Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
5279/17.6T8LSB.L1.S1
Nº Convencional: 2.ª SECÇÃO
Relator: MARIA DA GRAÇA TRIGO
Descritores: REFORMA DA DECISÃO
REFORMA DE ACÓRDÃO
EXTINÇÃO DO PODER JURISDICIONAL
LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ
EXTEMPORANEIDADE
Data do Acordão: 02/11/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: INDEFERIDA
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO
Sumário :
I. Constata-se que o requerente formula pedido de reforma do acórdão sem indicar qualquer dos fundamentos legalmente previstos, antes se limitando a manifestar a sua discordância com o sentido da decisão de mérito e com a decisão de condenação por litigância de má-fé.

II. Na medida em que, nos termos do art. 613.º, n.º 1, do CPC, aplicável ao recurso de revista ex vi art. 679.º e art. 666.º do mesmo Código, proferido o acórdão se esgota o poder jurisdicional, encontra-se o tribunal impedido de alterar tais decisões.

Decisão Texto Integral:

Acordam em conferência no Supremo Tribunal de Justiça



1. Notificado do acórdão proferido a 14 de Janeiro de 2021, vem o A. Recorrido requerer a reforma do mesmo, ao abrigo da previsão do art. 616.º do Código de Processo Civil, alegando o seguinte:

«EM CONCLUSÃO

a) A pretensão do Recorrido tem fundamento legal;

Uma vez que,

b) A lei tutela o direito de cessação da obrigação de prestação alimentar quando o alimentado inicie uma união de facto;

c) Os factos alegados pelo Recorrido correspondem à verdade; Dado que,

d) O Recorrido, apenas, soube que a Recorrente vivia em união de facto após a celebração do acorde firmado, em 2006;

e) O Recorrido, sempre, cooperou para a descoberta da verdade;

f) O Recorrido recorreu ao presente processo como o meio processual adequado, com vista à obtenção de um objectivo legal, que consiste no reconhecimento da cessação da obrigação alimentar da Recorrente,

Ou seja,

g) O pedido do Recorrido é legítimo e o meio adequado. h) O Recorrido age e agiu, sempre, de boa-fé.

Ao invés,

i) A Recorrente teve um comportamento, absolutamente, repreensível, Uma vez que

j) De forma reiterada, violou o dever de cooperação a que está obrigada,

l) Com total despudor pelo Tribunal e com vista ao entorpecimento da justiça, mentiu, ao afirmar que o seu companheiro não falava nem entendia a língua portuguesa;

m) Com esta censurável conduta conseguiu impedir o depoimento deste; n) Intimidou a testemunha do Recorrido, com recurso à ameaça.

E, ainda,

o) Tentou que o seu companheiro fosse considerado homossexual.

CONCLUSÕES FINAIS

Quanto ao mérito da causa

a) O Recorrido requereu a cessação da prestação de alimentos à Recorrente;

b) A ordem jurídica prevê, a cessação da obrigação de prestação alimentar, sempre, que o alimentado inicie uma união de facto;

c) A Recorrente iniciou uma união de facto;

d) Em Portugal vigora o princípio do Estado de Direito,

Pelo que,

e) O Recorrido tem direito a exigir a aplicação da lei e, em consequência, que lhe seja reconhecido o direito de ver cessada a sua obrigação de prestação alimentar à Recorrente;

f) A Constituição da República Portuguesa não admite diferenciações em função do género, da capacidade ou da nacionalidade;

g) A justiça tem de ser justa e a justiça só é justa se se respaldar na lei.

Porque,

h) “O Direito sem Justiça não é mais do que uma técnica, mas a Justiça sem Direito é o triunfo do sentimento sobre a razão, ou seja, da incerteza sobre a segurança”, autor desconhecido.

Quanto à má-fé

i) O Recorrido agiu segundo os ditames da boa-fé,

Pelo que,

j) Não é legitimo que lhe seja aplicada qualquer multa como litigante de má-fé.

Pelo contrário,

l) A Recorrente teve uma conduta torpe em todo o processo,

Pelo que,

m) Deve a Recorrente ser condenada, como litigante de má-fé.

TERMOS EM QUE,

a) Deve reconhecer-se que constam do processo meios de prova plena que, por si só,

implicam, necessariamente, decisão diversa da que foi proferida;

E, em consequência,

b) Deve ser reconhecida a cessação da obrigação de prestação de alimentos à Recorrente, por parte do Recorrido;

c) Deve ser reconhecido que o Recorrido não agiu de má-fé; e

d) Deve ser reconhecido que a Recorrente agiu de má-fé.»


A R. Recorrente pronunciou-se no sentido do indeferimento do pedido de reforma, pugnando para que a conferência determine que o incidente seja processado em separado.

2. Considera-se não ser de aplicar o regime de defesa contra demoras abusivas previsto no art. 670.º do Código de Processo Civil e, também, não poder ser tomado conhecimento, por extemporaneidade, do pedido de condenação da Recorrente como litigante de má-fé.

3. Prescreve o n.º 2 do art. 616.º do Código de Processo Civil o seguinte:

«Não cabendo recurso da decisão, é ainda lícito a qualquer das partes requerer a reforma da sentença quando, por manifesto lapso do juiz:

 a) Tenha ocorrido erro na determinação da norma aplicável ou na qualificação jurídica dos factos;

 b) Constem do processo documentos ou outro meio de prova plena que, só por si, impliquem necessariamente decisão diversa da proferida.»

Constata-se que o requerente formula pedido de reforma do acórdão sem indicar qualquer dos fundamentos legalmente previstos, antes se limitando a manifestar a sua discordância com o sentido da decisão de mérito e com a decisão de condenação por litigância de má-fé.

Na medida em que, nos termos do art. 613.º, n.º 1, do CPC, aplicável ao recurso de revista ex vi art. 679.º e art. 666.º do mesmo Código, proferido o acórdão se esgota o poder jurisdicional, encontra-se o tribunal impedido de alterar tais decisões.


3. Pelo exposto, decide-se:

a) Não conhecer do pedido de condenação da Ré Recorrente como litigante de má-fé;

b) Indeferir o requerimento de reforma do acórdão.


Custas pelo requerente, fixando-se a taxa de justiça em 3 UCs.


Lisboa, 11 de Fevereiro de 2021


Nos termos do art. 15º-A do Decreto-Lei nº 10-A/2020, de 13 de Março, aditado pelo Decreto-Lei nº 20/2020, de 1 de Maio, declaro que o presente acórdão tem o voto de conformidade das Exmas. Senhoras Conselheiras Maria Rosa Tching e Catarina Serra que compõem este colectivo.


Maria da Graça Trigo (relatora)