o Autor deprimido e triste quanto se encontra a fazer praia ou na piscina.


5. Tendo em conta o disposto no nº 4, do art. 635º, do Código de Processo Civil, o objecto dos recursos delimita-se pelas conclusões dos mesmos.

Assim, nos presentes recursos, estão em causa as seguintes questões:

Recurso dos AA. AA e BB:

- A conduta do condutor do veículo XQ não constitui causa adequada do acidente e dos danos.

Recurso do A. II:

- A conduta do condutor do veículo XQ não constitui causa adequada do acidente e dos danos.

Recurso da R. DD, S.A..:

- A contribuição causal da conduta do condutor do veículo AM e da conduta do condutor do veículo XQ, repartida na proporção, respectivamente, de 70%e de /30%, deve ser alterada para 50% para cada um dos condutores;

- Não aplicação do regime da solidariedade à responsabilidade da Recorrente;

- Subsidiariamente, abandono do regime de solidariedade pelos AA. GG, JJ e ISS, I.P, ao demandarem ambas as RR. (DD e HH);

- Condenação da R. HH, responsabilizando-a por 50% dos danos de todos os AA., assim como por 50% dos pedidos de reembolso do ISSS, I.P., com ressalva dos AA. AA e mulher que estão excluídos da cobertura do seguro da R. HH.


A questão objecto do pedido de ampliação do recurso pela Recorrida KK, S.A. (anteriormente HH, S.A.) corresponde à questão dos recursos dos AA. AA e BB e do A. II, pelo que não tem autonomia em relação ao âmbito destes recursos.


As questões serão apreciadas segundo a seguinte ordem de precedência:

- Repartição da responsabilidade pelo acidente entre os condutores dos veículos AM e XQ [todos os recursos e ampliação do recurso];

- Não aplicação do regime da solidariedade à responsabilidade da Recorrente [recurso da DD, S.A..];

- Subsidiariamente, abandono do regime de solidariedade pelos AA. GG, JJ e ISSS, I.P, ao demandarem ambas as RR. (DD e HH) [recurso da DD, S.A..];

- Condenação da R. HH, responsabilizando-a por 50% dos danos de todos os AA., assim como por 50% dos pedidos de reembolso do ISSS, I.P., com ressalva dos AA. AA e BB que estão excluídos da cobertura do seguro da HH [recurso da DD, S.A..]


6. Quanto à questão da repartição da responsabilidade pelo acidente entre os condutores dos veículos AM e XQ, relevam os seguintes factos provados:


1.1.No dia 3 de Novembro de 2001, pelas 05h30m, ao Km 290,9 da Estrada Nacional nº 1, freguesa de …, concelho de Vila …, ocorreu um acidente de viação no qual foram intervenientes os seguintes veículos:

- Ligeiro de passageiros com a matrícula XQ-...-..., conduzido pelo seu proprietário EE

- Ligeiro de passageiros, com a matrícula ...-...-AM, conduzido pelo seu proprietário FF;

- Ligeiro de passageiros, com a matrícula ...-...-BM conduzido pelo seu proprietário LL.

1.2. O veículo XQ-...-... circulava pela Estrada Nacional nº 1, no sentido Sul-Norte, ou seja, no sentido Lisboa-Porto.

1.3. O veículo XQ-...-... circulava pela hemifaixa direita daquela estrada, atento o seu sentido de marcha.

1.4. Em sentido contrário, ou seja, Norte-Sul, circulava o veículo automóvel com a matrícula …- …-AM.

1.5. Quando assim circulava, o veículo ...-...-AM aproximou-se do cruzamento que a Estrada Nacional nº 1 faz com a Rua da … e Rua R….

1.6. Era intenção do condutor do ...-...-AM efectuar a manobra de mudança de direcção para a sua esquerda e passar a circular na Rua da ….

1.7. Nas proximidades do cruzamento referido em 1.5., existe sinalização luminosa, quer para o trânsito que circula no sentido sul-norte, quer para o trânsito que circula no sentido norte-sul.

1.8. A sinalização luminosa ali existente para os veículos que circulam no sentido norte-sul situa-se a cerca de 22 metros do ilhéu existente no cruzamento referido em 1.5.

1.9. A EN nº 1, no local em que ocorreu o acidente, configura uma recta, antecedida de uma lomba, recta essa de inclinação descendente e com cerca de 175 metros de comprimento até ao cruzamento referido em 1.5., tudo atento sentido sul-norte.

1.10. A cerca de 200 metros do cruzamento existe outra sinalização luminosa e uma placa de sinalização de localidade (…) e a cerca de 100 metros dois sinais de perigo, um com indicação de passagem de peões e outro com indicação de aproximação de cruzamento, tudo atento o sentido Sul-Norte.

1.11. A velocidade máxima permitida no local é de 50 km/hora, atravessando uma localidade.

1.12. No local em que ocorreu o acidente, avista-se a respetiva faixa de rodagem em toda a sua largura, numa extensão de mais de 50 metros.

1.13. A largura da faixa de rodagem, junto aos sinais luminosos que imediatamente antecedem o cruzamento referido em 1.15., atento o sentido norte-sul, era, na altura do acidente, de 9,80 metros.

1.14. O condutor do veículo AM, após chegar ao cruzamento referido em 1.15. iniciou a manobra de direcção à esquerda.

1.15. Na altura estava amarelo intermitente a sinalização luminosa que se lhe deparou, atento o seu sentido de marcha norte-sul.

1.16. O condutor do AM não prestava a devida atenção ao trânsito e à condução e efectuou a referida manobra de mudança de direcção à esquerda sem se certificar previamente que o poderia fazer sem perigo para a condução rodoviária.

1.17. Ao efectuar tal manobra, o condutor do AM invadiu, pelo menos, parcialmente a hemifaixa esquerda da EN nº 1, atento o seu sentido de marcha, e cortou a linha de trânsito por onde circulava o XQ.

1.18. O condutor do XQ foi surpreendido pela manobra de mudança de direcção à esquerda do veículo AM na altura em que se aproximava do cruzamento referido em 1.5. e deste se encontrava a uma distância entre 20 a 50 metros.

1.19. O condutor do XQ, ao aproximar-se do cruzamento, deparou-se com o veículo AM ocupando, pelo menos, parcialmente a hemifaixa de rodagem por onde circulava.

1.20. Nas circunstâncias referidas, devido a imprevisto da manobra do condutor do AM, o condutor do XQ não conseguiu evitar o embate deste veículo no veículo AM.

 1.21. O embate entre o XQ e o AM ocorreu dentro da hemifaixa de rodagem direita, atento o sentido sul-norte, por onde circulava o XQ.

1.22. O veículo XQ era avistável pelo condutor do AM a cerca de 175 metros de distância do local onde se deu o embate e cerca de 200 metros da sinalização luminosa existente antes do início do cruzamento, atento o sentido norte-sul

1.23. O condutor do XQ circulava a uma velocidade não inferior a 90 km/h. [alterado pela Relação]

1.24. O falecido EE, condutor do XQ, conduzia com uma TAS de 0,74 g/l

1.25. A circunstância de o condutor do XQ apresentar a descrita TAS de 0,74 g/l concorreu para a velocidade que imprimiu à marcha da viatura.

1.26. O embate entre o XQ e o AM ocorreu entre a parte frontal direita do XQ e a parte lateral direita do AM.

1.27. Após o embate, o veículo ...-...-AM foi imobilizar-se já fora da faixa de rodagem da Estrada Nacional nº 1, junto à entrada daquela Rua da ….

1.28. Na sequência do primeiro embate, referido em 1.26., o condutor do XQ perdeu o controlo da sua viatura, após o que foi embater com a sua parte lateral esquerda na frente lateral esquerda da viatura ...-...-BM que, nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar, circulava naquela via no sentido Norte-Sul, na hemifaixa direita, atento o seu sentido de marcha.


O acórdão recorrido apreciou a questão da contribuição causal da conduta dos condutores dos veículos AM e XQ nos seguintes termos:


“I -Se o acidente pode ser imputado a culpa do condutor do AM, segurado na Ré DD ou antes se ao condutor do XQ ou ainda a culpas concorrentes


      Tendo sido julgado improcedente o recurso da matéria de facto, quanto à dinâmica do acidente, apenas com a alteração pouco significativa quanto à velocidade do XQ, subscrevemos a sentença recorrida, quando escreve:

    “O condutor do veículo AM efectuou a manobra de mudança de direcção à esquerda sem se previamente se certificar que o poderia fazer sem perigo para a circulação rodoviária, numa altura em que o veículo XQ se encontrava a uma distância de entre 20 a 50 metros do cruzamento, sendo certo, atento a configuração da estrada no local, o veículo XQ era avistável a cerca 175 metros do local do embate.

Ao proceder de modo descrito, revelou imperícia e desatenção às condições da via e do tráfego, efectuando manobra perigosa, violadora das mais elementares regras de prudência estradal, contrariando frontalmente o disposto os art.ºs 35º, e 44º do Código da Estrada, aprovado pelo DL nº 114/94, de 3 de Maio, com as alterações decorrentes dos DL nº 2/98, 3 de Janeiro e nº 265-A/2001, de 28 de Setembro, em vigor à data do acidente (03.11.2001), que o obrigava a realizar tal manobra por forma a que da sua realização não resultasse perigo ou embaraço para o trânsito.

Face à aproximação do veículo XQ, ao condutor do AM impunha-se que se abstivesse, naquele momento, de efectuar a mudança de direcção à esquerda, e aguardasse a passagem do dito veículo e que a via se encontrasse livre, para então, efectuar a manobra em condições de segurança.

Ao assim não proceder, o condutor do velocípede [rectius: do veículo] actuou de forma descuidada e negligente, omitindo os deveres de cuidado a que estava obrigado, e dando causa ao acidente dos autos.” 


     Decidiu ainda que a culpa na produção do acidente foi exclusiva do condutor do AM, argumentando, em síntese que caso tivesse observado os referidos deveres de cuidado, o veículo XQ, ainda que transitando a velocidade superior à regulamentar, teria passado o cruzamento, circulando pela sua mão de marcha, sem colisão.

      No entanto, não concordamos com este entendimento.

     Como está provado o condutor do veículo XQ circulava em velocidade excessiva, por não inferior a 90 km/h, em violação dos artigos 24º n.º 1 e 27º do Código da Estrada, na redação em vigor à data do acidente, dado tratar-se de um veículo automóvel ligeiro de mercadorias, que não podia exceder, dentro das localidades, a velocidade de 50 km/h.

     Note-se que no caso está expressamente provado que a velocidade máxima permitida no local é de 50 km/hora (cf. 1.11).

Por outro lado, está provado que acerca de 200 metros do cruzamento onde ocorreu a colisão, existe outra sinalização luminosa e uma placa de sinalização de localidade (…) e a cerca de 100 metros, dois sinais de perigo, um com indicação de passagem de peões e outro com indicação de aproximação de cruzamento, atento o sentido Sul-Norte, ou seja, o sentido do XQ (cf. 1.2 e 1.10), o que impunha ao condutor do XQ, que moderasse a velocidade, nos termos do art. 25º n.º 1 als. c), f) e i) do CE.

   O excesso de velocidade do condutor do XQ era nos termos do art. 146º do CE, em vigor, uma infração grave


A sentença recorrida, considera que a velocidade que tinha julgado provada 80/90 km, que alteramos para 90 km/h, não foi causal do embate.

No entanto, estando provado que quando o AM entrou no cruzamento o XQ se encontrava a uma distância entre 20 a 50 m (cf. 1.18) não é possível excluir liminarmente esse nexo de causalidade.

Consultando as tabelas de paragem de veículos, por exemplo a Martins de Almeida, em Manual de Acidentes de Viação, pág. 484 e 485 e de Heitor Consciência, em Sobre Acidentes de Viação e Seguro Automóvel, pág. 164, que ainda não se reportam a travões hidráulicos, se circulasse a 50 km/h poderia evitado o embate, sendo certo que a distância total de paragem para essa velocidade é de 22, 41 m.

Note-se que nessas tabelas circulando a 90km/h a distância total de paragem era de 58,75 m e que um veículo a 90 km/h percorre por segundo 25,01 metros (cf. Martins, de Almeida, obra citada pág. 480) 

Assim, atenta a factualidade apurada é provável que o embate não tinha [tivesse] ocorrido se o condutor do veículo XQ circulasse a velocidade moderada, como era seu dever.

De qualquer forma, a questão da contribuição da conduta culposa do condutor não é relevante apenas quanto à colisão, mas também quanto às suas consequências.

Como é manifesto, as lesões produzidas por um embate são tão mais graves quanto maior é o impacto resultante da velocidade e no caso a velocidade excessiva do condutor do XQ contribuiu seguramente para o posterior embate no outro veículo de marca Volvo e paras as graves consequências do acidente em causa.   

Está também provado que condutor do XQ conduzia com uma TAS de 0.74 g/l, o que era também uma infracção grave (art. 148º do CE). No entanto, apenas se provou que essa TAS superior à permitida, (a 0,50g/l) contribui para a velocidade que imprimiu à marcha da viatura (1.25).

Temos, pois, de concluir que o facto do condutor do OX circular em velocidade excessiva foi também causal do acidente e suas consequências.

Por conseguinte, na ocorrência do acidente e suas consequências, concorreu a culpa de ambos os condutores, do AM e do XQ.

Da factualidade apurada entendemos que o condutor do veículo AM ao efectuar a manobra de mudança de direção à esquerda sem se previamente se certificar que o poderia fazer sem perigo para a circulação rodoviária, numa altura em que o veículo XQ se encontrava a uma distância de entre 20 a 50 metros do cruzamento, quando, atenta a configuração da estrada no local, o veículo XQ era avistável a cerca 175 metros do local do embate, foi mais determinante para a produção do acidente e muito mais perigosa para a circulação do que condutor XQ circular a 90 km/h, quando a velocidade permitida era apenas de 50km/h e se aproximava de um cruzamento, numa altura de reduzido tráfego automóvel (5h. 30m) e de noite.


Deste modo, na graduação de culpas entende-se atribuir 70% ao condutor do veículo AM e segurado da Ré DD e 30% ao condutor do veículo XQ.” [negritos nossos]


Pretendem os AA. Recorrentes (AA e BB; e II) que a conduta do condutor do veículo XQ não constitui causa adequada do acidente nem do agravamento dos danos dele resultantes, sendo a responsabilidade pelo sinistro exclusivamente imputável ao condutor do veículo AM. Inversamente pretende a R. Recorrente, DD, S.A.. que a contribuição causal para o acidente e para os danos seja repartida de forma igual entre os condutores dos veículos XQ e AM.

Vejamos.

Afigura-se correcta a ponderação feita pelo acórdão recorrido quanto à contribuição causal de ambos os condutores dos veículos AM e XQ para o sinistro e para os danos que dele resultaram. Com efeito, sufraga-se o juízo da Relação no sentido de ambos os condutores terem desrespeitado regras estradais, assim como quanto à existência de uma relação de causalidade adequada entre tais violações de deveres legais de cuidado, por um lado, e a ocorrência do acidente e dos danos, por outro. Improcedem, assim, as pretensões dos recursos dos AA. (correspondentes à pretensão da Recorrida KK, S.A., em sede de ampliação do recurso) no sentido de atribuir em exclusivo tal responsabilidade ao condutor do veículo AM.

Verificando-se uma situação de concausalidade, considera-se, porém, tal como o acórdão recorrido, que a conduta ilícita e culposa do condutor do veículo AM (abundantemente provada nos factos 1.14 a 1.22) contribuiu em maior grau para a ocorrência do acidente do que o excesso de velocidade do veículo XQ.

A pretensão da Recorrente DD, S.A.. de repartir igualmente entre um e outro condutor a contribuição causal para o acidente e para os danos por ele causados, assenta em dois argumentos – a interpretação do facto 1.18 e a relevância a atribuir ao facto de o condutor do veículo XQ conduzir com taxa de alcoolemia superior ao legal – que se entende serem de refutar.

Na verdade, tendo sido provado que “A circunstância de o condutor do XQ apresentar a descrita TAS de 0,74 g/l concorreu para a velocidade que imprimiu à marcha da viatura”, não se pode concluir, sem mais, que o excesso de velocidade do veículo XQ contribuiu para a ocorrência do acidente e dos danos na mesma medida que a grave violação das regras estradais por parte do condutor do veículo AM.

Nem tampouco se pode acompanhar a (re)interpretação que a Recorrente DD, S.A.. pretende fazer do facto provado 1.18. Vejamos.

É o seguinte o teor deste facto:

1.18. O condutor do XQ foi surpreendido pela manobra de mudança de direcção à esquerda do veículo AM na altura em que se aproximava do cruzamento referido em 1.5. e deste se encontrava a uma distância entre 20 a 50 metros.


Alega a Recorrente DD, no essencial, que “o douto aresto recorrido parte de uma premissa errada no facto 1.18 já que dele não consta a distância a que o condutor inicia a manobra, mas aquela a que o condutor do "XQ" se apercebe que o "AM" já está a executar a manobra”. Pretende a Recorrente que o facto em causa seja tenha um pendor subjectivo, isto é, entender-se que a distância entre 20 a 30 metros em relação ao cruzamento onde o condutor do veículo AM efectuou a manobra de mudança de direcção, “é estimada quando o condutor se apercebe da manobra e não no momento do início da manobra” (corpo das alegações). Dito por outras palavras, o condutor do veículo XQ apenas se teria apercebido da presença do veículo AM na sua (do XQ) hemifaixa de trânsito, àquela distância, mas teria podido aperceber-se antes, quando se encontrava a uma distância superior.

Compulsado o processado, afigura-se que tal interpretação não pode ser acolhida, uma vez que, da motivação da sentença que fixou o facto 1.18, consta (a fl. 1082) o seguinte:

“Não obstante tal circunstancialismo e a velocidade a que circulava o veículo XQ, face à dinâmica do acidente que se teve como apurada, em resultado da conjugação dos depoimentos de LL e do Autor JJ com os demais elementos de prova atrás referidos, a manobra súbita e repentina do condutor do AM foi a determinante e causal do acidente verificado, ao cortar a linha de trânsito do XQ, na altura em que este se aproximava do cruzamento, não deixando ao condutor do XQ espaço de manobra ou possibilidade de evitar o acidente, que, dada aquela manobra imprevista e súbita sempre teria ocorrido ainda que observada a velocidade regulamentar. A distância a que o veículo XQ se encontrava do cruzamento aquando da mudança de direcção à esquerda do veículo AM resulta da valoração e conjugação destes depoimentos, das características da via e seu traçado, das velocidades dos veículos AM e XQ que se tiveram como apuradas, da distância percorrida pelo veículo AM até ao local do embate, das partes dos veículos que foram embatidas.” [negrito nosso]


Assim, o teor do facto provado 1.18 (“O condutor do XQ foi surpreendido pela manobra de mudança de direcção à esquerda do veículo AM na altura em que se aproximava do cruzamento (…) e deste se encontrava a uma distância entre 20 a 50 metros”) não possui a índole subjectivista que a Recorrente DD nele pretende imprimir, sendo antes um dado objectivo quanto à localização de ambos os veículos. Localização da qual resulta ter sido a manobra irregular executada pelo condutor do veículo AM a principal causa da colisão dos dois veículos. Sendo que, como ajuizou o acórdão recorrido, o excesso de velocidade do veículo XQ também contribuiu – mas em menor medida – para a ocorrência do embate e para as consequências do mesmo (o subsequente embate do veículo XQ num terceiro veículo e os danos sofridos pelo condutor e ocupantes do veículo XQ).

Tanto basta para afastar o regime do nº 2, do art. 506º do Código Civil, não podendo, diversamente do alegado pela Recorrente DD, equiparar-se o caso dos autos a outros casos já decididos em que a repartição das responsabilidades tenha sido diferente, na medida em que estão em causa factualidades distintas.

Conclui-se, assim, pela confirmação da repartição da responsabilidade pelo acidente e suas consequências danosas na proporção de 70% para o condutor do veículo AM e de 30% para o condutor do veículo XQ.     


7. Para a cabal compreensão das demais questões objecto do recurso da R. DD, S.A.., importa ter presente os seguintes dados do processado:


Pedidos

- O pedido dos AA. AA e BB (pais do falecido condutor do veículo XQ) foi dirigido contra a seguradora DD, S.A.. enquanto seguradora do veículo AM;

- O pedido do A. GG (ocupante do veículo XQ) foi dirigido contra a R. DD e contra a R. HH, pedindo a sua condenação solidária;

- O pedido do A. II foi dirigido contra a R. DD e contra a R. HH, pedindo a sua condenação na proporção das respectivas responsabilidades;

- O pedido do A. JJ foi dirigido contra a R. DD e contra a R. HH, pedindo a sua condenação solidária;

- O pedido do ISSS, I.P. de reembolso pela quantia paga ao A. AA foi dirigido contra a R. DD;

- O pedido do ISSS, I.P. de reembolso pela quantia paga ao A. GG foi dirigido contra ambas as RR.


Sentença

Tendo considerado que a responsabilidade pelo acidente e suas consequências é de imputar apenas ao condutor do veículo AM, absolveu a R. HH (seguradora do veículo XQ) e condenou a R. DD (seguradora do veículo AM) a pagar aos AA. a totalidade dos montantes indemnizatórios devidos em função dos danos dados como provados e a reembolsar o ISSS, I.P. da totalidade das quantias pagas aos AA.


Desta decisão apelaram:

- O A. GG pedindo o aumento do montante da indemnização;

- O A. JJ pedindo o aumento do montante da indemnização;

- A R. DD pedindo a alteração da matéria de facto e, em consequência, a atribuição exclusiva da responsabilidade pelo acidente ao condutor do veículo XQ, com a condenação da R. HH, enquanto seguradora do mesmo veículo e a absolvição da R. apelante.


Acórdão da Relação

- Julgou improcedente o recurso do A. GG;

- Julgou parcialmente procedente o recurso do A. JJ, aumentando o montante indemnizatório a atribuir-lhe;

- Julgou parcialmente procedente o recurso da DD, repartindo a responsabilidade pelo sinistro e pelas consequências danosas do mesmo, na proporção de 70% para o condutor do AM e de 30% para o condutor do XQ;

- Em consequência decidiu:

* Reduzir em 30% a indemnização a pagar pela R. DD (enquanto seguradora do veículo AM) aos AA. AA e BB, pais do condutor do veículo XQ, na proporção da culpa deste;

* Reduzir em 30% a condenação da R. DD (enquanto seguradora do veículo AM) a reembolsar o ISSS, I.P. do montante do subsídio de funeral pago ao A. AA, pai do condutor do veículo XQ, na proporção da culpa deste último;

* Manter a condenação da R. DD (enquanto seguradora do veículo AM) a pagar a totalidade da indemnização devia ao A. lesado GG (que peticionou a condenação solidária das RR. seguradoras);

* Manter a condenação da R. DD (enquanto seguradora do veículo AM) a reembolsar o ISSS, I.P. pela totalidade do subsídio de doença pago ao A. GG;

* Tendo aumentado a indemnização devida ao A. lesado JJ, condenar a R. DD (enquanto seguradora do veículo AM) a pagar a totalidade dessa indemnização (uma vez que este A. peticionou a condenação solidária das RR. seguradoras);  

* Reduzir em 30% a indemnização a pagar pela R. DD (enquanto seguradora do veículo AM) ao A. lesado II (por ter este peticionado a condenação das RR. seguradoras na proporção das respectivas responsabilidades);

- Manteve a absolvição da R. HH.


Tendo presente estes elementos, passemos a conhecer das demais questões do recurso da R. DD, a saber:

- Não aplicação do regime da solidariedade à responsabilidade da Recorrente;

- Subsidiariamente, abandono do regime de solidariedade pelos AA. GG, JJ e ISSS, I.P, ao demandarem ambas as RR. seguradoras;

- Condenação da R. HH, responsabilizando-a por 30% dos danos de todos os AA., assim como por 30% dos pedidos de reembolso do ISSS, I.P., com ressalva dos AA. AA e BB, que estão excluídos da cobertura do seguro da HH (questão reformulada em conformidade com a resolução da questão da repartição das responsabilidades pelos condutores dos veículos AM e XQ, nos termos do número 6 do presente acórdão).


8. Quanto à questão da alegada não aplicação do regime da solidariedade à responsabilidade da Recorrente DD, conclui a Recorrente que: “No caso dos autos, em que há mais do que uma relação jurídica de responsabilidade civil extracontratual, porque há mais de um facto ilícito e culposo causador de danos, encabeçados por pessoas diferentes, não há solidariedade entre os diferentes sujeitos das diferentes obrigações precisamente porque elas são mais do que uma e autónomas; "A solidariedade passiva só existe quando a mesma obrigação for encabeçada por uma pluralidade de devedores", o que não acontece no caso em apreço em que temos duas obrigações e dois factos voluntários ilícitos, culposos e autónomos, com sujeitos diferentes; E, como há muito se vem entendendo "não há solidariedade passiva de diversos responsáveis, quando os danos derivam de mais que um facto ilícito"; Daí que, andou mal o Tribunal recorrido na parte em que não reduziu as indemnizações fixadas a favor dos autores GG e JJ, bem como do pedido de reembolso do ISS,IP, na proporção da responsabilidade imputável ao condutor do "XQ" no âmbito de uma relação jurídica de responsabilidade civil da qual a recorrente não é titular (…)”


         Vejamos.

     No caso dos autos, o evento lesivo gerador de responsabilidade civil (colisão entre os veículos AM e XQ, sendo subsequentemente o veículo XQ projectado sobre um terceiro veículo) é unitário pelo que a argumentação da Recorrente não colhe. Assim, se ambas as RR. forem julgadas responsáveis, ser-lhes-á aplicável o regime do art. 497º, nº 1, do Código Civil, sendo a responsabilidade de ambas solidária.

     Porém, para que assim seja, é necessário que, em momento logicamente anterior, tanto a R. DD como a R. HH (actual KK, S.A.) sejam efectivamente responsabilizadas. Nas palavras de Dario Martins de Almeida, citadas pela Recorrente DD no corpo das alegações, a respeito do regime do art. 497º, nº 1, do CC, “Não se diz, neste preceito que, sendo vários os causadores do dano, todos respondem solidariamente; determina-se que, sendo vários os responsáveis pelos danos, será solidária a sua responsabilidade.” (Manual de Acidentes de Viação, 3ª ed., Almedina, Coimbra, 1987, pág. 279).

   Deste modo, conclui-se que, no caso dos autos, havendo pluralidade de responsáveis, se aplicará o regime da solidariedade. Mas que, naturalmente, se houver apenas uma seguradora responsável, será a mesma obrigada a indemnizar apenas na medida da sua responsabilidade.


9. A resolução da questão anterior permite também resolver, em sentido negativo, a questão do alegado abandono do regime de solidariedade pelos AA. GG, JJ e ISSS, I.P, ao demandarem ambas as RR. seguradoras.

   Os AA. GG, JJ e ISSS, I.P., ao demandarem ambas as seguradoras, beneficiarão do regime de solidariedade se as duas RR. forem responsabilizadas. Se apenas o for a R. DD, será esta obrigada a indemnizar na medida da sua responsabilidade, mas não mais.


10. Essencial é pois a questão da possibilidade de condenação da R. HH (actual KK, S.A.), responsabilizando-a (não em partes iguais como pretendia a Recorrente DD, mas em conformidade com a fixação de 30% da contribuição causal para o acidente e os danos ao veículo XQ nela segurado) por 30% dos danos de todos os AA., com ressalva dos AA. AA e BB (pais do condutor do veículo XQ) que estão excluídos da cobertura do seguro da HH; e ainda a questão da condenação da mesma R. HH (actual KK, S.A.) por 30% do pedido ou dos pedidos de reembolso ao ISSS, I.P.

    Trata-se, pois, de determinar se transitou ou não sem julgado a decisão da sentença que absolveu a R. HH (actual KK, S.A.).

     O acórdão recorrido, acolhendo a posição defendida pela R. HH em sede de contra-alegações à apelação da R. DD, resolveu a questão nos seguintes termos:

De referir ainda que não tendo os AA recorrido, da absolvição da R HH, atual KK, relativamente a ela a sentença transitou e, por isso, não obstante se ter julgado que o seu segurado contribuiu para o acidente não é legalmente possível a sua condenação.” [negrito nosso]


Não pode acompanhar-se esta orientação. Ao ter R. DD recorrido da sentença (que, considerando o respectivo segurado único culpado pelo acidente, condenou aquela R. no pagamento da totalidade dos montantes indemnizatórios pelos danos dados como provados, assim como na totalidade dos reembolsos ao ISSS, I.P.), pedindo: (i) que fosse alterada a matéria de facto e a decisão de direito, no sentido de atribuir a responsabilidade pelo sinistro em exclusivo ao condutor do veículo XQ, segurado da HH; (ii) e, consequentemente, que fosse a R. HH condenada no pagamento da totalidade das indemnizações e reembolsos; forçoso é concluir que a decisão de absolvição da R. HH não transitou em julgado com a sentença da 1ª instância.

Com efeito, o efeito pretendido com o recurso de apelação da R. DD – a sua absolvição de todos os pedidos (ou a redução da sua responsabilidade) – é indissociável da pretensão de revogação da decisão de absolvição da R. HH. A R. DD só veria a sua responsabilidade excluída (ou reduzida) se, e na medida, em que a R. HH viesse a ser condenada. Pelo que a apelação da R. DD, S.A.. obstou ao trânsito em julgado da decisão de absolvição da R. HH, S.A.

   Assim sendo: na medida em que a Relação julgou parcialmente procedente a apelação da R. DD, repartindo a responsabilidade pelo acidente e pelos danos por ambos os condutores, na proporção de 70% para o segurado da DD e de 30% para o segurado da HH; na medida em que tal repartição de responsabilidades foi confirmada no número 6 do presente acórdão; na medida em que, como se concluiu nos números 8 e 9 do presente acórdão, havendo mais do que uma seguradora responsável, é aplicável o regime de solidariedade do art. 497º, nº 1, do CC, salvo se outra solução resultar do peticionado por cada um dos AA., conclui-se:

(i) Ser a R. DD responsável pelo pagamento de 70% das indemnizações atribuídas aos AA. AA e BB, pais do condutor do veículo XQ (considerado culpado pelo acidente, na proporção de 30%);

(ii) Ser a R. DD responsável pelo pagamento de 70% do reembolso do subsídio de funeral pago pelo ISSS, I.P. ao A. AA (tendo em conta que o pedido foi fundado em sub-rogação legal e que o condutor falecido foi considerado responsável pelo acidente na proporção de 30%);

(iii) Serem as RR. DD e KK (antiga HH) solidariamente responsáveis pelo pagamento da indemnização, na proporção de 70% para a R. DD e de 30% para a R. KK, atribuída ao A. GG;

(iv) Serem as RR. DD e KK (antiga HH) solidariamente responsáveis pelo reembolso ao ISSS, I.P., na proporção de 70% para a R. DD e de 30% para a R. KK, do montante do subsídio de doença por aquele pago ao A. GG;

(v) Serem as RR. DD e KK (antiga HH) solidariamente responsáveis pelo pagamento da indemnização, na proporção de 70% para a R. DD e de 30% para a R. KK, atribuída ao A. JJ;

(vi) Serem as RR. DD e KK (antiga HH) responsáveis, na proporção respectivamente de 70% e de 30%, pelo pagamento da indemnização atribuída ao A. II, (em conformidade com o peticionado).


11. Pelo exposto julgam-se improcedentes os recursos dos AA. AA e BB e do A. II, assim como a ampliação do recurso da Recorrida KK, S.A. (antiga HH, S.A.), e parcialmente procedente o recurso da R. DD - Companhia de Seguros, S.A., revogando-se parcialmente a decisão do acórdão recorrido e decidindo-se:

a) Manter a condenação da R. DD - Companhia de Seguros, S.A., a pagar a cada um dos AA., AA e BB, a indemnização de € 39.633,75 (trinta e nove mil seiscentos e trinta e três euros e setenta e cinco cêntimos), no total de € 79.327,50 (setenta e nove mil trezentos e vinte sete euros e cinquenta cêntimos), ambas as quantias acrescidas de juros de mora desde a citação até efectivo e integral pagamento, à taxa legal anual de 4%;

b) Manter a condenação da R. DD - Companhia de Seguros, S.A., a reembolsar o Instituto de Solidariedade e Segurança Social, I.P., da quantia de € 1.050,08 (mil e cinquenta euros e oito cêntimos), correspondente a 70% do subsídio de funeral pago ao A. AA;

c) Condenar solidariamente as RR. DD - Companhia de Seguros, S.A., e KK, S.A. (antiga HH, S.A.) a pagar ao A. GG a indemnização de € 22.781,56 (vinte e dois mil setecentos e oitenta e um euros e cinquenta e seis cêntimos), acrescida de juros de mora desde a citação até efectivo e integral pagamento, à taxa legal anual de 4%, na proporção de 70% para a R. DD - Companhia de Seguros, S.A., e de 30% para a R. KK, S.A.;

d) Condenar solidariamente as RR. DD - Companhia de Seguros, S.A., e KK, S.A. (antiga HH, S.A.) a reembolsar o Instituto de Solidariedade e Segurança Social, I.P., da quantia de € 1.278,92 (mil duzentos e setenta e oito euros e noventa e dois cêntimos), correspondente ao subsídio de doença por aquele pago ao A. GG, na proporção de 70% para a R. DD - Companhia de Seguros, S.A. e de 30% para a R. KK, S.A.;

e) Condenar solidariamente as RR. DD – Companhia de Seguros, S.A. e KK, S.A. (antiga HH, S.A.) a pagar ao A. JJ a indemnização de € 23.434,00 (vinte e três mil quatrocentos e trinta e quatro euros), acrescida de juros de mora desde a citação até efectivo e integral pagamento, à taxa legal anual de 4%, na proporção de 70% para a R. DD - Companhia de Seguros, S.A. e de 30% para a R. KK, S.A.;

f) Condenar as RR. DD - Companhia de Seguros, S.A. e KK, S.A. (antiga HH, S.A.) a pagar ao A. II a indemnização de € 70.889,79 (setenta mil oitocentos e oitenta e nove euros e setenta e nove cêntimos), acrescida de juros de mora desde a citação até efectivo e integral pagamento, à taxa legal anual de 4%, bem como as quantias, a liquidar futuramente, para ressarcimento das despesas, perdas e danos decorrentes das lesões sofridas no acidente dos autos, na proporção de 70% para a R. DD - Companhia de Seguros, S.A. e de 30% para a R. KK, S.A.


Custas na acção na proporção do decaimento.

Custas nos recursos dos AA. AA e BB e do A. II pelos Recorrentes.

Custas no recurso da R. DD - Companhia de Seguros, S.A. na proporção de ½ pela Recorrente e de ½ pela Recorrida KK, S.A.


Lisboa, 5 de Julho de 2018


Maria da Graça Trigo (Relatora)

Maria Rosa Tching

Rosa Maria Ribeiro Coelho