Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
033882
Nº Convencional: JSTJ00004263
Relator: DANIEL FERREIRA
Descritores: PENA DE PRISÃO
CONTAGEM DOS PRAZOS
FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Nº do Documento: SJ197312050338823
Data do Acordão: 12/05/1973
Votação: UNANIMIDADE
Referência de Publicação: DG IS DE 1974/01/05, PÁG. 13 - BMJ Nº 232 ANO 1974 PÁG. 37
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PARA O PLENO
Decisão: TIRADO ASSENTO.
Indicações Eventuais: ASSENTO DO STJ.
Área Temática: DIR CRIM - TEORIA GERAL.
DIR CIV - TEORIA GERAL.
Legislação Nacional: CCIV66 ARTIGO 279 C ARTIGO 296 ARTIGO 298.
DL 47690 DE 1967/05/11.
CP886 ARTIGO 116 ARTIGO 117 ARTIGO 118.
DL 26643 DE 1936/05/28 ARTIGO 380 ARTIGO 381.
CCIV867 ARTIGO 560.
CPC876 ARTIGO 78.
CPC39 ARTIGO 148 PAR2 ARTIGO 143.
CPP29 ARTIGO 1 PARUNICO ARTIGO 308 ARTIGO 337 ARTIGO 636 ARTIGO 669.
DL 35007 DE 1945/10/13 ARTIGO 22.
DL 35042 DE 1945/10/20 ARTIGO 9.
DL 185/72 DE 1972/05/31.
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO RL DE 1972/06/26.
ACÓRDÃO RL DE 1972/10/18.
ACÓRDÃO STJ DE 1969/12/17 IN BMJ N192 PAG162.
ACÓRDÃO STJ DE 1971/03/10 IN BMJ N205 PAG147.
Sumário :
A contagem do tempo de cumprimento da pena de prisão e feita nos termos da alinea c) do artigo 279 do Codigo Civil.
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferencia, no Supremo Tribunal de Justiça:

O excelentissimo Procurador da Republica junto do Tribunal da Relação de Lisboa, invocando oposição sobre a mesma questão fundamental de direito entre os acordãos da Relação de Lisboa de 26 de Junho de 1972 e de 18 de Outubro do mesmo ano, recorreu para o Tribunal Pleno ao abrigo do disposto no artigo 669 do Codigo de Processo Penal a fim de ser fixada jurisprudencia sobre a controvertida forma de contar o tempo de prisão.
Foi ja reconhecido pelo acordão de folhas 144 a existencia de oposição entre as referidas decisões, pois enquanto que pelo acordão de 28 de Junho a Relação considerou aplicaveis ao caso as disposições dos artigos 279 e 298 do Codigo Civil vigente, decidindo que o cumprimento da prisão fixada em meses termina as 24 horas do dia do ultimo mes correspondente ao do inicio do cumprimento da pena, o acordão posteriormente proferido, em 18 de Outubro, julgou que os preceitos do actual Codigo Civil não são aplicaveis a hipotese em causa e que a contagem deve antes fazer-se, momento a momento, segundo o numero de dias de cada mes, computando-se sempre os meses em 30 dias.
O excelentissimo ajudante do Procurador-Geral da Republica junto da Secção Criminal deste Supremo Tribunal de Justiça defende na sua douta alegação o criterio seguido pelo primeiro das decisões em confronto desenvolvendo lucida argumentação no sentido de que o assento a proferir seja concebido nos seguintes termos:
"A contagem do tempo de cumprimento da pena de prisão e feita nos termos da alinea c) do artigo 279 do Codigo Civil".
Apos os vistos legais, cumpre decidir:
Preliminarmente, devera reconhecer-se que nenhuma duvida se levanta quanto a verificação do condicionalismo legal exigido pelo artigo 669 do Codigo de Processo Penal, havendo, consequentemente, perfeita razão para a admissibilidade do recurso.
Ja se disse qual o objecto deste: - eliminação do conflito jurisprudencial que tem feito surgir criterios divergentes quanto a contagem do tempo de prisão.
Ambas as teses em presença partem do pressuposto de que a lei penal, substantiva, adjectiva ou complementar, não fixou, por forma expressa, qualquer criterio determinador da forma de efectuar tal contagem. Na verdade, o Codigo Penal limita-se a indicar o momento inicial do cumprimento das penas (artigo 116), os descontos admissiveis quanto a sua duração (artigo 117) e a regra da continuidade no tocante a sua execução (artigo 118) e o Codigo de Processo Penal e a Reforma Prisional (Decreto-Lei n. 26643) apenas aludem ao termo do cumprimento da pena, prescrevendo a forma de efectivar a libertação dos condenados (artigo 636 do primeiro diploma legal e 380 e 381 do segundo) e para alem destes prodromicos elementos nada nos dizem os diplomas legais reguladores do nosso sistema punitivo sobre a forma de contagem do prazo em que se traduz a duração das penas privativas da liberdade de modo a possibilitar a fixação do preciso momento do seu termo.
A omissão notada vem de longe. Verificava-se ja no Codigo Penal de 1852 mas sempre se colmatou entendendo-se que os principios a adoptar para proceder a contagem das penas temporarias são as da computação civil do tempo segundo os principios considerados basicos e estatuidos na legislação que mais directamente lhe era propria: normas do Codigo Civil e do Codigo de Processo Civil.
Como a duração das penas criminais se reporta sempre a anos meses e dias tudo se cifra em determinar como deverão ser definidas estas medidas temporais.
O Codigo Civil de 1867 a proposito da prescrição continha o preceito do artigo 560 (norma a generalizar para o computo civil do tempo - confere Professor Manuel de Andrade - Teoria Geral, pagina 442) e dai resultava que o ano se regulava pelo calendario Gregoriano; o mes era sempre computado em 30 dias e os dias em 24 horas.
Complementarmente regulavam os artigos 78 do Codigo de Processo Civil de 1876, depois substituido pelo artigo 148 do Codigo de Processo Civil de 1939, e, salvas algumas hesitações e divergencias que os registos jurisprudenciais dão conta, da adopção de tais principios tinha resultado um criterio uniforme, atinente a determinar a contagem das penas de prisão e momento final desta.
O actual Codigo Civil chamou a si a completa estatuição dos principios genericos do computo do tempo por isso que pelo Decreto-Lei n. 47690, de 11 de Maio de 1967, foram suprimidos os ns. 1 e 3 do citado artigo 143 do Codigo de Processo Civil e no artigo 296 afirmou, a proposito da contagem dos prazos, que "as regras constantes do artigo 279 são aplicaveis, na falta de disposição especial em contrario, aos prazos e termos fixados por lei, pelos Tribunais ou por qualquer outra autoridade".
Portanto, no pendor da orientação seguida, agora confirmada por esta regra generalizadora, terminada a vigencia do Codigo Civil de 1867 e desaparecidas da lei processual civil as adjuvantes normas da contagem dos prazos, não podemos deixar de recorrer aos principios do artigo 279 para computar a prisão imposta por certo prazo.
Não ha, como razão obstativa, a existencia de qualquer disposição especial em contrario nem principio que se extraia duma impossivel revivescencia da norma do paragrafo 2 do artigo 148 do Codigo de Processo Civil de 1939 por força do paragrafo unico do artigo 1 do Codigo de Processo Penal ou de quaisquer outros preceitos, sendo, ainda, ininvocaveis os preceitos dos artigos 9 do Decreto-Lei n. 35042 e 22 do Decreto n. 35007 (confere Revista de Direito e de Estudos Sociais, ano XVII, paginas 239 e seguintes) por terem sido revogados pelos artigos 337 e 308 do Codigo de Processo Penal na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n. 185/72, de 31 de Maio.
Não ha, pois, razões validas para abandonar a tradicional orientação integradora da lacuna que o legislador, propositadamente ou não propositadamente, deixou por preencher, com socorro aos principios da lei civil, e neste sentido se pronunciaram ja os acordãos deste Supremo Tribunal de Justiça, de 17 de Dezembro de 1969 e de 10 de Março de 1971, publicados no Boletim do Ministerio da Justiça, nos ns. 192, pagina 162, e 205, pagina 147, respectivamente.
Assim e pelas razões expostas acordam os juizes do Supremo Tribunal de Justiça, reunidos em Tribunal Pleno, em decidir o conflito de jurisprudencia versado nos autos mediante a formulação do seguinte assento:
A contagem do tempo de cumprimento da pena de prisão fixado em meses e feita nos termos da alinea c) do artigo 279 do Codigo Civil.
Sem imposto de justiça.

Lisboa, 5 de Dezembro de 1973

Daniel Ferreira (Relator) - Ludovico da Costa - Oliveira Carvalho - Adriano Vera Jardim - Eduardo Correia Guedes - Adriano de Campos de Carvalho - Manuel Jose Fernandes Costa - Jose Antonio Fernandes - João Moura - Falcão Garcia - Eduardo Arala Chaves - Bruto da Costa - Jacinto Rodrigues Bastos - Manuel Arelo Ferreira Manso - Azevedo Soares.