Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
031657
Nº Convencional: JSTJ00004297
Relator: FRANCISCO SOARES
Descritores: ESPECULAÇÃO
UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Nº do Documento: SJ196605040316573
Data do Acordão: 05/04/1966
Votação: MAIORIA COM 1 VOT VENC
Referência de Publicação: DG Nº 128, I-S DE 1966/06/01, PÁG. 943 - BMJ Nº 157, ANO 1966, PÁG. 115 - RLJ, ANO 99, PÁG. 144
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PARA O PLENO
Decisão: TIRADO ASSENTO.
Indicações Eventuais: ASSENTO DO STJ.
Área Temática: DIR ECON - DIR CONS.
Legislação Nacional: DL 38850 DE 1952/08/07 ARTIGO 9 PARUNICO.
DL 43557 DE 1961/03/24 ARTIGO 11 ARTIGO 12.
PORT 20048 DE 1963/09/04.
DL 41204 DE 1957/07/24 ARTIGO 21 N1 ARTIGO 24 N1 A N2 ARTIGO 25.
DESP DE 1957/11/04 IN DG DE 1957/11/05.
DL 45223 DE 1963/09/02 ARTIGO 18 PARUNICO.
DL 46595 DE 1965/10/15 ARTIGO 22 PAR2.
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO STJ DE 1964/06/11 IN BMJ N138 PAG140.
ACÓRDÃO STJ PROC31657 DE 1964/05/20.
Sumário :
A tolerancia no peso de cada unidade de pão, estabelecida no artigo 11 do Regulamento aprovado pelo Decreto-Lei n. 43557, de 24 de Março de 1961, no artigo 18 paragrafo unico, do Decreto-Lei n. 45223, de 2 de Setembro de 1963, e na Portaria n. 20048, de 4 deste mes e ano, refere-se somente ao fabrico e exposição a venda, e não tambem ao peso para efeito de venda.
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferencia, no Supremo Tribunal de Justiça:

O insigne Ajudante do excelentissimo Procurador-Geral da Republica junto da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça recorre para o Tribunal Pleno, para ser decidido, por meio de assento, o conflito de jurisprudencia existente entre os acordãos deste Supremo Tribunal, de 11 de Junho de 1964, no Boletim do Ministerio da Justiça, n. 138, pagina 240, transitado em julgado, e o acordão recorrido de 20 de Maio de 1964, junto por fotocopia, folhas 3 a 8 dos autos.
No primeiro acordão decidiu-se que a tolerancia, no peso do pão, a que aludem o artigo 9 do Decreto-Lei n. 38850, de 7 de Agosto de 1952, o artigo II do Regulamento aprovado pelo Decreto-Lei n. 43557, de 24 de Março de 1961 e a Portaria n. 20048, de 4 de Setembro de 1963, e so tolerancia de fabrico, não abrangendo a tolerancia no acto da venda.
Por isso a venda por preço superior ao correspondente ao peso real, mesmo que compreendido dentro da apontada tolerancia, integra o crime de especulação.
E no acordão recorrido, ponderando-se o estatuido nos citados preceitos, decidiu-se que a mencionada tolerancia, e, não so de fabrico, mas tambem de venda, e que, assim, a venda de pão por preço superior ao correspondente ao peso real, mas dentro do limite da tolerancia, não integra o crime de especulação.
Da leitura dos dois acordãos verifica-se, nitidamente, que, no dominio da mesma legislação, a mesma questão fundamental de direito foi resolvida por forma oposta, e que, por isso, se justifica o presente recurso.
Seguidos os vistos legais cumpre agora conhecer, depois de tudo visto e ponderado:
Ve-se do acordão recorrido que o reu A, na qualidade de socio gerente da padaria "B, Limitada", foi acusado pelo Ministerio Publico, por ter cometido um crime de especulação, previsto e punido pelos artigos 24, ns. 1, alinea a) e 2, 25 e 21, n. 1, do Decreto-Lei n. 41204, de 24 de Julho de 1957, com referencia ao despacho ministerial de 4 de Novembro seguinte, publicado no Diario do Governo, de 5 imediato.
E isto porque, no dia 7 de Novembro de 1962, naquele estabelecimento, vendeu a C catorze pães de farinha de trigo espoada, tipo extra, formato de 60 gramas, ao preço de 40 centavos por unidade, mas apenas com o peso de 780 gramas, acabando por lhe cobrar 5 escudos e 60 centavos, o que representa a especulação de 40 centavos.
Esta acusação não foi recebida, por se haver entendido que a falta de peso de pão verificada estava compreendida na tolerancia de 10% estabelecida pelo Decreto-Lei n. 38850, de 7 de Agosto de 1952.
Este entendimento foi confirmado pela Relação de Lisboa, acordão proferido no recurso, para ali interposto, e pelo acordão recorrido de 20 de Maio de 1964, junto por fotocopia, folhas 3 a 8.
Porem, salvo o devido respeito, o acordão recorrido não seguiu, em nosso parecer, a melhor doutrina, sobre a materia em apreço.
Com efeito, o Decreto-Lei n. 38850, de 7 de Agosto de 1952, no seu artigo 9, prescreve que a tolerancia no peso de cada unidade de pão, seja qual for a qualidade ou tipo, sera de 10% e de 6%, respectivamente para pão de peso inferior a 333 gramas, ou superior a este peso.
E no paragrafo unico do mesmo artigo determina-se que a verificação do peso do pão, na venda ambulante e domiciliaria, ou em feiras e mercados, sera feita por unidade, devendo nas padarias e seus depositos ser determinado pela media do peso verificado, em trinta unidades, quando o peso for inferior a 100 gramas; em vinte unidades quando esse peso for mais elevado, e inferior a 333 gramas; e em dez unidades quando o peso, por unidade, for superior;
O Regulamento aprovado pelo Decreto-Lei n. 43557, de 24 de Março de 1961, no seu artigo II, prescreve:
"O pão deve ter o peso legalmente estabelecido, para cada unidade, não sendo permitida a sua exigencia ou venda sem aquele peso, ressalvadas as tolerancias admitidas".
Por isso o artigo 12 do mesmo Regulamento exige a pesagem do pão no acto da venda.
Por sua vez, o Decreto-Lei n. 45223, de 2 de Setembro de 1963, no seu artigo 18 determina: A venda de qualquer tipo de pão sera feita por unidade.
E no paragrafo unico do referido artigo prescreve-se que as tolerancias de peso serão fixadas por despacho do Secretario de Estado do Comercio.
Por isso, a Portaria n. 20048, de 4 de Setembro de 1963, mantem a tolerancia de 10%, no peso de cada unidade de pão.
A verificação do peso, nos termos da mencionada portaria, sera feita por unidade nos pesos superiores a 333 gramas; quando o peso, por unidade, for inferior, seja a verificação, na venda ambulante domiciliaria, ou em feiras e mercados, feita pela media de 10 unidades; nas padarias e depositos pela media de 30, quando o peso, por unidade, for inferior a 100 gramas; e de 20 unidades, quando estiver compreendido entre 100 gramas e 333 gramas; e possa a verificação fazer-se antes da exposição a venda ao publico.
E mais recentemente o Diario do Governo, de 5 de Maio de 1964, inseriu, pelo Ministerio da Economia a declaração subscrita pelo Intendente-Geral dos Abastecimentos do teor seguinte:
"Para os devidos efeitos e ao abrigo do disposto no paragrafo unico do artigo 18 do Decreto-Lei n. 45223, de 2 de Setembro de 1963, Sua Excelencia o Secretario de Estado do Comercio, por despacho de 9 de Dezembro de 1963, esclareceu que a tolerancia de 10%, estabelecida pela Portaria n. 20048, de 4 de Setembro de 1963, refere-se somente ao fabrico.
O consumidor tem o direito de verificar que cada unidade tem o peso legal, sendo, portanto, obrigatoria a pesagem, sempre que exigida".
E evidente que, com esta pesagem, se teve em vista garantir, a pessoa que compra certa quantidade de pão, a certeza de que vai receber, realmente, das mãos do vendedor a quantidade certa que comprou.
Do atras exposto e licito inferir que a tolerancia de 10% estabelecida pela Portaria n. 20048, se refere somente ao fabrico.
Por isso o acordão recorrido não pode subsistir.
Por outro lado acresce que o Decreto-Lei n. 46595, de 15 de Outubro de 1965, no seu artigo 22, em que se mantem os preços maximos do pão, fixados, pela legislação anterior, bem como os pesos, por unidade, tambem determinados, estabelece no paragrafo 2 que se mantem, para o fabrico, a tolerancia de 10%, no peso de cada unidade de pão, seja qual for a qualidade ou tipo.
Este preceito, como resulta dos seus termos e de natureza interpretativa, e, por isso de aplicação retroactiva.
Por isso, salvo o devido respeito, não pode haver duvida que a tolerancia e so para o fabrico.
Nestes termos acordam os juizes do Supremo Tribunal de Justiça, dando provimento ao recurso, em revogar o acordão recorrido e formulam o seguinte assento:
"A tolerancia no peso de cada unidade de pão, estabelecida no artigo II do Regulamento aprovado pelo Decreto-Lei n. 43557, de 24 de Março de 1961, no artigo 18, paragrafo unico, do Decreto-Lei n. 45223, de 2 de Setembro de 1963, e na Portaria n. 20048, de 4 deste mes e ano, refere-se somente ao fabrico e exposição a venda, e não tambem ao peso para efeito de venda".
Sem imposto.

Lisboa, 4 de Maio de 1966

Francisco Soares (Relator) - Ludovico da Costa - Joaquim de Melo - H. Dias Freire - Lopes Cardoso - Fernando Bernardes de Miranda - Gonçalves Pereira - Alberto Toscano
- Albuquerque Rocha - Oliveira Carvalho - Torres Paulo - Adriano Vera Jardim - Correia Guedes - Antonio dos Santos Rocha - J. Santos Carvalho (Vencido. Em meu parecer e salvo o devido respeito, a doutrina do assento so esta certa para a epoca posterior ao despacho publicado no Diario do Governo, de 5 de Maio de 1964. Ate ai e o presente processo refere-se a factos anteriores, as disposições legais eram concludentes no sentido de se equipararem, para efeitos de tolerancia de peso, o fabrico e a venda do pão).