Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 2.ª SECÇÃO | ||
Relator: | AFONSO HENRIQUE | ||
Descritores: | ADMISSIBILIDADE DE RECURSO RECURSO DE REVISTA DUPLA CONFORME PRESSUPOSTOS REJEIÇÃO DE RECURSO RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA | ||
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Data do Acordão: | 11/02/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | RECLAMAÇÃO - ARTº 643 CPC | ||
Decisão: | RECLAMAÇÃO INDEFERIDA | ||
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Sumário : | I - In casu, não estão em causa os meios de prova analisados, mas sim, a valoração/apreciação da prova por parte da Relação, com a qual o mesmo recorrente não se conforma. II - Contudo e como frisámos, a decisão de facto é inalterável - artº682º nº 3 do CPC. III – Prevalecendo assim, a situação de dupla conforme impeditiva do pretendido recurso para o STJ. | ||
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Decisão Texto Integral: |
ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NESTE SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (2ª SECÇÃO) AA, recorrente nos autos à margem identificados, em que é recorrida BB, notificado do douto despacho do Tribunal da Relação de Lisboa (refª Citius ......23) de 15.06.2023, que não admitiu o recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça/STJ, interposto do Acórdão que alterou a decisão sobre a matéria de facto e julgou a apelação totalmente improcedente e, em consequência, confirmou a sentença apelada, por não se conformar, vem dele reclamar, nos termos do artigo 643º, nº. 1, do Código do Processo Civil, com os seguintes fundamentos: 1. A não admissão do recurso fundamentou-se na (pretensa) ocorrência de “uma situação de dupla conforme”, pois, “apesar de ter alterado a decisão sobre a matéria de facto, tal alteração nenhuma influência teve na apreciação do mérito da causa ou da apelação.” (cit.). Entende-se que “Com a dupla conforme o legislador pretende restringir o recurso de revista às questões de direito que tenham merecido respostas diversas das instâncias, ou nas quais se tenha verificado um voto de vencido” (cit. Acórdão do STJ de 12.04.2018, Rev. 206/14.5T2STC-B.E1.S1, Sousa Lameira, “A dupla conforme no actual CPC Jurisprudência do STJ”, Sumários de Acórdãos de 2016 a Março de 2022, Gabinete de Assessores do STJ, Assessoria Cível, p. 43, disponível em stj.pt). 2. O objecto do recurso é definido pelas conclusões da alegação do recorrente, salvo existindo questões que sejam de conhecimento oficioso - artigos 635º, n.ºs 3 e 4 e 639º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil. 3. Resulta das conclusões das alegações que o objeto do recurso é o não uso dos poderes da Relação sobre o julgamento da matéria de facto, em violação do disposto nos artigos 6º e 411º do CPC. Não pode assim ocorrer a situação de dupla conforme. 4. Inconformado, o recorrente interpôs o recurso que veio a ser decidido pelo Acórdão que ora se pretende impugnar e que também julgou insuficiente a prova produzida. Em nenhuma das instâncias, porém, o recorrente foi notificado para produzir a prova que se considera necessária, como deveria ter sucedido, em obediência ao princípio do inquisitório (cfr. artigos 6º., 411º e 590º. do CPC) 5. Das decisões do Tribunal da Relação que conhecem do mérito da causa cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça (cfr. artigo 691º do CPC). O recurso de revista “… pode também fundar-se, isolada ou cumulativamente, na violação ou errada aplicação da lei de processo, ou integrar, a título principal ou acessório, a arguição de nulidades do acórdão” (cit. António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, pág, 320). 6. No que mais interessa, porém, atentos os respectivos fundamentos, o objecto do recurso que não se admitiu é limitado a questões que apenas o douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa conheceu, isto é, questões que não foram conhecidas pela douta sentença de 1ª instância. Por apenas existir uma decisão, não é, pois, possível a pretensa situação de dupla conforme. 7. Neste sentido, por exemplo, os seguintes arestos: “I - A recorribilidade do acórdão da Relação que, além de decidir questão processual colocada em sede de apelação, conhece de mérito, mostra-se arredada da previsão do art. 671.º, n.º 2, do CPC, aplicável apenas às situações em que a Relação se debruça, unicamente, sobre a relação processual. II - Cingindo a recorrente a sua discordância relativamente ao segmento do acórdão que se pronunciou sobre questão processual – irregularidade de notificação ao abrigo do art. 47.º, n.º 3, do CPC e violação dos princípios do contraditório e da igualdade das partes –, a dupla conformidade de decisões quanto ao mérito da causa não é impeditiva da admissibilidade da revista normal quanto àquele segmento que a recorrente pretende ver sindicado, porquanto não ocorre a sobreposição decisória limitativa do recurso para o STJ por constituir a primeira decisão quanto à questão. (…)” Acórdão do STJ de 12-03-2019 - Revista n.º 648/13.3TBABT-E.E1.S1 - 6.ª Secção - Graça Amaral (Relatora), (cit. Sumários, pág. 71.) III - Imputando-se, na revista, ao acórdão da Relação que admitiu e julgou o recurso interposto pelos réus contra a decisão proferida sobre os factos, a violação de regras adjectivas atinentes ao conhecimento dessa impugnação, não tem cabimento falar em dupla conformidade, pela simples razão de que se trata de decisão proferida apenas pela Relação, não tendo a matéria que dela foi objeto sido apreciada pelo tribunal de la instância. (…)” Acórdão do STJ de 11-04-2019 - Revista n.º 1119/04.4TBMFR.L1.S1 - 2.ª Secção - Rosa Ribeiro Coelho (idem, p. 77). “I - Não obstante a dupla conforme existente entre decisões, essa mesma conformidade deixa de operar se a parte pretender reagir contra o não uso, ou o uso deficiente dos poderes da Relação sobre a matéria de facto, quando se invoca um erro de direito. (…)” Acórdão do STJ de 07-11-2019 - Revista n.º 8141/15.3T8GMR.L1.S1 - 7.ª Secção - Oliveira Abreu (Relator) (idem p. 94). 8. Nos autos, a questão a decidir é saber se qual a natureza, se bens próprios ou comuns, de imóveis e dinheiro, existentes à data do divórcio, do casal constituído por recorrente e recorrida. O recorrente afirma serem bens próprios seus, por terem sido adquiridos com dinheiro que lhe pertencia, por aplicação do artigo 1722º e ss. do Código Civil, na interpretação do AUJ do Supremo Tribunal de Justiça n.º 12/2015, de 13 de Outubro, publicado no DRE de 13.10.2015. O preço dos bens foi pago. Foi feita prova de que o dinheiro existia à data do casamento. 9. Para que a pretensão deduzida pelo recorrente procedesse, incumbia-lhe o ónus de provar que os bens tinham sido adquiridos com bens próprios seus. 10. No entendimento das instâncias, não terá sido produzida prova suficiente. Apesar do casamento ter tido lugar no dia 01.08.2003, o recorrente ter vendido um bem próprio e recebido o preço de 109.736,00 € no dia 29.08.2003, os imóveis terem sido comprados em 23.10.2003 e 5.12.2003, o preço ter sido pago e a recorrida apenas ter alegado que pagou € 2.196,71, não se terá provado que os meios utilizados pertenciam ao recorrente. 11. Não obstante ter sido aceite na douta sentença que “Apesar de ser o mais provável e lógico que o valor do bem vendido pelo cabeça de casal (aqui recorrente) tenha composto o valor depositado em 29 de Agosto de 2003 na conta comum, o Tribunal não consegue concluir com segurança por tal situação, pois o valor não coincide com o valor da venda efectuada.” Pois, o valor depositado em 29.08.2003 foi de 112.229,53 € e o preço recebido da venda do bem próprio do recorrente na mesma data, em 29.08.2003, foi de 109.736,00 €. Continua a douta sentença: “Ora, se o valor do depósito não coincide com o valor da venda, tal significa que outros valores foram depositados na conta comum, (…)”, “Uma vez que o cabeça de casal não fez prova da proveniência dos valores depositados na conta para além de qualquer dúvida razoável, os valores da mesma, sendo uma conta comum, presumem-se de ambos os titulares, em partes iguais.” A diferença de valores que se discute e por isso não se aceita o valor da venda do bem próprio do recorrente, é de 2.493,53 € - (112.229,53 € - 109.736,00 €). 12. Mas também não se provou sobre a quem pertenciam, apesar de se considerar provada a venda do bem próprio do recorrente ocorrida em 29.08.2003 e do tempo decorrido sobre o casamento (três meses) impor a presunção conclusão de que, no valor excedente ao empréstimo, os bens eram próprios dos cônjuges. 13. Decorre do artigo 411º do CPC que o tribunal deve realizar ou ordenar as diligências necessárias ao apuramento da verdade material e à justa composição do litígio e, nomeadamente, notificar, para convidar, as partes para produzir as provas que considera necessárias para remover as dúvidas que se suscitem e que in casu claramente se suscitaram. No entendimento do recorrente não é por isso possível concluir que um facto não se provou, sem previamente a parte ter sido convidada a juntar a prova que se considera necessária. 14. A douta sentença proferida na 1ª instância não considerou provado que tivesse sido o recorrente a pagar o preço das fracções. Em consequência, apesar das fracções terem sido adquiridas respectivamente dois meses e alguns dias e cerca de quatro meses após o casamento e, portanto, ser facto notório que a parte do preço (€ 120.000,00 e € 17.500,00) paga sem recurso ao empréstimo bancário (€ 50.000,00), foi suportada por bens próprios de algum dos cônjuges (nesse prazo não podia haver bens adquiridos a título oneroso por ambos), decidiu em prejuízo do recorrente, por falta de prova, não obstante entender que o valor resultante da venda do bem próprio do recorrente tinha composto o valor depositado em 29.08.2003, por “ser o mais provável e lógico”. 15. Não existindo situação de dupla conforme, o recurso é admissível e deve ser admitido. Em causa está o não uso dos poderes da Relação sobre a matéria de facto, em violação do disposto nos artigos 6º, 411º e 490º do CPC. Nestes termos e nos demais de Direito, com o douto suprimento de V. Exas. que desde já se requer, autuado o presente por apenso e instruído com o requerimento de interposição de recurso e as alegações, a decisão recorrida e o despacho ora reclamado, nos termos do nº. 3 do artigo 643º do C.P.C., deve a presente reclamação ser distribuída no Supremo Tribunal de Justiça e apresentada ao Relator, para que profira decisão, prosseguindo o recurso os seus ulteriores termos e apenas assim se fazendo a costumada JUSTIÇA. BB, recorrida no processo identificado em epígrafe, notificada da Reclamação apresentada pelo recorrente contra o despacho de não admissão de recurso veio, nos termos do disposto no artigo 643º, n.º 2, do Cód. Proc. Civil, responder, como segue: I - Da rejeição da reclamação por falta de conclusões: 1 - Entende a recorrida que a presente reclamação terá de ser liminarmente rejeitada, pois que o recorrente nela não apresenta conclusões, ficando prejudicada apreciação das questões ali suscitadas. 2 - Conforme resulta do disposto no artigo 639º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil, quando o apelante interpõe recurso de uma decisão passível de apelação, fica automaticamente vinculado à observância de dois ónus: 3 - O primeiro é o denominado ónus de alegação, no cumprimento do qual se espera que o apelante analise e critique a decisão recorrida, imputando as deficiências ou erros, sejam de facto e ou de direito, que, na sua perspectiva, enferma essa decisão. 4 - O segundo ónus, denominado de ónus de concisão ou de conclusão, traduz-se na necessidade de finalizar as alegações recursivas com a formulação sintética de conclusões, em que é suposto que o apelante resuma ou condense os fundamentos pelos quais pretende que o tribunal ad quem modifique ou revogue a decisão proferida pelo tribunal a quo. 5 – Ocorre que a reclamação, à semelhança do recurso, num pedido de reapreciação de uma decisão do tribunal que a proferiu, dirigida a um tribunal de hierarquia superior, com a finalidade de a revogar ou substituir por outra mais favorável, deve observar as mesmas regras formais, entre elas, a de formular conclusões. 6 – Nesse sentido tendo já concluído várias decisões dos Tribunais superiores, como por exemplo: 6.1 - «A chamada reclamação do despacho que não admite o recurso, nos termos do artigo 643.º do CPC, é um verdadeiro recurso, razão pela qual não se deve dispensar que as alegações concluam pela formulação de conclusões, sob pena de indeferimento.»1 6.2 - «A chamada reclamação do despacho que não admite o recurso do artigo 643º do CPC é um verdadeiro recurso, razão pela qual não dispensa a apresentação de alegações (compostas por motivação e conclusões).»2 6.3 - «A reclamação, à semelhança do recurso, num pedido de reapreciação de uma decisão do tribunal que a proferiu, dirigida a um tribunal de hierarquia superior, com a finalidade de a revogar ou substituir por outra mais favorável, deve observar as mesmas regras formais, entre elas, a de formular conclusões.»3 7 – Razão, porque, a final, deverá ser rejeitada a reclamação apresentada pelo recorrente, não se conhecendo do seu objeto, mantendo-se o despacho proferido pelo Senhor Relator do Tribunal da Relação de Lisboa de não admissão do recurso de revista. II – Sem conceder e para o caso da reclamação ser conhecida: 8 – Dispõe o nº 3, do artigo 671º, do Cód. Proc. Civil que “sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível, não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1ª instância (…)”. 9 – Ou seja, verificando-se uma situação de dupla conforme o recurso ordinário de revista, a revista dita normal, não é admissível, como expressamente determina o nº 3 do artigo 671º do Código de Processo Civil. 10 – Sendo a regra consagrada no artigo 671º, n.º 3, do Cód. Proc. Civil (designada por dupla conforme) um pressuposto processual negativo do recurso de revista, pois tem um “efeito inibitório quanto à recorribilidade” (cf. neste sentido acórdão STJ, de 19.2.2005, Procº 302913/11.6YIPRT.E1.S1, citado por Rui Pinto), não pode deixar de entender-se, como bem entendeu o Tribunal da Relação de Lisboa (TRL), que a decisão sob reclamação é irrecorrível, sendo de manter o despacho de não admissão do recurso para este Supremo Tribunal de Justiça (STJ). 11 – Com efeito, o reclamante procura sustentar inexistir dupla conformidade, por, na sua ótica, o TRL ter conhecido de questões que não foram conhecidas pela sentença de 1ª instância. 12 – Mormente, sustenta o reclamante, por não ter sido notificado para produzir a prova que considera necessária para sustentar tese que não logrou provar – qual seja, a de que os bens comuns objecto da partilha tenham sido adquiridos através de meios pertencentes ao recorrente. 13 – Ocorre, em primeiro lugar, que para que pudesse, ao menos em tese, considerar-se que o TRL estava obrigado a conhecer de questão que não fora conhecida pela 1ª instância, teria tal questão de assumir natureza essencial da diversidade da fundamentação, e não uma mera discrepância marginal, periférica, que não representam efetivamente um percurso jurídico diverso.4 14 – Pois que (e como bem evidenciado no despacho sob reclamação, citando Rui Pinto, in Notas ao Código de Processo Civil, pp. 444 e 445)), só haveria uma nova decisão se, mudando os fundamentos, tivesse mudado a qualidade da decisão. 15 – A [mera] desconformidade de fundamentos não tem valia em si mesma: se os fundamentos mudam, mas não muda a decisão, há dupla conforme (opus et locus citados). 16 - Em segundo lugar, tenha-se presente que o TRL julgou a apelação totalmente improcedente e, em consequência, confirmou a sentença apelada. 17 – O que significa que a Relação de Lisboa confirmou a decisão proferida pelo Juiz ..., do Tribunal de Família e Menores de .... 18 – Fê-lo com os votos concordantes dos três Juízes Desembargadores que compuseram o coletivo da secção, isto é, sem voto de vencido. 19 – Não tendo a decisão da Relação de Lisboa usado fundamentação essencialmente diferente da decisão da 1ª instância. 20 – Sendo que em relação a este último requisito – inexistência de fundamentação essencialmente diferente – a questão que não foi, sequer, colocada em causa pelo recorrente nas suas alegações (conclusões) de recurso. 21 – Não podendo, agora, em sede de reclamação, procurar sustentar que o suposto não uso dos poderes da Relação sobre o julgamento da matéria de facto (sempre sem conceder) constitui arguição de fundamentação essencialmente diferente. 22 – Por fim, persiste o recorrente, agora em sede de reclamação, que não foi notificado para produzir a prova que se considera necessária em obediência ao princípio do inquisitório. 23 – Também aqui não lhe assiste qualquer razão, porquanto o exercício dos poderes decorrentes de tal princípio coexiste com o princípio do dispositivo, da preclusão e da autorresponsabilidade das partes, “de modo que não poderá ser invocado para, de forma automática, superar eventuais falhas de instrução que sejam de imputar a alguma das partes, designadamente, quando esteja precludida a apresentação de meios de prova”.5 24 - Como observa LEBRE DE FREITAS, o juiz apenas deve ordenar a diligência: “na medida em que necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio”.6 25 - Esse juízo de necessidade resulta do confronto entre a prova produzida e os factos controvertidos a apreciar, alegados pelas partes e relacionados com os temas de prova (art. 5º e 410º CPC e art. 341 e seg do CC). 7 26 – Nem na Resposta à Reclamação de Bens, nem em qualquer outro requerimento – e os meios de prova são indicados com os requerimentos e com as respostas (artigo 1105º, n.º 2) o recorrente indicou os concretos factos a provar com as diligências que agora vem reclamar que o Tribunal a quo determine, nem o justificou, motivo pelo qual não estava demonstrada nem a necessidade, nem o relevo de tais meios de prova para a justa composição do litígio. 27 - Para o efeito, não basta que se reproduza a expressão da lei, como faz o recorrente nas suas alegações de recurso, sendo necessário para avaliação do relevo dos meios de prova que se demonstre a efetiva necessidade no contexto de toda a prova produzida e ponderando sempre os factos a provar. 28 - Tal exigência justificava-se de modo particular pelo facto de estar concluída a produção de prova indicada pelas partes, sobre quem recaía o ónus de indicação e produção de prova (artigo 552º e 572º, do Cód. Proc. Civil). 29 – Também, por aqui, se conclui que não se verifica qualquer irregularidade que possa interferir na decisão do mérito da causa, por não ter o Tribunal a quo ordenado ao recorrente que juntasse documento para prova de facto controvertido nos autos desde o início do processo, por não estarem preenchidos os pressupostos do artigo 411º, do Cód. Proc. Civil. 30 – Cite-se, a propósito, Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 12.03.2019, no âmbito do processo n.º 141/16.2T8PBL-A.C1, relator Alberto Ruço, cujo sumário na parte aplicável se transcreve: “(…) III - A norma do artigo 411.º do Código de Processo Civil, segundo a qual incumbe ao juiz ordenar oficiosamente todas as diligências probatórias que se mostrem adequadas a provar uma afirmação factual, não comporta a interpretação no sentido das partes não terem quaisquer responsabilidades probatórias, tem antes de ser aplicada tendo em consideração outros princípios processuais, como o princípio dispositivo, o da autorresponsabilidade e da igualdade das partes e o da preclusão de direitos processuais probatórios, sem esquecer o dever de imparcialidade do juiz. IV – Em regra, se a parte podia ter requerido certa diligência probatória e não o fez, a intervenção do juiz substituindo-se a ela, violará o princípio da preclusão e o da autorresponsabilidade das partes conjugado com o princípio da igualdade das partes no processo, pois estaria a permitir a prática de um ato já precludido, a esvaziar a autorresponsabilidade de uma das partes e eventualmente a favorecer a outra. V – A omissão da diligência probatória tem de ser analisada tendo em conta os conhecimentos que o processo fornecia ao juiz no exacto momento em que é assinalada a existência da omissão e não à luz dos conhecimentos posteriores que o processo permitiu adquirir.” 31 – Tudo razões porque deverá a presente reclamação ser julgada improcedente, mantendo-se o despacho que não admitiu o recurso de revista. III – Conclusões: - A reclamação, à semelhança do recurso, num pedido de reapreciação de uma decisão do tribunal que a proferiu, dirigida a um tribunal de hierarquia superior, com a finalidade de a revogar ou substituir por outra mais favorável, deve observar as mesmas regras formais, entre elas, a de formular conclusões. B – Sendo a reclamação do despacho que não admite o recurso, nos termos do artigo 643.º do CPC, um verdadeiro recurso, não se deve dispensar que as alegações concluam pela formulação de conclusões, sob pena de indeferimento. C – Não tendo o recorrente/reclamante apresentado conclusões deverá ser rejeitada a reclamação, não se conhecendo do seu objeto, mantendo-se o despacho proferido pelo Senhor Relator do Tribunal da Relação de Lisboa de não admissão do recurso de revista. Sem conceder: D - Dispõe o nº 3, do artigo 671º, do Cód. Proc. Civil que “sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível, não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1ª instância (…)”. E - Verificando-se uma situação de dupla conforme, o recurso ordinário de revista, a revista dita normal, não é admissível, como expressamente determina o nº 3 do artigo 671º do Código de Processo Civil. F – Sendo a regra consagrada no artigo 671º, n.º 3, do Cód. Proc. Civil (designada por dupla conforme) um pressuposto processual negativo do recurso de revista, não pode deixar de entender-se, como bem entendeu o TRL, que a decisão sob reclamação é irrecorrível, sendo de manter o despacho de não admissão do recurso para este STJ. G – Por um lado, porque para que pudesse, ao menos em tese, considerar-se que o TRL estava obrigado a conhecer de questão que não fora conhecida pela 1ª instância, teria tal questão de assumir natureza essencial da diversidade da fundamentação, e não uma mera discrepância marginal, periférica, que não representam efetivamente um percurso jurídico diverso, como verificado. H – Por outro lado, o TRL julgou a apelação totalmente improcedente e, em consequência, confirmou a sentença apelada, o que significa que a Relação de Lisboa confirmou a decisão proferida pelo ... do Tribunal de Família e Menores de ... com os votos concordantes dos três Juízes Desembargadores que compuseram o coletivo da secção, isto é, sem voto de vencido e não tendo usado fundamentação essencialmente diferente da decisão da 1ª instância. I - Sendo que em relação a este último requisito – inexistência de fundamentação essencialmente diferente – a questão que não foi, sequer, colocada em causa pelo recorrente nas suas alegações (conclusões) de recurso, pelo que lhe está vedado, agora, em sede de reclamação, procurar sustentar que o suposto não uso dos poderes da Relação sobre o julgamento da matéria de facto (sempre sem conceder) constitui arguição de fundamentação essencialmente diferente. J – Por outro lado, ainda e por fim, insubsiste razão ao reclamante de que não foi notificado para produzir a prova que se considera necessária em obediência ao princípio do inquisitório, pois o exercício dos poderes decorrentes de tal princípio coexiste com o princípio do dispositivo, da preclusão e da autorresponsabilidade das partes, “de modo que não poderá ser invocado para, de forma automática, superar eventuais falhas de instrução que sejam de imputar a alguma das partes, designadamente, quando esteja precludida a apresentação de meios de prova”. K – Deve, por isso, a Reclamação ser considerada improcedente, mantendo-se o despacho que indeferiu o requerimento de interposição de recurso apresentado pelo recorrente, agora reclamante. Termos em que deve ser negado provimento à reclamação, como é de LEI e de inteira JUSTIÇA. DESPACHO DE NÃO ADMISSÃO DO RECURSO OBJECTO DE RECLAMAÇÃO – ARTº 643º DO CPC: “-…- Inconformado com o acórdão proferido por este Tribunal em 13-04-2023, que, sem qualquer voto de vencido, julgou improcedente o recurso de apelação interposto da sentença proferida pela 1ª instância, veio o apelante interpor recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça. Sucede, porém que nos termos do disposto no 671º, nº 3 do Código de Processo Civil1 “os acórdãos da Relação que apreciem decisões interlocutórias que recaiam unicamente sobre a relação processual só podem ser objecto de revista: a) Nos casos em que o recurso é sempre admissível; b) Quando estejam em contradição com outro, já transitado em julgado, proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, no domínio da mesma relação de direito, salvo se tiver sido proferido acórdão de uniformização e jurisprudência”. Por seu turno, o nº 3 d referido art. 671º, nº3, do CPC que “Sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível, não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1ª instância.” Os casos em que o recurso é sempre admissível são os previstos no art. 629º, nº 2 do CPC e correspondem às situações: - invocação de violação e regras de competência internacional, ou em razão da matéria ou hierarquia ou ofensa do caso julgado; - decisões sobre o valor da causa ou dos incidentes, quando se alegue que o seu valor excede a alçada do tribunal de que se recorre; - decisões proferidas no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, contra jurisprudência uniformizada do STJ - acórdão da Relação em contradição com outro, dessa ou de outra Relação, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, do qual não caiba recurso ordinário, excepto se tiver sido proferido acórdão uniformizador de jurisprudência com ele conforme. Como ensina RUI PINTO2, a regra consagrada no citado art. 671º, nº 3 do CPC, habitualmente designada por dupla conforme integra um pressuposto processual negativo na medida em que obsta à recorribilidade. De acordo com a jurisprudência dominante do Supremo Tribunal de Justiça, existe uma fundamentação essencialmente diferente se o acórdão do Tribunal da Relação: - Assentar num enquadramento normativo absolutamente distinto daquele que foi ponderado na sentença de 1ª instância, irrelevando: (i) uma modificação da matéria de facto que não se repercuta em diferente e essencial subsunção legal (ii) bem como dissensões secundárias; - Contiver divergências marcantes e significativas em termos de qualificação ou de enquadramento jurídico no tocante a aspetos que não sejam acessórios ou secundários para a discussão ou julgamento da causa. A este propósito, refere ABRANTES GERALDES3 que “A alusão à natureza essencial da diversidade da fundamentação claramente nos induz a desconsiderar, para o mesmo efeito, discrepâncias marginais, secundárias, periféricas, que não representam efetivamente um percurso jurídico diverso. Ou assim quando a diversidade de fundamentação se traduza apenas na não aceitação, pela Relação, de uma das vias trilhadas para atingir o mesmo resultado ou, do lado inverso, no aditamento de outro fundamento jurídico que não tenha sido considerado ou que não tenha sido admitido.” Por sua vez, RUI PINTO4, afirma que “a desconformidade de fundamentos não tem valia em si mesma, mas enquanto causa lógico-jurídica de desconformidade da decisão: se os fundamentos mudam, mas não muda a decisão, há dupla conforme; mas se os fundamentos mudam e muda a qualidade (já não a quantidade quando menor, pelas razões atrás explanadas) do efeito material da decisão, em bom rigor há uma nova decisão, mesmo que esta se mantenha formalmente idêntica.” Acresce que o STJ tem igualmente enfatizado, de forma repetida, que a ratio do preceito que consagra a dupla conforme impõe que esta se aplique também, por maioria de razão, aos casos em que a decisão recorrida represente uma situação mais vantajosa para o recorrente, ainda que tal conclusão resulte de um juízo global – vd., entre muitos outros, os acs. de 02-02-2016 (Fernandes Vale), p. 540/11.6TVLSB.L2.S1; e de 22-02-2017 (Lopes do Rego), p. 811/10.9TBBJA.E1.S1. Finalmente cumpre salientar que a arguição de nulidades do acórdão do Tribunal da Relação não constitui fundamento autónomo de recurso nas situações em que se verifica a dupla conforme. Em tais circunstâncias, cabe apenas reclamação para a conferência, nos termos previstos nos art. 615º, nº 4, e 666º, nºs 1 (1ª parte), e 2 do CPC. Tal reclamação deve ser apresentada no prazo de 10 dias, a contar da notificação do acórdão do Tribunal da Relação (art. 149º do CPC). No sentido de todo o exposto cfr. acs.: - STJ 15-05-2014 (Silva Gonçalves), p. 5869/09.0TBMTS.P1.S1; - STJ 08-01-2015 (João Trindade), p. 129/11.0TCGMR.G1.S1. - STJ 12-03-2015 (Leones Dantas), p. 1277/11.1TTBRG.P1.S1; - STJ 30-04-2015 (Serra Baptista), p. 1583/08.2TCSNT.L1.S1; - STJ 18-06-2015 (Helena Moniz), p. 623/10.T3SNT.L1.S1; - STJ 28-01-2016 (Ana Luísa Geraldes), p. 802/13.8TTVNF.P1.G1-A.S1; - STJ 15-02-2018 (Rosa Ribeiro Coelho), p. 28/16.9T8MGD.G1.S2; - STJ 15-02-2022 (Isaías Pádua), p. 16399/15.1T8LSB-A.L1.S1; - STJ 12-01-2021 (Fernando Samões), p. 492/13.8TBPDL.L1-A.S1; - STJ 06-07-2022 (Pedro Branquinho Dias), p. 240/19.9T8FAR.E1.S1; - STJ 29-09-2022 (Oliveira Abreu), p. 19864/15.7T8LSB.L1-A.S1; - STJ 30-12-2022 (Ana Resende), p. 12674/21.4T8SNT.L1.S1; No caso dos autos, o acórdão recorrido confirmou a sentença apelada sem qualquer voto de vencido, sendo certo que, apesar de ter alterado a decisão sobre matéria de facto, tal alteração nenhuma influência teve na apreciação do mérito da causa ou da apelação. Por outro lado, a fundamentação expendida por este Tribunal não se diverge radicalmente daqueloutra adotada pelo Tribunal a quo. Ocorre, pois, uma situação de dupla conforme. Acresce ainda que no caso não foi invocada nem se verifica nenhuma das situações que, nos termos previstos no art. 629º, nº 2 do CPC, sempre legitimariam a interposição do recurso de revista. Nesta conformidade, concluímos que o acórdão recorrido é irrecorrível, pelo que não pode ser admitido. Restaria então apurar se as nulidades invocadas podem ser apreciadas por este Tribunal, nos termos das disposições conjugadas dos arts. 615º, nº 4 e 666º, nºs 1 (1ª parte), e 2, do CPC. Como já referimos, tal arguição de nulidades está sujeita ao prazo de 10 dias. No caso vertente, verifica-se que o apelante foi notificado do acórdão proferido por este Tribunal por meio de comunicação eletrónica de 03-05-20235, pelo que se considera notificado no 3º dia posterior ou no 1º dia útil subsequente, (vd. art. 248º, nº 1 do CPC), o que no caso se verificou em 08-05-2023, já que o dia 06-05-2023 foi um sábado. Assim, a contagem do mencionado prazo iniciou-se em 09-05-2023 (art. 279º, al. b) do CC) e terminou em 18-05-2023. Processo: 30487/15.0T8LSB-E.L1. Não obstante, poderia ainda o apelante apresentar a reclamação para a conferência num dos três dias úteis subsequentes, ou seja, nos dias 19, 22, ou 23-05-2023, mediante o pagamento da multa prevista no art. 139º, nº 5 do CPC. Tendo as alegações de recurso dado entrada neste Tribunal em 23-05-2023, a apreciação das nulidades invocadas depende do prévio pagamento da multa a que se reporta o art. 139º, nº 5 do CPC. Não obstante, cremos que em caso algum será devida a penalização prevista no nº 6 do mesmo preceito, porquanto a omissão do pagamento da mencionada multa se deveu à errónea convicção de que o acórdão proferido por este Tribunal era recorrível. II. Assim sendo, e por todo o exposto, decide este Tribunal não admitir o recurso de revista. Custas pelo recorrente. Caso mantenha o interesse na apreciação das nulidades invocadas em conferência, deverá o recorrente, no prazo de 10 dias, manifestar tal desiderato, devendo, nesse caso, proceder à liquidação da multa a que se reporta o art. 139º, nº 5, al. c) do CPC. -…-” Neste Supremo Tribunal de Justiça/STJ a RECLAMAÇÃO DEDUZIDA – artº 643º do CPC - foi decidida nestes termos: “-…- DECISÃO - Assim e pelos fundamentos expostos, decide-se julgar improcedente a presente reclamação, e consequentemente, mantém-se o despacho objecto de reclamação. - Custas pelo reclamante e recorrente. -…-” O recorrente/A. veio reclamar daquela decisão para a Conferência nos termos do artº 652º nº 3 do CPC, alegando e concluindo do seguinte modo: - A presente reclamação para a conferência tem por objeto a douta decisão singular, que confirmou a não admissão do recurso interposto do douto Acórdão do Tribunal da Relação, por considerar que o seu objeto, se insere “no âmbito da apreciação da prova, matéria não sindicável pelo Supremo Tribunal de Justiça/STJ”. - No entanto, o fundamento do recurso é o deficiente julgamento da matéria de facto, por o tribunal ter decidido com fundamento em factos que reconhece insuficientes para o efeito. - A prova é livremente apreciada pelo juiz (cfr artigo 607º, nº. 5 do CPC), que pode exigir maior ou menor grau de certeza, razão pela qual a decisão deve ser fundamentada e o juiz deve “realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade” (art. 411º do CPC): doutro modo, a parte pode ser prejudicada pela imprevista exigência de certeza além de qualquer dúvida razoável. Assim, - Assim, não está em causa o sentido do julgamento que se entende deveria ter sido proferido e, portanto, a questão não é de facto, mas sim a validade da decisão que foi proferida com dúvidas (sem conceder quanto à sua justificação), em violação evidente da lei de processo (v.g. artigos 6º., 411º e 590º. do CPC). - A violação da lei de processo constitui fundamento do recurso de revista (cfr. al. b) do nº. 1 do artigo 674º do C.P.C. e António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luis Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, pág. 826-827). - Também porque no recurso se pretende sindicar a decisão do tribunal da Relação, o seu fundamento não é questão de direito decidida de forma idêntica nas instâncias, pelo que não ocorre dupla conforme. A revista deve por isso ser admitida e prosseguir os seus termos até final. Ao assim não entender, a decisão singular ora impugnada viola os artigos 6º., 411º, 590º e 674º do C.P.C., pelo que deve ser revogada e a revista admitida. A recorrida respondeu, pugnando pela manutenção da decisão singular agora objecto de reclamação para a conferência, em consonância com a sua resposta A) - APRECIANDO E DECIDINDO, EM CONFERÊNCIA Como se constata, na reclamação do recorrente/A. para esta conferência, aquele admite que “no recurso se pretende sindicar a decisão do tribunal da Relação, o seu fundamento não é questão de direito decidida de forma idêntica nas instâncias, pelo que não ocorre dupla conforme.” Passamos a reproduzir os fundamentos da decisão singular exarada neste STJ: “-…- Sabemos que a referida figura da dupla conforme foi introduzida com a Reforma de 2007 tendo em vista “a racionalização do acesso ao STJ, acentuando-se a sua função de orientação e uniformização da jurisprudência, procurando dar resposta à notória tendência de crescimento dos recursos cíveis” – vide, Preâmbulo do DL 303/2007, de 24-8. Estamos igualmente cientes de que a reforma de 2013 veio acrescentar à unanimidade do acórdão confirmatório que a fundamentação seja no essencial idêntica – cfr. actual redacção do artº 671º nº 3 do CPC. Paralelamente à analisada restrição ao acesso ao STJ, o Legislador prevê no artº672º do CPC as excepções que consubstanciam a intitulada revista excepcional – cfr. a), b) e c), do nº 1 daquele preceito legal. A doutrina e a jurisprudência tem vindo a densificar o conceito geral de não aplicação pela Relação de “fundamentação essencialmente diferente”. Hoje é pacífico que se deve desconsiderar para esse efeito “discrepâncias marginais, secundárias, periféricas, que não representam efectivamente um percurso jurídico diverso; ou mesmo quando a diversidade de fundamentação se traduza apenas na recusa, pela Relação, duma das vias trilhadas pela 1ª Instância para atingir o mesmo resultado; ou o aditamento de outro fundamento jurídico; ou no reforço argumentativo; sem que se ponha em causa a fundamentação essencial usada pelo tribunal de 1ª Instância” – António Abrantes Geraldes, in, “Recursos em Processo Civil”, 7ª edição actualizada, em particular, pags. 424 e 425. Exemplificando a nível jurisprudencial, e de modo paradigmático, refere-se no Acordão do STJ, de 28-5-2015, publicitado in, www.dgsi.pt.: “só se pode considerar existente uma fundamentação essencialmente diferente quando a solução jurídica do pleito prevalecente na Relação tenha assentado, de modo radicalmente ou profundamente inovatório, em normas interpretações normativas ou institutos jurídicos perfeitamente diversos e autónomos dos que haviam justificado e fundamentado a decisão proferida na sentença apelada - ou seja, quando tal acórdão se estribe decisivamente no inovatório apelo a um enquadramento jurídico perfeitamente diverso e radicalmente diferenciado daquele em que assentara a sentença proferida em 1ª Instância.”- publicitado in, www.dgsi.pt. Estamos perante um caso em que o recurso é sempre admissível? Não estamos face a qualquer das hipóteses enunciadas no artº 629º nº 2 do CPC: “a) violação das regras de competência (…); b) quando ao valor da causa (…); c) decisões contra jurisprudência uniformizada do STJ (…); c) acórdão da Relação em contradição com outro (…)”. O acórdão uniformizador citado pelo recorrente (AUJ do Supremo Tribunal de Justiça nº 12/2015) pressupõe que o bem ou bens em causa sejam comprovadamente próprios. O recorrente, com a contestação da recorrida – esta corrobora o entendimento do Tribunal a quo – defende que não há uma situação de dupla conforme, tendo em conta que: “o objecto do recurso é o não uso dos poderes da Relação sobre o julgamento da matéria de facto, em violação do disposto nos artigos 6º e 411º do CPC.” Segundo o mesmo recorrente, a Relação, oficiosamente ou notificando o mesmo recorrente para o efeito, devia esclarecer as dúvidas que manifestou sobre a titularidade dos bens em causa. Como o próprio recorrente refere, a Relação alicerçou a sua convicção, nestes termos: “Ora, se o valor do depósito não coincide com o valor da venda, tal significa que outros valores foram depositados na conta comum, (…)”, “Uma vez que o cabeça de casal não fez prova da proveniência dos valores depositados na conta para além de qualquer dúvida razoável, os valores da mesma, sendo uma conta comum, presumem-se de ambos os titulares, em partes iguais.” Significa isto que estamos no âmbito da apreciação da prova, matéria não sindicável pelo Supremo Tribunal de Justiça/STJ. Acresce ainda que os alegados normativos têm natureza processual e não imperativa. Finalmente e a entender-se que haveria uma omissão de pronúncia, como lembra a decisão reclamada, devia o recorrente reclamar do decidido para a Conferência. Não o tendo feito, acompanhamos o entendimento deste STJ no sentido de que a arguição de nulidades do acórdão recorrido não é admitida como fundamento exclusivo de recurso de revista – cfr., nomeadamente, os acórdãos de 5-12-2020 (pº nº 77/14.1TBMUR.G1.S1); de 19-6-2019 (pº n.º 5065/16.0T8CBR.C1-A.S1); de 5-2-2022 (pº n.º 983/18.4T8VRL.G1.S1); de 12-1-2022 (pº n.º 4268/20.8T8PRT.P1.S1); de 24-5-2022 (pº nº 2332/20.2T8PNF.P1.S2); e de 8-11-2022 (pº nº 6698/20.6T8LSB-A.L1.S1). Concluindo e sumariando: I - In casu, não estão em causa os meios de prova analisados, mas sim, a valoração/apreciação da prova por parte da Relação, com a qual o mesmo recorrente não se conforma. II - Contudo e como frisámos, a decisão de facto é inalterável - artº682º nº 3 do CPC. III – Prevalecendo assim, a situação de dupla conforme impeditiva do pretendido recurso para o STJ. DECISÃO - Assim e pelos fundamentos expostos, indefere-se a reclamação do recorrente/A., e consequentemente confirma-se a decisão singular antes proferida. - Custas pelo recorrente (sem prejuízo do benefício do apoio judiciário), fixando-se a taxa de justiça em 2Ucs. Lisboa, 2 de novembro de 2023 Afonso Henrique (relator) Maria da Graça Trigo Catarina Serra ____ 1. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17.09.2015, Relator Luís Correia de Mendonça, Processo n.º 23801/13.5T2SNTA.L1-8, WWW.DGSI.PT 2. Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 14.01.2016, Relatora Maria Purificação Carvalho, Processo n.º 3718/14.7T8VNF-A.G1, WWW.DGSI.PT 3. Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 26.11.2020, Relatora Maria dos Anjos Nogueira, Processo n.º 16254/18.3T8PRT-F.G1, www.dgsi.pt 4. In Geraldes, António Santos Abrantes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5ª Ed., págs. 263 e 364. 5. ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES, PAULO PIMENTA, LUÍS FILIPE PIRES DE SOUSA Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Almedina, Coimbra, setembro 2018, pag. 484 6. JOSÉ LEBRE DE FREITAS – ISABEL ALEXANDRE Código Processo Civil Anotado, ob. cit., pag. 208 7. JOSÉ LEBRE DE FREITAS – ISABEL ALEXANDRE Código Processo Civil Anotado, ob. cit., pag. 206 do Cód. Proc. Civil) 1. Adiante designado “CPC”. 2. “O Recurso Civil. Uma Teoria Geral”, AAFDL Editora, 2017, p. 204. 3. “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 5ª ed., 2018, pp. 363-364. 4. “Notas ao Código de Processo Civil,” Coimbra Editora, 2014, pp. 444-445. |