Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
324/14.0TELSB-FW.L1-A.S1
Nº Convencional: 5.ª SECÇÃO
Relator: HELENA MONIZ (RELATORA DE TURNO)
Descritores: ESCUSA
JUÍZ DESEMBARGADOR
TESTEMUNHA
PROCEDIMENTO DISCIPLINAR
IMPARCIALIDADE
Data do Acordão: 07/25/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: ESCUSA
Decisão: PROCEDÊNCIA TOTAL
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO.
Sumário :
I - A partir do pedido apresentado pela Requerente, sabemos que lhe foi distribuído (no Tribunal da Relação de Lisboa) um processo de recurso interposto do despacho, de 2022, proferido pelo Meritíssimo Juiz de Instrução Criminal, onde foi decidida a revogação de um arresto preventivo de bens, deferindo o que havia sido requerido pelo arrestado; a Senhora Desembargadora fundamenta o seu pedido de escusa no facto vir a ser inquirida como testemunha de defesa em processos disciplinares pendentes no Conselho Superior de Magistratura contra o Meritíssimo Juiz de Instrução Criminal; além disto, o visado é pessoa com relações próximas com a Senhora Desembargadora desde há mais de 30 anos, e convive frequentemente.
II O homem médio, integrado na comunidade, suspeitará que, por causa das relações estreitas entre a Senhor Juíza Desembargadora e o Senhor Juiz de Instrução Criminal, para além do mais, poderá existir um conhecimento extra-processual do caso, assim se gerando uma maior desconfiança quanto à decisão a obter. A que acresce a suspeita subjetiva da comunidade relativamente ao necessário afastamento do caso que se impõe ao julgador; Afastamento que no caso aparece esbatido atentas as proximidades entre o visado e a Senhora Desembargadora.
III Não está em causa uma avaliação como parcial da possível conduta da Senhora Desembargadora; tanto mais que o simples facto de ter suscitado este incidente é por si só revelador de uma conduta escrupulosa e isenta, a permitir concluir que manteria a sua imparcialidade na decisão do caso; porém, como dissemos, o que está em causa não é o de saber se a Senhora Juíza Desembargadora iria ou não manter a sua imparcialidade, mas sim o de defendê-la de uma suspeita, o de evitar que sobre a sua decisão recaia qualquer dúvida, e através da aceitação do seu pedido de escusa reforçarmos a confiança da comunidade nas decisões judiciais.
Decisão Texto Integral:


Processo n.º 324/14.0TELSB-FW.L1-A.S1

Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça:

I

Relatório

1. A Senhora Juíza Desembargadora AA, em exercício de funções na ... Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa, vem, nos termos do art. 43.º, n.º 4, do Código de Processo Penal (doravante CPP), apresentar pedido de escusa nos seguintes termos:

« Exmo Senhor Juiz Conselheiro Relator do Supremo Tribunal de Justiça

Exerço funções na ... Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa.

No âmbito dessas funções e por causa delas, foi-me distribuído o processo 324/14.0TELSB-FW.L1.

Neste processo, em 14.5.2015, 26.5.2015, 17.6.2015 e em 20.12.2018, o M.P requereu o arresto preventivo dos seguintes bens:

1)        dois bens imóveis do arguido BB;

2)        de todos os bens móveis de valor encontrados na residência deste arguido;

3)        de três viaturas automóveis com as matrículas EH-..-.., ..-PH-.. e ..-LX-..);

4)        e da pensão mensal auferida por este arguido na medida máxima permitida pela aplicação do art. 738° nºs 1 e3 do CPC, ex vi do art. 391° nº 2 do CPC.

Todos estes requerimentos do M.P foram deferido pelo Mmo. Juiz de Instrução Criminal que, em consequência, decretou o arresto preventivo dos mencionados bens (cfr decisões de 15.5.2015, a fls. 3248 a 3434 do 9° volume e fls 85 a 281 do apenso A; de 28.5.2015, a fls. 3786 a 3830 do 10° volume; de 18.6.2015, a fls. 4133 a 4167 do 10° volume; de 11.1.2019 a fls. 30145 a 30147 do apenso A).

Em 24.7.2018 (requerimento de fls. 25495-25612 apenso A volume 72°) o arrestado veio deduzir oposição, pedindo que fossem revogadas as decisões do decretamento da medida de arresto preventivo datadas de 15.5.2015, 28.5.2015 e 18.6.2015 e que fosse levantado o arresto preventivo em relação aos bens sobre os quais incidiu, relativamente ao oponente.

Em 22.3.2019 (requerimento de fls. 30157 a 30281 do apenso A) o arrestado deduziu oposição ao arresto da pensão, pedindo a revogação da decisão do decretamento do arresto da sua pensão datada de 11.1.2019.

Por decisão judicial de 21.10.2021 (fls 40886 a 41206 do apenso A, vol. 114°) a oposição do arrestado foi julgada improcedente.

Em 16.11.2021 o arrestado interpôs recurso da decisão proferida em 21.10.2021 (fls. 41613 a 41820 do volume 116°) do qual viria a desistir posteriormente, depois de distribuído

à ... Secção da Relação de Lisboa (cfr decisão judicial de aceitação da desistência proferida em 31.1.2022).

Essa desistência do recurso teve lugar, na sequência do despacho de 18.01.2022 proferido pelo Mmo. Juiz de Instrução Criminal, nos termos do qual decidiu julgar inválida a decisão proferida em 21.10.2021 pelo anterior Juiz de Instrução Criminal titular do processo que havia julgado improcedente a oposição invocada pelo arguido BB.

Com efeito, a fls. 42715-42779 dos presentes autos, sob o título «Da oposição ao arresto deduzida pelo Arguido: BB», o Mmo. JIC proferiu o despacho de 18.01.2022, no qual julgou procedente a oposição deduzida pelo arguido BB e decidiu revogar a decisão proferida pelo JIC anteriormente titular dos autos, a qual havia decretado o arresto preventivo dos seguintes bens:

1 - Prédio urbano, denominado por Lote ... do Loteamento dos B..., sito em ..., inscrito na matriz sob o artigo ...25, e descrito na Conservatória do Registo Predial ..., freguesia ..., sob o n.° ...26;

2 - Prédio urbano sito na Rua ..., ..., ..., inscrito na matriz sob o artigo ...07, e descrito na Conservatória do Registo Predial ..., freguesia ... (...), sob o n.° ...19;

3 - Bens móveis de valor encontrados na residência de BB (auto de arresto de fls. 4139-4147);

4 - Viaturas com as matrículas EH-..-.., marca "Cadillac", ..-PH-.., marca "Audi" e ..-LX-.., marca "Volkswagen";

5 - Pensão auferida pelo arguido BB.

Em consequência, o Mmo. JIC determinou o levantamento do arresto decretado sobre os referidos bens, com a comunicação da decisão ao Gabinete de Recuperação de Activos (GRA) da Polícia Judiciária (PJ), para efeitos e cancelamento do registo dos arrestos incidentes sobre os bens imóveis e móveis sujeitos a registos e determinando a imediata notificação da decisão à entidade pagadora GNB - Fundo de Pensões - no sentido de que cessa, a partir da decisão, o desconto efectuado no valor da pensão do arguido BB.

No despacho recorrido, refere-se, além do mais, o seguinte (transcrição parcial): «Em face de todo o exposto, não resulta alegado, e muito menos indiciado, qualquer conduta ou actuação do arguido BB da qual se possa concluir, ainda que em termos de mera indiciação, pelo receio de perda da garantia patrimonial do alegado crédito.

«Nesta conformidade, não tendo sido alegados factos de onde resulte o justo receio da perda da garantia do crédito do Estado e tendo em conta os factos e os fundamentos que o arguido trouxe aos autos através da sua oposição, fez com que se verifique insuficiência da causa de pedir o que, necessariamente, determina a improcedência da providência.

«Assim, utilizando aquilo que foi dito no AC do Tribunal da Relação ... de 10¬11- 2020: "Na verdade, estando o processo principal instaurado desde 2014, não há qualquer informação de publicitação daqueles bens com vista à sua venda, cedência ou oneração, ou seja, não há factos dos quais se possa extrair que os arguidos estão a organizar actos de venda, cedência ou ocultação daquele património, nada permite concluir que os requeridos, conhecedores da acusação e do pedido de indemnização civil deduzido, se desfaçam daquele património, pois o alegado trata-se de mera conjectura, de um juízo subjectivo, sem estar ancorado em factos concretos, pelo que o deferimento do arresto daqueles bens não obedeceria ao princípio da adequação e proporcionalidade.

«E, como se sabe, não basta o receio subjectivo de ver insatisfeita a pretensão a que tem ou se julga ter direito; o que é decisivo é que o credor fique ameaçado de lesão por acto do devedor e seja razoável e compreensível o seu receio de ver frustrado o pagamento do seu crédito, ou seja, o receio, para ser considerado justificado (por exigência da lei), há-de assentar em factos concretos, que o revelem, à luz de uma prudente apreciação (Cfr. Cons. Jacinto Rodrigues Bastos, Notas, Vol. I, p. 268)".

«Efectivamente, utilizando, também, as palavras do recente acórdão do TRL, de 25-1-2022, proferido nestes autos, junto ao Apenso ET, a propósito de um requerimento de arresto

deduzido pelo MP (idêntico ao deduzido neste incidente) "mostram-se por esclarecer, dado que não alegadas no requerimento inicial e agora afastadas na sequência da oposição do arguido "quais as condutas adoptadas pela requerida relativamente ao seu património que coloquem - objectivamente - o titular do crédito a recear ver frustrado o pagamento do mesmo?

«Nada sabemos sobre isso uma vez que nada se explicou ou respondeu de forma perceptível".

«Que factos concretos indiciam tal propósito? Nada sabemos quais pois na amálgama dos indicados apenas a recorrente aparece naqueles dois sintéticos parágrafos".

«Nesta conformidade, concluímos, em concordância com todo o acima exposto, que pelo MP não foram alegados, quanto ao arguido BB, quaisquer factos concretos susceptíveis de, a indiciar-se, legitimar um juízo positivo sobre a provável e iminente alienação ou oneração de património do opoente e consequente perigo fundado de perda da garantia patrimonial dos indiciados créditos do Estado, risco sério que o decretamento do procedimento pretende acautelar.

«Ao MP competia o ónus de alegar e provar (ainda que indiciariamente) factos concretos de onde pudesse derivar o perigo de perda da sua garantia patrimonial, o que, por falta de concretização, não sucedeu.

«Por fim, cumpre dizer que o arresto preventivo não é, de acordo com o estabelecido no processo penal, uma decorrência automática da pendência de um processo crime e, muito menos, a antecipação de uma decisão condenatória.».

É deste despacho que vem interposto o recurso a julgar e a decidir, neste apenso FW, o qual foi interposto pelo Mº. Pº., invocando, em síntese, que o mesmo padece dos vícios da inexistência jurídica ou nulidade insanável e subsidiariamente que seja reconhecida a ilegalidade do mesmo, por violação do princípio do esgotamento do poder jurisdicional e do caso julgado material.

Termina pedindo que seja o mesmo revogado e seja mantida a validade da decisão anteriormente proferida pelo JIC em 21.10.2021 (fls 40886 a 41206 do apenso A vol 114°), na qual fora já julgada improcedente a oposição do arrestado BB.

As conclusões do recurso interposto pelo Mº. Pº. são as seguintes:

1. O presente recurso é interposto do despacho proferido pelo Mmo. JIC a quo a 18/02/2022, com a referência ...71, a fls. 42715 a 42779, no qual decidiu revogar o arresto preventivo dos bens referidos nos pontos 1) a 5) de fls. 42778, assim deferindo a oposição deduzida pelo arguido BB.

Do "imediato trânsito em julgado" dos despachos do Mmo. JIC a quo

Do Mmo. JIC a quo como instância de recurso

2. Em consequência, determinou o Mmo. JIC a quo o levantamento do arresto decretado sobre os bens referidos nos pontos 1) a 5) de fls. 42778, determinando a imediata comunicação da decisão ao GRA e à entidade pagadora da pensão de reforma arrestada informando esta última de que «cessa, a partir deste momento, o desconto efectuado no valor da pensão do arguido BB».

3. O Mmo. JIC a quo procedeu da forma referida no ponto que antecede sem aguardar que quem tivesse legitimidade para interpor recurso da sua decisão declarasse a renúncia ao mesmo, ou que o interpusesse.

4. Fê-lo, nas palavras de Fernando Pessoa, sem a "demonstração do indemonstrável", ou seja, de que o seu despacho seria irrecorrível à luz do disposto no artigo 400.° do CPP.

5. Determinando, assim, o imediato trânsito em julgado do despacho, ofende o Mmo. MC a quo o princípio geral da recorribilidade, decorrente dos artigos 20.°, n.° 1 e 32.°, n.° 1 da Constituição da República Portuguesa (CRP) e dos artigos 399.° e 400.°, este a contrario, do CPP.

6. Para além disso, a decisão recorrida ignora olimpicamente o recurso interposto pelo Ministério Público da decisão proferida por este mesmo Mmo. JIC a quo, em 18/01/2021, a fls. 42252-42285, decisão essa que habilitou a produção de prova subsequente e o despacho recorrido.

7. Em tal recurso, a fls. 42508-42542, o Ministério Público aponta a esse despacho os vícios da inexistência jurídica ou nulidade insanável decorrente das regras de competência do Tribunal, nos termos do artigo 119.°, al. e) do CPP, peticionado que fossem declarados inexistentes - ou nulos - todos os actos subsequentes a esse despacho, nos termos do artigo 122.°, n.° 1 do CPP.

0. Subsidiariamente, apontou também o MP, a ilegalidade desse despacho, por violação do disposto nos artigos 4.°, 7.°, 118.°, n.° 1, 123.° e 194.° do CPP, por violação de caso julgado material, nos termos dos artigos 577.°, al. i), 580.°, n.°s 1 e 2,581.°, 628.° e 629.°, n.° 2, al. a) do Código de Processo Civil (CPC) e 4.° do CPP, e ainda pela violação dos artigos 97.°, n.°s 3 e 4,194.°, n.° 6 e 228.° do CPP.

1. Tal recurso foi admitido e a sua subida ao Tribunal da Relação de Lisboa encontra-se, presentemente, pendente da decisão que vier a ser proferida pela Exma. Senhora Desembargadora Presidente desse Tribunal, em reclamação que o MP apresentou nos termos do artigo 405.° do CPP contra a retenção do mesmo.

2. Não obstante, e num procedimento que é já habitual por parte do Mmo JIC a quo, estando pendente um recurso, vem o mesmo proferir a decisão de que se recorre, necessariamente sabendo que a apreciação daquele recurso por parte do Tribunal da Relação de Lisboa poderá gerar a inutilidade da decisão que agora profere.

3. Donde, o Mmo, JIC a quo deveria ter seguido um procedimento prudente e mais avisado, aguardando a pronúncia por parte do Tribunal superior relativamente ao recurso referenciado e não tentando sugestionar tal tribunal para o efeito devolutivo que lhe conferiu, nem retendo, como reteve, a subida do mesmo.

4. Ao agir deste modo, o Mmo. JIC a quo usurpa o poder jurisdicional da esfera da competência atribuída ao Tribunal da Relação de Lisboa porque, existindo recursos, era o Tribunal Superior que deveria sindicar e decidir pela manutenção ou não de decisões proferidas pelo tribunal de primeira instância.

5. Assim, o Mmo. TIC a quo violou regras de competência e hierarquia, em especial as que derivam da combinação dos artigos 12.°, n.° 3, alínea b), 427.° e 428.°, do CFF, artigos 32.°, n.° 1, 37.°, n.° 1, 42.°, n.° í, 67.°, n.°s 1 e 3, 73°, alínea a) e Anexo I da Lei da Organização do Sistema ludiciário e, ainda, do artigo 210.° da CRP.

6. E violou, igualmente, o princípio do esgotamento do poder jurisdicional previsto no artigo 613.°, n.°s 1 e 3, do CPC, aplicável ex vi artigo 4.° do CPP.

Do periculum in mora

7. No despacho recorrido, o Mmo. JIC a quo decidiu revogar o arresto preventivo dos bens do arguido BB, deferindo a oposição deduzida por este arguido, fundando a sua decisão na alegada ausência de um pressuposto material específico do arresto preventivo - o periculum in mora.

8.         Profere o Mmo. JIC a quo uma decisão que, para além de ilegal, é leviana e arriscada perante os factos que emergem dos autos, podendo colocar o Estado Português na mira de pedidos indemnizatórios fundados em responsabilidade civil decorrente do exercício da função judicial, eventualmente a serem formulados pelos lesados a quem o mesmo JIC já concedeu o estatuto de vítima, nos autos de que os presentes constituem apenso.

9. A decisão recorrida não passa de um asterismo apenas reluzente para afirmações conclusivas e genéricas acerca da verificação, em outros processos e em outras situações, do justo receio de dissipação da garantia patrimonial,

10. Enveredando por um critério de avaliação quanto à existência do referido pressuposto do arresto preventivo que não se ajusta com a Lei, e que, a vingar, tornaria inaplicável qualquer medida de garantia patrimonial.

11. O critério atentatório da mens legis que o Mmo, JIC a quo adoptou foi, desde logo, observado quando, na diligência de produção de prova, de 08/02/2022, questionou familiares e amigos do arguido sobre se este lhes tinha confidenciado o desejo de dissipar bens.

12. De acordo com a tese perfilhada pelo Mmo. JIC a quo, o periculum in mora só se verificaria se o arguido proclamasse aos quatro ventos o seu desejo em dissipar bens, o que revela uma ingenuidade dificilmente compaginável com o exercício consciente e responsável da função.

13. Ora, nenhum arguido quer cavar o seu próprio fracasso!

14. Mas, o que causa maior espanto é que o Mmo. JIC. a quo, decalcando os caminhos da defesa, cai no erro de considerar que as condutas do arguido se situaram em 1993 e não em 2014 como foi sustentado, por ser a realidade, tanto no requerimento do MP, quer na decisão de arresto preventivo.

0. No caso dos autos, verificamos que a primeira decisão de arresto preventivo, datada de 15/ 05/2015, evidencia o comportamento do arguido relativamente ao receio de sonegação do seu património, ao enfatizar que, em Outubro de 2014 - não em 1993 como parece apontar a decisão sob censura - aquele diligenciara no sentido de desvincular organicamente da sociedade em que alojara património imobiliário, deixando os seus filhos em seu lugar, sem qualquer vínculo jurídico ao mesmo, o qual ficaria a salvo de qualquer eventualidade que pudesse afetar o seu titular de facto - o arguido BB.

1. Esta conduta do arguido ocorreu escassos meses após a publicitada derrocada do BES e dos pedidos de gestão controlada (proteção contra os credores) feitos pelas holding do Grupo Espírito Santo (Espírito Santo International e Rio Forte, respetivamente em 18 e 22 de julho de 2014).

2. É assim falso que o requerimento de arresto e a decisão de arresto de 15/05/2022 enfermem do que aparece consignado a fls. 42772 (último parágrafo) «A falta do requisito justo receio mostra-se tanto mais evidente se tivermos em conta que os factos alegados vara justificar o receio, sobretudo quanto ao arresto da pensão, tiveram lugar em 15-4-1993 (alienação da casa onde vive o arguido para a sociedade C...)» (sublinhado nosso), pois os indícios quanto ao referido requisito se colhem, neste particular, por referência a condutas praticadas, não em 1993, mas em 2014!

3. A decisão sob censura também não transmite a verdade quando, nesse último parágrafo de fls. 42772, refere que a pensão de reforma do arguido foi arrestada em Dezembro de 2018 «sem qualquer facto adicional ou superveniente».

4. Na verdade, como resulta claramente do requerimento adicional de arresto preventivo datado de Dezembro de 2018 e da documentação a que o mesmo se reporta (fls. 47 e 48 do Apenso T13), a razão de ser desse arresto foi, justamente, o conhecimento por parte do Ministério Público, somente nessa data, do pagamento da dita pensão de reforma ao arguido.

5. É que a própria decisão recorrida - e bem! - elenca, na lista de elementos do processo considerados relevantes para a decisão, a fls. 42736-42739, os crimes imputados ao arguido BB em sede acusatória, juntamente com o apuramento das vantagens da actividade criminosa, não referindo, contudo, por defeito, a totalidade das quantias apuradas.

6. É imputada ao arguido, nos termos da acusação pública deduzida, a prática de 7 crimes de burla qualificada, p. e p. pelos artigos 217.°, n.° 1,218.°, n.°s 1 e 2, al. a), por referência ao artigo 202.°, al. b), e de 1 crime de infidelidade, p. e p. pelo artigo 224.°, n.° 1, todos do CP, sendo requerida a perda a favor do Estado, sem prejuízo do direito de lesados, da vantagem obtida com a prática dos crimes, liquidada em 11.885.319.555,55€, sendo que 3.146.063.798,63 € respeitam aos crimes cuja prática é especificamente imputada a BB.

7. Ora, tendo presente que o periculum in mora, para efeitos de decretamento do arresto nos termos do art. 228.° do CPP, se concretiza por referência ao “fundado receio enunciado de que faltem ou diminuam substancialmente as garantias de pagamento (..tal como previsto no art. 227.°, n.° 1 do mesmo diploma legal, e que a diminuição dessas garantias constitui apenas um dos fundamentos que podem ser invocados no momento de avaliar a existência do fundado receio, a circunstância de ao arguido BB ser assacado o pagamento do supra referido montante de vantagens auferidas pela prática dos crimes imputados, constitui, nas elucidativas palavras do recente Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 12 de Outubro de 2021, proferido no apenso jurisdicional "CU" a estes autos, justamente, o «condicionalismo perfunctório, de um circunstancialismo fáctico que faz antever o perigo de se tornar difícil ou impossível a cobrança do crédito, e como tal, a fundar justificadamente o perigo mencionado».

8. Pelo que é forçoso concluir que, não apenas em face da magnitude do valor da vantagem do crime por cujo pagamento é responsável o aqui arguido, mas também em função das suas condições vivenciais actuais, amplamente referidas nas suas próprias alegações nestes autos, é manifesto que se antevê, na prática, impossível a «cobrança do crédito».

9. O que «justificadamente [funda] o perigo mencionado».

10. Viola, assim, o despacho recorrido, o disposto nos artigos 191.°, 192.°, 227.° e 228.° do CPP e 391.° do CPC.

Apenas a título adicional

11. A decisão recorrida, reputando-se, porventura, proveniente de um outro galarim, revela uma tendência censuradora e inspetiva quando, de forma inédita, anormal e fantasiosa, defende e indica que o Ministério Público deveria ter requerido o arresto preventivo "fora" dos autos de inquérito.

12. Esta predisposição da decisão recorrida demonstra, por um lado, a vontade de ir mais além do que é pedido - na oposição ou no recurso - e, por outro lado, a confusão que nela grassa, em holocausto ao princípio da suficiência do processo penal, que a levou a considerar que todas as normas do arresto previsto no CPC são aplicáveis ao arresto preventivo previsto no artigo 228.° do CPP.

13. Nada mais de errado, pois se assim fosse, também a promoção do Ministério Público no sentido de aplicação de uma medida de coacção ao arguido deveria ser apresentada em requerimento autónomo, ou seja, "fora" do inquérito.

14. Assim, quando o Ministério Público promove, antes da acusação, o arresto preventivo, tal promoção deverá ser exposta - como foi e sempre é - nos autos principais de inquérito pois é aí que se destacam os interesses que o seu decretamento visa garantir e só dessa forma não são postergadas as normas do CPP que, antes de tudo, devem ser chamadas.

Termos em que o despacho recorrido, de fls. 42715-42779, deverá:

· Ser declarado juridicamente inexistente ou, caso assim se não entenda, ser reconhecida a nulidade insanável decorrente das regras de competência do Tribunal, nos termos do artigo 119.°, al. e) do CPP;

Subsidiariamente,

· Ser declarado ilegal, pela violação do disposto nos artigos 191.°, 192.°, 227.° e 228.° do CPP e 391.° do CPC;

· Ser declarado ilegal, pela violação dos artigos 399.° e 400.° do CPP; e consequentemente

15. Não se percebe como é que a decisão recorrida, sem se escorar em qualquer facto ou mera suspeição, afirma, como se tal fosse decisivo ou peremptório, que era «público» que o pagamento dessa reforma ocorresse desde 2014.

16. O Mmo. JIC a quo, para fazer tal afirmação, deixou-se embalar apenas pelo que lhe foi dito pelas testemunhas (amigos e familiares do arguido) na diligência de 8/02/2022 e não pelo que os autos, antes dessa data, davam à estampa.

17. Contrariamente ao que parece resultar do despacho recorrido, não foi por capricho ou por embirração que o MP promoveu o arresto da pensão de reforma auferida pelo arguido somente em finais de 2018, uma vez que, se da mesma tivesse tido conhecimento em Maio de 2015, certamente promoveria, então, o respectivo arresto, como seria lógico e racional!

18. Outrossim, a ser verdade que o arguido já auferia a pensão de reforma arrestada desde 2014, a mera circunstância de tal pagamento não ser, contrariamente ao referido na decisão recorrida «público», já constituiria indício suficiente da sua opacidade e da dissipação consumada das quantias percebidas pelo arguido de 2014 até Dezembro de 2018 e, por essa via, de um clamoroso e evidente periculum in moral

19. Acresce que, previamente ao requerimento de arresto formulado em Maio de 2015, muniu-se o Ministério Público de ampla investigação patrimonial e financeira realizada pelo GRA da PJ, corporizada no Apenso X, na qual não constava qualquer menção à pensão de reforma auferida pelo arguido BB.

20. O facto de não ter sido também arrestada, em Maio de 2015, a pensão de reforma auferida pelo arguido deixou-o numa posição confortável que lhe permitiu, desde essa data e até Dezembro de 2018, erodir ou ocultar os valores que ia recebendo, o que até corrobora o juízo de verificação do "justo receio" em questão.

21. Deste modo, contrariamente ao decidido pelo Mmo. JIC a quo, encontra-se, pois, devidamente patenteado nos autos o pressuposto material específico do periculum in mora do arresto preventivo que a decisão recorrida de forma precipitada e imprudente pretendeu apagar quer dos requerimentos quer das decisões que decretaram os arrestos preventivos.

22. Porém, mesmo que assim se não entendesse, nem por isso deveria o arresto decretado nos autos ser revogado.

Ser revogado, devendo ser substituído por outro que, declarando improcedente a oposição deduzida pelo arguido BB, mantenha o arresto preventivo decretado nos autos relativamente aos bens referidos nos n.°s 2 a 5 de fls. 42778;

O autor da decisão agora impugnada no presente recurso é o Mmo. Juiz de Instrução Criminal CC.

Que tem presentemente pendentes contra si processos disciplinares pendentes no Conselho Superior da Magistratura e instaurados em virtude de ter proferido decisões semelhantes à decisão recorrida nos presentes autos.

Acontece que serei inquirida como testemunha de defesa daquele Mmo. Juiz, nesse processo disciplinar.

Sendo certo que se trata de pessoa das minhas relações de amizade próxima desde há mais de trinta anos, com a qual convivo com frequência.

E, se é certo que, até agora, tal relação de amizade nunca me condicionou ou impediu de, com isenção e imparcialidade, manter ou revogar decisões proferidas pelo Mmo. Juiz visado, consoante os factos e o direito aplicável, parece-me, salvo melhor opinião, que em face das especificidades da decisão a proferir, do conhecimento extra processual e pessoal que tenho das circunstâncias em averiguação naquele processo disciplinar, da sua similitude com as vicissitudes sobre que versa o presente processo, existe motivo sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a minha imparcialidade, o que constituí fundamento de escusa nos termos do art. 43º n.º 1 do CPP, pois que essa minha relação pessoal próxima com factos correlacionados com os que constituem o objecto deste processo é susceptível de pôr em crise a minha imparcialidade interna do mesmo modo que é apta a gerar desconfiança sobre a minha imparcialidade e consequentemente da qualidade da decisão a proferir, neste apenso de recurso.

Por tudo acabo de expor, solicito a esse venerando Tribunal que me escuse de intervir nos autos supra referidos.»

2. Colhidos os vistos, em simultâneo, o processo foi presente à conferência para decisão.

II

Fundamentação

Nos termos do art. 43.º, n.º 4, do CPP, o juiz pode pedir ao tribunal imediatamente superior (cf. art. 45.º, n.º 1, al. a), do CPP) que o escuse de intervir “quando ocorrer o risco de [a sua intervenção] ser considerada suspeita, por existir motivo, sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade” (art. 43.º, n.º 1, ex vi n.º 4). Constituem também motivos de escusa os referidos no art. 40.º, do CPP, bem como, para além deles, a intervenção em fases anteriores do mesmo processo, ou a participação em outro processo.

A independência dos juízes constitui “a mais irrenunciável característica do «julgar» e, portanto, da função judicial”[1] só assim se realizando o princípio da separação dos poderes. “Sendo por conseguinte os tribunais no seu conjunto — e cada um dos juízes de per si — órgãos de soberania (...) e pertencendo a eles a função judicial (...), tem por força de concluir-se que a independência material (objectiva) dos tribunais — reforçada pela independência pessoal (subjectiva) dos juízes que os formam — é condição irrenunciável de toda verdadeira jurisprudência”[2]. Se, por um lado, a característica da independência dos juízes assegura que estejam livres de pressões exteriores, por outro lado,  “isto não basta para que fique do mesmo passo preservada a objectividade de um julgamento: é ainda necessário, ao lado e para além daquela segurança geral, não permitir que se ponha em dúvida a «imparcialidade» dos juízes, já não em face de pressões exteriores, mas em virtude de especiais relações que os liguem a um caso concreto que devam julgar. (...) [E] o que aqui interessa — convém acentuar — não é tanto o facto de a final, o juiz ter conseguido ou não manter a imparcialidade, mas sim defendê-lo da suspeita de a não ter conservado, não dar azo a qualquer dúvida, por esta via reforçando a confiança da comunidade nas decisões dos seus magistrados”[3]. Na verdade, a lei, ao estabelecer as situações em que o juiz pode pedir a escusa, está a realizar a tarefa de velar “por que, em qualquer tribunal (...) reine uma atmosfera de pura objectividade e de incondicional juridicidade. Pertence, pois, a cada juiz evitar, a todo o preço, quaisquer circunstâncias que possam perturbar aquela atmosfera, não — uma vez mais o acentuamos — enquanto tais circunstâncias possam fazê-lo perder a imparcialidade, mas logo enquanto possa criar nos outros a convicção de que ele a perdeu”[4].

O juiz pode pedir que o escuse de intervir no processo quando se verifiquem diversas condições, nos termos do n.º 1 e 2 do art. 43.º, do CPP, ex vi n.º 4 do mesmo dispositivo:
- sempre que exista risco de a sua intervenção ser considerada suspeita por existir motivo sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade (n.º 1 do art. 43.º) e/ouaquela suspeita existe. Na verdade, segundo o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem a imparcialidade.º).
- de David Sarmento Oli
- a intervenção do juiz em outro processo ou em outras fases do processo distintas das referidas no art. 40.º, do CPP (n.º 2, do art. 43.º).

Tal como é apresentada a condição do n.º 1 do art. 43.º, do CPP, é de molde a integrar nela uma variedade de situações que, analisadas caso a caso, permitam considerar que aquela suspeita existe. E existindo uma suspeita, a confiança comunitária nos juízes, e com isso no sistema judicial e no Estado de Direito, fica abalada.

Acresce que “a necessidade de confiança comunitária nos juízes [faz-se] sentir como muito maior força em processo penal do que em processo civil”[5], pese embora a densidade do regime previsto no Código de Processo Civil, relativamente ao regime previsto no Código de Processo Penal.  

É claro que o fundamento da escusa deve ser objetivamente analisado, não bastando um mero convencimento subjetivo, devendo basear-se em “uma razão séria e grave, da qual ou na qual resulte inequivocamente um estado de forte verosimilhança (desconfiança) sobre a imparcialidade do juiz (propósito de favorecimento de certo sujeito processual em detrimento de outro).” (acórdão do STJ, de 13.02.2013, proc. n.º 1475/11.8TAMTS.P1-A.S1, relator: Santos Cabral[6]). Todavia, este instrumento processual — o pedido de escusa — permite o afastamento do juiz “quando, objectivamente, existir uma razão que, minimamente, possa beliscar a sua imagem de isenção e objectividade” (idem).

Na verdade, “[é] evidente que não podem ser razões menores, quantas vezes fruto de preconceitos, quando não de razões pessoais sem qualificação, mas sim razões objectivas que se coloquem de forma séria. Fundamental é a formulação de um juízo hipotético baseado na percepção que um cidadão médio sobre o reflexo na imparcialidade do julgador daquele facto concreto.

[Pois] do que falamos é do risco da perda de objectividade, do afastamento isento que é indiciado pelo facto objectivo. Aqui, importa salientar que é do conhecimento normal de um cidadão médio que tais atributos do exercício da jurisdição estão tanto mais afastados quanto maior for a proximidade do julgador em relação a factos do litígio que lhe é proposto julgar, nomeadamente quando tal proximidade fruto de um conhecimento extraprocessual. A imparcialidade afasta‑se quando as razões ditadas pela razão objectiva são substituídas pelas empatias contidas na emoção resultante da proximidade.” (acórdão citado).

A partir do pedido apresentado pela Requerente, sabemos que lhe foi distribuído (no Tribunal da Relação de Lisboa) um processo de recurso interposto do despacho, de 18.02.2022, proferido pelo Meritíssimo Juiz de Instrução Criminal CC, onde foi decidida a revogação de um arresto preventivo de bens, deferindo o que havia sido requerido pelo arrestado. Pese embora sejam descritas de forma detalhada as circunstâncias envolventes deste despacho, no âmbito do processo em curso, tal não se afigura de relevo para o que aqui está em causa — decidir do pedido de escusa (aqueles elementos poderão, quando muito, eventualmente, ser relevantes para a decisão a tomar em sede de recurso, o que não se integra no âmbito deste processo).

A Senhora Desembargadora fundamenta o seu pedido de escusa no facto vir a ser inquirida como testemunha de defesa em processos disciplinares pendentes no Conselho Superior de Magistratura contra o Meritíssimo Juiz de Instrução Criminal. Além disto, o visado é pessoa com relações próximas com a Senhora Desembargadora desde há mais de 30 anos, e com quem convive frequentemente. Tal como refere a Ilustre Juíza Desembargadora a “relação de amizade nunca me condicionou ou impediu de, com isenção e imparcialidade, manter ou revogar decisões proferidas pelo Mmm. Juiz visado”, porém “em face das especificidades da decisão a proferir, do conhecimento extraprocessual e pessoa que tenho das circunstâncias em averiguação naquele processo disciplinar, da sua similitude com as vicissitudes sobre que versa o presente processo” entende que “existe motivoe sério e grave, adequado a gerar desconfianças sobre a minha imparcialidade”.

Objetivamente, até pela simples circunstância de este pedido de escusa ter sido formulado, deve-se afastar qualquer dúvida quanto à imparcialidade da julgadora, de modo que aos olhos do cidadão comum e externo ao mundo judiciário nenhuma dúvida deveria surgir.

Mas, o homem médio, integrado na comunidade, suspeitará que, por causa das relações estreitas entre a Senhor Juíza Desembargadora e o Senhor Juiz de Instrução Criminal, para além do mais, poderá existir um conhecimento extraprocessual do caso, assim se gerando uma maior desconfiança quanto à decisão a obter. A que acresce a suspeita subjetiva da comunidade relativamente ao necessário afastamento do caso que se impõe ao julgador. Afastamento que no caso aparece esbatido, atentas as proximidades entre o visado e a Senhora Desembargadora.

 E, num processo altamente escrutinado pelo público, com notícias ora do processo judicial ora do processo disciplinar em diversos órgãos de comunicação social, com destaques e longas reflexões em serviços televisivos nas principais estações de televisão portuguesas, impõe-se que quem nele tome decisões esteja livre de qualquer suspeição, assim se assegurando a necessária tranquilidade enquanto condição indispensável a um sadio sistema judicial.

Tal como já foi afirmado neste Tribunal “objectivamente tal coincidência é susceptível de ocasionar perplexidades e dúvidas, para o cidadão medianamente informado que, no mínimo, se questionará sobre a circunstância de a lei processual não conter meios susceptíveis de originar tal situação de melindre” (acórdão citado supra). Ora, a nossa lei processual até já tem meios para obviar a esta situação.

Além do mais, não está em causa uma avaliação como parcial da possível conduta da Senhora Desembargadora; tanto mais que o simples facto de ter suscitado este incidente é por si só revelador de uma conduta escrupulosa e isenta, a permitir concluir que manteria a sua imparcialidade na decisão do caso. Porém, como dissemos, o que está em causa não é o saber se a Senhora Juíza Desembargadora iria ou não manter a sua imparcialidade, mas sim o defendê‑la de uma suspeita, o evitar que sobre a sua decisão recaia qualquer dúvida, e através da aceitação do seu pedido de escusa reforçarmos a confiança da comunidade nas decisões judiciais.

III

Conclusão

Nos termos expostos acordam em conferência na secção criminal do Supremo Tribunal de Justiça:

Nos termos do art. 43.º, do CPP, entende-se que existem fundamentos para conceder a escusa da intervenção da Senhora Juíza Desembargadora AA, o que se determina.

Sem custas.

Supremo Tribunal de Justiça, 25 de julho de 2022

Os juízes conselheiros,


Helena Moniz (Relatora)
Luís Lopes da Mota
Paulo Ferreira da Cunha

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[1] Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, Coimbra: Coimbra Editora, 1974, p. 303.
[2] Idem, p. 303-4.
[3] Ibidem, p. 315.
[4] Ibidem, p. 320.
[5] Ibidem, p. 317.
[6] O acórdão pode ser consultado aqui: http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/e14355fb2048773480257b34004cd244?OpenDocument