Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
5512/15.9T8CBR.C1.S1
Nº Convencional: 6ª. SECÇÃO
Relator: NUNO CAMEIRA
Descritores: PROCESSO ESPECIAL DE REVITALIZAÇÃO
PRINCÍPIO DA IGUALDADE
ADMINISTRADOR DE INSOLVÊNCIA
REJEIÇÃO
HOMOLOGAÇÃO
CONHECIMENTO OFICIOSO
BANCO
CREDOR
CREDITO LABORAL
RECURSO DE REVISTA
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
OPOSIÇÃO DE JULGADOS
Nº do Documento: SJ
Data do Acordão: 02/07/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO FALIMENTAR - PROCESSO ESPECIAL DE REVITALIZAÇÃO / PRINCÍPIO DA IGUALDADE ENTRE CREDORES / RECURSOS.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - PROCESSO DE DECLARAÇÃO / RECURSOS / RECURSO DE REVISTA / FUNDAMENTOS DA REVISTA / PODERES DE COGNIÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA.
Doutrina:
- Carvalho Fernandes e João Labareda, “C.I.R.E.” Anotado, 2.ª edição, 826.
- Filipa Gonçalves, «O Processo Especial de Revitalização», em Estudos de Direito da Insolvência, coordenação de Maria do Rosário Epifânio, 8.
– Nuno Salazar Casanova e David Sequeira Dinis, O Processo Especial de Revitalização – Comentários aos artigos 17.º-A a 17.º-I do C.I.R.E., 143, 144.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DA INSOLVÊNCIA E DA RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS (CIRE): - ARTIGOS 14.º, N.º 1, 17.º-D, N.ºS 8 E 9, 17.º- F, 194.º, 215.º, N.º 5.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 652.º, N.ºS 3 E 4, 674.º, N.º 3, 682.º, N.ºS 1 E 2.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

-DE 14/11/2016, PROC.º 1519/11.3TBVRL.S1-A.
Sumário :
I - A oposição de julgados que releva no contexto do n.º 1 do art. 14.º do CIRE verifica-se quando a mesma norma jurídica se mostra, no acórdão recorrido e no acórdão fundamento, interpretada e/ou aplicada em termos frontalmente opostos e tal se revela decisivo para os resultados a que se chegou num e noutro aresto.

II - Não ocorre tal contradição decisória quando, no acórdão recorrido, se considerou que o plano de revitalização aprovou créditos indisponíveis da Segurança Social e da CGA sem o consentimento destas instituições e violou, de forma não negligenciável, regras procedimentais e o princípio da igualdade entre credores e, nos acórdãos fundamento, se decidiu, respectivamente, que uma moratória não extingue nem reduz o crédito da segurança social e que é ineficaz o plano de recuperação que viole as normas que estipulam a indisponibilidade dos créditos públicos.

III - Estando em causa o princípio da igualdade dos credores – um conceito indeterminado cujo preenchimento requer uma ponderação casuística – e posto que os factos julgados nos acórdãos fundamento indicados apresentam pontos de facto que coincidem com os do acórdão recorrido, é de concluir pela existência de oposição de julgados.

IV - O STJ, no desempenho da sua tarefa de aplicar definitivamente o regime jurídico que julgue adequado, não pode laborar sobre factos que não foram adquiridos para o processo ou sobre os qualificativos aditados pelo recorrente aos factos provados.

V - Deve considerar-se que constitui violação não negligenciável de normas procedimentais, a conduta de um administrador provisório que, após ter realizado as negociações tendentes à elaboração do plano de revitalização apenas com um credor hipotecário, enviou aos restantes credores o plano aprovado e lhes concedeu um prazo de 3 dias para se pronunciarem, pondo assim em causa o interesse de uma parte considerável dos credores.

VI - Inexistindo razão atendível para que o plano de revitalização trate privilegiadamente as entidades bancárias credoras face aos credores titulares de créditos laborais, é de concluir pela ofensa ao princípio da igualdade entre credores, o que constitui causa de recusa oficiosa da sua homologação.

Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

I. Síntese dos termos essenciais da causa e do recurso

A) AA intentou o presente processo especial de revitalização, ao abrigo do artº 17º-C, nº 3, do CIRE.

Concluídas as negociações, foi apresentado o mapa da votação e os votos regularmente emitidos, dos quais resulta que o total de votos relacionados é de 3.556.128,48 € e o de votos emitidos 2.790.351,74 €.

A favor e contra a aprovação do plano votaram credores detentores de créditos no valor de, respectivamente, 2.024.570,26 € e 765.781,48 €.

Obtiveram-se, assim, os quoruns exigidos pelo artº  17º-F, nº 3, al. a) do CIRE, uma vez que votaram o plano de revitalização credores cujos créditos representam mais de um terço do total dos créditos relacionados com direito de voto (quorum constitutivo) e vota­ram favoravelmente credores cujos créditos constituem mais de dois terços do total dos votos emitidos, sendo que mais de metade dos votos emitidos correspondem a créditos não su­bordinados (quorum deliberativo).

Apresentaram-se vários grupos de credores, a saber - BB, CC, DD e EE; FF e GG; HH,II e JJ; KK - pedindo a recusa de homologação do plano de recuperação aprovado com funda­mentos subsumíveis ao disposto no artº 215º do CIRE (violação não negligenciável de regras pro­cedimentais ou das normas aplicáveis ao respectivo conteúdo).

A devedora e o administrador judicial provisório responderam, defendendo a regularidade do processo negocial e a legalidade, formal e substancial, do plano de recuperação.

Por sentença de 8/1/16 foi homologado o plano de recuperação da requerente.

Apelaram o MP e, separadamente, os seguintes credores, trabalhadores da requerente: BB,II e KK; KK;BB; GG e FF.

Ao abrigo do artº 634º, nº 2, a), do CPC, CC, DD, EE e LL, de igual modo credores e trabalhadores da requerente, declararam aderir ao recurso de BB, por ser comum ao seu o interesse por este defendido.

Por acórdão unânime de 28/6/16 a Relação de Coimbra julgou as apelações procedentes, revogou a decisão da 1ª instância e recusou a homologação do plano.

Agora é a requerente AA que, inconformada, pede revista, sustentando a admissão do recurso e, a final, a reposição da sentença da 1ª instância.

Correspondendo ao convite para aperfeiçoar as suas alegações, nos termos do artº 639, nº 3, do CPC, completando-as e esclarecendo-as, a recorrente concluiu do seguinte modo:

I. O presente recurso é admissível nos termos do nº1 do art. 14º do CIRE, uma vez que o douto acórdão recorrido está em frontal oposição com outros acórdãos, já proferidos pelos Tribunais da Relação e pelo Su­premo Tribunal de Justiça que, no domínio da mesma legislação, decidiram de forma divergente as cinco questões fundamentais de direito que nele são conhecidas e sobre as quais o Venerando Supremo Tribunal de Justiça não fixou ainda jurisprudência.

II. A primeira questão fundamental de direito é a de saber se o Plano de Recuperação ao prever o paga­mento em prestações dos créditos detidos por instituições públicas, sem que estas tenham dado o seu assenti­mento, viola o princípio da indisponibilidade dos créditos públicos.

III. No acórdão recorrido, diante de um Plano de Recuperação da AA, em que esta se propunha a pagar integralmente o crédito detido pela Caixa Geral de Aposentações e pela Segurança Social em 150 (cento e cinquenta) prestações, o Tribunal entendeu que tal pagamento precaucional violava o princípio da indisponibilidade dos créditos públicos.

IV. No acórdão fundamento – o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 11 de julho de 2013, relatado pelo Mmo. Juiz Desembargador António Sobrinho, proferido no âmbito do processo nº 1411/12.4TBEPS-A.G1- diante de um Plano de Recuperação que previa o pagamento integral do cré­dito da Segurança Social em prestações, o Tribunal da Relação de Guimarães entendeu que, como o Plano de Recuperação não extinguia, nem reduzia o crédito da Segurança Social (mantendo-o no seu preciso montante), não podia entender-se ter ocorrido violação do princípio da indisponibilidade dos créditos públi­cos.

V. Fê-lo considerando ainda que a pendência do PER é uma das situações que autoriza o pagamento prestacional de dívidas à Segurança Social (alínea a) do nº2 do art. 190º do Código Contributivo) e que esse pagamento prestacional se encontrava sujeito a garantia idónea, não existindo, assim, vício não negli­genciável, cuja verificação em concreto pudesse constituir requisito bastante para recusa oficiosa da homolo­ga­ção, nos termos do art. 215º do CIRE, aplicável ex vi do nº 5 do art. 17ºF do CIRE.

VI. Quer, no douto acórdão recorrido, quer no douto acórdão fundamento, a situação de facto é seme­lhante, traduzida na circunstância de em ambos estarem em causa Processos Especiais de Revitalização, regulados pela mesma legislação (o Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas), onde foram aprovados e homologados os Planos de Recuperação propostos pelos devedores revitalizandos e de, em tais Planos, se ter previsto o pagamento integral dos créditos detidos por instituições públicas em prestações.

VII. Em ambos os acórdãos, discutia-se se estabelecimento de um plano de pagamento em prestações vi­ola o princípio da indisponibilidade dos créditos públicos, com base nos nºs 2 e 3 do art. 30º da Lei Geral Tributária, na sua redação conferida pelo art. 125º da Lei 55-A/2010 de 31 de dezembro.

VIII. O certo é que, apesar de a situação fáctica em ambos os acórdãos ser igual – previsão de um plano prestacional no PER, sem o alegado consentimento das instituições públicas – e de terem sido convocados os mesmos preceitos legais para as apreciar - os nºs 2 e 3 do art. 30º da LGT – a verdade é que em tais acór­dãos se fizeram diferentes interpretações do seu conteúdo e alcance.

IX. No acórdão recorrido entendeu-se que o princípio da indisponibilidade dos créditos fiscais impede que o crédito das instituições públicas possa ser objeto de pagamento em prestações sem o consentimento de tais instituições.

X. Já no acórdão fundamento entendeu-se que só a extinção ou redução dos créditos fiscais no Plano de Recuperação importaria a violação do princípio da indisponibilidade dos créditos públicos, pelo que o paga­mento integral de tais créditos, ainda que em prestações, não viola o referido princípio da indisponibi­lidade dos créditos fiscais, ainda que tal instituição não tenha dado o seu assentimento a tais condições de paga­mento.

XI. Consequentemente, a conclusão que se retirou no acórdão recorrido foi no sentido de revogar a decisão recorrida e de não homologar o Plano de Revitalização, enquanto que no douto acórdão fundamento se deci­diu confirmar a decisão de homologação do Plano de Recuperação.

XII. Salvo o devido respeito pelo que vem decidido no douto acórdão recorrido, a solução que vem consa­grada no douto acórdão fundamento é a que deve prevalecer, uma vez que o legislador quis consagrar uma tutela excecional e restrita aos casos de extinção do crédito público e de redução do seu montante, não se estendendo tal regime a situações de mera modificação dos seus prazos de pagamento no âmbito do PER.

XIII. A segunda questão fundamental e sem prescindir é a de saber se a violação do princípio da indispo­nibilidade dos créditos públicos impõe a não homologação do Plano de Recuperação na sua globali­dade ou se o torna apenas ineficaz relativamente aos credores visados.

XIV. No acórdão recorrido, o Tribunal entendeu que se o Plano de Recuperação da AA, ao estabele­cer o pagamento integral dos créditos da Caixa Geral de Aposentações e da Segurança Social em presta­ções, violava o princípio da indisponibilidade dos créditos públicos, a consequência não poderia deixar de ser a recusa da sua homologação.

XV. No acórdão fundamento - o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 13 de janeiro de 2015, relatado pelo Mmo. Juiz Desembargador Relator Moreira do Carmo, proferido no âmbito do pro­cesso nº 1395/13.1TBCVL.C1 - no âmbito de um PER, foi aprovado um Plano de Recuperação pela maioria dos credores, prevendo-se em tal Plano o pagamento do crédito do Instituto de Segurança Social em 150 (cento e cinquenta) prestações, precisamente o que sucede no douto acórdão recorrido, não só em relação ao crédito da Segurança Social, como em relação aos créditos detidos pelo Estado e pelas demais instituições públicas.

XVI. A Segurança Social votou desfavoravelmente o Plano de Recuperação proposto no acórdão funda­mento, tal como o fizeram a Caixa Geral de Aposentações e a Segurança Social no presente caso vertido no douto acórdão recorrido.

XVII. Quer no douto acórdão recorrido, quer no douto acórdão fundamento, o Tribunal a quo homolo­gou o Plano de Recuperação proposto pelos devedores revitalizandos, tendo sido interposto recurso de tal decisão para o Tribunal da Relação de Coimbra, invocando-se a violação do princípio da indisponibili­dade dos créditos públicos, previsto nos artigos 30º, nºs 2 e 3 da LGT e no art. 125º da Lei nº 55-A/2010, de 31 de dezembro.

XVIII. Em ambos os acórdãos, recorrido e fundamento, o Tribunal da Relação de Coimbra entendeu que não é possível reduzir, extinguir e/ou conceder moratórias de créditos públicos no âmbito do PER, sob pena de violação do princípio da indisponibilidade dos créditos públicos.

XIX. Sucede que o acórdão fundamento e o acórdão recorrido divergem quanto às consequências jurídicas que devem resultar de tal violação.

XX. Enquanto que no acórdão recorrido se decidiu que a violação do princípio da indisponibilidade dos créditos públicos deve implicar a não homologação do Plano de Recuperação, nos termos do art. 215º do CIRE, aplicável ex vi do nº5 do art. 17º-F do CIRE, no douto acórdão fundamento decidiu-se que a violação do princípio da indisponibilidade dos créditos públicos apenas conduz à ineficácia de tal Plano em relação aos credores visados, mantendo a sua eficácia quanto aos demais credores.

XXI. Esta solução jurídica da ineficácia, consagrada no douto acórdão fundamento, é aquela que se fi­gura mais justa, por contrabalançar o interesse da intangibilidade dos créditos públicos com o interesse da recuperação da AA, salvaguardando-se os postos de trabalho dos seus trabalhadores, a prossecução dos estudos dos seus alunos e a manutenção do tecido empresarial.

XXII. A terceira questão fundamental é a de saber se (i) tendo a devedora enviado a todos os credores o convite à negociação a que alude o nº 1 do art. 17º-D do CIRE; (ii) tendo o Administrador Judicial Pro­visório enviado aos credores um anteprojeto ou draft do Plano de Recuperação, concedendo prazo para que se pronunciassem sobre o seu conteúdo; (iii) tendo o Administrador Judicial Provisório mais tarde enviado versão final do Plano de Recuperação aos credores para que exercessem o seu voto; e iv) tendo os credores votado o referido Plano e v) não tendo reunido presencialmente com credores que manifestaram o propósito de participar nas negociações, ocorre violação não negligenciável de regras procedimentais suscetíveis de fun­damentar a recusa oficiosa de homologação do Plano de Recuperação.

XXIII. O douto acórdão recorrido respondeu afirmativamente a tal questão, entendendo que os credores que interpuseram recurso da sentença de homologação do Plano de Recuperação, tendo manifestado a inten­ção de participar nas negociações e não tendo a devedora alegadamente reunido presencialmente com esses mesmos credores, teria ocorrido violação não negligenciável de normas procedimentais - a saber os nºs 8 e 9 do artigo 17º-D do CIRE – conducente à não homologação do Plano de Recuperação da AA.

XXIV. O douto acórdão fundamento – o Tribunal da Relação do Porto, de 13 de abril de 2015, rela­tado pela Juíza Desembargadora Rita Romeira, no âmbito do processo nº 974/13.1TYVNG.P2 – res­pondeu negativamente a tal questão, sustentando que, tendo os credores recorridos tomado conhecimento da proposta de Plano Recuperação, em relação ao qual tiveram a oportunidade de se pronunciar e ainda de exercer o seu direito de voto relativamente à sua versão definitiva, não era defensável que possa ter ocorrido qualquer violação de normas procedimentais.

XXV. No caso subjacente ao acórdão fundamento, tal como sucede no acórdão recorrido, a devedora en­viou aos credores um convite às negociações.

XXVI. Quer no acórdão fundamento, quer no acórdão recorrido, consta dos factos provados que o admi­nistrador judicial provisório enviou, via-e-mail, a proposta de Plano de Recuperação, sobre a qual os credo­res tiveram oportunidade de se pronunciar.

XXVII. Os e-mail’s referidos no acórdão fundamento foram enviados aos credores nos dias 28 de no­vembro de 2013 e 02 de dezembro de 2013, mediando entre esses e-mail’s menos dias do que aqueles que mediaram entre 29 de outubro de 2015 e 03 de novembro de 2015, datas em que, no caso presente no acórdão recorrido, o administrador enviou e-mail’s aos credores com a proposta de Plano de Recuperação.

XXVIII. Nos casos vertidos em ambos os acórdãos, o Administrador Judicial Provisório enviou aos credores o Plano de Recuperação, tendo aqueles exercido o direito de voto.

XXIX. Sucede que, enquanto no acórdão fundamento, como vimos, o Tribunal não colocando quais­quer óbices ao modo de negociação usado pela devedora - traduzido no envio de e-mail’s aos credores - ou quanto aos (ainda mais curtos) prazos de ponderação concedidos, entendeu que tendo sido convidados a negociar; tendo recebido por e-mail a proposta de plano; e tendo tido a oportunidade de votar a sua versão definitiva, não podia afirmar-se ter ocorrido violação não negligenciável de normas procedimentais.

XXX. Entendendo ainda que, mesmo que essas alegadas e eventuais desconformidades pudessem ser eri­gidas a violação de normas procedimentais – o que ali não se aceita - jamais tal violação poderia assumir a natureza de violação não negligenciável de normas procedimentais capaz de fundar a não homologação do Plano de Recuperação.

XXXI. Já o acórdão recorrido considerou, em frontal oposição com o acórdão fundamento, que as nego­cia­ções com os credores deveriam ter decorrido presencialmente, sendo indispensável a realização de uma reunião prévia de negociações para definição dos procedimentos de negociação a desenrolar e que, tendo as negociações sido efetuadas com recurso à troca de e-mail’s, nos prazos em que o foram, teria ocorrido viola­ção de normas procedimentais, sendo essa violação não negligenciável.

XXXII. Em consequência, a conclusão que se retirou no acórdão recorrido foi no sentido de revogar a decisão recorrida e de não homologar o Plano de Revitalização, enquanto que no douto acórdão funda­mento se decidiu confirmar a decisão de homologação do Plano de Recuperação.

XXXIII. Por considerar que o entendimento propugnado no acórdão fundamento é o que melhor se coa­duna com as finalidades, tramitação e interesses prosseguidos pelo PER, não pode a AA conformar-se com o acórdão recorrido, que está em oposição, pelo menos, com aquele acórdão do Tribunal da Relação do Porto que aqui se elege como acórdão fundamento.

XXXIV. A quarta questão fundamental é a de saber se o princípio da igualdade de tratamento entre os credores, implica que os credores privilegiados tenham de merecer um tratamento mais favorável do que os credores garantidos e que os credores comuns.

XXXV. O douto acórdão recorrido propende para o entendimento de que o Plano de Recuperação da AA não respeita o princípio da igualdade, previsto no art. 194º do CIRE, por alegadamente estabele­cer diferentes condições de pagamento entre os credores, sem que essa diferença de tratamento se te­nha tradu­zido num tratamento mais favorável dos trabalhadores, detentores de um crédito privilegiado, como em seu entender se impunha.

XXXVI. No acórdão recorrido, o Plano de Recuperação da AA prevê o pagamento do capital em dívida aos trabalhadores no mesmo número de prestações em que a devedora se propõe pagar o capital de­vido aos credores ....... (credor garantido) e ao Montepio (credor comum); prevendo, no entanto, um prazo inferior de carência de capital (um ano) e o perdão dos juros em relação aos trabalhadores, ao passo que em relação aos credores ....... e Montepio se prevê um prazo superior de carência de capital (2 anos) e o pagamento semestral dos juros.

XXXVII. Trata-se de um regime de pagamentos perfeitamente equilibrado e que respeita o princípio da igualdade.

Em todo o caso, a verdade é que,

XXXVIII. O Plano da AA, por um lado, não tinha que estabelecer tratamento igual entre os créditos pertencentes a diferentes classes de créditos, pois não viola o princípio da igualdade a circunstância de os créditos de diferente natureza e categoria (garantidos, privilegiados, comuns e subordinados) serem tratados de modo diverso, na medida em que não se encontram em situação idêntica.

XXXIX. No douto acórdão fundamento - Acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação de Coimbra, em 26 de junho de 2013, transitado em julgado em 16 de julho de 2013, no âmbito do pro­cesso 3369/10.5TBVIS-L.C1, relatado pela Mma. Juíza Desembargadora Catarina Gonçalves - prevê-se uma situação de facto igual e no domínio da mesma legislação à prevista no acórdão recorrido, na medida me que num plano de insolvência se prevê que o início do pagamento do capital em dívida aos ex-trabalha­dores (credores privilegiados) começe a ter lugar somente 01 de maio de 2013, com amortização da dívida em três anos e com o perdão dos juros vencidos e outros encargos; ao passo que o credor BES, garantido com um contrato de locação financeira, vê mantidos os prazos acordados nos respetivos contratos, com amortiza­ções de capital através de rendas mensais.

XL. Em tal situação, entendeu o Tribunal que os credores garantidos tinham sido tratados efetivamente de forma mais favorável do que os credores privilegiados, mas que esse diferenciado tratamento não impli­cava uma violação do princípio da igualdade, dado que se tratavam de credores pertencentes a classes dife­rentes.

XLI. Tanto mais que, o crédito garantido em causa se reportava a um contrato de locação financeira que tinha como objecto as instalações da insolvente, sendo pois essencial à prossecução da sua atividade, precisa­mente o que sucede no caso da AA, pois o credor ....... é titular de um crédito garantido por hipoteca constituída sobre o imóvel onde a pré-insolvente exerce a sua atividade.

XLII.  Com o regime de pagamento previsto no Plano aprovado no acórdão fundamento, entendeu ainda o Tribunal que a circunstância de os credores privilegiados ficarem numa situação creditícia próxima da situ­ação creditícia dos credores comuns (em relação aos quais se previa um período de carência de um ano e a amortização da dívida em três anos, com perdão de juros vencidos, vincendos e outros encargos) não com­portava uma violação do princípio da igualdade.

XLIII. Já o acórdão recorrido, em frontal oposição com o acórdão fundamento, considerou que os traba­lhadores, pelo facto de serem titulares de um crédito privilegiados, deveriam ter um tratamento de favor em relação ao credor ....... (credor garantido) e ao credor Montepio, detentor de um crédito comum.

XLIV. Em consequência, a conclusão que se retirou no acórdão recorrido foi no sentido de revogar a decisão recorrida e de não homologar o Plano de Revitalização, enquanto que no douto acórdão funda­mento se decidiu pela homologação do Plano de Recuperação.

XLV. Salvo melhor entendimento, a solução vertida no douto acórdão fundamento é a que deve prevale­cer.

XLVI. A última e quinta questão fundamental prende-se com a questão de saber se (i) o peso relativo dos créditos na votação; (ii) a existência de crédito hipotecário que incide sobre o imóvel onde a devedora exerce a sua atividade; e (iii) o papel estratégico na recuperação, maxime através da concessão de emprésti­mos bancários são razões de natureza objetiva que permitem estabelecer um tratamento diferenciado entre os credores.

XLVII. No acórdão recorrido, o Plano de Recuperação da AA prevê o pagamento do capital em dívida aos trabalhadores no mesmo número de prestações em que a devedora se propõe pagar o capital de­vido aos credores ....... (credor garantido) e ao Montepio (credor comum); prevendo, no entanto, um prazo inferior de carência de capital (um ano) e o perdão dos juros em relação aos trabalhadores, ao passo que em relação aos credores ....... e Montepio se prevê um prazo superior de carência de capital (2 anos) e o pagamento semestral dos juros.

XLVIII. No douto acórdão fundamento – o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 25 de março de 2014, proferido no âmbito do processo nº 3175/13.5TBSXL.L1-1, relatado pelo Mmo. Juiz Desembargador Eurico Reis - o Plano de Recuperação em apreciação previa o pagamento de 20% (vinte por cento) dos créditos comuns, em 120 prestações mensais, iguais e sucessivas, mas em relação a determi­nado credor, uma instituição bancária, detentora de um crédito, em parte, comum e, em parte, garantido, previa o seu pagamento integral, em 120 prestações mensais, iguais e sucessivas, a uma taxa de juro de 2,0%.

XLIX. Em ambos os acórdãos, os credores visados por um alegado tratamento menos favorável, insurgi­ram-se contra a homologação do Plano de Recuperação, invocando a violação do princípio da igualdade.

L. Quer no acórdão fundamento, quer no acórdão recorrido, os devedores justificaram as diferenças de tra­tamento que previram em relação a determinados credores com base no peso relativo dos créditos na vota­ção; na existência de crédito hipotecário que incide sobre o imóvel onde a devedora exerce a sua atividade; e no papel estratégico na recuperação, através da concessão de empréstimos bancários.

Sucede que,

LI. Enquanto no douto acórdão fundamento se considerou que as referidas razões constituem razões de natureza objetiva que permitem estabelecer um tratamento diferenciado entre os credores, o douto acórdão recorrido considerou que que o peso relativo na votação e o papel estratégico na recuperação através da con­cessão de empréstimos não justificavam objetivamente um tratamento diferenciado entre os credores ou não as relevou sequer.

LII. O douto acórdão recorrido ignorou ainda em absoluto a circunstância de o credor ....... ser titular de um crédito garantido sobre o imóvel onde a AA exerce a sua atividade, ao contrário do que sucede no douto acórdão fundamento, tal circunstância foi de sobremaneira relevada.

LIII. Em consequência, a conclusão que se retirou no acórdão recorrido foi no sentido de revogar a deci­são recorrida e de não homologar o Plano de Revitalização por violação do princípio da igualdade, en­quanto que no douto acórdão fundamento se decidiu confirmar a decisão de homologação do Plano de Re­cuperação.

LIV. Salvo o devido respeito pelo entendimento propugnado no douto acórdão recorrido, tal como se de­fende no douto acórdão fundamento, o peso relativo dos créditos na votação; a existência de crédito hipotecá­rio que incide sobre o imóvel onde a devedora exerce a sua atividade e o papel estratégico na recu­peração, através da concessão de empréstimos bancários são razões que justificam as necessárias derroga­ções ao prin­cípio da igualdade no âmbito de processos especiais de revitalização.

Contra alegaram os recorridos HH, II e JJ, sustentando a confirmação do acórdão da 2ª instância.

B) Apreciando, liminarmente, a questão prévia da admissibilidade do recurso - artº 652º, nº 1, b) e h), e nº 3, do CPC - o relator decidiu nos seguintes termos, que se reproduzem na parte que interessa:

“.....

Vale a propósito a regra do artº 14º, nº 1, do CIRE, que diz o seguinte:

“No processo de insolvência, e nos embargos opostos à sentença de declaração de insol­vência, não é admi­tido recurso dos acórdãos proferidos pela Relação, salvo se o recor­rente demonstrar que o acórdão de que pretende recorrer está em oposição com outro, proferido por alguma das relações, ou pelo Supremo Tribunal de Jus­tiça, no domínio da mesma legislação e que haja de­cidido de forma divergente a mesma questão fun­damental de direito e não houver sido fixada pelo Supremo, nos termos dos artigos 732º-A e 732º-B do Código de Processo Civil, juris­prudência com ele conforme”.

A oposição de julgados relevante para o efeito previsto nesta disposição verifica-se quando a mesma norma jurídica se mostra, no acórdão recor­rido e no acórdão funda­mento, inter­pretada e/ou aplicada em termos opostos, não obstante existir iden­tidade da si­tuação de facto em am­bas as hipóteses. Ha­verá oposição justifi­cativa da admissão da re­vista, dito doutro modo, quando um caso concreto caracterizado por um núcleo factual idêntico é julgado, com base na  mesma regra de direito, num acór­dão num sen­tido e no outro em sen­tido contrário. A oposi­ção tem de ser frontal, não somente implícita ou pres­su­posta; e deve incidir sobre a resposta que os acórdãos em confronto deram a uma questão determi­nante para o resultado a que se chegou num e noutro caso, como tem sido unânimemente entendido pela doutrina e pela jurisprudência. Como bem se refere no acórdão deste STJ de 14/11/16 (Procº 1519/11.3TBVRL.S1-A), “... a questão fundamental de direito está decidida de forma contraditória quando corresponde a interpretações divergentes de um mesmo regime normativo, situ­ando-se ou movendo-se no âmbito da interpretação e aplicação de um mesmo instituto ou figura jurídica fundamental. Ou seja, as decisões são relevantemente divergentes se têm na sua base situações materiais litigiosas que, de um ponto de vista jurídico-normativo - tendo em consideração a natureza e teleologia dos específicos interesses das partes em conflito - são análogas ou equiparáveis, pres­supondo o conflito jurispru­dencial uma verdadeira identidade substancial do núcleo essencial da matéria litigiosa subjacente a cada uma das decisões em confronto (acrescente-se que a questão fundamental de di­reito em que assenta a alegada divergência deve assumir um carácter essencial para a solução do caso, ou seja, deve integrar a verdadeira ratio decidendi dos acórdãos em confronto, e não constituir uma questão conexa e muito menos um simples obiter dictum). Basicamente no mesmo sentido, aduz Amâncio Ferreira (Manual dos Recursos em Processo Civil, 8ª ed., pp. 116 e 117) que o requisito da mesma questão fun­damental de direito verifica-se quando o núcleo da situação de facto, à luz da norma aplicável, seja idên­tico. Do que resulta, conclui, que o conflito jurisprudencial se verifica quando os mesmos preceitos são in­terpretados e aplicados diversamente a factos idênticos”.

Vejamos, em concreto, e respeitando a ordem por que as questões são apresentadas nas alegações, o que ocorre no caso presente.

a) As duas primeiras questões fundamentais de direito isoladas pela requerente e justificati­vas, na sua tese, da admissão da revista - conclusões I a XXI da minuta - são, respectiva­mente, a de saber (1ª) se o plano de recuperação que prevê o pagamento em prestações dos créditos detidos por instituições públicas sem que estas tenham dado o seu assentimento viola o princípio da indisponibilidade dos créditos públicos e (2ª) se a viola­ção deste prin­cípio impõe a não homologação daquele plano na sua globalidade, ou se o torna apenas ineficaz relativamente aos credores visados

No que se refere à primeira questão, o acórdão fundamento (TRG, 11/7/2103) conside­rou que com uma moratória “não está em causa nem a extinção nem a redução do crédito da segu­rança social, visto que se mantém o seu pagamento na totalidade”, acrescentando ainda que no caso ali apreciado a dívida da segurança social não foi objecto de tratamento desigual e menos fa­vorável do que os outros credores. No que toca à segunda questão, o acórdão funda­mento (TRC, 13/1/15) pronunciou-se no sentido, actualmente dominante, da ineficácia do plano de recuperação que viole o disposto nos artºs 30º, nº 3 e 36º, nºs 2 e 3, da LGT, e 190º, nº 1, 2 e 6, do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Se­gurança So­cial.

Ora, o acórdão recorrido, como acima se referiu, julgou as apelações - todas elas, entenda-se - procedentes, tendo considerado que o plano, por um lado, aprovou créditos indisponí­veis da Segurança Social e da CGA sem o consentimento destas instituições, e, por outro, violou de forma não negligenciável, quer regras procedimentais, quer ainda o princípio da igualdade  consagrado no artº 194º, nº 1, do CIRE, decidindo, nesta base, que ele não po­dia ser homologado. Perante isto, deixa de fazer sentido e de ter utilidade auto­nomizar para efeitos de admissão do recurso a questão da ineficácia do plano relativa­mente aos créditos indisponíveis, já que a decisão de o recusar na totalidade com os ou­tros fundamentos sub­sistiria intocada, ainda que quanto àquela questão se admitisse a re­vista com base na oposi­ção jurisprudencial alegada e a seu respeito se adoptasse posição idêntica à do acórdão fun­damento. Mutatis mutandis, o que se disse é válido para negar a admissão da revista com fundamento na oposição jurisprudencial relativa à segunda questão identificada. Na ver­dade, não há qualquer dúvida que o acórdão fundamento, tal e qual como o acórdão recor­rido, se pronunciou no sentido da ineficácia do plano que viole créditos indisponíveis, de­signadamente os da segurança social; nisto, ambos os arestos coincidem; só que, como já se evidenciou, no caso do acórdão recorrido o plano de recuperação não foi judicialmente homologado na sua totalidade por outras razões, além daquela que está na origem da se­gunda questão fundamental de direito apontada; assim sendo, a aparente divergência entre os dois acórdãos quanto à solução dada a esta última questão deixa de assumir relevância para o efeito que estamos a considerar, po­dendo com propriedade afirmar-se, consequen­temente, que ela não foi determinante (de­cisiva) para o julgamento final adoptado – rejei­ção do plano. Em termos rigorosos, afi­gura-se correcto dizer que a decisão de recusar a homologação do plano de revitalização pelos fundamentos alegados nas restantes apela­ções consumiu a outra decisão, também adoptada pela 2ª instância, de julgar procedente a apelação do MP com os fundamentos que dela constam. 

b) Relativamente à terceira questão fundamental apontada pela requerente - conclusões XXII a XXXIII da minuta - afigura-se existir oposição de acórdãos quanto ao que seja uma violação não negligenciável de regras procedimentais, nos termos e para os efeitos do artº 215º do CIRE, oposição essa que tendo determinado, ao menos em parte, o resultado final a que se chegou nos acórdãos em presença, se apresenta como uma verdadeira questão de direito a justificar a intervenção clarificadora do STJ, e não como um mero ar­gumento ou obiter dictum. Na verdade, o acórdão fundamento (TRP, 13/4/15) não atri­buiu importân­cia ao afastamento dos trabalhadores das negociações que tiveram lugar no quadro do artº 17º-D, nºs 1 a 11, do CIRE, considerando suficiente que tenham sido in­formados por e-mail do projecto do plano a tempo de participarem na votação porquanto o plano apro­vado não deu azo, em concreto, a diferenças de tratamento entre os credores, ou seja, à violação do princípio da igualdade fixado no artº 194º, nº 1, do CIRE.  O acór­dão recor­rido, diversamente,  considerou que “...o modo de negociação com os credores laborais (por email e com um prazo curto de resposta) interferiu com a justa salvaguarda dos interesses desses cre­dores. Tratando-se de credores privilegiados, teriam de ser convenientemente ouvidos. E depois não parece razoável que a devedora, que reuniu com as instituições bancárias, não o tenha feito com os credores labo­rais. Não é coe­rente exigir igualdade entre os credores relativamente ao conteúdo do plano e, depois, con­temporizar ou con­descender com um tratamento desigual dos credores na fase das negociações. Se não se pode admitir que o plano introduza uma diferença de tratamento baseada apenas na grandeza dos créditos também não se pode admitir uma diferença negocial baseada na grandeza dos créditos ou da importância dos credores (apesar de os créditos dos trabalhadores preferirem em relação os créditos hipotecários). Aliás, só assim será possível respeitar um dos princípios orientadores aprovados pela Resolução do Conselho de Ministros nº 43/2011 de 25.10 – o nono - segundo o qual o acordo deve ser equilibrado do ponto de vista dos credores, não benefi­ciando uns em detrimento de outros (princípio da igualdade)”.

Verifica-se, pois, quanto à questão enunciada, a oposição jurisprudencial de que o artº 14º, nº 1, do CIRE, faz depender a admissão do recurso de revista.

c) Quanto à quarta questão fundamental de direito isolada pela recorrente - conclusões XXXIV a XLV da minuta - a de saber se o princípio da igualdade de tratamento entre os credores implica que os credores privilegiados tenham de merecer um tratamento mais fa­vorável do que os credores garantidos e os credores comuns, o acórdão fundamento (TRC, 26/7/13), como se vê do respectivo sumário, decidiu que “o princípio da igualdade impõe que, sem prejuízo de qualquer razão objectiva que o justifique, os créditos garantidos e privilegiados não recebam um tratamento mais desfavorável do que os créditos comuns; mas não comporta qualquer violação do prin­cípio da igualdade a mera circunstância de os créditos garantidos ou privilegiados ficarem submetidos a re­gime idêntico ao dos créditos comuns”.

Ora, lendo-se com atenção o acórdão recorrido e, designadamente, analisando o plano de revitalização aprovado,  constata-se que este não trata por igual todos os credores, sejam eles comuns ou garantidos; o que faz é perdoar na totalidade os juros vencidos e vincen­dos das dívidas aos trabalhadores, que são credores garantidos, enquanto que todos os bancos (incluindo um, o Montepio Geral, que é um credor comum) mantêm o direito ao paga­mento integral dos respectivos juros, sem que o plano enuncie quaisquer razões para tal diferença de tratamento.

Tanto basta para se concluir com segurança pela inexistência de oposição entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento.

d) Finalmente, quanto à quinta questão fundamental de direito, nos termos em que a re­corrente a equaciona nas conclusões XLVI a LIV - a de saber se o peso relativo dos cré­ditos na votação, a existência de crédito hipotecário que incide sobre o imóvel onde a de­vedora exerce a sua actividade e o papel estratégico na recuperação, maxime através da concessão de empréstimos bancários, são razões objectivas que permitem estabelecer um tratamento diferenciado entre os credores - verifica-se que no acórdão fundamento invo­cado (TRL, 25/3/14) se diz o seguinte no respectivo sumário: 

“Não viola o princípio geral da igualdade dos credores enunciado no artº 194º do CIRE, o acordo de re­vi­talização dos devedores que define formas mais favoráveis de pagamento da dívida do credor que repre­senta 75,439228 % dos débitos aprovados no processo de revitalização e é credor hipotecário, porque, para além desse crédito, dada essa especial garantia de que goza, ser objectivamente muito distinto dos de­mais, sem a aprovação do plano criticado, que acarretaria a insolvência dos devedores, os demais credores muito dificil­mente poderiam obter o ressarcimento de qualquer porção do crédito cujo pagamento lhes é de­vido, solução esta que dá cabal satisfação ao princípio da proporcionalidade consagrado no art.º 335º do Código Civil, e é totalmente conforme às finalidades éticas, sociais e económicas de todos os direitos sob escrutínio”.

Importa ter em atenção, no entanto, que a factualidade subjacente a este aresto é substan­cialmente diversa, no seu núcleo essencial, da que está presente no acórdão recorrido. As­sim, lendo-se o acórdão fundamento verifica-se que se tratou de um PER de pessoas sin­gulares em que havia apenas três credores, todos eles bancos, e em que o credor principal era o credor hipotecário, sendo os outros dois bancos credores comuns. O tratamento privilegiado que o plano aprovado concedeu ao credor hipotecário não prejudicou qual­quer outro credor garantido (não existia mais nenhum), e muito menos credores com ga­rantias – como sucede no caso do acórdão recorrido – que até podem prevalecer sobre a hipoteca.

Não é possível, consequentemente, e em rigor, dizer-se que existe oposição relevante en­tre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento, centrada em interpretação e aplicação con­traditórias do princípio da igualdade a que alude o artº 194º do CIRE.

Em face do exposto, decide-se admitir a revista interposta pela requerente AA-Asso­cia­ção Recreativa de Coimbra Artística, mas circunscrita e tendo unicamente por ob­jecto a questão supra enunciada em II, b)”.

C) Notificada desta decisão, a requerente, considerando-se por ela prejudicada, reclamou para a conferência, pedindo que sobre a mesma recaia um acórdão, nos termos e para os efeitos do artº 652º, nº 3, do CPC.

Formulou, desta feita, quarenta e uma conclusões, onde levanta, em resumo, as seguintes questões essenciais em ordem a obter a modificação do despacho do relator:

1ª - O acórdão recorrido e o acórdão fundamento estão em absoluto desacordo quanto às consequências decorrentes da violação do princípio da indisponibilidade dos créditos públicos, pois enquanto do acórdão recorrido resulta que tal violação conduz à não homologação do plano de recuperação, do acórdão funda­mento resulta que tal violação conduz a mera ineficácia das cláusulas em questão para os credores públicos visados;

2ª - Segundo o acórdão recorrido, a violação do princípio da indisponibilidade dos créditos públicos cons­titui, por si só e independentemente das demais violações - violação não negligenciável de regras procedi­mentais e do princípio da igualdade - fundamento de recusa da homologação judicial do plano de recupera­ção;

3ª - O acórdão recorrido atribui a todas aquelas alegadas violações idêntico relevo e significado, não ha­vendo qualquer consumpção de umas em relação a outras, tanto mais que estão em causa violações muito díspares;

4ª - A violação do princípio da indisponibilidade dos créditos públicos foi decisiva para a recusa de ho­mologação do plano de recuperação da AA e, assim sendo, o conhecimento da 1ª e 2ª questões funda­mentais, referente à alegada violação de tal princípio, não se encontra prejudicado, nem foi consumido pelo conhecimento de quaisquer outras questões, havendo, pois, utilidade na sua apreciação autónoma;

5ª - Caso o STJ não se pronunciasse sobre a 1ª e 2ª questões fundamentais, o plano de recuperação da AA não poderia ser homologado, por ter transitado em julgado o acórdão que recusou a sua homologação com base na violação do princípio da indisponibilidade dos créditos públicos;

6ª - Quanto à 4ª questão fundamental, identificada em II. c) do despacho sob reclamação, o relator en­volveu-se na apreciação do conteúdo do plano de recuperação; indevidamente, porém, visto que nesta fase apenas há lugar a uma apreciação genérica e tabelar dos aspectos meramente formais da admissibilidade e regime do recurso, não a considerações sobre o seu mérito;

7ª - As particularidades de facto e o concreto objecto dos processos em que os dois acórdãos foram proferi­dos são irrelevantes;

8ª - Uma vez que a realidade das coisas se apresenta sempre muito diversa, não seria curial que o legis­lador exigisse uma igualdade absoluta da situação de facto presente em ambos os acórdãos, recorrido e fundamento, sobretudo no âmbito do PER, onde não é possível encontrar devedores na mesma situação económica (com igual passivo e activo), nem credores na mesma categoria e igual situação creditícia, nem planos de recuperação propostos prevendo exatamente as mesmas condições de pagamento para os credores;

9ª - É manifesta a oposição de acórdãos quanto à 4ª questão fundamental de direito, tanto mais que, embora isso não fosse sequer exigido, ambos tiveram na sua base idênticas situações de facto;

10ª - Descontando os pequenos e irrelevantes pormenores da situação fáctica a que o relator deu impor­tância (PER requerido por pessoa singular/colectiva, ou o número de credores), no que toca à 5ª questão fundamental de direito é manifesto que os acórdãos recorrido e fundamento divergem entre si quanto à res­pectiva apreciação, que não pode, por isso,  deixar de fazer parte do objecto da presente revista.

Tudo visto, cumpre decidir – a reclamação em primeiro lugar, conforme o disposto no nº 4 do artº 652º, e depois a revista propriamente dita.

II. Fundamentação

1) Começando pela reclamação visando o alargamento do objecto da presente revista, e tendo presentes as limitações impostas pelo artº 14º, nº 1, do CIRE, importa somente di­zer que quanto às duas primeiras questões fundamentais de direito isoladas pela reque­rente nada temos a acrescentar àquilo que o relator ponderou; fazemos nossas todas as considerações e argumentos em que se baseou para concluir pela inexistência de oposição jurisprudencial relevante, considerações e argumentos esses cuja pertinência a recorrente não conseguiu pôr em causa, já que se limitou a repetir o anteriormente afirmado nas ale­gações e oportunamente apreciado pelo relator nos termos sobreditos.

Já no que se refere à quarta e quinta questões de direito apontadas como susceptíveis de justificar a admissão do recurso, respeitantes à determinação do conteúdo e alcance do princípio da igualdade no âmbito do processo especial de revitalização, entende-se que há razão para modificar a decisão do relator, pese embora a subsistência de alguma margem de dúvida, e admitir agora a extensão do objecto da revista em conformidade com a pre­tensão da recorrente; isto porque se aceita, em parte, o argumento esgrimido no sentido de que não pode ser-se excessivamente rigoroso na determinação do que sejam, ou devam ser, situações de facto nuclearmente idênticas quando esteja em causa a questão de direito apontada; reconhece-se, com efeito, que muito dificilmente haverá, desse ponto de vista, duas situações factualmente iguais; ora, o conceito de igualdade dos credores, no quadro do direito falimentar, é eminentemente indeterminado, no sentido de que o seu preen­chimento em concreto depende sempre da ponderação das circunstâncias específicas do caso apreciado; por outro lado, os casos julgados nos acórdãos fundamento que a recor­rente escolheu apresentam pontos de facto relevantes que coincidem com os do acórdão recorrido e são suficientes, tudo visto e ponderado, para se afirmar a existência da alegada oposição jurisprudencial a respeito da questão de direito em apreço.  

Em face do exposto esta conferência, atendendo em parte a reclamação da recorrente, decide que serão objecto de apreciação por este STJ, além da 3ª, nos termos já anterior­mente indicados pelo relator, também a 4ª e a 5ª questões fundamentais de direito acima identificadas, deste modo ficando definitivamente circunscrito o âmbito da presente re­vista.

2) Cabe agora verificar, portanto, se quanto às apontadas questões o acórdão recorrido cometeu, ou não, e com que consequências, os erros de julgamento que lhe são imputa­dos pela recorrente, , assim se chegando, finalmente, ao cerne do litígio.

As conclusões a tal respeito formuladas na minuta do recurso são as seguintes:

1ª - Não existe qualquer norma imperativa que determine em termos rigorosos e precisos o modo como devem desenrolar-se as negociações entre os credores e o devedor revitalizando, existindo ampla margem para a definição dos seus termos, definição que, em concreto, compete ao Administrador Judicial Provisó­rio;

2ª - As negociações podem decorrer presencialmente, mas também podem decorrer por escrito, com recurso a e-mai’s, tal como sucedeu no presente PER.

3ª - Existindo uma ampla margem para definição dos procedimentos de negociação, sendo que a lei não impõe que as negociações tenham de ser presenciais ou que tenha de existir uma reunião presencial prévia com os credores;

4ª - Sobretudo nos processos especiais de revitalização em que, como no presente processo, são muitos os credores do devedor recuperando, é muito frequente que o Administrador assuma as rédeas das negociações, estabelecendo a forma com se irá tramitar o processo negocial;

5ª - A AA convidou os seus credores a participar nas negociações e conferiu-lhes a oportunidade real e efetiva de conhecerem e se pronunciarem, apresentando propostas de alteração, sobre a proposta de Plano de Recuperação e de votarem a sua versão definitiva, em prazos perfeitamente razoáveis e compatíveis com a celeridade imposta pelo carácter urgente do PER, o que afasta a possibilidade de terem sido violadas as normas procedimentais dos nºs 8 e 9 do art. 17º-D do CIRE;

6ª - Mesmo que se entendesse ter havido alguma compressão do tempo disponível para a pronúncia dos credores ou alguma desconformidade durante o processo negocial, jamais tais situações poderiam consubs­tanciar vícios não negligenciáveis;

7ª - Só são não negligenciáveis as violações de normas imperativas que acarretem a produção de um re­sultado não permitido pela lei, influindo na decisão do PER;

8ª - Considerando que os nºs 8 e 9 do art. 17º-D do CIRE não estabelecem qualquer regime imperativo quanto ao modo de negociação a adoptar e que as alegadas desconformidades ocorridas durante o processo negocial não impediram em nada o conhecimento do Plano, o sentido de voto dos credores e o resultado de aprovação a que se chegou, aquelas supostas desconformidades não constituem violação não negligenciável de normas procedimentais;

9ª - Ao ter recusado a homologação no Plano de Recuperação da AA por alegada violação não ne­gligenciável de normas procedimentais, o Tribunal fez errónea apreciação, entre outros preceitos legais, dos nºs 8 e 9 do art. 17º-D do CIRE;

10ª - O Mº Juiz Desembargador Relator a quo fez errada interpretação do princípio da igualdade ínsito no art.194º do CIRE, pois este princípio impõe que sejam tratados de forma igual os credores que se en­contrem em idênticas situações, mas já não impõe um tratamento diversificado dos credores em função da diferente categoria e natureza dos respectivos créditos;

11ª - Não colide com o princípio da igualdade a circunstância de os créditos de diferente natureza e cate­goria (garantidos, privilegiados e comuns) serem tratados de modo diverso, pois, na realidade, tais créditos não estão em situação idêntica e, portanto, não têm de merecer, necessariamente, o mesmo tratamento;

12ª - Sem prejuízo do referido em XIV, a AA tinha razões objetivas para estabelecer um trata­mento diferenciado entre o ....... e os trabalhadores: a diferente natureza dos créditos (créditos pri­vilegiados vs crédito hipotecário); o facto do crédito do ....... ser garantido por hipoteca sobre o imó­vel onde a AA exerce a sua atividade; a circunstância do crédito do ....... representar 52,80% dos votos, sendo o seu voto determinante, e ainda a crucial importância do ....... para a viabilidade da recuperação da AA, uma vez que com ele contará para a concessão de crédito no desenvolvimento da sua atividade e recuperação;

13ª - Apesar da sua manifesta dependência em relação ao credor ....... e de, pois, ter razões obje­tivas que lhe permitiam traçar diferentes condições de pagamento entre esse crédito e o crédito dos trabalha­dores, a AA antes de partir para as negociações com esse credor envidou os seus melhores esforços para poder oferecer aos trabalhadores as mesmas condições de pagamento estabelecidas para os créditos de natu­reza pública;

14ª - Só depois de harmonizar o seu plano de negócios com aquele compromisso de pagar aos trabalhado­res dentro do mesmo prazo em que pagaria aos credores públicos, é que a AA procurou negociar com o ......., forçando-o a aceitar que o pagamento do seu crédito tivesse lugar no mesmo prazo já fixado para os credores públicos e privilegiados;

15ª - O facto de os credores privilegiados perdoarem à AA os juros vencidos e vincendos em prol da sua recuperação é compensado pela circunstância de se prever em relação a eles um período de carência de capital de um ano, ao passo que as instituições bancárias estão sujeitas a um período de carência de capita de dois anos;

16ª - A circunstância de se ter estabelecido um período de carência mais curto do que em relação às ins­tituições bancárias, constitui um efetivo benefício para os trabalhadores, permitindo-lhes receber o capital em dívida mais rapidamente do que as instituições bancárias, equilibrando-se, deste modo, as condições de pagamento previstas para os credores privilegiados e o credor ......., pese embora esse tratamento paritário ou mesmo mais favorável não tivesse nem tenha de existir;

17ª - Sendo o Montepio um credor de reduzido relevo na votação, mas de grande importância para a recuperação da AA, não faria sentido descriminar negativamente tal credor, considerando desde logo um critério de igualdade em relação à outra instituição de crédito credora – o ....... – daí que o Plano preveja o pagamento do crédito do Montepio no mesmo prazo de pagamento previsto para o ....... e para os trabalhadores, e com um período de carência de dois anos, talqualmente se encontra esta­belecido para o .......;

18ª - O credor Montepio não é um qualquer credor comum, pois à semelhança do ....... tem uma importância estratégica na solução encontrada para a sua recuperação, na medida em que a AA po­derá contar com a concessão de empréstimos bancários para o desenvolvimento da sua atividade por parte desta instituição bancária;

19ª - Considerando o escopo visado pelo PER, que não é primordialmente o da satisfação dos credores, mas antes a revitalização do devedor, não pode o seu êxito ser paralisado por credores que não aceitem a decisão tomada pela maioria dos credores, no caso de 72,556%;

20ª - Credores esses que, apesar de lhes ter sido atribuída a natureza de credores privilegiados, são na sua grande maioria ex-docentes universitários - que resolveram os seus contratos de docência e prestação de serviços com a AA (caraterizados por total ausência de subordinação jurídica) - e que não dependem dos proventos resultantes da prestação desses serviços para sustentar as suas famílias, na medida em que se encontravam em regime de não exclusividade;

21ª - A insolvência da AA implicaria a cessação dos contratos de trabalho de todos os seus funcio­nários e a interrupção abrupta de cursos já iniciados, o que não só acarretaria um aumento das suas dívi­das, como inviabilizaria a manutenção futura dos postos de trabalho cuja preservação e salvaguarda não pode deixar de ser considerada prioritária e decisiva, atenta a atual conjuntura económica;

22ª - Em caso de declaração da insolvência da AA, os recorridos ficarão na realidade numa situa­ção muito mais desfavorável do que aquela em que ficam com o Plano de Recuperação aprovado pela mai­oria (72,556%) dos credores, porquanto se assistirá à desvalorização dos bens que compõe o ativo da AA, a um aproveitamento por parte dos agentes imobiliários que oferecerão preços irrisórios por esses bens, a que se somarão as enormes dificuldades de venda do imóvel onde a AA exerce a sua atividade – atentas as específicas caraterísticas que apresenta -, o que, em contexto de excesso de bens no mercado, redundará, sem sombra de dúvidas, na diminuição do valor da massa insolvente, sem se olvidar que o pa­gamento das custas e despesas do processo de insolvência sairão precípuas do produto da venda dos bens.

Matéria de Facto

São os seguintes os factos a considerar, dados como definitivamente assentes pela Rela­ção:

1 -  AA iniciou o presente processo especial de revitalização em 24 de Junho de 2015;

2 -  Em 30 de Junho de 2015 foi proferido despacho de nomeação do administrador judi­cial provisório;

3 - A lista provisória de credores foi apresentada e publicitada em 4 de Agosto de 2015;

4 - Setenta e sete créditos constantes da lista provisória foram impugnados no que con­cerne à sua existência, montante e natureza;

5 - A decisão sobre as impugnações de créditos foi proferida em 22 de Setembro de 2015;

6 - A decisão sobre as impugnações de créditos foi notificada à devedora em 28 de se­tembro de 2015;

7 - O prazo de negociações de dois meses, prorrogado por mais um mês, iniciou-se em 12 de agosto de 2015 e terminou em 12 de novembro de 2015;

8 - O mandatário dos credores MM, NN, OO, PP e QQ remeteu à devedora, que as recebeu, as cartas datadas de 30 de Setembro de 2015, juntas a fls. 755, 759, 763, 767 e 771, das quais consta, designadamente, que:

(…) Venho, nos termos do artigo 17.º-D, nº 7 do CIRE informar que os meus constituintes pretendem participar nas negociações em curso.

Agradeço, neste conspecto, que os contactos para o efeito sejam estabelecidos com o meu escritório, sito em Coimbra (…);

9 - O mandatário dos credores BB, CC, DD e EE remeteu à devedora, que a recebeu, a carta datada de 1 de Outubro de 2015, junta a fls. 775, da qual consta, designadamente, que:

(…) Nos termos do artigo 17.º-D, nº 7 do CIRE, venho informar que os meus constituintes pretendem participar nas negociações em curso, fazendo-se representar, em todas as diligências que se realizem nesse conspecto, pela minha pessoa, para o que me outorgaram procurações com poderes bastantes, cujas cópias junto a esta.

Aguardo o vosso contacto para estar presente nos actos que se venham a realizar com o referido objetivo (…);

10 - O mandatário da credora RR remeteu à devedora, que a recebeu, a carta datada de 1 de Outubro de 2015, junta a fls. 787, da qual consta, designadamente, que:

(…) ao abrigo do disposto no nº 7 do artigo 17.º-D do CIRE, venho informar que a minha constituinte pretende participar nas negociações em curso, fazendo-se representar para o efeito pelo mandatário consti­tuído nos autos.

Quaisquer informações e contactos subsequentes por parte da devedora com referência às negociações deve­rão ser feitas para o meu escritório (…);

11 - O mandatário da credora SS remeteu à devedora, que a rece­beu, a carta datada de 30 de Julho de 2015, junta a fls. 800, da qual consta, designada­mente, que:

(…) III- Nos termos e para os efeitos previstos no art.º 17.º-D, nº 7 do CIRE, venho informar que a minha constituinte pretende participar nas negociações em curso.

Agradeço, assim, que os contactos para o efeito sejam efetuados para o meu escritório (…);

12 - O credor TT remeteu à devedora, que a recebeu, a carta datada de 15 de setembro de 2015, junta a fls. 813, da qual consta, designadamente, que:

(…) Prevaleço-me da presente para declarar a V. Exas. que pretendo participar nas negociações no âm­bito do processo especial de revitalização em curso, nos termos e para os efeitos previstos no nº 7, do artigo 17.º-D, nº 7 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (…);

13 - O mandatário do credor UU remeteu à devedora, que a recebeu, a carta datada de 8 de outubro de 2015, junta a fls. 818, da qual consta, designadamente, que:

(…) Venho, na qualidade de mandatário do credor e ex-trabalhador UU, declarar a vontade do mesmo em participar nas negociações em curso, nos termos e para os efeitos do artigo 17.º-D, nº 7 do CIRE.

Assim, deve qualquer diligência, proposta ou qualquer documentação relevante ser comunicada e/ou envi­ada para o meu escritório (…);

14 - A mandatária do credor HH remeteu à devedora, que a recebeu, a carta datada de 20 de julho de 2015, junta a fls. 822, da qual consta, designadamente, que:

(…) nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 17.º-D do Código de Insolvência e Recuperação de Empresa, informe que é intenção do meu constituinte HH participar nas negociações em curso no âmbito do processo infra melhor identificado.

Junto envio cópia de procuração com poderes especiais para, em nome do meu constituinte, intervir nas su­pra mencionadas negociações (…);

15 - A mandatária do credor JJ remeteu à devedora, que a recebeu, a carta datada de 17 de setembro de 2015, junta a fls. 823 verso, da qual consta, designadamente, que:

(…) nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 17.º-D do Código de Insolvência e Recuperação de Empresa, informe que é intenção do meu constituinte JJ participar nas negociações em curso no âmbito do processo infra melhor identificado.

Junto envio cópia de procuração com poderes especiais para, em nome do meu constituinte, intervir nas su­pra mencionadas negociações (…);

16 - A mandatária do credorII remeteu à devedora, que a recebeu, a carta datada de 20 de Julho de 2015, junta a fls. 824 verso, da qual consta, designadamente, que:

(…) nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 17.º-D do Código de Insolvência e Recuperação de Empresa, informe que é intenção do meu constituinte II participar nas nego­ciações em curso no âmbito do processo infra melhor identificado.

Junto envio cópia de procuração com poderes especiais para, em nome do meu constituinte, intervir nas su­pra mencionadas negociações (…);

17 - Em 29 de Outubro de 2015 o administrador judicial provisório remeteu e-mail a to­dos os credores contendo proposta de plano de revitalização;

18 - Na comunicação referida em 17) constam os seguintes dizeres:

(…) Pretende-se com o presente que V. Exas. se pronunciem, querendo, quanto ao teor do mesmo [pro­posta de plano de revitalização apresentada pela devedora], tecendo comentários e propondo alte­rações que tiverem por convenientes, até ao próximo dia 3 de novembro de 2015.

Para tal, deverão V. Exas remeter comunicação escrita, dirigida ao signatário, por correio eletrónico, re­metida para o endereço (…) ou por fax (…).

Mais se informa que as comunicações remetidas no prazo ora estabelecido não consubstanciam votos e que após o prazo supra definido irá a devedora analisar as propostas emitidas pelos credores, sendo que poste­riormente será remetida a V. Exas. A versão definitiva do mesmo, a qual será, apenas nessa data, sub­metida a votação (…);

19 - Em 30 de Outubro de 2015 o administrador judicial provisório remeteu e-mail a to­dos os credores contendo a proposta de plano de revitalização referida em 17) juntamente com os mapas dos fluxos de caixa previsionais e o mapa do activo fixo;

20 - Na comunicação referida em 19) constam os seguintes dizeres:

(…) Pretende-se com o presente que V. Exas. se pronunciem, querendo, quanto ao teor do mesmo [pro­posta de plano de revitalização apresentada pela devedora], tecendo comentários e propondo alte­rações que tiverem por convenientes, até ao próximo dia 3 de novembro de 2015.

Para tal, deverão V. Exas remeter comunicação escrita, dirigida ao signatário, por correio eletrónico, re­metida para o endereço (…) ou por fax (…).

Mais se informa que as comunicações remetidas no prazo ora estabelecido não consubstanciam votos e que após o prazo supra definido irá a devedora analisar as propostas emitidas pelos credores, sendo que poste­riormente será remetida a V. Exas. a versão definitiva do mesmo, a qual será, apenas nessa data, sub­metida a votação (…);

21 - Em 3 de Novembro de 2015 o administrador judicial provisório remeteu e-mail a to­dos os credores contendo o plano de revitalização, em versão definitiva;

22 - Na comunicação referida em 21) constam os seguintes dizeres:

(…) Após o decurso do prazo concedido para análise do plano pelos credores e subsequente estudo das comunicações remetidas pelos mesmos, procedeu a devedora ao envio do plano de recuperação, em versão definitiva, o qual se junta em anexo e se dá por reproduzido para os devidos efeitos legais.

Assim, solicita a V. Exas. que emitam o competente voto, até às 18 horas do próximo dia 10 de novem­bro de 2015, independentemente de V. Exas. se terem já pronunciado aquando do envio da proposta do plano de revitalização.

Para tal, deverão V. Exas, nos termos do art.º 17º-F do CIRE, remeter a declaração de voto que segue em anexo, devidamente preenchida e assinada, dirigida ao signatário, por correio eletrónico, remetido para o endereço (…), por fax (…) ou entregue em mão no escritório do signatário (…);

23 - Em 3 de Novembro de 2015 a mandatária dos credores HH, VV, JJ, XX e ZZ re­meteu ao administrador judicial provisório os emails juntos de fls. 875 a 881, nos quais solicitou esclarecimentos sobre a proposta do plano de recuperação;

24 - O administrador judicial provisório não respondeu ao e-mails referidos em 23º;

25 - Em 5 de novembro de 2015 o administrador judicial provisório remeteu email a to­dos os credores contendo o plano de recuperação definitivo com os mapas previsionais correctos, porquanto os mapas previsionais que havia remetido com o e-mail de 3 de No­vembro de 2015 estavam errados;

26 - Na comunicação referida em 25) constam os seguintes dizeres:

(…)AAA (…), vem pelo presente remeter a V. Exas. o plano de recuperação retificado, sendo que a retificação foi efetuada nos mapas provisionais, uma vez que erradamente foram inseridos mapas diferentes no plano dos em anexo.

Assim, solicita o signatário a V. Exas. que emitam o competente voto, até às 18 horas do próximo dia 10 de novembro de 2015, sendo que os votos já emitidos são válidos e apenas serão desconsiderados com emissão de novo voto.

Para tal, deverão V. Exas, nos termos do art.º 17º-F do CIRE, remeter a declaração de voto que segue em anexo, devidamente preenchida e assinada, dirigida ao signatário, por correio electrónico, remetido para o endereço (…), por fax (…) ou entregue em mão no escritório do signatário (…);

27 - Em 6 e 9 de Novembro de 2015 o administrador judicial provisório reenviou a todos os credores o plano de recuperação com os mapas previsionais correctos referidos em 25);

28 - Em 10 de Novembro de 2015 o administrador judicial provisório remeteu e-mail a todos os credores do qual consta designadamente:

(…)AAA (…) vem esclarecer V. Exas. que, por lapso, consta no plano de re­cuperação (pag. 20 do mesmo) a menção que o “pagamento das dívidas ao Estado segue o padrão estabe­lecido no CIRE, ou seja, o pagamento integral do capital em 150 prestações mensais e o perdão das coi­mas e dos juros vincendos” sendo que se deverá considerar eliminada a menção “e o perdão das coimas e dos juros vincendos” (…);

29 - Em 11 de novembro de 2015 o administrador judicial provisório remeteu e-mail a todos os credores do qual consta, designadamente:

(…)AAA (…) vem esclarecer V. Exas. do lapso de escrita verificado na página 25 do plano de recuperação (em anexo) nas condições de pagamento ao Montepio Geral (ponto 3), de­vendo ser interpretado e lido que o período de carência de 2 anos se refere ao capital (…);

30 - As comunicações referidas em 17), 19), 21), 25), 27), 28) e 29) foram remetidas, além de outros, para o email dos mandatários dos seguintes credores: SS (Dr. BBB), FF(Dr. CCC), DDD (Dr. EEE), GG (Dr. CCC), TT (Dr. FFF), BB, CC, GGG, EE (Dr. HHH), UU (Dr. III HH,II, JJ, XX, ZZ (Dra. JJJ), MM, NN, OO, PPo, QQ (Dr. KKK) e KK (Dr. LLL);

31 - Em 3 de Novembro de 2015 o administrador judicial provisório recepcionou a co­municação da credora MMM junta a fls. 1188, da qual consta, designada­mente:

Assunto: Proposta de Plano Especial de Recuperação

Os meus cumprimentos.

Venho por este meio informar não concordar com a proposta de plano apresentada.

Acho lamentável que, atendendo aos valores por mim reclamados e reconhecidos (de € 2.689,25), equaci­onem, sequer, que esse pagamento possa ser faseado e que esse faseamento seja efetuado ao longo de 150 prestações !!!

Como é fácil de compreender não posso aceitar essa proposta que julgo ser até ofensiva (…);

32 - FFe GG não remeteram ao administrador judicial provisório os respectivos votos até às 18 horas do dia 10 de Novembro de 2015;

33 - A lista definitiva de créditos integra 118 credores;

34 - Até ao dia 10 de novembro de 2015 devedora e ......., S.A. reuniram-se duas vezes para definição dos critérios de pagamento do crédito hipotecário titulado por este credor;

35 - Em 13 de Novembro de 2015 o administrador judicial provisório juntou aos autos a acta de abertura dos votos e a proposta de plano de recuperação constantes de fls. 951 a 1084;

36 - Dos elementos referidos em 35) constam como abstencionistas/não votantes FF, GG, MMM e SS;

37 - Votaram contra a aprovação do plano de recuperação os seguintes credores: DD, NNN, OOO, KK, QQ, Segurança So­cial,II, PPP, QQQ, JJ, RR, RRR, CC, SSS, TT, TTT, BB, UUU, VVV, OO, XXX, ZZZ, AAA, BBB, Unipessoal, Lda., UU, CCCC, DDDD,EEEE, FFFF, GGGG, HHHH, MM, IIII, HH, JJJJ, NN, HHH, KKKK e EE;

38 - DD, NNN, OOO, KK, QQ,II, PPP, QQQ, JJ, RR, RRR, CC, SSS, TT, TTT, BB, UUU, ZZ, OO, XXX, ZZZ, AAA, UU, CCCC, DDDD, EEEE, FFFF, GGGG, HHHH, IIII, MM, HH, JJJJ, NN, KKKK e EE o são titulares de créditos laborais, de natureza privilegiada, no valor global de € 763.037,24;

39 - Votaram a favor da aprovação do plano de recuperação os seguintes credores: LLLL, MMMM, NNNN, OOOO, Hotel ...., Ldª,...., SA, PPPP, QQQQ, RRRR, SSSS, Ldª, e TTTT;

40 - O ......., S.A. é titular de créditos garantidos por hipoteca, no valor global de € 1.877.813,89;

41 - A hipoteca registada a favor do ......., SA, incide sobre o imóvel no qual os trabalhadores prestaram a sua actividade;

42 - Da versão definitiva do plano de recuperação junta de fls. 1358 a 1386 consta o se­guinte plano de pagamentos:

10 - Plano de Pagamentos:

Devemos referir que na sua organização tivemos em atenção as seguintes orientações de amortização e pa­gamento das dívidas:

- o plano de pagamentos ao ....... seguiu os critérios assumidos entre os grupos de trabalho da AA e do ....... em duas reuniões sucessivas e deram origem a propostas escritas;

- o pagamento das dívidas ao Estado segue o padrão estabelecido no CIRE, ou seja, o pagamento integral do capital em 150 prestações mensais;

- o pagamento aos fornecedores e outros credores é feito na sua totalidade distribuído em períodos que vão de 12 a 150 prestações mensais, consoante a dimensão da dívida;

- os pagamentos aos docentes e não docentes da AA são propostos o pagamento integral da dívida que vão de 12 a 150 prestações mensais, consoante a dimensão da dívida;

13- Medida Proposta

A- Restruturação dos créditos mediante moratória nos seguintes termos:

1- Dívidas ao Estado e Institutos Públicos:

1.1. Segurança Social (ISS,IP):

Valor da dívida: € 106.843,77

Plano de pagamento acordado: Pagamento da dívida em 150 prestações iguais, mensais e sucessivas, a ter início no mês seguinte após o trânsito em julgado da decisão de homologação do plano de revitalização;

Garantia: Este crédito encontra-se garantido pela hipoteca sobre o prédio urbano......, freguesia de Eiras, concelho de Coimbra;

1.2. CGA-Caixa Geral de Aposentações:

Valor da dívida: € 50.074,89

Plano de pagamento acordado: Pagamento da dívida em 150 prestações iguais, mensais e sucessivas, a ter início no mês seguinte após o trânsito em julgado da decisão de homologação do plano de revitalização;

ADSE

Valor da dívida: € 105.590,75

Plano de pagamento acordado: Pagamento da dívida em 150 prestações iguais, mensais e sucessivas, a ter início no mês seguinte após o trânsito em julgado da decisão de homologação do plano de revitalização;

2- Créditos Garantidos:

2.1. ......., S.A. (com garantia hipotecária)

- capital em dívida: € 1.837.520,00 que resulta da junção dos valores que a seguir se indicam: emprés­timo bancário- € 1.537.520,00; empréstimo c/c-€ 300.000,00 e ainda os juros vencidos e não pagos serão capitalizados e serão pagos nos termos do capital a partir do trânsito em julgado da sentença de ho­mologação do plano de recuperação;

Nota: Os valores dos juros a capitalizar serão calculados à data do trânsito da sentença que homologar o plano de recuperação e serão incorporados no capital, procedendo-se então à correção dos mapas de paga­mentos.

- Taxa de Juro: Euribor a 6 meses em vigor no fim de cada período e que atualmente é de 0,019%, acrescido de um spread progressivo ao longo do período: 2015/2017 - 1,5%;2018/2022 - 1,75%; 2023/2026 - 2,25% e 2027/2030 - 2,75%;

- Período de amortização: dois anos de carência de capital em que serão pagos apenas os juros, seguidos de treze anos de amortização de capital e juros (2018/2030);

- amortizações semestrais de capital e progressivas e escalonadas de acordo com os períodos das taxas de juro indicadas no ponto 2, ficando o valor residual a amortizar de cerca de 30% do valor da dívida ini­cial, no final do período;

- os juros vencidos semestralmente serão pagos integralmente na data do seu vencimento;

- no caso de o ....... pagar a garantia bancária constante dos autos, o pagamento pela AA será efetuado nos termos propostos para o restante crédito, aproveitando o prazo em falta;

- a contagem dos prazos referentes ao período de amortização da dívida inicia-se no dia imediato à data do trânsito em julgado da sentença homologatória do plano de recuperação proposto;

- manutenção da garantia real (hipoteca) prestada pela AA ao ......., S.A.;

- a AA compromete-se a comunicar de imediato ao ......., S.A. qualquer facto que diminua ou possa levar à diminuição do objeto da garantia ou do respetivo valor, designadamente, a intenção de alienar ou onerar o bem imóvel dado de hipoteca ao ......., S.A.;

- no caso da AA pretender alienar o bem imóvel dado como garantia ao ......., S.A. compro­mete-se a:

i) informar antecipadamente o ......., S.A.;

ii) apurar junto do ......., S.A. qual o montante em dívida para cancelamento do distrate da hi­poteca;

iii) proceder ao pagamento, aquando da celebração do contrato ou em data anterior,da quantia em dívida indicada pelo ......., S.A.;

3- Montepio Geral (crédito comum):

- capital em dívida: €50.308,47 que resulta do valor reclamado por esta instituição bancária;

- taxa de juro Euribor a 6 meses em vigor no final de cada período e que atualmente é de 0,019%, acres­cido de um spread de 1,5%;

- período do empréstimo: 2 anos de carência em relação ao capital (2015/2017) + 13 anos (2018/2030);

- amortizações semestrais de capital e progressivas;

- os juros vencidos semestralmente serão pagos integralmente na data do seu vencimento;

- manutenção das garantias existentes;

4- Demais Créditos Comuns:

Os créditos referentes a fornecedores, prestadores de serviços e outros credores, serão pagos integralmente, com um ano de carência e a serem amortizados em prestações mensais de acordo com o seguinte critério: valores inferiores a € 200,00 - 12 prestações; valores compreendidos entre € 201,00 e € 500,00 - 24 prestações; créditos de valores compreendidos entre € 501,00 e € 1.000,00 - 36 prestações e valores supe­riores a € 1.000,00 - 150 prestações;

O período de carência de um ano será contabilizado com data ao início seguinte à data da publicação no Citius da homologação do PER.

O início do plano de pagamento deve ocorrer um ano após a data da publicação no Citius da homologação do PER.

Perdão total dos juros vencidos e vincendos.

5- Créditos Laborais:

Pagamento integral dos créditos laborais em 150 prestações mensais e sucessivas, com exceção dos créditos com valores mais reduzidos e de acordo com o seguinte critério: valores inferiores a €200,00 - 12 presta­ções; valores compreendidos entre €201,00 e €500,00 - 24 prestações; créditos de valores compreendidos entre € 501,00 e €1.000,00 - 36 prestações e valores superiores a € 1.000,00 - 150 prestações;

O período de carência de um ano será contabilizado com data ao início seguinte à data da publicação no Citius da homologação do PER.

O início do plano de pagamento deve ocorrer um ano após a data da publicação no Citius da homologação do PER.

Perdão total dos juros vencidos e vincendos.

6 - Créditos Subordinados:

Conversão em capital após o trânsito em julgado do despacho de homologação do plano de recuperação e a pagar dentro das condições respetivas referidas nos pontos anteriores.

7- Créditos Sob Condição:

Os créditos sob condição se e quando se vierem a verificar as condições de que dependem, serão englobados no plano e terão o mesmo tratamento que os da classe em que se inserem.

B- Âmbito

As alterações aos créditos sobre a devedora introduzida pelo plano de recuperação produzir-se-ão indepen­dentemente de tais créditos terem sido, ou não, reclamados ou verificados (nº 6 do art.º 17º-F do CIRE).

O plano de recuperação acautela os créditos eventualmente controvertidos em processo de impugnação para que venham a ter o mesmo tratamento que os da classe em que se inserem.

C- Garantias

As garantias prestadas tocantes aos credores em referência mantêm-se plenamente em vigor.

As garantias pessoais prestadas pelos anteriores elementos da Direção da AA a favor do Montepio Geral, mantêm-se até ao cumprimento integral da dívida a esta instituição de crédito.

D- Impacto expectável das alterações propostas

O plano apresentado pela administração da devedora tem por finalidade expor as condições em que esta e os credores definem a continuidade da Associação, sob administração da devedora e nomeadamente os ter­mos em que serão feitos os créditos sob a devedora.

Mas considerando o volume de créditos a pagar de acordo com o plano de pagamentos anexo e aos valores estimados para os ativos e principalmente a sua natureza, nomeadamente nos graus de liquidez, não se vislumbra alternativa que não seja um programa de continuidade da atividade com uma estrutura de cus­tos reduzida e adaptada à nova realidade de mercado, permitindo libertar os meios que sejam considerados necessários que permitam satisfazer os créditos sobre a devedora.

Na ausência do apoio dos credores ao plano de recuperação, torna-se como certo o cenário de liquidação abrupta dos ativos.

Este cenário caracterizar-se-ia pela venda dos ativos para liquidação de parte dos passivos. E, como tam­bém se depreende o cenário de não recuperação não deixará de acarretar consequências graves a nível de alunos de ensino superior e da escola profissional que não poderão terminar os seus cursos, bem como as perdas enormes a nível dos ativos devido a um mercado do imobiliário ainda recessivo e de crise.

Com efeito, e caso suceda a não aprovação do plano de recuperação a requerente só poderia pagar aos seus credores os montantes resultantes das vendas do seu principal ativo que são as instalações.

Estima-se no cenário da não recuperação que os credores comuns – nomeadamente fornecedores, bancos e restantes credores- receberão apenas uma percentagem reduzida ou mesmo nula dos seus créditos, nomea­damente atenta a existência de credores privilegiados -Estado e credores garantidos.

Em alternativa, com a aprovação do plano teremos a garantia do pagamento dos créditos de acordo com as condições acima expostas.

De referir que se mostra imprescindível respeitar os períodos de carência propostos, dado que a AA necessita de repor o seu equilíbrio de tesouraria, pois é verdade que os vários fornecedores e outros prestado­res não irão no futuro próximo conceder facilidades de pagamentos.

Assim afigura-se de todo vantajoso a aprovação do presente plano de recuperação da AA.

E Preceitos legais derrogados                                                                           

Âmbito das derrogações do CIRE

Com o presente plano foram derrogados os seguintes preceitos legais do CIRE:

- foi derrogado o princípio da igualdade (art.º 194º do CIRE) no que se refere ao pagamento integral dos créditos a todos os credores e no acatamento dos princípios do pagamento ao Estado;

- Igualmente no que se refere aos créditos laborais, em virtude das garantias que legalmente lhes assistem, prevê-se o pagamento integral do capital, sem juros, em pé de igualdade com os restantes credores;

- Foi derrogado o princípio da igualdade (art.º 194º do CIRE) no que se refere ao pagamento dos créditos garantidos, com o pagamento integral da dívida e a manutenção das garantias já concedidas.

- As condições propostas são assim uniformes, embora na sua aplicação prática se encontrem condiciona­das pela natureza, dimensão e outras condições em que os créditos foram desenvolvidos.

F- Execução do plano e seus efeitos

Com o despacho de homologação, além dos demais efeitos legais, produzem-se as alterações dos créditos sobre a devedora introduzidas pelo plano de recuperação independentemente de tais créditos terem sido, ou não, reclamados ou verificados de acordo com os artigos 17.º-D, 17.º-F e 217.º do CIRE (…);

43 - O plano de recuperação foi votado por credores que representam 78,446% do total dos créditos reconhecidos e foi aprovado por credores que representam 72,556% dos votos emitidos.

44 – Dos documentos nºs 1 e 2 juntos com as contra-alegações resulta provado, ainda, o seguinte: A requerida foi notificada, por email datado de 26.10.2015 de que por despacho de 20.10.2015 tinha sido aprovada pelo Director Geral da ADSE a proposta por ela apre­sentada para liquidação, no âmbito do PER, da dívida existente em 22 de Julho de 2015 e reconhecida no montante de € 105.590,75 em 150 prestações mensais e sucessiva, no va­lor de € 703,94 cada uma.

Matéria de Direito

Para revogar a sentença da 1ª instância e recusar, consequentemente, a homologação do plano de revitalização aprovado a Relação considerou no essencial ter havido, por um lado, violação não negligenciável do artº 17º-D, nºs 8 e 9, do CIRE, e, por outro, do prin­cípio da igualdade consagrado no artº 194º, nº 1, do mesmo diploma.

Quanto ao primeiro aspecto porque, não tendo existido, no caso, a “prévia definição das re­gras da negociação, não parece legítimo um modo de negociação com as instituições bancárias (reuniram-se duas vezes) e outro com os credores laborais através de e-mails com um curto prazo de resposta para su­gestões ou propostas de alteração”; no entendimento do acórdão recorrido a negociação que teve lugar “...interferiu com a justa salvaguarda dos interesses desses credores. Tratando-se de credores privilegiados, teriam de ser convenientemente ouvidos”. E acrescentou ainda: “ E depois não parece razoável que a devedora, que reuniu com as instituições bancárias, não o tenha feito com os credores labo­rais. Não é coerente exigir igualdade entre os credores relativamente ao conteúdo do plano e, depois, con­temporizar ou condescender com um tratamento desigual dos credores na fase das negociações. Se não se pode admitir que o plano introduza uma diferença de tratamento baseada apenas na grandeza dos créditos também não se pode admitir uma diferença negocial baseada na grandeza dos créditos ou da importância dos credores (apesar de os créditos dos trabalhadores preferirem em relação os créditos hipotecários). Aliás, só assim será possível respeitar um dos princípios orientadores aprovados pela Resolução do Conselho de Ministros nº 43/2011 de 25.10 – o nono - segundo o qual o acordo deve ser equilibrado do ponto de vista dos credores, não beneficiando uns em detrimento de outros (princípio da igualdade). E não se diga que os credores laborais eram em grande número, o que inviabilizava o rápido desenvolvimento das negoci­ações: o administrador dispunha de poderes para definir regras adequadas à boa marcha daquelas (cfr. nº 9 do art. 17º-D do CIRE). Que o procedimento negocial não acautelou os interesses dos credores, de­monstra-o, também, o facto de em 3.11.2015 a mandatária, em representação dos mesmos credores e ainda de XX e VVV, ter remetido ao administrador provisório os dois emails jun­tos a fls. 875 a 881 em que solicitou esclarecimentos sobre a proposta do plano de recuperação sem que tenha obtido qualquer resposta”.

Quanto ao segundo aspecto entendeu-se que o plano aprovado não assegura o respeito pelo princípio da igualdade porque “não garante aos trabalhadores, credores privilegiados, um tra­tamento mais favorável (e inerente à categoria dos seus créditos), ou sequer idêntico àquele que é concedido às instituições financeiras (ao ......., que dispõe de crédito garantido e até ao Montepio que apenas tem um crédito comum).... De todo o modo, e ainda que a devedora possa vir a beneficiar do crédito das instituições financeiras (designadamente do .......), isso não pode/deve servir para as privilegiar relativamente aos trabalhadores, que dispõem, estes sim, de créditos privilegiados e que, por isso, deviam ter beneficiado de um tratamento mais favorável. E esse tratamento privilegiado não passava necessaria­mente pela atribuição de juros vincendos (embora este constituísse um bom mecanismo para proteger os créditos dos trabalhadores da inevitável desvalorização durante o longo período de pagamento proposto). Podia traduzir-se, por exemplo, na redução mais significativa do número de prestações. O reembolso dos créditos em 13,5 anos não pode deixar de representar uma violência para os trabalhadores, especialmente para os despedidos e para os desempregados. Não se pode equiparar os créditos desses trabalhadores aos créditos das instituições bancárias, que têm por função emprestar dinheiro a longo prazo com juros e podem esperar, sem problemas, pelo seu reembolso. Redução que se podia até fazer até com alguma perda de ca­pital pra os trabalhadores (e aqui negociações mais demoradas e até presenciais podiam ter-se revelado mais frutuosas). Em resumo, ocorre violação não negligenciável do princípio da igualdade consagrado no nº 1 do art. 194º do CIRE”.

A recorrente contesta este enquadramento e valoração jurídica dos factos, sustentando que não existiu violação não negligenciável das regras procedimentais, nem do princípio da igualdade.

Cumpre, porém, chamar desde logo a atenção para o segue.

Como é sabido, os termos em que o STJ, enquanto tribunal de revista, julga os recursos, são os claramente estabelecidos no artº 682º, nºs 1 e 2, do CPC: cabe-lhe aplicar definiti­vamente o regime jurídico que julgue adequado aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido, sendo certo que a decisão deste último quanto à matéria de facto não pode ser alterada, salvo o caso excepcional previsto no artº 674º, nº 3, que na presente situação não se verifica e nem sequer é alegado pela recorrente.

Ora, confrontando as conclusões da minuta com o elenco da matéria de facto dada como assente pela Relação, acima destacada (pontos 1 a 44), verifica-se que, intencionalmente ou não, a recorrente assenta uma parte considerável das conclusões que extrai para sus­tentar a sua tese no plano jurídico em factos que pura e simplesmente não estão adquiri­dos no processo, ou então estão, mas não com os qualificativos que lhes adiciona e per­mitem uma qualificação jurídica ilusória e enganadora; factos que, portanto, não podem de modo algum ser tomados em consideração por este STJ e interferir no julgamento de fundo do litígio já que, por outro lado, não são factos notórios nem documentalmente comprovados.

Assim, não se encontra provado, designadamente, o seguinte:

- Que a recorrente conferiu aos seus credores oportunidade real e efectiva de conhecerem e se pronunciarem sobre o plano de recuperação, apresentando propostas de alteração em prazos perfeitamente razoáveis e compatíveis com a celeridade imposta pelo carácter ur­gente do PER;

- Que antes de partir para as negociações com o credor ....... a recorrente envidou os seus melhores esforços para poder oferecer aos trabalhadores as mesmas condições de pagamento estabelecidas para os créditos de natureza pública;

- Que só depois de harmonizar o seu plano de negócios com o compromisso de pagar aos trabalhadores dentro do mesmo prazo em que pagaria aos credores públicos é que a re­corrente procurou negociar com o ......., forçando-o a aceitar que o pagamento do seu crédito tivesse lugar no mesmo prazo já fixado para os credores públicos e privile­giados;

- Que o Montepio, tal como o ......., tem uma importância estratégica na solução encontrada para a recuperação da recorrente, na medida em que esta poderá contar com a concessão de empréstimos bancários por parte daquela instituição bancária para o desen­volvimento da sua actividade;

- Que os credores que não aceitaram a decisão tomada pela maioria sejam na sua grande maioria ex-docentes universitários que resolveram os seus contratos de docência e presta­ção de serviços com a AA e não dependem dos proventos resultantes da prestação des­ses serviços para sustentar as suas famílias, na medida em que se encontravam em regime de não exclusividade.

Suprimida a matéria de facto, bem como os qualificativos sublinhados, que pusemos em relevo, facilmente se verifica que as conclusões extraídas pela recorrente acerca da ausên­cia de violação das regras procedimentais e do princípio da igualdade na aprovação do plano de revitalização perdem grande parte da sua força persuasiva e consistência jurídica, ficando sem base de apoio suficiente.

Em contrapartida, sobressai a justeza e o acerto das ilações tiradas no acórdão recorrido e que também já sublinhámos, ilações essas com as quais não podemos deixar de manifestar inteira concordância.

Vale a pena acrescentar, em todo o caso, que deve de igual modo atribuir-se particular re­levância ao facto de o prazo concedido pelo administrador judicial provisório aos credo­res para se pronunciarem quanto ao plano ter sido singularmente escasso; bem vistas as coisas, deu-lhes, aparentemente, três dias, e mesmo assim incompletos, para o efeito (cfr factos 20 e 21) – entre 30/10/15 e 3/11/15 – sendo de notar que ainda em 3/11/15 lhes enviou a versão definitiva do plano de revitalização, tudo a autorizar a conclusão que terá propositadamente desconsiderado e (ou) desvalorizado, que mais não seja por falta de tempo útil para tanto, qualquer pedido de esclarecimento que lhe possa ter sido formu­lado por alguns dos credores naquele curto lapso temporal; isto é confirmado, de resto, pelos factos 23) e 24), que devidamente conjugados e articulados com as omissões para as quais o acórdão recorrido chamou, e bem, a atenção, evidenciam sem margem para dú­vida que houve violação não negligenciável de regras procedimentais. Na verdade, en­contra-se já suficientemente estabilizado, quer na jurisprudência, quer na doutrina, o que deve entender-se por tal. Normas procedimentais “são todas aquelas que regem a actuação a desenvolver no processo, que incluem os passos procedimentais que nele devem ser dados até que os credores decidam sobre as propostas que lhes foram apresentadas – incluindo, assim, as regras que disciplinam as negociações a encetar entre os credores e o devedor e as regras que regulam a aprovação e votação do plano – e, bem assim, as relativas ao modo como o plano deve ser elaborado e apresentado” [1]; e a violação destas normas terá de considerar-se não negligenciável quando “possa influir no exame ou na decisão da causa”, sendo certo que “a decisão a tomar nesta matéria deverá ser sempre feita de forma casuística” [2]. Ora, temos por certo que o modo, em concreto, como as negociações foram conduzidas e realizadas, efectuando-se reuniões presenciais somente com o credor ....... para definir os critérios de pagamento do crédito hipotecário, e limitando-se o ad­ministrador judicial provisório a enviar aos restantes credores o plano aprovado, conce­dendo-lhes um prazo notoriamente curto para se pronunciarem com verdadeiro conhe­cimento de causa, integra uma violação procedimental que não é de carácter menor, de somenos importância,  uma vez que pôs em causa o interesse de uma parte considerável dos credores, com tanto mais significado quanto é certo que grande número deles cons­tituiu advogado para ser representado naquela fase do processo e comunicou em tempo oportuno a quem de direito o seu interesse em participar nas negociações a decorrer.

No que toca à violação do princípio da igualdade – artº 194º do CIRE – que é uma im­portante norma a respeitar no estabelecimento do conteúdo material do plano de revitali­zação, sob pena de recusa oficiosa da sua homologação por parte do tribunal (artºs 17º- F, nº 5, e 215º do mesmo diploma), pouco ou nada temos a acrescentar ao que foi ponde­rado no acórdão recorrido, que por si só responde cabalmente às conclusões extraídas na minuta da revista. A lei admite expressamente, no citado artº 194º, nº 1, o estabelecimento de diferenciações entre credores “justificadas por razões objectivas”; no caso dos autos, porém, o plano aprovado não põe a nu nenhuma razão plausível para o tratamento privilegiado que concede aos dois Bancos – ....... e Montepio – no confronto com os credores titulares de créditos laborais, o que se torna de impossível aceitação no quadro da aprecia­ção da legalidade substancial do acordo cometida ao tribunal quando em boa verdade o Montepio é um credor comum e os recorridos são titulares de créditos privilegiados.

Tanto basta para se concluir que o acórdão da 2ª instância não merece qualquer censura, improcedendo ou mostrando-se deslocadas  todas as conclusões do recurso.

III. Decisão

Nos termos expostos, acorda-se em negar a revista.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 7 de Fevereiro de 2017

Nuno Cameira (Relator)

Salreta Pereira

João Camilo

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  [1] O Processo Especial de Revitalização – Comentários aos artigos 17º-A a 17º-I do CIRE – Nuno Salazar Casanova –David Sequeira Dinis – pág. 144

[2] Cfr. obra citada na nota anterior, pág. 143; em idêntico sentido, Carvalho Fernandes e João Labareda, CIRE Anotado, 2ª edição, pág. 826, e Filipa Gonçalves, em Estudos de Direito da Insolvência, coordenação de Mª do Rosário Epifânio – O Processo Especial de Revitalização – pág. 81.