Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
354/16.7T8PTM.E1.S1
Nº Convencional: 4ª SECÇÃO
Relator: CHAMBEL MOURISCO
Descritores: DESPEDIMENTO ILÍCITO
INDEMNIZAÇÃO DE ANTIGUIDADE
Data do Acordão: 04/11/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA EM PARTE
Área Temática:
DIREITO DO TRABALHO – CONTRATO DE TRABALHO / DIREITOS, DEVERES E GARANTIAS DAS PARTES / CESSAÇÃO DE CONTRATO DE TRABALHO / DESPEDIMENTO POR INICIATIVA DO EMPREGADOR / ILICITUDE DE DESPEDIMENTO / CESSAÇÃO DE CONTRATO DE TRABALHO POR INICIATIVA DO TRABALHADOR / RESOLUÇÃO DE CONTRATO DE TRABALHO PELO TRABALHADOR.
Doutrina:
-João Leal Amado, Contrato de Trabalho, noções básicas, 2016, Almedina, p. 363;
-Pedro Furtado Martins, Cessação do Contrato de Trabalho, 4.ª Edição, revista e atualizada, Principia, p. 555;
-Pedro Romano Martinez, Direito do Trabalho, 2017, 8.ª Edição, Almedina, p. 1057.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DO TRABALHO (CT): - ARTIGOS 128.°, 381.º, 391.º E 396.° N.º 1.
Sumário :

I. Na fixação do valor da indemnização em substituição da reintegração deve atender-se ao valor da retribuição, ao grau de ilicitude do despedimento e ainda ao tempo decorrido desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial.

II. O valor da retribuição é ponderado na graduação da indemnização que tenderá a ser mais elevada para um trabalhador que aufira uma remuneração inferior à média e menor quando a retribuição se situa acima da média.

III. O grau de ilicitude do despedimento é ponderado atenta a graduação estabelecida no art.º 381.º do Código do Trabalho, devendo-se atender ao grau de culpa do empregador, nomeadamente na apreciação do motivo justificativo invocado.

IV. O tempo decorrido desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial deve ser considerado, sendo razoável que o montante da indemnização seja tanto menor quanto maior for o dos salários intercalares.

V. É adequada uma indemnização em substituição da reintegração graduada em vinte e dois dias de retribuição base e diuturnidades num caso em que o despedimento foi declarado ilícito por violação do princípio da proporcionalidade, num quadro em que o grau de ilicitude do despedimento não se pode considerar elevado, tendo ainda em consideração que a retribuição auferida pelo trabalhador situa-se na média e que tendo o autor sido despedido em 02/02/2016 irá receber salários intercalares até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento, o que ainda não se verificou.

Decisão Texto Integral:

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:

                                                           I

 Relatório:

 1. AA intentou contra BB, S.A., a presente ação de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento.

 Não tendo sido obtida a conciliação o empregador apresentou articulado para motivar o despedimento, no qual alegou, em síntese, que o autor detinha a categoria profissional de Diretor Coordenador e exercia as funções de responsável no estabelecimento comercial CC Portimão, explorado por si, e que lhe moveu um processo disciplinar no termo do qual veio a concluir estarem demonstrados os factos constantes da nota de culpa e, por via disso, que o comportamento do mesmo inviabilizou a manutenção do vínculo laboral, decidindo-se pelo respetivo despedimento com justa causa.

Concluiu pela improcedência da ação, requerendo a exclusão da reintegração do trabalhador, em conformidade com o disposto no artigo 392.º, n.º 1 do Código do Trabalho.

2. O trabalhador respondeu, impugnando os factos e deduzindo reconvenção, alegando, em síntese, que não correspondem à verdade os factos alegados pela ré empregadora e que, por isso, inexiste qualquer justa causa que possa fundamentar o seu despedimento.

Concluiu, assim, que não praticou qualquer comportamento violador dos seus deveres laborais, conducente ao despedimento, peticionando a declaração de ilicitude do mesmo e a condenação da ré no pagamento ao autor das retribuições vencidas e vincendas, desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão, bem como indemnização pelo despedimento ilícito, em substituição da reintegração, que computa em € 29.862,00 e indemnização a título de danos não patrimoniais, no montante de € 15.000,00.

3. A ré apresentou resposta, reiterando o já afirmado no seu articulado motivador e pugnando pela improcedência da reconvenção.

4. Foi proferido despacho saneador, tendo-se aferido positivamente todos os pressupostos processuais relevantes e dispensado a fixação dos temas da prova.

5. Procedeu- se à realização da audiência de discussão e julgamento, tendo sido proferida sentença que decidiu:

a) Declarar a ilicitude do despedimento do autor;

b) Condenar a ré no pagamento ao autor das retribuições (no valor mensal de € 1. 355,00 + € 304,90) que seriam devidas desde a data do despedimento e até ao trânsito em julgado da presente decisão – nestas se incluindo as férias e os subsídios de férias e de Natal durante todo esse período – sem prejuízo do eventual desconto das quantias a que se refere o artigo 390.º n.º 2, alínea c), do Código do Trabalho, acrescidas dos juros calculados à taxa legal, desde o vencimento de cada uma das prestações, até integral pagamento;

c) Condenar a ré no pagamento ao autor de uma indemnização, em valor equivalente a quarenta dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano ou fração de antiguidade até à data do trânsito em julgado da decisão (consignando-se que a antiguidade do autor remonta ao dia 02 de dezembro de 1997 e que a retribuição a atender é de € 1.355,00 mensais), acrescida dos juros, calculados à taxa legal, desde o trânsito em julgado da decisão, até integral pagamento;

d) Os valores constantes dos pontos 2 e 3 deverão ser fixados em liquidação, a efetuar em sede de eventual execução de sentença, por a sua fixação depender da data do trânsito em julgado da decisão;

e) No mais, julga-se improcedente o pedido de indemnização por danos não patrimoniais formulado pelo autor.

f) Custas pelo autor e pela ré, em função do respetivo decaimento, que se fixa em ⅛ para o autor e ⅞ para a ré (cf. artigo 527.º do Código de Processo Civil).

g) Fixa-se o valor da ação em € 44.862,00 (cf. artigo 98.º-P n.º 2 do Código de Processo do Trabalho e artigo 297.º n.º 1 do Código de Processo Civil)

6. Inconformada com esta decisão a ré interpôs recurso de apelação para o Tribunal da Relação que decidiu julgar a apelação parcialmente procedente, alterar parte da matéria de facto dada como provada e revogar a sentença recorrida na parte em que condenou a ré no pagamento ao autor de uma indemnização em valor equivalente a quarenta dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano ou fração de antiguidade e, nesta parte, condenar a ré no pagamento ao autor de uma indemnização em valor equivalente a quinze dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano ou fração de antiguidade e manter quanto ao mais a sentença recorrida.

7. Por sua vez, o autor inconformado com o decidido pelo Tribunal da Relação interpôs recurso de revista, tendo formulado as seguintes conclusões:

a) O presente recurso de Revista interposto do douto Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora porquanto este julgou parcialmente procedente a apelação interposta por BB, S.A., alterando parte da matéria dada como provada, e diminuindo para mais de metade o quantum indemnizatório fixado pelo Tribunal de 1.ª Instância, tendo entendido que embora não haja fundamento para o despedimento do trabalhador ora recorrente, fixou a indemnização a pagar pela entidade patronal em 15 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano ou fração de antiguidade, quando o Tribunal de 1.ª Instância havia fixado em 40 dias;

 b) Dos factos provados e com relevância destacam-se os seguintes:

(a recorrente transcreve os factos dados como provados nos números 3 a 5, 41 a 49, 53 a 60, 66 a 68, 70 e 71)

c) Não podem ser imputados ao trabalhador aqui recorrente os prejuízos decorrentes da destruição de bens alimentares atingidos pelos roedores no estabelecimento CC, pois o trabalhador tomou as diligências urgentes e de imediato logo que o problema surgiu, embora o seu superior hierárquico visitasse o estabelecimento semanalmente, não ficou demonstrado que o estabelecimento estivesse sujo, com falta de higiene e que foi por este motivo que os roedores surgiram, pelo contrário, ficou provado que o trabalhador tinha a sua equipa deficitária;

d) Existe pelo contrário, prova expressa e inequívoca de que o trabalhador teve um comportamento adequado, que sempre acionou as entidades que teriam que intervir, mais concretamente a "DD", a que acresce o facto de face a toda a prova produzida em Audiência de Julgamento, o Tribunal da Relação violou de forma expressa o previsto no artigo 391° n° 1 do Código do Trabalho, porquanto não foi feita qualquer prova da conduta culposa do trabalhador aqui recorrente, pelo que o Tribunal da Relação de Évora, não podia ter decidido pela redução para o mínimo legal, porquanto não foi feita qualquer prova que justifique nem o comportamento culposo do Autor nem os prejuízos para a entidade empregadora;

e) Considerou o Tribunal de 1.ª Instância e muito bem que: "Há que reconhecer que a existência de uma praga de roedores no interior de um restaurante aberto ao público é, obviamente, uma situação grave, diremos mesmo muito grave. Tal gravidade, no entanto, não pode ser transporta, sem mais, para os ombros do responsável da loja, ignorando todas as circunstâncias acessórias apuradas. Ora, o que resultou da instrução da causa é que, desde Junho de 2015 (data em que pela primeira vez são detetados vestígios de roedores) paulatinamente, foram desenvolvidas estratégias tendo em vista o controlo e eliminação da aludida praga (o que aliás está bem patente no relatório técnico elaborado pelo técnico da empresa de controlo de pragas, "DD ", que consta a fls 195 a 197 dos autos) e que, em alguns períodos, a mencionada praga parecia ter sido erradicada, verificando‑se posteriormente que assim não fora e, ainda, que só em setembro de 2015 foi desencadeada uma atuação "musculada", com a intervenção da manutenção, tendo em vista a selagem dos potenciais acessos dos roedores ao estabelecimento.

 Ou seja o que se observa é um processo dinâmico, no qual o Autor e os demais profissionais envolvidos foram adotando estratégias evolutivas, com vista ao controlo da praga. Não pode, por isso, dizer-se que se manteve inativo ou que não se preocupou com a questão que tinha em mãos (e, quase seria desnecessário dizer-se, não existe qualquer indício de que o autor pudesse ser o causador do aparecimento dos roedores no estabelecimento).

... é verdade que, em 24.09.2015, o autor sabia que o seu superior hierárquico estava de férias e, em consequência, podia suspeitar que o e-mail que enviou não seria lido no próprio dia - e é igualmente verdade que a situação constatada nesse dia reclamava ação imediata. Porém não pode dizer-se que o autor nada tenha feito além de enviar o e-mail: dos factos provados resulta que, mais uma vez, desencadeou a intervenção da "DD"- e note-se que, de acordo com o relatório a que já acima se fez referência, só nessa data é que o técnico de controlo de pragas terá alertado o autor/responsável da loja para a necessidade de serem tapados buracos nas paredes falsas, locais por onde os ratos poderiam estar a sair).

.... Resulta do exposto que, contrariamente ao invocado pela ré (e ao que consta dos fundamentos da decisão de despedir o autor), não se demonstrou que tenha existido reiterado desrespeito pelos procedimentos instituídos pela entidade patronal ou evidente falta de zelo no desempenho das suas funções. Por outro lado não resulta da matéria de facto dada como provada que o comportamento do autor tenha importado uma lesão grave de interesses patrimoniais sérios do empregador. É verdade que a eliminação da praga teve custos para a ré (em montante que não foi apurado) e que a existência da mesma é suscetível de pôr em risco o respetivo negócio, mas não está demonstrado que tais custos sejam consequência da atuação do autor: a ré tinha uma praga no seu restaurante e tinha que eliminá-la, suportando, naturalmente o custo da intervenção.

... Em suma, a factualidade provada não permite que se conclua que o autor tenha agido de forma flagrantemente contrária aos interesses da ré ou que tenha existido reiterada desobediência ilegítima aos procedimentos instituídos pela entidade empregadora.

 f) O despedimento do autor, aqui recorrente foi ilícito, e porque os motivos invocados pela Ré entidade patronal não justificam o despedimento do ora recorrente, temos que atender ao facto de o trabalhador estar ao serviço da Ré há 18 anos, nunca foi alvo de qualquer processo disciplinar e da matéria dada como provada não se pode concluir que o comportamento levado a cabo pelo aqui recorrente seja de tal modo grave para a entidade patronal, que este tenha que ser "castigado" vendo a indemnização que lhe havia sido fixada pelo Tribunal de 1.ª Instância diminuída para o mínimo legal, pois não resultam dos factos provados que permitam concluir que o autor agiu de forma grave, pelo contrário face aos factos que ficam provados e tal como consta da decisão proferida pela 1.ª Instância ele "é um trabalhador brioso e empenhado, desempenhando funções de responsabilidade que implicaram o investimento de muitas horas de disponibilidade, atenta a falta de pessoal, com competências de direção em funções no estabelecimento da Ré. (Sic decisão da 1.ª Instância).

 g) O Tribunal da Relação ao julgar parcialmente procedente o recurso no que respeita ao cômputo da indemnização violou o disposto nos artigos 128.° e 391.° e 396 n.º 1 todos do Código de Trabalho, na medida em que considerou que a conduta do trabalhador é grave e censurável, quando na nossa modesta opinião, o trabalhador agiu com zelo e diligência, nunca deixando de tomar providências relativamente ao problema existente no estabelecimento da sua entidade patronal, tudo tendo feito para que o problema fosse debelado, mal andou o seu superior hierárquico que desde 15 de julho de 2015 que sabia do problema e ele sim tinha como dever comunicar aos superiores hierárquicos e não o fez, não podendo ser o autor a sofrer as consequências da atuação do seu superior hierárquico, tanto assim que este último sempre lhe disse que queria ser informado de tudo e que era ele quem tinha que comunicar à direção da marca e nunca o trabalhador Autor e aqui recorrente.

h) O ora recorrente tudo fez para debelar o problema, tomou todas as providências necessárias, a loja teve várias inspeções, todas pedidas por ele e no dia 20 de setembro de 2015, ele embora tenha enviado e-mail ao seu superior hierárquico, acionou de imediato a presença da "DD", não ficou parado e sem resolver a questão, chamou de imediato a empresa responsável;

i) Tal como o Tribunal de 1.ª Instância entendeu e no nosso modesto entendimento muito bem "trabalhando o autor para a ré desde 2 de dezembro de 1997, sem que em qualquer ocasião anterior tivesse sido alvo de qualquer reparo disciplinar e sem que haja notícia de quaisquer comportamentos anteriores que evidenciem menor cuidado ou empenho na execução das suas funções, os factos apurados que são suscetíveis de representar incumprimento de deveres laborais (designadamente a falta de contato direto com os responsáveis da marca, na ausência do coordenador), não permitem concluir pela impossibilidade da subsistência da relação laboral, "

 j) Mais consta da matéria dada como provada que: "O autor tinha instruções para reportar todas as situações ao seu superior hierárquico direto, não estando normalmente previsto que contactasse diretamente com a direção nacional da marca", concluindo o Tribunal recorrido que: "o que deixa a entender que o superior hierárquico do autor é que era o seu interlocutor direto e quem tomava a decisão de contratar alguém para desratizar e que o autor só tinha que comunicar a este." Ponto 43 dos factos provados.

k) O Tribunal da Relação não poderia ter reduzido para o mínimo o valor da indemnização devida ao trabalhador, e ao decidir pela procedência parcial no que à indemnização respeita, violou expressamente o disposto no artigo 128.° e 391.º e 396.° n.º 1 ambos do Código de Trabalho.

1) Havendo assim uma ofensa expressa destas disposições legais, o presente recurso é admissível, nos termos do disposto no artigo 674.º n.º 3 do CPC, na medida em que ofende expressamente as disposições legais supra indicadas, uma vez que face a matéria provada não poderia o Tribunal da Relação "a quo" ter alterado de forma tão drástica o valor da indemnização.

 

8. A ré contra-alegou, defendendo a improcedência do recurso de revista interposto pelo autor.

9. Neste Supremo Tribunal de Justiça, o Excelentíssimo Senhor Procurador‑Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que deve ser negada a revista.

7. Nas suas conclusões, o recorrente suscita a questão de saber se o Tribunal da Relação, ao reduzir para o mínimo o valor da indemnização devida em substituição da reintegração, violou o disposto nos artigos 128.° e 391.º e 396.° n.º 1 do Código de Trabalho.

                                                           II

A) Fundamentação de facto:

O Tribunal da Relação após ter apreciado a impugnação da decisão relativa à matéria de facto, a requerimento da ré, fixou a seguinte factualidade:

1. A ré dedica-se ao exercício da atividade de produção e comercialização de produtos alimentares e restauração, bem como atividades conexas (4.º do articulado motivador).

2. No exercício da sua atividade, a ré detém a exploração do estabelecimento comercial da marca «CC» instalado no Centro Comercial …Portimão, sito em Portimão, de ora em diante CC Portimão (5º do articulado motivador).

3. O autor foi admitido ao serviço da ré no dia 02 de dezembro de 1997, mediante a celebração de um Contrato de Trabalho a Termo Certo, o qual se converteu posteriormente em Contrato de Trabalho por Tempo Indeterminado, nos termos que constam dos documentos de fls. 110 a 115, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido (6.º do articulado motivador).

4. À data dos factos sub judice, o autor detinha a categoria de diretor coordenador competindo-lhe o exercício das funções de responsável do estabelecimento CC Portimão (7.º do articulado motivador).

5. No exercício das suas funções competia ao autor, entre outras funções de gestão da loja CC Portimão, acompanhar e verificar os trabalhos de limpeza e manutenção do estabelecimento, zelando pelo cumprimento das especificações e normas de qualidade, higiene e segurança alimentar, predefinidas para os estabelecimentos da marca CC e para o Grupo EE, do qual a ré faz parte integrante (8.º do articulado motivador).

6. Em 29.09.2015, foi instaurado processo disciplinar contra o autor, o qual veio a culminar no seu despedimento, com invocação de justa causa, em 02.02.2016 (11.º e 12º do articulado motivador).

7. Em 29.09.2015, o departamento de qualidade da ré tomou conhecimento da existência de uma praga de roedores no seu estabelecimento CC Portimão (17º do articulado motivador).

8. Nessa altura, a ré tomou conhecimento de que, pelo menos desde 25 de junho de 2015, existiam vestígios de ratos no estabelecimento CC Portimão (18.º do articulado motivador).

9. De acordo com os procedimentos internos em vigor na ré, verificada uma “não conformidade muito grave” em qualquer estabelecimento, o responsável do mesmo tem o dever de a comunicar de imediato ao respetivo coordenador (20.º do articulado motivador).

10. Os procedimentos supra referidos incluem, entre outros, a identificação de não conformidades em matéria de higiene e segurança alimentar, a graduação das não conformidades até ao nível de muito graves e o tratamento das mesmas - planos de ação - (21.º do articulado motivador).

11. Para este efeito, considera-se “não conformidade muito grave” a existência de pragas de roedores (22.º do articulado motivador).

12. O autor tinha conhecimento dos procedimentos instituídos e da obrigatoriedade do seu cumprimento (23.º do articulado motivador).

13. No âmbito do procedimento prévio de inquérito movido contra o autor, foram juntos pela ré diversos documentos relativos ao processo, tais como ficha de trabalhador, contratos de trabalho e acordo de isenção de horário de trabalho, relatórios técnicos, relatórios de intervenção da DD, diários de gestão de turno e planos de limpeza periódicos, sumários e lista de presenças das ações de formação ministradas pela ré e, ainda, as apresentações powerpoint das referidas ações de formação, bem como o correspondente teste final de avaliação do autor e ainda fotografias do estabelecimento CC Portimão (25.º do articulado motivador).

14. A ré, em 27.11.2015, deduziu nota de culpa contra o autor (26.º do articulado motivador).

15. A nota de culpa deduzida contra o autor tem o teor que consta de fls. 695 e seguintes, que aqui se dá por integralmente reproduzido (27.º e 28.º do articulado motivador).

16. A nota de culpa, constando de documento escrito, foi entregue, em mão, ao autor no dia 27 de novembro de 2015, tendo sido também enviada, nesse dia, por correio registado com aviso de receção, para a sua morada (29.º do articulado motivador).

17. Com a nota de culpa, a ré comunicou ainda ao autor a sua suspensão preventiva, sem perda de retribuição (34.º do articulado motivador).

18. O autor apresentou resposta à nota de culpa, em 14.12.2015, com o teor de fls. 725 e seguintes, que aqui se dá por integralmente reproduzido (35.º a 38.º do articulado motivador).

19. No âmbito do processo disciplinar movido ao autor, foi designada data para inquirição das testemunhas arroladas na resposta à nota de culpa, nos termos que constam de fls. 754, cujo teor se dá por integralmente reproduzido (39.º do articulado motivador).

20. O referido despacho foi comunicado à mandatária do autor, em 23 de dezembro de 2015, via correio eletrónico (40.º do articulado motivador).

21. Em 28 de dezembro de 2015 foi comunicado à mandatária do autor o local de inquirição das testemunhas arroladas por este na sua resposta à nota de culpa, via correio eletrónico (41.º do articulado motivador).

22. Nesse mesmo dia, 28 de dezembro de 2015, foram ainda juntos aos autos os documentos requeridos pelo autor no seu requerimento probatório (42.º do articulado motivador).

23. No dia 29 de dezembro de 2015, dia designado para a inquirição das testemunhas arroladas pelo autor, apenas compareceu a testemunha FF (43.º do articulado motivador).

24. Dada a não comparência das restantes testemunhas arroladas pelo autor, e a requerimento da mandatária deste, foi desde logo acordada a inquirição do superior hierárquico daquele, GG (44.º do articulado motivador).

25. Foi proferido despacho que designou data para a realização da inquirição de GG, tendo este sido comunicado à mandatária do autor, em 11 de janeiro de 2016, via correio eletrónico (45.º do articulado motivador).

26. Realizou-se, no dia 15 de janeiro de 2016, a inquirição de GG (46.º do articulado motivador).

27. No dia 18 de janeiro de 2016 foi proferido despacho, dando-se por concluídas as diligências probatórias, para efeito de emissão da decisão final (47.º do articulado motivador).

28. No dia 28.01.2016, foi proferida decisão final no processo disciplinar, com o teor constante de fls. 796 e seguintes, que aqui se dá por integralmente reproduzido (48.º do articulado motivador).

29. A decisão foi comunicada ao autor por correio registado, com aviso de receção, em 29 de janeiro de 2016 e por este recebida em 02 de fevereiro de 2016 (49.º do articulado motivador).

30. A referida decisão final foi, também, comunicada à mandatária do autor via correio eletrónico, após frustrada tentativa de envio por telefax (50.º do articulado motivador).

31. No exercício das suas funções, o autor era o responsável por toda a gestão do estabelecimento CC Portimão, nomeadamente, pelo cumprimento de todos os procedimentos instituídos pela ré em matéria de recursos humanos, administrativos, financeiros e da qualidade (68.º do articulado motivador).

32. Os primeiros vestígios de ratos no estabelecimento CC Portimão surgiram no dia 25.06.2015, circunstância de que o autor teve conhecimento (73.º do articulado motivador).

33. Em 10.09.2015 foram detetados dois ratos no estabelecimento, a qual deveria ter sido imediatamente comunicada ao superior hierárquico do autor, GG, pelo autor (este ponto da matéria de facto corresponde à redação dada pelo Tribunal da Relação na sequência da reapreciação da matéria de facto).

34. Pelo menos, um rato foi avistado por clientes no restaurante, em 20.09.2015 (79.º do articulado motivador).

35. Em 24.09.2015, o autor remeteu ao seu superior hierárquico a mensagem de correio eletrónico que consta a fls. 130, com o seguinte teor:

“Bom dia,

P/ conhecimento,

Presença de excrementos de ratos e sacos de farinha roídos (eliminados 3 sacos). Solicitada presença de DD. Nas telas verificaram novamente presença de ratinhos (2). Telas trocadas e reforço de iscos.

V... e P… com problema idêntico

Situação reportada ao controle de pragas (check list)

AA” (80.º do articulado motivador).

36. O autor sabia que o seu superior hierárquico estava de férias desde 21.09.2015 (81.º do articulado motivador).

37. O autor dispunha do contacto telefónico do seu superior hierárquico (82.º do articulado motivador).

38. O autor dispunha de outros contactos, nomeadamente da responsável nacional do negócio CC Restaurantes, ou das estruturas intermédias, como o pivot de qualidade da marca (83.º do articulado motivador).

39. Até 28.09.2015, o autor não contactou nenhuma das pessoas referidas em 38 (84.º do articulado motivador).

40. Só depois de GG ter acedido à sua caixa postal eletrónica, em 28.09.2015, é que foram despoletados os mecanismos adicionais necessários à eliminação da praga de ratos no estabelecimento, designadamente, a intervenção da manutenção, com vista à selagem dos acessos ao interior da loja. (85.º do articulado motivador).

41. O autor desenvolveu as diligências que se mostram documentadas nos autos, designadamente, solicitando a intervenção da empresa de controlo de pragas «DD» em 20 de setembro de 2015, a qual visitou a loja em 24 de setembro (este ponto da matéria de facto corresponde à redação dada pelo Tribunal da Relação na sequência da reapreciação da matéria de facto).

42. Desde, pelo menos, o dia 15.07.2015, o superior hierárquico do autor, GG, sabia da existência de roedores, por tal lhe ter sido transmitido por aquele primeiro (30.º da contestação).

43. O autor tinha instruções para reportar todas as situações ao seu superior hierárquico direto, não estando normalmente previsto que contactasse diretamente com a direção nacional da marca (32.º da contestação).

44. GG não reportou à direção nacional da marca CC a existência de roedores no estabelecimento do centro comercial … Portimão antes de 28.09.2015 (35.º da contestação).

45. O superior hierárquico do autor, GG, visitava a loja CC do centro comercial … Portimão semanalmente e era informado pelo autor das ocorrências, nomeadamente, das circunstâncias em que fora solicitada a presença de técnicos da empresa DD na loja, designadamente, a 15.07.2015 (36.º a 40.º da contestação).

46. O autor tinha instruções do seu superior hierárquico para o contactar, mesmo quando este estivesse de férias, por correio eletrónico ou telefone, que o mesmo responderia (41.º da contestação).

47. O autor, no dia 24.09.2015, solicitou de imediato a intervenção da DD, tendo em vista o controlo da praga de roedores (42.º da contestação).

48. O técnico da empresa de controlo de pragas DD concluiu que, provavelmente, a praga de roedores existiria noutras áreas do centro comercial e não apenas na loja da ré (49.º da contestação).

49. Após a situação ter surgido foram sendo feitas várias visitas de acompanhamento e foram feitas verificações do estado da loja, com o resultado descrito, nomeadamente, no relatório de 18.09.2015, que consta a fls. 1017 e seguintes, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido (116º da contestação).

50. O custo das intervenções efetuadas na loja foi integralmente suportado pela empregadora (86º do articulado motivador).

51. A ré sofreu prejuízos decorrentes da destruição dos bens alimentares atingidos pelos roedores no estabelecimento CC Portimão (87.º do articulado motivador).

52. O autor apresentou resposta à nota de culpa, nos termos que constam de fls. 725 e seguintes, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido (3.º da contestação).

53. O autor nunca foi alvo de qualquer processo disciplinar e trabalhou para a entidade empregadora durante cerca de 18 anos, mais concretamente desde dezembro de 1997 (5.º da contestação).

54. O autor sempre foi considerado um profissional competente e dedicado, mantendo bom relacionamento com os colegas e superiores hierárquicos e mostrando-se empenhado no exercício das suas funções (8.º a 11.º da contestação).

55. O autor nunca tinha sido alvo de um processo disciplinar, tem cerca de 18 anos de antiguidade e, nos últimos dois anos, foi-lhe proposto baixar a sua categoria profissional, o que nunca aceitou (23.º da contestação).

56. Nos últimos três anos, ocorreu uma restruturação da empresa no Algarve e GG, que era coordenador multimarca, passou a exercer as funções de coordenador regional da marca CC, que antes cabiam ao autor (24.º da contestação).

57. O autor exercia as funções de diretor de unidade e GG exercia as funções de coordenador, com os conteúdos descritos nos documentos de fls. 983 e seguintes e 986 e seguintes, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido (33.º da contestação).

58. O autor é funcionário da ré há 18 anos, sempre desempenhou cargos de direção e chefia e nunca antes lhe foi movido qualquer processo disciplinar (61.º da contestação).

59. Era do conhecimento da ré que o autor tinha a sua vida familiar, com dois filhos pequenos, no Algarve, na zona de Portimão, e as propostas que lhe foram apresentadas resumiram-se à coordenação de lojas na zona norte do país e a eventual coordenação de lojas no aeroporto de Faro, negócio que a ré não chegou a concretizar (64º da contestação).

60. O autor exercia as funções de diretor coordenador auferindo um vencimento base de € 1.355,00, ao qual acrescia o subsídio de alimentação e recebia isenção de horário de trabalho no valor de € 304,90 (76.º da contestação).

61. O autor tinha a responsabilidade de 8 lojas da marca CC, tendo a partir de fevereiro de 2013 sido afastado dessas funções, justificando a ré que esta alteração seria devida à conjuntura económica (77.º da contestação).

62. A partir de fevereiro de 2013, as funções de coordenador das lojas CC do Algarve passaram a ser executadas por GG (78.º e 79.º da contestação).

63. Quando lhe foram retiradas as funções de diretor coordenador, foi-lhe solicitado o veículo, o telemóvel, o computador portátil e a placa Kanguru (80.º da contestação).

64. Foi assegurado ao autor e cumprido pela ré a manutenção da respetiva categoria profissional e a retribuição (86.º da resposta à contestação).

65. Além do autor, existiam outros dois diretores coordenadores das marcas pertencentes ao grupo EE, concretamente K... e B…, os quais se mantiveram em funções (81.º da contestação).

66. O autor, a partir de fevereiro de 2013, foi colocado na loja do centro comercial … Portimão, com as funções de diretor, e foram-lhe feitas as propostas aludidas em 58 (82.º da contestação).

67. Foi proposta ao autor a descida de categoria, o que este não aceitou (83.º da contestação).

68. Em novembro de 2014, foi proposto ao autor que saísse da loja do centro comercial … Portimão e fosse para a loja do centro comercial …, na … – …, nos termos que constam do documento de fls. 1005 e seguintes, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido (85.º da contestação).

69. O autor, desde que deixou de ser diretor coordenador, não tem veículo da empresa atribuído e, por isso, não aceitou a transferência para a loja da …, que implicava uma deslocação de 50 km diários, no pressuposto de que tal deslocação teria que ser efetuada em viatura própria (86.º da contestação).

70. (Este ponto da matéria de facto foi eliminado pelo Tribunal da Relação na sequência da reapreciação da matéria de facto).

71. Em consequência, o autor, mesmo nas suas folgas, tinha que estar disponível para qualquer eventualidade, pois a colega que o substituía não tinha formação para assumir a direção de loja (92.º da contestação).

72. O autor sentiu-se desgostoso com a alteração das suas funções e insatisfeito com as propostas que lhe foram apresentadas (93.º da contestação).

73. Ainda na vigência do contrato de trabalho do autor, foi admitido um novo diretor coordenador para a zona do Algarve, para a marca B… (94.º da contestação).

74. O autor sentiu-se discriminado pela ré (95.º da contestação).

75. Em consequência do processo disciplinar que lhe foi movido, o autor sentiu-se atingido no seu brio profissional e desgostoso com a situação, sentindo-se injustiçado (97.º da contestação).

76. O processo disciplinar movido ao autor foi conhecido entre os colegas, que o questionaram sobre o mesmo (100.º da contestação).

77. O autor passou noites sem dormir, ansioso, triste e desgostoso, sentindo-se injustiçado, pois estava convicto de que havia tomado todas as diligências necessárias para que o problema dos roedores fosse erradicado, chamando a empresa responsável por esse serviço e seguindo as instruções que lhe eram dadas pelo respetivo técnico. (115.º da contestação).

78. O autor remeteu à ré a carta que consta a fls. 1062, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido (87.º da resposta à contestação).

79. A ré remeteu ao autor a resposta que consta a fls. 1009, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido (88.º da resposta à contestação).

80. A loja do centro comercial ….Portimão era uma loja de formação (98.º a 101º da resposta à contestação).

(O Tribunal da Relação, na sequência da reapreciação da decisão da matéria de facto, aditou os seguintes números.)

81. Considerando a atividade desenvolvida pelo Empregador – restauração –, o facto de se reger pelas normas “HACCP” e ISO 22000 e ainda o facto da exploração da marca CC estar sujeita a regras impostas pelo respetivo franquiador, tudo de modo a garantir a excelência em matéria de higiene e segurança alimentar e no serviço ao Cliente, este adotou diversas medidas e procedimentos, cujo escrupuloso cumprimento por parte dos seus colaboradores e fornecedores é obrigatório e fundamental.

82. A CC Portimão beneficia dos serviços da empresa DD - …, Lda., a qual realiza visitas periódicas aos estabelecimentos da marca CC com o objetivo de vistoriar as mesmas, nomeadamente através de detetores de pragas, que coloca preventivamente, atuando no caso de se verificar a existência ou vestígio destas, no sentido de as erradicar.

83. A CC Portimão beneficia dos serviços da HH, S.A. que realiza auditorias periódicas aos estabelecimentos a fim de controlar, por via externa, o cumprimento dos procedimentos legais e internos em matéria de higiene e segurança alimentar e as condições higieno-sanitárias dos mesmos, no âmbito das quais efetua recolhas para análises laboratoriais a produtos alimentares.

84. O empregador mantém um departamento de Qualidade e outro de Manutenção, aos quais compete definir e monitorar o cumprimento de procedimentos em matéria de qualidade e segurança alimentar e intervir sempre que se verifiquem não conformidades.

85. Existem ainda documentos de preenchimento obrigatório – em sinal de confirmação de que determinadas verificações são feitas – como é o caso, por exemplo, dos “Relatórios …” ou das Listas de verificação de Gestão diária e semanal de turnos, os quais devem ser confirmados e/ou levados ao conhecimento dos responsáveis pela supervisão dos estabelecimentos (Diretores Coordenadores e de Negócio).

86. O empregador ministra ainda ações de formação regulares aos seus colaboradores, as quais têm por objeto a análise e certificação dos trabalhadores por forma a garantir que conhecem e adquirem os conhecimentos necessários para cumprir com os procedimentos, nomeadamente em matéria de segurança e higiene alimentar”.

87. No dia 4 de setembro de 2015, o trabalhador esteve presente numa ação de formação ministrada pelo empregador sobre os procedimentos a seguir quando identificadas não conformidades muito graves, entre elas a existência de pragas como roedores ou baratas.

88. Em 29 de setembro de 2015, a Diretora de Negócio II, quando tomou conhecimento da situação, determinou que o GG interrompesse as suas férias para acompanhar a intervenção conjunta da HH, da DD, e da Manutenção (Trace) que teve lugar no dia 30 de setembro, com o objetivo de elaborar e pôr em prática um plano de ação urgente e imediato e em conjunto eliminar a praga ali densificada.

89. No dia 30 de setembro de 2015, o trabalhador não esteve presente.

B) Fundamentação de Direito:

B1) Os presentes autos respeitam a ação declarativa de condenação instaurada em 2016, tendo o acórdão recorrido sido proferido em 14/09/2017.

Assim sendo, o regime processual aplicável é o seguinte:

- O Código de Processo do Trabalho, na versão operada pela Lei n.º 63/2013, de 27 de agosto;

- O Código de Processo Civil, na versão conferida pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho.

B2) Como já se referiu a questão suscitada neste recurso de revista consiste em saber se o Tribunal da Relação ao reduzir para o mínimo o valor da indemnização devida em substituição da reintegração violou o disposto nos artigos 128.° e 391.º e 396.° n.º 1 do Código de Trabalho.

Como já se fez referência, o Tribunal da 1.ª Instância considerou adequado fixar ao autor uma indemnização de 40 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo tendo em conta que o despedimento foi declarado ilícito por improcedência dos motivos justificativos invocados para o despedimento e atendendo ao facto de o autor trabalhar para a ré desde 02 de dezembro de 1997 – portanto, há mais de 18 anos à data do despedimento – sendo um trabalhador brioso e empenhado, desempenhando funções de responsabilidade que implicaram o investimento de muitas horas de disponibilidade, atenta a exiguidade do pessoal com competências de direção em funções no estabelecimento da ré.

Em sede de apreciação de justa causa de despedimento o Tribunal da 1.ª Instância concluiu que muito embora se admita que os deveres que sobre o trabalhador impendiam possam não ter sido cumpridos escrupulosamente (designadamente, quanto aos factos do dia 24.09.2015), não se identifica no seu comportamento a reiteração e gravidade que lhe são, conclusivamente, atribuídas na decisão de despedimento.

Por sua vez, o Tribunal da Relação entendeu que a indemnização a fixar deverá ter como referência 15 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano ou fração de antiguidade, nos termos do art.º 396.º do Código do Trabalho, em face da conduta culposa do trabalhador e do perigo daí decorrente para a saúde pública e repercussões na imagem da empregadora.

Ao apreciar a invocada justa causa, o Tribunal da Relação refere que o comportamento do autor tem atinências com as alíneas a), d) e e) do n.º 2 do art.º 351.º do CT.

Fazendo uma análise detalhada dos factos provados o Tribunal da Relação refere que os mesmos evidenciam “de forma clara que o autor e o seu superior hierárquico, GG, violaram de forma muito grave o seu dever de providenciarem para que o estabelecimento da ré se mantivesse livre de ratos.”

Acrescenta que “é um facto notório que os ratos podem transmitir doenças graves aos seres humanos. O estabelecimento da ré fornece alimentos e bebidas aos clientes, os quais, durante o tempo em que nada foi feito para proceder à desratização, estiveram sujeitos ao perigo concreto de contraírem doenças.

O autor tomou conhecimento da existência de excrementos de ratos no lavatório, em 25 de junho. Não está suficientemente explicado se o superior hierárquico do autor tomou conhecimento deste facto, embora pareça que sim, na medida em que está provado que este visitava a loja «CC» do centro comercial … Portimão semanalmente e era informado pelo autor das ocorrências, nomeadamente, das circunstâncias em que fora solicitada a presença de técnicos da empresa «DD» na loja, designadamente, a 15.07.2015. 

Está provado que em 10.09.2015 foram detetados dois ratos no estabelecimento, a qual deveria ter sido imediatamente comunicada ao superior hierárquico do autor, GG, pelo autor.

Não está provado que o autor não deu conhecimento, mas apenas que este facto deveria ter sido comunicado imediatamente ao superior hierárquico, o que é diferente.

Também neste caso temos dúvidas quanto à questão de saber se o superior hierárquico do autor tinha ou não conhecimento, pela mesma razão que já referimos quanto ao facto ocorrido em 25 de junho: o superior hierárquico visitava o estabelecimento semanalmente e o autor informava-o das ocorrências.

Este facto faz parte da nota de culpa que fundamenta a decisão de despedimento, pelo que a sua prova competia à ré. Esta deveria ter provado de forma clara que o autor não comunicou. Face aos factos provados, ficámos com dúvidas quanto à questão de saber se o superior hierárquico do autor sabia ou não. É muito importante ter a certeza, pois está provado que o autor tinha instruções para reportar todas as situações ao seu superior hierárquico direto, não estando normalmente previsto que contactasse diretamente com a direção nacional da marca, o que deixa entender que o superior hierárquico do autor é que era o seu interlocutor direto e quem tomava a decisão de contratar alguém para desratizar e que o autor só tinha que comunicar a este.

Face aos factos provados, ficamos com dúvidas quanto a saber se efetivamente o autor comunicou ou não a existência de ratos de forma imediata. Esta prova, como já referimos, competia à ré empregadora.

              Em qualquer caso, o superior hierárquico do autor, pelo menos a partir de 15 de julho, sabia da possibilidade da existência de ratos. Desde esta data até 10 de setembro, data da deteção de ratos, decorreram quase dois meses e os factos provados não mostram que o superior hierárquico do autor (e a ré empregadora) tenha tido o cuidado de providenciar pela sua eliminação.

Nesta parte, existe partilha de responsabilidade entre o autor e o seu superior hierárquico, mas em grau maior quanto a este, pois é quem decidiria o que fazer. O autor tinha a obrigação de comunicar e o seu superior hierárquico de atuar em concreto.

O que os factos provados mostram com clareza é que havia excrementos de ratos no estabelecimento da ré em 25 de junho de 2015, o superior hierárquico do autor soube pelo menos em 15 de julho de 2015 – fica-nos a dúvida se não saberia antes por ocasião das visitas semanais – em 10 de setembro foram detetados ratos – fica-nos também aqui a dúvida se o superior hierárquico do autor não saberia por ocasião da visita semanal - em 20 de setembro foram visualizados ratos no estabelecimento da empregadora por clientes e foi só perante este facto extremo que o autor e o seu superior hierárquico tomaram providências efetivas.”

O Tribunal da Relação conclui que os factos enunciados mostram que o autor violou de forma grave e censurável o seu dever de zelo, mas não de forma a fazer quebrar a confiança necessária para fazer cessar o contrato de trabalho tornando impossível a sua subsistência.

Temos assim que, quer a 1.ª Instância quer o Tribunal da Relação concluíram que o comportamento do autor que motivou o despedimento apresenta relevância no plano disciplinar, só que atendendo ao conjunto das circunstâncias a sua gravidade e consequências não é de molde a tornar imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho.

Perante este quadro, e atento o objeto do recurso de revista, importa determinar se deve ou não ser mantido o valor da indemnização devida em substituição da reintegração, atribuída ao autor pelo Tribunal da Relação.

O art.º 391.º do Código do Trabalho intitulado “Indemnização em substituição de reintegração a pedido do trabalhador” estatui:

1 - Em substituição da reintegração, o trabalhador pode optar por uma indemnização, até ao termo da discussão em audiência final de julgamento, cabendo ao tribunal determinar o seu montante, entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fração de antiguidade, atendendo ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude decorrente da ordenação estabelecida no artigo 381.º

2 - Para efeitos do número anterior, o tribunal deve atender ao tempo decorrido desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial.

3 - A indemnização prevista no n.º 1 não pode ser inferior a três meses de retribuição base e diuturnidades.

Nos termos do n.º 1 da citada disposição legal para a fixação judicial do valor da indemnização deve atender-se ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude com referência à ordenação estabelecida no art.º 381.º.

O n.º 2 do mesmo comando legal manda ainda atender na fixação do valor da indemnização o tempo decorrido desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial.

Quanto ao valor da retribuição como refere João Leal Amado (Contrato de Trabalho, noções básicas, 2016, Almedina, pág. 363) “para um trabalhador que aufira uma remuneração elevada, o tribunal tenderá a graduar a indemnização em baixa, para um trabalhador que aufira um salário modesto, o tribunal tenderá a modulá-la em alta”.

No que diz respeito à ilicitude a lei remete para as situações enunciadas nas três alíneas do art.º 381.º, devendo ainda atender-se como refere Pedro Romano Martinez (Direito do Trabalho, 2017, 8.ª edição, Almedina, pág. 1057) “ao grau de culpa do empregador, nomeadamente na apreciação do motivo justificativo invocado.”

Finalmente a lei manda ainda atender na fixação do valor da indemnização ao tempo decorrido desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial, o que leva Pedro Furtado Martins (Cessação do Contrato de Trabalho, 4.ª Edição, revista e atualizada, Principia, pág. 555) a afirmar “... a indemnização será menor ou maior consoante o tempo decorrido até ao termo da ação. E, na verdade, o valor final que o trabalhador tem direito a receber depende em grande medida do tempo que a ação levar a ser julgada, dada a condenação do empregador no pagamento dos salários intercalares. Esse valor é tendencialmente muito mais elevado do que o da indemnização substitutiva da reintegração. Neste quadro, é razoável que o montante desta indemnização seja tanto menor quanto maior for o dos salários intercalares”.

No caso concreto a retribuição a considerar, no montante de € 1.355,00, tem de se considerar média.

Por outro lado, estamos perante um despedimento que foi declarado ilícito por violação do princípio da proporcionalidade, em virtude de o tribunal ter entendido que a infração disciplinar cometida pelo autor pela sua gravidade e consequências não era de molde a tornar imediata e praticamente impossível a subsistência da relação laboral.

Quanto a este ponto saliente-se que resulta da matéria de facto provada que o autor não tomou as providências adequadas de forma que o estabelecimento da ré se mantivesse livre de ratos, assumindo este comportamento relevância disciplinar grave.

Nestas circunstâncias, o grau de ilicitude do despedimento não se pode considerar elevado.

Finalmente, tendo o autor sido despedido em 02/02/2016 irá receber salários intercalares até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento, o que ainda não se verificou.

 Perante este quadro o montante da indemnização deve corresponder a vinte e dois dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fração de antiguidade.

                                                           III

            Decisão:

            Face ao exposto, acorda-se em conceder parcialmente a revista, decidindo-se:

            a) Revogar o acórdão recorrido na parte em que condenou a ré no pagamento ao autor de uma indemnização em valor equivalente a quinze dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano ou fração de antiguidade;

           b) Condenar a ré no pagamento ao autor de uma indemnização em valor equivalente a vinte e dois dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano ou fração de antiguidade;

            c) Manter quanto ao mais o acórdão recorrido.

Custas a cargo do recorrente e da recorrida na proporção do decaimento.

Anexa-se sumário do acórdão.

Lisboa, 11/04/2018

Chambel Mourisco (Relator)

Pinto Hespanhol

Gonçalves Rocha