Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
05P220
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: SOUSA FONTE
Descritores: FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS
Nº do Documento: SJ20070322002203
Data do Acordão: 03/22/2007
Votação: UNANIMIDADE
Referência de Publicação: DR, I SÉRIE, 240, 13 DE DEZEMBRO DE 2007, P. 8903
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: FIXAÇÃO DE JURISPRUDENCIA
Decisão: FIXADA JURISPRUDENCIA
Sumário : Na vigência do artº 23º do DL 15/93, de 22 de Janeiro, o agente do crime previsto e punido pelo artº 21º, nº 1, do mesmo diploma cuja conduta posterior preenchesse o tipo de ilícito da alínea a) do seu nº 1, cometeria os dois crimes, em concurso real.
Decisão Texto Integral:
Acordam no pleno das Secções Criminais do Supremo Tribunal de Justiça

1.

1.1. AA, devidamente identificada nos autos, interpôs recurso extraordinário para fixação de jurisprudência do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13.05.04, proferido no Pº nº 1408/04-5ª Secção, por estar em oposição com o acórdão do mesmo Tribunal de 23.03.2000, proferido no Pº nº 972/99, também da 5ª Secção e publicado na Colectânea de Jurisprudência STJ (2000), Tomo II, 227.
Alegou, em síntese, que:
- enquanto no acórdão recorrido se afirmou «a existência de concurso real entre o crime de tráfico de estupefacientes e o crime de branqueamento, vertidos, respectivamente, nos arts. 21º e 23º do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro»,
- o acórdão fundamento decidiu que os agentes do crime previsto e punido no referido artº 23º não podem ser os próprios traficantes – os agentes do crime previsto no artº 21º, do mesmo diploma.
Deste modo, concluiu, versando ambos os acórdãos sobre a mesma questão de direito e assentando em soluções opostas, deverá ser fixada jurisprudência «no sentido de os agentes do crime do artº 23º do Decreto-Lei 15/93, de 22 de Janeiro, a que corresponde actualmente o artº 368º-A do Código Penal, não poderem ser os agentes do crime do artº 21º do mesmo diploma; ou seja, pela não existência de concurso real entre os ilícitos penais em questão».

1.2. Recebido o recurso, a Secção, em conferência, pronunciou-se no sentido da existência de oposição de julgados e determinou o prosseguimento dos autos (acórdão de fls. 102 e segs).

1.3. Notificados os sujeitos processuais interessados, nos termos do disposto no nº 1 do artº 442º do Código de Processo Penal (CPP), apresentaram alegações o Senhor Procurador-Geral Adjunto e a Recorrente.

O primeiro pronunciou-se no sentido da confirmação do acórdão recorrido e da fixação de jurisprudência no sentido do que aí foi decidido, formulando a seguinte proposta de redacção:
«Existe concurso efectivo de crimes quando o autor do crime de tráfico de estupefacientes previsto e punido pelo art. 21º do DL 15/93, de 22-1, pratica, com os bens ou produtos provenientes dessa conduta, algum dos factos incriminados no art. 23° nº1 do mesmo diploma.

Por sua vez, a Recorrente terminou as suas alegações com as seguintes conclusões:
«1.ª Do art.° 23.° do Decreto-Lei n.° 15/93, de 22 de Janeiro, ou melhor, da sua previsão normativa decorre que os seus destinatários são terceiras pessoas – ainda que em proveito do próprio traficante – que não os agentes do crime de tráfico de estupefacientes.
2.ª Neste sentido, veja-se que a lei portuguesa, nos designados «pós-delitos», expressamente exclui a possibilidade do agente do ilícito-típico precedente poder ser punido em concurso efectivo pelas intervenções posteriores à consumação, quando realizadas pelo próprio.
3.ª A revogação do art.° 23.° do aludido Decreto-Lei n.° 15/93, de 22 de Janeiro, o qual corresponde actualmente ao artigo 368.°-A do Cód. Penal, não interfere, directa ou indirectamente, na resolução da questão de direito controvertida.
4.ª Como é entendimento pacífico, o intuito de evitar o confisco de bens ilicitamente adquiridos é conatural a todo e qualquer crime de cunho aquisitivo, sendo os factos posteriores impunes quando praticados pelo agente desse crime.
5.ª Dão-se por reproduzidos os motivos já referidos, nomeadamente no ponto 5 deste recurso.
6.ª A Lei 11/2004, de 27 de Março, que revogou o art.° 23.° do Decreto-Lei n.° 15/93, o qual corresponde ao já mencionado art.° 368.°-A do Código Penal, inseriu-o no Capítulo III – "Dos crimes contra a realizarão da justiça"; clara indicação no sentido de apontar a realização da justiça como sendo o bem jurídico protegido, colocando em crise o entendimento plasmado no Acórdão recorrido e consagrando, assim, a jurisprudência fixada no Acórdão do Supremo de 23 de Março de 2000. Deve pois considerar-se que as condutas de branqueamento de capitais não lesam um outro bem jurídico; não devendo o traficante ser punido em concurso efectivo por tráfico e branqueamento de capitais.
7.ª Pelo que, em face do exposto e dos Acórdãos em oposição, deverá ser fixada jurisprudência no sentido de
os agentes do crime do art.° 23.° do Decreto-Lei 15/93, de 22 de Janeiro, a que corresponde actualmente o art.° 368.º-A do Código Penal, não poderem ser os agentes do crime de tráfico; ou seja, pela não existência de concurso real entre os ilícitos penais em questão.
Termos em que, deve proceder o recurso interposto, fixando-se a jurisprudência em consonância com o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23 de Março de 2000, em detrimento do douto Acórdão recorrido, como é de JUSTIÇA».

1.4. Colhidos os vistos legais, teve lugar a conferência do pleno das Secções Criminais, conforme previsto no artº 443º do CPP.

Tudo visto, cumpre decidir.

2. Decidindo:

2.1. A decisão da Secção sobre a verificação da oposição de julgados e sobre o regular processamento do recurso não vincula o pleno das Secções.
Consequentemente, devemos começar pelo reexame destas questões.

No acórdão interlocutório escreveu-se, a propósito da primeira, o seguinte:
«Estão em causa dois acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça que efectivamente assentam, relativamente à mesma questão de direito, em soluções opostas.
Na verdade, sendo a mesma a questão de direito – a de saber se o agente de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artº 21º do DL 15/93, de 22 de Janeiro, quando pratique os factos descritos no artº 23º do mesmo diploma com os valores proporcionados pela primeira conduta, pode ser punido, em concurso real, pelos dois crimes, ou seja, se, nas referidas circunstâncias, se verifica concurso efectivo entre as duas condutas –, os dois acórdãos optaram por soluções opostas:
- o acórdão fundamento entendeu que “os agentes delituosos a que respeita o dito artigo 23º, ..., não podem, …, ser os próprios traficantes ...”;
- o acórdão recorrido, por sua vez, entendeu que, nas aludidas circunstâncias, se verificava “concurso real dos apontados normativos”.
[Certo que,] entre a prolação dos dois acórdãos, foi publicada a Lei 11/04, de 27 de Março, cujo artº 55º revogou o artº 23º do DL 15/93 e o artº 53º introduziu um novo preceito no Código Penal – o artº 368-A – com a epígrafe “Branqueamento”.
No entanto, a modificação legislativa assim operada em nada influiu na abordagem e resolução daquela questão. Aliás, o acórdão recorrido considerou mesmo o novo artº 368ª-A como «correspondente» ao artº 23º e acrescentou que o concurso real era agora reportado ao artº 21ºdo DL 15/93 e ao artº 368º-A (cfr. fls. 17, notas 8 e 9)».

Pois bem.

2.1.1. Poderá objectar-se que as condutas apreciadas em cada um dos acórdãos em confronto não são idênticas do ponto de vista dos factos que as concretizaram – enquanto a do acórdão fundamento se traduziu, em síntese, na aplicação directa, pelos autores do tráfico de estupefacientes, dos ganhos proporcionados por tal actividade na aquisição de um automóvel e de imóveis, sempre em seu nome, sem qualquer intermediário ou operação tendente a esconder a origem do dinheiro, a do acórdão recorrido traduziu-se num conjunto de operações, com intervenção formal de diversas pessoas, com vista a dissimular a sua origem ilícita.

A crítica, no entanto, não procede.

A lógica da fundamentação do acórdão de 23 de Março de 2000 leva, com efeito, a concluir que a solução aí adoptada seria sempre a mesma, independentemente dos particulares contornos da actividade posterior dos autores do tráfico de estupefacientes, porquanto a conclusão a que aí se chegou foi a de que «os agentes delituosos a que respeita o dito artigo 23º do Decreto-Lei nº 15/93 não podem ser os próprios traficantes…». E, por isso, é que até considerou desnecessário ajuizar da «aptidão da prova certificada para consentir (ou não consentir) o preenchimento típico daquele ilícito».

2.1.2. Dir-se-á ainda que não se verifica a exigida oposição, uma vez que, se o acórdão recorrido decidiu que os agentes do crime de tráfico de estupefacientes cometeram, em concurso real com este, o crime de branqueamento, o acórdão fundamento disse que os autores do segundo não podiam ser os próprios traficantes. O primeiro versará sobre um problema de concurso de infracções; o segundo sobre uma questão de autoria.

No entanto, apesar da letra do dispositivo dos dois acórdãos, a sua análise substantiva, designadamente a da motivação do acórdão fundamento, conduz-nos à reafirmação da oposição relevante entre ambos.
A questão da autoria, elemento do tipo objectivo de ilícito (1), precede lógica e naturalmente a da forma especial de aparecimento da infracção em que se traduz o concurso de crimes (2). Enquanto a delimitação daquela constitui tarefa da responsabilidade do legislador, a afirmação ou negação deste é da responsabilidade do juiz a quem, competindo a interpretação da lei, cabe identificar as relações que intercedem entre as disposições legais violadas e dizer se essas relações são tais que impõem o recuo de uma delas perante a preponderância ou a maior amplitude de protecção proporcionada pela outra.
Ora, a decisão proferida pelo acórdão recorrido, ao julgar que aqueles concretos Arguidos cometeram, em concurso real, aqueles dois crimes, tem como pressuposto necessário a admissão de que os autores do crime precedente não estão excluídos do círculo de possíveis autores do crime de branqueamento, contradizendo, deste modo, o dispositivo do acórdão fundamento. Só pode, de facto, ser punido pela prática, em concurso real, de dois crimes quem puder ser autor de ambos. Se o autor do crime precedente não puder ser autor do post-delito, fica irremediavelmente afastada a possibilidade de, em relação a ele, se colocar o problema de um eventual concurso(3).

2.1.3. Por outro lado, também se poderá argumentar que o acórdão fundamento só se pronunciou sobre a questão da autoria: o agente do crime do artº 23º do DL 15/93 não pode ser o agente do crime do artº 21º. Sobre o concurso de infracções, o seu dispositivo é formalmente omisso.
Mas, pelo que acima dissemos, temos de aceitar que o acórdão fundamento, ao excluir os autores dos crimes de tráfico de estupefacientes do círculo de possíveis autores do crime de branqueamento, excluiu necessariamente a possibilidade de concurso real entre as duas infracções.
Aliás, a questão que se coloca a propósito do problema de delimitação da autoria é, segundo alguns, a de saber se o agente do facto precedente pode também ser punido pelo branqueamento. Do que se trata, enfim, é de um problema de concurso de normas, isto é, de saber se o mesmo agente pode criar uma situação de concurso entre o crime de tráfico de estupefacientes (a hipótese de crime precedente que nos interessa) e o crime de branqueamento ou se, pelo contrário, se verifica uma relação de exclusão entre ambos. Sendo negativa a resposta, o agente do primeiro crime fica naturalmente arredado do círculo de possíveis autores ou participantes no segundo (4).
Ora, parece ser esta a perspectiva em que se colocou o acórdão fundamento, porquanto a questão central do objecto do recurso do Ministério Público nele apreciado era justamente a da impugnação da decisão da 1ª instância, no ponto em que decidiu «que os agentes do crime de tráfico de estupefacientes agravado não podem ser punidos em concurso real pela prática desse crime [do crime do artº 23º, nºs 1, alínea a) e 2, do DL 15/93]», como o próprio acórdão sublinhou, quando referiu que «…a discordância do Ministério Público a respeito do acórdão recorrido – para além da benevolência… – dirige-se unicamente à decisão de não ter havido por configurado o crime de conversão de bens, previsto e punido no artº 23º, nºs 1 e 2…». Por isso que considerou que «agentes delituosos a que respeita o dito artº 23º… não podem, portanto, ser os próprios traficantes mas aqueles que, …, convertem… [etc.] bens ou produtos provenientes da prática do tráfico…, sendo afinal este prolongamento de incidência do tráfico, mediante a acção de agentes que, directa e originariamente, não são traficantes que se visa com a incriminação»; que aludiu às «realidades que, numa perspectiva global, envolvem, no seu núcleo central e nas sua ramificações, este tipo de criminalidade, são múltiplas e complexas, cobrindo variadas condutas, assumindo diversos cambiantes, tonalizando-se de distintas matizes e exigindo a tutela de diferentes valores…»; que «… a acção dos arguidos-recorrentes (…) nunca seria susceptível de integrar o crime do artº 23º…». Tudo argumentos que visam a problemática do concurso entre os dois tipos legais, a significar, se entendermos, como devemos entender, que o acórdão fundamento apreciou e resolveu a questão que foi submetida ao seu julgamento, à qual respondeu negativamente, no sentido de que não se verifica o concurso real que o Ministério Público propugnava, ao contrário da posição assumida pelo acórdão recorrido. E, por isso é que confirmou a absolvição dos arguidos em relação aos factos que aquele reclamava preencherem o crime de branqueamento, mesmo sem ter tido necessidade de ajuizar da «aptidão da prova para consentir (ou não consentir) o preenchimento daquele ilícito».

Nesta conformidade, confirma-se a decisão da Secção sobre a oposição de julgados.
Oposição, importa sublinhar, com a dimensão enunciada. De fora, estão questões como as relacionadas com o tipo objectivo ou com o tipo subjectivo do branqueamento que, por isso, não integram o objecto do presente recurso.

Por outro lado, também não vemos que ocorra qualquer outra circunstância que obste ao conhecimento do objecto do recurso. A revogação do artº 23º do DL 15/93 pelo artº 55º da Lei 11/04, de 27 de Março, não se traduziu na descriminalização das condutas por aquele tipificadas, em princípio abrangidas pelo artº 368º-A aditado ao CPenal pelo artº 53º da mesma Lei.

2.2. A fundamentação dos acórdãos em conflito:
2.2.1. Do acórdão recorrido
O acórdão recorrido, como nele expressamente se refere, foi buscar os fundamentos da decisão que tirou à fundamentação de anterior acórdão da mesma Secção, proferido em 20.06.02, no Pº nº 477/02, que, aliás, transcreveu longamente:
«Referindo-se aos restantes «pós-delitos», como a receptação (artigo 231º), alguns autores (5). dão-nos conta de que a lei expressamente exclui a possibilidade de concurso.
E, baseados nesta constatação, partem para uma tomada de posição mais geral segundo a qual “estes dados constituem à partida um forte argumento porque indicam que no Código Penal as intervenções posteriores à consumação nunca são puníveis quando realizadas pelo agente do ilícito-típico precedente. Só assim não seria se no caso de branqueamento de capitais existissem fortes razões que apontassem em sentido diverso. Razões que cremos não existirem. Dever-se-á considerar que o intuito de evitar o confisco de bens ilicitamente adquiridos é conatural a qualquer crime de cunho aquisitivo, sendo um facto posterior impune quando praticado pelo agente do crime precedente”. E mais adiante: “Deve considerar-se, para este efeito, que as condutas de branqueamento de capitais não lesam um outro bem jurídico.
Pese embora a realização da justiça ser formalmente um bem jurídico diverso, em termos materiais verifica-se que, uma vez consumada a lesão do bem jurídico tutelado pelo crime precedente, surge em seu lugar o bem jurídico que é a realização da justiça. (...) O branqueador terá pois de ser pessoa diversa da que cometeu a infracção geradora dos lucros. Pelo que não é punível o branqueamento de capitais obtidos pelo próprio através das infracções precedentes (...)”.
Porém, assentando numa real distinção entre os bens jurídicos protegidos – num caso, como no de tráfico de estupefacientes, a saúde pública e em simultâneo a saúde física e psíquica bem como a própria liberdade individual dos cidadãos, noutro, como no branqueamento, a ordem jurídica no seu todo, designadamente na perspectiva de que as enormes fortunas geradas pela criminalidade subjacente podem, se inseridas no circuito económico e financeiro “regular”, corromper e contaminar toda a estrutura comercial e financeira legítimas, pondo em causa as próprias estruturas do Estado, e gerar novos fundos que, afinal, irão refinanciar as estruturas criminosas, desta forma reforçando a respectiva capacidade de actuação – outros há que chegam exactamente à conclusão contrária, ou seja, de que o agente será punível pelo crime.
Discorrendo sobre esta questão, escreve Jorge Manuel Vaz Monteiro Duarte: “[...] Tendo em conta o já exposto, afigura-se-me que a resposta à questão acima colocada não pode deixar de ser positiva, isto é, o autor do crime de tráfico pode cometer, em concurso efectivo com o crime-base, o crime de branqueamento de capitais.
Na realidade, os bens jurídicos tutelados por ambos os ilícitos em referência são efectivamente distintos.
Assim, a criminalização do tráfico de estupefacientes visa, em primeiro lugar, tutelar a saúde pública da comunidade e, reflexamente ou, melhor dizendo, em paralelo, a saúde (física e psíquica) de todos e de cada um dos membros da comunidade.
Por seu turno, o crime de branqueamento de capitais visa, para além do mais, tutelar a «saúde» do circuito financeiro, económico e jurídico dessa mesma comunidade, assim o visando resguardar de “contaminações” derivadas do afluxo, à respectiva corrente, de bens de origem criminosa que aí procuram a sua legitimação. Tais bens tenderiam a ser posteriormente reinvestidos, gerando novos meios de fortuna que fortaleceriam as entidades criminosas de que provêm os bens branqueados, e são, em simultâneo, susceptíveis de colocar em risco o próprio princípio da livre concorrência.”
E mais adiante: “[...] poder-se-á objectar que a partir do momento em que o autor do crime-base consegue, para si próprio, meios de fortuna ou bens resultantes da prática daquele crime, não é exigível que o mesmo os mantenha «visíveis», quase «à disposição» das autoridades judiciárias e/ou policiais, pois que esses bens poderão ser, afinal, a prova que incriminará aquele agente pela prática do crime-base.
Tal objecção ganhará, aparentemente, ainda mais solidez, se pensarmos no caso do agente que se «limita» a depositar na agência bancária do banco com que normalmente trabalha os fundos provenientes da prática do crime-base.
É certo que dificilmente se poderá compaginar um exemplo de mais singela actuação do agente, que, aparentemente, nada faz para ocultar tais bens.
Todavia, tendo em atenção a natureza do bem jurídico tutelado pelo crime em apreço, afigura-se-me que a simples introdução do capital em questão no circuito bancário e/ou financeiro, é já susceptível de integrar a prática do crime de branqueamento.
Na realidade, tais fundos irão ser utilizados pelas entidades financeiras junto das quais o agente do crime-base os deposita, sendo direccionados para as mais diversas actividades económicas, gerando rendimentos que o agente do crime-base irá receber, maxime sob a forma de juros, correspondentes à remuneração do capital, assim aumentando o seu poder económico.
Paralelamente, uma das ideias base de toda a legislação anti-branqueamento é a de preservar a economia legítima da contaminação por fundos de origem criminosa, contaminação essa que começa, desde logo, pelo simples aumento da massa monetária que operações tão simples como a acima referida desde logo potenciariam...
Afigura-se, pois, que à ideia de não exigibilidade de outra conduta por parte do agente que pratica o crime base, cuja actuação corresponderia, assim, a uma conduta posterior não punível, deve antes ser contraposta a noção de reforço da censurabilidade da conduta do agente de tal ilícito que sabe que, para além da punição pelo crime de tráfico (com a consequente perda dos bens pelo mesmo gerados, através do regime dos artigos 35º a 38º do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro), será também punido por qualquer actividade relacionada com o aproveitamento que eventualmente pretenda fazer desse bens ou meios de riqueza, desde o momento em que, por qualquer forma, os introduza no circuito bancário, financeiro e/ou económico, pois então encontrar-se-á também incurso na prática, em concurso efectivo com aquele crime-base, de um crime da previsão do artigo 23º do citado diploma legal».
Aqui chegados, há que dizê-lo de frente, esta última orientação merece a nossa preferência.
É ela, com efeito, que melhor se coaduna com a definição legal de concurso acolhida no artigo 30º, nº 1, do Código Penal, e, mais do que isso, com as concepções doutrinais dominantes.
Sem esquecer que a tese contrária, deixaria o sistema indefeso perante a colocação nos circuitos económico-financeiros de dinheiro sujo, desde que tal feito lograsse a autoria singular do autor do crime-base.
O que, reconheça-se, constituiria um rombo de vulto na sua estrutura, que, assim, seria permissiva com o usufruto das vantagens do branqueamento pelos que, afinal, constituem o centro das preocupações legais.
Para além de que, ressalvado do devido respeito, parece difícil conceber e sustentar, com base nos princípios gerais referidos, e da própria finalidade essencial de aplicação das penas «protecção de bens jurídicos» – artigo 40º, nº 1, do Código Penal – a tese algo artificiosa, aliás não suficientemente demonstrada, segundo a qual, «uma vez consumada a lesão do bem jurídico tutelado pelo crime precedente, surge em seu lugar o bem jurídico que é a realização da justiça».

2.2.2. Do acórdão fundamento
A decisão do acórdão fundamento, por sua vez, repousa na «justeza» da interpretação que do artº 23º do DL 15/93 fizeram:
- o acórdão aí sob recurso (o acórdão proferido no Pº 972/99, da comarca de Barcelos, onde se considerou que «Do conteúdo de tais previsões normativas decorre que os seus destinatários são terceiras pessoas (mesmo que em proveito do próprio traficante…) que não os agentes directamente ligados à traficância. Destinam-se a punir tal actividade de conversão, transferência ou dissimulação de bens ou produtos nas relações mediatas, que não imediatas entre o traficante e o comprador da droga. Até porque o traficante, por via dessa mesma traficância, já sabe que o dinheiro que recebe da venda da droga é dessa mesma venda. Isto é, se o artº 23º do citado diploma se aplicasse ao traficante, tal preceito, no seu nº 1 era uma redundância…» e
-o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24.06.98, proferido no Pº 543/98-3ª Secção, aliás citado no primeiro, no ponto em que afirmou que «agentes deste crime (o previsto no artº 23º) têm de ser pessoas diferentes dos traficantes e que, sabendo que os bens ou produtos são provenientes da prática do crime de tráfico de estupefacientes praticam qualquer dos actos das als. a), b) e c) em seu proveito próprio ou em benefício do próprio traficante».
E, nessa conformidade, conclui que «os agentes delituosos a que respeita o dito artº 23º … não podem, portanto, ser os próprios traficantes mas aqueles que, com os propósitos normativamente definidos, convertem, transferem ou dissimulam bens ou produtos provenientes da prática de tráfico….».
Foi de resto na doutrina do acórdão fundamento que se apoiou o acórdão da 1ª Vara Mista de Guimarães, nesta parte revogado pelo acórdão recorrido.

2.3. A Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça
A jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça sobre o tema é relativamente escassa e mostra-se, mesmo assim, dividida, embora com ligeiro pendor para a tese adoptada no acórdão recorrido.
Coincidentes com a solução adoptada pelo acórdão recorrido, poderão invocar-se:
- o acórdão de 30.05.96 (Pº nº 35/96) que, partindo da consideração de que «só poderia haver dúvidas sobre se se trataria ou não de concurso aparente neste caso, se os interesses protegidos se interpenetrassem ou confundissem»; de que «aqui temos dois interesses a proteger, por um lado a saúde pública no tráfico e pelo outro, no branqueamento de capitais [do artº 23º do DL 15/93], «a legalidade económica e financeira»; e de que «no concurso aparente, as normas aplicáveis hão-de se excluir por força da aplicação de vários princípios estabelecidos pela doutrina…», confirmou a decisão da 1ª instância que havia condenado um dos Arguidos pela prática, em concurso real, dos crimes de tráfico agravado e de “conversão” de bens provenientes do primeiro;
- o acórdão de 08.07.98 (Pº 344/98-3ª) que confirmou a decisão da 1ª instância que condenou um dos Arguidos pelo concurso real dos crimes de tráfico de estupefacientes e de branqueamento de capitais. Embora a questão não integrasse o objecto desse recurso, um dos seus subscritores, precisamente o relator do acórdão de 24.06.98, Pº nº 543/98-3ª, abaixo enumerado, votou vencido quanto à condenação do Arguido pelo crime do artº 23º, nº 1, por entender «que tal crime não pode ser praticado pelo próprio traficante em relação aos dinheiros e sua aplicação resultantes do tráfico; a sanção é a do artº 36 do mesmo DL»;
- o acórdão de 08.10.98 (Pº nº 356/97-3ª) que perfilha a tese de Lourenço Martins (6) a que nos referiremos mais à frente (7) ;
- o acórdão de 20.06.02 (Pº 472/02-5ª), cuja argumentação, como vimos, o acórdão recorrido assume integralmente.

Por sua vez, no mesmo sentido do acórdão fundamento, pronunciaram-se:
- o acórdão de 24.06.98 (Pº 543/98-3ª), naquele invocado, que revogou a decisão da 1ª instância que havia condenado um dos Arguidos pelo concurso real dos crimes de tráfico e de branqueamento, aduzindo, em síntese, os seguintes argumentos: «da letra do corpo do nº 1 do artº 23º, …, resulta que o agente do crime de tráfico de estupefacientes não pode praticar este crime, uma vez que ele ao vender droga tem a consciência de estar a praticar um acto ilícito, e os bens ou produtos recebidos como pagamentos só passam a ter proveniência ilícita após a sua recepção pelo traficante das mãos dos compradores»; «se correcta fosse a incriminação assumida pelo Tribunal Colectivo todos os traficantes de estupefacientes incorreriam na prática do crime do artº 23º…, pois de um modo geral com a venda de estupefacientes o agente consegue proventos económicos, proventos esses que não guarda intactos para serem apreendidos e declarados perdidos a favor do Estado, antes os gasta no seu sustento e na aquisição de bens e em depósitos bancários, muitas vezes uns e outros em nome de familiares ou terceiras pessoas, o que não impede…a sua perda para o Estado nos termos do artº 36º do DL 15/93…»;
- o voto de vencido atrás mencionado.

Do acórdão recorrido foi interposto recurso para o Tribunal Constitucional para apreciação da inconstitucionalidade da norma do artº 23º do DL 15/93 por alegada violação do princípio «ne bis in idem», o qual, pela decisão sumária de 28.06.04 (fls. 30 e segs.), confirmada pelo acórdão de 22 de Setembro seguinte, negou provimento ao recurso.

2.4. A posição adoptada
2.4.1. Como na generalidade dos países, a punição do branqueamento de capitais(8)”, . (expressão que utilizaremos em vez de outras igualmente divulgadas (9), por nos parecer ser a mais usada entre nós e porque o próprio legislador a emprega desde o DL 15/93 – cfr. a epígrafe do Cap. III do DL 15/93), começou, também em Portugal, por estar exclusivamente ligada ao tráfico de estupefacientes.
Foi o DL 15/93, de 22 de Janeiro, que, através do seu artº 23º, com a epígrafe “conversão, transferência e dissimulação de bens ou produtos”, criou o referido crime.
A razão determinante da publicação deste diploma legal, como se diz no respectivo preâmbulo, foi a de transpor para a ordem jurídica interna os objectivos e regras estabelecidos pela Convenção das Nações Unidas contra o Tráfico Ilícito de Estupefacientes e de Substâncias Psicotrópicas (Convenção de Viena), oportunamente assinada e ratificada por Portugal (10).
Entre os objectivos deste instrumento de direito internacional público, destaca-se o de «privar aqueles que se dedicam ao tráfico de estupefacientes do produto das suas actividades criminosas, suprimindo, deste modo, o seu móbil ou incentivo principal e evitando, do mesmo passo, que a utilização de fortunas ilicitamente acumuladas permita a organizações criminosas transnacionais invadir, contaminar e corromper as estruturas do Estado, as actividades comerciais e financeiras legítimas e a sociedade a todos os seus níveis», transcrito, de resto, no preâmbulo daquele DL.
Posteriormente, o DL 325/95, de 2 de Dezembro, publicado na sequência da Convenção do Conselho da Europa sobre o Branqueamento, Detecção, Apreensão e Perda dos Produtos do Crime, de 8 de Novembro de 1990 (11), e da Directiva nº 91/308/CEE, do Conselho, de 10 de Junho, transposta para a ordem jurídica interna pelo DL 313/93, de 15 de Setembro, reafirmou o combate ao branqueamento de capitais e outras vantagens provenientes do tráfico de estupefacientes e precursores (artº 1º), e alargou-o a um certo número de tipos legais que enuncia – terrorismo, tráfico de armas, tráfico de produtos nucleares, extorsão de fundos, rapto, lenocínio, tráfico de pessoas, tráfico de órgãos ou tecidos humanos, pornografia envolvendo menores, tráfico de espécies protegidas, corrupção e demais infracções referidas no nº 1 do artº 1º da Lei 36/94, de 29 de Setembro, fraude fiscal – e, ainda, a todos os crimes puníveis com pena de prisão cujo limite máximo seja superior a 5 anos, cláusula geral esta acrescentada pela Lei 10/2002, de 11 de Fevereiro.
Finalmente, foi publicada a Lei 11/2004, de 27 de Março (12), que, a par de ter aditado ao Código Penal o artº 368º-A, com a epígrafe “Branqueamento” (cfr. artº 53º), revogou o artº 23º do DL 15/93, de 22 de Janeiro, e o DL 325/95, de 2 de Dezembro [cfr. artº 55º, nº 1, alíneas a) e c)].
Continuando a recorrer ao sistema misto de definição dos factos precedentes(13), constata-se que, dos “crimes”do catálogo anterior, deixaram de constar os de terrorismo, de tráfico de produtos nucleares e de rapto e que lhe foram aditados os de abuso sexual de crianças ou de menores dependentes (e não apenas a pornografia envolvendo menores), de tráfico de influência e de extorsão (não apenas a extorsão de fundos), sem que isso signifique, contudo, compressão da criminalização, pois que a cláusula geral complementar passou a contemplar, além dos anteriores (os crimes puníveis com prisão cujo limite máximo fosse superior a 5 anos), todos os factos ilícitos típicos puníveis com pena de prisão de duração mínima superior a 6 meses.

2.4.2. O crime de branqueamento de capitais pressupõe uma infracção principal (predicated offense) – a prática anterior de um dos crimes precedentes constantes do catálogo, no nosso caso, a prática, sob qualquer forma de comparticipação, de infracção (14) prevista nos artigos 21º, 22º, 24º e 25º, do DL nº 15/93. Nessa medida, trata-se de um crime de conexão, um «post-delito».
A circunstância de, com a publicação do DL 325/95, passarmos a ter formalmente dois crimes de branqueamento de capitais (que, depois, a Lei 11/04, de 27 de Março, unificou e integrou no CPenal, no capítulo dos crimes contra a realização da justiça), um com assento no artº 23º do DL 15/93, o outro com previsão no artº 2º do diploma de 1995, não significa que o regime por este instituído não se aplique ao primeiro, na parte em que o complemente. O artº 1º do DL 325/95 prescreve mesmo que o seu objecto é o de estabelecer medidas de natureza preventiva e repressiva contra o branqueamento de capitais e de outros bens, para além do que já se encontra estipulado, na mesma matéria, quanto aos bens provenientes do tráfico de droga e precursores(15).
No que especialmente respeita à questão controversa do concurso de infracções, apesar de o DL 325/95 ter alargado o leque dos crimes precedentes, deve encarar-se unitariamente o crime de branqueamento de capitais pois o que é aí decisivo, como veremos, é a identificação do bem jurídico por ele protegido.
Por outro lado, como se referiu, o número e a natureza dos crimes precedentes vem sendo sucessivamente alargado a crimes cuja gravidade seguramente não caberia nas preocupações do projecto inicial, em suma, o perigo inerente ao crime organizado, o que, no dizer de Pedro Caeiro, «vai modificando a intenção político-criminal inicialmente subjacente à punição do fenómeno e aumentando de forma exponencial a polémica doutrinal acerca da identificação do bem jurídico que com ela se visa proteger». A ausência de um bem jurídico claramente identificado foi, assim, permitindo a dilatação do tipo e esta, por sua vez, vem tornando cada vez mais difícil a dilucidação daquela questão, com reflexos na interpretação de vários aspectos do seu regime, entre os quais o que agora ocupa a nossa atenção – o da punição ou da impunidade do autor, ou do comparticipante a qualquer título, do facto precedente (16).

2.4.3. Feito este brevíssimo enquadramento do crime de branqueamento de capitais, é altura de tomarmos posição sobre a querela, tal como atrás a enunciamos: o autor do facto precedente (no nosso caso, o crime de tráfico de estupefacientes) pode ser autor do crime de branqueamento? E, sendo a resposta afirmativa, se praticar factos típicos que o concretizam, pode ser punido, pela prática de ambos, em concurso real, efectivo?
A tanto se resume, como já antes frisamos, o objecto do presente recurso.
2.4.3.1. A Convenção do Conselho da Europa de 1990 que incitou os Estados membros a alargar o combate ao branqueamento de capitais e de vantagens provenientes, não apenas do tráfico de droga e de precursores, mas também de outras formas de criminalidade graves, como se lê no 2º parágrafo do preâmbulo do DL 325/95, de 2 de Dezembro, estabelece, no seu artº 6º, nº 2, alínea b), que as Partes podem prever, nas respectivas leis internas, que as infracções de branqueamento não se apliquem aos autores da “infracção principal” (17).
A Directiva nº 91/308/CEE e o DL 313/93, de 15 de Setembro, que a transpôs para a ordem jurídica portuguesa, especialmente dirigidos à prevenção, no espaço comunitário, da utilização do sistema financeiro para o branqueamento de capitais, não contêm, pelo menos de forma directa e expressa, qualquer norma com incidência nesta problemática.
Pois bem.
Ainda antes da publicação do DL 325/95, já Lourenço Martins sustentava que, entre nós, a posição mais defensável era a de que os autores do crime de branqueamento podiam ser os agentes do crime de tráfico de estupefacientes, pelo menos em relação às situações típicas descritas nas suas alíneas a) e b). Por um lado, porque era a interpretação que melhor se ajustava ao texto da Convenção da ONU de 1988, seu texto fonte, onde na alínea b), pontos i) e ii), do nº 1 do artº 3º, se distinguem nitidamente as duas situações: «conhecimento de que os bens provêm de uma infracção de tráfico, “ou da participação nessa ou nessas infracções” – ponto i) – “ou de actos de participação nessa ou nessas infracções” – ponto ii)»; por outro, porque o proémio do preceito, ao aludir a ”qualquer forma de comparticipação”, «inculca até que só quem participou na infracção de tráfico pode cometer o delito de branqueamento» – conclusão que, diz, se peca por excesso, …, não se poderá cair no extremo oposto de dar como não escrito tal inciso»(18).
Também Henriques Gaspar, em comentário ao acórdão de 11.11.96, da 3ª Vara Criminal do Porto (Pº nº 27/96), proferido sobre factos praticados antes de 1995, equacionou o problema – «tendo sido praticados [os factos susceptíveis de integrar o crime de branqueamento do artº 23º] pelos próprios comparticipantes no crime de tráfico (predicate offense), será legítimo indagar se a própria configuração do tipo e valores em presença não impõem a existência de um concurso de infracções» – e considerou que «…fazendo actuar os princípios gerais, a completa autonomia estrutural dos crimes de tráfico e de dissimulação de bens ou produtos e a diversidade de bens jurídicos protegidos num e noutro, parecem apontar para a existência de concurso real mesmo quando praticados, sequentemente, pela mesma pessoa». «O crime de tráfico, continua, consuma-se com a venda; para além disso, a utilização do dinheiro auferido com o tráfico constitui acção distinta – é um aliud – em relação àquele crime…»(19).

O DL 325/95, publicado, como vimos, na sequência da Convenção do Conselho da Europa e da Directiva nº 91/308/CEE não tomou posição expressa sobre esta concreta questão, o que, considerando o teor da norma do artº 6º, nº 2-b) do primeiro, e o sentido da argumentação aduzida pelos dois Autores acima citados, nos deverá conduzir à mesma conclusão – a de que o participante a qualquer título no crime de tráfico não está excluído do círculo de possíveis autores do crime de branqueamento. O sentido lógico-gramatical dessa norma parece ser, de facto, esse: estipulando que as Partes pudessem prever que o autor do crime de branqueamento não coincidisse com o autor da infracção precedente, o silêncio das leis nacionais deveria ser entendido como a adopção da regra geral ali ínsita, a de o agente do segundo poder também ser punido pelo primeiro, em concurso real, desde que, claro está, a sua conduta preenchesse os respectivos tipos objectivo e subjectivo. Por isso não vemos que a leitura do preceito justifique necessariamente o entendimento de que aquela é uma norma «meramente permissiva, intencionalmente neutra, que se limita a constatar a diversidade de soluções possíveis desta questão» (20).
A verdade é que, no silêncio da lei, a doutrina, como veremos mais à frente, e a jurisprudência, como já vimos, divergiram. A Lei 11/2004, com a redacção que deu ao artº 368º-A, aditado ao CPenal, parece, no entanto, ter posto ponto final na discussão, na medida em que o seu nº 2 estabeleceu expressamente a punição de «quem converter, transferir…vantagens obtidas por si ou por terceiro...».
Poder-se-á então dizer que, se o legislador veio adoptar, de forma expressa, aquela solução, é porque a mesma não estava contemplada no direito anterior.
Mas todos conhecemos a fragilidade de argumentos deste tipo, especialmente quando, como no caso, o percurso legislativo não fornece pistas seguras sobre o verdadeiro alcance daquela proposição.
Na exposição de motivos do Projecto de Lei nº 174/IX, da iniciativa de um grupo de Deputados do PS, entre as “soluções inovatórias agora introduzidas” destaca-se, é certo, a de se possibilitar «a punição por branqueamento, em concurso real, do autor da infracção subjacente» (cfr. seu nº 7), destaque que foi repetido e vincado pelo Deputado Vitalino Canas, quando apresentou o Projecto à discussão na generalidade (21). Curiosamente, no seu “Crime de Branqueamento: Regime de Prevenção e de Repressão”, publicado em 2004, depois de apontar a inserção no nº 2 do artº 368º-A da expressão «por si ou por terceiro» como exemplo de diferença, com «significado substantivo», entre aquele preceito e os da alínea a) do nº1 do artº 2º do DL 325/95 e do artº 23º do DL 15/93, como querendo significar «que pode cometer o crime de branqueamento em concurso real quem é autor ou participante do facto ilícito típico subjacente», Vitalino Canas comenta que esta era uma questão controvertida, mas que, embora a lei não o dissesse «já assim se deveria entender (sublinhado nosso)» – o que parece contrariar aquela ideia de inovação.
Já a exposição de motivos da Proposta de Lei 73/IX, reflectindo de forma ainda mais clara essa ambiguidade, depois de enunciar, entre «as mais importantes inovações constantes do presente diploma», a que possibilita «a punição por branqueamento, em concurso real, do próprio autor do crime subjacente», logo acrescenta que «embora não se faça, propositadamente, referência a essa faculdade [e, de facto, o preceito proposto não continha expressão idêntica à do Projecto do PS], a construção do tipo não obsta a essa interpretação… [pelo que] considera-se que o autor do facto precedente pode ofender de forma relevante o interesse protegido pela punição do branqueamento, sem que essa conduta deva considerar-se consumida pelo facto subjacente».
Deste modo, a redacção que veio a ser dada a final ao artº 368º-A do CPenal, tanto pode significar a “inovação” duvidosa que o PS propugnava, como simples reafirmação do que já devia ser entendido.

Seja como for, diz-nos a ciência do direito que autor de um crime pode ser, por via de regra, qualquer pessoa. Autor é o «quem» anónimo com que começa a generalidade das descrições dos tipos legais (22) , os chamados crimes comuns. Mas, por vezes, a lei exige a intervenção de pessoas «de um certo círculo», ornadas de uma certa qualidade ou oneradas com um dever especial. Estaremos, então, perante os chamados crimes específicos (23).
Nem a norma do artº 23º do DL 15/93, nem a do artº 2º do DL 325/95, de 2 de Dezembro, delimitam, por regra, o círculo de pessoas que podem ser autores do tipo legal que descrevem. Lourenço Martins, já vimos, entende que a formulação deste preceito parece até exigir que o autor do crime de branqueamento tenha algo que ver com o crime precedente.
O autor do facto precedente não pode, pois, ser excluído da autoria do branqueamento, excepto, porventura, em relação ao segmento normativo que prevê o auxílio [alínea a) do nº 1 do artº 23º] ou a ajuda [alínea a) do nº 1 do artº 2º] a uma pessoa outra, outrem, implicada na prática de qualquer dessas infracções(24). É esta fórmula – outrem ou outra pessoa –, de resto, a que é a usada na delimitação subjectiva dos post-delitos não puníveis, como são a receptação, o auxílio material e o favorecimento pessoal (arts. 231º, 232º e 367º, do CPenal) – razão por que não nos parece curial partir da configuração destes para concluir que, também o branqueamento de capitais levado a cabo pelo autor do tráfico de estupefacientes, constitui facto posterior não punível. Aliás, como evidencia Pedro Caeiro (25), se, naqueles casos, as condutas do autor do facto precedente «são prolongamentos dele socialmente tidos como “naturais”, pelo que a sua censura penal já está contida na punição do mesmo», em relação ao branqueamento de capitais, cuja repressão se justifica, «não pelo fim visado com as condutas – a conversão das vantagens ilicitamente obtidas, em detrimento da pretensão estadual [ao confisco das vantagens do crime] –, mas sim e apenas, pelo modo particularmente eficiente (e, portanto, perigoso) de o atingir, ínsito nas condutas branqueadoras, isso não de verifica. Por isso que, não se podendo dizer que sejam prolongamento natural do facto precedente, não devam constituir um “post-delito” não punível.


2.4.3.2. Mas debrucemo-nos mais especificamente sobre a questão do concurso de infracções.

Nos termos do artº 30º, nº 1, do CPenal, «o número de crimes determina-se pelo número de tipos de crime efectivamente cometidos, ou pelo número de vezes que o mesmo tipo de crime foi preenchido pela conduta do agente».
Este preceito corresponde ao artº 33º do Projecto da Parte Geral de 1963 que, por sua vez, como frisou, perante a Comissão Revisora, o Professor Eduardo Correia, seu autor, corresponde, por inteiro, às ideias que defendeu desde 1945, em “Unidade e Pluralidade de Infracções” (26).
Ideias essas que, no que directamente para aqui releva, nos parece poderem resumir-se do seguinte modo: o número de infracções determinar-se-á pelo número de valorações que, no mundo jurídico-criminal, correspondem a uma certa actividade. Assim, se diversos valores ou bens jurídicos são negados, outros tantos crimes haverão de ser contados, independentemente de, no plano naturalístico, lhes corresponder uma só actividade. Inversamente, se um só valor é negado, só um crime existirá. Sendo o tipo legal o portador da valoração de uma conduta, como ilícita, pela ordem jurídica, então é a unidade ou pluralidade de tipos legais que nos fornece o critério básico de distinção entre a unidade e pluralidade de infracções. Porém, se tiver sido violado mais do que um tipo de crime, haverá ainda que averiguar se, pelas relações que intercedem entre as várias disposições legais, a aplicação de uma exclui ou não a aplicação de outras. No primeiro caso, estaremos perante uma hipótese de concurso aparente de infracções; no segundo perante uma situação de concurso real. Para estabelecer esta diferença é que o próprio Professor Eduardo Correia, logo no início da discussão do preceito, propôs que no corpo do artigo fosse introduzido o advérbio efectivamente (…número de crimes efectivamente cometidos…), evitando, desse modo, o recurso a fórmulas ou regras doutrinais.
Daquelas relações entre as normas legais, importa aqui referir a de consunção: entre os valores protegidos pelas normas criminais verificam-se por vezes relações de mais e menos, contendo-se uns já nos outros, de tal maneira que uma das normas consome já a protecção que a outra visa. Por isso que, com fundamento na proibição do ne bis in idem, se deva excluir a norma que prevê o crime menos grave, segundo o princípio lex consumens derogat legi consumtae – o que só em concreto se pode afirmar, através da comparação dos bens jurídicos violados (sublinhamos)(27).

A solução do problema passará, pois, por saber se é o mesmo o bem jurídico protegido pelos crimes de tráfico de estupefacientes e de branqueamento de capitais.
Sublinhamos atrás que a Convenção de Viena aponta como objectivos da luta contra o branqueamento os de privar aqueles que se dedicam ao tráfico de estupefacientes do produto das suas actividades criminosas, suprimindo assim, o seu móbil principal e, do mesmo passo, evitar que as organizações criminosas invadam, contaminem e corrompam as estruturas do Estado, as actividades comerciais e financeiras legítimas e a sociedade a todos os seus níveis.
Por sua vez, a Directiva 91/308 foca fundamentalmente a utilização do sistema financeiro global para o branqueamento, preocupando-se com a sua reputação e fiabilidade.
Já por aqui se pode ver que muito embora se cometam a esses instrumentos e, naturalmente aos diplomas legais internos que neles assentam, a defesa de uma pluralidade de interesses e valores, eles são sempre diferentes dos prosseguidos pela incriminação do tráfico de estupefacientes – a saúde pública, uma fórmula porventura redutora mas suficientemente explicativa.
A doutrina nacional reflecte perfeitamente essa situação: grande divergência quanto à identificação do bem(s) protegido(s) pelo branqueamento; quase unanimidade quanto à diferente natureza dos bens jurídicos tutelados por este e pelo tráfico de estupefacientes, mesmo antes do DL 325/95.
Assim, sem pretendermos ser exaustivos,
- Gonçalo Melo Bandeira fala na «paz pública» como o principal bem jurídico tutelado pela criminalização do branqueamento.
E afirma que o agente do crime de tráfico de estupefacientes pode praticar o crime de branqueamento. “Pode”, porque, citando Pedro Caeiro, ob. cit. 1109, da diversidade de bens jurídicos ofendidos não decorre a impossibilidade de a conduta branqueadora ser um facto não punível, por força de uma relação de consunção que também se pode estabelecer entre normas dirigidas à protecção de bens diferentes” (28).
- Henriques Gaspar defende que, «enquanto com a punição do tráfico se pretende proteger a sociedade, a saúde física e psíquica e a liberdade dos virtuais consumidores, afectada pelo resultado da actuação dos que fomentam o consumo e traficam droga, no branqueamento, para além de certa finalidade pragmática, perspectiva-se a protecção da sociedade e do Estado e das suas instituições contra o uso das fortunas ilicitamente acumuladas e que podem corromper e contaminar as próprias estruturas do Estado e as actividades comerciais e financeiras legítimas».
E parece não ter dúvidas de que, «sendo estruturalmente autónomos e protegendo bens jurídicos diversos, os crimes de tráfico e branqueamento concorrem em acumulação real quando praticados pelo mesmo agente» (29).
- Jorge Manuel Dias Duarte advoga que o que «sobreleva como bem jurídico protegido pelo crime de branqueamento [é] a própria ordem económica e social no seu todo, assim como, mais mediatamente, a própria protecção das diversas instituições do Estado…», afigurando-se-lhe que o autor do crime de tráfico pode cometer, em concurso efectivo com o crime base, o crime de branqueamento de capitais(30).
- Lourenço Martins acentua que, enquanto no tráfico de estupefacientes se protege essencialmente a saúde pública, no branqueamento tutelam-se essencialmente «interesses económicos e financeiros nos quais sobrelevam a preservação de uma sadia concorrência entre empresas e pessoas singulares … assim como a não contaminação das instituições financeiras que em qualquer Estado se querem credíveis e sólidas».
Deste modo, sendo diferentes os bens jurídicos protegidos pelos dois tipos legais, a que acrescem as razões que já atrás se referiram, conclui pela possibilidade de concurso real, «no que respeita às alíneas a) e b)», do nº 1 do artº 23º. A situação descrita na alínea c), em seu juízo, «aproxima-se das modalidades de receptação previstas no nº 1 do artº 329º (e 331º), do Código Penal» (hoje, arts. 231º e 233º) (31).
- Oliveira Ascensão assume que o combate ao branqueamento «previne o envenenamento de todo o sistema económico-financeiro… numa altura em que…os milhões da droga, …, trazem o espectro da subordinação geral de um país ao domínio de organizações criminosas e à corrupção».
Quanto à questão fulcral, depois de apontar a proximidade do «tipo básico» de branqueamento ao favorecimento pessoal, embora sem o reduzir a uma modalidade deste, conclui que, «na medida em que corresponde a um favorecimento pessoal, o branqueamento de capitais tem um agente que é necessariamente diferente do agente da infracção principal»(32) .
- Pedro Caeiro, acompanha a tese de Jorge Fernandes Godinho (vd. infra) segundo a qual a punição do branqueamento visa tutelar a “pretensão estadual ao confisco das vantagens do crime”, «ou mais especificamente o interesse do aparelho judiciário na detecção e perda das vantagens de certos crimes».
Mas diverge dele quanto às questões da autoria e do concurso. Entende, por um lado, que o autor do facto precedente não deve ser excluído do círculo da autoria do branqueamento, desde logo porque a norma não delimita um específico círculo de autores (cfr., todavia, nota 24, supra). E não acompanha a ideia de que as condutas de branqueamento não ofendem um bem jurídico diverso do atingido no facto precedente. Nota, porém, que desta diversidade de bens jurídicos não decorre a impossibilidade de a conduta branqueadora ser um facto não punível, por força de uma relação de consunção, que também se pode estabelecer entre normas dirigidas à protecção de bens diferentes – ideia que vai buscar a Eduardo Correia, “Direito Criminal”, II (…), p. 205 e nota 2 : «… devem, em atenção ao princípio da consunção, excluir-se: …; as [disposições] que punem certas condutas, quando estas traduzem, em certas condições, uma vontade de aproveitar, garantir ou assegurar a impunidade de outro crime, etc.».
E conclui: «a regra da consunção deverá ser judicialmente aplicada sempre que a concreta conduta do autor do facto precedente, preenchendo embora o tipo legal de branqueamento, corresponda apenas a uma utilização ou aproveitamento normal das vantagens obtidas e deva, por isso, considerar-se abrangida pela punição daquele facto – o que acontecerá v.g., na simples “utilização” ou “detenção” incriminadas pelo nº 1, alínea c), do artº 2º do DL 325/95»(33), cuja formulação não difere substancialmente da correspondente alínea do nº 1 do artº 23º.
Afinal, se bem interpretamos o seu raciocínio, chega a uma conclusão que, nos resultados práticos, não diverge da de Lourenço Martins.
- Vitalino Canas entende que o branqueamento de capitais lesa bens jurídicos próprios que não se confundem com os bens jurídicos tutelados pelos crimes precedentes. «O branqueamento de capitais, conclui, é um crime “pluriofensivo” cuja tipificação visa a tutela de uma multiplicidade de bens jurídicos… que… são, à cabeça, o funcionamento dos sistemas políticos e dos sistemas económico-financeiros global e de cada Estado… [embora] a boa administração da justiça não se [tenha tornado] irrelevante neste contexto, sendo também mediata ou imediatamente tutelado». Na perspectiva do legislador de 2004, inserindo-se o artº 368º-A do CPenal no capítulo dos crimes contra a realização da Justiça, a boa administração de justiça seria mesmo o bem jurídico tutelado.
Quanto à questão do concurso de infracções, reportando-se à norma do artº 368º-A, do CPenal, observa que, com a inserção da expressão “obtida por si ou por terceiro” se pretendeu significar «que pode cometer o crime de branqueamento em concurso real quem é autor ou participante do facto ilícito típico subjacente». Acrescenta, como atrás dissemos, que já assim se devia entender antes, embora também sustente que «a admissão da possibilidade do concurso real ou efectivo não prejudica a hipótese de em certas circunstâncias poder ocorrer uma conduta de auto-encobrimento não punível e não a prática de branqueamento (34).

Jorge Alexandre Fernandes Godinho pensa que a posição mais correcta é a que sustenta que o branqueamento de capitais ofende a administração da justiça. Entende, no entanto, que a asserção carece de ser precisada, uma vez que, afirma, a administração ou realização da justiça não é um bem jurídico mas sim uma categoria de infracções.
Segundo este Autor, com o crime de branqueamento não se tutela qualquer realidade nova, um quid qualitativamente diverso. Do que se trata é do «propósito de conseguir elevados níveis de eficácia no combate a certas formas de criminalidade», «de erigir um sistema específico, dotado de particular eficácia, com vista a assegurar a detecção e o confisco dos lucros derivados do tráfico de droga e de certos outros crimes». Não se trata, pois, de proteger um novo bem jurídico, mas sim de uma nova estratégia com vista a assegurar que «o crime não compensa». O que se tutela é, pois, «a pretensão estadual ao confisco das vantagens do crime, um interesse supra-individual que é posto em perigo pelas condutas de branqueamento de capitais». Enfim, «o branqueamento de capitais não fere a realização da justiça num sentido estrito, de ataque ao funcionamento judiciário propriamente dito, antes reduz a probabilidade de que as acções com vista a confiscar as vantagens do crime produzam resultados». Por isso, o crime deveria estar integrado no capítulo dos crimes contra a administração da justiça (o Autor escrevia em 2000, antes, pois, da Lei 11/04)
Quanto ao concurso de infracções, conclui que «o branqueador terá…de ser pessoa diversa da que cometeu a infracção geradora dos lucros, pelo que não é punível o branqueamento de capitais obtidos pelo próprio através das infracções precedentes».
Os fundamentos são, no essencial, os alinhados e rebatidos no acórdão recorrido, que deixamos transcritos. Em suma, porque, nos restantes “post-delitos”, a lei exclui expressamente a possibilidade do concurso real; porque não há razões que, quanto ao branqueamento, apontem em sentido contrário; porque, «para este efeito», as condutas de branqueamento de capitais não lesam um outro bem jurídico, porquanto «pese embora a realização da justiça ser formalmente um bem jurídico diverso, em termos materiais verifica-se que, uma vez consumada a lesão do bem jurídico tutelado pelo crime precedente, surge em seu lugar o bem jurídico que é a realização da justiça»(35).

Rodrigo Santiago, escrevendo numa altura em que a punição do branqueamento de capitais estava apenas relacionada com o tráfico de estupefacientes, antes, portanto, do DL 325/95, considera que, na sua forma de ver as coisas, «o bem jurídico tutelado pelos referidos três tipos [de crime do nº 1 do artº 23º…] é, ao menos de forma imediata, “a prevenção do tráfico e do consumo”, ou seja, a respectiva dissuasão», sem contudo esconder «as enormes dúvidas que [o] assaltam acerca do bem fundado desta afirmação…pois bem pode acontecer que…esteja a incorrer na confusão entre o conceito de “bem jurídico”, e aquilo que constitui a “motivação do legislador”». De forma mediata, indirecta ou consequencial, releva também, na opinião do Autor, o valor tutelado pelo facto prévio, o perigo para a saúde pública.
Quanto à questão do concurso, parece não se ter ocupado do tema.
Na análise do tipo objectivo e a propósito da expressão “sob qualquer forma de comparticipação” inscrita no nº 1 do artº 23º, considera que ela «não atine pessoalmente ao agente branqueador, qua tale» …o referido elemento tem o seguinte conteúdo de sentido: haverá branqueamento, não só relativamente a condutas puníveis, nos termos do catálogo – … – do autor imediato de um de tais crimes, como de qualquer outro participe, nos termos do artº 26º e 27º do Código Penal.» (36)
Entendemos, porém, que o trecho não respeita ao nosso problema. Aliás, inserindo-se no propósito pré-anunciado de analisar «as circunstâncias que preenchem a descrição decorrente do ilícito-típico», cremos ter pretendido apenas esclarecer uma concreta questão relativa ao crime precedente, no sentido de que relevam tanto as praticadas pelo seu autor (imediato ou mediato), como pelo participante a qualquer outro título.
Quando muito, admitimos que tenha pretendido refutar uma interpretação idêntica à que foi retirada da mesma expressão por Lourenço Martins e que ficou atrás exarada (37).

2.4.3.3. Um dos objectivos da Convenção de Viena, como vimos, foi o de «privar aqueles que se dedicam ao tráfico de estupefacientes do produto das suas actividades criminosas, suprimindo, deste modo, o seu móbil ou incentivo principal e evitando, do mesmo passo, que a utilização de fortunas ilicitamente acumuladas permita a organizações criminosas transnacionais invadir, contaminar e corromper as estruturas do Estado, as actividades comerciais e financeiras legítimas e a sociedade a todos os seus níveis» (sublinhado nosso).
E também referimos que a repressão do branqueamento se diferencia dos normais post-delitos não puníveis em função da especial perigosidade das respectivas condutas que constituem uma das maiores ameaças ao Estado de direito. Estão aí em causa realidades como sofisticadas organizações criminosas, os elevadíssimos lucros (38) proporcionados por actividades sistemáticas, facilitadores da infiltração dos respectivos agentes nas estruturas económicas, no sistema financeiro e, através dessa via, no próprio aparelho do Estado, perigosidade esta potenciada pelo fenómeno da globalização.
Estas são inquestionavelmente realidades completamente diferentes das que andam ligadas ao fenómeno doméstico da receptação, do auxílio material e do favorecimento pessoal. Como escreveu Faria Costa, estas são actuações «que se processam dentro do sistema e que este, em princípio controla». No branqueamento, «não se está, …, perante um caso isolado de apropriação ilícita de capital; está-se defronte de uma estrutura poderosamente organizada que se infiltra aos mais diversos níveis da realidade social e que age, em qualquer circunstância, dentro dos pressupostos de uma forte cadeia hierárquica, cujo fito é sempre o de conseguir uma maior acumulação de capital para, desse jeito, directa ou mediatamente, aumentar também o poder da organização… uma organização que se anicha dentro do próprio Estado».
E, continua o mesmo Autor, apesar da similitude material entre o branqueamento e a receptação (modus operandi) «o peso e as densidades normativas, quer do desvalor de intenção, quer do desvalor de resultado que acompanham as duas práticas, apresentam-se de jeito tão diferenciado que tudo aponta para que também se verifique uma diferenciação ao nível do tipo legal. Porque, convenhamos, em termos político-criminais, não é a mesma coisa ser receptador de rádios de automóveis ou se branqueador de capitais» “(39) .

Mas se há “fortes” razões para autonomizar o crime de branqueamento de capitais relativamente àqueles post-delitos, também nos parece que os apontamentos doutrinários que deixamos alinhados demonstram a bondade da possibilidade de concurso real entre o primeiro e o tráfico de estupefacientes.

O acórdão fundamento, se bem nos parece, acabou legitimado pela doutrina de Fernandes Godinho, o autor que, entre nós, mais desenvolvidamente se pronunciou no sentido da inadmissibilidade daquele concurso de infracções.
Como se viu, parte do argumento de que, entre nós, a lei, relativamente aos restantes post-delitos – concretamente os crimes de receptação, de auxilio material e de favorecimento pessoal, previstos e punidos pelos arts. 231º, 232º, e 367º, nº1, do CPenal, respectivamente –, exclui expressamente aquela possibilidade, e de não encontrar razões que, no caso do crime de branqueamento, apontem em sentido diverso. Por outro lado, entende que «para este efeito» se deve considerar que as condutas de branqueamento não lesam um outro bem jurídico, pois que se assim não fosse, haveria concurso efectivo. E não lesam um outro bem jurídico porque, embora a realização da justiça seja um bem jurídico formalmente diverso, consumada a lesão do bem jurídico tutelado pelo crime precedente, «surge no seu lugar o bem jurídico que é a realização da justiça».

A sua posição é, como o próprio expressamente reconhece, minoritária (40) .
E foi refutada em termos que sufragamos (embora sem precisarmos de tomar aqui posição sobre qual é concretamente o interesse protegido pelo crime de branqueamento, pois se trata de questão irrelevante para a decisão final porque estranha, ela sim, à controvérsia de jurisprudência que nos incumbe superar) no acórdão recorrido – melhor dito, no acórdão em que se louva o acórdão recorrido.
Acrescentaremos, todavia, o seguinte:
Por um lado, como sublinhamos atrás, são radical e substancialmente diferentes as razões da intervenção do direito penal no caso do branqueamento e no caso da receptação, do auxílio material e no favorecimento pessoal, a sugerir soluções diferentes e diferentes bens jurídicos prosseguidos.
Por outro lado, como demonstra Pedro Caeiro, não está excluída, no ordenamento jurídico português, a possibilidade de o autor do facto precedente poder cometer outros tipos de crimes através de condutas materialmente análogas às condutas que aqueles post-delitos deixam impunes – e cita, além de outros, o exemplo do suborno de uma testemunha, por parte do agente de um crime, para conseguir um álibi credível, em que o bem jurídico é o mesmo(41).
Por outro, ainda, porque na tese de Fernandes Godinho o que parece decisivo para a solução do problema é a identificação do bem jurídico protegido, já que acaba este capítulo do seu trabalho a afirmar que, os que sustentam que são diferentes os respectivos bens jurídicos tutelados pelos dois tipos legais, «vêem-se forçados a, em coerência, afirmar a punibilidade em concurso efectivo».
Ora, como ficou inequivocamente demonstrado, se há grande divergência entre os Autores sobre qual o bem ou bens jurídicos tutelados pelo crime de branqueamento, também há grande consenso entre eles no que toca à afirmação de que é (são) diferente(s) do(s) prosseguido(s) pelo crime de tráfico de estupefacientes.
E, como ensina Figueiredo Dias (42), os crimes de mera garantia ou aproveitamento – isto é, aqueles que são dominados por uma vontade de garantir ou aproveitar a impunidade de outros crimes –, categoria a que Fernandes Godinho parece reconduzir o crime de branqueamento (43), só devem recuar perante o respectivo crime de fim lucrativo ou de apropriação se os primeiros não ocasionarem ao ofendido um novo dano ou se não dirigirem contra novo bem jurídico. Só haverá concurso aparente entre o facto principal e o facto posterior se a este não couber qualquer significado autónomo perante a violação principal de bens jurídicos. Caso contrário, configurar-se-á uma situação de concurso real. Ora, diz o mesmo Mestre (44) , o conceito de bem jurídico, «como expressão de um interesse da pessoa ou da comunidade, na manutenção ou integridade de um certo estado, objecto ou bem em si mesmo socialmente relevante e por isso juridicamente reconhecido como valioso», compreende tanto os bens jurídicos individuais ou dotados de referente individual como os bens jurídicos «universais, trans-pessoais ou supra-individuais» que têm de ser aceites como «autênticos bens jurídicos».

Aliás, Fernandes Godinho não deixa, a nosso ver, de evidenciar alguma dificuldade em se demarcar da tese maioritária de que são diferentes os bens jurídicos protegidos por cada uma das infracções, logo quando tem necessidade de precisar a posição dos que sustentam que o branqueamento de capitais ofende a administração da justiça, por esta não constituir um bem jurídico mas antes uma categoria de crimes para, depois, reconhecer que a realização da justiça é, afinal, um bem jurídico, ainda que só formalmente diverso, pois que «em termos materiais verifica-se que, uma vez consumada a lesão do bem jurídico tutelado pelo crime precedente, surge em seu lugar o bem jurídico que é a realização da justiça».
Finalmente, porque, como bem salienta o acórdão recorrido, a impunidade do autor do crime precedente, «constituiria um rombo de vulto na sua estrutura [do sistema] que, assim, seria permissiva com o usufruto das vantagens do branqueamento pelos que, afinal, constituem o centro das preocupações legais».

Quer dizer: o autor (ou participante a qualquer título) do crime de tráfico de estupefacientes previsto e punido pelo artº 21º do DL 15/93 – a modalidade do crime sobre que incidiram os acórdãos em oposição – que pratique acções típicas descritas no artº 23º do mesmo diploma pode ser punido pelo concurso real das duas infracções.
De facto, vimos atrás:
por um lado, que, segundo alguns, essa hipótese fica afastada quando estiver em causa o segmento da norma da alínea a) do nº 1 do artº 23º que prevê o auxilio a “outra pessoa”;
por outro, que, praticando o agente do crime precedente alguns dos factos tipificados na alínea c) do nº 1 do mesmo artº 23º – situação que alguns aproximam da figura da receptação – parece ter de se atender a que, como também já foi sublinhado, a repressão do branqueamento se diferencia das dos normais post-delitos não puníveis em função da especial eficácia e perigosidade das respectivas condutas e, por outro lado, ter de se averiguar se, no caso, a conduta do branqueador, participante que foi no tráfico de estupefacientes, se deve considerar ainda prolongamento natural deste, isto é, simples propósito de garantir a fruição normal do produto do crime precedente ou se, pelo contrário, assume aquela eficácia e gravidade. No primeiro caso, haverá que fazer actuar a regra da consunção; no segundo, o agente deve ser punido, em concurso real, pelos dois crimes.


As apontadas limitações ao concurso real de infracções não têm, todavia, implicações no caso sub judice, por contemplarem situações estranhas ao objecto do recurso.
Tanto no acórdão recorrido como no acórdão fundamento o que estava em causa era saber se os autores do crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artº 21º, nº 1, do DL 15/93, deviam ser condenados, em concurso real, pela autoria do crime de branqueamento, p. e p. pelo artº 23º, nº 1, alínea a), do mesmo diploma.
O objecto do presente recurso terá, por isso, que se restringir a essa concreta questão. Isto é, a problemática do concurso real de infracções apenas tem de se colocar aqui relativamente ao tipo daquela alínea a). Ora, relativamente a essa modalidade típica de branqueamento, nenhuma daquelas enunciadas objecções à punição pelo concurso real de infracções se coloca, até porque nenhuma das situações tratadas nos acórdãos em confronto preenche a segmento dessa norma que se refere ao auxílio a outra pessoa. Por isso que não hesitamos em responder afirmativamente a essa questão, confirmando consequentemente o acórdão recorrido.

3. Nesta conformidade, acordam no pleno das Secções Criminais do Supremo Tribunal de Justiça em:
3.1. negar provimento ao recurso e confirmar o acórdão recorrido;
3.2. fixar a seguinte jurisprudência:
«Na vigência do artº 23º do DL 15/93, de 22 de Janeiro, o agente do crime previsto e punido pelo artº 21º, nº 1, do mesmo diploma cuja conduta posterior preenchesse o tipo de ilícito da alínea a) do seu nº 1, cometeria os dois crimes, em concurso real».

Custas pela Recorrente fixando-se a taxa de justiça em 15 (quinze) UC´s

Lisboa, 22 de Março de 2007

Sousa Fonte (relator)
Souto de Moura
Santos Cabral
Oliveira Mendes
Reino Pires
Pires da Graça
Alfredo Gonçalves Pereira
Flores Ribeiro
Carmona da Mota
Pereira Madeira
Simas Santos
Santos Carvalho
Costa Mortágua
Henriques Gaspar
Rodrigues da Costa
Soreto de Barros
Santos Monteiro
_____________________________
(1) Figueiredo Dias, “Direito Penal, Parte Geral”, Tomo I, 278;
Cfr. também Jescheck, “Tratado de Derecho Penal”, vol. II, 887 e Claus Roxin, “Teoria Del Tipo Penal Tipos Abertos y Elementos del Deber Jurídico”, Ediciones Depalma, Buenos Aires, 1979, pág. 10 e segs.
(2)Figueiredo Dias, “Direito Penal, Sumários …”, 1976, 3.
(3) Neste sentido, Pedro Caeiro, “A Decisão-quadro do Conselho, de 26 de Junho de 2001...”, no “Liber Discipulorum para Jorge de Figueiredo Dias”, 1106
(4) Jorge Alexandre Fernandes Godinho, “Do Crime de Branqueamento de Capitais, Introdução e Tipicidade”, Almedina, 2001, 236
(5) Referência a Jorge Alexandre Fernandes Godinho, ob. cit., 238 e segs
(6) “Droga e Direito”, Aeqitas/Ed. Notícias, 1194, 137/138,
(7)Cfr. 2.4.3., infra
(8) O branqueamento de capitais é «o processo através do qual os bens de origem delituosa se integram no sistema económico legal, com a aparência de terem sido obtidos de forma lícita», segundo Juana Del Carpio Delgado, “El Delito de Blanqueo de Capitales”, citada por “Jorge Manuel Dias Duarte no seu “Branqueamento de Capitais, o Regime do D.L. 15/93…”, 34; ou «o procedimento através do qual o produto de operações criminosas ilícitas é investido em actividades aparentemente lícitas, mediante dissimulação da origem dessas operações», segundo Lourenço Martins, “Branqueamento de Capitais: Contra-Medidas a Nível Internacional e Nacional”, RPCC, Ano IX, Fasc. 3º, 450.
O crime de branqueamento compreende as fases da colocação/conversão, da circulação/dissimulação e da integração, bem caracterizadas, de resto, nas diversas alíneas do nº 1 do artº 23º:
Rodrigo Santiago, “O ‘Branqueamento de Capitais e Outros Produtos do Crime”, na RPCC, Ano 2, Fasc, 4º,501, aponta dois momentos: o primeiro, conhecido por money laudering, o outro chamado recycling.
(9) “Reciclagem” ou, também, “lavagem”, de dinheiro ou capitais, com origem na expressão inglesa “money-laundering”, que terá sido cunhada pelas autoridades norte-americanas, nos anos 30, quando vários gangsters utilizavam lavandarias para legitimar os lucros das suas actividades ciminosas, por aquelas operarem com base em numerário. – cfr. Jorge Alexandre Fernandes Godinho, ob cit., 26
(10) Conforme Resolução da Assembleia da República nº 29/91 e Decreto do Presidente da República nº 45/91, no Diário da República de 6 de Setembro de 1991.
(11) Data em que foi assinada por Portugal.
(12) Cujo objecto, nos termos do seu artº 1º foi o de transpor a Directiva nº 2001/97/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de Dezembro, que altera a Directiva nº 91/308/CEE, do Conselho, de 10 de Junho.
(13) Onde o artº 23º do DL nº 15/93 falava em «…sabendo que os bens ou produtos são provenientes da prática, …, de infracção prevista nos artigos….», e o artº 2º do DL nº 325/ /95 em «…sabendo que os bens ou produtos são provenientes da prática,…, de crimes de…», o artº 368º-A do Código Penal refere que «consideram-se vantagens os bens provenientes da prática,…,dos factos ilícitos típicos de…»
(14)Os autores divergem sobre o significado das expressões “infracção”, usada no artº 23º, e “crimes”, utilizada pelo DL 325/95. Se, relativamente à primeira, existe consenso no sentido de admitir que vale como facto ilícito típico, já relativamente à segunda, enquanto uns concedem que tenha o mesmo significado, outros há que sustentam que a só pode ser interpretado em sentido técnico, como facto, típico, ilícito, culposo e punível – cfr. Pedro Caeiro, ob. cit. 1102 e Jorge Alexandre Fernandes Godinho, ob. cit., 166, e respectivas notas.
(15) Oliveira Ascensão, “Branqueamento de Capitais: Reacção Criminal”, em “Estudos de Direito Bancário”, Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, 340, entende que, apesar de o DL 325/95 não ter atingido o crime do artº 23º do DL 15/93, «o regime complementar estabelecido pelos dois diplomas diverge, [criando-se] assim a necessidade de distinguir constantemente o regime do branqueamento de capitais provenientes da droga do branqueamento de capitais de proveniência diversa».
(16) Ob. cit., 1074 e1081/82.
(17) Jorge Alexandre Fernandes Godinho, ob. cit. 237, nota 539, refere que a versão portuguesa da Convenção, por via de um erro de tradução, exprime, quanto a este ponto, «exactamente o contrário do que consta das versões oficiais». Diz a versão portuguesa que «pode ser previsto que as infracções enumeradas…apenas se aplicam aos autores da infracção principal. Todavia, na versão francesa está escrito que «il peut être prévu que les infractions enoncées par ce paragraphe ne s’apliquent pas aux auteurs de l’infraction principale». E a versão inglesa que «it may be provided that the offences set foth in that paragraph do not apply to the persons who commited the predicate offence» (sublinhados nossos).
(18) Ob. cit. 137/138.
(19) “Droga – Decisões de Tribunais de 1ª Instância – 1996 – Comentários”, edição da Presidência do Conselho de Ministros – Gabinete de Planeamento e de Coordenação do Combate à Droga, 1998, pág.193.
(20) Jorge Alexandre Fernandes Godinho, ob. cit. 237
(21) Cfr. DAR, I Série, de 30.01.03, 3425
(22 Jescheck, ob. e loc. cit.
(23)Eduardo Correia, “Direito Penal”, I, 306 e Figueiredo Dias, ob. cit. 287 )
(24) Conclusão com que Pedro Caeiro, ob. cit., 1105, nota 111 parece também condescender.
(25) Ob. cit. 1106 e segs.
(26) “Actas das Sessões da Comissão Revisora do Código Penal”, Parte Geral, volumes I e II, edição da AALisboa, 211de
(27) Eduardo Correia, “Direito Criminal”, II, 197 e segs.; Cfr. tb. Figueiredo Dias, “…Sumários..”, cit. 105
(28)Gonçalo de Melo Bandeira, “O Crime de ‘Branqueamento’ e a Criminalidade Organizada...”, em “Ciências Jurídicas”, Ob. cit, 287 e 316.
(29) Henriques Gaspar, loc. cit. na nota 19 e “Branqueamento de Capitais”, in “Droga e Sociedade – O Novo Enquadramento Legal”, Gabinete de Planeamento e de Coordenação do Combate à Droga, Ministério da Justiça, 1994, 124 e 133.
(30) Ob. cit., 91 e segs e 109.
(31) Lourenço Martins, ob e loc. cit. e RPCC, cit.., 453 e 475
(32)Oliveira Ascensão, ob. cit. 338 e 347.
(33) O. cit., 1086 e 1109.
(34) Ob. cit. 14 e segs,. 146 e 157
(35) Ob.cit., 140 e segs e 237 e segs..
(36 )Rodrigo Santiago, “O Branqueamento de Capitais e Outros Produtos do Crime”, RPCC, Ano 4, Fasc. 4º, 530/532 e 535.
(37) Com efeito, desconhecemos se Rodrigo Santiago, quando elaborou o seu artigo tinha conhecimento daquela posição de Lourenço Martins, apesar de ambos os textos terem sido publicados em 1994.
(38) Como referia Vitalino Canas na apresentação do Projecto de Lei nº 174/IX, a que atrás já nos referimos, de acordo com fontes credíveis, são branqueados anualmente qualquer coisa como 800.000 milhões a 1,5 biliões de euros, provenientes, em grande maioria do tráfico de drogas.
No mesmo sentido, afirmava o El País de 3 de Outubro de 1992, citado por Jorge Manuel Dias Duarte, ob. cit., 19, que o mercado clandestino de drogas representava, em 1989, cerca de 9% do comércio mundial, equivalente ao dobro das transacções de petróleo realizadas em todo o mundo, nesse ano.
(39) “O Branqueamento de Capitais (algumas reflexões à luz do Direito Penal e da Política Criminal)”, no BFD da UC, Vol. LXVIII (1992), 65,66 e 71, nota 23
(40) Ob. cit., 147
(41) Ob. ci.t., 1107.
(42) “… Sumários...”, cit., 109
(43) Ob. cit. 238/239
(44) “Direito Penal, Parte Geral”, cit. 109 e 135.