Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
06A2589
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: SEBASTIÃO PÓVOAS
Descritores: LIVRANÇA
ACORDO DE PREENCHIMENTO
Nº do Documento: SJ200612140025891
Data do Acordão: 12/14/2006
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA.
Decisão: CONCEDIDA A REVISTA.
Sumário : 1) A obrigação cambiária constitui-se mesmo antes do preenchimento total da livrança, bastando a assinatura de pelo menos um obrigado cambiário, sendo, contudo, fundamento da lide executiva o titulo preenchido, com os elementos do artigo 75 da Lei Uniforme LL.
2) No domínio das relações imediatas - isto é, enquanto a livrança não é detida por alguém estranho às relações extra-cartulares - o executado pode opôr ao exequente a excepção de incumprimento do pacto de preenchimento, geradora de preenchimento abusivo.
3) Como excepção de direito material, o preenchimento abusivo deve ser alegado e provado pelo embargante em processo de embargos de executado, cumprindo ao embargante demonstrar que a aposição de data e montante foram feitas de forma arbitrária e ao arrepio do acordado.
4) O contrato de preenchimento pode ser expresso ou estar implícito no negócio subjacente à emissão do título, podendo ser contemporâneo ou posterior à aquisição pelo exequente.
5) Se o avalista subscreveu o acordo de preenchimento, pode apor ao portador a excepção de preenchimento abusivo, estando o título no âmbito das relações imediatas.
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

O "Empresa-A", intentou execução, para pagamento de quantia certa, contra "Empresa-B" e AA e sua mulher BB, para cobrança da quantia de 55.582970$00, acrescida de juros no montante de 1.659.875$00 e de juros vincendos, crédito titulado por livrança subscrita pela executada sociedade e avalizada pelos 2ºs executados.

Deduziram, os executados, embargos alegando, nuclearmente, o preenchimento abusivo do título.

Na 1ª Instância, os embargos foram julgados improcedentes.

Apelaram os executados, tendo a Relação do Porto julgado os embargos parcialmente procedentes e determinado o prosseguimento da execução para cobrança de 582.970$00 - juros vencidos - e juros vincendos.

O exequente pede revista, assim concluindo:

- O crédito de 55 mil contos foi integralmente utilizado pela subscritora da livrança e ao foi pago.

- No último aditamento, junto pelo embargado como doc 5 à contestação de embargos, na cláusula 2.2 ficou estipulado que os juros remuneratórios seriam liquidados postecipada e mensalmente.

- O contrato de abertura de crédito em conta corrente foi encerrado pelo embargado, com motivo na falta de cumprimento por parte da primeira embargante Empresa-B, por ter deixado de pagar os juros contratuais entretanto vencidos.

- A livrança dada à execução foi subscrita pela embargante Empresa-B e avalizada pelos segundos embargantes, emitida à ordem do Banco embargado e entregue a este, em branco, para garantir e caucionar o cumprimento das obrigações assumidas e emergentes do contrato de abertura de crédito segundo a forma contabilística de conta corrente, celebrado em 1/9/94 e seus aditamentos de 5/7/95, 10/2/97 e 10/2/98.

- E, nos termos do pacto de preenchimento (designadamente cláusula 3ª do doc 5 junto à contestação - aditamento de 10/2/98)

- O Banco ficou autorizado a preencher a livrança caução pelo saldo em divida do capital, juros, demais encargos e despesas, e a fixar-lhe e a inscrever-lhe a data do seu vencimento, caso o contrato não seja pontualmente cumprido, ou os seus valores vencidos e não pagos.

- Verificou-se o não pagamento de juros e a utilização do capital mutuado.

- Ora, o não pagamento de juros significa que o contrato não foi pontualmente cumprido, logo, que se verificou uma das causas que legitima o portador da livrança caução a proceder ao seu preenchimento.

- O pacto de preenchimento, ao referir "caso o contrato não seja pontualmente cumprido" abarca todas as obrigações contratuais, designadamente a obrigação de pagamento de juros, a qual é uma obrigação a prazo certo, nos termos do artº 805º nº2 a) do CC.

- O embargado foi autorizado pelos embargantes a preencher a livrança caução pelas responsabilidades emergentes do financiamento e dos seus aditamentos. Ora, as responsabilidades emergentes do financiamento concedido, abarcam capital, juros e encargos.

- A livrança foi assim preenchida nos termos do acordado no pacto de preenchimento o qual foi celebrado nos termos do artigo 405º do CC.

- Ao que acresce que o não pagamento de uma prestação implica o vencimento das restantes nos termos do artigo 781º do CC.

Contra alegaram os recorridos em defesa do julgado.

A Relação deu por assente a seguinte matéria de facto:

1- Nos autos de acção executiva sob a forma ordinária, para pagamento de quantia certa, intentada pelo "Empresa-A" contra "Empresa-B", AA e mulher BB, para cobrança de 57.242.845$00, foi oferecido como titulo executivo a livrança junta aos autos principais a fls. 7;
2- Na referida livrança consta, no local da importância, a quantia de 55.582.970$00;
3- No local da data de emissão consta 1/9/94, no local do vencimento, 4/4/98, no local da assinatura dos subscritores, nome e morada dos mesmos, a designação "Empresa-B", Rua Manuel Monteiro, ...., 4490, Póvoa de Varzim;
4- No local de pagamento consta a designação "Empresa-A - Póvoa de Varzim";
5- No seu verso consta a assinatura da gerência da subscritora da livrança;
6- Ainda no verso da referida livrança consta "Bom por aval", subscrito por AA e mulher BB;
7- A referida livrança foi entregue ao embargado com a data de vencimento e o montante sem estarem preenchidos;
8- Tal livrança foi subscrita pela embargante "Empresa-B" e avalizada pelos segundos embargantes, emitida à ordem do Banco/embargado e entregue a este em branco, para garantir e caucionar o cumprimento das obrigações assumidas e emergentes do contrato de abertura de crédito segundo a forma contabilística de conta corrente, celebrado em 1/9/94 e os seus aditamentos de 5/7/95, 10/2/97 e 10/2/98;
9- O embargado concedeu à "Empresa-B" um crédito de 10.000.000$00 em 5/7/95, aumentado para 40.000.000$00 e, a partir de 10 de Fevereiro de 1998, para 55.000.000$00, destinado a apoios de tesouraria, pelo prazo de 180 dias, prorrogável por um ou mais períodos;
10- As utilizações seriam feitas mediante transferência para a conta de depósitos à ordem nº 0066.08.0425717, aberta no balcão do Banco/embargado da Póvoa de Varzim;
11- Sobre o capital em divida seriam contados juros dia a dia, à taxa de 15.5%, os quais seriam pagos postecipada e trimestralmente pela "Empresa-B", por débito na conta de depósitos à ordem, acrescida, em caso de mora, da sobretaxa que, para o efeito, então vigorasse;
12- A taxa de juro convencionada foi reduzida para 14% ao ano de 5/7/95 até 12/2/97 e, a partir desta data, para 12% ao ano;
13- O mencionado contrato de abertura de crédito em conta corrente foi sendo sucessivamente prorrogado até 4/4/98, data em que o embargado o considerou denunciado e vencido;
14- O contrato de abertura de crédito em conta corrente foi encerrado pelo embargado, com motivo na falta de cumprimento por parte da primeira embargante "Empresa-B", por ter deixado de pagar os juros contratuais entretanto vencidos;
15- A primeira embargante "Empresa-B" utilizou integralmente o crédito aberto no montante de 55.000.000$00, quantia esta que lhe foi colocada à disposição pelo banco/embargado;
16- A embargante "Empresa-B" não pagou ao embargado o mencionado empréstimo em conta corrente e seus aditamentos, tendo o mesmo embargado, preenchido a livrança em causa pelo valor do capital dos juros em divida e do respectivo imposto de selo, no montante global de 55.582.970$00, tendo-lhe dado vencimento em 4/4/98;
17- Tal foi comunicado pelo banco/embargado aos aqui embargantes, por cartas de 16/7/98;
18- O banco/embargado preencheu a livrança dada à execução, tendo-lhe dado o vencimento de 4/4/98, pelo valor de 55.582.970$00;
19- Os embargantes "Empresa-B" e AA assinaram pelo seu próprio punho o contrato de crédito celebrado em 1/9/94 e seus aditamentos, enquanto a embargante BB assinou pelo seu próprio punho o aditamento de 10/2/98.

Foram colhidos os vistos.

Conhecendo,

1- Pacto de preenchimento.
2- Incumprimento do contrato e abuso de preenchimento.
3- Conclusões.

1- Pacto de preenchimento.

1.1- É titulo executivo uma livrança subscrita pela recorrida "Empresa-B" e avalizada pelos recorridos AA e BB.
Resulta do acervo de factos assentes que foi emitida à ordem do Banco recorrente e entregue a este em branco para garantir o pagamento do saldo de um contrato de abertura de crédito - na forma contabilística de conta corrente -, contrato que foi encerrado pelo recorrente por a primeira recorrida ter deixado de pagar os juros contratuais, entretanto vencidos, o que traduziu o incumprimento da obrigação.
O recorrente preencheu a livrança pelo valor do capital, juros em dívida e imposto de selo, no montante global de 55.582.970$00, tendo aposto 4 de Abril de 1998 como data de vencimento.
Assim comunicou aos recorridos em 16 de Julho seguinte.
O recorrente concedeu à sociedade recorrida um crédito de 10.000.000$00 e em 5 de Julho de 1995, aumentado para 40.000.000$00 e, a partir de 10 de Fevereiro de 1998 para 55.000.000$00, pelo prazo de 180 dias, prorrogável por um ou mais períodos.

1.2- Perante estes factos há que saber se a dívida se vencia na data aposta na livrança e, se houve, em consequência, desrespeito pelo pacto de preenchimento daquele título.
Abordamos, em primeira linha, o pacto.
Dispõe o artigo 10º da Lei Uniforme sobre Letras e Livranças - preceito aplicável às livranças "ex vi" do artigo 77º - que se o título que está incompleto no momento da sua emissão tiver sido completado "contrariamente aos acordos realizados, não pode a inobservância desses acordos ser motivo de oposição ao portador, salvo se este tiver adquirido a letra de má-fé ou, adquirindo-a, tenha cometido uma falta grave."
Daqui resulta, desde logo, a conclusão apodíctica que a obrigação cambiária se constitui mesmo antes do total preenchimento da livrança ou, no limite, aquando do preenchimento. (cf., no primeiro sentido, o Prof. Mário de Figueiredo - RLJ 55-242 e, no sentido de constituição de vinculo aquando do preenchimento, o Prof. José Gabriel Pinto Coelho, "Lições de Direito Comercial" II, 1943, 31).
Como nesta linha - e também do Acórdão do STJ de 16 de Outubro de 2003 - o fundamento da lide executiva é o próprio título preenchido, a sua natureza é cambiária, com a consequente irrelevância de relações extracartulares.
Contudo, os executados podem opor a exequente o incumprimento do acordo de preenchimento, no âmbito das relações imediatas.

A excepção de preenchimento abusivo, como excepção do direito material, que é, deve ser alegada e provada pelo executado, por força do nº2 do artigo 342º da lei civil. (cf., "inter alia" o Acórdão do STJ de 28 de Julho de 1992 - BMJ 219-235, Pº 3980/01-7ª, e o de 6 de Abril de 2000 - Pº 4800, 2ª e de 10 de Janeiro de 2002 e Prof. Ferrer Correia in "Lições de Direito Comercial", 1994, 484).
A mesma solução foi firmada quanto ao cheque no Acórdão Uniformizador de Jurisprudência deste Supremo Tribunal, de 14 de Maio de 1996 ("Em processo de embargos de executado é sobre o embargante, subscritor do cheque exequendo emitido com data em branco e posteriormente completado pelo tomador ou a seu mando que recai o ónus da prova da existência de acordo de preenchimento e da sua observância" (D.R. de 11 de Julho de 1996), nada obstando, antes aconselhando a que se aceite como válido para as letras e livranças. (veja-se, ainda, o Prof. Alberto dos Reis, in "Código de Processo Civil Anotado" III, 4ª ed, 421).
Como acima se acenou, a livrança em branco é admissível, sendo que é de considerar como tal a que, embora contendo a assinatura de, pelo menos, um obrigado cambiário, lhe faltam alguns dos requisitos elencados no artigo 75º da lei uniforme.
O contrato - ou pacto - de preenchimento é, na definição do Acórdão do STJ de 3 de Maio de 2005 - 05 A1086 - "o acto pelo qual as partes ajustam os termos em que deverá definir-se a obrigação cambiária, tais como a fixação do seu montante, as condições relativas ao seu conteúdo, o tempo do vencimento, a sede do pagamento, a estipulação de juros, etc."
Este acordo, que pode ser expresso ou de induzir perante os factos que forem assentes, reporta-se à obrigação cartular em si mesma, o que pode ou não coincidir com a obrigação que esta garante e que daquela é causal ou subjacente.
Mas ali valem, tão somente, os critérios da incorporação, literalidade, autonomia e abstracção e não a "causa debendi" bastando-se para a execução a não demonstração, pelo executado, de ter sido incumprido o pacto de preenchimento, que pode ser invocado no domínio das relações imediatas.
Principio que também é válido quando aos avalistas, se subscreveram - como é o caso - o pacto de preenchimento.
Não o tendo feito, valeria a doutrina do Acórdão do STJ de 11 de Novembro de 2004 ao decidir que "os meros avalistas porque não
sujeitos materiais da relação contratual (relação subjacente), não podem apor ao portador da livrança a excepção de preenchimento abusivo" - 04B3453.
Também o Acórdão de 3 de Julho de 2000 - CJ/STJ VIII-11-39 - "sem embargo de deverem ser considerados de "imediatas" as relações entre o avalista do aceitante e o sacador ou entre o avalista do subscritor e o beneficiário - visto que as suas obrigações, independentes das dos avalizados, tem como primeiro credor o interveniente cambiário que assim se lhes opõe - mesmo nesse domínio das "relações imediatas" a obrigação cambiária continua a ser literal e abstracta, embora a relação subjacente possa fundar excepções que funcionam como uma contraprestação, compensando-a ou anulando-a".
De tal não pode concluir-se, sem mais, que a qualidade de mero avalista não legitime a oponibilidade da excepção de preenchimento abusivo.
Isto porque a prestação do aval estará normalmente condicionada ao conhecimento e aceitação pelo avalista do montante a avalizar e data de vencimento.
Sem, contudo, entrar neste ponto polémico, dir-se-á apenas que a legitimidade para excepcionar o preenchimento abusivo é conferida ao avalista se este subscreveu o acordo de preenchimento.
Neste sentido, vejam-se os Acórdãos do STJ de 30 de Setembro de 2003 -Pº 2113/03-1ª-relatado pelo aqui 2º Adjunto e de 4 de Maio de 2004- Pº371/04- 1ª,de relato do aqui 1º Adjunto.
Já nas relações mediatas em que o titulo é detido por alguém estranho à convenção extra-cartular, por já ter entrado em circulação, prevalecem os princípios típicos da relação cambiária que independem da causa que deu lugar à sua assunção.

2- Incumprimento do contrato e abuso de preenchimento.

Feito este breve bosquejo, e na ponderação de todos os factos provados, está demonstrada a existência de um pacto de preenchimento expresso (cf. doc 5, junto com a contestação) não havendo que lançar mão do implícito no negócio subjacente à emissão do título, ou seja de um acordo tácito, o que também seria de admitir.
O preenchimento, que pode ser contemporâneo, ou posterior, à aquisição do título pelo adquirente, terá de ser feito de harmonia com as cláusulas negociais do contrato que garantia, não podendo exceder esses limites.

A Relação concluiu pelo preenchimento abusivo por ter sido aposta uma data de pagamento sem que a obrigação estivesse vencida.
Acontece, porém, que a primeira recorrente deixou de pagar os juros contratuais vencidos, sendo que fora acordado que tais juros seriam pagos postecipada e trimestralmente, sob pena de incumprimento.
Por essa razão o recorrido preencheu a livrança com o capital e juros vencidos apondo-lhe a data de vencimento e comunicando, por cartas, tais elementos aos recorridos.
Não importa aqui apurar se essa comunicação pode considerar-se interpelação aos devedores, nos termos do nº1 do artigo 777º do Código Civil.
Cumpria aos recorridos embargantes demonstrar que essas datas e quantia foram apostas por forma arbitrária e abusiva por desrespeitarem a vontade presumida daquele acordo de preenchimento.
Isto porque no pacto expresso (doc. fls. 82) diz-se ser garantia a "livrança emitida e subscrita pela cliente, por ela entregue nesta data ao Banco, com o valor e a data de vencimento em branco, com aval ao subscritor dos garantes, que o Banco fica desde já autorizado a preencher pelo saldo em divida do capital, juros, demais encargos e despesas a fixar-lhe e a inscrever-lhe a data do seu vencimento, caso o contrato não seja pontualmente cumprido, ou os seus valores vencidos e não pagos, fazendo o Banco deste titulo o uso que melhor entender na defesa dos seus interesses e sem que, por esse facto, se opere a novação da operação de crédito titulada pelo presente."
Este contrato de preenchimento foi firmado pelos recorridos (fls. 83) que nunca puseram em causa as suas assinaturas, nem impugnaram o seu teor.
Ademais, embora cumprindo aos embargantes, como ficou dito, alegarem e provarem o preenchimento abusivo, estes limitaram-se a dizer, na petição de embargos, que "desconhecem presentemente se autorizaram ou não o preenchimento de todos os títulos em branco entregues ao Banco embargado" (nº15) e "daí que não possam deixar de, à cautela, invocar que o embargado não dispõe relativamente ao titulo dado à execução, de acordo ou autorização de preenchimento válidos subscritos pelos executados (nº17).
E perante a junção do documento referido, e outros de datas anteriores, dizem na sua resposta (nº5 - fl.92): "De salientar ainda que as pretensas autorizações de preenchimento agora juntas pelo embargado não lhe conferem a faculdade de preencher a livrança ali referida quanto à data da emissão."

Isto é, para além de negarem factos pessoais - por vertidos em documentos que subscreveram - contrariam "expresis verbis" o teor literal do documento que firmaram, olvidando ostensivamente o disposto no artº 490
n. 3 do Código de Processo Civil.
Subscreveram a delegação de confiança para preenchimento, quer "ab initio" - fl.73 - em 1 de Setembro de 1994 (renovando-o - fl.76 - em 5 de Julho de 1995 - em 10 de Fevereiro de 1997 - fl.86) quer, finalmente, o acima citado e transcrito - fl. 82 - em 10 de Fevereiro de 1998.
Indemonstrada, pois, o preenchimento abusivo, procede, em consequência, o alegado pelo recorrente.
Diga-se, "ex abundantia", irrelevar o alegado pelos recorridos quanto à não invocação de violação de norma substantiva, já que tal foi invocado, e ressalta claramente, dos alegações do recorrente.

3- Conclusões.

De concluir que:

a) A obrigação cambiária constitui-se mesmo antes do preenchimento total da livrança, bastando a assinatura de pelo menos um obrigado cambiário, sendo, contudo, fundamento da lide executiva o titulo preenchido, com os elementos do artigo 75 da Lei Uniforme LL.
b) No domínio das relações imediatas - isto é, enquanto a livrança não é detida por alguém estranho às relações extra-cartulares - o executado pode opôr ao exequente a excepção de incumprimento do pacto de preenchimento, geradora de preenchimento abusivo.
c) Como excepção de direito material, o preenchimento abusivo deve ser alegado e provado pelo embargante em processo de embargos de executado, cumprindo ao embargante demonstrar que a aposição de data e montante foram feitas de forma arbitrária e ao arrepio do acordado.
d) O contrato de preenchimento pode ser expresso ou estar implícito no negócio subjacente à emissão do título, podendo ser contemporâneo ou posterior à aquisição pelo exequente.
e) Se o avalista subscreveu o acordo de preenchimento, pode apor ao portador a excepção de preenchimento abusivo, estando o título no âmbito das relações imediatas.

Nos termos expostos, acordam conceder a revista, revogando o Acórdão recorrido para subsistir a sentença da 1ª Instância.
Custas pelos recorridos.

Lisboa, 14 de Dezembro de 2006
Sebastião Povoas
Faria Antunes
Moreira Alves