Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
341/13.7TBVNO-I.E1.S1
Nº Convencional: 6ª SECÇÃO
Relator: RICARDO COSTA
Descritores: IMPUGNAÇÃO PAULIANA
DIREITO DE PROPRIEDADE
TITULARIDADE
CREDOR PREFERENCIAL
AUTORIDADE DO CASO JULGADO
DEVEDOR
INSOLVÊNCIA
APREENSÃO
ABUSO DO DIREITO
Data do Acordão: 07/11/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO CIVIL – RELAÇÕES JURÍDICAS / EXERCÍCIO E TUTELA DOS DIREITOS / ABUSO DO DIREITO – DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / GARANTIA GERAL DAS OBRIGAÇÕES / CONSERVAÇÃO DA GARANTIA PATRIMONIAL / IMPUGNAÇÃO PAULIANA.
DIREITO FALIMENTAR – EFEITOS DA DECLARAÇÃO DE INSOLVÊNCIA / RESOLUÇÃO EM BENEFÍCIO DA MASSA INSOLVENTE – RESTITUIÇÃO E SEPARAÇÃO DE BENS / VERIFICAÇÃO ULTERIOR.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL – PROCESSO EM GERAL / CUSTAS, MULTAS E INDEMNIZAÇÃO / RESPONSABILIDADE NO CASO DE MÁ-FÉ, NOÇÃO DE MÁ-FÉ.
Doutrina:
- Alexandre Soveral Martins, Um Curso de Direito da Insolvência, 2.ª ed., Almedina, Coimbra, 2016, p. 272, 276;
- Almeida Costa, Direito das obrigações, 12.ª ed., Almedina, Coimbra, 2009, p. 868-869; - Menezes Leitão, Direito das obrigações, volume II, Transmissão e extinção das obrigações. Não cumprimento e garantias do crédito, 8.ª ed., Coimbra, Almedina, 2011, p. 321;
- António Menezes Cordeiro, Tratado de direito civil português, X, Direito das obrigações. Garantias, Almedina, Coimbra, 2017, p. 388-389;
- Carvalho Fernandes e João Labareda, Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, 2.ª ed., Quid Juris, Lisboa, 2013, p. 130;
- Francisco Ferreira de Almeida, Direito processual civil, volume II, 2.ª ed., Almedina, Coimbra, 2019, p. 605, 719 e ss.;
- Gravato Morais, Resolução em benefício da massa insolvente, Almedina, Coimbra, 2008, p. 205;
- João Cura Mariano, Impugnação pauliana, 2.ª ed., Almedina, Coimbra, p. 242 e ss.;
- Lebre de Freitas, Providência cautelar: desistência do pedido, repetição e caso julgado, Estudos sobre direito civil e processo civil, Coimbra Editora, Coimbra, 2002, p. 494-496;
- Maria de Fátima Ribeiro, Um confronto entre a resolução em benefício da massa insolvente e a impugnação pauliana, IV Congresso de Direito da Insolvência, coord.: Catarina Serra, Almedina, Coimbra, 2017, p. 149-150;
- Maria do Rosário Epifânio, Manual de direito da Insolvência, 7.ª ed., Almedina, Coimbra, 2019, p. 263;
- Maria José Capelo, A sentença entre a autoridade e a prova. Em busca de traços distintivos do caso julgado civil, Almedina, Coimbra, 2015 (reimp.: 2016), p. 51;
- Menezes Cordeiro, Litigância de má fé, abuso do direito de ação e culpa “in agendo”, 3.ª ed. (à luz do Código de Processo Civil de 2013), Coimbra, Almedina, 2014 (reimp. 2016), p. 43, 141, 146, 205 e ss.;
- Menezes Leitão, Direito da insolvência, 8.ª ed., Almedina, Coimbra, 2018, p. 233-234;
- Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, 4.ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 1987, p. 626-627, 633-634;
- Rui Pinto, Exceção e autoridade de caso julgado – algumas notas provisórias, Julgar online, 2018, p. 4-7, 17-19, 25 e ss.;
- Teixeira de Sousa, O objecto da sentença e o caso julgado material (Estudo sobre a funcionalidade processual), BMJ n.º 325, 1983, p. 159-160, 171 e ss. ; Prejudicialidade e limites objectivos do caso julgado, RDES, 1977, ps. 305-308.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 334.º E 616.º, N.º 1 E 4.
CÓDIGO DA INSOLVÊNCIA E DA RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS (CIRE): - ARTIGOS 127.º, N.º 3, 141.º, N.º 1, ALÍNEA C), 146.º, 147.º E 148.º.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGO 542.º, N.º 2.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:


- DE 10-10-2012, IN CDP N.º 41, 2013, P. 24-25, 28-29;
- DE 11-07-2013, PROCESSO N.º 283/09.0TBVFR-C.P1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 06-03-2014, PROCESSO N.º 462/10.8TBVFR-L.P1.S1, IN SASTJ, ASSESSORIA CÍVEL, NOVEMBRO DE 2018, P. 34;
- DE 20-03-2014, PROCESSO N.º 1429/11.4TBPNF.P1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 13-11-2014, PROCESSO N.º 1444/08.5TBAMT-A.G1.S1, IN WWW.DGSI.PT.
- DE 12-08-2016, PROCESSO N.º 841/14.1TYVNG-A.P1.S1, IN WWW.DGSI.PT.
- DE 18-10-2016, PROCESSO N.º 106/13.6TYVNG-B.P1.S1, IN WWW.DGSI.PT.
- DE 08-11-2018, PROCESSO N.º 478/08.4TBASL.E1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 19-12-2018, PROCESSO N.º 930/13.0TVPRT.P1.S1, IN WWW.DGSI.PT.
Sumário :
I. A impugnação pauliana consiste numa acção pessoal e com escopo indemnizatório que, tendo como base a ineficácia do acto impugnado, confere ao credor, na medida do seu interesse, o “direito à restituição” dos bens visados, tendo, para o efeito de satisfação do valor do seu crédito, o direito a praticar os actos de conservação da garantia patrimonial autorizados por lei na esfera jurídica do obrigado à restituição-adquirente e o direito de execução no património desse adquirente.

II. O direito à restituição (art. 616º, 1, CCiv.) não determina, em regra, o regresso efectivo dos bens alienados ao património do devedor/transmitente, uma vez que a titularidade jurídica desses bens se mantém no adquirente.

III. A procedência de acção pauliana não confere ao credor impugnante, por via da aplicação do art. 616º, 4, do CCiv. («Os efeitos da impugnação aproveitam apenas ao credor que a tenha requerido.»), uma preferência legal sobre os credores comuns do adquirente obrigado à restituição no âmbito da satisfação do seu crédito.

IV. A autoridade de caso julgado material fixada por acção de impugnação pauliana procedente e transitada não é contrariada pela apreensão do bem-alvo nessa impugnação na massa insolvente do adquirente, uma vez que não se lesa a imutabilidade processual do efeito jurídico-substantivo atingido na acção pauliana.

V. Não há apreensão indevida na massa insolvente do adquirente, afectado por acção de impugnação pauliana que declara a ineficácia do acto de aquisição, do bem objecto dessa aquisição, de acordo com o previsto no art. 141º, 1, c), do CIRE, o que não permite o recurso à acção de separação e restituição de bens regulada pelos arts. 146º-148º do CIRE.

VI. Justifica-se a aplicação analógica do art. 127º, 3, do CIRE («Julgada procedente a ação de impugnação, o interesse do credor que a tenha instaurado é aferido, para efeitos do artigo 616º do Código Civil, com abstração das modificações introduzidas ao seu crédito por um eventual plano de insolvência ou de pagamentos.») às acções de impugação pauliana julgadas procedentes após a declaração de insolvência e aos actos nelas impugnados em que o insolvente é o adquirente na transmissão visada com êxito pela impugnação pauliana pendente à data da declaração de insolvência e o bem-alvo se encontra apreendido legitimamente na massa insolvente.

VII. O credor impugnante pauliano concorre em igualdade com os demais credores da insolvência do insolvente adquirente do bem-alvo na impugnação pauliana, salvaguardando-se o princípio par conditio creditorum e sendo tratado o seu crédito como se tivesse sido reclamado e verificado no processo de insolvência.

VIII. Se se invoca singelamente atuação processual abusiva
de acordo com o art. 334º do CCiv., sem se explicitar e concretizar a modalidade de exercício inadmissível e ilegítimo no processo, a conduta da parte deve ser julgada de acordo com as condutas previstas no instituto da litigância da má fé (art. 542º, 2, CPC).
Decisão Texto Integral:


Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

6.ª Secção



I. Relatório

1. AA intentou acção declarativa, sob a forma de processo comum, para separação e restituição de bens (art. 146º e ss do CIRE), pedindo a (i) separação do bem imóvel, identificado como verba n.º 8 no “Auto de Apreensão e Arrolamento” (art. 151º do CIRE) constante do apenso C do processo de insolvência em que foi declarada insolvente a “BB, Lda.”, da Massa Insolvente dessa “BB” e a restituição ulterior à esfera jurídica da “CC, S.A.”, tendo em vista o pagamento do Autor, e a (ii) suspensão da liquidação do activo da insolvente, relativamente ao bem objecto da acção, nos termos do art. 160º do CIRE, uma vez lavrado o protesto a que alude o art. 146º, 3, do CIRE, que igualmente se peticionou.
2. Por despacho de 11 de Abril de 2018, que faz fls. 20, o tribunal de 1.ª instância admitiu a acção e ordenou a citação dos credores da insolvente nos termos do art. 146º, 1, do CIRE, assim como a suspensão da liquidação quanto à referida verba n.º 8, com notificação do Administrador da Insolvência.
3. Em contestação, a credora “DD, S.A.R.L.” pugnou pela improcedência da acção, “devendo o imóvel identificado na petição e apreendido na insolvência (…) ser vendido da insolvência a que os autos (…) se encontram apensos”.
Também contestando, a Massa Insolvente da “BB” refutou o peticionado e pugnou pela improcedência da acção por absolvição da Ré do pedido.
4. O Tribunal de 1.ª instância, em sede de audiência prévia, realizou tentativa de conciliação e, perante a frustração de consenso, proferiu saneador-sentença nos termos do art. 595º, 1, b), do CPC, no qual decidiu:
(…) liminarmente indefiro a presente demanda cujo Autor é AA.
Em consequência, a liquidação da Massa Insolvente de BB, Lda. prosseguirá os seus devidos termos, uma vez transitada em julgado a presente Decisão.

Usou da seguinte fundamentação:

“A todo o direito corresponde ação que possa efetivá-lo, constituí-lo ou quanto muito reconhecê-lo (artigo 2.º, n.º 2 do CPC).
Constrói-se a realidade jurídica em consonância com as realidades apuradas e firmadas nas sentenças, de acordo com a lei e com o direito, sendo as sentenças fonte imediata do próprio direito.

A sentença proferida e acima identificada em 2 é clara no sentido que tornou ineficaz a relação de AA e o contrato de compra e venda de 04-11-2010, permitindo ao referido Autor a execução de crédito à custa daquele património, ou seja, o imóvel aqui apreendido como verba n.º 8.
Decorre claro daquela sentença, decorre claro das regras do direito quanto à Ação Pauliana, de que a aqui insolvente manteve-se dona do referido imóvel (artigo 610.º e seguintes do CC e, ainda, artigo 818.º, 2.ª parte do mesmo diploma legal).
Aqui chegados, tendo presente a interpretação daquela sentença, das também referidas normas legais citadas e dos subsequentes ensinamentos acerca da Ação Pauliana que a tese de mestrado de Cura Mariano mostra (Edição Almedina - facilmente adquirível no mercado).
Resulta claro que a Ação Pauliana é meramente declarativa de uma realidade a qual está espelhada naquela sentença.

Compaginando a referida sentença com a efetiva e definitiva apreensão da Massa insolvente (ponto 2 e 4 dos factos acima provados), resulta claro que ao Autor não é legítimo o uso do presente meio judicial para a procedência do ora peticionado; além do mais a pretensão em causa é impedida pelos termos impostos pelo artigo 141.º e seguintes do CIRE.”
5. Inconformado, o Autor interpôs o presente recurso per saltum, formulando as seguintes conclusões:
A.  Por sentença de 17/02/2014, devidamente transitada em julgado, proferida no Apenso D dos autos de insolvência principais, foi declarado: “a) ineficaz, em relação ao autor, AA, o contrato de compra e venda celebrado em 04-11-2010, entre a 1.ª ré, “CC, S.A.” e a 2.ª ré, “BB, Lda.”, que teve por objeto o prédio urbano, sito na E.N. ..., ..., ..., inscrito na matriz sob o artigo P ....º e descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º ... da freguesia de ...” e que “b) o autor pode obter pagamento do seu crédito à custa do dito prédio”.
B.  A ré Massa Insolvente, representada pelo Sr. A. I., devidamente notificada do teor da sentença em 04/03/2014, conformou-se com o teor da mesma e dela não interpôs recurso, pelo que a mesma transitou em julgado.
C. O recorrente cuidava que conhecia os efeitos do caso julgado e que podia confiar nas decisões dos tribunais.
D.  Efetivamente, dispõe o artigo 619.º, n.º 1 do C.P.C. que “Transitada em julgado a sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele nos limites fixados pelos artigos 580.º e 581.º, sem prejuízo do disposto nos artigos 696.º a 702.º”.
E.  Por sua vez, dispõe o artigo 621.º do C.P.C. que “A sentença constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que julga (…)”.
F.  Contudo, o recorrente andava iludido!
G.  Afinal, as sentenças dos tribunais, mesmo quando proferidas no mesmo processo, não são para cumprir!
H.  Efetivamente, em 27/03/2013, o recorrente intentou ação de impugnação pauliana contra as sociedades “CC, S.A.” e “BB  –  …, Lda.”, à qual foi atribuído o n.º 1563/13.6TBLRA, pelo extinto 3.º Juízo Cível do Tribunal Judicial de ....
I. A ação foi devidamente registada pelo autor na Conservatória do Registo Predial, pela Ap. n.º ..., de 2013/03/28.
J. Logo em 04/04/2013 foi declarada a insolvência da sociedade “BB, Lda.”, ali 2.ª ré.
K. Tendo sido nomeado Administrador de Insolvência, o Sr. Dr. EE. (cfr. sentença dos autos principais de insolvência).
L.  Assim, no dia 19/09/2013, foi o Sr. A. I. citado para os termos da ação pauliana intentada pelo recorrente, em nome da Massa Insolvente da sociedade “BB, Lda.”.
M. O Sr. A. I. nomeado nos autos principais de insolvência não ofereceu contestação,
N. Tendo, antes, requerido a tramitação por apenso da ação pauliana ao processo de insolvência, porque, no seu entendimento, “a ação, que foi intentada contra a insolvente, relativamente a um bem compreendido na Massa Insolvente, pode influenciar o valor da massa insolvente”. (cfr. requerimento com a ref.ª Citius n.º 2654670 do Apenso D)
O.  A ação de impugnação pauliana foi, assim, tramitada por apenso aos autos principais de insolvência, constituindo o seu Apenso D. (cfr. conclusão com a ref.ª Citius n.º 8521625 do Apenso D)
P.  Nela, o tribunal proferiu sentença onde entendeu que “A mencionada venda foi realizada com a exclusiva finalidade de frustrar a satisfação do crédito do autor. As rés agiram com dolo direto – atuação com intenção ou propósito de causar dano ao credor (apesar de, quanto a este requisito, a lei se bastar com a negligência consciente, ou seja, com a representação da possibilidade de produção do resultado danoso) – qualificável como má-fé”,
Q. Pelo que “o pedido do autor procede tão-somente na parte em que peticiona a declaração de ineficácia do contrato de compra e venda em discussão, de modo a que o mesmo possa obter o pagamento do seu crédito no património do adquirente (2.ª ré)”.
R.  O que o tribunal a quo parece ter esquecido é que o autor não é credor da massa insolvente da “BB, Lda.”,
S.  Mas da sociedade “CC, S.A.”,
T.  E que, sendo a ação pauliana uma ação pessoal, o recorrente pode executar o imóvel alienado como se ele não tivesse saído do património da devedora – a sociedade “CC, S.A.” []–, na medida do necessário para satisfação do seu crédito, sem sofrer a competição dos credores da adquirente – a massa insolvente da “BB, Lda.”.
U. Efetivamente, a declaração de ineficácia do contrato de compra e venda em discussão, perante o ora recorrente, permite-lhe executar o bem alienado como se, hipoteticamente, o mesmo não tivesse saído do património do devedor.
V.  O tribunal a quo remete para os “ensinamentos acerca da Ação Pauliana que a tese de mestrado de Cura Mariano mostra” para justificar o indeferimento liminar da presente demanda.
W. No entanto, o que Cura Mariano refere é que o facto de se utilizar a palavra “restituição”, não significa uma viagem de regresso entre patrimónios, mas uma reconstituição da garantia patrimonial do crédito do impugnante.
X.  Por via da insolvência da adquirente, foi o imóvel em causa apreendido para a massa insolvente, em 05/09/2013.
Y.  Aliás, como se escreveu na douta sentença proferida no apenso D, “Em face da declaração de insolvência da 2.ª ré, o processo próprio ao dispor do autor para obter a restituição ao património da 1.ª ré do imóvel em causa é o processo especial de restituição de bens, previsto no citado artigo 141.º do CIRE. É esse o meio próprio e único de reação contra uma apreensão indevida de bens em processo de insolvência. Por outras palavras, todo aquele que se sinta lesado pela apreensão de bens efetivada pelo administrador de insolvência ou, como no caso, pretenda a restituição do património a terceiro de bem apreendido para a massa insolvente, tem de recorrer necessariamente ao procedimento para restituição e separação de bens previsto no artigo 141.º a 148.º do CIRE. Tal procedimento constitui o único meio de reação contra a apreensão indevida em processo de insolvência”.
Z.  Pelo que, nos termos do disposto na al. c) do n.º 1 do artigo 141.º do CIRE, a presente demanda constitui o meio idóneo para o autor poder dar cumprimento à sentença que reconheceu o seu direito e obviar à venda do imóvel pela massa insolvente antes de ter obtido o pagamento do seu crédito à custa do dito prédio,
AA. Pois que a sentença que julgou procedente a impugnação pauliana não pode ser executada se o bem que dela foi objeto integra a massa insolvente.
BB. A declaração de ineficácia do contrato de compra e venda do prédio apreendido como verba n.º 8, aproveitando apenas ao autor (artigo 616.º, n.º 4 do CC),
CC. É oponível a todos os credores da massa insolvente da “BB, Lda.”.
DD. Só assim se justifica a apensação da ação pauliana aos autos de insolvência.
EE. Se a ação pauliana fosse apenas eficaz em relação ao ora recorrente e não também em relação aos credores da massa insolvente da “BB, Lda.” – se a ação não fosse efetivamente suscetível de influenciar o valor da massa insolvente – teria corrido como um processo autónomo ao processo de insolvência (artigo 127.º, n.º 2 do CIRE).
FF. O recorrente tem, pois, direito à restituição do imóvel em causa, em regime universal, na medida do seu interesse, nos termos e para os efeitos do n.º 1 do referido art.º 616.º do CC.
GG. Aliás, salvo o devido respeito, parece-nos que grassa no espírito do tribunal a quo uma grosseira confusão e um enorme equívoco: é que, como já referimos, o autor não é e nunca foi credor da insolvente.
HH. O autor reagiu no local próprio contra uma transmissão fraudulenta de um imóvel para a sociedade insolvente “com a exclusiva finalidade de frustrar a satisfação do crédito do autor” (página 6 da sentença proferida no Apenso D).
II.  O Sr. A.I. representa a massa insolvente e, por inerência, todos os credores da mesma.
JJ. Ao ter-se conformado com a sentença anteriormente referida, dela não recorrendo e aceitando que a mesma transitasse, como transitou, em julgado, o Sr. A.I. aceitou que tal sentença produzisse efeitos contra todos os credores da massa insolvente.
KK. Admitir que o raciocínio expendido pelo Mmo. Juiz a quo fosse válido, consistiria em, na prática, aceitar que existisse uma maneira simples de fraudar e frustrar o sentido e o alcance da ação pauliana: de cada vez que alguém intentasse uma ação pauliana, bastaria o adquirente do bem apresentar-se à insolvência para inibir os efeitos daquela ação!
LL. Como se refere, com acerto, na douta sentença ora recorrida (e, que nos perdoem, é a única asserção acertada da mesma), “A todo o direito corresponde ação que possa efetivá-lo, constitui-lo ou quanto muito reconhecê-lo (artigo 2.º, n.º 2 do CPC)”.
MM. Esta é uma verdade lapalissiana: contudo, na mesma sentença em que refere que a todo o direito corresponde ação que possa efetivá-lo, constitui-lo ou reconhece-lo, acaba o Mmo. Juiz da causa por, de uma forma totalmente incompreensível, negar ao autor o direito à ação para efetivar o direito subjetivo que já lhe foi reconhecido por sentença transitada em julgado.
NN. Se, como se refere na douta sentença recorrida, “Resulta claro que ao Autor não é legitimo o uso do presente meio judicial para a procedência do ora peticionado” e se “além do mais a pretensão em causa é impedida pelos termos impostos pelo artigo 141.º e ss. do CIRE” caberia então perguntar qual é, então, na perspetiva do Mmo. Juiz da causa o meio idóneo para tal.
OO. Até porque, o facto de o bem ter sido apreendido para a massa insolvente e ter sido a apreensão registada em nada contunde com o direito do autor a obter o pagamento do seu crédito à custa do prédio dos autos.
PP. Do teor da sentença agora posta em crise parece concluir-se que a sentença proferida no Apenso D não tem qualquer valor e em nada contunde com a apreensão feita para a massa insolvente do imóvel dos autos, mesmo que o mesmo tenha sido adquirido para a insolvente com a exclusiva finalidade de frustrar a satisfação do crédito do autor.
QQ. Algo que constitui uma autêntica aberração jurídica.
RR. O tribunal a quo laborou em equívoco porque confundiu o autor com um comum credor da massa insolvente e, como se o autor, na qualidade de credor da massa insolvente estivesse a colocar-se numa posição vantajosa relativamente aos demais credores reconhecidos.
SS. Contudo, na fundamentação da sentença proferida no Apenso D, foram considerados “confessados os factos articulados pelo autor”, nomeadamente, que “Ao realizar a venda referida em 26.º, a primeira ré pretendeu unicamente evitar ser proprietária de qualquer bem que pudesse satisfazer o pagamento da letra referida em 3.º e, dessa forma, frustrar tal pagamento”; que “O referido terreno foi vendido pelo preço declarado de €600.000,00 (seiscentos mil euros)”; que “No entanto, tratou-se de uma venda simulada”; que “Na verdade, a segunda ré não pagou à primeira qualquer quantia a título de preço”; que “Não foi intenção da 1.ª ré transferir a propriedade de tal imóvel para a 2.ª”; que “Não foi intenção da 2.ª ré adquirir da 1.ª a propriedade de tal imóvel” e que “A verdadeira intenção da 1.ª e da 2.ª ré foi, por via da celebração do contrato de compra e venda de tal imóvel, eximir tal prédio do acervo patrimonial daquela e, por essa via, diminuir ou frustrar a garantia do crédito dos credores da mesma, mormente, o autor” (artigos 28.º a 34.º da p.i. da Ação de Impugnação Pauliana).
TT. Dito de outro modo, a insolvente adquirente do imóvel não pagou qualquer parcela que fosse do preço do mesmo.
UU. Por essa razão, por não existir na contabilidade da insolvente qualquer documento comprovativo do pagamento de qualquer quantia, é que o Sr. A. I. não contestou a ação.
VV. Aqui chegados, por se ter tratado de um negócio fraudulento, em que não ocorreu qualquer pagamento, é evidente que da procedência da ação pauliana não resulta qualquer prejuízo para os credores da massa insolvente.
WW. Ao invés, da sentença agora posta em crise resulta um enorme prejuízo para o recorrente por contraponto a um locupletamento e um enriquecimento ilegítimo, abusivo e imoral dos credores da massa insolvente relativamente ao recorrente.
XX. Aliás e sem conceder sempre se dirá que a massa insolvente litiga em evidente abuso de direito, por estar a exceder “manifestamente os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito” (artigo 334.º do CC).
YY. No presente recurso, nas suas alegações, o recorrente discute apenas questões de direito.
ZZ. O valor da causa é superior à alçada da Relação.
AAA. Pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 678.º do Código de Processo Civil, requer-se que o mesmo (per saltum) suba diretamente ao Supremo Tribunal de Justiça.
BBB. O tribunal a quo violou o disposto nos artigos 2.º, n.º 2; 619.º, n.º 1 e 621.º do CPC; 127.º, n.º 2 e 141º, n.º 1, al. c) do CIRE e 334.º e 616.º, n.os 1 e 4 do CC.

Pugna o recorrente pela procedência do recurso, revogação do despacho recorrido, com substituição por outro que admita a separação da massa insolvente e a restituição do referido bem imóvel à esfera jurídica da devedora, a sociedade “CC, S.A.”, ou, pelo menos, a suspensão da liquidação, enquanto não se efectivar a satisfação do crédito do autor à custa do dito prédio, a fim de o recorrente sobre ele se fazer pagar.

6. Oferecendo as suas contra-alegações, a “DD, S.A.R.L.” e a Massa Insolvente da “BB”, em síntese, defenderam a inadmissibilidade do recurso interposto e sustentaram a improcedência do recurso, tendo a última pugnado, ainda, pela condenação do autor como litigante de má-fé.

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II. APRECIAÇÃO DO RECURSO E FUNDAMENTAÇÃO

1. A admissibilidade e o objecto do recurso

1.1. O processo 341/13.7TBVNO-I.E1.S1 traz à cognição directa do STJ uma acção de separação e restituição de bens da massa insolvente, seguindo a forma de processo comum e a tramitação da acção de verificação ulterior de créditos ou de outros direitos (arts. 146º e ss do CIRE). Não se trata in casu de um pedido (regra) de separação e/ou restituição de bem/bens da massa insolvente, reclamando para o administrador da insolvência, apresentado “dentro do prazo fixado na sentença declaratória da insolvência” para a reclamação e verificação dos créditos pelos credores da insolvência (arts. 141º-143º do CIRE, com aplicação adaptada do regime da reclamação de créditos dos arts. 128º-140º do CIRE), nem sequer do pedido (excepcional e condicionado) de bem/bens apreendido(s) para a massa insolvente “depois de findo o prazo fixado para as reclamações”, desde que exercido “nos cinco dias posteriores à apreensão” (art. 144º do CIRE). Antes se configura nos autos a situação de, “findo o prazo das reclamações” (ou o referido prazo adicional de cinco dias), o direito (ulterior) à separação do(s) bem/bens da massa insolvente e a sua restituição à esfera jurídica de terceiro, por meio de acção judicial proposta contra a massa insolvente, os credores e o devedor. Esta separação e restituição ulteriores, tal como prevista nos artigos 146º-148º do CIRE, implica, de acordo com o art. 148º, que a acção respectiva siga a forma de processo declarativo comum e corra por apenso ao processo de insolvência.

O art. 14º, 1, do CIRE prescreve: «No processo de insolvência e nos embargos opostos à sentença de declaração de insolvência, não é admitido recurso dos acórdãos proferidos por tribunal da relação, salvo se o recorrente demonstrar que o acórdão de que pretende recorrer está em oposição com outro, proferido por alguma das Relações ou pelo Supremo Tribunal de Justiça, no domínio da mesma legislação e que haja decidido de forma divergente a mesma questão fundamental de direito e não houver sido fixada pelo Supremo, nos termos dos artigos 686º e 687º do Código de Processo Civil, jurisprudência com ele conforme.» Este especial regime de recurso em sede de processo de insolvência tem sido objecto de uma apurada e fundamentada aplicação por parte deste Supremo Tribunal e nesta 6.ª Secção.
No que respeita ao âmbito de aplicação da disciplina restritiva nele contido em razão da matéria – logo, da amplitude da inibição de acesso de Acórdãos proferidos por Tribunal da Relação ao terceiro grau de jurisdição do STJ, tendo em conta a especialidade da norma de irrecorribilidade –, tem-se uniformemente julgado e decidido que a revista “normal” – independentemente do juízo sobre a condição negativa da “dupla conformidade decisória”, tal como prevista no art. 671º, 3, do CPC – está vedada a todas as decisões proferidas no processo de insolvência (e, extensivamente, no processo especial de revitalização), incluindo-se as decisões tomadas nos incidentes que do ponto de vista formal e estrutural integram o referido processo e nele se tramitam (excluindo-se portanto da irrecorribilidade todas as acções e incidentes processados por apenso ao processo de insolvência e PER, a não ser, por expressa previsão legal e constituindo apenso nos termos do art. 41º, 1, do CIRE, os embargos opostos à sentença de declaração de insolvência): v., por ex., os Acs. de 13/11/2014[1], de 12.8.2016[2] e de 18.10.2016 [3], absorvendo-se igualmente a posição e os fundamentos da doutrina, focada com acerto na relação do n.º 1 com o n.º 2 (quando neste se faz referência a «todos os recursos interpostos no processo ou em qualquer dos seus apensos») do art. 14º do CIRE[4]. Em suma, a razão visada na restrição (ao art. 671º, 1 e 2, do CPC), centrada na particular celeridade e desejada estabilidade processual nas matérias da insolvência (cfr. Preâmbulo, ponto 16, do DL n.º 53/2004, que aprovou o CIRE) e da revitalização pré-insolvencial, aplica-se à tramitação endógena dos processos de insolvência e deixa de fora a tramitação apensa e adjectivamente autonomizada desses mesmos processos, cujos litígios correm o regime comum (como induz justamente o referido art. 14º, 2, do CIRE). Para essa tramitação endógena tão-só se admite que se precluda a limitação do direito de recurso a um grau apenas nos casos de oposição de acórdãos em matéria relativamente à qual não exista ainda uniformização de jurisprudência, de acordo com 2.ª parte do art. 14º, 1.

Ora, se assim é, o apenso de separação e restituição ulteriores de bens não se encontra abrangido pela disciplina restritiva, atípica (sem deixar de ser, porém, comum ou ordinária), da revista contemplada pelo art. 14º, 1, do CIRE, como pretendem os Recorridos. É o caso dos autos, em que nos confrontamos com um saneador-sentença proferido em apenso ao processo de insolvência da “BB, Lda.”.

Daqui resulta que a impugnação recursiva dessa sentença segue as normas gerais de interposição de recurso, em aplicação do preceituado no art. 17º, 1, do CIRE: «O processo de insolvência rege-se pelo Código de Processo Civil, em tudo o que não contrarie as disposições do presente Código”. O que, naquela sede, abrange os arts. 671º a 678º sobre o recurso de revista. Neste regime, não obstante se incidir, em princípio, sobre decisões de 2.ª instância, a lei admite a possibilidade do recurso directo (designado “per saltum) de revista, sem passar previamente pela apelação. E foi esse recurso que, legitimamente e sem censura que obste ao conhecimento do recurso, o aqui Recorrente lançou mão.

1.2. Estamos assim perante o recurso previsto no artigo 678º do CPC, o qual está circunscrito às decisões do tribunal de 1.ª instância previstos no artigo 644º, 1, do mesmo CPC – decisões finais de fundo ou de forma proferidas pelo tribunal de 1.ª instância que ponham termo ao processo e despacho saneador que, sem pôr termo ao processo, decida do mérito da causa: corpo do art. 678º, 1, CPC –, desde que, uma vez requerido nas Conclusões da alegação (“verdadeiro direito potestativo[5] e requisito também previsto no corpo do art. 678º, 1) se verifiquem cumulativamente os demais seguintes requisitos (tal como elencados nas alíneas desse art. 678º, 1): o valor da causa superior ser superior à alçada da Relação; o valor da sucumbência ser superior a metade da alçada da Relação; serem suscitadas apenas “questões do direito”, na circunscrição do objecto do recurso, pela parte recorrente-requerente da subida directa ao STJ (por aplicação do art. 631º, 1, 2, 635º, 4, 637º, 2, 2ª parte, CPC) ou por ambas as partes na tramitação recursiva (desde que a iniciativa do recurso per saltum caiba à parte recorrida e esta, nas contra-alegações, traga novas “questões de direito” às levantadas pela parte recorrente que, neste caso, não assumira a iniciativa per saltum[6]); não serem impugnadas pelas partes quaisquer decisões interlocutórias.

            Apreendendo as Conclusões do Recorrente, que delimitam nesse contexto o objeto do recurso, verificamos que a questão essencial é a legalidade da recusa da separação e restituição do bem (devidamente identificado) à esfera jurídica da devedora “CC” tendo em conta a legitimidade ou não do meio processual de acção de separação e restituição de bens, tal como prevista nos artigos 146º-148º (e 141º, 1, c)) do CIRE, nos moldes pugnados pelo Recorrente e indeferidos pelo tribunal de 1ª instância, tendo em conta a violação ou errada aplicação dos arts. 619º, 1, e 621º do CPC – sendo prejudicial a ofensa da autoridade de caso julgado material, resultante de decisão judicial transitada de procedência de impugnação pauliana em que foi Autor e em que foi declarada a ineficácia de venda do imóvel identificado da “CC” à “BB” –, assim como dos arts. 2º, 2, do CPC, 127º, 2, e 141º, 1, c), do CIRE e 616º, 1 e 4, do CCiv. Ademais, o Recorrente invoca ainda a litigância da massa insolvente da “BB” como violadora do art. 334º do CCiv. Todas são “questões de direito”, abrangidas pelo pressuposto de admissibilidade do art. 674º, 1, CPC.

            Os demais requisitos estão verificados, nomeadamente quanto ao valor da causa e assumindo este o critério único perante “fundada dúvida” sobre o valor da sucumbência, para uma situação em que não temos no estado da tramitação recursiva duas decisões judiciais em confronto nem (no que poderia ser um critério alternativo) um valor seguro da diferença entre o pedido e a improcedência do pedido em 1.ª instância, valendo, pois, o art. 629º, 1, 2ª parte, CPC.

3. A factualidade relevante

A factualidade dada como provada pela 1.ª instância recorrida é a seguinte:
1. Do auto de apreensão de 31-07-2013 consta a verba n.º 8, que corresponde ao prédio urbano descrito na 1.ª Conservatória de Registo Predial de ..., sob o n.º .../....
2. A 17-02-2014, no âmbito do apenso D – Ação Pauliana, foi proferida sentença cujo segmento de “Decisão” aqui se considera integralmente reproduzido (folhas 69 a 76 do dito apenso).
3. A referida sentença resulta e configura decisão final, transitada em julgado da Ação Pauliana instaurada por AA contra a CC, S.A. e a BB, Lda.
4. A acima aludida apreensão a favor da Massa insolvente consta definitivamente registada a favor da mesma, conforme resulta da apresentação 4158 de 25-05-2016, respeitante à apresentação 2371 de 05-09-2013.

Acresce ainda, com interesse para a causa, que:

5. Por sentença datada de 4 de Abril de 2013 foi declarada a insolvência, com caráter restrito, de “BB Ld.ª”, pessoa coletiva n.º ..., com sede na Rua ..., …, 2.º esquerdo, ..., ..., .... (Fls. 87 e ss dos autos.)
6. Por sentença datada de 17 de Fevereiro de 2014, referida supra no ponto 2., foi decidido: “julgo parcialmente procedente a ação e, em consequência: a) declaro ineficaz, em relação ao autor, AA, o contrato de compra e venda celebrado em 04-11-2010, entre a 1.ª ré, ‘CC, S.A.’, e a 2.ª ré, ‘BB, Lda.’, que teve por objeto o prédio urbano, sito na E. N. ..., ..., ..., inscrito na matriz sob o artigo P ....º e descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º ..., da freguesia de ...; b) declaro que o autor pode obter pagamento do seu crédito à custa do dito prédio. / Absolvo as rés do demais peticionado.” (Fls. 94 e ss dos autos.)
7. Na sua contestação, a massa insolvente da “BB” argumentou no essencial que:
 “a sentença [na acção pauliana] (…) não lhe permite [ao Autor] obter a separação da massa insolvente do imóvel apreendido sob a verba nº 8 pelo Senhor AI no presente processo de insolvência, e a consequente restituição do mesmo à esfera da dita CC” (item 5º);
(…) a ação de impugnação pauliana é uma ação meramente declarativa e não constitutiva, não tendo em si mesma a virtualidade de promover qualquer alteração na ordem jurídica – ou seja, o bem transmitido não retorna ao património do devedor, não sai do património do adquirente, podendo aí ser executado” (item 6º);
(…) a BB, enquanto adquirente do imóvel ora em apreço, mantém-se como sua legítima proprietária, não havendo, pois, lugar ao cancelamento de qualquer registo” (item 7º);
“importa evidenciar que, atendendo ao facto do imóvel sub judice não ter sido indevidamente apreendido para a massa, tal circunstância sempre impediria o putativo direito do Autor a requerer a separação do imóvel da massa insolvente da Ré” (item 15º);
“o que é suficiente para se concluir que não está preenchido nenhum dos requisitos para a procedência de qualquer ação de separação e restituição de bens (v. arts. 141º/1 e segs. do CIRE)” (item 17º);
(…) a peticionada restituição do bem imóvel impetrado pelo Autor acarretaria prejuízos de monta para os credores do processo de insolvência, em benefício do Autor, que almejaria por uma via (separação e restituição de bens) o que não conseguiu noutra (ação pauliana)” (item 20º);
 
4. O direito aplicável

As questões a decidir foram identificadas supra, a propósito do requisito de admissibilidade da revista per saltum previsto no art. 678º, 1, c), CPC.

4.1. Da separação da massa insolvente e restituição do bem à esfera jurídica da devedora, em face da (i)legitimidade do meio processual, e da autoridade de caso julgado material anterior

No que respeita à questão essencial invocada pelo Autor-Recorrente, o cerne decisório consiste em saber se, na sequência da declaração judicial de ineficácia, em relação ao Autor, e aqui Recorrente, AA, do contrato de compra e venda do imóvel, celebrado em 2010, entre a “CC, S.A.”, devedora do Autor-Recorrente, e a “BB, Lda.”, que veio depois a ser declarada insolvente em 2013, decorrente da procedência da pertinente acção de impugnação pauliana, assiste ao Recorrente o direito de fazer separar da massa insolvente da “BB” o prédio urbano identificado e restituí-lo à esfera jurídica da devedora “CC” através do recurso à acção de separação e restituição de bens. Estamos no âmbito das relações entre o Autor, como credor do alienante do imóvel, e o sujeito adquirente desse mesmo imóvel, a insolvente “BB”.

4.1.1. O Recorrente alicerça ab initio a sua argumentação na violação dos arts. 619º, 1 («Transitada em julgado a sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele nos limites fixados pelos artigos 580º e 581º (…)») e 621º do CPC. Em rigor, vem afirmar-se que a improcedência da presente acção de separação e restituição, apensa ao processo de insolvência da “BB”, vem desrespeitar os efeitos da autoridade de caso julgado material emergente da sentença proferida na acção de impugnação pauliana[7], também tramitada como apenso desse processo de insolvência, em que, sendo Autor, foram Réus a “CC” e a “BB”, contraentes no contrato de compra e venda impugnado, celebrado, segundo aquela instância, para prejudicar o Autor, aqui Recorrente[8]. Segundo este, a ineficácia, decretada judicialmente, desse negócio em relação a si enquanto credor da “CC” – art. 616º, 4, CCiv.: «Os efeitos da impugnação aproveitam apenas ao credor que a tenha requerido.» – e a imposição, também judicialmente resultante dessa sentença na acção pauliana, de obtenção de pagamento do seu crédito (derivado da sua relação com a devedora “CC”) à custa do referido prédio, para serem respeitadas, têm que, após decretada a insolvência da “BB” e a apreensão do referido imóvel para a massa insolvente, implicar necessariamente a presente acção de separação e restituição: “nos termos do disposto na al. c) do n.º 1 do artigo 141.º do CIRE, a presente demanda constitui o meio idóneo para o autor poder dar cumprimento à sentença que reconheceu o seu direito e obviar à venda do imóvel pela massa insolvente antes de ter obtido o pagamento do seu crédito à custa do dito prédio”, considerando que “a sentença que julgou procedente a impugnação pauliana não pode ser executada se o bem que dela foi objeto integra a massa insolvente”.

No entanto, não se deve considerar que a decisão aqui recorrida, na medida em que faz improceder a intentada acção de separação e restituição, está a postergar a prevalência da decisão judicial proferida na acção pauliana e transitada em julgado, ou seja, a lesar a imutabilidade processual do efeito jurídico-substantivo atingido nessa outra causa[9]. Na verdade, o nosso CCiv. sedimenta uma concepção de impugnação pauliana – fundada no seu carácter eminentemente pessoal ou obrigacional e no seu escopo indemnizatório em proveito do credor requerente, sem efeito constitutivo rescisório, revogatório ou recuperatório, de nulidade ou de anulação[10] –, que atribui ao credor que impugnou com êxito o acto do devedor o direito à restituição dos bens na medida do seu interesse, mas sem que os bens saiam do património do obrigado à restituição, esfera a que o credor recorre para os poder executar e praticar quanto a eles os actos de conservação da garantia patrimonial autorizados por lei (artigo 616º, 1, CCiv.)[11]-[12]. Em suma, não determina o regresso efectivo dos bens alienados ao património do devedor/transmitente. De acordo com a doutrina, a expressão legal usada nesse art. 616º, 1 – “direito à restituição” – “não significa a reentrada dos bens alienados no património do devedor, num movimento retroactivo, nem sequer a entrega dos mesmos ao credor; mas tão-somente o restabelecimento da garantia patrimonial diminuída, através da exposição desses bens, independentemente da sua situação jurídica, aos meios legais conservatórios e executórios colocados à disposição do credor impugnante. Com a impugnação pauliana não se obtém a restauração do património do devedor, mas sim a reconstituição da garantia patrimonial do crédito do impugnante. (…) Os bens alienados continuam, assim, a desempenhar no património do terceiro a sua função de garantia do cumprimento das obrigações do alienante, ficando apenas desactivado o efeito indirecto de subtracção à garantia patrimonial próprio dos actos de transmissão de bens. (…) traduz-se assim num direito potestativo do credor, integrante da estrutura complexa unitária do direito de crédito que consiste em poder sujeitar à execução ou a medidas conservatórias determinados bens do adquirente (os adquiridos ao devedor), sendo aquele alheio à relação constitutiva do crédito”[13]. Se assim é, a circunstância de a impugnação pauliana ter recaído com êxito sobre o imóvel não priva da sua propriedade o adquirente afectado nem obriga a que, para a sua conservação como garantia patrimonial, seja restituído à esfera jurídica do transmitente-devedor do credor-impugnante e triunfante em acção pauliana. Logo, a vinculação de autoridade de caso julgado da sentença na acção pauliana, como acção anterior definidora[14], não abriga efeitos jurídicos que se apresentem como pressuposto indiscutível do efeito jurídico-prático pretendido na acção posterior de separação da massa e restituição do bem, no quadro da relação material controvertida neste processo ulterior.

Tal significa, brevitatis causa, que os efeitos dispositivos do caso julgado na acção pauliana, assentes nos “enunciados decisórios contidos na parte dispositiva”[15] da sentença, não entram em contradição com a apreensão do bem imóvel na massa insolvente da adquirente-afectada “BB”, aplicado que seja, desde logo, o regime da impugnação pauliana. Mas será evidente a priori que a nova condição do terceiro adquirente afectado – “BB” como insolvente – e o ingresso do bem num regime de tutela dos credores do insolvente poderão legitimar que se estabeleça uma adequação do prescrito na acção pauliana tendo em atenção a natureza específica da ineficácia declarada na impugnação pauliana quando se integre o bem-alvo na massa insolvente do adquirente-insolvente[16].

Assim, por ora, concluímos que não procede de todo, em relação à decisão recorrida, a invocação da ofensa de caso julgado pertinente à sentença proferida em 17/02/2014, relativa à acção pauliana tramitada no Apenso … dos autos de insolvência principais, uma vez que não se vislumbra, pelas razões expostas, violação ou errada aplicação dos arts. 619º, 1, e 621º do CPC. Soçobra, por isso, a pretensão recursiva exposta (expressa ou implicitamente ) nas Conclusões “B” a “X”.

            4.1.2. A acção proposta ao abrigo do artigo 146.º, 1, e 2, 1.ª parte, do CIRE pode ter lugar a todo o tempo. E, por aplicação do regime-regra da reclamação dirigida ao administrador da insolvência, destina-se a «separar da massa [insolvente] os bens de terceiro indevidamente apreendidos e quaisquer outros bens, dos quais o insolvente não tenha a plena e exclusiva propriedade, ou sejam estranhos à insolvência ou insuscetíveis de apreensão para a massa» (art. 141º, 1, c), CIRE). Logo, a acção tem como pressuposto necessário a indevida apreensão de bens para a massa, que legitima o exercício do direito à separação de bens da massa insolvente através de meio processual próprio.

As hipóteses de apreensão indevida são, portanto, quatro: (i) quando tenham sido apreendidos bens que pertençam a terceiro; (ii) quando tenham sido apreendidos bens dos quais o insolvente não seja pleno e exclusivo proprietário dos mesmos; (iii) quando se trate de bens estranhos à insolvência; ou (iv) não sejam susceptíveis de apreensão para a massa insolvente (por ex., bens isentos de penhora)[17]. Ora, a partir do momento em que o imóvel em causa não foi indevidamente apreendido para a massa, uma vez que nunca deixou de ser da propriedade da sociedade declarada insolvente – cfr. art. 48º, 1, do CIRE («A massa insolvente destina-se à satisfação dos credores da insolvência, depois de pagas as suas próprias dívidas, e, salvo disposição em contrário, abrange todo o património do devedor à data da declaração de insolvência, bem como os bens e direitos que ele adquira na pendência do processo.») –, falece o direito de requerer a sua separação da massa insolvente da “BB”. Não se entrevê, antes pelo contrário, uma errada aplicação do art. 141º, 1, c), do CIRE, nem do mais genérico art. 2º, 2, também do CIRE, tal como, sem proceder, invoca o Recorrente, que nos fizesse concluir que fosse legítimo o uso desse meio judicial pelo Autor, o que foi indeferido pela sentença recorrida.

4.1.3. Por fim, olhando para as Conclusões “BB” a “FF” e para a visão nelas inscrita e pela qual se bate o Autor-Recorrente, não sendo credor da massa insolvente da “BB” – em rigor, quereria dizer credor da insolvência (art. 47º, 1 vs. art. 51º, 1 e 2, CIRE)mas sim credor da “CC” (transmitente no negócio visado pela impugnação pauliana), o dispositivo da sentença da acção pauliana “[é] oponível a todos os credores da massa insolvente da “BB, Lda.”, uma vez que, “[s]e a ação pauliana fosse apenas eficaz em relação ao ora recorrente (…) – se a ação não fosse efetivamente suscetível de influenciar o valor da massa insolvente –[,] teria corrido como um processo autónomo ao processo de insolvência (artigo 127.º, n.º 2 do CIRE).” Assim, pretende o Recorrente (não obstante a falta de clareza) não concorrer com os credores da insolvência da “BB” em face da apreensão do bem-alvo na impugnação paulina pela massa insolvente – pretendo retirá-lo da massa – e, consequentemente, prevenir-se dessa forma o risco de ocorrer, se não se proceder à separação e à restituição do bem, como refere, “um enorme prejuízo (…) por contraponto a um locupletamento e um enriquecimento ilegítimo, abusivo e imoral dos credores da massa insolvente relativamente ao recorrente.”

Quid juris?

Em primeiro lugar, bem visto o alcance das razões do Recorrente, importa saber, partindo da premissa de que os bens afectados pela impugnação pauliana procedente se mantêm, em regra, no património do adquirente, aí sendo executados e conservados pelo credor impugnante[18], se o alcance do efeito ineficácia declarada pelo tribunal na relação com os credores do terceiro adquirente, autêntica vexata quaestio no contexto dos efeitos da impugnação pauliana. Isto é, ou esse alcance “apenas se limita a permitir que o credor impugnante continue a contar com o bem alienado na garantia geral do seu crédito, podendo executá-lo no património do adquirente, mantendo-se este aí para todos os efeitos, incluindo a sua integração na função de garantia desempenhada no novo património onde se insere. Ou então a ineficácia é mais profunda e impõe que esses bens, além de continuarem ao alcance do credor activo do seu alienante, também não possam garantir a satisfação dos créditos do seu adquirente, na medida em que sejam necessários ao pagamento do credor impugnante”[19]. O azimute deve ser encontrado num equilíbrio razoável de interesses, uma vez que a protecção do credor impugnante não pode ser feita com o sacrifício dos credores do adquirente (que, aliás, passaram a contar com um reforço da garantia patrimonial dos seus créditos): “[n]ão sofrendo o acto impugnado de qualquer vício que afecte a sua validade, não devem estes [credores do adquirente], totalmente alheios ao prejuízo sofrido pelo credor impugnante, verem diminuída, injustificadamente, a sua garantia. Do mesmo modo que são poupados o próprio adquirente e os subadquirentes de boa fé, quando o acto envolve da sua parte um sacrifício patrimonial, por maioria de razão, também a impugnação pauliana não deve afectar os direitos patrimoniais dos credores do adquirente atingido pelo exercício desta figura. (…) A solução contrária resultaria na atribuição de um direito de preferência ao credor impugnante, semelhante ao que caracteriza direitos de garantia específicos, como a hipoteca, sem que o legislador tivesse consagrado expressamente esse direito. O credor impugnante que, como credor comum, apenas gozava da garantia geral sobre o património do devedor, (…) passava a dispor de uma garantia específica sobre os concretos bens alienados. A protecção da sua posição não só repunha a garantia afectada, como a reforçava excessivamente, criando uma preferência especial que permitia ao credor impugnante pagar-se com o produto da venda judicial destes bens, com prevalência aos demais credores (…)”[20]. Não se sustenta tal prevalência, envolvendo a criação de uma preferência legal que o art. 616º, 1, do CCiv. não constitui ex professo, quando, nos termos vistos, “a impugnação pauliana tem a veste de restituição de um enriquecimento, nos casos em que o bem alineado já não se encontra no património do adquirente”, e “o credor impugnante tem um direito de crédito sobre aquele em tudo igual aos restantes credores comuns”[21]. “Dir-se-á que o beneficiário da impugnação é, afinal, um credor do adquirente como qualquer outro. E também os credores pessoais deste podem ter confiado na regularidade da aquisição, contando com os referidos bens. Assim, afigura-  -se preferível a doutrina que subordina o credor que exercer a impugnação pauliana à concorrência, nos termos gerais, dos restantes credores comuns do terceiro obrigado à restituição”[22].

Vejamos se tal ajuda à discussão do segmento discursivo da parcela analisada das Conclusões do Recorrente.

Os credores da “BB” passaram a ser credores da insolvência da “BB”, de acordo com os termos e conteúdo do art. 47º, 1 a 3, do CIRE. E o aqui Autor, à partida, não é considerado credor daquela insolvência, pois era sim credor da contraparte vendedora da compradora “BB”, depois declarada insolvente. Mas no património desta, porém, encontrava-se a garantia de execução da impugnação pauliana decretada, correspondente ao bem depois apreendido na massa insolvente da “BB”. Assim, de acordo com a visão adoptada, estariam em concorrência o credor do transmitente-impugnante pauliano, aqui Autor-Recorrente, e os credores da insolvência, em face do bem transmitido para o adquirente, depois insolvente, apreendido na massa como efeito da insolvência. É essa concorrência que o Recorrente pretende evitar com a procedência da acção, uma vez que poderá lesar a garantia concedida pela impugnação pauliana procedente.

Sendo certo que, nos autos, a sentença da impugnação pauliana é posterior à sentença de declaração de insolvência do adquirente do bem cuja aquisição foi declarada ineficaz em relação ao credor do transmitente, isto é, que a impugnação pauliana estava pendente de decisão uma vez declarada a insolvência da adquirente “BB”, o Recorrente chama à colação, para esse efeito de invocar a primazia do seu crédito perante os credores da insolvência da “BB” – nas suas palavras, invocar a oponibilidade da ineficácia decidida pela decisão judicial da acção pauliana em face dos credores da insolvência –, por mor da condição de insolvente do adquirente, o art. 127º, 2, do CIRE, enquanto inibidor da apensação ao processo de insolvência pertinente das acções de impugnação pauliana pendentes à data da declaração de insolvência (ou propostas ulteriormente). Este preceito, tendo em vista a sua dilucidação, integra-se na disciplina da resolução de actos prejudiciais em benefício da massa insolvente (arts. 120º-127º CIRE). 

Nesse regime do CIRE é pacífico que, dentro dos instrumentos de reacção contra essa prejudicialidade negocial, “a impugnação pauliana constitui um instrumento subsidiário em relação à resolução em benefício da massa. Bem se compreende que assim seja. Enquanto esta determina a reversão dos bens ou valores para a massa insolvente, sendo, assim, os seus efeitos susceptíveis de aproveitar a todos os credores, aquela detém um marcado carácter pessoal e dirige-se, como é seu timbre, à exclusiva tutela do interesse do credor impugnante (…), desviando-se daquilo que, em rigor, se imporia em face da natureza universal do processo de insolvência, ou seja, a par conditio creditorum[23]. Na verdade, o decretamento da resolução em benefício da massa pelo administrador da insolvência preclude a possibilidade de os credores da insolvência recorrerem à impugnação pauliana dos actos abrangidos por essa resolução, nos termos do n.º 1 do art. 127º. A contrario sensu, os credores da insolvência não estão impedidos de recorrer à impugnação pauliana, desde que e enquanto não se verificar a resolução em benefício da massa insolvente[24].

Por isso, o art. 127º, 2, «estabelece que estas acções, pendentes à data da declaração de insolvência ou propostas anteriormente[,] não serão apensas ao processo de insolvência e, em caso de resolução do acto pelo administrador da insolvência, só prosseguirão os seus termos se tal resolução vier a ser declarada ineficaz por sentença definitiva, a qual terá força vinculativa no âmbito daquelas acções quanto às questões que tenha apreciado, desde que não ofenda caso julgado de formação anterior». E é neste âmbito de aplicação, respeitante à articulação entre a resolução em benefício da massa insolvente e as impugnações paulianas de actos de transmissão do devedor insolvente “resolúveis” (nos termos do art. 120º, 1 e 2, do CIRE), que se aplica o art. 127º, 2. Fora, portanto, do âmbito de factos elencados nos autos, em que se mobiliza a impugnação, por terceiro que não é credor da insolvência, de acto de aquisição do devedor insolvente- adquirente de bem que se repercute no valor da massa insolvente. Aqui, a apensação do processo de impugnação pauliana estriba-se a título próprio no art. 85º, 1, do CIRE: «Declarada a insolvência, todas as ações em que se apreciem questões relativas a bens compreendidos na massa insolvente, intentadas contra o devedor, ou mesmo contra terceiros, mas cujo resultado possa influenciar o valor da massa, e todas as ações de natureza exclusivamente patrimonial intentadas pelo devedor são apensadas ao processo de insolvência, desde que a apensação seja requerida pelo administrador da insolvência, com fundamento na conveniência para os fins do processo». Assim, também por aqui soçobra o Recorrente na invocação da violação desse art. 127º, 2, do CIRE, para fundar a necessidade de retirar o bem-alvo da massa insolvente da “BB” e evitar a concorrência dos credores da sua insolvência.

Não obstante.

O recurso ao regime do art. 127º, que finaliza a disciplina da resolução de actos em benefício da massa insolvente e foi invocado pelo Recorrente, não pode deixar fora de análise o respectivo n.º 3. Que reza assim: «Julgada procedente a ação de impugnação [prevista no art. 127º, 2], o interesse do credor que a tenha instaurado é aferido, para efeitos do artigo 616.º do Código Civil, com abstração das modificações introduzidas ao seu crédito por um eventual plano de insolvência ou de pagamentos». Esta prescrição, aplicada literal e sistematicamente aos actos impugnados em que o devedor-insolvente é transmitente e o impugnante pauliano é seu credor, impõe que o crédito do impugnante pauliano “é considerado, quanto à medida do direito à restituição, nos termos e para os efeitos do n.º 1 do art. 616º, tal como tenha sido reclamado e verificado no processo de insolvência[25]. E mais: “Na aferição do interesse do credor, o preceito (…) atende ao disposto no art. 616º do C. Civ., nomeadamente ao seu n.º 4, quando estabelece que a impugnação só aproveita ao impugnante”[26]. Da letra da norma, assim, tendo em conta que o bem continua na titularidade do adquirente do insolvente, “parece resultar que a procedência de uma acção pauliana não obsta a que os seus efeitos se produzam relativamente a bens que se encontrem na massa insolvente, a fim de satisfazer o credor que deles beneficie – e que é apenas aquele que tenha intentado a acção em causa”[27], “com a consequente violação do princípio da igualdade dos credores em caso de insolvência”[28]. Por isso, em homenagem ao princípio par conditio creditorum, os bens relativamente a cuja alienação esteja pendente acção de impugnação pauliana quando o devedor é declarado insolvente devem regressar a título excepcional à massa insolvente, se a acção pauliana triunfar, e o credor autor da acção concorrerá nessas circunstâncias patrimonialmente acrescidas com os restantes credores da insolvência[29]

Ora, o art. 127º, 3, tem a aptidão para, em face da manifesta semelhança de situações e da justificação do caso previsto na lei, se aplicar analogicamente às acções paulianas pendentes e aos actos nelas impugnados em que o insolvente é o adquirente na transmissão visada com êxito pela impugnação pauliana pendente à data da declaração de insolvência e, ainda para mais, o bem-alvo já se encontra apreendido legitimamente na massa insolvente.

É uma solução equilibrada e que concorre, por fim, para a razão de a sentença recorrida ter decretado que o meio judicial da separação e restituição de bens não era o próprio nem o adequado para a pretensão do Autor, aqui Recorrente.

Por um lado, tem o alcance de corresponder à melhor opção – como vimos ser, em geral, no conflito entre o credor impugnante e os credores do adquirente[30]de os credores-impugnantes paulianos, mesmo não sendo credores do insolvente, concorrerem em igualdade com os demais credores da insolvência, com o consequente impedimento de, após a declaração da insolvência de um sujeito, se permitir que algum credor obtenha na satisfação do seu crédito uma posição privilegiada ou mais eficaz do que a que assiste os restantes credores da insolvência[31]. Por outro, não permite claudicar ao credor-impugnante a garantia conferida pelo art. 616º, 1 e 4, do CCiv., desde logo pelo reconhecimento expresso que tal analogia e aplicação ao caso do art. 127º, 3, do CIRE permite na situação do adquirente do bem se ter declarado judicialmente insolvente, e, ainda que não seja originariamente credor do insolvente, ser tratado como credor da insolvência, à luz do art. 47º, 1, do CIRE, pois nessa categoria se incluem como tal os «titulares de créditos de natureza patrimonial sobre o insolvente, ou garantidos por bens integrantes da massa insolvente, cujo fundamento seja anterior à data dessa declaração»[32] (v. ainda o art. 127º, 1, in fine, e 4, CIRE)[33].

Razão pela qual não procede, por força da própria lei/CIRE, a violação dos arts. 616º, 1 e 4, do CCiv., ao ser recusada pela sentença recorrida a separação do bem-alvo da impugnação da massa insolvente através de acção prevista no CIRE de separação e restituição de bens tal como foi pugnado pelo Recorrente.

4.2. Da litigância da massa insolvente em abuso de direito/má fé processual

No ponto XX das suas Conclusões, o Recorrente sustenta ainda que a massa insolvente litiga em evidente abuso de direito (nos termos do art. 334º do CCiv.), em referência ao invocado no antecedente ponto 4.1.3. Não obstante o “abuso de direito de acção” (em sentido amplo, referido ao “exercício de quaisquer posições no processo”) não ser absorvido pelo instituto da litigância de má fé (art. 542º do CPC)[34], temos por adequado que, sempre que não se explicite e concretize a modalidade de exercício inadmissível e ilegítimo no processo[35], apenas poderemos, aproveitando-o nos termos do art. 547º do CPC, aferir desse abuso uma vez ele traduzido nas situações (mais restritas e exigentes) de manifesto e inequívoco comportamento processual censurável[36] previsto nesse art. 542º, 2, do CPC («Diz-se litigante de má-fé quem, com dolo ou negligência grave: a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar; b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa; c) Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação; d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objetivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a ação da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.»). Logo, só estaremos legitimados a verificar se a massa insolvente da “BB” litiga de má fé quando deduz oposição em primeira instância à pretensão do Autor com o conteúdo apresentado e constante dos autos, de acordo com o quadro de reprovação da boa fé processual exigida pelo art. 8º do CPC.
Da conjugação do que foi referido e sustentado, não se vê que tenham sidos exibidos argumentos nessa oposição que, tendo em conta as als. a) e d) do art. 542º, 2, do CPC possam ser vistos como litigância gravemente atentatória da boa fé processual. Tanto mais que a massa insolvente, aqui Recorrida, apenas veio, em síntese, sustentar na sua litigância (reiterada nas suas contra--alegações) que, de acordo com o CIRE, não houve apreensão indevida do bem cuja transmissão foi declarada ineficaz no âmbito da acção de impugnação pauliana apensa, uma vez que a procedência desta acção não teve como efeito a privação da propriedade de tal bem na esfera da insolvente “BB”[37]. Tanto mais que, para se julgar como litigante de má fé uma parte em juízo, se exige nessa conduta actuação qualificadamente censurável, com dolo ou com negligência grave, ou seja, sabendo da falta de fundamento da sua oposição ou encontrando-se numa situação em que se lhe impunha que tivesse esse conhecimento. Do essencial da fundamentação de análise à questão essencial dos autos resulta que não pode de todo julgar-se que haja razões para condenar a Contestante/Recorrida em litigância de má fé, claudicando esta (singela) pretensão do recurso.

III. DECISÃO

Pelo exposto, acorda-se em julgar improcedente a revista per saltum, confirmando-se a decisão recorrida.

Custas pelo Recorrente.

STJ/Lisboa, 11 de Julho de 2019

Ricardo Costa (Relator)

Assunção Raimundo

Ana Paula Boularot

SUMÁRIO (arts. 663º, 7, 679º, CPC)

___________________________________
[1] Processo n.º 1444/08.5TBAMT-A.G1.S1, Rel.: Pinto de Almeida, in www.dgsi.pt.
[2] Processo n.º 841/14.1TYVNG-A.P1.S1, Rel.: Nuno Cameira, in www.dgsi.pt.
[3] Processo n.º 106/13.6TYVNG-B.P1.S1, Rel.: Ana Paula Boularot, in www.dgsi.pt.
[4] Carvalho Fernandes/João Labareda, Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, 2.ª ed., Quid Juris, Lisboa, 2013, sub art. 14º, pág. 130. V., ainda na jurisprudência da 6.ª Secção do STJ sobre esse argumento, o Acórdão de 6/3/2014, processo n.º 462/10.8TBVFR-L.P1.S1, Rel. Azevedo Ramos, com disponibilidade de Sumário in A admissibilidade do recurso de revista no processo de insolvência – A jurisprudência recente da 6.ª Secção do STJ, Assessoria Cível do STJ, Novembro de 2018, pág. 34.
[5] Francisco Ferreira de Almeida, Direito processual civil, volume II, 2.ª ed., Almedina, Coimbra, 2019, pág. 605.
[6] Veja-se, em abono da interpretação quanto ao objecto do recurso per saltum: o art. 678º, 1, c), do CPC refere-se às alegações das partes para determinar as “questões de direito” a apreciar no recurso directo; o art. 678º, 2, do CPC fornece a possibilidade e prazo para a parte recorrente (na circunstância) apelante se pronunciar, quanto à admissibilidade do recurso directo e, se for o caso, para as novas “questões de direito” adicionais e, por tal legitimação em recurso, submetidas à apreciação do STJ. Tal significa que, a contrario sensu, não podem ser apreciadas “questões de direito” acrescentadas às Conclusões do recorrente pelas contra-alegações do recorrido se não foi esta a parte que desencadeou o recurso per saltum e as contra-alegações não têm aptidão para ampliar o objecto do recurso – como é o caso dos presentes autos.
[7] A autoridade de caso julgado, enquanto efeito e incidência do caso julgado material, visa garantir a vinculação dos órgãos jurisdicionais e o acatamento pelos particulares de uma decisão judicial transitada, na circunstância de se verificar diversidade entre objectos processuais e funcionar o objecto processual anterior como condição prejudicial dependente para a apreciação do objecto processual posterior (efeito vinculativo à não repetição e à não contradição da decisão anterior em processo subsequente com diverso objecto). Por outro lado, postula ainda esta perspectiva o efeito positivo (e normativo) da autoridade de caso julgado: a decisão revestida de autoridade, associada à sua imposição externa, é, em função da “consumpção prejudicial” ou de “concurso material” entre os objectos processuais, um pressuposto ou uma premissa da causa subsequente, de tal forma que é um antecedente na apreciação da nova causa no sentido da prevalência do sentido decisório da primeira decisão. V. fundamentalmente (que seguimos na terminologia dogmática) Teixeira de Sousa, “O objecto da sentença e o caso julgado material (Estudo sobre a funcionalidade processual)”, BMJ n.º 325, 1983, págs. 159-160, 171 e ss, em esp. 171-172, 175, 178-179, Id., “Prejudicialidade e limites objectivos do caso julgado”, RDES, 1977, págs. 305-308, Id., “Preclusão e ‘contrário contraditório’ – Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10.10.2012”, CDP n.º 41, 2013, págs. 24-25, 28-29, Lebre de Freitas, “Providência cautelar: desistência do pedido, repetição e caso julgado”, Estudos sobre direito civil e processo civil, Coimbra Editora, Coimbra, 2002, págs. 494-496, Rui Pinto, “Exceção e autoridade de caso julgado – algumas notas provisórias”, Julgar online, 2018, págs. 4-7, 17-19, 25 e ss (“efeito positivo externo”); também, com proveito, Francisco Ferreira de Almeida, Direito processual civil cit., págs. 719 e ss. 
[8] E assumindo-se, sob pena de falecimento da questão na origem, que a autoridade de caso julgado abrange – tendo como critério subjectivo, no confronto dos processos conexos, as mesmas pessoas, sob o ponto de vista da qualidade física e intervenção processual, assim como aquelas que sejam os mesmos sujeitos do ponto de vista da sua qualidade jurídica (art. 581º, 2, CPC: identidade dos sujeitos abrangidos) – a massa insolvente da “BB”, enquanto sucessora patrimonial da sociedade insolvente, numa condição adquirida por força dessa insolvência, representada pelo administrador da insolvência, constituindo património autónomo de afectação legal à satisfação de um conjunto próprio de dívidas da massa e dos créditos da insolvência, com personalidade judiciária (arts. 46º, 1, 81º, 1, 4, 51º, 12º, a), CPC). Sobre tal “condição subjectiva” para a força vinculativa da autoridade de caso julgado (e não só da “excepção de caso julgado” fora do seu objecto processual), v., com jurisprudência relevante, Rui Pinto, “Exceção e caso julgado…”, loc. cit., págs. 28 e ss (em conjugação com as págs. 10-12 [“estão abrangidos pelos efeitos do caso julgado não somente os concretos titulares do direito ou bem litigioso que eram partes na causa à data do trânsito em julgado da sentença (…), como, ainda, os seus transmissários ou sucessores posteriores ao trânsito em julgado.”], 20-21).
[9] V. Maria José Capelo, A sentença entre a autoridade e a prova. Em busca de traços distintivos do caso julgado civil, Almedina, Coimbra, 2015 (reimp.: 2016), pág. 51.
[10] V., ainda e por todos, as anotações de Pires de Lima/Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, 4.ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 1987, sub art. 610º, págs. 626-627, sub art. 616º, págs. 633-634.
[11] O art. 818º permite a execução de bens de terceiro, quando sejam objecto de acto praticado em prejuízo do credor, que este haja procedentemente impugnado, nos termos dos arts. 610º e ss, em conformidade com o disposto pelo art. 616º, 1, sempre do CCiv.
[12] V., na doutrina, Almeida Costa, Direito das obrigações, 12.ª ed., Almedina, Coimbra, 2009, págs. 868-869, Menezes Leitão, Direito das obrigações, volume II, Transmissão e extinção das obrigações. Não cumprimento e garantias do crédito, 8.ª ed., Coimbra, Almedina, 2011, pág. 321 (“Se o adquirente estiver de boa fé «responde só na medida do seu enriquecimento» (art. 616º, n.º 3). Se o adquirente estiver de má fé é responsável pelo valor dos bens que tenha alienado, bem como dos que tenha perecido ou se hajam deteriorado por caso fortuito, salvo se provar que a perda ou deterioração se teriam igualmente verificado no caso de os bens se encontrarem no poder do devedor ([art.] 616º, nº 2)”); António Menezes Cordeiro, Tratado de direito civil português, X, Direito das obrigações. Garantias, Almedina, Coimbra, 2017, pág. 388-389 (“A regra da restituição deve ser entendida à luz do enriquecimento sem causa, tamizada com a ideia da responsabilidade patrimonial. Não se trata de uma restituição material dos bens, do património do terceiro para o do devedor (…). Está em jogo, tão-só, uma restituição do valor: o montante da aquisição (‘enriquecimento’) até ao valor garantido (o ‘empobrecimento’)”); Maria de Fátima Ribeiro, “Um confronto entre a resolução em benefício da massa insolvente e a impugnação pauliana”, IV Congresso de Direito da Insolvência, coord.: Catarina Serra, Almedina, Coimbra, 2017, págs. 149-150.
Na jurisprudência do STJ, v., exemplarmente, o Acórdão de 20/3/2014, processo n.º 1429/11.4TBPNF.P1.S1, Rel.: Granja da Fonseca, in www.dgsi.pt.
[13] João Cura Mariano, Impugnação pauliana, 2.ª ed., Almedina, Coimbra, págs. 242 e ss.
[14] “A autoridade de caso julgado implica o acatamento de uma decisão proferida em ação anterior cujo objeto se inscreva, como pressuposto indiscutível, no objeto de uma ação posterior, ainda não integralmente idêntico, de modo a obstar a que a relação jurídica ali definida venha a ser contemplada, de novo, de forma diversa”: Ac. do STJ de 8/11/2018, processo n.º 478/08.4TBASL.E1.S1, Rel. Tomé Gomes, in www.dgsi.pt.
[15] Rui Pinto, “Exceção e caso julgado…”, loc. cit., pág. 18.
[16] V. infra, 4.1.3.
[17] V. Carvalho Fernandes/João Labareda, Código da Insolvência… cit., sub art. 141º, pág. 575.
[18] A regra pode com fundamento admitir excepções sempre que a execução do bem no património do obrigado à restituição não seja possível – como será justamente o caso de, na pendência da acção de impugnação pauliana, o devedor ser declarado insolvente, pois então o bem deve reentrar no património do devedor, a fim de servir à satisfação de todos os créditos que contra esse património são invocados: assim, Pires de Lima/Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, sub art. 616º, pág. 634; Paula Costa e Silva, “Impugnação pauliana e execução. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 11.2.2003, Agravo 3895/02”, CDP n.º 7, Julho/Setembro 2004, págs. 54 e ss, em esp. pág. 56 (a impugnação pauliana deixa de ter eficácia pessoal “para ter uma eficácia universal”); Maria de Fátima Ribeiro, “Um confronto…”, loc. cit., págs. 160-161.
[19] João Cura Mariano, Impugnação pauliana cit., págs. 266-267.
[20] João Cura Mariano, Impugnação pauliana cit., págs. 267-268.
[21] João Cura Mariano, Impugnação pauliana cit., pág. 268.
[22] Almeida Costa, Direito das obrigações cit., pág. 871 (sublinhado nosso), no âmbito do vertido nas págs. 869 e ss, com referência útil a doutrina (dividida) e jurisprudência; concordante: Menezes Leitão, Direito das obrigações, volume II cit., nt. 622 – págs. 321-322.
[23] Assim, o Ac. do STJ de 19/12/2018, processo n.º 930/13.0TVPRT.P1.S1, Rel. Catarina Serra, in www.dgsi.pt. Na doutrina, por ex., v. Carvalho Fernandes/João Labareda, Código da Insolvência… cit., sub art. 127º, pág. 544, Maria do Rosário Epifânio, Manual de direito da Insolvência, 7.ª ed., Almedina, Coimbra, 2019, pág. 263.
[24] Gravato Morais, Resolução em benefício da massa insolvente, Almedina, Coimbra, 2008, pág. 205; Carvalho Fernandes/João Labareda, Código da Insolvência… cit., sub art. 127º, pág. 543; Menezes Leitão, Direito da insolvência, 8.ª ed., Almedina, Coimbra, 2018, págs. 233-234 (com o acrescento útil: “A omissão do administrador da insolvência em promover a resolução em benefício da massa insolvente tenderá a estimular as acções de impugnação paulianas individuais até porque o prazo para as mesmas (art. 618º CC) é consideravelmente superior àquele que se prevê para a resolução (art. 123º)”); Maria de Fátima Ribeiro, “Um confronto…”, loc. cit., pág. 167.
[25] Carvalho Fernandes/João Labareda, Código da Insolvência… cit., sub art. 127º, pág. 544, itálico nosso.
[26] Ainda Carvalho Fernandes/João Labareda, Código da Insolvência… cit., sub art. 127º, pág. 544.
[27] Maria de Fátima Ribeiro, “Um confronto…”, loc. cit., pág. 169.
[28] Assim adverte Menezes Leitão, Direito da insolvência cit., pág. 234.
[29] Seguimos o legado da precípua jurisprudência adoptada nesta 6.º Secção pelo Ac. do STJ de 11/7/2013, processo n.º 283/09.0TBVFR-C.P1.S1, Rel.: Fonseca Ramos, in www.dgsi.pt: “Nos casos em que os executados são declarados insolventes na pendência de acção de impugnação pauliana, por razões de justiça material e respeito pela execução universal que a insolvência despoleta, os bens alienados e objecto de acção de impugnação pauliana, devem, excepcionalmente, regressar ao património do devedor, para, integrando a Massa Insolvente[,] responderem perante os credores da insolvência, sendo o crédito do exequente e Autor triunfante na acção de impugnação pauliana, tratado em pé de igualdade [com a ressalva do estatuído no art. 127º, n.º 3, do CIRE] com os demais credores dos inicialmente executados, ora insolventes (…)”. Convergente: Maria de Fátima Ribeiro, “Um confronto…”, loc. cit., pág. 170.
[30] V. supra, 4.1.1.
[31] Sobre o ponto, v. João Cura Mariano, Impugnação pauliana cit., pág. 269.
[32] Neste sentido, v. Carvalho Fernandes/João Labareda, Código da Insolvência… cit., sub art. 47º, pág. 306, Alexandre Soveral Martins, Um Curso de Direito da Insolvência, 2.ª ed., Almedina, Coimbra, 2016, págs. 272, 276.
[33] Recordemos o que anunciámos supra, ponto 4.1.1., último parágrafo.
[34] V. Menezes Cordeiro, Litigância de má fé, abuso do direito de ação e culpa “in agendo”, 3.ª ed. (à luz do Código de Processo Civil de 2013), Coimbra, Almedina, 2014 (reimp. 2016), págs. 43, 141, 146, 205 e ss.
[35] V. Menezes Cordeiro, Litigância de má fé… cit., págs. 141-143 (em esp., “proibição de consubstanciar dolosamente posições processuais”, “proibição de venire contra factum proprium”, “proibição de abuso de poderes processuais” e “supressio”).
[36] Menezes Cordeiro, Litigância de má fé… cit., pág. 65, com jurisprudência.
[37] Cfr. supra, ponto 3., item 7.