Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
02A3679
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: ARMANDO LOURENÇO
Descritores: DIREITOS DE AUTOR
CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS
CUMPRIMENTO DEFEITUOSO
Nº do Documento: SJ200305060036796
Data do Acordão: 05/06/2003
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: T REL ÉVORA
Processo no Tribunal Recurso: 3679/02
Data: 04/11/2002
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA.
Sumário :
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

Em 10/12/97, A propôs esta acção contra
Junta de Freguesia de ... .
Pede que a ré seja condenada a pagar-lhe 38.469.842$50.
Alega, em resumo:
É arquitecto e, do exercício da arquitectura, faz profissão.
Em 1994, a ré adjudicou-lhe os seguintes trabalhos:
a)- Elaboração do projecto do edifício do novo balneário termal;
b)- Elaboração do projecto do conjunto envolvente das termas da sulfuria.
Entregou o projecto referido em a) e o serviço não lhe foi pago na totalidade.
Quanto ao projecto referido em b) foi suspendido definitivamente pela ré que não lhe pagou tudo a que tinha direito.
A ré contestou dizendo:
O A. só apresentou os trabalhos mais de um ano depois de terminar o prazo acordado.
Além disso, o trabalho apresentado tinha graves inconvenientes, apontados por geólogo de reconhecido mérito.
Tinha ainda outros defeitos de concepção, os quais o A. não conseguiu superar.
O projecto tal como o autor apresentou finalmente à ré, não seria aprovado.
O A. não cumpriu, logo a ré nada lhe deve.
Em Reconvenção pede a condenação do A. a pagar-lhe 305.000$00 acrescido de juros desde a citação, por importâncias indevidamente recebidas.
Proferiu-se despacho saneador, onde, além do mais, foi decidido que não se verificava a excepção de prescrição invocada pela ré.

A final foi proferida a seguinte sentença:
1- Julgar a acção parcialmente provada e procedente, bem como a reconvenção e condenar a ré a pagar ao A. 20.703.928$00 acrescido de juros desde a citação.
2- Condenar a ré a pagar ao A. o que se vier a liquidar em execução de sentença e que exceder a quantia de 9.000.000$00, já considerada pela terceira prestação devida pela ré ao A., mas incompletamente prestada por este àquela.
A R. e o A. interpuseram recurso.
Relação decidiu:
a- Julgar improcedente a Apelação do A..
b- Julgar parcialmente procedente a Apelação da ré e, em consequência, condená-la a pagar ao A.:
1- A quantia global de 11.703.928$00 (58.378,95 euros),
2- Acrescida da quantia que se vier a apurar em execução de sentença, na parte que diz respeito à 3ª prestação do contrato, relativamente ao projecto dos novos Balneários, estando a liquidação limitada pelo valor máximo da 3ª prestação, correspondente a 55% do valor acordado de 28.768.500$00.
O A. e a R. interpuseram recurso.

O A. apresentou as seguintes conclusões:
1- A. e R. celebraram dois contratos.
2- Tinham como objecto a adjudicação ao A. da elaboração do projecto do edifício do novo balneário termal e a elaboração do projecto do conjunto envolvente das termas da sulfúrea.
3- O projecto do Balneário foi entregue pelo A. á R. terminado.
4- Estando terminado este contrato, não lhe podiam pôr termo.
5- O A. consentiu que outro técnico responsável pudesse introduzir alterações sem condicionantes nesse projecto.
6- O A. cedeu os seus direitos de autor ao novo técnico.
7- Essa autorização foi expressa e exclusiva em relação ao contrato do novo Balneário.
8- Os dois contratos são autónomos.
9- A Junta comunicou ao A. que devia suspender definitivamente os trabalhos relativos ao projecto do conjunto envolvente.
10- Assim, a R. deverá ser condenada a pagar a quarta prestação de 10% do total dos honorários, referente ao contrato do novo Balneário, ou seja 2.876.750$00.
11- A rescisão unilateral do contrato relativo ao conjunto envolvente, dá ao A. direito a receber metade da 3ª prestação a título de indemnização, no montante de 7.804.307$00.

A R. apresentou as seguintes conclusões:
1- Na resposta à matéria de facto, a fundamentação foi "As respostas aos quesitos fundaram-se nas respostas dos senhores peritos, nos documentos juntos ao processo e no depoimento das testemunhas gravadas."
No recurso de apelação arguiu a nulidade da fundamentação.
A Relação, fazendo uma incorrecta interpretação da lei, não a reconheceu.
3- A prestação do recorrido era uma só e não se esgota na entrega física dos projectos mas sim no resultado que sobre eles se venha a produzir decorrente da sua aprovação ou não pelas entidades competentes.
4- Há que esperar pelo resultado da apreciação, para se ajuizar do cumprimento ou não.
5- Havendo revogação dos contratos, os mesmos extinguiram-se nesse momento.
6- O A. não pode formular o pedido com base nos contratos. Poderá reclamar o que achar ter direito, ao abrigo de qualquer outro instituto, mas não do cumprimento do contrato.
7- A Relação devia ter considerado que na data em que as partes puseram termo aos contratos por acordo, a prestação do recorrido por ser só uma ainda não se achava cumprida.
8- Para o caso de se entender que a resposta ao quesito 76 é possível de ser interpretada como geradora de incumprimento definitivo, temos de ponderar:
9- Os contratos só ficavam cumpridos com a aprovação pelas entidades que deviam dar o seu parecer;
10- Ao projecto apresentado pelo A. relativo ao Balneário foram apontados vários defeitos (quesitos 85, 86, 89, 78, 79, 80).
11- A prestação do A. foi defeituosa, logo há cumprimento defeituoso.
12- Apontados os defeitos pela ré não foram corrigidos.
13- O A. até aceitou que os defeitos fossem corrigidos por terceiro. Isto gerou incumprimento definitivo por perda do interesse da R. (artº. 808º nº. 2).
14- Havendo incumprimento definitivo, o recorrido perdeu direito de receber a restante parte da segunda prestação e a terceira respeitante ao contrato do Novo Balneário, bem como a segunda prestação do Projecto da Zona Envolvente.
15- Para o caso de se entender que, em virtude da prestação incompleta, deve haver redução do preço, ainda assim, por não existirem factos que desde já permitam essa quantificação, deverá remeter-se para execução de sentença esse apuramento, não só referente à restante parte da segunda prestação do Novo Balneário como também à totalidade da segunda prestação do Projecto da Zona envolvente.
Houve contra-alegações de ambas as partes.
Após vistos cumpre decidir.

Damos por reproduzida a matéria de facto fixada pelas instâncias.
Dela destacamos a seguinte:
10. Em 4-8-94, são celebrados dois contratos em que são outorgantes a Junta de Freguesia de ..., representada pelo seu Presidente, com poderes para o acto, e o Autor, como 2º outorgante, tendo as assinaturas sido reconhecidas presencialmente e na qualidade para o acto (al. k).
11. Os contratos referidos tinham como objecto a adjudicação ao segundo outorgante da elaboração do projecto do edifício do novo balneário termal e da elaboração do projecto do conjunto envolvente das termas da sulfúrea (al. l).
91. O presidente da Câmara de Fronteira informou o Autor que o segundo projecto de execução por ele entregue não tinha sido positivamente apreciado pelo Instituto Geológico e Mineiro, por este ainda considerar excessivo o volume de escavações (q. 33º).
92. E dado que o projecto ainda carecia de sofrer alterações (o Presidente da Câmara) solicitou ao A. que autorizasse outro técnico a vir a fazer tais alterações (anterior quesito 34º e que passou para a especificação, conforme fls. 296 e 330).
93. O Autor acedeu a que outro Técnico fosse contratado para reformular a adaptar o Projecto. (q. 76).
102. Em 21-7-97, presente à reunião da Junta de Freguesia realizada nesse mesmo dia, o Autor informou a mesma do sucedido e solicitou o pagamento dos seus honorários (q. 35º).
103. Pela Junta de Freguesia foi dito ao Autor que os pagamentos seriam efectuados, mas que tal não era possível realizar no imediato (q. 36º).
104. Nessa data e reunião, foi comunicado ao Autor, pela Junta de Freguesia, que aquele deveria suspender definitivamente os trabalhos relativos ao projecto do conjunto envolvente (q. 37º).

Que dizer!?
Em 3/8/94, A. e R. chegaram ao seguinte acordo: (1º outorgante - Freguesia; 2º outorgante - autor)
A Freguesia "adjudica ao A. a elaboração do projecto do edifício do novo balneário termal."
"O projecto constará de projecto geral, projecto de estruturas, projecto de águas e esgotos, projecto de instalações eléctricas, projecto de instalações mecânicas, medições, orçamento e caderno de encargos."
"O projecto compreenderá a elaboração de ESTUDO PRÉVIO e de projecto de execução, devendo ser apresentado pelo 2º outorgante, respectivamente, 90 dias após ter sido notificado de que o contrato foi visado pelo TC, e 90 dias após ser notificado da aprovação do ESTUDO PRÉVIO."
"O não cumprimento dos prazos fixados........implicará a retenção de parcelas dos honorários respeitantes às fases em atraso...... . Quando por iniciativa do 1º outorgante ou por razões não imputáveis ao 2º outorgante houver lugar à suspensão temporária ou rescisão do contrato, terá o 2º outorgante direito a receber, a título de indemnização, a totalidade da fracção de honorários respeitante à fase em curso, bem como metade do respeitante à fase seguinte."
"Os honorários relativos ao projecto abrangido pelo presente contrato têm o valor de 28.768.500$00. O valor referido será acrescido de IVA."
Liquidação dos honorários:
"1ª prestação - 5% do total após obtenção do visto do TC."
"2ª prestação - 30% do total quando da aprovação do estudo prévio, ou 60 dias após a sua entrega."
"3ª prestação - 55% do total aquando da aprovação do projecto de execução ou 60 dias após a sua entrega."
"4ª prestação - 10% do total pago em 2 fracções iguais - a 1ª com o início da obra, ou 180 dias após entrega do projecto de execução ; a 2ª aquando da conclusão dos trabalhos ou no prazo máximo de 2 anos após a entrega do projecto de execução."
"O 1º outorgante poderá rescindir o contrato quando os prazos fixados para entrega das várias fases do trabalho forem excedidas, sem justificação aceite, em 90 dias, perdendo neste caso o 2º outorgante o direito ao pagamento da fase em curso e seguintes."
"Em tudo o omisso no presente contrato seguir-se-á o que vier a ser acordado, ou o disposto na Port. de 5/3/86 do M.O.P.T.C.."

No mesmo dia, celebraram outro acordo do seguinte teor:
"O 1º outorgante adjudica ao 2º a elaboração do projecto do CONJUNTO ENVOLVENTE das Termas da Sulfúrea".
"O projecto constará de Projecto Geral, Projecto de estruturas, Projecto de circulações, Projecto de águas e esgotos, Projecto de instalações eléctricas, Projecto de instalações mecânicas, Medições, Orçamento e Caderno de encargos."
"O Projecto compreenderá a elaboração de ESTUDO PRÉVIO e de PROJECTO DE EXECUÇÃO, devendo ser apresentados pelo 2º out., respectivamente, 270 dias após ter sido notificado de que o contrato foi visado e 90 dias após ser notificado da aprovação do estudo prévio."
"O não cumprimento dos prazos........., implicará a retenção, pelo 1º out., de parcelas de honorários.......... . Quando por iniciativa do 1º out. ou por razões não imputáveis ao 2º, houver lugar á suspensão temporária ou rescisão do contrato, terá o 2º direito a receber, a título de indemnização, a totalidade de fracção dos honorários respeitantes á fase em curso, bem como metade do respeitante à fase seguinte."
"Os honorários têm o valor de 28.379.300$00."
"Serão liquidados de acordo com as seguintes prestações:
1ª- 5% do total, após obtenção do visto.
2ª - 30% do total a liquidar aquando da aprovação do ESTUDO PRÉVIO ou 60 dias após a sua entrega."
3ª - 55% do total, a liquidar aquando da aprovação do PROJECTO DE EXECUÇÃO ou 60 dias após a entrega.
4ª - 10% do total, pagos em duas fracções iguais, a 1ª aquando do início da obra, ou 180 dias após a entrega do projecto de execução, a 2ª aquando da conclusão dos trabalhos ou no prazo máximo de 2 anos após entrega do projecto de execução."
"O 1º poderá rescindir quando os prazos fixados para entrega das várias fases forem excedidos ...., em 90 dias, perdendo o 2º direito ao pagamento da fase em curso e seguintes."
"Em tudo o omisso .......... ."

Posição do A.
O A. qualifica os contratos com de prestação de serviços inominado.
As partes fixaram os honorários.
O A. cumpriu, logo, tem direito aos honorários.

Posição da R..
A ré qualifica os contratos como de prestação de serviços.
O A. não cumpriu. Não pode pedir a contraprestação do cumprimento.
Poderíamos encarar a acção como uma acção típica de honorários.
Mas, então, "põe-se o problema de saber como quantificar, avaliar o trabalho que o A. ainda que incompleto e defeituoso, entregou à ré."
O processo não fornece elementos que permitam esta quantificação.
"Só restaria relegar para execução de sentença a fixação do montante a pagar."
Não se aceita esta forma de ver as coisas. O A., pura e simplesmente, não cumpriu.
A 1ª INSTÂNCIA fez o seguinte discurso:
Estamos perante dois contratos de prestação de serviços.
Estão sujeitos às disposições sobre o mandato. (artº. 1156º CC)
Estes contratos, apesar de vicissitudes várias sobreviveram.
As partes puseram-lhe termo por mútuo acordo.
Esta conclusão é tirada do comportamento das partes. Do facto de a ré ter solicitado ao A. que permitisse a intervenção de um técnico estranho e de o A. ter aceitado.
Como os contratos diziam respeito a uma obra unitária, a comunicação da ré para suspender definitivamente o projecto do conjunto envolvente, só pode entender-se com o sentido de que a revogação de um contrato implicava a revogação do outro.
Tendo os dois contratos terminado por mútuo acordo tem o A. direito aos honorários pelos trabalhos efectuados, de acordo com as fases de pagamento acordadas.
A R., sobre esta decisão, disse:
Aceitando-se que as partes puseram termo aos contratos por mútuo acordo, não pode assentar-se o pedido no contrato, que deixou de existir.
Não se interpretando desse modo o comportamento das partes, temos de concluir que estamos perante um incumprimento definitivo, por parte do A..
Sendo assim, o A. "perdeu o direito a receber a restante parte da 2ª prestação e a 3ª respeitante ao contrato do Novo Balneário, bem como a segunda prestação do Projecto da Zona Envolvente.
Entendendo-se que, por haver cumprimento defeituoso, deve haver redução do preço, então deverá relegar-se para execução de sentença o seu apuramento.
O A., sobre a mesma decisão, disse:
Entregou o projecto do novo balneário terminado.
Cedeu ao novo técnico os seus direitos, nos termos e para os fins do Código de Direitos de Autor.
A. e R. não acordaram em pôr termo ao contrato.
Os contratos que celebrou são autónomos.
O contrato cujo objecto era o conjunto envolvente foi rescindido unilateralmente pela ré.
A Ré deve pagar a 4ª prestação de 10% do total dos honorários, referente ao contrato do novo balneário (2.876.750$00).
A R. deve pagar metade da 3ª prestação do conjunto envolvente.
A Relação fez o seguinte discurso:
"É evidente a interdependência de ambos os contratos, já que a execução do novo balneário carecia necessariamente do projecto referente à zona envolvente." "A cessação do contrato referente ao Projecto A) provocou necessariamente a cessação da actividade prestadora de serviços quanto ao Projecto B)."
"A cessação ocorreu por vontade de ambas as partes." "Efectivamente, a certa altura, quer uma quer outra revelaram que não estavam interessadas na conclusão do acordado."
"Nada permite concluir que tenha existido uma cedência dos direitos de Autor ao novo técnico." A alegação agora feita, "está desacompanhada da respectiva descrição fáctica que a suporte."
Aos contratos sub-judice aplicam-se as regras do mandato oneroso.
"O pagamento de honorários solicitado tem que ser entendido com o alcance - de remuneração que é devida como contrapartida pelos trabalhos executados."
"POR ISSO MESMO, O DIREITO DO A. À RETRIBUIÇÃO DEVE SER O RESULTADO DA APLICAÇÃO DOS ARTºS. 1167º, B) E 1158º, DO CC, CONSIDERANDO O PONTO EM QUE O CONTRATO SE ENCONTRAVA QUANDO LHE FOI POSTO TERMO.
Relativamente ao contrato A) em que apresentou e viu aprovado o E. Prévio e desenvolveu o Projecto que praticamente concluiu, tem direito a:
a)- 1ª e 2ª (5% e 30% do total);
b) a parte correspondente ao serviço que a 3ª prestação (55%) deveria remunerar, tendo-se em conta a proporção entre os serviços relacionados com o projecto, até à sua aprovação, e os serviços que efectivamente foram prestados.
Relativamente ao contrato B), apresentou o estudo prévio, cuja aprovação (ou rejeição) nunca lhe foi comunicada.
"Deve reconhecer-se ao A. o direito de receber a totalidade da 2ª prestação."
Deve reduzir-se ao montante global a quantia de 262.082$00 paga pela ré sem justificação.
Sobre este acórdão disse o A:
Entregou o projecto do balneário completo.
Cedeu os direitos de autor ao novo técnico.
Não acordaram em pôr termo ao contrato.
Os dois contratos são autónomos.
O outro contrato foi rescindido unilateralmente pela ré.
Tem direito á 4ª prestação do contrato A) (clausula 6ª do contrato).
Tem direito a metade da 3ª prestação a titulo de indemnização pela rescisão do contrato B) (clausula 4ª).

A ré sobre o dito acórdão disse:
Só se pode falar em cumprimento das obrigações assumidas quando os projectos entregues forem aprovados pelas entidades competentes.
A revogação tácita destes contratos não produz os mesmos efeitos que a revogação dos contratos de execução continuada.
A revogação extinguiu os contratos e estes não podem suportar o pedido.
Pode fundamentar o pedido ao abrigo de outra causa de pedir (enriquecimento sem causa).
Não existindo a causa invocada e não tendo sido invocada outra causa, o pedido tinha de improceder.
Considerando-se que, a resposta ao quesito 76, pode ser interpretada como incumprimento definitivo por perda do interesse do credor, o A. perdeu o direito a receber a restante parte da 2ª prestação e a 3ª respeitante ao contrato A), bem como a 2ª prestação do contrato B).
Entendendo-se que, em virtude da prestação incompleta, deve haver redução do preço, deve relegar-se para execução de sentença, não só quanto à restante parte da 2ª prestação do contrato A), como à totalidade da 2ª prestação do contrato B), à semelhança do que foi entendido quanto à 3ª prestação do contrato A).
Apreciaremos simultaneamente as várias questões postas por A. e R., pois traduzem, apenas, diferentes modos de encarar juridicamente as mesmas realidades.
Apenas apreciaremos em separado e inicialmente a 1ª questão posta pela ré.

1ª questão - Nulidade do julgamento da matéria de facto por incorrecta fundamentação.
O processo iniciou-se em 10/2/97.
Na fundamentação das respostas aos quesitos escreveu-se:
"As respostas aos quesitos fundaram-se nas respostas dos senhores peritos, nos documentos juntos ao processo e no depoimento das testemunhas, gravado."
Nas conclusões do recurso de apelação a ré afirmou que "não existe fundamentação da resposta à matéria de facto, pelo que a mesma é nula nos termos do artº. 668º nº. 1 b) do CPC.
A Relação, apreciando, começa por notar que a ré não reclamou quando o podia ter feito.
Em seguida, lembrando os poderes que lhe são conferidos pelo artº. 712º, nº. 5 do CPC, e, tendo em conta as provas constantes do processo e a deficiente alegação da ré quanto essenciais que pretendia ver motivados, indeferiu a pretensão.
O indeferimento foi feito por unanimidade.
Como esta questão é uma questão processual, por força do nº. 2 do artº. 754º do CPC, na versão dada pela reforma de 95/96, não era passível de agravo autónomo.
Por igual razão não pode ser objecto de recurso englobado na revista.
Não se toma conhecimento da questão.

2ª Questão - Cumprimento ou não dos contratos.
Não temos dúvidas de que há dois contratos.
Também não temos dúvidas de que entre os dois contratos há uma intima conexão, pois ambos contribuiriam para a realização do interesse da ré na criação/remodelação da zona termal.
À escolha do A. para apresentação da proposta e adjudicação dos dois projectos, encargo de elaboração do Plano de Pormenor e perspectiva de adjudicação do projecto de remodelação, não foi estranha esta visão de conjunto.
Essa visão de conjunto não pode ser estranha à apreciação jurídica de cada uma das relações contratuais estabelecidas.
Começamos por apreciar a relação de encomenda e realização do projecto do novo balneário.
Pode considerar-se dominante a orientação que vê neste tipo de relação jurídica uma relação de prestação de serviços inominada.
Na falta de normas reguladoras contratuais, esta relação está sujeita às regras do mandato, com as necessárias adaptações (1156º).
No caso presente, a natureza da obra intelectual prometida implica que, nas adaptações possíveis, se tenha de atender às normas ditadas pelo direito de autor.
Também a natureza da relação criada pode exigir que se deva recorrer a normas mais adequadas previstas para a empreitada (vg. desistência).
A obrigação de realizar um projecto de arquitectura é uma obrigação complexa.
Em regra exige a obrigação de realizar estudos prévios, e o projecto em si abrange um conjunto de desenhos representativos e mapas complementares, de medições, plantas de sondagens, perfis geológicos, etc., que definem a natureza, a forma, as dimensões, a estrutura e as características da obra a realizar... .
Como vimos, o A. apresentou o projecto. A sua obrigação estava cumprida. O A. para cumprir devia apresentar um projecto apto para o fim pretendido e que respeitasse as regras da arte de arquitecto-projectista e eventuais normas jurídicas condicionantes da implantação das obras projectadas.
O A. era inteiramente livre e responsável pelo trabalho apresentado.
O encomendante do projecto podia e talvez devesse precisar o mais que pudesse aquilo que pretendia.
Num projecto como este, há, naturalmente, operações de técnica pura, sem apelo à criatividade (vg. medições, cálculos de resistência, etc.).
Mas há outras operações em que se faz apelo à criatividade (vg. a configuração e localização dos edifícios e a modelação da zona envolvente).
Naturalmente, um projecto desta natureza, sem pôr em risco a liberdade do arquitecto, será executado em intima colaboração com o encomendante, cujo desejo será satisfeito (ou não) pela solução criada (encontrada) pelo arquitecto.
Foi o que aconteceu aqui, com as várias modificações, quer nos estudos prévios quer nos projectos.
Podemos dizer que o projectista se obrigou a pôr à disposição do encomendante o seu saber fazer para atingir o fim pretendido.
O A. apresentou um estudo prévio. Perante as observações feitas pela Junta de F. o A. apresentou um 2º. estudo.
Em seguida apresentou o projecto. A Junta de F., em face da opinião de vários especialistas, rejeitou-o e solicitou alterações que o A. se propôs fazer.
A Junta de F., para ganhar tempo, enviou o projecto rejeitado, acompanhado de uma memória descritiva elaborada pelo A., às várias entidades que iriam aprovar o projecto.
O A. deu início aos trabalhos de alteração.
Quando procedia a estas alterações, o Presidente da Câmara de Fronteira informou o A. que o projecto do Balneário não tinha sido apreciado positivamente, por ainda considerar excessivo o volume de escavações.
Dado que o projecto ainda carecia de sofrer alterações, solicitou ao A. que autorizasse outro técnico a vir fazer tais alterações.
Em 21/7/97, na reunião da Junta de F., o A. informou-a do sucedido e solicitou o pagamento de honorários.
Pela Junta de F. foi dito ao A. que os pagamentos seriam efectuados, mas que tal não era possível realizar de imediato.
Nessa data e reunião, foi comunicado ao A., pela Junta, que aquele deveria suspender definitivamente os trabalhos relativos ao Projecto do Conjunto Envolvente.
Em 21/7/97, o A. acedeu a que outro técnico fosse contratado para reformular e adaptar o projecto, conforme doc. de Fls. 143 "... declaro que dou o meu consentimento à Junta ... que indiquem outro técnico responsável por introduzir alterações sem condicionantes no projecto do Novo Balneário ..., de cujo projecto inicial fui autor".
A ré contratou e pagou a esse novo técnico.
Apesar de o A. ter entregue todos os projectos parcelares que compõem o dito Projecto, alguns deles estavam incompletos.
Como dissemos, uma das regras próprias da empreitada aplicável a este contrato é a do artº. 1229º do CC. "O dono da obra pode desistir da empreitada a todo o tempo, ainda que tenha sido iniciada a sua execução contanto que indemnize o empreiteiro dos seus gastos e trabalho e do proveito que poderia tirar da obra".
Se é certo, ser razoável que o encomendante não seja obrigado a manter até ao fim a relação com o projectista, porque, pelas mais variadas razões, não está interessado em a manter, já não temos a mesma certeza quanto à razão de ser do pagamento dos trabalhos efectuados.
Se, na empreitada de obra material é razoável atribuir o direito à livre desistência, com a contrapartida de ficar com os trabalhos realizados pelo seu custo, já no caso em que a obra é intelectual, materializada, embora, em suporte físico, temos de atender ao facto de que a obra é do autor e é inalienável, embora possa ser cedida a sua utilização.
O artº. 2º do C.D.Autor considera obras protegidas "os projectos e esboços respeitantes à arquitectura".
O artº. 9º atribui ao autor o direito patrimonial e moral sobre a obra.
Quanto ao direito patrimonial, pode, em exclusivo, dispor da obra e fruí-la e utilizá-la, ou autorizar a sua fruição por terceiro... .
Independentemente dos direitos patrimoniais, e mesmo depois da transmissão ou extinção destes, o autor goza de direitos morais sobre a obra, designadamente ... assegurar a sua genuinidade e integridade".
O artº. 10º distingue a obra do suporte à sua fixação ou comunicação e diz que o adquirente do suporte não goza de quaisquer poderes compreendidos no direito de autor.
O artº. 41º diz que a autorização para utilizar a obra só pode ser conhecida por escrito.
O artº. 68º atribui ao autor o direito de autorizar a construção de obra de arquitectura segundo o projecto.
O artº. 198º pune criminalmente quem atentar contra a genuinidade ou integridade de obra alheia.

Tendo em atenção estas disposições, entendemos que o encomendante pode desistir mas não tem direito a utilizar o projecto em vias de acabamento, sem consentimento do autor para o utilizar e completar ou/e modificar, embora tenha a obrigação de indemnizar nos termos do artº. 1229º.
Tudo o que deixamos dito, o é sem prejuízo de justa causa para pôr termo à relação.
Cremos que, em face do regime que deixámos delineado, podemos tomar posição sobre o que se passou em 21/7/97.

Ainda que se entendesse aplicar, ao caso, as regras do mandato, não se lhe aplicaria a regra do artº. 1170º, nº. 2, mas a regra da revogação ad nutum, pois o interesse do autor na remuneração não é relevante (Januário Gomes, in Revogação do Mandato - 148).
A vontade da ré em pôr termo à relação, seria sempre livre quer a considerássemos exercida ao abrigo do artº. 1170º quer do artº. 1229º (as diferenças poderiam surgir em termos de indemnização).
Como a ré podia livremente revogar o contrato, a declaração do autor só tem sentido como autorização da ré aproveitar/usar o seu projecto com as alterações que entendesse.
O A. sempre teve uma atitude colaborante até àquele momento, apesar de muitas cabeças a opinar sobre o projecto, que era da sua inteira responsabilidade.
O A. estava a modificar o projecto para atender aos reparos da Junta.
Um terceiro, Presidente da Câmara, dá-lhe a entender que o seu projecto não será aprovado, e que só outrem é capaz de o levar a bom termo.
A atitude do A. perante a Junta só podia ser a que teve. O seu projecto ficava como estava e a Junta que lhe pagasse. A sua obrigação estava cumprida. Se bem ou mal cumprida, quem de direito se pronunciasse.
Ainda, numa atitude colaborante, consentiu que o seu projecto fosse usado com as alterações que quisessem.
Não há, aqui, qualquer desistência por parte do A. ou da ré.
Há, apenas, uma declaração do A. no sentido de que a sua obrigação estava cumprida com o projecto entregue e que não fazia mais alterações.
Da parte da ré há uma aceitação do projecto e aceitação de uma declaração de consentimento de alterações.
No que toca ao Projecto do Conjunto Envolvente, há uma desistência por parte da ré.

3ª. Questão - Cumprimento defeituoso do contrato de projecto de balneário.
Este é um dos aspectos em que o contrato de projecto deve ser, na falta de normas contratuais, apreciado de acordo com as regras da empreitada.
706º CC - O devedor cumpre a obrigação quando realiza a prestação a que está vinculado.
No cumprimento da obrigação, assim como no exercício do direito correspondente, devem as partes proceder de boa fé.
1208º CC - O empreiteiro deve executar a obra em conformidade com o que foi convencionado, e sem vícios que excluam ou reduzam o valor dela, ou sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato.

Para um juízo de cumprimento, temos de colocar lado a lado o que foi prestado e o que devia ser prestado.
No caso presente as partes não definiram, senão vagamente, o que devia ser prestado.
Apenas disseram que era um projecto para construção de um balneário termal.
Esta obrigação é complexa e, por natureza, exige saberes e saber de que o A. era presuntivamente possuidor e que a ré não detinha. Foi por isso que foi escolhido.
Neste caso era ao devedor que cabia ir dando os contornos à obrigação à medida que ela se ia desenvolvendo de acordo com o fim que se pretendia.
Apresentado o resultado final, caberia, por critérios objectivos, apreciar se o trabalho apresentado respeitava as regras da arte, e se satisfazia os fins pretendidos.
O principal vício apresentado diz respeito ao volume das escavações e ao risco de contaminação das reservas aquíferas daí resultante.
Não há dúvidas de que um risco desta natureza é suficiente para considerar que o resultado pretendido pela ré não era satisfeito.
Está ou não provado que o projecto apresentado faz correr esse risco?

O que está provado é o seguinte:
Z- Em 2/5/97, a ré comunicou ao A. que "O local onde se situa o Projecto, do ponto de vista hidrogeológico suscita muitas dúvidas quanto ao bom funcionamento das emergências primitivas e furos de abastecimento, mostrando, através dos vários perfis topográficos, a escavação necessária para implantação do balneário e instalações de apoio. Sobre esta escavação o parecer é pouco positivo. Alguns locais ficariam sujeitos a remoções de terreno na ordem dos 8 a 9 m de profundidade. Seria negativa a remoção de grandes quantidades de terreno como o uso de explosivos.
A geologia do local é calcária, susceptível de grandes fracturas, apesar de ser uma rocha impermeável.
A utilização de explosivos poderia pôr em perigo a estabilidade do solo, assim como o bom funcionamento das emergências primitivas.
Estando comprovado que, quando o furo que abastece as termas entra em funcionamento, as emergências primitivas deixam de funcionar. Qualquer alteração nas emergências primitivas afectará o abastecimento termal, pondo em risco as próprias termas".
A Ré, em face da situação comunicada, propõe alterações.
BB- Em 23/5/97, a ré deu a conhecer ao A. o parecer de um geólogo onde se lê: que "a área de implantação do balneário tem uma configuração aceitável em termos dos conhecimentos actuais sobre o circuito hidromineiro de Cabeço de Vide". "A localização para o balneário poderá ser aceite, em si, desde que todos os cuidados da boa técnica sejam postos em prática para minimizar riscos de poluição e contaminação induzidos pela obra na fase de construção e exploração".
"Questionamos a possibilidade de virem a ser feitas escavações importantes que possam interferir directa ou indirectamente com o recurso hidromineral ou pôr em risco a respectiva exploração".
56- "As escavações a 8/9 m, implicariam a remoção de grandes quantidades e o uso de explosivos, o que desde logo constituía uma ameaça aos recursos hidrológicos existentes.
57- Além das opiniões atrás mencionadas, outras pessoas, entre as quais um arquitecto e um médico, se pronunciaram pela inviabilidade do projecto tal como se encontrava, censurando vários outros aspectos, além das escavações.
32- Em 9/7/97, o A. entregou à Junta o 2º. Projecto do balneário, com as desejadas alterações reflectidas nos 10 projectos componentes.
73- Reduziu o volume das escavações para cerca de 6/7 m (Não se provou, porém, que esse volume fosse desaconselhável e impensável para o edifício em questão, atendendo à zona de implantação do mesmo).
74- Um bloco de tratamentos ficou a cerca de 1 a 2 m abaixo do nível do solo, com alterações de pequenos aspectos anteriores.

Em face desta matéria de facto não podemos dizer que o projecto apresentado pelo A. pusesse em risco os recursos hidrológicos existentes.
Não podendo fazer esse juízo não podemos julgar procedente a excepção de cumprimento imperfeito para isentar a ré de cumprir a sua obrigação.

Outros defeitos apresentados e provados.
61- O edifício não estava seccionado, o que confere ao mesmo pouca aptidão para funcionar sazonalmente, de acordo com uma maior ou menor taxa de ocupação.
62- Na secção de inaloterapia, estava prevista uma sala, o que implicaria o funcionamento da mesma em toda a sua amplitude, quer houvesse muita ou pouca afluência de pessoas.
63- Tal facto traduz-se em gastos de manutenção mais elevados.
64- No projecto está prevista uma zona de arrefecimento para todos os tratamentos, obrigando a uma aglomeração de pessoas naquele local.
66-A- Por estas razões (e outras não provadas 65, 66, e restrições aos quesitos provados) a entidade que iria supervisionar na aprovação do projecto para efeitos de candidatura ao AVNA, comunicou à ré, que o projecto nesses moldes não iria ser aprovado.
67- A ré comunicou ao A. a vontade de proceder a alterações ao projecto.
Estes defeitos, como resulta da própria atitude da ré podiam ser reparados.
Em face da sua natureza apenas davam à ré o direito de exigir a sua supressão por parte do A. (1221).
A ré, com o consentimento do A., preferiu que um terceiro remodelasse o projecto criado pelo A..
A ré teria, então, direito a haver do A. os gastos com essa remodelação.
Mas, para isso, teria que demonstrar que, nessa parte, a concepção do projecto era da responsabilidade do autor, uma vez que a ré interveio directamente na formulação da concepção do projecto e impôs alterações quer ao estudo prévio quer ao 1º. projecto.
O A. foi pondo ao serviço da ré o seu saber fazer e, no final, ainda se viu sujeito a ver a sua obra examinada pelas mais diversas entidades, que opinavam sem critérios objectivos decisórios de opção por uma ou outra das soluções.
O A., verdadeiramente, não sabia para onde se virar, não fazia bem, diziam, mas não lhe diziam como devia fazer.
Também, no fim deste processo, não temos um termo de comparação para dizer onde é que o A. errou.
O mais que podemos dizer é que o A. deu o melhor de si para levar a bom porto a tarefa a que se obrigou.
Nada nos permite dizer que o A., na realização da sua tarefa, não respeitou as leges artis.
O A. cumpriu a obrigação do contrato de elaboração do projecto de Novo Balneário.

Do Contrato de Projecto do Conjunto Envolvente.
U- O A. elaborou estudo prévio do "C.E.", que entregou à J. em fins de Dez. de 1995.
12- Após a entrega do estudo prévio o P.J. transmitiu ao A. um conjunto de aspectos que em seu entender deveriam ser alterados no referido estudo.
13- De seguida o A. elaborou um 2º. estudo prévio, atendendo aos aspectos referidos, o qual foi entregue no início de Fev. de 1996.
14- Este estudo prévio do "C.E.", com as alterações solicitadas pelo P.J. (alteração da localização dos campos de ténis e da piscina) foi enviado ao Instituto Geológico e Mineiro, de cuja aprovação o estudo necessitava.
45- O A. nunca foi notificado da não aprovação do estudo prévio.
82- O I.G.M. informou a ré (fls. 145 - ofício em resposta a comunicação da ré de 29/2/96) de que: "atendendo à vulnerabilidade do aquífero à poluição e considerando o estudo hidrológico efectuado, por A. Cavaco de 1979 a 183, qualquer actividade a montante das captações é de elevado risco, não nos sendo por isso possível dar parecer favorável ao anteprojecto. Deverá ser reformulado numa perspectiva de preservação desse recurso.
Assim:
Para jusante do actual edifício balneário não se vê inconveniente para a expansão das termas em todas as suas vertentes... .
A Zona a montante dos balneários, em que se inserem as captações da água com carência de protecção, seja objecto de intervenção limitada, nomeadamente:
- recuperação de edifícios;
- correcção da arborização existente, limpeza e conservação dos leitos e margens dos cursos de água, com eventual renaturalização e exclusão de qualquer apresamento de água;
- pavimentação dos locais de trânsito de pessoas e arrelvamento dos espaços livres;
- desencorajar os aspectos conducentes ao estacionamento de veículos motorizados e pessoas;
- a captação de água para funcionamento das infra-estruturas de apoio à actividade balnear (hotéis, restaurantes; ...) deve ser localizada preferencialmente, a jusante das captações de água mineral existentes.

37- Na reunião de 21/7/97, foi comunicado ao A., pela J., que aquele deveria suspender definitivamente os trabalhos relativos ao Projecto do Conjunto Envolvente.
A ré desistiu do contrato como lhe era legal e contratualmente permitido, sem justa causa provada. O mais que se provou foi parecer do IGM, nem sequer se tendo provado que esse parecer foi dado a conhecer ao A..
Não bastava à ré, para justificar a desistência, alegar e provar a existência desse parecer.
Cabia-lhe alegar e provar os vícios eventualmente existentes no estudo prévio, de que esse parecer constituiria um meio probatório sujeito a contraditório judicial.
A. responde, nos termos contratuais pela extinção da relação contratual.

Resumindo as soluções dadas às duas últimas questões.
Estamos perante dois contratos de projecto de arquitectura autónomos e com duas fases distintas de execução, estudo prévio e projecto final.
Estes contratos de prestação de serviços inominados, regem-se pela vontade das partes na medida em que não violem eventuais normas imperativas, pelas normas do contrato de mandato, com alterações impostas pela natureza do seu objecto, que levam a aplicar algumas normas do contrato e empreitada e atender a normas do direito de autor.
No contrato, as partes fixaram de modo muito vago os contornos da obrigação do projectista, limitaram-se a indicar o fim do projecto, os prazos de execução, a termos em que o credor podia pôr termo ao contrato e as suas consequências bem como as consequências da mora do devedor.
No caso de vaguidade na definição da obrigação cabia ao A. (devedor) ir definindo esses contornos à medida que ia avançando na execução, tendo em conta o fim pretendido.
Ao apreciar o modo como essa definição foi sendo feita não podemos deixar de atender às intervenções do credor que concorreram para a mesma, sem prejuízo da autonomia do devedor, como é próprio de um contrato de prestação de serviços.
Apresentando o projecto final, ou uma das fases distintas, só será justa causa de recusa do resultado apresentado, se o credor alegar e provar razões objectivas que convençam que esse resultado tem vícios que o tornam imprestável para atingir os fins pretendidos.
Atendendo aos termos em que se processou a intervenção do credor na definição do objecto da obrigação, podemos dizer que o devedor apenas se obrigou a pôr à disposição do credor o seu saber e saber fazer.
Cabia ao credor, para obter uma censura do resultado apresentado, alegar e provar vícios reveladores de violação pelo devedor das boas regras da arte.
Não alegando e provando esses vícios tem de responder nos termos do contrato.

Questão final - Quantificação da responsabilidade da ré.
Tendo o A. cumprido a obrigação do contrato de elaboração do projecto do novo balneário tem direito a receber a prestação acordada por pagamento desses serviços, ou seja 28.768.500$00.
Como já recebeu 6.616.755$00, tem direito a receber 22.151.745$00.
Tendo a ré desistido do contrato de elaboração do projecto do conjunto envolvente depois de ter sido entregue o estudo prévio mas sem notificação da sua aceitação, tem o A. direito a receber a totalidade correspondente à 1ª. fase, ou seja 35% do total e metade da fase seguinte, 27,5% do total ou seja 62,5% do total, igual a 17.737.097$50.
Como já recebeu 1.418.965$00, tem direito a receber 16.737.062$50.
Como se decidiu no douto acórdão recorrido, à importância que o A. tem de receber há que deduzir a quantia de 262.082$00 paga, pela ré ao A., sem justificação.
Sobre as importâncias em dívida são devidos juros de mora legais desde a citação.

Em face do exposto, concedemos a revista ao A., revogando o douto acórdão no que toca à parte negatória da sua pretensão.
Negamos a revista à ré.
Julgando procedente a acção e parcialmente procedente a reconvenção, condenamos a ré a pagar ao autor a quantia de (38.207.761$00), 190.579,5 (cento e noventa mil quinhentos e setenta e nove euros e cinquenta cêntimos, acrescido de juros de mora à taxa legal desde a citação.
Custas na proporção do vencimento.

Lisboa, 6 de Maio de 2003
Armando Lourenço
Azevedo Ramos
Silva Salazar