Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
134/20.5PDAMD.L1.S1
Nº Convencional: 5.ª SECÇÃO
Relator: CID GERALDO
Descritores: RECURSO DE ACÓRDÃO DA RELAÇÃO
HOMICÍDIO
IN DUBIO PRO REO
INCONSTITUCIONALIDADE
MEDIDA CONCRETA DA PENA
Data do Acordão: 03/24/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO.
Sumário :
I - Nos termos do art. 400.º, n.º 1, al. f), do CPP não é admissível recurso de acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelas Relações, que confirmem decisão de 1.ª instância e apliquem pena de prisão não superior a 8 anos, isto é, se ocorrer uma situação de dupla conforme. De acordo com a alínea e) do mesmo preceito também não é admissível recurso de acórdãos proferidos, em recurso, pelas Relações que apliquem pena de prisão não superior a 5 anos. Por sua vez, o art. 432.º, do CPP estabelece que se recorre para este tribunal de decisões que não sejam irrecorríveis proferidas pelas Relações, em recurso, nos termos do art. 400.º.
II - Os poderes de cognição do STJ estão, assim, delimitados negativamente pela medida das penas aplicadas ou confirmadas pelo tribunal da Relação. Da conjugação das citadas disposições resulta, como tem sido sublinhado pela jurisprudência deste Tribunal, que só é admissível recurso de acórdãos das Relações que apliquem penas superiores a 8 anos de prisão ou penas superiores a 5 anos e não superiores a 8 anos em caso de não confirmação da decisão da 1.ª instância.
III - O descrito regime de recursos para o STJ efectiva, de forma adequada, a garantia do duplo grau de jurisdição, traduzida no direito de reapreciação da questão por um tribunal superior, quer quanto a matéria de facto, quer quanto a matéria de direito, consagrada no art. 32.º, n.º 1, da CRP.
IV - Garantido o duplo grau de jurisdição em matéria de facto e em matéria de direito, têm, assim, os sujeitos processuais à sua disposição duas vias possíveis de exercer o seu direito ao recurso. Querendo impugnar a decisão em matéria de facto – ou querendo arguir os vícios da decisão a que se refere o art. 410.º, do CPP (como se tem sublinhado na jurisprudência constante do STJ – cfr., por todos, o acórdão de 2.10.2014, no Proc. 89/12.3SGLSB.L1.S1, em www.dgsi.pt) – e em matéria de direito, devem estes utilizar a via de recurso para o tribunal da Relação (art. 428.º, do CPP), qualquer que seja a pena aplicada.
V - Porém, limitando (art. 403.º, do CPP) o recurso a matéria de direito, a lei impõe-lhes caminhos distintos, consoante a pena aplicada: se a pena não exceder 5 anos de prisão, o conhecimento do recurso é da competência do tribunal da Relação (art. 427.º, do CPP); se a pena for superior a 5 anos (incluindo a pena parcelar e a pena conjunta, em caso de concurso de crimes), tal competência pertence ao STJ (arts. 432.º e 434.º, do CPP)
VI - Em caso de recurso para o tribunal da Relação, é ainda possível o recurso da decisão da Relação para o STJ, limitado a questões de direito (arts. 432.º e 434.º), nos termos anteriormente referidos. A limitação do recurso ao reexame da matéria de direito não impede este Tribunal de conhecer oficiosamente dos vícios da decisão recorrida a que se refere o n.º 2, do art. 410.º, do CPP – insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão e erro notório na apreciação da prova –, se eles resultarem do texto da decisão recorrida, por si só ou em conjugação com as regras da experiência, e se a sua sanação se revelar necessária à boa aplicação do direito, como este Tribunal vem afirmando em jurisprudência constante .
VII - A alegada violação da livre apreciação da prova, do in dubio pro reo, é suscitada “no âmbito da matéria de facto”, pelo que a sua sindicância apenas cabe ao STJ na estrita medida da sua análise a partir do texto da decisão recorrida; não cabe ao STJ analisar se a matéria de facto foi ou não bem decidida, ou se a prova foi bem ou mal analisada, na medida em que tais análises implicam poderes de cognição em matéria de facto o que está para além dos poderes de cognição do STJ em matéria de recursos; porém, nada obsta a que a partir do texto se verifique se se evidencia alguma violação daquele princípio “se, da decisão resultar que o tribunal recorrido ficou na dúvida em relação a qualquer facto e que, perante esse estado de dúvida, decidiu contra o arguido”.
VIII - Resulta, também, dos autos que o recorrente questiona a inconstitucionalidade da norma do art. 127.º, do CPP - norma segundo a qual “salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente” -, com o sentido de permitir interpretações subjetivas da prova produzida.
IX - O princípio da livre apreciação da prova consagrado naquele normativo impõe desde logo que a mesma seja fundamentada segundo as regras da experiência e que assente num juízo lógico, preciso. No domínio da livre apreciação da prova, para além dos limites constitucionais e legais, resultantes do grau de convicção requerido para a decisão, da proibição dos meios de prova, e da observância dos princípios da presunção de inocência e in dubio pro reo, não se impõe ao julgador outra limitação que não seja a resultante das regras da lógica e da razão, das máximas da experiência, e dos conhecimentos técnico-científicos, os quais reclamam uma «motivação clara, suficiente, objetiva e comunicacional». Como refere o TC no acórdão n.º 1165/96 (Diário da República II série, de 6 de fevereiro de 1997) «o julgador, ao apreciar livremente a prova, ao procurar através dela atingir a verdade material, deve observância a regras da experiência comum utilizando como método de avaliação e aquisição do conhecimento critérios objectivos, genericamente susceptíveis de motivação e controlo» ( in CPP comentado, Almedina, Coimbra, 3.ª Edição, Coimbra, 2021, anotação 3 ao art. 127.º, p. 421).
X. Neste quadro, a alegação pelo recorrente de que se verifica a inconstitucionalidade da norma do art. 127.º do CPP, por violação do disposto nos arts. 2.º, 20.º, n.º 4, 23.º, n.º 3, 32.º, n.º 1 da CRP e ainda do art. 6.º da CEDH, quando o acórdão do tribunal da Relação de Lisboa, mantendo tudo o que acórdão do tribunal 1.ª instância decidiu, fez um salto lógico em violação do princípio da proibição da inocência e, nessa conformidade, o recorrente deveria ter sido absolvido, por falta absoluta de provas, não tem qualquer acolhimento. Com efeito, a norma impugnada não foi aplicada com esse sentido. E não foi aplicada com o referido sentido, desde logo porque na decisão recorrida foi feita uma apreciação crítica e conjugada de toda a prova produzida, tendo sido justificados de forma fundamentada os factos provados, sendo descabido afirmar-se que a interpretação que o tribunal recorrido fez do art. 127.º, do CPP viola o art. 2.º, 20.º, n.º 4, 23.º, n.º 3, 32.º, n.º 1, da CRP e ainda do art. 6.º da CEDH.
XI. Na determinação da medida da pena foram levados em conta os seguintes factores relevantes (art. 71.º, do CP): o dolo directo e intenso, pois o acto em questão, cometido quando a vítima já se deslocava no sentido descendente da rua, em direcção à sua residência, oposta àquela onde o conflito se iniciara, pelos órgãos corporais atingidos/trespassados, denota considerável violência; o grau de ilicitude que é mediano atento o contexto em que ocorreram os factos, originados em discussão por questões de trânsito, em que a iniciativa da agressão física partiu da própria vítima, pelo menos por duas vezes, contra os dois demais arguidos; as elevadas as necessidades de prevenção geral e especial, tendo em consideração as condenações que, não obstante a sua jovem idade, o arguido já regista, designadamente uma pela prática de um crime roubo, pela violência contra pessoas que é inerente a tal crime; e a falta de confissão e de arrependimento do recorrente. A seu favor, contabilizou o acórdão recorrido, contrariamente ao que alega o recorrente, as suas circunstâncias de vida, nomeadamente as condições socioeconómicas, boa inserção social, familiar e profissional, que nada têm de excecional, isto é, de reduzido valor atenuativo, por ser a conduta exigida a todo e qualquer cidadão como modo de poder viver em sociedade, não superando o comportamento do homem comum do seu seio socioeconómico, a sua idade, o contexto em que ocorreram os factos, incluindo o facto da iniciativa da agressão ter partido da vítima relativamente a duas outras pessoas presentes.
XII. Tendo em consideração todos estes parâmetros, bem como a moldura penal abstracta com o limite mínimo de 8 anos, e o limite máximo de 16, o que se constata é que a pena concreta fixada de 12 anos e 6 meses de prisão, situada ligeiramente acima do respectivo limite abstracto médio, se mostra justa, correta e adequadamente fixada, pois a sua redução, além de não ser justificada ao nível da prevenção especial mormente por qualquer circunstância com destaque ao nível da sua condição social ou outra que pudesse ser tida como factor atenuativo criaria relativamente a factos semelhantes uma aberrante ideia de impunidade. Em comportamentos com este nível de violência e com estas desastrosas consequências, a efectiva aplicação de uma pena, a demonstrar que apesar da violação das normas estas se mantém em vigor, é necessária para se demonstrar que comportamentos como os praticados constituem um sério atentado à comunidade em que vivemos e ao Estado de Direito em que nos inserimos.
Decisão Texto Integral:





 Proc.º nº 134/20.5PDAMD.L1.S1

 

Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça

I. RELATÓRIO

Por acórdão proferido em 06/07/2021, do Juízo Central Criminal ..., foi o arguido AA, condenado como autor material de um crime de homicídio, p. e p. pelo artigo 131º do Código Penal, na pena de 12 (doze) anos e 6 (seis) meses de prisão.

Foi, ainda, julgado parcialmente procedente o pedido de indemnização civil formulado por BB, por si e em representação do seu filho de menor idade CC, e a que se associou o menor DD, representado pela sua mãe EE e, em consequência, condenado o arguido/demandado AA no pagamento a esses demandantes e ao interveniente da quantia de 80.000,00 € (oitenta mil euros), acrescida de juros, vencidos desde 6-7-2021, à taxa legal (actualmente de 4%/ano).

*

Não se conformando com o acórdão, o arguido interpôs recurso da referida decisão, alegando falta de fundamentação da matéria de facto; nulidade da decisão recorrida, por excesso de pronúncia; impugnação da matéria de facto; insuficiência para a decisão da matéria de facto provada; inconstitucionalidade do art.º 127º do CPP e medida da pena.

*

A Exm.ª Magistrada do MP e a Assistente BB responderam ao recurso, concluindo pela improcedência do mesmo, devendo manter-se na íntegra a decisão recorrida.

*

Remetido o processo ao Tribunal da Relação, na vista a que se refere o art. 416º do CPP, o Exmo. Sr. Procurador da República, emitiu parecer no sentido de que o recurso deve ser julgado improcedente.

*

Por douto acórdão proferido em 22 de Novembro de 2021, pela ... Secção do Tribunal da Relação ..., foi negado provimento ao recurso interposto pelo arguido AA, confirmando, na íntegra, o acórdão recorrido.

*

Desse acórdão interpôs recurso para o STJ o arguido AA.  

Da motivação do recurso, retira o recorrente as seguintes conclusões:

 I – O arguido foi condenado a 12 anos e 6 meses de prisão pela prática de um crime de homicídio, p e p. no art. 131º, do C.P.

II – O recorrente sempre se declarou inocente, colaborou com a justiça e sempre prestou declarações sobre os factos, das muitas pessoas existentes no local à data e hora dos factos e algumas delas ouvidas como testemunhas, nenhuma imputou tal factualidade ao aqui recorrente, nem se provou que detivesse qualquer arma/faca, e nada lhe foi apreendido que o relacione com o crime em questão, nem os exames periciais realizados revelam provas que o arguido o tenha feito. – A única excepção é a Assistente e testemunha BB!

III - Mais uma vez, e ao contrário do que vem vertido no douto acórdão da relação que deu credibilidade ao testemunho de BB, assistente nos autos, a única interessada no desfecho deste processo, pessoa que não tinha boas relação como arguido, por causa de um namoro antigo com o irmão do arguido, um depoimento até contraditório, a única “Iluminada” que tem a visão de ver uma facada desferida pelo arguido e as outras pessoas que estavam no local não viram!

IV – Ficou provado que FF provocou as pessoas no Bairro, quase que atropelava uma criança e chegou a bater com o espelho do carro no GG com a sua condução perigosa e não aceitou a chamada de atenção, não era humilde, antes porém era agressivo, teimoso e rancoroso, e foi a casa de propósito munir-se de uma faca como o arguido refere nas suas declarações

V – Apesar da reiterada negação da prática dos factos pelo arguido AA, e dos exames periciais não terem confirmado quaisquer vestígio o relacione com a prática do crime de homicídio e ainda de não ter nada apreendido o pudesse relacionar com os factos em apreço, quer roupa quer armas ou facas, nomeadamente a descrita pela testemunha!

VI – Apesar do douto acórdão do Tribunal da Relação ... ter manido nesta parte tudo o que o douto acórdão do Tribunal da Primeira Instância decidiu, mais uma vez o Recorrente, reitera, com o devido respeito que é - como sempre – muito e bem devido por diversa ou mais sapiente interpretação- deve dizer-se que colhe aqui a douta expressão utilizada num singular aresto proferido pelo STJ em que se acentua que (e passa-se a citar): “um salto lógico em violação do princípio da proibição da inocência” Ac. Do STJ de 9.11.1994 in BMJ 441- 36.

VII - Nessa conformidade, o recorrente deveria ter sido absolvido, por falta absoluta de provas. Mais uma vez estamos perante uma Inconstitucionalidade material do apontado preceito legal, - o art.º 127.º do CPP - encontra-se ferido de inconstitucionalidade material por violação do disposto nos art.º 2.º, 20.º n.º 4, 23.ºn.º 3, 32º, n.º 1 da CRP e ainda do art.º 6.º da C.E.D.H.

VIII - Nos termos do disposto nos supramencionados artigos da nossa Lei Penal Adjectiva, não vai por isso este recurso limitado à questão de se saber se o acórdão enferma ou não de nulidades processuais ou de algum dos vícios contemplados no art.º 410.º do CPP que imporiam (como impõem, na óptica da recorrente a absolvição do arguido mas essencialmente (embora sem conceder), - se o mesmo recorrido acórdão fez a melhor ou a mais curial aplicação do direito aos factos assentes, “maxime” se a severa pena de prisão encontrada para a punição do recorrente foi a mais adequada ao caso concreto e respeitou os ditames consignados no art.º 18.º n.º 2 da C.R.P (princípios da necessidade, proibição do excesso ou proporcionalidade das penas), sendo a adequada e proporcional à defesa do ordenamento jurídico e da medida da culpa, uma vez que, no limite interpretativo e sempre sem conceder, a escassíssima prova indiciária constante dos autos em sede de inquérito “maxime” um depoimento de uma testemunha com contradições e incoerências e que em sede de julgamento foi contraditada pelas restantes testemunhas e em particular pela declarações do arguido.

IX - Mais ficou provado que o arguido é uma pessoa calma, trabalhador, pacífica, nada temendo e porque não foi o autor da facada manteve-se no local de forma pacífica e ordeira viu a polícia…, nunca fugiu e sempre prestou esclarecimentos sobre os factos.

X - É primário quanto á pratica do ilícito criminal em apreço e tens perspectivas de vida futura, que será voltar a viver com a mãe criar o seu filho e trabalhar.

XI - Discordamos que haja fortes necessidades de prevenção geral, pois, o recorrente é conhecido como sendo uma pessoa de bem, é jovem, trabalhador apesar de situação precária a que vivia.

XII - Quando se fala na prevenção especial não podemos de deixar de ter em conta o vector da socialização, pedra angular, estamos perante um arguido totalmente inserido na sociedade, onde trabalha, tem casa e família.

XIII – Por mero dever de patrocínio, caso, se entenda pela sua condenação, justifica-se, sem dúvida, uma diminuição da pena a que o arguido veio a ser condenado, uma vez que, a pena de 12 (doze) anos e 6 (seis) meses de prisão se mostra manifestamente exagerada, desproporcional e desadequada, atendendo ao preceituado legal quanto à função repressiva e preventiva das penas de privação de liberdade e tendo em consideração a previsão do art. 131º do C.P. a moldura penal situa-se entre os 8 anos e os 16 anos, atento a tudo o que se exposto entende-se que deverá ser aplicada ao arguido uma pena que se situe no limite mínimo.

XIV - Parece-nos que houve uma notória violação da medida da pena aplicada ultrapassado em muito a medida da culpa concreta do arguido face aos factos dados como provados, tendo ainda, o acórdão em crise violado disposto nos artigos 40º, n.º 2 e 71, n.º 1 al. a), do Cód Penal;

XV - Acresce o facto de, os fins de prevenção geral atendidos no douto acórdão ora em crise ultrapassam a medida da culpa do recorrente, a qual deve ser o primeiro e último limite na determinação da pena concreta a aplicar, bem como, descurou os fins de prevenção especial expressos na necessidade de reintegração do arguido encarado na vertente humana e social.

Termos em que, e pelo mais que V. Ex.as mui doutamente suprirão, deve ser concedido provimento ao presente recurso: deverá o arguido ser absolvido do crime de homicídio que foi condenado, caso assim não se entenda, deverá a sua pena ser diminuída e situar-se no limite da mesma que se afigure justa e proporcional à sua culpa, ao grau de ilicitude dos factos.

*

A Procuradora-Geral Adjunta no Tribunal da Relação respondeu ao recurso interposto, concluindo:

1- O vício da sentença, previsto no art.° 410°, n.º 2, al. a) do Código de Processo Penal, da insuficiência da matéria de facto não pode ser confundido com a divergência entre a convicção que o recorrente formou e a convicção que o tribunal formou sobre os factos, com respeito pelo princípio da livre apreciação da prova, nos termos do disposto no art.° 127° do CPP e sem violar qualquer regra da experiência comum;

2- É esta desconformidade entre a convicção do recorrente e do tribunal, com a qual não se conforma, que o recorrente fundamenta o que invoca constituir o vício da sentença previsto no art.° 410°, n.º 1, al. a) do CPP.

3- Na sentença foi feita uma apreciação crítica e conjugada de toda a prova produzida, tendo os factos provados sido fundamentados;

4- O princípio da livre apreciação da prova obriga o julgador a respeitar os princípios em que se consubstancia o direito probatório e as normas da experiência comum, da lógica e das regras de natureza científica;

5- A pena aplicada respeita os critérios fixados no art.° 71° do C. Penal, face à culpa do agente, às exigências de prevenção geral e especial que se justificam, sendo justa, adequada e proporcional.

Negando provimento ao recurso e mantendo o decidido, nos seus precisos termos, farão V. Excelências, aliás como sempre, JUSTIÇA!

*

Neste Tribunal a Exmª Procuradora-Geral Adjunta emitiu Parecer, no sentido de que será de improceder o recurso em análise, mantendo-se a decisão recorrida.   

*

Notificados os recorrentes nos termos do art. 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, nada vieram responder.

*

Colhidos os vistos, e uma vez que não foi requerida audiência, o processo foi presente à conferência para decisão.

*

II. FUNDAMENTAÇÃO

II. 1. 1. O tribunal da Relação manteve inalterados os seguintes factos dados como provados no acórdão de 1.ª instância, que assim se mostram fixados (transcrição):

Da relevante para a discussão da causa, resultou provada a seguinte matéria de facto:

1. Em 15-2-2020, cerca das 21H20, FF, com a idade de 26 anos, circulava pela Rua ..., Bairro ..., ..., conduzindo um veículo automóvel, tendo passado junto ao estabelecimento ali existente conhecido como “Café ...”, próximo da porta do qual se encontravam algumas pessoas, de entre elas os arguidos AA e GG.

2. Considerando que a velocidade a que FF conduzia o veículo era desadequada para aquele local, porque supostamente perigosa para pessoas que por ali circulavam, o arguido AA dirigiu-lhe palavras, de teor não apurado, que deram causa a que FF parasse o veículo, saísse do mesmo e encetasse uma discussão, designadamente com o arguido AA.

3. HH, que então explorava o referido “Café ...”, interveio, juntamente com outras pessoas que ali se encontravam, para pôr fim à discussão, tendo afastado FF, que se dirigiu para o seu veículo automóvel, no qual entrou.

4. FF fez o veículo descer a Rua alguns metros, encostou- o/estacionou-o, voltou a sair do mesmo e a dirigir-se a pessoas que ali se encontravam, discutindo com estas, tendo-se então envolvido fisicamente com o arguido GG, desferindo-lhe socos, óculos deste arguido que se quebraram nessa contenda.

5. Pessoas ali presentes separam-nos, tenho FF se dirigido para a sua residência, situada na mesma Rua, no sentido descendente, a algumas dezenas de metros.

6. FF entrou na sua habitação, manifestando irritação, tendo saído logo depois, no que foi seguido pela sua mulher, BB, que tentava acalmá-lo.

7. FF caminhou no sentido ascendente da Rua, onde se encontrava designadamente o arguido II, com quem se envolveu fisicamente, tendo derrubado ao solo este arguido, ficando sobre ele, no que foram separados por BB e por um indivíduo de identidade não apurada que também ali se encontrava.

8. Após ter sido separado do arguido II, FF foi descendo a Rua, juntamente com BB, em direcção à residência de ambos, encontrando-se a cerca de 2 metros da mesma quando se aproximou, pela sua frente, o arguido AA, que, empunhando uma faca, espetou a respectiva lâmina no peito de FF, tendo de seguida se afastado desse local, enquanto FF caminhou um pouco e acabou por cair ao solo, sendo posteriormente transportado para o Hospital ..., onde deu entrada pelas 23H15, já cadáver.

9. A facada que o arguido AA desferiu em FF atingiu o corpo deste com trajecto da frente para trás, da esquerda para a direita e grosseiramente horizontalizado, tendo-lhe causado ferida corto-perfurante no quadrante supero-interno da mama esquerda, oblíqua ínfero-lateralmente, com 1,6X1cm de maiores dimensões, com soluções de continuidade no 4º espaço intercostal anterior esquerdo, na face anterior esquerda do pericárdio, na face ântero-superior do coração, com cerca de 1 cm de comprimento, com penetração na cavidade ventricular esquerda e na face anterior do lobo superior do pulmão esquerdo, ao nível da língula, vertical, com 0,7 cm de comprimento, lesões traumáticas cardíacas que foram causa da morte de FF.

10. O arguido AA agiu de forma livre, deliberada e consciente, com o propósito de tirar a vida a FF, o que representou e quis, bem sabendo que a sua conduta era proibida criminalmente.

- da determinação da sanção -

11. Ao tempo dos factos o agregado familiar do arguido AA era composto por ele e pela sua mãe, habitando casa arrendada, pela contraprestação mensal de 350,00 €.

12. A sua mãe encontra-se desempregada.

13. O arguido AA tem como habilitações literárias o 9º ano de escolaridade.

14. Esporadicamente, trabalhou como ....

15. Tem seis irmãos, dos quais pelo menos três a residirem em ..., só tendo contacto com um dos irmãos, residente em Portugal, com a idade de 25 ou de 26 anos.

16. Tem um filho, com a idade de 3 anos, que habita no Bairro ..., com a avó materna, cuja respectiva mãe se encontra actualmente a residir em ....

17. No Estabelecimento Prisional, onde se encontra desde Fevereiro de 2020, recebe visitas, com periodicidade semanal, da sua mãe, do seu irmão e da companheira do seu irmão.

18. No processo nº 206/15...., por factos de 18-3-2015 e sentença de 15-6-2016, transitada em julgado em 15-7-2016, pela prática de um crime de roubo, foi condenado na pena de 1 ano de prisão, suspensa na sua execução, com regime de prova, pena que foi declarada extinta por despacho de 24-5-2018 e efeitos a 15-7-2017, com fundamento no artigo 57º, nº 1 do Código Penal.

19. No processo nº 107/16...., por factos de 2016 e sentença de 24-3-2017, transitada em julgado em 2-5-2017, pela prática de um crime de tráfico de menor gravidade, foi condenado na pena de 1 ano e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução, com regime de prova, pena que foi declarada extinta por despacho de 27-2-2020 e efeitos a 2-11-2019, com fundamento no artigo 57º, nº 1 do Código Penal.

- do pedido de indemnização civil -

20. A assistente/demandante BB e FF casaram um com o outro, em 14-7-2017, na Conservatória do Registo Civil ..., ..., casamento que foi dissolvido pela morte do marido em 15-2-2020.

21. CC, nascido a .../.../2019, é filho de FF e de BB e reside com a mãe.

22. DD, nascido a .../.../2016, é filho de FF e de EE e reside em ..., aparentemente com uma tia.

23. JJ, nascida a .../.../2017, é filha de KK e de BB e reside com a mãe.

24. A assistente/demandante aufere cerca de 650,00 € mensais da sua actividade profissional.

25. Recebe mais cerca de 320,00 € mensais a título de subsídio social relativo às suas duas filhas, as quais frequentam uma “creche”, em que despende mensalmente 179,00 €.

26. Habita casa arrendada, pela contraprestação mensal de 250,00 €.

27. O falecido FF integrava o agregado familiar da assistente/demandante, exercendo actividade profissional de ..., no que auferia cerca de 750,00 € mensais.

2.2.Matéria de facto não provada

Da relevante para a discussão da causa, não resultou provada a seguinte matéria de facto:

1. Que, sem prejuízo da factualidade provada, “no dia 15-02-2020, cerca das 21:20, na Rua ..., ..., FF conduzia o veículo automóvel e, por motivos não concretamente apurados, os arguidos, que ali se encontravam, colocaram-se à frente e de ambos os lados da viatura do ofendido, impedindo o mesmo de andar”.

2. Que, sem prejuízo da factualidade provada, “no exterior do carro os arguidos iniciaram uma discussão com o ofendido, ao que uma HH, que explora o estabelecimento denominado “Café ...” interveio, visto os arguidos serem membros de um grupo organizado, denominado “Grupo ...”, puxando o ofendido para o interior de sua casa, sita na mesma r..., ...”.

3. Que “passados alguns minutos o ofendido saiu de casa de modo a ir buscar o seu veículo”.

4. Que, sem prejuízo da factualidade provada, “ao aproximar-se do veículo o arguido GG abeirou-se do ofendido e, de modo não concretamente apurado, bateu no corpo do mesmo, e por o ofendido ter resistido os arguidos II e AA de igual modo bateram no corpo do ofendido, de modo não concretamente apurado”.

5. Que “o arguido II de imediato aproximou-se do arguido AA e do ofendido e quando a companheira do ofendido lhe disse “cobarde” o mesmo sorriu”.

6. Que, sem prejuízo da factualidade provada, “mais agiram os arguidos II e GG em união de esforços com o arguido AA, nomeadamente ao agredir de forma concertada o ofendido e causando perigo para a vida do mesmo, tal como veio a suceder, bem sabendo que pertenciam ao mesmo grupo e que qualquer resistência por parte de terceiros iria ser retaliada, com recurso a armas, provocando a morte do ofendido, resultado que quiseram e com o qual se conformaram”.

- do pedido de indemnização civil -

7. Que, “até à presente data, os arguidos, por si próprios ou por interpostas pessoas, vão até à janela e porta da casa da demandante prostrar, sorrir e ameaçar por via de gestos e palavras”.

8. Que “por temer pela vida da filha, que assistiu à morte do pai e foi vista pelos homicidas, a demandante tonou a difícil decisão de a enviar para a ..., onde reside, por ora, com uma tia”.

9. Que, para DD, “todos os meses era enviada, pelo ofendido, uma ajuda monetária, que a demandante fez questão de continuar a remeter”. …”.

*

II. 1. 2. Quanto á motivação da decisão sobre a matéria de facto, decidiu o acórdão recorrido do seguinte modo:

Como dissemos, o art.º 374º/2 do CPP determina que, na sentença, ao relatório se segue a fundamentação que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal.

A redacção deste preceito inculca a ideia, que a obediência a regras de bom senso, clareza e precisão apoiam, de que a fundamentação da decisão se repartirá pela enumeração dos factos provados, depois dos não provados e, seguidamente, pela exposição dos motivos de facto e de direito que fundamentam a decisão com o exame crítico das provas.

Necessário e imprescindível é que o tribunal indique os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência se possa controlar a razoabilidade da convicção sobre o julgamento do facto provado ou não provado.

No cumprimento desse dever, o tribunal recorrido fundamentou a sua decisão de facto, para além do mais, da seguinte forma:

“… A prova da factualidade relativa à discussão inicial entre o arguido AA e o ora falecido FF, que deu causa a que este parasse o veículo que conduzia e dele saísse, assentou nas declarações do arguido AA, nesse sentido e, essencialmente, no depoimento de HH, que então explorava o “Café ...” e que revelou conhecimento dessa factualidade, assim como da subsequente, correspondente à reentrada de FF no seu veículo, tê-lo estacionado e voltado a sair, para prosseguir a discussão e se ter envolvido fisicamente com o arguido GG, cujos óculos se quebraram nessa contenda, até populares terem voltado a pôr termo à discussão e FF se ter afastado, no sentido descendente dessa Rua, em direcção à sua residência, testemunha HH que, sem prejuízo de em termos de amizade se situar mais próximo dos arguidos do que do ora falecido, prestou depoimento globalmente merecedor de credibilidade, pelo menos no que se refere ao teor positivo do mesmo ou seja nos aspectos de que a testemunha revelou conhecimento directo, por ter visualizado o que descreveu.

Quanto ao confronto físico do ora falecido com o arguido GG, no sentido do depoimento de HH, o depoimento de LL, embora amigo dos arguidos e manifestando evidente falta de isenção, e o depoimento de MM, que referiu que esse confronto sucedeu e que foi uma das pessoas que interveio para pôr fim ao mesmo, após o que acompanhou o ora falecido até à sua residência, onde ele entrou e voltou a sair, seguido pela sua mulher, tendo aquela pegado no filho dele ao colo e permanecido na residência, só o voltando a ver quando ele já se encontrava ferido no peito, depoimento de MM que mereceu credibilidade e que não foi infirmado nalgum aspecto essencial por outro meio de prova que tivesse sido produzido.

A prova da factualidade subsequente, além da documentação infra referida, assentou fundamentalmente nas declarações da assistente/demandante, ora viúva de FF, que se referiu ao facto de este ter entrado na sua residência com a “cabeça quente” e de ter saído logo, seguido por ela, tendo-se envolvido fisicamente com o arguido II, estando em cima deste quando ela e um indivíduo que ali se encontrava os separaram, após o que se dirigia com ele no sentido descendente da Rua, estando o seu marido junto a um poste de electricidade ali existente, quando se aproximou o arguido AA, que trocou palavras com o seu marido e que, empunhando uma faca, que levantou a altura superior à do ombro (conforme descreveu gestualmente) espetou-a no peito do seu marido, faca que BB referiu que viu bem e que descreveu, indicando gestualmente o comprimento da lâmina, de cerca de 15 - 20 cm, que estava ao lado do seu marido e que quando viu “o AA” a levantar a faca tentou segurá-lo para não dar a facada, mas sem sucesso e que depois chegou um amigo do arguido AA que o interpelou acerca do sucedido, tendo-se depois afastado, amigo cujo nome disse não conhecer, e que depois o seu marido caminhou mais um pouco e caiu, tendo sido chamada a ambulância, que o transportou para o Hospital.

Neste contexto e não obstante a sua relação com o falecido, afigura-se que o teor das declarações de BB foi inquestionável quanto ao seu conhecimento da identificação da pessoa que o feriu e ao modo como o fez, concretamente o arguido AA que a mesma conhecia, como aos demais arguidos, acerca dos quais referiu que “antigamente dava-se bem com eles”, que os conhece “há muito tempo”, da ..., aspecto também relevante no sentido da credibilidade que as suas declarações merecem.

Com efeito, ao imputar ao arguido AA o acto de ter esfaqueado mortalmente o seu marido, ao lado do qual se encontrava quando tal sucedeu, BB não pode deixar de não ter consciência da gravidade da imputação e das respectivas consequências para o identificado e que não se está a reportar a qualquer desconhecido, mas antes a uma concreta pessoa, sua vizinha e sua conhecida desde há vários anos, com quem se dava bem, que tem familiares e amigos nesse Bairro, onde ela residia e continua a residir, vizinho que não tem qualquer capacidade financeira para a indemnizar pela perda do marido, pelo que não se vislumbra qualquer razão para pôr em crise a credibilidade das suas declarações, conforme o arguido AA pretende, ao negar que tivesse sido ele a esfaquear FF, imputando a prática de tal facto a um suposto NN (aparentemente cidadão ..., melhor identificado no expediente de fls. 847 a 886, remetido ao processo em 30-6-2021), presença de outra pessoa aquando da prática desse concreto acto que BB não confirmou, bem assim como não revelou qualquer dúvida acerca de quem foi o indivíduo que assim procedeu, postura e declarações de BB que se entende que ao identificar o arguido AA como a pessoa que esfaqueou mortalmente o seu marido foi porque assim sucedeu e não porque quisesse identificar um mero “culpado”, tendo-se, nesse aspecto, por inquestionável a certeza do teor das suas declarações.

A prova das consequências da facada para FF decorre, designadamente, da documentação hospitalar de fls. 225 a 229 e do relatório de autópsia de fls. 453 a 461.

Face à facada em questão, da violência do impacto na vítima, que a trajectória e os órgãos corporais atingidos indiciam, bem assim a respectiva região do corpo, tem-se por evidente que quem assim procedeu teve o propósito de matar outrem, conduta que, de acordo com normais regras de experiência, que a prova produzida não infirmou, cumpre concluir que o arguido AA levou a cabo de forma livre, deliberada e consciente, sabendo que era criminalmente punível.

Dos meios de prova produzidos não resultou prova de factualidade relevante diversa daquela que assim se considerou, designadamente daquela que se teve por não provada.

No que concerne à situação pessoal do arguido AA assentou o Tribunal nas suas declarações, cujo teor neste aspecto se afigurou genericamente merecedor de credibilidade.

Quanto às condenações que sofreu fundou-se o Tribunal no respectivo certificado de registo criminal, de fls. 771 a 775.

Da documentação de fls. 564, 565, 726 a 727, 728 a 729 e 746 a 747 decorre a prova do casamento, e respectiva dissolução, de BB com FF e dos referidos filhos de cada um.

Das declarações da assistente/demandante e do teor de fls. 583 e 584 decorre a prova do seu rendimento mensal, do que despende mensalmente em renda de casa e do rendimento mensal que o falecido auferia.

Não foi produzido algum meio de prova no sentido de que os arguidos, por si próprios ou por terceiros, provoquem ou ameacem a assistente.

Sem prejuízo de a assistente/demandante ter oferecido ao processo cópia de um bilhete de avião de ... para ..., de 5-7-2020, de JJ (fls. 580), esta não é filha do falecido, nem foi produzido algum meio de prova de que decorresse que a mesma tivesse ido para a ... devido a facto, directa ou indirectamente, cometido pelos arguidos, deslocação que, nesses termos, teve lugar cerca de cinco meses após a data dos factos que constituem o objecto nuclear do processo.

Não obstante a documentação de fls. 582, relativa ao envio de 50,00 € para ..., em 21-7-2020, tendo como beneficiário OO, também não foi produzido algum meio de prova no sentido de que o falecido enviasse mensalmente pensão de alimentos para a sua filha que ali reside, bem assim não foi produzida prova de que o referido envio de 50,00 € se destinasse a essa filha do falecido, ou que a demandante remeta mensalmente quantia para alimentos daquela, a este respeito se referindo que, infirmando essa alegação, a própria assistente/demandante declarou que apenas por quatro vezes, através de interpostas pessoas, enviou dinheiro para essa filha do falecido, ignorando-se também os montantes enviados, além do que demais se colocaria em sede da procedência da respectiva pretensão.…”.

*

II. 2. Constitui entendimento constante e pacífico que o âmbito dos recursos é definido pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação, que delimitam as questões que o tribunal ad quem tem de apreciar, sem prejuízo das que sejam de conhecimento oficioso (cfr. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, Vol. III, 2.ª ed. 2000, p. 335; Simas Santos e Leal-Henriques, Recursos em Processo Penal, 6.ª ed., 2007, p. 103; Ac. STJ de 11-09-2019, Proc. n.º 96/18.9GELLE.E1.S1, Relator: Raúl Borges).

*

II. 2.1. Assim, atentas as conclusões formuladas pelo recorrente AA, as questões a decidir dizem respeito:

- À violação do princípio do in dúbio pro reo e inconstitucionalidade material do art.° 127° do CPP, por violação do disposto no art.° 2°, 20°, nº 4, 23°, nº 3, 32°, nº 1 da Constituição da República Portuguesa;

- Discordância quanto à medida da pena, que considera excessiva, por ultrapassar a medida da culpa.

*

Como se extrai das respectivas conclusões, verifica-se que o recurso abrange questões relativas à prova e à decisão em matéria de facto (conclusões II, III, IV e V), violação do princípio da proibição da inocência (conclusão VI), inconstitucionalidade material do art.º 127.º do CPP, por violação do disposto nos art.º 2.º, 20.º n.º 4, 23.ºn.º 3, 32º, n.º 1 da CRP e ainda do art.º 6.º da C.E.D.H (conclusão VII).

Porém, como se vê do texto do acórdão recorrido, o Tribunal da Relação conheceu de todas as questões suscitadas no recurso perante ele apresentado, de forma circunstanciadamente motivada, em rigoroso cumprimento das exigências de fundamentação decorrentes dos artigos 374.º, n.º 2, e 424.º, n.º 4, do CPP, cuja violação é susceptível de gerar causa de nulidade (artigo 379.º, n.º 1, do CPP), inexistente no presente caso e conheceu também o tribunal recorrido da alegada questão de inconstitucionalidade, concluindo pela sua não verificação, em decisão que, como se disse, não admite recurso na parte inscrita no âmbito de questões cuja decisão também o não admite.

Na verdade, vendo a decisão recorrida, verifica-se que esta, diferentemente do que alega o recorrente, se pronunciou expressamente sobre os pontos indicados pelo recorrente, fazendo-o nos seguintes termos:

III - O Arg. entende que o tribunal recorrido não devia ter fixado a matéria de facto da forma como o fez, porque, em seu entender, não foi o que resultou da prova produzida em audiência, pelo menos, por aplicação d princípio in dubio pro reo.

Uma vez que o Recorrente entende que foi mal julgada a matéria de facto, o que invoca é a existência de erro na avaliação dos depoimentos e declarações dos intervenientes, bem como da restante prova produzida em audiência ou constante dos autos.

A garantia do duplo grau de jurisdição não subverte o princípio da livre apreciação da prova pelo juiz.

Este princípio da livre apreciação da prova está consagrado no art. 127º do CPP nos seguintes termos «... a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente».

E embora este Tribunal da Relação tenha poderes de intromissão em aspectos fácticos (art.ºs 428º e 431º/b) do CPP), não pode sindicar a valoração das provas feitas pelo tribunal em termos de o criticar por ter dado prevalência a uma em detrimento de outra, salvo se houver erros de julgamento e as provas produzidas impuserem outras conclusões de facto.

A garantia do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas, a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida em audiência - visando apenas a detecção e correcção de pontuais, concretos e seguramente excepcionais erros de julgamento, incidindo sobre pontos determinados da matéria de facto.

Na formação da convicção do juiz não intervêm apenas factores racionalmente demonstráveis, referindo-se a relevância que têm para a formação da convicção do julgador «elementos intraduzíveis e subtis», tais como «a mímica e todo o aspecto exterior do depoente» e «as próprias reacções, por vezes quase imperceptíveis, do auditório» que vão agitando o espírito de quem julga (no mesmo sentido Castro Mendes, Direito Processual Civil, 1980, vol. III, pág. 211, para acrescentar depois, a págs. 271, que «existem aspectos comportamentais ou reacções dos depoentes que apenas podem ser percebidos, apreendidos, interiorizados ou valorizados por quem os presencia e que jamais podem ficar gravados ou registados para aproveitamento posterior por outro tribunal que vá reapreciar o modo como no primeiro se formou a convicção dos julgadores»).

O que é necessário e imprescindível é que, no seu livre exercício de convicção, o tribunal indique «os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela convicção sobre o julgamento do facto como provado ou não provado».

E convém referir que quando o tribunal recorrido forma a sua convicção com provas não proibidas por lei, prevalece a convicção do tribunal sobre aquelas que formulem os Recorrentes.

Normalmente, os erros de julgamento capazes de conduzir à modificação da matéria de facto pelo tribunal de recurso consistem no seguinte: dar-se como provado um facto com base no depoimento de uma testemunha que nada disse sobre o assunto; dar-se como provado um facto sem que tenha sido produzida qualquer prova sobre o mesmo; dar-se como provado um facto com base no depoimento de testemunha, sem razão de ciência da mesma que permita a referida prova; dar-se como provado um facto com base em prova que se valorou com violação das regras sobre a sua força legal; dar-se como provado um facto com base em depoimento ou declaração, em que a testemunha, o arguido ou o declarante não afirmaram aquilo que na fundamentação se diz que afirmaram; dar-se como provado um facto com base num documento do qual não consta o que se deu como provado; dar-se como provado um facto com recurso à presunção judicial fora das condições em que esta podia operar.

No presente caso, o Recorrente, fazendo as especificações previstas no art.º 412º/3 do CPP, o que fez, realmente, foi uma interpretação alternativa da prova produzida em audiência, o que sendo compreensível, não é relevante como impugnação da matéria de facto, porque, por um lado, isso corresponderia à reapreciação global da prova produzida, o que, como vimos, não é admissível em sede de recurso, e, por outro, porque corresponde à mera contraposição das suas convicções à do tribunal recorrido.

Por outro lado, entendemos que “O recorrente não impugna de modo processualmente válido a decisão proferida sobre matéria de facto se se limita a procurar abalar a convicção assumida pelo tribunal recorrido, questionando a relevância dada aos depoimentos prestados em audiência. …” , como acontece no presente caso, em que o Recorrente, no fundo, se limita a pôr em causa a credibilidade da viúva da vítima.

De qualquer forma, os trechos dos depoimentos transcritos pelo Recorrente no seu recurso não impõem que se altere a matéria de facto de acordo com a sua pretensão.

Para além disso, o tribunal recorrido, na fundamentação da matéria de facto explicou, com clareza e detalhadamente, o caminho lógico que percorreu para dar como provada aquela matéria e esse caminho foi razoável e corresponde a uma das soluções plausíveis, segundo as regras da experiência, pelo que é inatacável.

Improcede, pois, ainda nesta parte, o recurso.

*

IV – Entende o Recorrente que a decisão recorrida padece do vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada.

Os vícios previstos no art.º 410º/2 do CPP, são de conhecimento oficioso e têm que resultar do próprio texto da decisão recorrida, por si só ou conjugado com as regras da experiência comum.

Para que exista o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, que não se confunde com a insuficiência da prova para a decisão de facto, é necessário que a matéria de facto fixada se apresente insuficiente para a decisão sobre o preenchimento dos elementos objectivos e subjectivos dos tipos legais de crime verificáveis e dos demais requisitos necessários à decisão de direito e seja de concluir que o tribunal a quo podia ter alargado a sua investigação a outro circunstancialismo fáctico suporte bastante dessa decisão.

Ora, sendo os factos dados como provados na sentença conclusões lógicas da prova produzida produzidas em audiência e plausíveis face a essas provas, a convicção assim formada pelo julgador não pode ser censurada, sob pena de se aniquilar a livre apreciação da prova do julgador, construída dialecticamente na base da imediação e da oralidade, como refere o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20/09/2005 (em www.dgsi.pt/jstj.nsf/ com o nº 05A2007). Na verdade, refere o mesmo acórdão, «a convicção do tribunal é construída dialecticamente, para além dos dados objectivos fornecidos pelos documentos e outras provas constituídas, também pela análise conjugada das declarações e depoimentos, em função das razões de ciência, das certezas e das lacunas, das contradições, hesitações, inflexões de voz, (im) parcialidade, serenidade, olhares, "linguagem silenciosa e do comportamento", coerência do raciocínio e de atitude, seriedade e sentido de responsabilidade manifestados, coincidências e inverosimilhanças que, por ventura, transpareçam em audiência, das mesmas declarações e depoimentos». Elementos que a transcrição não fornece e de que a reapreciação em sede de recurso não dispõe. “…”.

“Está-se na presença da insuficiência da matéria de facto para a decisão de direito quando os factos colhidos, após o julgamento, não consentem, quer na sua objectividade quer na sua subjectividade, o ilícito dado como provado.”

Não ocorre esse vício quando o tribunal investigou tudo o que podia e devia investigar e os factos dados como provados são suficientes para preencher os elementos do tipo pelo qual o Arg. foi condenado, e para a determinação da respectiva pena, sendo que, a existência da possibilidade de fazer uma diferente tipificação em face dos factos dados como provados, não integra este tipo de vício .

O Recorrente imputa este vício, porque “... o douto Tribunal ignorou toda a prova quer pericial quer documental e quer testemunhal produzida e constante nos autos, pelo que se entende ter sido violado, nesta sede, para além do art. 410, n.º 2 al. a), o disposto no art.º 355.º e 127.º do CPP. ...”.

Como se vê o Recorrente não indica que outras diligências de prova deveriam ter sido feitas e nós também não vislumbramos quais possam ser.

Por outro lado, os factos dados como provados são suficientes para preencher os elementos do tipo pelo qual o Arg. foi condenado, e para a determinação da respectiva pena.

Não padece, assim, a decisão recorrida da apontada, nem doutras, insuficiência.

*

Não vislumbramos na decisão recorrida qualquer outro dos vícios previstos no art.º 410º/2 do CPP.

*

II. 2.2. De acordo com o disposto no artigo 46.º da Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto (Lei de Organização do Sistema Judiciário), «Fora dos casos previstos na lei, o Supremo Tribunal de Justiça apenas conhece de matéria de direito». Nos termos do artigo 434.º do CPP, o recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça visa exclusivamente o reexame de matéria de direito, sem prejuízo do disposto nos n.ºs 2 e 3 do artigo 410.º.

O recurso de decisões da Relação que, em recurso, conheçam, a final, do objecto do processo está, todavia, limitado pela natureza e pela medida da pena de prisão aplicada: não é admissível se for aplicada pena não privativa da liberdade (al. e) do n.º 1 do artigo 400.º) e, sendo aplicada pena privativa da liberdade, dependerá dos limites e condições previstas nas alíneas e) e f) do mesmo preceito.

Nos termos do artigo 400.º, n.º 1, al. f), do CPP não é admissível recurso de acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelas Relações, que confirmem decisão de 1.ª instância e apliquem pena de prisão não superior a 8 anos, isto é, se ocorrer uma situação de dupla conforme. De acordo com a alínea e) do mesmo preceito também não é admissível recurso de acórdãos proferidos, em recurso, pelas Relações que apliquem pena de prisão não superior a 5 anos. Por sua vez, o artigo 432.º do CPP estabelece que se recorre para este tribunal de decisões que não sejam irrecorríveis proferidas pelas Relações, em recurso, nos termos do artigo 400.º.

Os poderes de cognição do Supremo Tribunal estão, assim, delimitados negativamente pela medida das penas aplicadas ou confirmadas pelo tribunal da Relação.

Da conjugação das citadas disposições resulta, como tem sido sublinhado pela jurisprudência deste Tribunal, que só é admissível recurso de acórdãos das Relações que apliquem penas superiores a 8 anos de prisão ou penas superiores a 5 anos e não superiores a 8 anos em caso de não confirmação da decisão da 1.ª instância. 

O descrito regime de recursos para o STJ efectiva, de forma adequada, a garantia do duplo grau de jurisdição, traduzida no direito de reapreciação da questão por um tribunal superior, quer quanto a matéria de facto, quer quanto a matéria de direito, consagrada no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição[1]

Garantido o duplo grau de jurisdição em matéria de facto e em matéria de direito, têm, assim, os sujeitos processuais à sua disposição duas vias possíveis de exercer o seu direito ao recurso. Querendo impugnar a decisão em matéria de facto – ou querendo arguir os vícios da decisão a que se refere o artigo 410.º do CPP (como se tem sublinhado na jurisprudência constante deste Supremo Tribunal – cfr., por todos, o acórdão de 2.10.2014, no Proc. 89/12.3SGLSB.L1.S1, em www.dgsi.pt) – e em matéria de direito, devem estes utilizar a via de recurso para o tribunal da Relação (artigo 428.º do CPP), qualquer que seja a pena aplicada.

Porém, limitando (artigo 403.º do CPP) o recurso a matéria de direito, a lei impõe-lhes caminhos distintos, consoante a pena aplicada: se a pena não exceder 5 anos de prisão, o conhecimento do recurso é da competência do tribunal da Relação (artigo 427.º do CPP); se a pena for superior a 5 anos (incluindo a pena parcelar e a pena conjunta, em caso de concurso de crimes), tal competência pertence ao STJ (artigos 432.º e 434.º do CPP)[2]

Em caso de recurso para o tribunal da Relação, é ainda possível o recurso da decisão da Relação para o STJ, limitado a questões de direito (artigo 432.º e 434.º), nos termos anteriormente referidos.

A limitação do recurso ao reexame da matéria de direito não impede este Tribunal de conhecer oficiosamente dos vícios da decisão recorrida a que se refere o n.º 2 do artigo 410.º do CPP – insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão e erro notório na apreciação da prova –, se eles resultarem do texto da decisão recorrida, por si só ou em conjugação com as regras da experiência, e se a sua sanação se revelar necessária à boa aplicação do direito, como este Tribunal vem afirmando em jurisprudência constante[3]. Trata-se, como se tem insistido, de vícios da decisão, de «lógica jurídica», de vícios lógicos do discurso decisório em matéria de facto que se revelam no texto da decisão e se evidenciam a partir dele, por si só ou em conjugação com as regras da experiência[4], não de erros de julgamento da matéria de facto, nomeadamente de apreciação das provas, cujo conhecimento se encontra subtraído a este Tribunal.

*

II.2.3. Como se observa, e para lá do que se alude no acórdão revidendo, “supra” transcrito, a decisão “in judice” mostra-se particularmente elucidativa quanto ao sucedido, fundamentando, com base na prova produzida, a matéria de facto, o que resulta da conjugação dos elementos expressos, compreendidos e interpretados, desde logo, na lógica interna da decisão.

Ou seja, em perspectiva própria de uma razoável compreensão das regras da vida e da experiência comum das coisas, o que se nota é que o tribunal “a quo” valorou devidamente os meios de prova.

A prova produzida e examinada em audiência, não permitia, muito menos impunha, decisão em sentido diferente, não demonstrando o recorrente em que medida os tidos por credíveis meios de prova, considerados no global da prova e valorados, podem contrariar a convicção do tribunal, antes se limitando a “sugerir” na sua motivação interpretação diferente da que esteve na base do acórdão revidendo.

A alegada violação da livre apreciação da prova, do in dubio pro reo, é suscitada “no âmbito da matéria de facto”, pelo que a sua sindicância apenas cabe ao STJ na estrita medida da sua análise a partir do texto da decisão recorrida; não cabe a este Supremo Tribunal analisar se a matéria de facto foi ou não bem decidida, ou se a prova foi bem ou mal analisada, na medida em que tais análises implicam poderes de cognição em matéria de facto o que está para além dos poderes de cognição deste Supremo Tribunal em matéria de recursos; porém, nada obsta a que a partir do texto se verifique se se evidencia alguma violação daquele princípio “se, da decisão resultar que o tribunal recorrido ficou na dúvida em relação a qualquer facto e que, perante esse estado de dúvida, decidiu contra o arguido[5]. E da leitura do acórdão recorrido em parte alguma se vislumbra uma decisão ou avaliação contra o arguido; não resulta da decisão recorrida qualquer dúvida quanto aos factos, nem resulta qualquer decisão contra o arguido, baseada num qualquer raciocínio realizado a partir de um estado de dúvida.

Como se referiu e reiterou acima, a fundamentação da decisão em matéria de facto mostra uma apreciação e valoração da prova feita de forma racional, lógica, plausível e de harmonia com as regras da experiência comum, pelo que, de modo algum, se pode concluir que aquela mesma prova gera factos incertos, susceptíveis de causarem uma dúvida razoável que afaste a valoração efectuada pelo tribunal recorrido.

*

II.2.4. Resulta, também, dos autos que o recorrente questiona a inconstitucionalidade da norma do artigo 127º do Código de Processo Penal - norma segundo a qual “salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente” -, com o sentido de permitir interpretações subjetivas da prova produzida.

O princípio da livre apreciação da prova consagrado naquele normativo impõe desde logo que a mesma seja fundamentada segundo as regras da experiência e que assente num juízo lógico, preciso.
A livre apreciação da prova «não pode ser entendida como uma operação puramente subjectiva, emocional e portanto imotivável. Há de traduzir-se em valoração racional e crítica, de acordo com as regras comuns da lógica, da razão, das máximas da experiência e dos conhecimentos científicos, que permitam ao julgador objectivar a apreciação dos factos, requisito necessário para uma efectiva motivação da decisão»[6]
O princípio «comporta duas vertentes: - por um lado, a entidade que decide fá-lo de acordo com a sua íntima convicção em face do rol de provas apresentadas no processo, em especial na audiência de julgamento, quer sejam arroladas pela acusação, quer pela defesa, quer, ainda, aquelas que o Tribunal entende oficiosamente conhecer, e, por outro lado, essa convicção, objectivamente formada com apoio em regras técnicas e de experiência, não deve estar sujeita a quaisquer cânones legalmente pré-estabelecidos.
Ao contrário do que acontece no sistema de prova legal, no qual a conclusão probatória é pré-fixada legalmente mediante inferências probatórias sustentadas pela lei em abstracto pelo princípio da livre convicção o juiz tem a liberdade de formar a sua convicção, sobre a realidade, os factos, do caso submetido a julgamento, com base apenas no juízo que se fundamenta no mérito objectivamente concreto desse caso, na sua individualidade histórica, tal como ele foi exposto, e adquirido, representativamente no processo (pelas alegações, respostas, inquirições e meios de prova utilizados, etc).
As regras de experiência, e os critérios gerais, não serão aqui mais do que índices corrigíveis, critérios que definem conexões de relevância, orientam os caminhos da investigação e oferecem probabilidades conclusivas, mas apenas isso»[7].
No domínio da livre apreciação da prova, para além dos limites constitucionais e legais, resultantes do grau de convicção requerido para a decisão, da proibição dos meios de prova, e da observância dos princípios da presunção de inocência e in dubio pro reo [8], não se impõe ao julgador outra limitação que não seja a resultante das regras da lógica e da razão, das máximas da experiência, e dos conhecimentos técnico-científicos, os quais reclamam uma «motivação clara, suficiente, objetiva e comunicacional».
Em matéria de prova indiciária, é jurisprudência deste Supremo Tribunal que «a prova nem sempre é directa, de percepção imediata, muitas vezes é baseada em indícios», sendo estes «as circunstâncias conhecidas e provadas a partir das quais, mediante um raciocínio lógico, pelo método indutivo, se obtém a conclusão, firme, segura e sólida de outro facto; a indução parte do particular para o geral e, apesar de ser prova indirecta, tem a mesma força que a testemunhal, a documental ou outra» e, assim, «a prova indiciária é suficiente para determinar a participação no facto punível se da sentença constarem os factos-base (requisito de ordem formal) e se os indícios estiverem completamente demonstrados por prova directa (requisito de ordem material), os quais devem ser de natureza inequivocamente acusatória, plurais, contemporâneos do facto a provar e, sendo vários, estar interrelacionados de modo a que reforcem o juízo de inferência», devendo este «ser razoável, não arbitrário, absurdo ou infundado, e respeitar a lógica da experiência e da vida; dos factos-base há de derivar o elemento que se pretende provar, existindo entre ambos um nexo preciso, directo, segundo as regras da experiência» (Acórdão de 11 de julho de 2007, processo n.º 07P1416)
E, na decorrência, o Supremo Tribunal afirma que «as normas dos artigos 126.º e 127.º do CPP podem ser interpretadas de modo a permitir que possam ser provados factos sem que exista uma prova directa deles. Basta a prova indirecta, conjugada e interpretada no seu todo», nesse sentido, «essa interpretação não ofende quaisquer princípios constitucionais, como o da legalidade, ou das garantias de defesa, ou da presunção de inocência e do contraditório, consagrados no art.º 32.°, n.os 1, 2, 5 e 8 da Constituição da República Portuguesa, desde que haja uma fundamentação crítica dos meios de prova e um grau de recurso em matéria de facto para efectivo controlo da decisão» (Acórdão de 23 de novembro de 2006, processo n.º 06P4096.
Como refere o Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 1165/96 (Diário da República II série, de 6 de fevereiro de 1997) «o julgador, ao apreciar livremente a prova, ao procurar através dela atingir a verdade material, deve observância a regras da experiência comum utilizando como método de avaliação e aquisição do conhecimento critérios objectivos, genericamente susceptíveis de motivação e controlo» ( in Código de Processo Penal comentado, Almedina, Coimbra, 3ª Edição, Coimbra, 2021, anotação 3 ao artigo 127.º, p. 421).
Neste quadro, a alegação pelo recorrente de que se verifica a inconstitucionalidade da norma do artigo 127º do Código de Processo Penal, por violação do disposto nos art.º 2.º, 20.º n.º 4, 23.º n.º 3, 32º, n.º 1 da CRP e ainda do art.º 6.º da C.E.D.H., quando o acórdão do Tribunal da Relação ..., mantendo tudo o que acórdão do Tribunal da Primeira Instância decidiu, fez um salto lógico em violação do princípio da proibição da inocência e, nessa conformidade, o recorrente deveria ter sido absolvido, por falta absoluta de provas, não tem qualquer acolhimento.

Com efeito, a norma impugnada não foi aplicada com esse sentido.

E não foi aplicada com o referido sentido, desde logo porque na decisão recorrida foi feita uma apreciação crítica e conjugada de toda a prova produzida, tendo sido justificados de forma fundamentada os factos provados, sendo descabido afirmar-se que a interpretação que o tribunal recorrido fez do art. 127º C.P.P. viola o art. art.º 2.º, 20.º n.º 4, 23.º n.º 3, 32º, n.º 1 da CRP e ainda do art.º 6.º da C.E.D.H.

*

II.2.5. Está, por isso, afastada da apreciação do presente recurso de toda a matéria que diz respeito à invocação dos pontos que o recorrente considera incorrectamente julgados nos termos acima descritos.

A matéria de facto foi fixada em definitivo pela 2ª instância restando ao Supremo Tribunal a revista da decisão ali proferida no tocante à matéria de direito.

Verifica-se, pois, pelo elenco feito supra que a análise do recurso se cinge, afinal, à questão de avaliar a medida da pena respeitante ao crime de homicídio

*

II. 3. Quanto à medida da pena.

II.3.1. A determinação da medida da pena pelo tribunal da condenação mostra-se fundamentada nos seguintes termos:

“... Feito pela forma descrita o enquadramento jurídico-penal da conduta do arguido AA, importa determinar a natureza e a medida da sanção a aplicar (cfr. artigos 40º, 70º e 71º do Código Penal).

O crime de homicídio é punível com pena de prisão de 8 a 16 anos - artigo 131º do Código Penal.

A determinação da pena em concreto, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente, tendo em conta as exigências de prevenção, nos termos do artigo 71º, nº 1 do Código Penal e bem assim o disposto no artigo 40º, nº 2 do mesmo diploma, atendendo-se a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, conforme também dispõe o nº 2 do referido artigo 71º.

Em termos globalmente favoráveis ao arguido AA cumpre considerar as suas condições socioeconómicas, muito deficitárias, a sua jovem idade e o contexto em que ocorreram os factos, originados em discussão por questões de trânsito, em que a iniciativa da agressão física partiu da própria vítima, pelo menos por duas vezes, contra os dois demais arguidos.

No aspecto negativo, as condenações que, não obstante a sua jovem idade, o arguido AA já regista, designadamente uma pela prática de um crime roubo, pela violência contra pessoas que é inerente a tal crime, violência que, naturalmente, tem o seu

 expoente máximo no crime de homicídio.

O acto em questão, aliás cometido quando a vítima já se deslocava no sentido descendente da Rua, em direcção à sua residência, oposta àquela onde o conflito se iniciara, pelos órgãos corporais atingidos/trespassados, denota considerável violência e revela dolo, directo, muito intenso, tendo-se, porém, por mediana a ilicitude dos factos, atento o referido contexto em que ocorreram.

Ponderando as supra referidas circunstâncias determinantes da medida da pena, assim como as necessidades de prevenção geral e especial, nomeadamente aquelas, que são elevadas nos crimes contra pessoas, não sendo também despiciendas as necessidades de prevenção especial, atentas condenações que o arguido AA já regista, designadamente uma por crime de roubo, tendo por referência que a pena não pode ultrapassar a medida da culpa e que a mesma visa a reintegração social do agente, tem-se por adequado aplicar ao arguido AA pena situada ligeiramente acima do respectivo limite abstracto médio, pelos 12 anos e 6 meses de prisão. ...”.

*

II.3.2 Em apreciação do recurso interposto pelo arguido para o Tribunal da Relação, diz o acórdão recorrido:

«A determinação da medida concreta da pena, nos termos do art.º 71º do CP, deve ser feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, atendendo às circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor ou contra o agente.

A intervenção dos tribunais de 2ª instância na apreciação das penas fixadas pela 1ª instância deve ser parcimoniosa e cingir-se à correcção das operações de determinação ou do procedimento, à indicação dos factores que devam considerar-se irrelevantes ou inadmissíveis, à falta de indicação de factores relevantes, ao desconhecimento pelo tribunal ou à errada aplicação dos princípios gerais de determinação, à questão do limite da moldura da culpa, bem como a forma de actuação dos fins das penas no quadro da prevenção, mas já não deve sindicar a determinação, dentro daqueles parâmetros da medida concreta da pena, salvo perante a violação das regras da experiência, a desproporção da quantificação efectuada, ou o afastamento relevante das medidas das penas que vêm sendo fixadas pelos tribunais de recurso para casos similares.

Verificamos que o tribunal recorrido, tendo sido rigoroso na determinação da pena (importa ter em conta que desqualificou o crime de homicídio que vinha imputado ao Arg.), que fixou em medida ligeiramente superior ao ponto médio do intervalo entre os limites mínimo e máximo aplicáveis, aplicou correctamente os princípios gerais de determinação das penas, não ultrapassou os limites das molduras das culpas, e teve em conta os fins das penas no quadro da prevenção. Por outro lado, em face da matéria de facto apurada, entendemos que não estamos perante qualquer desproporção da quantificação efectuada da pena, nem face a violação de regras da experiência comum, pelo que não se justifica intervenção correctiva deste Tribunal.

Improcede, pois, também nesta parte o recurso.»

*

II.3.3. Nos termos do artigo 40.º do Código Penal, que dispõe sobre as finalidades das penas, «a aplicação de penas e de medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade» e «em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa».

Estabelece o n.º 1 do artigo 71.º do Código Penal que a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, devendo o tribunal atender a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele.

A finalidade útil da pena assume-se numa função basicamente preventiva que se desdobra orientada para a comunidade – prevenção geral – e para o indivíduo – prevenção especial. “(…) só finalidades relativas de prevenção, geral e especial, não finalidades absolutas de retribuição e expiação, podem justificar a intervenção do sistema penal e conferir fundamento e sentido às suas reacções específicas. (...) Prevenção geral, porém, não como prevenção geral negativa, de intimidação do delinquente e de outros potenciais criminosos, mas como prevenção positiva ou de reintegração, isto é, de reforço da consciência jurídica comunitária e do seu sentimento de segurança face à violação da norma ocorrida.” [9]

Culpa e prevenção são os dois termos do binómio com o auxílio do qual há-de ser construído o modelo da medida da pena em sentido estrito.

A prevenção geral não se reconduz somente ao efeito dissuasor que o anúncio da aplicação de uma pena exercerá sobre o potencial infractor no que se designa como prevenção geral negativa. Contém em si e principalmente uma mensagem de reafirmação e de consolidação da validade da lei penal como meio de «manter e reforçar a “confiança” da comunidade na validade e na vigência das suas normas de tutela de bens jurídicos e como instrumento por excelência destinado a revelar perante a comunidade a inquebrantibilidade da ordem jurídica», na faceta de prevenção geral positiva sendo então, decerto, nas normas que, no sistema, tutelam bens que assumem expressão e valor superlativo, como a vida, que essa expectativa da comunidade na validade de tais normas, na restauração da paz jurídica, encontra o seu pleno sentido e a sua máxima expressão.

Já a vertente da prevenção especial reconduz-se ao objectivo de evitar a recidiva mediante a ressocialização ou reinserção social sem embargo de se lhe adicionar também, numa deriva mais securitária, o objectivo de intimidação individual e de inocuização.

E se é a prevenção geral positiva que fornece uma “moldura de prevenção” não pode escamotear-se – como bem se salienta no acórdão deste Supremo Tribunal de 30/05/2019, proc. 21/17.4JAFUN.L1.S1, 5ª Secção, relator: Nuno Gomes da Silva – «haver “dentro” dessa moldura de prevenção um efeito de prevenção geral negativa ou prevenção de intimidação que embora não constitua «por si mesma uma finalidade autónoma da pena pode surgir como um efeito lateral (porventura, em certos ou em muitos casos desejável) da necessidade de tutela dos bens jurídicos).

É ainda dentro da dita “moldura de prevenção” que «devem actuar, em toda a medida possível, pontos de vista de prevenção especial sendo assim eles que vão determinar, em última instância, a medida da pena.

É este, no essencial, o programa político-criminal que está vertido no art. 40º, nº 1 do C. Penal onde se determina que a aplicação de uma pena visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade conferindo a essa pena a natureza preventiva geral e especial».

*

II.3.4. Pretende o recorrente uma diminuição da pena, uma vez que a pena de 12 (doze) anos e 6 (seis) meses de prisão se mostra manifestamente exagerada, desproporcional e desadequada, atendendo ao preceituado legal quanto à função repressiva e preventiva das penas de privação de liberdade e tendo em consideração a previsão do art. 131º do C.P., em que a moldura penal se situa entre os 8 anos e os 16 anos, deverá ser aplicada ao arguido uma pena que se situe no limite mínimo.

Em justificação da sua pretensão de ver reduzida a pena, invoca o arguido, em síntese: que é uma pessoa calma, trabalhador, pacífica, nada temendo e porque não foi o autor da facada manteve-se no local de forma pacífica e ordeira viu a polícia, nunca fugiu e sempre prestou esclarecimentos sobre os factos; é primário quanto á pratica do ilícito criminal em apreço e tem perspectivas de vida futura, que será voltar a viver com a mãe criar o seu filho e trabalhar. Discorda que haja fortes necessidades de prevenção geral, pois, o recorrente é conhecido como sendo uma pessoa de bem, é jovem, trabalhador, totalmente inserido na sociedade, onde trabalha, tem casa e família; que houve uma notória violação da medida da pena aplicada ultrapassado em muito a medida da culpa concreta do arguido face aos factos dados como provados, tendo ainda, o acórdão em crise violado disposto nos artigos 40º, n.º 2 e 71, n.º 1 al. a), do Cód Penal (conclusões IX a XIV).

*

II.3.5. Na determinação da medida da pena foram levados em conta os seguintes factores relevantes (artigo 71.º do Código Penal): o dolo directo e intenso, pois o acto em questão, cometido quando a vítima já se deslocava no sentido descendente da Rua, em direcção à sua residência, oposta àquela onde o conflito se iniciara, pelos órgãos corporais atingidos/trespassados, denota considerável violência; o grau de ilicitude que é mediano atento o contexto em que ocorreram os factos, originados em discussão por questões de trânsito, em que a iniciativa da agressão física partiu da própria vítima, pelo menos por duas vezes, contra os dois demais arguidos; as elevadas as necessidades de prevenção geral e especial, tendo em consideração as condenações que, não obstante a sua jovem idade, o arguido AA já regista, designadamente uma pela prática de um crime roubo, pela violência contra pessoas que é inerente a tal crime; e a falta de confissão e de arrependimento do recorrente.

A seu favor, contabilizou o acórdão recorrido, contrariamente ao que alega o recorrente, as suas circunstâncias de vida, nomeadamente as condições socioeconómicas, boa inserção social, familiar e profissional, que nada têm de excecional, isto é, de reduzido valor atenuativo, por ser a conduta exigida a todo e qualquer cidadão como modo de poder viver em sociedade, não superando o comportamento do homem comum do seu seio socioeconómico, a sua idade, o contexto em que ocorreram os factos, incluindo o facto da iniciativa da agressão ter partido da vítima relativamente a duas outras pessoas presentes.

Tendo em consideração todos estes parâmetros, bem como a moldura penal abstrata com o limite mínimo de 8 anos, e o limite máximo de 16, o que se constata é que a pena concreta fixada de 12 anos e 6 meses de prisão, situada ligeiramente acima do respectivo limite abstracto médio, se mostra justa, correta e adequadamente fixada, pois a sua redução, além de não ser justificada ao nível da prevenção especial mormente por qualquer circunstância com destaque ao nível da sua condição social ou outra que pudesse ser tida como factor atenuativo criaria relativamente a factos semelhantes uma aberrante ideia de impunidade. Em comportamentos com este nível de violência e com estas desastrosas consequências, a efectiva aplicação de uma pena, a demonstrar que apesar da violação das normas estas se mantém em vigor, é necessária para se demonstrar que comportamentos como os praticados constituem um sério atentado à comunidade em que vivemos e ao Estado de Direito em que nos inserimos.

Pelo que se conclui pela improcedência do alegado quanto à invocada violação do disposto nos artigos 40º, n.º 2 e 71, n.º 1 al. a), do Cód Penal e consequentemente pela redução do quantum da pena aplicada.

 Deste modo, se conclui pela improcedência do alegado pelo recorrente.

*

III – DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes desta Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça em negar provimento ao recurso interposto pelo arguido AA, confirmando integralmente o Acórdão recorrido.    

Custas pelo recorrente fixando-se a taxa de justiça em 5 (cinco) unidades de conta.

Lisboa, 24 de Março de 2022

Cid Geraldo (Relator)

Helena Moniz (Adjunto)  

____________________________________________________


[1] Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 4ª edição revista, 2007, Vol. I, p. 516.
[2] Cfr. também o acórdão de fixação de jurisprudência n.º 5/2017, DR I, de 23.6.2017.
[3] Por todos, o acórdão de 15,12,2011, Proc. 17/09.0TELSB.L1.S1 (Raul Borges), e abundante jurisprudência nele citada, em www.dgsi.pt.
[4] Acórdão de 09/10/2019, Proc. 74/16.2JDLSB.L1.S1, 3ª Secção, Relator: Lopes da Mota, citando o acórdão de 12-07.2018, Proc. 74/16.2JDLSB.L1.S1, em www.dgsi.pt.
[5] Ac. do STJ, de 03.05.2018, Proc. n.º 444/14.0JACBR.C1.S1 e, no mesmo sentido, ac. STJ de 17.03.2016, Proc. 1180/10.2JAPRT.P1.S1, 3ª Secção, in Código de Processo Penal comentado, 3ª Edição Revista, Almedina, 2021, pag. 1399.
[6] Cf. Germano Marques da Sila, Curso de processo penal, II Volume, Lisboa, verbo1993, pag. 107 e segs; Cavaleiro de Ferreira, Curso de Processo Penal, II Volume, 1986, pag. 257 e segs., e J. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, vol. IV, Coimbra, Coimbra Editora 1981. Pág. 566 e segs., citados in Código de Processo Penal comentado, Almedina, 3ª Edição, Coimbra, 2021, anotação 1 ao artigo 127.º, p. 419.
[7] Código de Processo Penal comentado, Almedina, 3ª Edição, Coimbra, 2021, anotação 3 ao artigo 127.º, p. 420.
[8] Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário ao Código de Processo Penal, 4ª Edição, Lisboa Universidade Católica Editora., anotações 2 e 3 ao artigo 127.º, pp. 345-346.
[9]  Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal Português, Parte geral II, As consequências jurídicas do crime, Editorial Noticias, 1993, p.72.