Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
211/18.2PALGS-E.S1
Nº Convencional: 5ª SECÇÃO
Relator: ANTÓNIO CLEMENTE LIMA
Descritores: HABEAS CORPUS
PRISÃO PREVENTIVA
PRAZO DA PRISÃO PREVENTIVA
ABERTURA DE INSTRUÇÃO
REQUERIMENTO DE ABERTURA DE INSTRUÇÃO
INDEFERIMENTO LIMINAR
JULGAMENTO
RECURSO
REVOGAÇÃO
PRINCÍPIO DA IGUALDADE
Data do Acordão: 12/12/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: HABEAS CORPUS
Decisão: DEFERIDO O PEDIDO DE HABEAS CORPUS
Área Temática:
DIREITO PROCESSUAL PENAL – ACTOS PROCESSUAIS / NULIDADES – MEDIDAS DE COACÇÃO E DE GARANTIA PATRIMONIAL / MEDIDAS DE COACÇÃO / REVOGAÇÃO, ALTERAÇÃO E EXTINÇÃO / MODOS DE IMPUGNAÇÃO / HABEAS CORPUS EM VIRTUDE DE PRISÃO ILEGAL – FASES PRELIMINARES / INSTRUÇÃO – JULGAMENTO / ACTOS PRELIMINARES.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO PENAL (CPP): - ARTIGOS 122.º, 215.º, N.ºS 1, ALÍNEAS B) E C) E 2, 222.º, N.º 2, ALÍNEA C), 223.º, N.º 4, ALÍNEA D), 286.º, N.º 1 E 311.º E SEGUINTES.
Sumário :
I - O art. 215.º, do CPP, estabelece os prazos de duração máxima da prisão preventiva por referência à prática de actos que, na fluência do iter processual, confirmando ou reforçando os indícios inicialmente verificados, fazem reverter o processo para uma nova fase, uma fase outra, de maior solidez indiciária e, por tal via, de maior consistência de uma prognose de condenação.

II - No caso, determinado que deve haver lugar à fase de instrução, não chegou a afirmar-se, por uma decisão de pronúncia (com o sentido que lhe confere o n.º 1 do art. 286.º, do CPP), o acto que concede a transição do processo para a fase de julgamento.

III - Daí que (e bem, à luz do disposto no art. 122.º, do CPP) o Tribunal de 1.ª instância tenha invalidado o despacho de saneamento e determinação da audiência (arts. 311.º e ss., do CPP).

IV - O prazo de 10 meses a considerar, por via do disposto no n.º 2 do art. 215.º, do CPP, caducou no dia 07-12-2018, por isso que, à data da formulação do pedido de habeas corpus, a 08-12-2019, a prisão preventiva a que o arguido se encontrava submetido já se extinguira.

V - Assim, mantendo-se para além dos prazos fixados pela lei, em vista do disposto no art. 222.º, n.º 2, al. c), do CPP, a prisão preventiva não pode deixar de considerar-se ilegal, determinando-se a consequente libertação do arguido, nos termos prevenidos na al. d) do n.º 4 do art. 223.º do CPP – sem prejuízo de a respectiva detenção ser requerida à ordem de outro processo.

VI - Em conclusão e síntese: anulado o despacho que indeferiu o requerimento de abertura de instrução e, bem assim, anulada, em sequência, a decisão de saneamento do processo e de determinação da audiência, o prazo de prisão preventiva a considerar deve referenciar-se à al. b), que não à al. c), do n.º 1 do art. 215.º, do CPP.

Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, na 5.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça:




I


1. Nos autos em referência, o arguido, AA, por requerimento de 8 de Dezembro de 2019, deduziu providência de habeas corpus.

Nos seguintes termos:

«AA, arguido nos autos acima identificados, vem, respeitosamente, com fundamento nas disposições conjugadas dos artigos 28.º, n. 4, 31.º, nº 1 e 32.º, n° 1 todos da Constituição da República Portuguesa e dos artigos 215.º, nº 1 al. b) e nº 2, 217.º nº 2 e nºs 1 e 2 alínea c) do artigo 222º, todos do Código de Processo Penal, apresentar junto de V. Exa.

PETIÇÃO de HABEAS CORPUS

O    que faz nos termos e com os seguintes fundamentos

1 - DOS FACTOS

1. No dia 5 de Fevereiro de 2019, o aqui Peticionante foi detido por elementos da PSP de … no âmbito dos autos à margem referenciados.

2. No dia 7 de Fevereiro de 2019 foi presente a 1º interrogatório judicial de arguido detido, e por despacho proferido nesse mesmo dia o Mmº Juiz de instrução Criminai aplicou ao peticionante a medida de coacção de prisão preventiva enquanto suspeito da prática do crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art 21° do DL 15/93, de 22/01.

3. Nessa mesma data foram emitidos os competentes mandados de condução do arguido, aqui peticionante, ao Estabelecimento Prisional …, onde se encontra desde então, ininterruptamente, a aguardar os ulteriores tramites deste processo mediante a medida de coacção de prisão preventiva.

4. No dia 25-07-2019 foi deduzida acusação nos autos;

5. Por requerimento que deu entrada em Juízo em 22-08-2019 o arguido, aqui peticionante, requereu a abertura da fase de instrução nos termos e para os efeitos do artigo 287.º do CPP.

6. Por despacho datado de 04-09-2019, o Mmº Juiz de Instrução Criminal rejeitou o requerimento de abertura de instrução com fundamento em inadmissibilidade legal.

7. Desse despacho o aqui requerente interpôs recurso em 09-10-2019 para o Tribunal da Relação de Évora, pedindo a sua revogação.

8. Por decisão sumária prolatada em 14-11-2019, o Tribunal da Relação de Évora revogou o despacho que rejeitou o requerimento de abertura de instrução e determinou que o mesmo fosse substituído por outro que ordenasse a abertura desta fase processual.

9. Esta decisão do Tribunal da Relação de Évora transitou em julgado no dia 3-12-2019.

10. Encontram-se os autos a aguardar até à presente data (08-12-2019) a decisão instrutória.

II - DO DIREITO

11. Dispõe o nº 1 do artigo 215.º do CPP, que "A prisão preventiva extingue-se quando, desde o seu início, tiverem decorrido:

a)   (...); b) Oito meses sem que, havendo lugar a instrução tenha sido proferida decisão instrutória; c) (…) d) (…)

12. Por seu turno o nº 2 desse preceito legal prescreve que: "os prazos referidos no número anterior são elevados, respectivamente, para 6 meses, 10 meses, 1 ano e 6 meses e 2 anos, em casos de terrorismo, criminalidade violenta ou altamente organizada, ou quando se proceder por crime punível com pena de prisão de máximo superior a 8 anos (...);

13. Como aludido supra, o Peticionante vem indiciado, além do mais, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes previsto e punido pelo artigo 21.º do D.L. 15/93, de 22 de Janeiro, que lei equipara a criminalidade altamente organizada (cfr. al. m) do artigo 1.º do CPP por remissão do artigo 51.º do D. L. nº 15/93, de 22-01).

14. Pelo que ao caso sub judice tem aplicação o prazo prevenido no nº 2 daquela previsão legal, ou seja, o prazo máximo da medida de coacção de prisão preventiva é elevado para 10 (dez) meses até ser prolatada decisão instrutória.

15. Sucede que tal como referido supra o aqui peticionante encontra-se privado da sua liberdade, ininterruptamente, à ordem destes autos desde o dia 5 de Fevereiro de 2019, sendo que o despacho que lhe aplicou a medida de coacção da prisão preventiva data de 07-02-2018,

16. e, até à presente data (08-12-2019), não foi proferida decisão instrutória.

17. Assim, salvo melhor opinião, por força do disposto no artigo 215.º, n.os 1 e 2 do CPP, verifica-se a extinção da medida de coacção aplicada, porquanto o prazo máximo de 10 (dez) meses para a decisão instrutória consagrado na lei, mostra-se ultrapassado.

18. Tendo sido ultrapassado o prazo máximo legalmente previsto no supra aludido preceito legal (v.g. artigo 215.º, nº 2 do C.P.P.) a medida de coacção de prisão preventiva extinguiu-se, ope legis.

19. Pelo que a manutenção do arguido com o estatuto processual de preso preventivo viola esse dispositivo legal, assim como afronta os artigos 28º, nº 4 e 32.º, n.º 1, ambos da CRP.

20. Impondo-se a sua imediata restituição à liberdade, nos termos do disposto nos n.os 1 e 2 do artigo 217.º do Código de Processo Penal.

21. O que vem impetrar junto de V. Exas.

TERMOS EM QUE

Sempre com o mui douto suprimento de V. Exa., requer que seja concedido provimento à presente PETIÇÃO de HABEAS CORPUS, ordenando-se que o arguido seja imediatamente restituído à liberdade, aguardando os ulteriores termos do processo sujeito a medida de coação não privativa da liberdade».

2. O Senhor Juiz do Tribunal de 1.ª instância informou [artigo 223.º n.º 1, do Código de Processo Penal (CPP)] nos seguintes termos:

«a) O arguido AA está sujeito à medida de coacção de prisão preventiva desde o dia 07.02.2019, em execução ininterrupta desde então, aplicada em despacho proferido em sede de primeiro interrogatório judicial de arguido;

b)  Foi deduzida acusação publica em 25.07.2019 contra o arguido e outros, pela pratica em autoria material de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artigo 21.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 15/93, de 22 de Janeiro, com referência às Tabelas I-A e I-B, e mapa anexo à portaria n.° 94/96, de 24 (vinte e quatro) crimes de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3.°, n.°s 1 e 2, do D.L. n.° 2/98, de 03.01, com referência ao artigo 121°, n.° 1, do Código da Estrada, e de 1 (um) crime de falsificação de documento, p. e p. pelo artigo 256.°, n.°s 1, als. e), e f), e 3, do Código Penal;

c)   O arguido AA requereu abertura de instrução em 22.08.2019, pretensão que foi indeferida por despacho de 04.09.2019; O arguido interpôs recurso de despacho de indeferimento para o Tribunal da Relação de Évora em 08.10.2019, recurso que foi admitido, subiu imediatamente, separado e com efeito devolutivo;

d)    A acusação publica foi recebida neste Juízo Central Criminal em 15.10.2019 e foi designada audiência de discussão e julgamento para o dia de hoje, 09.12.2019, tendo sido dada sem efeito no dia 06.12.2019, face ao teor do Douto Acórdão do Tribunal da Relação de Évora proferido a 14.11.2019 (cuja remessa a este Juízo teve lugar a 06.12.2019) a conceder provimento ao recurso interposto e a ordenar a abertura de instrução.

e)   Os pressupostos da prisão preventiva foram reexaminados tempestivamente, sendo o último a 15.10.2019.

Cumpre ainda referir que sobre o esgotamento do prazo de prisão preventiva que é fundamento da presente providencia de habeas corpus, o retorno dos autos a uma fase anterior em virtude da Decisão do Tribunal da Relação de Évora não torna inexistente o facto de os autos já se encontrarem em fase de julgamento, pelo que o prazo máximo de duração da prisão preventiva é, in casu, aquele que resulta do artigo 215°, n.° 1, alínea c) e n.°2, do CPP, ou seja, um ano e seis meses (veja-se neste sentido Acórdão do STJ proferido a 20.09.2018, no processo 3/17.6GASLV desta Instancia Criminal).»

3. Foram ouvidos o Ministério Público e a Defesa, nos termos prevenidos nos n.os 2 e 3 do artigo 223.º, do CPP.



II


4. Consta certificado nestes autos:

a) o arguido foi sujeito à medida de coacção de prisão preventiva por despacho judicial de 7 de Fevereiro de 2019, proferido na sequência de primeiro interrogatório judicial de arguido detido (artigo 141.º, do CPP);

b) a 25 de Julho de 2019, foi deduzida acusação pública, imputando ao arguido a prática de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punível (p. e p.) nos termos do disposto no artigo 21.º n.º 1 e tabelas I-A e I-B, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro (DL 15/93), de vinte e quatro crimes de condução sem habilitação legal, cada um p. e p. nos termos do disposto nos artigos 3.º n.os 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, e 121.º n.º 1, do Código da Estrada, e de um crime de falsificação de documento, este p. e p. nos termos do disposto no artigo 256.º n.os 1 alíneas e) e f), e 3, do Código Penal (CP);

c) por requerimento de 22 de Agosto de 2019, o arguido requereu a abertura da instrução;

d) tal requerimento foi indeferido, por despacho de 4 de Setembro de 2019;

e) a 8 de Outubro de 2019, o arguido interpôs recurso deste despacho para o Tribunal da Relação de Évora, recurso que veio a ser admitido, com subida imediata, em separado e com efeito suspensivo;

f) o processo foi recebido em juízo a 15 de Outubro de 2019, vindo a ser designada data para a audiência de julgamento;

g) por acórdão de 14 de Novembro de 2019 (remetido a juízo a 6 de Dezembro de 2019), o Tribunal da Relação de Évora decidiu conceder provimento ao recurso, ordenando a abertura da instrução;

h) a decisão referida em (g) foi dada sem efeito, por despacho de 6 de Dezembro de 2019, face ao decidido pelo Tribunal da Relação de Évora;

i) os pressupostos da prisão preventiva foram objecto de reexame, designadamente, por despacho de 15 de Outubro de 2019.

5. Nos termos prevenidos nos n.os 1 e 2 do artigo 27.º, da Constituição da República Portuguesa (CRP), sob a epígrafe direito à liberdade e à segurança, (i) «todos têm direito à liberdade e à segurança» e (ii), «ninguém pode ser total ou parcialmente privado da liberdade, a não ser em consequência de sentença judicial condenatória pela prática de acto punido por lei com pena de prisão».

6. O n.º 1 do artigo 31.º, da CRP, epigrafado de habeas corpus, prescreve que «haverá habeas corpus contra o abuso de poder, por virtude de prisão ou detenção ilegal».

7. O n.º 2 do artigo 222.º, do CPP, epigrafado de habeas corpus em virtude de prisão ilegal, determina que, relativamente a pessoa presa (como é o caso), o pedido «deve fundar-se em ilegalidade da prisão proveniente de: a) ser sido efectuada ou ordenada por entidade incompetente; b) ser motivada por facto pelo qual a lei a não permite; ou c) manter-se para além dos prazos fixados pela lei ou por decisão judicial.»

8. A providência de habeas corpus configura incidente que visa assegurar o direito à liberdade constitucionalmente garantido (artigos 27.º n.º 1 e 31.º n.º 1, da CRP), com o sentido de pôr termo, cerce, às situações de prisão ilegal, designadamente motivada por facto pelo qual a lei a não permite ou mantida para além dos prazos fixados na lei ou por decisão judicial [artigo 222.º n.os 1 e 2, alíneas b) a c), do CPP], por isso que apenas pode ser utilizada para impugnar estes precisos casos de prisão ilegal.

9. O habeas corpus, processualmente configurado como uma providência excepcional, não constitui um recurso sobre actos de um processo, designadamente sobre actos através dos quais é ordenada e mantida a privação de liberdade do arguido, nem um sucedâneo dos recursos admissíveis, estes sim, os meios ordinários e adequados de impugnação das decisões judiciais.

10. A providência de habeas corpus não comporta decisão sobre a regularidade de actos processuais com dimensão e sequelas processuais específicas, não configura um sobre-recurso de actos processuais, valendo apenas no sentido de determinar se, para além de tais dimensão e sequelas, os actos processuais levados no processo produzem consequência que possa acolher-se na previsão do citado n.º 2 do artigo 222.º, do CPP.

11. Importa reter que, na contagem do prazo da prisão preventiva, deve atender-se ao despacho que a aplicou e não a data da prévia detenção do arguido – a lei atende ao prazo máximo da duração da medida de coação e não ao tempo global da privação da liberdade.

12. Na arquitetura traçada pela Constituição da República e na conformação normativa do CPP, a providência em apreço pressupõe a efetividade e atualidade da prisão ilegal.

13. No caso, o requerente pretexta que o prazo de duração máxima da prisão preventiva (iniciada a 7 de Fevereiro de 2019) se extinguiu passados 10 meses (a 7 de Dezembro de 2019).

Vejamos.

14. Face ao disposto no artigo 215.º n.os 1 alínea b), e 2, e no artigo 1.º alínea m), ambos do CPP, «a prisão preventiva extingue-se quando, desde o seu início, tiverem decorrido dez meses sem que, havendo lugar a instrução, tenha sido proferida decisão instrutória».

15. No caso, havendo lugar a instrução, por força da decisão do Tribunal da Relação de Évora acima referenciada, correram já mais de dez meses (7 de Fevereiro a 7 de Dezembro de 2019) sobre a data em que a prisão preventiva foi decretada.

16. O facto de o processo «ter estado já na fase de julgamento» não pode relevar-se, na medida em que a decisão judicial que determinou tal sequência processual (de não admissão da instrução) foi anulada adrede, pelo Tribunal da Relação, não podendo os actos sequentes ser aproveitados, designadamente em desfavor do arguido, desde logo em vista do disposto nos artigos 18.º n.º 2, 28.º n.os 3 e 4, e 32.º n.º 2, da Constituição da República Portuguesa (CRP).

17. A prisão preventiva só pode ser aplicada, designadamente, quando se constatem fortes indícios de que o arguido praticou crime doloso, punível com pena de prisão de máximo superior a 5 anos, ou que corresponda a criminalidade violenta – artigo 27.º n.os 2 e 3, da CRP, e artigo 202.º n.º 1 alíneas a) a e), do CPP.

18. As medidas de coacção são imediatamente revogadas, designadamente, sempre que tenham deixado de subsistir as circunstâncias que justificaram a sua aplicação – artigo 212.º n.º 1 alínea b), do CPP.

19. O artigo 215.º, do CPP, estabelece os prazos de duração máxima da prisão preventiva por referência à prática de actos que, na fluência do iter processual, confirmando ou reforçando os indícios inicialmente verificados, fazem reverter o processo para uma nova fase, uma fase outra, de maior solidez indiciária e, por tal via, de maior consistência de uma prognose de condenação.

20. No caso, determinado que deve haver lugar à fase de instrução, não chegou a afirmar-se, por uma decisão de pronúncia (com o sentido que lhe confere o n.º 1 do artigo 286.º, do CPP), o acto que concede a transição do processo para a fase de julgamento.

21. Daí que (e bem, à luz do disposto no artigo 122.º, do CPP) o Tribunal de 1.ª instância tenha invalidado o despacho de saneamento e determinação da audiência (artigos 311.º e ss., do CPP).

22. O prazo de 10 meses a considerar, por via do disposto no n.º 2 do artigo 215.º, do CPP, caducou no dia 7 de Dezembro de 2018, por isso que, à data da formulação do pedido de habeas corpus, a 8 de Dezembro de 2019, a prisão preventiva a que o arguido se encontrava submetido já se extinguira.

23. Assim, mantendo-se para além dos prazos fixados pela lei, em vista do disposto no artigo 222.º n.º 2 alínea c), do CPP, a prisão preventiva não pode deixar de considerar-se ilegal, determinando-se a consequente libertação do arguido, nos termos prevenidos na alínea d) do n.º 4 do artigo 223.º, do CPP – sem prejuízo de a respectiva detenção ser requerida à ordem de outro processo.

24. Em face do deferimento do pedido, não cabe tributação.

25. Em conclusão e síntese: anulado o despacho que indeferiu o requerimento de abertura de instrução e, bem assim, anulada, em sequência, a decisão de saneamento do processo e de determinação da audiência, o prazo de prisão preventiva a considerar deve referenciar-se à alínea b), que não à alínea c), do n.º 1 do artigo 215.º, do CPP.



III


26. Nestes termos e com tais fundamentos, decide-se deferir o pedido de habeas corpus formulado pelo requerente, AA, determinando-se a sua imediata restituição à liberdade.

Sem custas.

Passem-se os devidos mandados de libertação.

Informem-se, de imediato e pelo meio mais expedito, o Tribunal de 1.ª instância, o Tribunal da Relação de Évora e o Estabelecimento Prisional em que o arguido se encontra recluído.


Lisboa, 12 de Dezembro de 2019


António Clemente Lima (Relator)

Margarida Blasco

Manuel Joaquim Braz