Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
06A4617
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: SILVA SALAZAR
Descritores: RECURSOS
FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO DO ACÓRDÃO
FACTOS ARTICULADOS NÃO INCLUÍDOS NA FUNDAMENTAÇÃO DA SENTENÇA
CASO JULGADO
PODERES REPRESENTATIVOS DOS ADMINISTRADORES DAS SOCIEDADES COMERCIAIS
PREENCHIMENTO ABUSIVO DO TÍTULO EXECUTIVO
CLÁUSULAS CONTRATUAIS GERAIS
Nº do Documento: SJ200702130046176
Data do Acordão: 02/13/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA.
Decisão: NEGADA A REVISTA.
Sumário : I - Mesmo não tendo sido incluídos na fundamentação da sentença da 1ª instância, entre os factos dados como assentes, determinados factos articulados provados por documentos, nada obsta a que a Relação os tome em consideração como fundamento para decidir a apelação.
II - Não forma caso julgado a decisão sobre a determinação dos fundamentos de facto conducentes à decisão do pleito.
III - A limitação dos poderes representativos dos administradores de sociedades comerciais, estabelecida em cláusula do contrato de sociedade, não resultante do objecto social, - como é o caso de cláusula que exija a assinatura de dois administradores para obrigar a sociedade para com terceiros -, não é oponível a terceiros.
IV - As cláusulas contratuais gerais devem ser comunicadas na íntegra, e explicadas quando se justifique a sua aclaração, à parte aderente, já não tendo de o ser aos garantes desta.
V - É sobre o embargante que recai o ónus da prova de preenchimento abusivo do título de crédito dado à execução. *

* Sumário elaborado pelo Relator.
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:



Em 23/10/03, por apenso à execução ordinária para pagamento de quantia certa (21.535,44 euros mais juros, somando os vencidos, em 5/9/03, o montante de 207,68 euros) contra si e outra instaurada pelo Empresa-A, com base em livrança de que a exequente invocava ser legítima portadora, como tomadora, subscrita por Empresa-B, e avalisada pelas executadas, não paga na data de vencimento, em que foi apresentada a pagamento, deduziu AA os presentes embargos de executada, invocando em síntese que, embora tivesse sido nomeada administradora da Empresa-B até 31 de Maio de 2002, nunca exerceu de facto tais funções, limitando-se a fazer um favor a uma familiar, assinando os documentos que lhe pediam fossem assinados;
na data de emissão inscrita na livrança, - 29 de Maio de 2003 -, a embargante já não obrigava a sociedade, o que foi comunicado ao dito Banco, embora admita tê-la assinado, crendo que em branco, no período em que estava nomeada como administradora daquela, pelo que, constando o seu nome como administradora quando já não o era, tal título cambiário era nulo por vício de forma, até porque, como o Banco sabia, a Empresa-B se obrigava pela assinatura conjunta de dois administradores;
não sendo, em consequência, a Empresa-B, vinculada pela livrança, também a embargante, como avalista, não o é;
sustenta por outro lado ter havido preenchimento abusivo da dita livrança;
desconhece ainda a embargante os termos e cláusulas do contrato de locação financeira referido nos autos como caucionado por aquela livrança, que nunca lhe foi comunicado nem explicado, pelo que as respectivas cláusulas contratuais gerais não a obrigam.
Contestou o Banco embargado, admitindo que a livrança em causa lhe fôra entregue em branco, contendo apenas as assinaturas da sociedade subscritora e das avalistas, mas em 30 de Outubro de 2001, - data em que consequentemente foi emitida -, para caucionar o cumprimento das obrigações decorrentes de um contrato de locação financeira celebrado entre ele embargado (então ....- Empresa-A), e a Empresa-B;
a livrança foi preenchida apenas em 29/5/03 totalmente de harmonia com o anteriormente acordado;
acresce que a obrigação da embargante, como avalista, é autónoma da da subscritora.
Veio ainda a embargante sustentar a nulidade das cláusulas contratuais gerais insertas no aludido contrato de locação financeira, por falta de prévia comunicação, esclarecimento ou até negociação consigo, ao que o embargado se opôs.
Efectuada uma tentativa infrutífera de conciliação, foi proferido despacho saneador que decidiu não haver excepções dilatórias nem nulidades secundárias, ao que se seguiu a enumeração da matéria de facto desde logo dada por assente e a elaboração da base instrutória.
Oportunamente teve lugar audiência de discussão e julgamento, no início da qual foi determinado o aditamento de um facto, então invocado, à matéria assente (pagamento de uma quantia pela Empresa-B ao Banco embargado posteriormente à instauração da execução e à propositura dos embargos), tendo sido decidida a matéria de facto sujeita a instrução.
Foi depois proferida sentença que julgou os embargos improcedentes, ordenando o prosseguimento da execução relativamente à embargante.
Esta apelou, tendo na Relação começado por ser decidido liminarmente o recurso, nos termos do art.º 705º do Cód. Proc. Civil, mediante decisão sumária que alterou a sentença ali recorrida apenas no sentido de o capital ter ficado, por via daquele pagamento, reduzido para o montante de 11.909,84 euros.
Indo os autos à conferência, foi então proferido acórdão que manteve o dito despacho liminar.
Deste acórdão interpôs a embargante a presente revista, formulando, em alegações, as seguintes conclusões:
1ª - A decisão quanto à matéria de facto não podia ser ex oficio objecto de apreciação autónoma e de pronúncia por parte do Tribunal da Relação na medida em que a decisão da 1ª instância, nessa parte, não foi atacada, nem pela recorrente, nem pelo recorrido, e, por isso, transitou em julgado;
2ª - Ou seja, quer porque tenha transitado em julgado a decisão relativa à matéria de facto em causa nos autos, quer porque não foi ela incluída no objecto do recurso sobre o qual se podia pronunciar a Relação, parece que esta não podia passar a pronunciar-se, nomeadamente nos termos em que o fez, sobre a respectiva matéria de facto;
3ª - Muito menos podia a Relação acrescentar à matéria assente a factualidade vertida nos pontos 1 e 2 do capítulo V do acórdão recorrido;
4ª - Daí que o acórdão recorrido padeça, nesta parte, do vício de excesso de pronúncia, na medida em que conhece de questões de que não podia tomar conhecimento naquela específica fase processual;
5ª - Vício esse que acarreta nulidade dessa parte do mesmo acórdão, nos termos do art.º 668º, n.º 1, al. d), ex vi do art.º 716º, do Cód. Proc. Civil;
6ª - Por outro lado, tendo a recorrente impugnado, repetidamente, a validade do contrato, quer na petição inicial de embargos, quer no requerimento que, após a junção do mesmo aos autos por parte do Banco recorrido, a recorrente igualmente enviou para os mesmos em 4/12/03, também não podia o teor das cláusulas insertas em tal contrato - as quais comprovadamente nunca foram objecto de negociação ou esclarecimento para com a recorrente, conforme expressamente ficou provado na decisão proferida quanto à matéria de facto na 1ª instância e, curiosamente, mantida no acórdão recorrido - ser acrescentado ou levado à matéria de facto assente;
7ª - O que tudo impõe, nesta parte, que este Supremo, no uso dos poderes conferidos pelos art.ºs 722º, n.º 2, e 729º, do Cód. Proc. Civil, revogue aquela mesma parte do dito acórdão que decidiu acrescentar na relação da matéria de facto assente o constante dos n.ºs 1 e 2 do seu capítulo V;
8ª - Para além disso, estando-se no âmbito de uma acção cambiária, - como as instâncias repetidamente declararam -, e verificando-se que ao menos uma das assinantes do respectivo título cambiário dado à execução não tem a qualidade de administradora da sociedade na data em que veio a ser escrita pelo Banco embargado como sendo de emissão, tal como na data que veio a ser escrita como de vencimento no título;
9ª - Então o mesmo é "formalmente nulo por vício de forma" - art.º 409º, n.º 4, do Cód. das Sociedades Comerciais e 220º do Cód. Civil (se o aval foi dado à sociedade, não sendo esta subscritora do título, não podem os avalistas responder como tal, pois a sua obrigação de garantia, acessória e solidária, só existiria em face da obrigação da sociedade - in BMJ 375, pg. 385);
10ª - No entanto, o acórdão recorrido, tal como havia acontecido com a sentença da 1ª instância, não se pronunciou expressamente sobre tal factualidade, nem sobre a respectiva questão de direito;
11ª - Parece, assim, ter sido cometido o vício de omissão de pronúncia sobre esta questão de direito colocada ao Tribunal e da qual este não conheceu, nem a propósito da mesma proferiu decisão expressa;
12ª - Tal constitui nulidade prevista no art.º 668º, n.º 1, al. d), citado;
13ª - Quando assim se não entenda, a livrança dada à execução não saiu da mão do respectivo tomador, o Banco embargado, pelo que não entrou no tráfico cambiário;
14ª - Estamos, assim, no domínio das relações imediatas, sendo legítimo à embargante, como fez ao longo dos autos e aqui repete, invocar a nulidade ou invalidade da relação subjacente - contrato de locação financeira mobiliária - no que a si directamente diz respeito;
15ª - Pois, em qualquer caso, recai sobre o contratante determinado que se sirva das cláusulas contratuais gerais o ónus da prova de ter feito, nos seus devidos termos, a referida comunicação;
16ª - Ora, a embargante provou que o aludido contrato não tinha sido objecto de prévia negociação, nem as respectivas cláusulas previamente comunicadas e explicadas;
17ª - E sendo certo que, no domínio das relações imediatas, as obrigações cartulares têm o mesmo regime das obrigações de direito comum, podendo cada uma das partes invocar as circunstâncias genéticas da emissão do título cambiário (conforme acórdão da Rel. do Porto de 3/2/67, in JR, 13º-156, e da Rel. de Lisboa de 19/5/76, in BMJ 259º-255);
18ª - É manifesto que a respectiva livrança carece de força executiva, na medida em que o preenchimento da livrança que o embargado veio dar à execução se fundamenta num contrato de adesão e em cláusulas gerais que, afinal, como se provou, estão irremediavelmente feridas de nulidade;
19ª - Assim, atenta a aplicação conjugada do disposto no n.º 3 do art.º 5º do Dec. - Lei n.º 446/85, na sua actual redacção, com o disposto nos art.ºs 10º, 17º e 77º da LULL, a livrança dada à execução não tem a pretendida força executiva, uma vez que se reporta a uma alegada dívida proveniente do incumprimento de um alegado contrato inexistente ou que, no mínimo, se encontra ferido de manifesta nulidade;
20ª - Pelo que o acórdão recorrido violou ou interpretou erradamente as disposições conjugadas dos art.ºs 677º, 684º, n.ºs 3 e 4, e 684º-A, n.º 2, a contrario, e 668º, n.º 1, al. d), do Cód. Proc. Civil, por um lado; por outro, o estatuído nesta última disposição com os art.ºs 409º, n.º 4, do Cód. das Sociedades Comerciais e 220º do Cód. Civil; e, por outro ainda, o disposto nos art.ºs 5º, n.º 3, 6º, n.º 1, 7º e 8º do Dec. - Lei n.º 446/85, 342º do Cód. Civil, e 10º, 17º e 77º da LULL.
Termina pedindo a revogação do mesmo acórdão e a procedência dos embargos.

Em contra alegações, o Banco embargado pugnou pela confirmação daquele acórdão.

Em conferência, foi proferido na Relação novo acórdão em que se sustentou inexistir a invocada nulidade por excesso de pronúncia.

Colhidos os vistos legais, cabe decidir, tendo em conta que a 1ª instância deu por assentes os factos seguintes:
1º - O exequente é dono e legitimo portador de uma livrança, emitida em 29/5/03, com data de vencimento em 9/6/03, no montante de € 21.535,44, subscrita por Empresa-B, e avalizada pelas executadas.
2º - Tal livrança foi entregue ao ora embargado em 30/10/01 para caucionar o cumprimento das obrigações decorrentes do contrato de locação financeira celebrado entre a subscritora e a ... - Sociedade de .... ...., S.A., actualmente Empresa-A.
3º - A Empresa-B enviou ao Banco exequente, em 24/6/04, o cheque de Empresa-C, no montante de € 9.843,59, quantia esta que foi recebida pelo Empresa-A.
4º - À ora embargante não foi entregue nenhuma cópia do contrato de leasing.
5º - A embargante não participou na elaboração das cláusulas desse contrato e também não foi esclarecida do teor delas pelo Banco.
A Relação aditou, logo na mencionada decisão liminar, a essa matéria de facto assente, ainda os factos seguintes, que entendeu decorrerem de documento que não havia sido impugnado:
6º - A embargante assinou no lugar do aval a livrança em causa com conhecimento expresso de que se destinava a garantir o cumprimento integral das obrigações decorrentes do contrato de locação financeira, ref. 337053, celebrado entre Empresa-B, e Empresa-A, compreendendo o saldo que fosse devido, indemnizações, juros remuneratórios e de mora.
7º Do mesmo modo que autorizou o Banco, irrevogavelmente, a proceder ao preenchimento dos espaços que propositadamente ficaram em branco no referido título, designadamente no que respeita ao montante a à data do vencimento, e a apresentá-la a pagamento, quando considerasse oportuno.
A primeira questão suscitada pela recorrente é a da nulidade por excesso de pronúncia, respeitante precisamente a esse aditamento, uma vez que, com efeito, não foi pedido, nem pela recorrente, na apelação, nem pelo então apelado.
Para que exista nulidade por excesso de pronúncia é necessário, nos termos do art.º 668º, n.º 1, al. d), parte final, do Cód. Proc. Civil, que o juiz conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.
Ora, tal não se verifica.
Com efeito, impõe o art.º 659º, n.º 3, do mesmo diploma, - aplicável no âmbito da apelação face ao disposto no art.º 713º, n.º 2, também do Cód. Proc. Civil -, que, na fundamentação da sentença, o juiz tome em consideração os factos admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito e os que o tribunal colectivo deu como provados, fazendo o exame crítico das provas de que lhe cumpre conhecer.
E foi isso que a Relação fez, tomando em consideração factos que considerou provados por documento, não como questão a decidir mas como fundamento para decisão de questões suscitadas nas conclusões das alegações da apelação, o que nada a impedia de fazer apesar de esses factos não terem sido incluídos na sentença da 1ª instância entre os factos dados como assentes.
Acresce que não se pode sequer sustentar que haja caso julgado no que respeita à determinação da matéria de facto assente, uma vez que a sentença só constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que julga, face ao disposto no art.º 673º, também do Cód. Proc. Civil, não abrangendo consequentemente esse caso julgado, cujos limites são traçados pelos elementos identificadores da relação ou situação jurídica substancial definida pela sentença (sujeitos, objecto e fonte ou título constitutivo), os respectivos fundamentos de facto.
Diferente é a questão de saber se são de considerar efectivamente provados os factos acrescentados pela Relação.
Trata-se aqui de matéria que este Supremo, dado o disposto nos art.ºs 729º, n.º 2, e 722º, n.º 2, do Cód. Proc. Civil, poderia sindicar, mas apenas se se verificasse ofensa de disposição legal que fixasse a força probatória do documento invocado pela Relação.
Mas tal não acontece, pois, tendo o documento invocado pela Relação de ser, forçosamente, se bem que por ela não identificado, o que se encontra a fls. 33 dos embargos, do qual aqueles factos constam (carta de 30/10/01 da Empresa-B à Empresa-A, subscrita pelas administradoras daquela, entre elas a embargante, por um lado assinando expressamente nessa qualidade, pelo que é declarante a Empresa-B, mas por outro lado repetindo as suas assinaturas na qualidade, que ali referem, de avalistas, e portanto a título pessoal, pelo que elas próprias têm de ser consideradas declarantes nesse documento em relação à ora embargada e não a algum terceiro), tal documento, particular, não foi impugnado nos termos do art.º 375º do Cód. Civil, donde resulta, à luz do disposto no art.º 376º, n.º 2, deste mesmo Código, deverem efectivamente ser considerados provados os factos nele declarados, e que são os aditados.
Donde que, para além de não se poder considerar verificada a dita nulidade por excesso de pronúncia, não possa ser censurado o aditamento pela Relação da mencionada matéria de facto.
A segunda questão suscitada é a de omissão de pronúncia por o acórdão recorrido não se ter pronunciado sobre a questão consistente em não ser a embargante, nas datas constantes da livrança como de emissão e de vencimento, administradora da Empresa-B.
Invocara a embargante nas conclusões das suas alegações da apelação, - transcritas no já referido despacho liminar da Relação -, aliás como já invocara na petição inicial dos embargos, que nessas datas já ela não era administradora da Empresa-B, o que determinava a nulidade da livrança exequenda por vício de forma.
E, com efeito, o acórdão recorrido não se pronunciou sobre essa questão.
Simplesmente, para haver nulidade por omissão de pronúncia, nos termos da mencionada al. d), primeira parte, é necessário que o juiz não se tenha pronunciado sobre questão que devesse conhecer.
Ora, face ao disposto no art.º 409º, n.º 4, do Cód. das Sociedades Comerciais, os administradores obrigam a sociedade, apondo a sua assinatura, com a indicação dessa qualidade.
Mas, mesmo que, por hipótese, fosse de excluir a embargante como administradora à data inscrita na livrança como sendo a da emissão, sempre subsistiria a assinatura da outra administradora, - BB -, que a embargante não diz que já não o fosse naquela data, antes referindo que o era no art.º 16º da petição inicial dos embargos.
Assim, não deixaria a livrança de se encontrar assinada por uma administradora da Empresa-B nessa qualidade, o que era suficiente para obrigar esta para com terceiros, e portanto para com a exequente, tanto mais que, mesmo sendo por hipótese necessárias em princípio as assinaturas de dois administradores, dos n.ºs 1 e 2 daquele art.º 409º resulta que a limitação dos poderes representativos dos administradores estabelecida em cláusula do contrato de sociedade, não resultante do objecto social, - como é o caso dos autos -, não é oponível a terceiros.
Donde resulta não se tornar necessária a decisão sobre se a embargante era ou não administradora da Empresa-B nas datas inscritas na livrança como sendo as da emissão e do vencimento, nem sobre as consequências da eventual perda, por ela, dessa qualidade, uma vez que, fosse qual fosse a respectiva decisão, sempre se manteria a validade da livrança como título integrante de obrigação da Empresa-B para com a ora embargada, face à assinatura da outra administradora em representação da sociedade subscritora.
Improcede também, em consequência, a invocação dessa nulidade.
Sustenta depois a ora recorrente a existência de nulidade da relação subjacente, que era um contrato de adesão, por não lhe terem sido comunicadas e explicadas as respectivas cláusulas gerais.
Só que, como dispõe o art.º 5º, n.º 1, do Dec. - Lei n.º 446/85, de 25/10, com redacção inalterada pelo Dec. - Lei n.º 220/95, de 31/8, as cláusulas contratuais gerais devem ser comunicadas na íntegra aos aderentes que se limitem a subscrevê-las ou a aceitá-las. Por outro lado, o art.º 6º, n.º 1, do mesmo diploma, estatui que o contratante que recorra a cláusulas contratuais gerais deve informar, de acordo com as circunstâncias, a outra parte dos aspectos nelas compreendidos cuja aclaração se justifique.
Quer isto dizer que é à outra parte contratante, ou seja, à parte aderente, que as cláusulas contratuais gerais, sob pena de se considerarem excluídas nos termos do art.º 8º do mesmo diploma, devem ser comunicadas e explicadas.
Ora, a parte aderente ao contrato de locação financeira em causa não é a ora embargante, mas a própria subscritora da livrança, a Empresa-B. E, quanto a esta, não se provou, nem sequer a embargante o invocou, que as aludidas cláusulas não lhe tivessem sido comunicadas e explicadas, como podiam ter sido, até na pessoa de outro administrador, pelo que não se pode concluir pela inexistência dessas cláusulas ou pela nulidade do contrato.
Acresce que, mesmo que assim não fosse, resulta do disposto no art.º 32º da LULL, aplicável às livranças face ao disposto no art.º 77º da mesma Lei, que a obrigação do dador de aval se mantém mesmo no caso de a obrigação que ele garantiu ser nula por qualquer razão que não seja um vício de forma. Ora, a ser nulo o contrato de locação financeira pelo fundamento invocado pela embargante, a nulidade da obrigação garantida pelo aval não resultaria de vício de forma, pelo que sempre subsistiria a obrigação da embargante.
Donde que também quanto a esta questão não se possa reconhecer razão à recorrente.
Finalmente, ao aludir a violação do disposto no art.º 10º da LULL, parece pretender a recorrente invocar preenchimento abusivo da livrança.
O preenchimento abusivo, porém constitui matéria de excepção peremptória, cujo ónus da prova recaía sobre a própria embargante por se tratar de matéria de oposição à petição executiva (art.º 342º, n.º 2, do Cód. Civil). Ora, para se demonstrar preenchimento abusivo, necessária se tornava a prova da divergência entre os termos do acordo realizado a tal respeito e os termos inscritos na livrança pela ora embargada nos espaços então em branco, a fim de determinar se o preenchimento foi feito ou não de harmonia com esse acordo. Não foi, porém, produzida qualquer prova de eventual divergência entre o preenchimento feito e a autorização deste, aliás concedida também pela própria embargante como se vê do citado documento de fls. 33.

Pelo exposto, acorda-se em negar a revista, confirmando-se o acórdão recorrido.
Custas pela recorrente.

Lisboa, 13 de Fevereiro de 2007
Silva Salazar
Afonso Correia
Ribeiro de Almeida