Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
059791
Nº Convencional: JSTJ00002648
Relator: GONÇALVES PEREIRA
Descritores: SERVIDÃO DE PASSAGEM
EXTINÇÃO
PRÉDIO ENCRAVADO
UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Nº do Documento: SJ196505070597911
Data do Acordão: 05/07/1965
Votação: UNANIMIDADE
Referência de Publicação: DG I-S 1965/05/28, PAG. 652 - BMJ N º 147, ANO 1965, PÁG. 81
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PARA O PLENO
Decisão: TIRADO ASSENTO.
Indicações Eventuais: ASSENTO DO STJ.
Área Temática: DIR CIV - DIR REAIS.
Legislação Nacional: CCIV867 ARTIGO 2279 PARUNICO ARTIGO 2313 PARUNICO.
DL 19126 DE 1930/12/16.
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO STJ DE 1946/12/17 IN COL OF ANOVI PAG532.
ACÓRDÃO STJ DE 1963/03/08 IN BMJ N125 PAG504.
Sumário :
O artigo 2313 e paragrafo unico do Codigo Civil são aplicaveis somente nas servidões de passagem em beneficio de predio encravado.
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferencia, os do Supremo Tribunal de Justiça em Tribunal Pleno:

A sociedade por quotas "A, Limitada" recorre para o Tribunal Pleno do acordão deste Supremo Tribunal, de 8 de Março de 1963, que decidiu ser aplicavel o artigo 2 313 do Codigo Civil, relativo a cessação de servidão de passagem, somente no caso de esta servidão ter sido constituida em beneficio de um predio encravado.
Alega a recorrente que este acordão esta em manifesta oposição com o de 17 de Dezembro de 1946, proferido em processo diferente, no dominio da mesma legislação e no qual se julgou que o referido artigo 2 313 aplica-se a todas as servidões de passagem, mesmo em relação aquelas que não digam respeito a predios encravados.
Da leitura dos dois acordãos verifica-se a nitida oposição sobre esta questão fundamental de direito justificando-se o presente recurso.
Tudo visto:
Examinada a questão, atenta e objectivamente, nos seus variados aspectos, julgamos que a solução mais legal e a que foi adoptada no acordão recorrido.
Preceitua o artigo 2 313 do Codigo Civil que a obrigação de prestar passagem pode cessar a requerimento do proprietario do predio serviente, cessando a necessidade da servidão ou se o dono do predio dominante, por qualquer modo, tiver possibilidade de comunicação igualmente comoda com a via publica por terreno seu.
O Decreto-Lei n. 19 126 acrescentou o paragrafo unico, o qual determina que a disposição do artigo 2 313 e aplicavel as servidões de transito, qualquer que tenha sido o titulo da sua aquisição; no caso de ter havido indemnização, sera esta restituida pelo desonerado.
Este paragrafo unico não alargou o ambito da aplicação do artigo 2 313 do Codigo Civil as servidões para predios não encravados; veio somente esclarecer que a servidão podia cessar mesmo no caso de não ter havido indemnização.
A expressão "titulo de aquisição" indica a origem da servidão; não alude a natureza do predio a favor do qual foi constituida a servidão.
O mencionado paragrafo unico veio abranger, alem das servidões constituidas coercivamente, as resultantes de negocio juridico ou prescrição, tenha havido ou não indemnização.
A entender-se que nos termos do citado paragrafo unico as servidões de passagem criadas por negocio juridico em beneficio de predios não encravados podem cessar, desde que se tornem desnecessarias ao predio dominante, havia que ter-se como revogado o paragrafo unico do artigo 2 279 do Codigo Civil que, para as servidões constituidas para predio não encravado so admite que sejam declaradas extintas por desnecessarias as servidões constituidas por prescrição.
E norma de interpretação não alargar os preceitos especiais para alem dos casos por eles regulados; este principio seria posto de parte se fossem aplicadas as citadas disposições que so regem para o caso de direito de acesso ou transito, as servidões em geral.
Alem disso, a colocação do artigo 2 313 num capitulo referente a servidão de passagem sobre predios encravados significa que não se trata de um preceito generico porque, neste caso, deveria conter-se entre as disposições gerais (Professor Pires de Lima, Revista de Legislação e de Jurisprudencia, ano 77, pagina 3).
O aludido paragrafo unico reproduz textualmente a proposta de lei de 7 de Fevereiro de 1903, que o Professor Guilherme Moreira (Revista de Legislação e de Jurisprudencia, ano 36, pagina 145) interpretou como não tendo resolvido o problema de saber se era aplicavel as servidões de transito voluntarias.
O principio de fazer terminar servidões inuteis, de restringir o menos possivel a propriedade plena, não tem aplicação no campo das servidões contratuais para predio que não era encravado a data da sua constituição. Seria a violação da liberdade contratual e da eficacia dos contratos.
Na servidão para predios encravados, constituida por decisão judicial ou voluntariamente, ha um condicionalismo que a fez surgir: a encravação. E legitimo que a servidão cesse, quando cessar esse condicionalismo.
Nos outros casos, foi uma vontade autonoma que se obrigou; não havia na lei poder coactivo impondo a obrigação de contratar.
Esta orientação foi consignada no projecto do novo Codigo Civil (artigo 1 561, ns. 2 e 3, Livro III, Direito das Coisas, primeira revisão ministerial, Boletim do Ministerio da Justiça, n. 124).
Pelo exposto, negam provimento ao recurso e formulam o seguinte assento:
O artigo 2 313 e paragrafo unico do Codigo Civil são aplicaveis somente nas servidões de passagem em beneficio de predio encravado.
Custas pela recorrente.

Lisboa, 7 de Maio de 1965

Gonçalves Pereira (Relator) - Alberto Toscano - Fragoso de Almeida - Albuquerque Rocha - Simões de Carvalho - Torres Paulo - Eduardo Tovar de Lemos - Ludovico da Costa
- Antonio Teixeira Botelho - Lopes Cardoso - Toscano Pessoa - Barbosa Viana - Joaquim de Melo - Henrique Dias Freire.