Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
1050/09.7TBBGC.G1.S1
Nº Convencional: 6.ª SECÇÃO
Relator: JOÃO CAMILO
Descritores: RECURSO DE APELAÇÃO
IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
PRAZO DE INTERPOSIÇÃO DE RECURSO
PRORROGAÇÃO DO PRAZO
CONTAGEM DE PRAZOS
Data do Acordão: 11/28/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: INDEFERIDA A RECLAMAÇÃO.
Área Temática:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL – PROCESSO EM GERAL / ATOS PROCESSUAIS / ATOS EM GERAL – PROCESSO DE DECLARAÇÃO / RECURSOS.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 138.º, N.º 1, 139.º, N.ºS 3 E 5, 141.º, N.º 2 E 638.º, N.ºS 1 E 7.
Sumário :
I - O prazo para a interposição de recurso de apelação em que se impugna a decisão da matéria de facto é de 40 dias, contado da data da notificação da decisão recorrida – art. 638.º, n.os. 1 e 7, do CPC.

II - A prorrogação do prazo inicial por acordo das partes – art. 141.º, n.º 2, do CPC – deve ser comunicada ao tribunal no seu decurso e inicia-se desde o termo daquele prazo inicial, e não do despacho que a considera verificada.

III - O prazo suplementar dos três dias úteis previsto no art. 139.º, n.º 5, do CPC, apenas pode ser contado no termo do prazo total – prazo inicial e prorrogação – e não no termo do prazo inicial.

IV - Prorrogado o prazo legal para a interposição do recurso de apelação, fica a haver um único prazo com a duração do tempo do prazo legal acrescido do tempo da prorrogação.

V - A circunstância de o termo do prazo inicial de 40 dias ocorrer numa sexta-feira, não determina que a prorrogação inicie apenas segunda-feira, mas antes sábado, não se aplicando neste particular a regra prevista no art. 138.º, n.º 1, do CPC.

Decisão Texto Integral:



Revista nº 1050/09.7TBBGC.G1.S1.

Acordam em conferência no Supremo Tribunal de Justiça:

AA intentou a presente ação com processo comum, no Tribunal da Comarca de ..., contra BB, Lda., CC, DD e EE, formulando um conjunto de pedidos referentes à vida social da ré sociedade de que as demais rés são ou foram sócias ou gerentes.

A ação foi julgada parcialmente procedente.

A respetiva sentença foi notificada aos mandatários das partes, via Citius, em 4-09-2015.

Em 4-10-2015, a autora e as rés vieram comunicar terem acordado na prorrogação do prazo “ que as RR dispõem para interpor recurso da decisão proferida em 24-07-2015, por uma vez e por igual período”, requerendo que fosse admitida tal prorrogação nos termos acordados.

Em 7-10-2015 foi proferido seguinte despacho:

Face ao acordo das partes prorrogo o prazo para a interposição de recurso por igual período – art. 141º, nº 2 do NCPC”.

Tal despacho foi notificado aos mandatários das partes, via Citius, em 7-10-2015.

Em 19/10/2015, a autora e as rés vieram declarar que “por mútuo acordo, exercem por uma vez e por igual período a faculdade de prorrogação do prazo de 30 dias, acrescido de 10 dias, para a autora interpor nos autos recurso de apelação, tendo por objeto a reapreciação da prova gravada”.

Em 22/10/2015 foi proferido o seguinte despacho:

“ Face ao acordo das partes prorrogo o prazo para apresentar alegações de recurso pelo prazo de 30 dias, acrescido de 10 dias, para a autora interpor nos autos recurso de apelação, tendo por objeto a reapreciação da prova gravada – art. 141º, nº 2 do NCPC”.

Tal despacho foi notificado aos mandatários das partes, via Citius, em 23/10/2015.

A autora, em 4/12/2015, interpôs recurso de apelação da aludida sentença, com impugnação da decisão da matéria de facto, acompanhando as alegações das respetivas conclusões, tendo procedido ao pagamento de multa ” pela prática do acto no 3ºdia útil após o termo do prazo”.

No tribunal de 1ª instância foi o recurso de apelação recebido, tendo sido distribuído no Tribunal da Relação de ….

Aqui a Senhora Desembargadora Relatora , depois de ouvir as partes, decidiu, singularmente, rejeitar o recurso por extemporâneo.

Reclamando a apelante para a conferência, foi mantido o despacho de rejeição do recurso.

Deste acórdão interpôs a autora a presente revista, tendo neste Supremo Tribunal sido o objeto deste recurso conhecido nos termos do art. 656º do Cód. de Proc. Civil,  de forma singular e sumária, negando-se a revista pedida.

Atempadamente, veio a recorrente reclamar daquela decisão para a presente conferência, não tendo sido apresentada resposta.

Dispensados os vistos, urge apreciar e decidir.

Nas alegações apresentadas pela recorrente nesta revista foram formuladas conclusões que, por falta de concisão, não serão aqui transcritas.

Daquelas resulta que a recorrente, para conhecer neste recurso levanta apenas a questão seguinte:

O recurso de apelação foi interposto tempestivamente ?  

Não foram apresentadas contra-alegações.

Cumpre decidir.

Os factos e os parâmetros processuais apurados com interesse para a decisão da presente revista são os acima relatados.

Passaremos  agora para a  apreciação da  questão acima apontada como objeto deste recurso.

Está aqui em causa simplesmente determinar como se faz a contagem de um prazo para a interposição de recurso de apelação, em caso em que há impugnação da decisão da matéria de facto e em que houve acordo entre as partes para a prorrogação do respetivo prazo legal, nos termos do art. 141º, nº 2 do Cód. de Proc. Civil, a que pertencerão todas as disposições a citar sem indicação de origem.

Não temos dúvidas que a recorrente carece de razão na sua pretensão.

Com efeito, o prazo para a interposição de recurso de apelação em que se impugna a decisão da decisão da matéria de facto é de quarenta dias, contados da data da notificação da decisão recorrida – art. 638º, nºs 1 e 7.

Por seu lado, o art. 138º, nº 1 estipula que o prazo processual estabelecido por lei ou fixado pelo juiz é contínuo, suspendendo-se, no entanto, durante as férias judiciais, salvo se a sua duração for igual ou superior a seis meses ou se tratar de atos a praticar em processos que a lei considere urgentes.

Além disso, o art 141º, nº 2 prescreve que, havendo acordo das partes, o prazo é prorrogável por uma vez e por igual período.

Segundo a recorrente a contagem do prazo no caso em apreço deve ser efetuada contando-se a prorrogação apenas a partir da data da decisão que admitiu a prorrogação do prazo.

O acórdão recorrido entendeu de forma oposta, ou seja, no sentido de que o prazo total – inicial ou legal acrescido da respetiva prorrogação - deve ser contado ininterruptamente desde a notificação da decisão apelada até ao fim do prazo total.

Parece-nos que tendo em conta a apontada natureza contínua da contagem dos prazos, a exigência de a prorrogação ter de ser comunicada dentro do decurso do prazo inicial – pois de outro modo já não haveria prorrogação do prazo, que estaria extinto, nos termos do a rt. 139º, nº 3, mas apenas poderia haver uma atribuição de novo prazo -, a contagem do prazo terá de ser contínua, no sentido de que se iniciaria com a notificação da decisão apelada e contar-se-ia o prazo inicial acrescido da prorrogação por igual prazo, ininterruptamente.

A circunstância de as partes terem de comunicar em juízo a existência de um acordo de prorrogação apenas tem por finalidade o controlo judicial sobre a verificação desse acordo, não podendo o julgador deduzir qualquer obstáculo a essa prorrogação, obstáculo este que não fosse a não verificação do referido acordo.

Este entendimento é o que as Relações vêm adotando e corresponde a uma interpretação que respeite os princípios da celeridade processual, além da regra da continuidade dos prazos.

A recorrente ainda pretende que se assim se não entender como defende, deve a contagem efetuar-se contando com o prazo de três dias úteis no fim da contagem do prazo inicial e só depois começar a contar a prorrogação, com o que a interposição do recurso deveria ser considerada como tendo sido feita no terceiro dia útil após o decurso do prazo, o que seria válido pois foi paga a multa prevista no art. 139º, nº 5.

Também não podemos concordar com tal pretensão.

O prazo suplementar de três dias úteis previsto no referido nº 5 do art. 139º apenas pode ser contado validamente, no término da contagem do prazo total – prazo inicial e a prorrogação efetuada.

Não pode ser utilizada a faculdade de praticar o ato após o decurso do prazo nos três dias úteis posteriores ao fim do prazo senão uma vez, ou seja, no fim da contagem do prazo total e não pode ser desdobrado  o prazo total em prazo inicial, com a interposição de três dias e só depois iniciar-se a contagem da prorrogação, com novo faculdade de praticar o ato validamente nos três dias úteis seguintes.

A este entendimento se opõe a referida regra da continuidade dos prazos e a própria razão da existência da previsão do art. 139º, nº 5 que visa, após o termo do prazo – seja simples ou resultando de um prazo inicial com prorrogação - , permitir a prática do ato com o pagamento da multa nos três dias úteis seguintes ao termo do decurso do prazo total, ou seja, com a duração inicial e a prorrogação.

Estes foram os considerandos constantes da decisão reclamada.

Perante os mesmos, a reclamante veio, em síntese, apontar dois argumentos:

a) A contagem do tempo de prorrogação do prazo apenas se deve iniciar após a decisão que admitiu a mesma prorrogação do prazo.

b) Se assim se não entender deve ser contado o prazo inicial com o término no dia 19-10-2015, por o último dia dos quarenta dias ocorrer ao sábado dia 17, contando-se o primeiro dia da prorrogação de quarenta dias no dia 20-10-2017.

Não concordamos com estas pretensões.

A da alínea a) foi já suficientemente rebatida acima.

Quanto à segunda pretensão, diremos que a regra da continuidade dos prazos não permite satisfazer tal pretensão.

Prorrogado o prazo legal para a interposição do recurso de apelação, fica a haver um único prazo com a duração do tempo do prazo legal acrescido do tempo de prorrogação.

Por isso, a contagem, não se interrompe com os sábados e domingos, conforme prescreve o art. 138º, nº 1.

Desta forma, o referido dia 17 de Outubro de 2015 constitui o quadragésimo dia do prazo, sendo os mencionados dias 18 e 19 de Outubro de 2015, respetivamente, domingo e segunda feira, os quadragésimo primeiro e o quadragésimo segundo dia do prazo total de oitenta dias para interpor a referida apelação.

Assim, o último dia do referido prazo total ocorreu no dia 26 de Novembro de 2015 e a interposição do recurso podia ter sido efetuada até ao dia 1 de Dezembro de 2015 com o pagamento da multa prevista no art. 139º, nº 5.

Como apenas em 4 de Dezembro de 2015 a reclamante deu entrada do requerimento de interposição de recurso, estava então este fora do prazo legal.

Desta forma, improcede os argumentos da reclamante.

Pelo exposto, se rejeita a reclamação, confirmando a decisão reclamada que negou a revista pedida.

Custas pela reclamação, com a taxa de justiça de duas unidades de conta.  

28-11-2017

João Camilo - Relator

Fonseca Ramos

Ana Paula Boularot