Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
034693
Nº Convencional: JSTJ00001503
Relator: VERA JARDIM
Descritores: RECURSO
CONVERSÃO DA MULTA EM PRISÃO
EFEITO DO RECURSO
FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Nº do Documento: SJ197802150346933
Data do Acordão: 02/15/1978
Votação: MAIORIA COM 1 DEC VOT E 1 VOT VENC
Referência de Publicação: DR IS 1978/03/11, PÁG. 505 A 506 - BMJ Nº 274 ANO 1978 PÁG. 8
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PARA O PLENO
Decisão: TIRADO ASSENTO.
Indicações Eventuais: ASSENTO DO STJ.
Área Temática: DIR PROC PENAL - RECURSOS.
Legislação Nacional: CPP29 ARTIGO 628 ARTIGO 630 ARTIGO 649 ARTIGO 658 N1 ARTIGO 659 ARTIGO 660 ARTIGO 669 ARTIGO 625.
CPC67 ARTIGO 734 ARTIGO 740 N2 D N3 ARTIGO 765 N1 ARTIGO 766 N3.
CP886 ARTIGO 115 ARTIGO 118.
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO RL DE 1976/10/13.
ACÓRDÃO RL DE 1976/07/21.
Sumário :
O recurso interposto da decisão que converte em prisão a pena de multa aplicada tem sempre efeito suspensivo.
Decisão Texto Integral:
O representante do Ministerio Publico junto do Tribunal da Relação de Lisboa, invocando o artigo 669 do Codigo de Processo Penal, recorre do acordão de 13 de Outubro de 1976, alegando oposição entre ele e o de 21 de Julho de 1976, ambos daquele Tribunal, dado que os mesmos não admitem recurso ordinario e foram proferidos no dominio da mesma legislação.
Baseia a oposição no facto de o segundo acordão haver decidido ser o efeito do recurso interposto do despacho que converte a multa em prisão meramente devolutivo e ter o primeiro julgado em sentido oposto, ou seja, que o efeito de tal recurso e suspensivo.
A Secção , pelo seu acordão de folhas 17, ja se pronunciou sobre a existencia da oposição, decidindo no sentido da sua verificação.
O Tribunal Pleno não esta, no entanto, vinculado aquela decisão - n. 3 do artigo 766 do Codigo de Processo Civil, razão pela qual deve examinar preliminarmente tal questão.
Ora, não pode por-se duvida sobre a existencia da oposição, que e evidente, bastando, para tal concluir, o enunciado da questão.
Sendo assim e porque estão verificados os demais pressupostos, deve o Tribunal Pleno examinar e decidir, proferindo assento, tal questão, ou seja, fixar o efeito do recurso a que se fez referencia.
Em direito processual penal, como, alias, em direito processual civil, a interposição e recebimento de um recurso pode ter, como e sabido, dois efeitos: ou suspende a execução da decisão impugnada ou tem, como diz a lei - artigo 660 do Codigo de Processo Penal - efeito meramente devolutivo. Esta disposição refere, porem, que os recursos não mencionados nos artigos 658, n. 1 e 659, onde se fixa o feito suspensivo, tem efeito meramente devolutivo, o que parece, desde logo, significar que so tem efeito suspensivo os recursos a que se referem aquelas duas disposições. Nestes termos decidiu o acordão da Relação, de 21 de Julho de 1976.
Pelo contrario, o acordão de 13 de Outubro decidiu ser o efeito suspensivo por considerar que o despacho que converte a multa em prisão constitui decisão complementar da sentença condenatoria, pelo que o respectivo recurso deve estar sujeito ao regime do recurso de tal sentença, que se encontra estabelecido no artigo 658, n. 1, do Codigo de Processo Penal.
Quanto ao primeiro acordão, decidiu ele cingindo-se a letra da lei, donde se conclui que so admite o efeito suspensivo nos casos expressamente previsto; relativamente ao segundo, o argumento empregado não nos parece decisivo, pois ainda que se admita que o despacho posterior a sentença que converte a pena de multa decretada nesta em pena de prisão e complementar da sentença, nem so por isso se pode afirmar que o efeito do recurso ha-de, necessariamente, ser o mesmo do da sentença.
O efeito do recurso, suspensivo ou meramente devolutivo, tem, naturalmente, que ver, com os interesses em jogo e, portanto, com a natureza da decisão impugnada, sendo muito claro que, em direito processual criminal, a lei ao fixar o efeito, teve em consideração tanto aqueles como esta, o que, alias, resulta do disposto no artigo 658 do Codigo de Processo Penal, vendo-se dele que das decisões penais condenatorias contidas em sentença ou acordão o recurso tem efeito suspensivo e isto porque tais decisões não devem ser executadas sem que transitem em julgado.
Alias, este principio esta presentemente enunciado no artigo 115 do Codigo Penal - o que tem conduzido este Tribunal a considerar suspensivo o recurso para o Tribunal Pleno, contrariamente ao que dispõe no n. 1 do artigo 765 do Codigo de Processo Civil, que não pode ter aplicação em processo criminal.
Se isto ja indicia que a lei teve em consideração, ao fixar o efeito do recurso, a situação penal do arguido, o que, de resto, tambem sucede no que se refere a pronuncia.
Alias, a terminologia do Codigo de Processo Penal no que se refere ao efeito do recurso, não e muito precisa, devendo notar-se que a linha traçada na lei processual civil não tem nele o mesmo rigor ou, sequer, a mesma expressão, como se pode ver dos artigos 658, 659 e 660 do Codigo de Processo Penal e dos artigos 734 e seguintes do Codigo de Processo Cicil.
Aquele, efectivamente, estabeleceu - artigo 660 - o efeito devolutivo como regra, depois de fixar os casos em que o recurso tem efeito suspensivo do processo.
No entanto, o efeito meramente devolutivo, quer dizer, que não suspende o andamento do processo, não pode entender-se aplicavel aos casos em que a decisão impugnada implica com a liberdade - situação que foi prevista no artigo 658, mas não de maneira completa.
Efectivamente, quando se impugna uma decisão judicial por via de recurso tem-se em vista um certo efeito util, que se traduz, em primeira linha, na fiscalização da decisão pelo Tribunal Superior e, em segunda, na modificação dela.
Ora, no caso em apreciação, o efeito util do recurso, na hipotese de modificação da decisão, so tem interesse se o efeito do recurso for suspensivo, tal como nos casos do artigo 658, pois, de contrario, ou seja, se tal efeito for meramente devolutivo, pode vir a perder qualquer interesse, pois o arguido pode ja ter cumprido a pena de prisão que resulta da conversão da pena de multa.
E claro que esta situação, que e a de verificação mais provavel e em si mesma contraria a obtenção do fim util do recurso e, por outro lado, conduz a criação de um resultado manifestadamente contrario ao interesse da pessoa, interesse que se traduz na existencia do bem da liberdade, a que corresponde o respectivo direito de personalidade.
Por isso se disse anteriormente que a qualificação do regime de subida do recurso tem que ver com os interesses em jogo. Ora se o interesse e aquele e a fiscalização do Tribunal Superior conduz a definição de uma situação que interfere com a liberdade da pessoa, e então claro que o efeito do recurso ha-de ser de forma a obstar a ofensa de tal interesse, o que quer dizer que, tal como nos casos do artigo 658, o efeito do recurso deve ser suspensivo. Na verdade, so assim se evita que ao proferir-se a decisão no Tribunal de recurso esta seja inutil por se haver ja verificado o cumprimento total ou parcial da pena de prisão resultante da substituição da pena de multa.
Alem destas considerações procedem as contidas na alegação do excelentissimo representante do Ministerio Publico, que conduzem, embora, em parte, por outra via, a mesma conclusão.
Em face do que vem de ser exposto, acordam, em conferencia, no Supremo Tribunal de Justiça em decidir, formulando assento, que:
O recurso interposto da decisão que converte em prisão a pena de multa aplicada tem sempre efeito suspensivo.
Não e devido imposto de justiça.

Lisboa, 15 de Fevereiro de 1978

Adriano Vera Jardim (Relator) - João Moura - Francisco Bruto da Costa - Rodrigues Bastos - Daniel Ferreira - Abel de Campos - Santos Vitor - Jose Montenegro - Eduardo Botelho de Sousa - Avelino da Costa Ferreira Junior- Costa Soares - Oliveira Carvalho - Artur Moreira da Fonseca - Hernani de Lencastre - Anibal Aquilino Ribeiro -
- Alberto Alves Pinto - Amandio dos Santos Cruz - Octavio Dias Garcia - Antonio Viana Correia Guedes - Rui de Matos Corte Real (Vencido, pois continuo a entender, como decidi varias vezes na Relação, em acordãos por mim relatados, que o efeito a atribuir a este recurso e o meramente devolutivo.
Na verdade, estamos perante um despacho proferido em execução de sentença - artigps 118 e seguintes do Codigo Penal e 625 e seguintes do Codigo de Processo Penal - não sendo, por conseguinte, nem complemento desta, nem a de equiparavel, para efeito do artigo 658, n. 1, desse Codigo, e como despacho que e em execução de sentença -
- artigo 628 do Codigo de Processo Penal - o efeito que lhe compete e o meramente devolutivo, como expressamente resulta do artigo 630 desse Codigo, não referido no douto acordão.
E não e aqui aplicavel o disposto no artigo 740, n. 2, alinea d) e 3, do Codigo de Processo Civil, porque o efeito do recurso esta expressamente previsto, como vimos, no citado artigo 630 do Codigo de Processo Penal, e como se comanda no artigo 649 deste Codigo, so se aplica as disposições relativas aos agravos civeis, quando não haja disposições em contrario no Codigo de Processo Penal, o que se verifica no caso presente.
As razões que se invocam para defender o efeito suspensivo, mormente a de o reu poder ter de cumprir a pena de prisão, resultante da conversão, antes de o recurso ser julgado, são de atender de jure constituendo, para uma futura alteração da lei, mas não tem valor para, de jure constituto revogar esta).