Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 4.ª SECÇÃO | ||
Relator: | RAMALHO PINTO | ||
Descritores: | ACIDENTE DE TRABALHO VIOLAÇÃO DE REGRAS DE SEGURANÇA NEXO DE CAUSALIDADE RESPONSABILIDADE AGRAVADA | ||
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Data do Acordão: | 06/23/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | NEGADA A REVISTA | ||
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Sumário : |
I- A responsabilidade prevista no arto 18o da LAT pressupõe a verificação cumulativa do incumprimento do dever de observância de regras de segurança e saúde no trabalho e de uma relação de causalidade adequada entre tal omissão e o acidente. II- O nosso sistema positivo acolheu a “teoria de causalidade”, ao consignar, no artigo 563.o do Código Civil, que “...a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão”. III- Para prova do nexo causal, basta a demonstração de que o sinistro é uma consequência normal, previsível da violação das regras de segurança, independentemente de se provar ou não, com todo o rigor e extensão, a chamada dinâmica do acidente. | ||
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Decisão Texto Integral: | Processo 179/19.8T8GRD.C1.S1 Revista 81/23 Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: AA intentou processo emergente de acidente de trabalho contra Liberty Seguros, SA, e Gualdim Anciães Amado § Filhos, Lda, alegando, em suma, que sofreu um acidente de trabalho, na sequência da queda num poço de 7 metros, tendo ficado com a mão entalada num tubo de PVC, o que lhe provocou incapacidade para o trabalho, e peticionando o seguinte: 1) ser a 1.a Ré condenada a pagar-lhe a quantia que se encontra em dívida pela indemnização pela incapacidade temporária absoluta, no período compreendido entre 20 de Julho de 2019 e 30 de Janeiro de 2019, no montante de € 1.361,51; subsidiariamente, ser a 2.a Ré condenada a pagar-lhe a referida quantia de € 1.361,51 a título de indemnização pela ITA; 2) ser a 1.a Ré condenada a pagar-lhe pensão anual e vitalícia no montante de € 6.324,83, a partir de 31 de Janeiro de 2019; subsidiariamente, ambas as Rés condenadas a pagar-lhe a pensão anual e vitalícia indicada na proporção das suas responsabilidades, em função da responsabilidade transferida; 3) ser a 1.a Ré condenada a pagar-lhe as despesas com deslocações, no montante de € 106,08; 4) ser a 1.a Ré condenada a pagar-lhe juros de mora, à taxa legal, das quantias indemnizatórias e devidas desde as datas dos respectivos vencimentos até integral e efectivo pagamento. Frustrada a conciliação das partes, a Ré- seguradora contestou imputando a responsabilidade pela produção do sinistro à Ré- empregadora por violação de regras de segurança e refutando o montante da remuneração transferido. A Ré- empregadora também contestou e respondeu à contestação da seguradora, rejeitando a sua responsabilidade pela ocorrência do sinistro e sustentando ter a sua responsabilidade para aquela totalmente transferida. O Instituto da Segurança Social IP deduziu, contra as Rés, pedido de reembolso das prestações de segurança social pagas ao autor. Foi realizada audiência final. O Tribunal de 1a Instância, em 24.07.2022, proferiu sentença, na qual decidiu o seguinte: “IV. Decisão Pelo exposto, julga-se a presente acção procedente, por provada e o pedido de reembolso procedente, por provado, e, em consequência, decide o Tribunal em: A) Declarar que o acidente em causa nos autos é acidente de trabalho; B) Declarar que o acidente ocorreu por violação das regras de segurança e saúde no trabalho por parte da Ré Gualdim Anciães Amado & Filhos, Lda; C) Condenar a ré Gualdim Anciães Amado & Filhos, Lda, a pagar, a título principal, ao autor AA: 1. A pensão anual e vitalícia de 6.324,83 euros (seis mil trezentos e vinte e quatro euros e oitenta e três cêntimos), com início em 31 de Janeiro de 2019, paga adiantada e mensalmente até ao 3o dia de cada mês, correspondendo cada prestação a 1/14 da pensão anual, sendo os subsídios de férias e de Natal, no valor unitário de 1/14 da pensão anual, pagos, respectivamente nos meses de Junho e Novembro, acrescido de juros de mora desde o dia 31 de Janeiro de 2019; 2. O montante de 1.351,61 euros (mil trezentos e cinquenta e um euros e sessenta e um cêntimo), a título de indemnização por incapacidades temporárias em falta, acrescido de juros de mora à taxa legal em vigor desde 20 de Julho de 2018; 3. A quantia de 106,08 euros (cento e seis euros e oito cêntimos) a título de despesas de transportes, acrescida de juros de mora. D) Condenar a ré Gualdim Anciães Amado & Filhos, Lda a pagar a título de reembolso ao Instituto da Segurança Social, IP, a quantia global de 1.423,80 euros (mil quatrocentos e vinte e três euros e oitenta cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos à taxa legal em vigor, contados desde a citação; E) Condenar a ré Liberty Seguros, S.A. a pagar a título subsidiário ao autor AA: 1. A pensão anual e vitalícia 6.324,83 euros (seis mil trezentos e vinte e quatro euros e oitenta e três cêntimos), com início em 31 de Janeiro de 2019 e juros de mora, à taxa legal; 2. O montante de 1.351,61 euros (mil trezentos e cinquenta e um euros e sessenta e um cêntimo), a título de indemnização por incapacidades temporárias em falta, acrescido de juros de mora à taxa legal em vigor desde 20 de Julho de 2018; 3. A quantia de 106,08 euros (cento e seis euros e oito cêntimos) a título de despesas de transportes, acrescida de juros de mora. F) Condenar a Ré Gualdim Anciães Amado & Filhos, Lda no pagamento das custas do processo.”. A Ré empregadora interpôs recurso de apelação. Por acórdão de 13.12.2022, o Tribunal da Relação de Coimbra considerou parcialmente procedente a impugnação da matéria de facto 1 e improcedente a apelação. A Ré empregadora interpôs recurso de revista excepcional. Tal recurso foi admitido por acórdão da Formação a que se refere o no 3 do artigo 672.o do Código de Processo Civil. A Recorrente formulou as seguintes conclusões: 1. Existe dupla conforme quando a Relação confirma, sem voto de vencido e com base em fundamentação substancialmente idêntica à decisão da 1a instância. 2. A dupla conformidade exige, assim, que a questão crucial para o resultado declarado tenha sido objeto de duas decisões “conformes”. 3. TAL NÃO OCORRE, nos casos em que o Acórdão da Relação viola normas de direito adjetivo e substantivo no que concerne à apreciação da impugnação da decisão da matéria de facto proferida pela 1a instância, consequentemente aplicando e subsumindo mal essa matéria na lei, nomeadamente, nos termos das als. a), b) e c), do artigo 672o, do C.P.C. 4. Efetivamente, em tais circunstâncias, ainda que simultaneamente a Relação tenha confirmado a decisão recorrida no que respeita à matéria de direito, na dúvida se tal situação poderá ou não consubstanciar uma situação de dupla conformidade no que concerne ao modo como foi reapreciada a matéria de facto e aplicado o direito ao caso, é legítima a presente Revista Excecional, como infra se exporá e demonstrará. Posto isto, 5. Começaremos pelos interesses de relevância social a salvaguardar, requisito ínsito na al. b), do artigo 672o, do C.P.C.: 6. A jurisprudência tem entendido como interesses de relevância social, situações associadas a uma prática reiterada, aliás, obrigatória por lei, e até consagradas na nossa Lei Fundamental, como sejam as de a Entidade Empregadora (tomador do seguro), a qual é conhecida e aceite pela Seguradora, de por via de uma apólice de acidentes de trabalho, “cobrir” a atividade dos trabalhadores ao serviço daquela. 7. No cumprimento estrito de tal dever, a Recorrente, contratou com a Seguradora, uma apólice para tal efeito, como é sabido e consabido, sem possibilidade de negociar tais cláusulas. Apenas, através de uma análise apriorística, têm as Entidades Empregadoras de escolher de entre o leque de ofertas das Seguradoras existentes no mercado, aquela que, basicamente, oferece as melhores condições de preço. 8. Tal seguro, com sinais nos autos, visa a proteção infortunísticas dos trabalhadores da Recorrente com vista à sua ressarcibilidade em caso de ocorrência de sinistro. 9. Vai perpassando a ideia na sociedade, peregrina, de que é “normal” em caso de sinistro terem as companhias seguradoras o hábito de declinarem a assunção das responsabilidades em caso de acidente, cujas circunstâncias elas próprias circunscrevem nas condições gerais e particulares das respetivas apólices, diga-se até, de forma pensada, e por isso de porta aberta às suas interpretações contratuais, não raras vezes, determinando que os lesados não sejam ressarcidos. 10. Seja porque as Entidades Empregadoras não têm capacidade para pagar a ressarbilidade dos sinistros aos seus trabalhadores, que ao terem de o fazer poderá até determinar o seu decesso ou, seja porque as Seguradoras pura e simplesmente lutam e esgrimem argumentos até às últimas instâncias possíveis, tantas e tantas vezes dilatoriamente, com vista a protelar o pagamento desses danos. 11. A contratação de um seguro de acidentes de trabalho, é assim obrigatório por lei, porque protege interesses (bens jurídicos) de relevância social, uma vez que se estendem, além dos sinistrados, aos seus familiares diretos. 12. Não é despiciendo o facto de num agregado familiar, o único “ganha pão” sofrer um sinistro, e recorrendo a juízo para ser ressarcido, ver que a responsabilidade infortunísticas da sua Entidade Empregadora, está contratada, válida e eficaz e que, a apólice cobre ou teria de cobrir a ressarcibilidade de tais custos, e esta não o faz. 13. In casu, não o fez, porque, entre o mais, foram várias as teses trazidas pela Co- Ré Companhia de Seguros para recriar o sinistro: 14. Desde logo, alegou que o vencimento do trabalhador não estava, pelo menos, integralmente, a coberto da apólice e, quando viu que esta tese não vingava; 15. Avançou que o sinistrado fora colocado no talude do poço por ordens expressas da Entidade Empregadora, o que foi negado perentoriamente pelo próprio sinistrado e, quando percebeu que tal tese não vingava; 16. Avançou com a tese de que o sinistrado deveria estar ancorado num ponto fixo e, quando percebeu que esta tese não vingava; 17. Avançou que o sinistrado não possuía instrumentos de segurança coletivos e individuais e, quando percebeu que esta tese foi destruída pelo próprio sinistrado e pela testemunha por si arrolada (perita); 18. Avançou que a Entidade Empregadora não ministrava formação aos seus mais de 60 trabalhadores e, quando percebeu que esta tese não vingava; 19. Avançou que a vala existente entre o exterior das manilhas do poço, deveria ter sido aterrada para evitar o sinistro, o que se veio a provar ser inexequível face à natureza dos trabalhos a executar, tese que também não vingou. 20. No fundo, a Co-Ré Companhia de Seguros avançou teses e factos meramente hipotéticos para atingir o desiderato da responsabilidade agravada da Entidade Empregadora, o que aliás conseguiu, ludibriando o foco no nexo causal, o qual inexiste, como já se viu. 21. Ora, compete aos Tribunais, em primeira linha apurar se a Seguradora, deve ao não pagar os danos ao Sinistrado/Vítima, sendo que, no presente caso, ficou provado que: - A apólice contratada pela Recorrente cobre o sinistro ocorrido; - A responsabilidade por ocorrência de acidentes de trabalho estava integralmente transferida para a Seguradora, inclusivamente, pela massa salarial total auferida pelo trabalhador. 22. - A Entidade Empregadora, não é responsável nem podia ter evitado o sinistro. 23. Assim, só com floreados à volta da reconstrução do sinistro, poderia lograr a Seguradora obnubilar o espírito do julgador. 24. Desiderato que a Seguradora vai conseguindo! 25. Arte que vai utilizando, de forma incólume, da qual os Tribunais não se livram tão cedo, aliás, arte generalizada a qualquer companhia seguradora. 26. Pelo que, para efeitos de aplicação dos artigos 18.o, n.o 1, e 37.o, n.o 2, da Lei n.o 98/2009, de 04 de Setembro, cabe aos beneficiários do direito à reparação por acidente de trabalho, bem como às Seguradoras que pretendam ver desonerada a sua responsabilidade infortunística, o ónus de alegar e provar os factos que revelem que o acidente ocorreu por culpa do empregador ou que o mesmo resultou da inobservância por parte daquele de regras sobre segurança, higiene e saúde no trabalho. 27. Todavia, não basta que se verifique um comportamento culposo da entidade empregadora ou a inobservância das regras sobre segurança, higiene e saúde no trabalho por banda desta entidade, para ser esta responsabilizada, de forma agravada, pelas consequências do acidente, tornando-se, ainda, necessária a prova do nexo de causalidade entre essa conduta ou inobservância e a produção do acidente. 28. Como é jurisprudência pacífica, o ónus de alegar e provar os factos que agravam a responsabilidade da Empregadora cabe a quem dela tirar proveito, no caso, à Ré Seguradora, nos termos do artigo 342o, n.os 1 e 2, do Código Civil. 29. Assim, incumbia à Ré Seguradora alegar e provar, não só a inobservância por parte da entidade empregadora de regras sobre segurança no trabalho, mas também a existência de nexo de causalidade entre essa inobservância e a produção do acidente, e este é o ponto, o qual não logrou provar! 30. Bem se compreende o inconformismo quer do sinistrado, quer assim da Entidade Empregadora. 31. Este caso, multiplicado por milhares de casos similares, assuma relevância social e uma capitalização, inadmissível ao arrepio dos pressupostos legais, consubstanciam um enriquecimento injustificado para as companhias Seguradoras. 32. Não é um capricho de um qualquer sinistrado, vítima de acidente de trabalho obter a ressarcibilidade dos danos produzidos, nem é um capricho da Entidade Empregadora ver transferido, por provada, a sua responsabilidade infortunística para a Seguradora, e não ser esta a liquidar o que lhe compete. 33. Então de que serve a contratação obrigatória de um seguro de acidentes de trabalho? 34. Por isso, urge inverter o sentido da decisão aqui posta em crise! Dito isto, 35. O presente recurso vem interposto do Acórdão proferido pela 6a Secção do Venerando Tribunal da Relação de Coimbra, que julgou que: “A omissão dos dispositivos de segurança num trabalho que envolvia directamente o legal representante da ré empregadora, o qual estava presente e orientava os trabalhos, conduz-nos a considerar, sem nenhuma dúvida, que existe nexo causal entre a omissão da ré empregadora de estabelecer orientações de segurança, com utilização de dispositivos anti queda, e o evento queda. Essa omissão foi sem dúvida uma das condições do evento e do subsequente dano. Podemos afirmar que a violação das normas de segurança em presença não foi de todo indiferente para a produção do resultado. Independentemente dos motivos que tenham determinado a queda do sinistrado (desequilíbrio, desatenção ou outra) - o que se não apurou em concreto de forma detalhada e ponto em que a apelante argumenta no recurso como sendo necessário para a verificação do nexo causal em questão -, a violação das apontadas normas de segurança surge como condição relevante e efectiva para a ocorrência do sinistro laboral. Este apresenta-se como consequência normal, típica ou provável daquela violação. Assim apreciadas as questões colocadas no recurso, podemos sem dúvida considerar demonstrado que ocorreu violação, por omissão do empregador, de normas de segurança previstas na lei que se mostrem causais do acidente.” Daí que, tal como se concluiu na sentença recorrida, que se apresente o quadro de actuação culposa do empregador previsto no art. 18.o da LAT/2009, gerador do particular dever de indemnizar. Por consequência, a apelação tem de improceder.”. Itálico e negrito nossos. 36. Remata o referenciado Aresto (passando do ditame I para o ditame III, sem que se descortine haver um ditame II, ou se o III é efetivamente o II) sumariando que: “Sumário: I- A responsabilidade agravada do empregador com fundamento no art. 18.o, n.o 1 da LAT, pressupõe que sobre ele recaia o dever de observar determinadas regras de comportamento, cuja observância teria impedido a consumação do evento, e que entre essa conduta omissiva e o acidente intercorra um nexo de causalidade adequada. III- É de reconhecer a existência desse nexo causal quando o sinistrado sofre uma queda num poço de sete metros de profundidade, sem que o empregador – que orientava directamente os trabalhos – tenha determinado o prévio uso de dispositivos de segurança anti queda, individuais ou colectivos. * IV- DECISÃO Em conformidade com o exposto, delibera-se julgar improcedente a apelação. Custas no recurso pela apelante.” 37. O Tribunal da Relação de Coimbra, julgou que, “...a violação das apontadas normas de segurança surge como condição relevante e efectiva para a ocorrência do sinistro laboral. Este apresenta-se como consequência normal, típica ou provável daquela violação. “. 38. Tal salto no raciocínio do Tribunal “a quo”, não se consegue acompanhar, até porque, não se encontra ancorado em qualquer dispositivo legal, nem tão pouco, à falta de melhor argumento jurídico, nas regras da experiência comum do julgador. 39. Dir-se-á mesmo, que tal conclusão do Tribunal da Relação de Coimbra, inculca a ideia, ou perpassa a conclusão de que, “... como provavelmente o acidente adveio da violação de tais regras de segurança, o mesmo ter-se-á dado, tão somente, por causa dessa omissão”, o que, substantivamente é inadmissível e, mais grave, tal não resultou da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento. 40. Não pode o Tribunal julgar com base em probabilidades, em juízos de prognose, no fundo com base em condições hipotéticas ou advinhatórias, levando a conclusões a cheirómetro. 41. Vejamos que, o Tribunal da Relação de Coimbra, circunscreve o caso sub judice às seguintes questões: “Perante o antes exposto, resulta claro serem as seguintes as questões suscitadas no presente recurso: 1a) A impugnação da decisão da matéria de facto antes proferida; 2a) A revogação da decisão proferida com a consequente improcedência da acção e a procedência da reconvenção.” 42. A Recorrente, nas suas alegações e conclusões, impugnou, de facto, a decisão da 1a Instância, sustentando que deveriam ser considerados como não provados, os factos provados n.os 30, 31, 36, 37, 39, 40, 41, 42, 43, 44, 45 e 46, constantes do elenco descrito na decisão da 1a Instância sobre a matéria de facto, pontos estes daquela decisão que aqui se reproduzem: “30. O sinistro ocorreu pelo facto de a 2a Ré não ter facultado ao Autor qualquer dispositivo de protecção colectiva contra o risco de queda. (artigo 22o da contestação) 31. Ao ordenar o Autor para que se colocasse na zona do talude, segurando uma cinta amarrada ao tubo que fazia descer segundo as instruções dadas, sabendo da existência do fosso entre a manilha e a escavação, não podia deixar de acautelar, como lamentavelmente fez, o risco de queda do trabalhador para a zona interior da vala. (artigo 23o da contestação) 36. A 2a Ré não preparou convenientemente os seus trabalhadores para as tarefas que os incumbia a realizar. (artigo 28o da contestação) 37. O acidente podia e devia ter sido evitado pela 2a Ré. (artigo 29o da contestação) 39. Tivessem sido fornecidos Equipamentos de Protecção Individual, pois, (artigo 31o da contestação) 40. O risco de queda estaria completamente anulado. (artigo 32o da contestação) 41. Não cuidou a 2a Ré de tomar as medidas de forma a assegurar as condições de segurança aos seus trabalhadores, mormente ao Autor. (artigo 34o da contestação) 42. A 2a Ré era a responsável pela orientação e planificação dos trabalhos. (artigo 35o da contestação) 43. À 2a Ré, responsável pela orientação e planificação dos trabalhos, era exigível que não descurasse o cumprimento estrito das regras de segurança que se impunham no caso em apreço. (artigo 36o da contestação) 44. Tal situação poderia e deveria ser facilmente evitada se fossem implementados dispositivos de segurança colectiva pela 2a Ré. (artigo 37o da contestação) 45. O acidente de trabalho que o Autor sofreu se deu exclusivamente porque a 2a Ré não colocou em prática medidas adequadas à prevenção do risco associado à execução da tarefa que atribuiu ao seu trabalhador. (artigo 38o da contestação) 46. A 2a Ré não acautelou tal risco por qualquer das formas possíveis e obrigatórias, muito embora soubesse, porque não podia desconhecer, a possibilidade de queda em altura, em função do modo como o trabalho era executado, segundo as ordens, direcção e fiscalização da 2a Ré. (artigo 39o da contestação)” 43. Pediu a Recorrente que, uma vez passando os referidos factos a constar dos factos não provados, impunha-se uma subsunção da lei aos factos restantes – provados – a qual conduz(irá) a uma solução de direito nos antípodas da prolatada. 44. Ora, O Tribunal da Relação de Coimbra, decidiu alterar e suprimir os seguintes pontos dos factos provados, impugnados na Apelação: O FACTO 30. – Manteve inalterado; - O FACTO 31 – alterou a sua redação para a seguinte: “31. O legal representante do empregador ordenou ao autor para que se colocasse na zona do talude, segurando uma cinta amarrada ao tubo que fazia descer segundo as instruções dadas, sabendo da existência do fosso entre a manilha e a escavação”; - FACTOS 36.,37., 39., 40. E 41., FORAM SUPRIMIDOS do elenco de factos provados; - FACTO 42. Manteve inalterado; - FACTOS 43., 44., 45. E 46., FORAM SUPRIMIDOS do elenco de factos provados. 45. Ante o novo elenco dos factos provados, impõe-se então responder à segunda questão formulada pelo Tribunal da Relação de Coimbra, cerne e objeto do presente recurso, com vista à subsunção de direito, e que é a seguinte: “2. A questão de saber se o acidente se não pode imputar à Ré Empregadora em termos enquadrados no artigo 18o da LAT/2009.” 46. Avança, o Tribunal da Relação de Coimbra no seu Aresto que: “Dispõe o no 1, do art.o 18o, da LAT/2009 que: “Quando o acidente tiver sido provocado pelo empregador, seu representante ou entidade por aquele contratada e por empresa utilizadora de mão-de-obra, ou resultar de falta de observação, por aqueles, das regras sobre segurança e saúde no trabalho, a responsabilidade individual ou solidária pela indemnização abrange a totalidade dos prejuízos, patrimoniais e não patrimoniais, sofridos pelo trabalhador e seus familiares, nos termos gerais” 47. A questão em análise, sobre a imputação causal do acidente ao empregador, tem, portanto, relevo para efeito da ponderação da reparação agravada pelo empregador, em razão da violação das obrigações de segurança legalmente impostas. 48. A estatuição prevista no artigo 18o da LAT, prevê que “Quando o acidente tiver sido provocado pelo empregador (...), ou resultar de falta de observação, por aqueles, das regras sobre segurança e saúde no trabalho (...)”, “... a responsabilidade...”, sendo “individual ou solidária”, (caso em que a responsabilidade da entidade patronal, quanto à reparação dos danos advenientes do sinistro, se encontre totalmente transferida por via de uma apólice de acidentes de trabalho para a Companhia de Seguros, como in casu, acontece), a “... indemnização abrange a totalidade dos prejuízos, patrimoniais e não patrimoniais, sofridos pelo trabalhador e seus familiares, nos termos gerais.” 49. Deste preceito legal, infere-se que, havendo culpa, por ação ou omissão, da Entidade Patronal, por violação de normas de segurança no trabalho, a responsabilidade é individual, mas, estando transferida a reparação desses danos “... abrange a totalidade dos prejuízos, patrimoniais e não patrimoniais, sofridos pelo trabalhador e seus familiares, nos termos gerais.” 50. E, infere-se também que, na ausência de culpa da Entidade Patronal a responsabilidade é solidária, porquanto, na falta de pagamento da Seguradora dos danos do sinistrado, é também responsável a Entidade Patronal, juntamente com a respetiva companhia seguradora, as quais respondem subsidiariamente. 51. Ora, o Tribunal da Relação de Coimbra reconhece que: “Para a verificação em questão, como se diz nas alegações do recurso, impõe-se seguramente a demonstração da violação das regras de segurança, da culpa e do nexo de causalidade entre o acidente e a dita violação (já que aqui importa determinar se o acidente ocorreu por causa dessa específica violação).”. Itálico e negrito nossos. 52. E, antevemos já, que não tendo sido apurada a dinâmica do sinistro, não é possível estabelecer um nexo de causalidade entre a possível violação de normas de segurança de banda da Recorrente (EP) e o próprio sinistro! 53. O que vale por dizer que, se não pode concluir que o sinistro se deu por causa dessa específica violação de normas de segurança, ou que a omissão dessas normas de segurança, foram a causa adequada à produção do sinistro! 54. Pela simples razão de Direito que dita que tais requisitos sendo, como são, CUMULATIVOS (como sejam, demonstração da violação das regras de segurança, da culpa e do nexo de causalidade entre o acidente e a omissão de tais regras de segurança), implicam como condição sine qua non, que se determine se o acidente ocorreu por causa dessa específica violação, por omissão, de regras de segurança. 55. E, para tanto, basta um olhar sobre a matéria de facto, acima transcrita, dada como provada, para escolher um único ponto desses factos provados, que descreva a dinâmica do sinistro, as condições de tempo, modo e lugar em que o mesmo se deu, para depois se concluir que “... o acidente ocorreu por causa dessa específica violação”. 56. O mesmo é dizer que, caso se apurasse a dinâmica do sinistro (e não se apurou), o modo como o mesmo se deu, que a violação por omissão de uso dos dispositivos de segurança coletivos e/ou individuais, evitariam o sinistro, atendendo a este ou àquele facto – mas nada! 57. Contudo e, lamentavelmente, a dinâmica do sinistro não se provou de todo, inexiste, como reconhecem quer a 1a Instância, quer assim o Venerando Tribunal da Relação de Coimbra. 58. É assente, sabido e consabido que, não se tendo apurado a dinâmica do sinistro, ou seja, nada se provando quanto às circunstâncias, pelo menos, de modo em que o mesmo se deu, não é possível estabelecer um nexo de causalidade entre a omissão de uso dos dispositivos de segurança e o sinistro. 59. Além de que, também não é possível afirmar-se e muito menos concluir-se que, mesmo usando os dispositivos de segurança coletivos e/ou individuais, o sinistro não ocorreria ou teria ocorrido de qualquer modo. 60. Para que à Entidade Empregadora/Recorrente, seja imputada, em primeira linha, a responsabilidade pela reparação de acidente de trabalho por violação das regras de segurança, têm de se verificar, CUMULATIVAMENTE, os seguintes requisitos: i) Que sobre a entidade empregadora impenda o dever de observância de determinadas normas ou regras de segurança e que aquela não as haja, efetivamente, observado e; ii) Que se verifique uma demonstrada relação de causalidade adequada entre a omissão e o acidente. 61. Pelo que, “A implementação de medidas de protecção contra quedas em altura só é obrigatória quando esse risco efectivamente existir face a um juízo de prognose - a formular no quadro do circunstancialismo de que o sinistrado tenha conhecimento, ou de que se possa aperceber - e não, face a um juízo a emitir com base em circunstâncias ou dados que só após o acidente se tornaram conhecidos ou cognoscíveis pelo sinistrado.” 62. Assim, a resposta à 2a pergunta formulada pelo Tribunal da Relação de Coimbra, tem necessariamente de ser negativa, ou seja, não se pode concluir, como se concluiu que, a violação de normas de segurança de banda da Entidade Empregadora, ainda que tenham ocorrido, é por si só, idónea a considerar que a responsabilidade das prestações agravadas lhe compete e lhe são imputadas em primeira linha, porque: 63. Desde logo, não se apurou, de todo, a dinâmica do sinistro, não havendo um qualquer quesito ou ponto da matéria dada como assente que questione a que causa se ficou a dever o sinistro; 64. Consequentemente, é impossível, de facto e de direito, estabelecer o nexo de causalidade entre a omissão de uso dos dispositivos de segurança individuais ou coletivos e o sinistro; 65. Pelo que, cabendo o ónus da prova a quem invoca a responsabilidade agravada da Entidade Patronal, e não tendo a Co-Ré Seguradora logrado fazer tal prova, responde em primeira linha a Companhia de Seguros, não se podendo assacar as responsabilidade das prestações agravadas à Recorrente Entidade Empregadora; 66. Até porque, a Recorrente, tem a responsabilidade infortunística de acidentes de trabalho integralmente transferida para a Ré Companhia de Seguros. Para afeitos da al. a), do artigo 672o, do C.P.C. 67. São vários os Acórdãos dos nossos Tribunais Superiores (Supremo Tribunal de Justiça e Tribunais da Relação) que contradizem a decisão de Direito aqui posta em crise, que justificam a Oposição de Julgados, que se juntam em anexo e se dão por reproduzidos para todos os legais efeitos: - No Processo: 00S1921, em que fora Relator DINIS NUNES, prolatado Pelo STJ, em 25/10/2000, votado por Unanimidade, sumariou-se que: “I - Conhecendo-se na decisão de questão indispensável à solução do litígio, ainda que não levantada pelas partes, não ocorre a nulidade de excesso de pronúncia. II - A culpa a que alude o n.o 2 da Base XVII da Lei 2127, de 3 de Agosto de 1965, abrange não só a culpa grave mas também a mera culpa ou negligência. III - Nos acidente de trabalho, para a responsabilização do empregador, não basta a inobservância das regras de segurança, sendo ainda necessária a existência de um nexo causal entre essa inobservância e o sinistro. IV - Se a seguradora do empregador não prova que a inobservância dos preceitos legais por parte deste, no concernente à segurança no trabalho, ainda que tal situação tenha ocorrido, a seguradora é responsável, a título principal, pela indemnização a pagar em virtude de algum acidente de trabalho abrangido no contrato de seguro.” - No Processo: 507/07.9TTVC.T.P1.S1, 4a Secção, do STJ, em que fora Relator FERNANDES DA SILVA, prolatado em 08/01/2013, votado por Unanimidade, sumariou-se que: “I - A imputação, à entidade empregadora, da responsabilidade pela reparação de acidente de trabalho por violação de regras de segurança pressupõe a verificação CUMULATIVA dos seguintes pressupostos: (i) que sobre a entidade empregadora impenda o dever de observância de determinadas normas ou regras de segurança; (ii) que aquela não as haja, efectivamente, observado; (iii) que se verifique uma demonstrada relação de causalidade adequada entre a omissão e o acidente. II - A implementação de medidas de protecção contra quedas em altura só é obrigatória quando esse risco efectivamente existir face a um juízo de prognose - a formular no quadro do circunstancialismo de que o sinistrado tenha conhecimento, ou de que se possa aperceber - e, não, face a um juízo a emitir com base em circunstâncias ou dados que só após o acidente se tornaram conhecidos ou cognoscíveis pelo sinistrado. III - Não resultando provado que se impusesse à entidade empregadora, em termos de normal previsibilidade dos riscos profissionais, a implementação preventiva de quaisquer medidas de segurança – aquando da deslocação pontual do sinistrado ao telhado, visando apenas a marcação dos pontos de drenagem das águas pluviais – numa altura em que, ao contrário do que seria suposto ou expectável, não estavam afinal fixadas à estrutura (embora colocadas no seu lugar) todas as placas da cobertura, a omissão causal não lhe pode ser imputada, não havendo por isso lugar à sua responsabilização agravada.” 68. O próprio Tribunal da Relação de Coimbra, sabe, pelo menos, tem obrigação de saber, que os Acórdão que refere no Aresto que prolatou, vão na esteira da melhor e mais assertiva jurisprudência há muito emanada dos nossos Tribunais Superiores, de que são exemplos os seguintes: - No Processo: 55/07.7TTLMG.P1.S1, 4a Secção, em que fora Relator PINTO HESPANHOL, prolatado pelo STJ, em 25/11/2010, votado por Unanimidade, sumariou-se que: “1. Apurando-se, apenas, que o a§§§§cidente se verificou «quando o Autor cortava umas tábuas com uma máquina» e que esta máquina «não estava dotada de um elemento protector do disco de corte», desconhece-se o processo naturalístico que, em concreto, lhe deu origem, pelo que não é possível afirmar a existência de nexo de causalidade entre a violação, por parte da empregadora, das normas de segurança no trabalho que lhe impunham dotar a ferramenta de corte da máquina dos adequados protectores e a eclosão do acidente. 2. Não se extraindo da matéria de facto provada que o acidente tenha resultado da inobservância, pela ré empregadora, de regras sobre segurança no trabalho, não se mostram preenchidos os pressupostos da responsabilização da empregadora, cuja previsão consta do n.o 1 do artigo 18.o da Lei n.o 100/97, de 13 de Setembro.” - No Processo: 908/08.5TTBRG.P1.S1, 4a Secção, do STJ, em que fora Relator SAMPAIO GOMES, prolatado em 08/05/2012, votado por Unanimidade, sumariou-se que: “I - A responsabilidade agravada do empregador com fundamento no art. 18.o, n.o 1 da LAT, pressupõe a concorrência de dois requisitos, isto é, que sobre ele recaia o dever de observar determinadas regras de comportamento, cuja observância teria impedido a consumação do evento, e que entre essa conduta omissiva e o acidente intercorra um nexo de causalidade adequada. II - No juízo de preenchimento do nexo causal entre a violação de regras de segurança no trabalho e o acidente de trabalho, como pressuposto da responsabilização a título principal e agravado do empregador, há que fazer apelo à teoria da causalidade adequada, consagrada no art. 563° do CC, teoria segundo a qual para que um facto seja causa de um dano é necessário que, no plano naturalístico ele seja condição sem a qual o dano não se teria verificado e, em abstracto ou em geral, seja causa adequada do mesmo, traduzindo-se, essa adequação, em termos de probabilidade fundada nos conhecimentos médios, de harmonia com a experiência comum, atendendo às circunstâncias do caso. III - Não é de afirmar a responsabilidade agravada da empregadora quando não resultou provado que o facto por ela praticado – in casu, o corte e a retirada das terras, a não adopção de medidas de contenção da parede, a falta de entivação na frente escavada – em termos de fenomenologia real e concreta, deu origem ao dano.” - No Processo: 817/07-5TTBRG.P1, em que fora Relator EDUARDO PETERSEN SILVA, prolatado pelo TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO, em 17/01/2011, votado por Unanimidade, sumariou-se que: “I. O ónus de alegar e provar os factos que agravam a responsabilidade da entidade empregadora cabe a quem dela tirar proveito. II. Provando-se que o sinistrado caiu e não se provando nada mais sobre a dinâmica do acidente, não está demonstrado o nexo de causalidade entre a violação das regras de segurança e o acidente.” 69. Donde, muito se estranha que conhecendo tais Acórdãos, estes e outros que por economia processual nos dispensamos de trazer à liça, o Tribunal da Relação de Coimbra, em lugar de subsumir a matéria de facto que ele próprio alterou, constituindo um novo elenco dos factos provados, alterados e suprimidos, os tenha, pura e simplesmente arredado, mantendo meramente a mesma solução de Direito que a 1a Instância aplicou ao caso, também esta conclusiva, como a própria Relação reconhece, factos conclusivos esses suprimidos que excluem a responsabilidade agravada da Entidade Empregadora. 70. Ao fazê-lo, como o fez, o Tribunal da Relação de Coimbra, em lugar de subsumir na lei o elenco dos novos factos provados, subsumiu na lei (ainda por cima mal) as suas próprias conclusões e ilações que do caso retirou de forma absolutamente inusitada, face à inexistente dinâmica naturalística do acidente, reconhecendo, porque outro remédio não tem, que inexiste nexo de causalidade entre uma eventual violação de normas de segurança da Entidade Empregadora e o sinistro. 71. Ante o que vem exposto, não podia e não devia o Tribunal da Relação de Coimbra, concluir, sem mais que: “Independentemente dos motivos que tenham determinado a queda do sinistrado (desequilíbrio, desatenção ou outra) - o que se não apurou em concreto de forma detalhada e ponto em que a apelante argumenta no recurso como sendo necessário para a verificação do nexo causal em questão -, a violação das apontadas normas de segurança surge como condição relevante e efectiva para a ocorrência do sinistro laboral. Este apresenta-se como consequência normal, típica ou provável daquela violação.” 72. Porquanto, são, justamente, os motivos que determinaram a queda do sinistrado, que permitem estabelecer o nexo de causalidade adequada, ou seja, concluir-se que, esses motivos determinantes da queda do sinistrado, teriam sido evitados, caso a Entidade Empregadora, tivesse adotado os dispositivos de segurança coletivos e/ou individuais, que em concreto levariam a que o sinistro não ocorresse, por um qualquer motivo. 73. Raciocínio que o Tribunal de 1a Instância não fez, e o Tribunal da Relação de Coimbra, mesmo depois de alterar e suprimir do elenco da matéria provada ospontos 31, 36, 37, 39, 40, 41, 43, 44, 45 e 46, ainda mais longe ficou de o poder fazer. 74. Donde, atabalhoadamente, acabou por descaraterizar o sentido jurídico da solução de Direito a aplicar ao caso, concluindo que os motivos que determinaram a queda do sinistrado, que no seu entendimento não relevam para o nexo causal, “... apresentam-se como consequência normal, típica ou provável daquela violação.”. 75. Com o devido e merecido respeito, o Tribunal da Relação de Coimbra mostrou-se ausente a uma qualquer fundamentação de direito, à qual está adstrito. 76. E, como está bom de ver, tal conclusão afronta irremediavelmente os requisitos cumulativos nos termos do artigo 18o, da NLAT, que aqui se repristinam: 1) por um lado, que sobre a entidade empregadora impenda o dever de observância de determinadas normas ou regras de segurança; 2) por outro, que aquela as não haja, efetivamente, observado, sendo-lhe imputável tal omissão; 3) que se verifique uma demonstrada relação de causalidade adequada entre a omissão e o acidente, com vista a imputar responsabilidade agravada pelo sinistro à entidade patronal. 77. De resto, a supressão dos factos provados 36, 37, 39, 40, 41, 43, 44, 45 e 46 os quais apresentavam a seguinte redação: “36. A 2a Ré não preparou convenientemente os seus trabalhadores para as tarefas que os incumbia a realizar. (artigo 28o da contestação) 37. O acidente podia e devia ter sido evitado pela 2a Ré. (artigo 29o da contestação) 39. Tivessem sido fornecidos Equipamentos de Protecção Individual, pois, (artigo 31o da contestação) 40. O risco de queda estaria completamente anulado. (artigo 32o da contestação) 41. Não cuidou a 2a Ré de tomar as medidas de forma a assegurar as condições de segurança aos seus trabalhadores, mormente ao Autor. (artigo 34o da contestação) 43. À 2a Ré, responsável pela orientação e planificação dos trabalhos, era exigível que não descurasse o cumprimento estrito das regras de segurança que se impunham no caso em apreço. (artigo 36o da contestação) 44. Tal situação poderia e deveria ser facilmente evitada se fossem implementados dispositivos de segurança colectiva pela 2a Ré. (artigo 37o da contestação) 45. O acidente de trabalho que o Autor sofreu se deu exclusivamente porque a 2a Ré não colocou em prática medidas adequadas à prevenção do risco associado à execução da tarefa que atribuiu ao seu trabalhador. (artigo 38o da contestação) 46. A 2a Ré não acautelou tal risco por qualquer das formas possíveis e obrigatórias, muito embora soubesse, porque não podia desconhecer, a possibilidade de queda em altura, em função do modo como o trabalho era executado, segundo as ordens, direcção e fiscalização da 2a Ré. (artigo 39o da contestação)” 78. O Tribunal da Relação de Coimbra, arredou toda e qualquer possibilidade de responsabilizar de forma agravada a Entidade Empregadora, pelo que, a solução de direito, não pode ser a de manter tal responsabilidade agravada à Recorrente. 79. Sob pena, de prolatar um acórdão, como prolatou, que no seu conjunto apresenta uma matéria de facto provada que nada tem que ver com a solução de direito, dizemos até, mesmo contrária a uma boa aplicação do direito aos factos. 80. A solução de direito do Aresto aqui em crise, apresenta-se assim bem, quanto à solução de ao sinistrado ser dada a devida compensação, mas apresenta-se também nos antípodas dos requisitos, legais e imperativos, que são cumulativos, para que à Entidade Empregadora seja assacada a responsabilidade agravada. 81. Outrossim, provado que a Entidade Empregadora tinha, como tem, a transferência da responsabilidade infortunísticas totalmente transferida para a 1a Ré Seguradora, através de apólice paga e por isso, válida e eficaz à data do sinistro, deve ser esta a indemnizar o sinistrado. 82. Tudo visto e devidamente ponderado, é natural o inconformismo da Recorrente, pois que, a responsabilidade infortunística define-se e determina uma solução que não poderá deixar de ser alterada no sentido de mantendo ao Autor a devida compensação indemnizatória mas, a expensas da Companhia de Seguros 1a Ré, e não, responsabilizar a Entidade Empregadora em primeira linha por via agravada. Vejamos pois, 83. O direito dos trabalhadores à prestação do trabalho em condições de higiene, segurança e saúde, com a consequente garantia de acesso à assistência e reparação de acidentes de trabalho e de doenças profissionais, constitucionalmente reconhecido, projeta-se na Lei ordinária (Lei n.o 98/2009, de 04 de Setembro que Regulamenta o Regime de Reparação de Acidentes de Trabalho e de Doenças Profissionais – doravante NLAT) e no artigo 59o, n.o 1, alíneas c) e f) da Lei Fundamental. 84. Clama a recorrente Seguradora, como se disse, pela inobservância causal, por banda da co-R. empregadora, das regras de segurança e pela sua consequente condenação nas prestações agravadas, nos termos previstos no artigo 18o da identificada NLAT, respondendo aquela apenas subsidiariamente e só pelas prestações normais previstas na Lei. 85. Fá-lo a coberto da convocada hipótese legal: “1 - Quando o acidente tiver sido provocado pelo empregador, seu representante ou entidade por aquele contratada e por empresa utilizadora de mão-de-obra, ou resultar de falta de observação, por aqueles, das regras sobre segurança e saúde no trabalho, a responsabilidade individual ou solidária pela indemnização abrange a totalidade dos prejuízos, patrimoniais e não patrimoniais, sofridos pelo trabalhador e seus familiares, nos termos gerais.”. (vide, n.o 1, do artigo 18o, da NLAT) 86. A solução à luz do quadro da previsão constante do normativo enunciado, exige a verificação cumulativa dos seguintes pressupostos: 1) por um lado, que sobre a entidade empregadora impenda o dever de observância de determinadas normas ou regras de segurança; 2) por outro, que aquela as não haja, efetivamente, observado, sendo-lhe imputável tal omissão, e ainda, 3) que se verifique uma demonstrada relação de causalidade adequada entre a omissão e o acidente. 87. É também sabido que recai sobre quem disso vise tirar proveito ou pretenda ver-se desonerado de tal responsabilidade, o ónus de alegar e provar, neste caso nos termos do no 2, do artigo 342o do C.C., os factos que revelem ter ocorrido, no concreto, a violação causal dessas regras. 88. Assim, impendia sobre a Ré Seguradora, para o pretendido efeito, o ónus de alegar e demonstrar a inobservância de regras de segurança por banda da co- R. Empregadora, SOBRETUDO, A RELAÇÃO DE CAUSA-EFEITO ENTRE ESSA CONDUTA OMISSIVA E O ACIDENTE. 89. Ora, basta um olhar atento à alteração da matéria de facto à qual o Tribunal da Relação deu provimento, para se concluir inexistir, in casu, um qualquer nexo de causalidade, requisito sine qua non, sem o qual se não pode imputar e assacar a responsabilidade agravada da Entidade Empregadora. 90. Caberá saber, antes de prosseguir, que concretas e inobservadas regras de segurança estão ou estariam em causa, e quanto a tal matéria nada fora invocado ou alegado pela 1a Ré Seguradora. 91. Pela invocação que faz o Tribunal da Relação de Coimbra, parece arredar-se do processo naturalístico do sinistro, construindo a sua tese que, circunscreve à volta da violação de regras de segurança através de dispositivos de proteção coletiva e individual que o sinistrado não possuía, cuja Entidade Empregadora tinha por obrigação fornecer, medidas essas que seriam adequadas a evitar o sinistro, nada mais se fundamentando no Aresto aqui em crise. 92. No Aresto sub specie, considerando que as tarefas que iriam ser desenvolvidas pelo sinistrado, consistiam no mesmo modus operandi levado a cabo na feitura dos 7 poços anteriores, foi dado enfase apenas e só ao artigo 18o da NLAT. 93. Releva também o disposto no art. 11.o da Portaria 101/96, de 3 de Abril (Regras Técnicas de Segurança na Construção Civil), o qual dispõe que: “1. Sempre que haja risco de queda em altura, devem ser tomadas medidas de protecção colectiva adequadas e eficazes ou, na impossibilidade destas, de protecção individual, de acordo com a legislação aplicável, nomeadamente o Regulamento de Segurança no Trabalho da Construção Civil. 2. Quando, por razões técnicas, as medidas de protecção colectiva forem inviáveis ou ineficazes, devem ser adoptadas medidas complementares de protecção individual, de acordo com a legislação aplicável.” 94. Para efeitos de responsabilidade agravada da Entidade Empregadora, há que referir que não basta qualquer trabalho em cima de um talude para que, desde logo, se imponha a adoção de medidas de segurança, coletivas ou individuais. 95. Para tanto é necessário que se demonstre a verificação de alguma das circunstâncias previstas nas normas (perigosidade decorrente da inclinação, da natureza ou do estado da superfície, das condições atmosféricas, da fraca ou boa resistência dos taludes onde se executavam os trabalhos que justifique a adoção de tais medidas. 96. Ora, compulsada a factualidade assente e provada, nada nos aponta no sentido quanto ao modo e circunstâncias como o sinistro se deu. 97. Aliás, tão pouco o próprio trabalhador soube explicar o motivo determinante da sua queda em altura e, muito menos o poderia fazer o legal representante da Recorrente, já que participava na execução dos trabalhos a uma profundidade de 7 metros de profundidade (base do poço) por dentro das manilhas, mas apenas e só para orientar a descida do tubo de PVC, cujo sinistrado conduzia e orientava do cimo do poço. 98. Da referida matéria de facto não decorre que as terras do talude fossem moles ou movediças, nem que ao chegar-se ao fosse entre o talude e as manilhas, o sinistrado, não estivesse seguro a um ponto fixo, que estava com a corda enrolada à sua mão, aliás, o que lhe determinou que após a queda ficasse suspenso, pelo que, a sua indeterminada posição junto ao fosso entre as manilhas e o talude, não impediam ou tornasse de tal forma perigosa a circulação do sinistrado naquela zona, de tal forma que impusesse a adoção de medidas de proteção individual ou coletivas contra o risco de queda em altura. 99. Aliás, nem tal foi discutido, aventado ou alegado por qualquer interveniente processual. 100. Por outro lado, o sinistrado, revelou possuir firmeza e equilíbrio tal como na execução dos poços anteriores, necessários para efetuar o trabalho, revelando que a execução dos trabalhos, pela sua própria natureza tinham de ser realizados como foram. 101. E, por isso mesmo, simplesmente, o sinistrado não consegue decifrar, explicar ou pormenorizar, o que determinou a sua queda. 102. Donde, o juízo de prognose quanto à avaliação desse risco de queda em altura deve ser feito em função das condições existentes ‘a priori’, perante o circunstancialismo que se verificava aquando do acidente, e não ‘a posteriori’, perante a constatação do acidente. 103. Com relevância, veja-se o Acórdão do S.T.J. de 9.12.2010, in www.dgsi.pt, Processo n.o 838/06.5TTMTS.P1.S1, no qual se referiu o seguinte: “Como se deixou consignado no Acórdão da Secção Social deste Supremo, de 21.10.2009, proferido no Proc. n.o 230/09.0YFLSB, sintetizando a posição que vem sendo seguida neste Tribunal, a implementação de medidas de protecção contra quedas em altura, no quadro dos apontados normativos (arts. 44.o e 45.o do citado Regulamento e 11.o da Portaria n.o 101/96) só é obrigatória quando esse risco efectivamente existir, face a um juízo de prognose a formular, no quadro do circunstancialismo existente aquando do acidente, circunstancialismo de que o sinistrado tenha conhecimento ou de que se possa aperceber, agindo com a diligência normal do ‘bonus pater familias’ (2), e não face a um juízo a emitir com base em circunstâncias ou dados que só após o acidente se tornaram conhecidos ou cognoscíveis pelo sinistrado. Sendo que não basta que tenha ocorrido um acidente de trabalho traduzido em queda em altura para, de imediato e sem mais, se poder afirmar que houve violação das regras de segurança (neste sentido veja-se, por exemplo, o Acórdão desta Secção de 16.6.2004, www.dgsi.pt, processo n.o 04S339), não podendo a eclosão do acidente ser o ponto de partida para se ajuizar da necessidade de implementar uma determinada medida de segurança (ver Acórdão desta Secção de 31.10.2007, www.dgsi.pt, processo n.o 07S1517)”. 104. Subscrevemos por inteiro as presentes considerações, adiantando que este entendimento se mantém na linha da Jurisprudência já firmada no Supremo Tribunal de Justiça, cuja bondade, a nossos olhos, não sofre contestação. 105. E na aplicação das medidas de prevenção deve a Entidade Empregadora mobilizar os meios necessários, nomeadamente, nos domínios da prevenção técnica, da formação e da informação, e os serviços adequados, internos ou exteriores à empresa, estabelecimento ou serviço, bem como o equipamento de proteção que se torne necessário utilizar, tendo em conta, em qualquer caso, a evolução técnica. 106. Ante os conferidos factos que delimitam a subsequência dinâmica e o âmbito do quadro relevante, não resulta que se impusesse, em termos de normal previsibilidade dos riscos profissionais, como já se disse, que à R. empregadora fosse exigível, preventivamente, ao tempo da intervenção pontual do trabalhador sinistrado e nas sobreditas circunstâncias (posição junto ao fosso entre o talude e as manilhas do poço, com vista a dirigir o tubo de PVC pelo interior das manilhas segundo as indicações dadas para esse fim pelo legal representante da Recorrente), a implementação de quaisquer (outras) medidas de segurança, cuja omissão lhe possa/deva ser imputada em primeira linha, quanto mais não seja porque, não pode a eclosão do sinistro ser o ponto de partida para se ajuizar da necessidade de implementar uma determinada medida de segurança. 107. Ora, concluímos dizendo que, nada se tendo provado quanto à dinâmica concreta em que se produziu o sinistro, por maioria de razão, não se consegue estabelecer um nexo de causalidade adequada entre a omissão das regras de segurança e o sinistro. 108. Assim tendo, como efetivamente tem, a Entidade Empregadora a sua responsabilidade infortunística totalmente transferida para a 1a Ré Seguradora, através de apólice de acidentes de trabalho, válida e eficaz à data do sinistro, mais não resta, pois, do que condenar esta ao pagamento das quantias peticionadas, assim se absolvendo, tout court, a aqui Recorrente Entidade Empregadora. 109. O mesmo é dizer que, deve ser revogada a decisão emanada do Tribunal da Relação de Coimbra, substituindo-se por Douto e assertivo Acórdão que declare a improcedência da ação e a procedência da reconvenção deduzida pela Recorrente. A Ré – seguradora apresentou contra-alegações. Neste Supremo Tribunal, o Exmo Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de ser negada a revista. x Definindo-se o âmbito do recurso pelas suas conclusões, temos, como questões em discussão: -se existe nexo de causalidade entre a violação das regras de segurança pela empregadora e o acidente de trabalho. x Vem assente como provada a seguinte matéria (a negrito as alterações efectuadas pela Relação): 1. No relatório pericial de clínica médico-legal, efectuado pelo perito médico neste Juízo de Trabalho, foi arbitrada, a partir de 31 de Janeiro de 2019, dia seguinte à alta, uma incapacidade permanecente parcial de 44,7967% (artigo 1o factos assentes). 2. O sinistrado foi vítima de um acidente de trabalho no dia 19 de Julho de 2018, pelas 11h:30m, em ..., quando executava o seu trabalho de operador de máquinas por conta, sob a autoridade, direcção e fiscalização da entidade patronal Gualdim Anciães Amado & Filhos, Lda, com sede em ..., ... (artigo 2o factos assentes). 3. O acidente consistiu em ter entalado a mão direita, quando manuseava um tubo, resultando-lhe as lesões descritas no auto de exame médico de fls. 64 a 66 (artigo 3o factos assentes). 4. À data do acidente o sinistrado auferia a remuneração anual de 20.169,97 euros [(760,00 euros x 12 meses) + (1.337,26 euros x 1 de subsídio de férias) + 1.337,26 euros x 1 de subsídio de Natal) + (5,81 euros x 22 x 12) de subsídio de alimentação) + (472,00 euros x 12 de prémio de assiduidade) + (1.177,61 euros de pagamento de trabalho suplementar nos 12 meses anteriores ao do acidente] (artigo 4o factos assentes). 5. A 1.a Ré já pagou a título de pensão mensal, desde 31 de Janeiro de 2020 a Outubro de 2020, a quantia de 18 318,90 euros (artigo 6o factos assentes). 6. O Autor deslocou-se uma vez ao Gabinete Médico-Legal da Guarda, para ser submetido a perícia de avaliação do dano corporal em Direito do Trabalho e deslocou-se três vezes a este Tribunal para diligências agendadas (artigo 7o factos assentes). 7. Deslocações que fez em veículo próprio por não haver transporte público compatível quer com o horário de tais diligências quer com o horário da perícia de avaliação (artigo 8o factos assentes). 8. A residência do Autor dista da cidade da Guarda cerca de 65Km, nas referidas quatro deslocações, o Autor percorreu cerca de 520Km (artigo 9o factos assentes). 9. O Autor é beneficiário da Segurança Social Portuguesa com o n.o 11300788154 e nasceu a 12 de Setembro de 1965 (artigo 10o factos assentes). 10. A Companhia de Seguros declinou responsabilidades (artigo 11o factos assentes). 11. O Autor trabalha como operador de máquinas, com idêntica categoria profissional, por conta, sob a autoridade e direção da 2.a Ré, que exerce a actividade de construção civil e obras públicas. (artigo 1o da petição inicial) 12. O Autor se encontrou afectado de Incapacidade Temporária Absoluta entre os dias 20 de Julho de 2018 e 31 de Janeiro de 2019. (artigo 5o da petição inicial) 13. A 2.a Ré tinha a sua responsabilidade emergente do acidente de trabalho transferida para a 1.a Ré, pela apólice n.o .... (artigo 6o da petição inicial) 14. Realizada Tentativa de Conciliação no dia 11 de Novembro de 2020, não foi obtido acordo porquanto: - A 1.a Ré reconheceu a caracterização do acidente dos autos como de trabalho, o nexo de causalidade entre este e as lesões, bem como a incapacidade indicada e a existência de um contrato de seguro válido e eficaz pela retribuição transferida de pelo montante anual de € 16.859,35 [€ 760,00 x 14 meses) + (€82,78 x 12 meses de trabalho suplementar) + (€ 393,33 x 12 meses de outras remunerações) + € 126,50€ x 4 meses de subsídio de alimentação); aceitou a data da alta fixada pelo GML e os períodos de incapacidade temporária também pelo mesmo fixados; aceitou pagar ao sinistrado as despesas de transporte com as deslocações obrigatórias ao Tribunal (3) e ao GML (1), no montante de € 106,08; não aceitou conciliar-se por entender que o acidente ocorreu devido a atuação culposa da aqui 2.a Ré, nos termos previstos no artigo 18.o n.o 1 da LAT, em consequência do que considera existir responsabilidade agravada da mesma; - A 2.a Ré reconheceu a caracterização do acidente dos autos como de trabalho, o nexo de causalidade entre este e as lesões, bem como a incapacidade indicada; aceitou a data da alta fixada pelo GML e os períodos de incapacidade temporária também pelo mesmo fixados. Porém, não aceitou conciliar-se por se encontrar transferido para a 1.a Ré o salário anual de € 20.169,97 [(€760,00 x 12 meses) + (€ 1.337,26 x 1 de subsídio de férias) + (€ 1.337,26 x 1 de subsídio de natal) + (€5,81 x 22 x 11) de subsídio de alimentação) + (€472,00 x 12 meses de prémio de assiduidade) + (€ 1.177,61 de pagamento de trabalho suplementar nos 12 meses anteriores ao do acidente], entendendo que a responsabilidade pela reparação dos danos emergentes do acidente se encontra integralmente transferida para a 1.a Ré. (artigo 7o da petição inicial) 15. A 1.a Ré pagou ao Autor a título de indemnizações pelas incapacidades temporárias de que foi portador (ITA entre o período de 20 de Julho de 2018 e 31 de Janeiro de 2019), a quantia de 6181,50 euros, calculada em função da remuneração anual que a 1.a Ré considera encontrar-se para si transferida. (artigo 9o da petição inicial) 16. Contudo, e uma vez que à data do acidente o Autor auferia a remuneração anual de 20 169,97 euros, era devida ao Autor, a título de indemnização por incapacidades temporárias a quantia global de 7.543,01 euros (20.169,97 euros/ 365 x 70% x 195). (artigo 10o da petição inicial) 17. Permanecendo assim por liquidar quantia de 1361,51 euros. (artigo 11o da petição inicial) 18. A 1a Ré, presentemente continua a proceder ao pagamento de pensão mensal provisória. (artigo 4o da contestação) 19. No dia 19 de Julho de 2018 pelas 11.00 horas/11.30 horas, o Autor procedia à colocação de um tubo de PVC no interior de um poço manilhado, na Serra do Sirigo, em Penedono, sob as ordens e direcção da 2a Ré. (artigo 9o da contestação) 20. Ao mesmo tempo, o representante legal da sua 2a Ré, encontrava-se no interior de tal poço a colaborar nos trabalhos. (artigo 10o da contestação) 21. Tal serviço tinha sido contratado pela Câmara Municipal de Penedono e pressupunha a execução de 5 poços, com 7 metros de profundidade cada um para a captação de água. (artigo 11o da contestação) 22. No exercício das suas funções, e em colaboração com o representante legal da 2a Ré, o Senhor BB, procederam à colocação de um tubo de PVC, de aproximadamente 21 kg, no interior das manilhas que já se encontravam instaladas na escavação. (artigo 12o da contestação) 23. Para tal, o representante legal da 2a Ré colocou-se no interior das manilhas, ou seja, na base do poço, mantendo-se o Autor no exterior, mais concretamente na zona superior do talude da escavação. (artigo 13o da contestação) 24. O Autor segurava com a sua mão direita uma cinta que se encontrava presa ao topo superior do tubo, permitindo-lhe controlar a descida e movimentação do mesmo. (artigo 14o da contestação) 25. Por sua vez, o representante legal da 2a Ré ia fornecendo orientações ao Autor sobre o posicionamento do tubo a fim de ser aparafusado à manilha do poço com recurso a braçadeiras. (artigo 15o da contestação) 26. A determinado momento da tarefa que executavam, o Autor acabou por cair na vala existente entre o exterior das manilhas e a parede em terra da escavação, com uma profundidade de 7 metros. (artigo 16o da contestação) 27. Acto contínuo, como o tubo se encontrava já no interior da manilha, a cinta que estava acoplada ao mesmo e segura pela mão do Autor, acabou por permitir a sua suspensão. (artigo 17o da contestação) 28. Sucede que, a cinta encontrava-se enrolada na mão direita do Autor, e a queda com suspensão, provocou o aperto e esmagamento da mão pela cinta, por força do peso do corpo do Autor. (artigo 18o da contestação) 29. Facto de que resultaram para o Autor lesões. (artigo 20o da contestação) 30. O sinistro ocorreu pelo facto de a 2a Ré não ter facultado ao Autor qualquer dispositivo de protecção colectiva contra o risco de queda. (artigo 22o da contestação) 31. O legal representante do empregador ordenou ao autor para que se colocasse na zona do talude, segurando uma cinta amarrada ao tubo que fazia descer segundo as instruções dadas, sabendo da existência do fosso entre a manilha e a escavação (alterado pela Relação) 32. O poço estava manilhado e era circundado por uma vala de 7 metros, resultado da escavação. (artigo 24o da contestação) 33. O Autor se manter na zona do talude da escavação enquanto segurava a cinta, com uma vala imediatamente à frente, sem para tal estar munido de qualquer equipamento de segurança que o impedisse de se aproximar da abertura da escavação, conduziu inevitavelmente ao acidente dos autos. (artigo 25o da contestação) 34. Para evitar tal acidente, bastaria que a colocação do tubo de PVC ocorresse em momento posterior ao aterro da zona envolvente às manilhas, eliminando-se o fosso, e, por conseguinte, o risco de queda em altura. (artigo 26o da contestação) 35. Ou, ainda, que fossem utilizados dispositivos de segurança colectiva, como por exemplo, uma corda de amarração, ancorada a ponto fixo na retaguarda do Autor, com o comprimento apto a permitir a execução dos trabalhos e a evitar a aproximação da abertura do poço. (artigo 27o da contestação) 36. A 2a Ré não preparou convenientemente os seus trabalhadores para as tarefas que os incumbia a realizar. (artigo 28o da contestação) (suprimido pela Relação) 37. O acidente podia e devia ter sido evitado pela 2a Ré. (artigo 29o da contestação) (suprimido pela Relação) 38. Para tal bastaria que tivesse sido feito o aterro da vala, ou (artigo 30o da contestação) 39. Tivessem sido fornecidos Equipamentos de Protecção Individual, pois, (artigo 31o da contestação) (suprimido pela Relação) 40. O risco de queda estaria completamente anulado. (artigo 32o da contestação) (suprimido pela Relação) 41. Não cuidou a 2a Ré de tomar as medidas de forma a assegurar as condições de segurança aos seus trabalhadores, mormente ao Autor. (artigo 34o da contestação) (suprimido pela Relação) 42. A 2a Ré era a responsável pela orientação e planificação dos trabalhos. (artigo 35o da contestação) 43. À 2a Ré, responsável pela orientação e planificação dos trabalhos, era exigível que não descurasse o cumprimento estrito das regras de segurança que se impunham no caso em apreço. (artigo 36o da contestação) (suprimido pela Relação) 44. Tal situação poderia e deveria ser facilmente evitada se fossem implementados dispositivos de segurança colectiva pela 2a Ré. (artigo 37o da contestação) (suprimido pela Relação) 45. O acidente de trabalho que o Autor sofreu se deu exclusivamente porque a 2a Ré não colocou em prática medidas adequadas à prevenção do risco associado à execução da tarefa que atribuiu ao seu trabalhador. (artigo 38o da contestação) (suprimido pela Relação) 46. A 2a Ré não acautelou tal risco por qualquer das formas possíveis e obrigatórias, muito embora soubesse, porque não podia desconhecer, a possibilidade de queda em altura, em função do modo como o trabalho era executado, segundo as ordens, direcção e fiscalização da 2a Ré. (artigo 39o da contestação) (suprimido pela Relação) 47. Encontra-se totalmente transferido para a 1a Ré o salário anual de 20 169,97 euros [(760,00 euros x 12 meses) + (1337,26 euros x 1 de subsídio de férias) + (1337,26 euros x 1 de subsídio de natal) + (5,75 euros até Setembro de 2018 e 5,81 euros após Setembro de 2018 x 22 dias de trabalho efectivo x 11 meses) de subsídio de alimentação) + (472,00 euros x 12 meses de prémio de assiduidade) + (1177,61 euros de pagamento de trabalho suplementar nos 12 meses anteriores ao do acidente]. (artigo 2o da contestação) 48. A responsabilidade pela reparação dos danos emergentes do acidente se encontra integralmente transferida para a 1a Ré. (artigo 4o da contestação) 49. A 2a Ré celebrou e mantinha com a 1a Ré um contrato de seguro para cobertura de acidentes de trabalho ocorridos com os seus trabalhadores, na modalidade de prémio variável, com efeitos a partir de 1 de Julho de 2018, com periodicidade de pagamento mensal. (artigo 5o da contestação) 50. A 2a Ré remetia, mensalmente e em suporte electrónico, a folha de remunerações à 1a Ré, em ficheiro com as caraterísticas técnicas definidas por esta, sendo considerados, para efeitos do presente contrato, as pessoas e retribuições aí identificadas, em especial o Autor. (artigo 6o da contestação) 51. Em cumprimento das suas obrigações contratuais, a 2a Ré sempre procedeu ao pagamento dos prémios de seguro vencidos, inclusive o referente ao período do acidente. (artigo 7o da contestação) 52. No final de cada semestre também pagou os valores que lhe eram apresentados pela 1a Ré, inclusive os referentes ao subsídio de refeição. (artigo 8o da contestação) 53. Sempre a 2a Ré procedeu à elaboração das folhas de férias do seu pessoal, em ficheiro PDF, delas constando todos os trabalhadores e todas as remunerações, seja retribuição base, subsídios de férias e de Natal, prémios, horas extraordinárias e subsídios de alimentação. (artigo 9o da contestação) 54. E sempre procedeu à remessa destas folhas de férias à 1a Ré, em ficheiro e segundo os procedimentos definidos por esta, convencida e sem razões para duvidar de que este ficheiro assumia na íntegra o conteúdo integral do ficheiro PDF elaborado pela 2a Ré. (artigo 10o da contestação) 55. Todos os valores auferidos pelos trabalhadores são os que constam do recibo de vencimento e são estes valores, todos, que igual e precisamente são comunicados quer à Segurança Social quer à 1a Ré. (artigo 11o da contestação) 56. Na sequência do acidente de trabalho, a 2a Ré naturalmente remeteu à 1a Ré a competente participação de acidente de trabalho. (artigo 12o da contestação) 57. Logo após a indicação da 1a Ré de que não se encontravam transferidos valores a 2a Ré, incrédula, procurou esclarecer o sucedido. (artigo 13o da contestação) 58. Remeteu também ao processo, a pedido do tribunal, cópia dos recibos e folhas de férias, o que fez por comunicação de 20 de Fevereiro de 2019, conforme solicitado pelo Tribunal. (artigo 14o da contestação) 59. A 2a Ré tinha não apenas um contrato de seguro válido para garantia de 60. A 2a Ré remetia, mensalmente e em suporte electrónico, a folha de remunerações à Co-Ré Liberty, em ficheiro com as caraterísticas técnicas definidas por esta, sendo consideradas, para efeitos do presente contrato, as pessoas aí identificadas – todos e quaisquer um dos trabalhadores, Autor incluído –, e todas e quaisquer retribuições por estes auferidas – não apenas o subsídio de alimentação, mas também salário base, subsídios de férias e de Natal, prémios e horas extraordinárias –, tudo à semelhança e nos exactos termos em que era feito relativamente à Segurança Social. (artigo 2o da resposta) 61. No final de cada semestre também sempre pagou os valores que lhe eram apresentados pela 1a Ré, inclusive os referentes ao subsídio de refeição. (artigo 3o da resposta) 62. A 2a Ré distribui equipamentos de protecção individual anualmente a todo e qualquer um dos trabalhadores, Autor incluído. (artigo 7o da resposta) 63. Na sequência do acidente ocorrido, o ISS.IP, pagou a título de prestações de doença, no período de 18 de Agosto de 2018 a 11 de Outubro de 2018, a importância de 1.423,80 euros. (artigo 1o do pedido de reembolso) x Factos considerados não provados: • À data de 19 de Julho de 2018, relativamente ao Autor, encontrava-se validamente transferida para a Ré Seguradora a responsabilidade infortunística laboral, referente ao salário transferido de € 760,00 x 14 meses + 82,78 € x 12 meses (trabalho suplementar) + 393,33 € x 12 meses (outras remunerações) + 126,50 € x 4 meses (subsídio alimentação), (artigo 6o da contestação) • A que corresponde o salário anual transferido para a Ré Seguradora de € 16.859,35 (dezasseis mil oitocentos e cinquenta e nove euros e trinta e cinco cêntimos). (artigo 7o da contestação) • Montante a que se encontra limitada a responsabilidade desta Ré Seguradora, nos seus precisos termos. (artigo 8o da contestação) -Se desequilibrar. (artigo 16o da contestação) • A 2a Ré cumpre e dá instruções para serem cumpridas todas as regras de segurança, inclusive no que a equipamentos de protecção individual diz respeito, velando inclusive pela sua utilização. (artigo 7o da resposta) • O Autor tenha feito descer o tubo manualmente em vez de se ter socorrido de máquina retroescavadora existente no local, tal como previamente lhe tinha sido ordenado inclusive pelo representante legal também presente no local. (artigo 9o da resposta) • E não tenha utilizado uma corda, amarrando-a ponto fixo, mormente à retroescavadora. (artigo 10o da resposta) • O Autor, também no caso dos autos, dispunha de equipamento de protecção individual. (artigo 9o da 2a contestação) -A 1a Ré não pode ignorar que os trabalhos que estavam a ser executados no momento do acidente exigiam que o poço estivesse seco. (artigo 14o da 2a contestação) - O aterro da vala, atendendo ao nível freático, muito elevado, assim inundando o poço, inviabilizava os trabalhos. (artigo 15o da 2a contestação) • O aterro da vala obrigava a colocação antecipada de tampa de betão armado para o fecho do poço, o que também inviabilizava a colocação do tubo, bem como outras tarefas associadas. (artigo 16o da 2a contestação) x • o direito: Está assente, por tal ser admitido, em termos que não suscitam quaisquer dúvidas, pela Recorrente, na sua alegação de recurso, a violação das regras de segurança. A mesma põe em causa unicamente o nexo de causalidade entre essa violação e o acidente, por nada se ter provado quanto à dinâmica concreta em que se produziu o sinistro. O artigo 18.o da LAT (lei 98/2009), com a epígrafe “atuação culposa do empregador” consagra, desde logo, um agravamento da responsabilidade, ampliando o dano indemnizável e reparável, à totalidade dos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pelo trabalhador e pelos seus familiares (n.o 1). Como a jurisprudência deste Tribunal tem salientado, a prova dos pressupostos ou requisitos deste agravamento cabe a quem o invoca, quer se trate do trabalhador, quer do segurador. E não se pode inferir da própria ocorrência do acidente a falta de observação pelo empregador, ou demais pessoas referidas no preceito, das regras sobre segurança e saúde já que a observação de tais regras não elimina sempre e completamente o risco, ou melhor o perigo, de ocorrência de um acidente- cfr. ac. do STJ e Secção Social de 11-07-2019, Processo n.o 1564/15.0Y2MTS.P1.S1 (Revista) – 4.a Secção A responsabilidade prevista em tal disposição legal pressupõe a verificação cumulativa do incumprimento do dever de observância de regras de segurança e saúde no trabalho e de uma relação de causalidade adequada entre tal omissão e o acidente. Quanto ao nexo de causalidade, temos que, e segundo Galvão Teles, Manual de Direito das Obrigações, 229, no direito civilístico português vigora a doutrina da causalidade adequada: "determinada acção ou omissão será causa de certo prejuízo se, tomadas em conta todas as circunstâncias conhecidas do agente e as mais que um homem normal poderia conhecer, essa acção ou omissão se mostrava, à face da experiência comum, como adequada à produção do referido prejuízo, havendo fortes probabilidades de o originar" No Ac. do STJ de 23/9/2012, proc. 289/09.0TTSTB.E1.S1, disponível em www.dgsi.pt, escreveu-se o seguinte: “Debruçando-se sobre esta temática, Pessoa Jorge começa por aludir à “teoria da equivalência das condições”, para a qual “... cada condição sine qua non seria causa de todo o efeito, porque, sem ela, as outras condições não teriam actuado” (in “Ensaio Sobre os Pressupostos Da Responsabilidade Civil” – “Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal”, Lisboa, 1 a 72, reedição, página 389). Sendo notório, porém, que uma tal teoria jamais poderia ser transposta, na sua genuinidade, para o domínio da responsabilidade civil – por ser patentemente injusto responsabilizar alguém por prejuízos que nada tiveram a ver em concreto, com a sua conduta – haverá que eleger então, de entre as várias condições do dano, aquelas que legitimam a imposição, ao respectivo agente, da obrigação de indemnizar. O nosso sistema positivo acolheu a “teoria de causalidade”, ao consignar, no artigo 563.o do Código Civil, que “...a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão”. A inadequação de uma dada causa para um resultado deriva da sua total indiferença para a sua produção, que, por isso mesmo, só ocorreu por circunstâncias excepcionais ou extraordinárias. A teoria da causalidade adequada impõe, pois, num primeiro momento, a existência de um facto naturalístico concreto, condicionante de um dano sofrido, para que este seja reparado; e, num segundo momento, que o facto concreto apurado seja, em geral e abstracto, adequado e apropriado para provocar o dano. E assim sendo, o facto gerador do dano só pode deixar de ser considerado sua causa adequada se se mostrar inidóneo para o provocar ou quando para a sua produção tiverem contribuído decisivamente circunstâncias anormais, excepcionais, extraordinárias ou anómalas, que intervieram no caso concreto- ac. do STJ de 25/10/2018, proc. 92/16.0T8BGC.G1.S2. Enquadrada a questão vejamos a argumentação acolhida pelo acórdão recorrido: “Estava em causa na obra e no movimento laboral que o sinistrado executava, aquando do acidente, um trabalho em altura - na descrição provada do acidente resulta que a queda ocorreu perante vala existente no local dos trabalhos com uma profundidade de 7 metros, de acordo como o facto 26. Portanto, ocorrendo risco de queda em altura haveria que atender aos comandos inscritos no DL n.o 50/2005, de 25 de Fevereiro (relativo a prescrições mínimas de segurança e de saúde na utilização de equipamentos de trabalho), designadamente nos artigo 36.o e segs. (na secção relativa a utilização dos equipamentos de trabalho destinados a trabalhos em altura), onde se aponta para a necessidade de utilização de equipamentos de protecção colectiva (andaimes e plataformas, designadamente) e de protecção individual (cordas, corda de segurança e arnês, conforme art. 39.o). Ora, o que os factos provados demonstram é que o serviço no qual o autor se acidentou (em queda) era feito juntamente com o representante legal da empregadora (facto 22.), estando este na base do poço de 7 metros e o autor no exterior, na zona superior do talude da escavação (facto 23.), e à medida que o primeiro ia fornecendo instruções ao segundo (facto 25.). Não estavam colocados quaisquer dispositivos de protecção colectiva contra o risco de queda (facto 30.) e o legal representante do empregador ordenou ao autor para que se colocasse na zona do talude, segurando uma cinta amarrada ao tubo que fazia descer segundo as instruções dadas, sabendo da existência do fosso entre a manilha e a escavação (facto 31.). O autor não estava munido de qualquer equipamento de segurança que o impedisse de se aproximar da abertura da escavação (facto 33.), nomeadamente uma corda de amarração, ancorada a ponto fixo na retaguarda, com o comprimento apto a permitir a execução dos trabalhos e a evitar a aproximação da abertura do poço (facto 35.). Segue-se daqui que a queda do sinistrado ocorreu sem a presença de quaisquer dispositivos e segurança impostos pelas normas referidas. As circunstâncias em que o acidente ocorreu permitem com devida razoabilidade e clareza perceber que se tais dispositivos existissem, uma plataforma em andaime adequado ou cordas de protecção e de segurança, a queda não teria ocorrido. Naturalmente, a ré era a responsável pela orientação e planificação dos trabalhos, como resulta dos factos provados (facto 22.) e dos normativos legais acima apontados. A omissão dos dispositivos de segurança num trabalho que envolvia directamente o legal representante da ré empregadora, o qual estava presente e orientava os trabalhos, conduz-nos a considerar, sem nenhuma dúvida, que existe nexo causal entre a omissão da ré empregadora de estabelecer orientações de segurança, com utilização de dispositivos anti queda, e o evento queda. Essa omissão foi sem dúvida uma das condições do evento e do subsequente dano. Podemos afirmar que a violação das normas de segurança em presença não foi de todo indiferente para a produção do resultado. Independentemente dos motivos que tenham determinado a queda do sinistrado (desequilíbrio, desatenção ou outra) - o que se não apurou em concreto de forma detalhada e ponto em que a apelante argumenta no recurso como sendo necessário para a verificação do nexo causal em questão -, a violação das apontadas normas de segurança surge como condição relevante e efectiva para a ocorrência do sinistro laboral. Este apresenta-se como consequência normal, típica ou provável daquela violação. Assim apreciadas as questões colocadas no recurso, podemos sem dúvida considerar demonstrado que ocorreu violação, por omissão do empregador, de normas de segurança previstas na lei que se mostrem causais do acidente”. Como expressamente se referiu no acórdão da Formação que admitiu a presente revista excepcional, o acórdão recorrido basta-se com a demonstração, para a prova do nexo causal, de que o sinistro é uma consequência normal, previsível da violação das regras de segurança, ao passo que o invocado, pela Recorrente, acórdão fundamento exige substancialmente mais, exige que, no caso concreto, a violação das regras de segurança tenha sido conditio sine qua non. Neste último considerou-se que “a vertente naturalística - a chamada dinâmica do acidente – não se encontra provada. Isto é, não foi feita prova de que o facto praticado pelo agente – in casu, o corte e a retirada das terras, a não adoção de medidas de contenção da parede, a falta de entivação na frente escavada – em termos de fenomenologia real e concreta, deu origem ao dano”. Reconhecendo-se que a questão está longe de ser pacífica, parece-nos mais adequada a posição seguida pelo acórdão recorrido. Como refere Cláudia Alexandra dois Santos Silva, in o “Ato Suicida do trabalhador no contexto do regime infortunístico laboral- comentário ao Acórdão do Supremo Tribumal de Justiça de 16/12/2010”, in Questões Laborais, no 61, pags. 152-154: “Tem sido entendimento dominante no nosso ordenamento jurídico que, tanto para efeitos do regime da responsabilidade objetiva no domínio civil, como para efeitos da LAT, deverá atender-se à teoria da causalidade adequada (art. 563.o do Código Civil), segundo a qual para que um facto seja causa de um dano é necessário que, no plano naturalístico aquele seja condição sem a qual o dano não se teria verificado e que, em abstrato ou em geral, seja adequado a produzi-lo segundo o curso normal das coisas. Acresce que, a jurisprudência tem entendido que o facto só deixará de ser causa adequada do dano, se, dada a sua natureza geral e em face das regras da experiência comum, se mostrar indiferente para a verificação do dano, se se revelar de todo inadequado e o haja produzido apenas em consequência de circunstâncias anómalas ou excecionais. Conforme explicitado pelo Supremo Tribunal de Justiça em acórdão de 14/07/2021: "(...) o facto que atuou como condição do dano só não deverá ser considerado causa adequada do mesmo se, dada a sua natureza geral e em face das regras da experiência comum, se mostra indiferente para a sua verificação, tendo presente que a causalidade adequada não se refere ao facto e ao dano isoladamente considerados, mas ao processo factual que, em concreto, conduziu ao dano no âmbito da aptidão geral ou abstraia desse facto para o produzir, sendo que para a sua verificação pode ter havido a colaboração de outros factos, contemporâneos ou não, e que a causalidade não tem de ser necessariamente direta e imediata, bastando que a ação condicionante desencadeie outra condição que, diretamente, suscite o dano - causalidade indireta.". Com efeito, a doutrina da causalidade adequada não exige a exclusividade do facto condicionante do dano (isto é, que o dano seja necessariamente provocado por uma só condição). Refere Menezes Leitão que "(...) o que caracteriza o conceito de causa de um evento é apenas a imprescindibilidade de uma condição para a sua verificação ("sem a qual não") não se justificando estabelecer qualquer apreciação da relevância jurídica dessas condições, uma vez que todas elas são equivalentes para o processo causal, mesmo que o evento só resulte da acção conjugada de ambas.". Além disso, não se exige que o nexo causal entre o facto e o dano seja direto e imediato, podendo ser indireto e mediato, o que ocorre nas situações em que embora o facto não tenha ele mesmo provocado o dano, desencadeia outra condição que diretamente o produz, desde que esta segunda condição seja uma consequência adequada da primeira (causalidade indireta)17. Aliás, os nossos tribunais superiores têm-se pronunciado de forma expressa no sentido de que o nexo causal para efeitos de responsabilidade infortunística comporta uma causalidade indireta: "(...) a secção social deste Tribunal tem considerado (...) que o nexo causal que se exige, para efeito de responsabilidade infortunística, não tem de ser de uma causalidade direta, pois comporta, também, uma causalidade indireta. Com efeito, face a relevância social da matéria dos acidentes de trabalho, é a própria legislação relativa aos acidentes de trabalho que confere este grau de proteção aos sinistrados. O próprio Direito Civil, no campo mais lato das obrigações, prevê desde logo, no art- 563Q do Código Civil: A obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão. Constatamos assim que o próprio Direito Civil não exclui a obrigação de indemnizar qualquer dano que o lesado tenha sofrido em consequência da lesão inicial. Por maioria de razão, verifica-se o mesmo em matéria de acidentes de trabalho.". Na verdade, no âmbito da responsabilidade por acidentes de trabalho, a configuração do nexo de causalidade parece ser mais ampla do que aquela que resulta da causalidade adequada no regime da responsabilidade civil, o que se justifica face aos interesses em jogo na legislação infortunística”.. Por sua vez, Mafalda Miranda Barbosa, in “Para Jorge Leite – Escritos Jurídico-Laborais”, Vol. I, Coimbra Editora, 2014, pag. 72, escreve designadamente o seguinte: “A ser ponderada a causalidade nos moldes tradicionais, seríamos, igualmente, remetidos para o limbo da condicionalidade. A condicionalidade sem a qual vem-nos dizer que um facto é causa do dano quando mostre ser uma condição sem a qual ele não surgiria. No entanto, em termos gerais, temos boas razões para recusar tal impostação do problema. A condicionalidade sem a qual enreda-nos numa linguagem contrafáctica conducente a aporias várias, ao mesmo tempo que nos remete para soluções que se mostram profundamente distantes de um quadro de justiça onde a nota da exigibilidade deve estar presente. Ademais, com a condicionalidade sine qua non não conseguimos apurar qual a verdadeira causa do dano, mas tão-só eliminar comportamentos que sejam irrelevantes para a produção dele. E, porque a visão determinística do mundo foi já ultrapassada, ainda assim só o conseguiremos fazer em termos probabilísticos, numa aproximação indesejada à doutrina da causalidade adequada. Acresce que, porque a realidade é complexa e, portanto, concorrem ou podem concorrer sempre diversas causas/condições para a produção do dano, podemos ser remetidos para situações aporéticas, como sejam aquelas em que somos confrontados com a causalidade alternativa incerta”. Júlio Manuel Vieira Gomes, in “O acidente de trabalho – o acidente in itinere e a sua descaracterização”, Coimbra Editora, pags. 142 e ss, refere, exaustivamente, o seguinte: “Como é sabido, uma das teorias historicamente mais influentes, no direito alemão e também no nosso, foi a teoria da equivalência das condições. A partir da visão da causa defendida por Hume e depois, com várias adaptações por STUART MILL, entendeu-se que a causa seria o conjunto das condições sem as quais um determinado evento não teria ocorrido, isto é, que, se fossem suprimidas, também o evento deixaria de existir. Neste sentido só o conjunto de todas essas condições representa a causa de um evento e todas são — e daí o nome com que a teoria é conhecida — equivalentes. O facto de uma pessoa ter atirado uma beata mal apagada para uma mata pode ter sido condição sine qua non para o incêndio, como o foram também, por exemplo, o facto de não ter chovido recentemente, de a mata não ter sido limpa, e haver abundante vegetação rasteira e outra matéria combustível, ou, simplesmente, de haver oxigénio na atmosfera... Em todo o caso, para esta visão da causa, o que há que perguntar para identificar uma situação sine qua non é como seria o mundo, qual seria o mundo hipotético que existiria, se um determinado evento não tivesse ocorrido e fosse mentalmente suprimido (...) A teoria da equivalência das condições foi considerada pela doutrina dominante como insuscetível de ser usada no domínio do direito e mais propriamente da responsabilidade civil por ser demasiado abrangente e por não distinguir entre as várias condições que no seu conjunto representam a causa e que podem, do ponto de vista jurídico, ter uma relevância muito diferenciada. No entanto, ela apresenta outros graves inconvenientes que nem sempre são destacados: além do carácter hipo-tético da situação contrafactual, importa reconhecer que esta teoria não dá uma resposta satisfatória nem às situações de causalidade alternativa ou concorrente, nem às situações de causalidade cumulativa. Há, assim, situações em que se pode suprimir mentalmente um fator, sem que por isso um certo efeito deixe de ocorrer, parecendo todavia arbitrário, de um ponto de vista jurídico, negar-lhe relevância causal — é o caso, frequentemente invocado, dos dois disparos, cada um deles mortal, provenientes de dois atiradores, que atingem simultaneamente a vítima. Noutras situações, um facto ou conduta que só por si não seria suficiente para produzir o resultado cumula-se com outro evento, também só por si insuficiente, resultando da combinação dos dois a produção do resultado. Numa tentativa de corrigir a teoria da equivalência das condições, desenvolveu-se posteriormente a teoria dita da causalidade adequada. Esta teoria procura, de entre as várias condições sine qua non, distinguir e identificar aquelas que, de um ponto de vista jurídico, podem ser tratadas como "causas". Pode, no entanto, dizer-se que esta teoria da causalidade adequada representa, apesar da linguagem adotada, uma teoria que, em rigor, não é uma teoria da causalidade. Com efeito, ela trai a premissa da teoria da equivalência das condições que considera que só as condições sine qua non no seu conjunto é que constituem a causa de um evento. Parece-nos poder afirmar-se, também, que a teoria da causalidade adequada se desenvolveu tomando como paradigma ou arquétipo a responsabilidade pela culpa e, muito particularmente, a responsabilidade pela conduta negligente. Surgindo como uma construção que visa restringir os efeitos da teoria da equivalência das condições e o âmbito de responsabilidade excessivo que esta gerava, a teoria da causalidade adequada coloca a probabilidade no âmago da causalidade, apresentando-se, pois, como uma teoria da regularidade causal. O agente só deve responder pelas consequências prováveis (outros dirão, mesmo, previsíveis ou normais) dos seus atos, por aquelas que de algum modo podia controlar ou dominar. À previsibilidade, em algumas variantes da teoria da causalidade adequada, é uma probabilidade subjetiva — aproximando-se então a questão da causalidade da questão da culpa, ao ponto de quase se confundirem —, enquanto noutras é uma probabilidade objetiva que faz apelo às circunstâncias cognoscíveis a um bom pai de família colocado "idealmente" no momento da conduta (acrescentando-se, por vezes, os conhecimentos efetivos do agente real). Constrói-se aqui, segundo alguns autores, um juízo de prognose póstuma objetivo. Em suma, a teoria da causalidade adequada não pergunta apenas, ou nem tanto, o que se passou concretamente, como o que é que era provável que se tivesse passado na sequência da conduta do agente e em que medida é que o que se passou corresponde a uma consequência normal, regular, dessa conduta. Pode de facto resto, dizer-se que o principal escopo da teoria da causalidade adequada é o de limitar a responsabilidade do agente, excluindo-a quanto às consequências improváveis ou anómalas da sua conduta. Como já se disse, a teoria da causalidade adequada conhece múltiplas variantes: em algumas construções, por exemplo, uma conduta será causa adequada se for uma circunstância que em regra favorece a produção do dano que efetivamente ocorreu por aumentar a probabilidade de ocorrência desse dano de uma maneira que não é irrelevante; outros preferem uma formulação negativa da causalidade adequada, a qual, aliás, segundo ANTUNES VARELA e alguma da nossa jurisprudência, consistiria em ser inadequada uma causa quando, segundo a sua natureza, ela for geralmente indiferente à produção de um dano e só por força de circunstâncias excecionais tiver sido condição desse dano no caso concreto. Muito embora a causalidade adequada continue a ser invocada por uma parte da doutrina e da jurisprudência, designadamente nacional, e dela se ter dito já que "constitui hoje património comum da literatura jurídica e não só da europeia continental", a verdade é que também a seu propósito se multiplicam as vozes críticas. Fala-se, abertamente, do declínio da causalidade adequada, de uma fórmula vazia ou de uma encantação mágica, de um espírito ou fantasma a exorcizar. Há, desde logo, a consciência de que a fórmula deixa muito em aberto, o que, para uma parte da doutrina, permitiria aos tribunais considerar, com grande facilidade, que existe ou que não existe causalidade adequada, ocultando as verdadeiras razões da sua decisão. A consciência das limitações da teoria da causalidade adequada conduziu a que, nomeadamente na Alemanha e na Áustria, se tivesse desenvolvido para alguns como alternativa à teoria da causalidade adequada, e para outros como mero complemento desta, a teoria do escopo de protecção da norma. Já RABEL observou que a extensão do dever de indemnizar deveria decorrer, fundamentalmente, na responsabilidade contratual, do conteúdo das obrigações contratuais violadas e, na responsabilidade extracontratual, do âmbito de proteção da norma violada. Violada uma determinada norma, importaria verificar se o dano causado pela conduta do agente era um daqueles danos cuja produção a norma pretendia evitar, sendo a sua concretização a manifestação do risco gerado pela conduta do agente. Nesta perspetiva, o escopo de proteção da norma, nas palavras de MÁRIO BARCELLONA, abrange todos os possíveis eventos lesivos que objetivamente representam actuações ou manifestações do perigo que a regra de conduta visava evitar e tal escopo estende-se a todos os bens e sujeitos sempre que a lesão constitua atuação desse perigo. Acusada, por alguns, de não se diferenciar verdadeiramente de uma interpretação teleológica da norma violada, a teoria do escopo de proteção acabou, historicamente, por ser mais um corretivo da teoria da causalidade adequada do que propriamente o seu substituto. Importa, contudo, sublinhar que a mesma parece apelar a um juízo mais concreto de imputação e, além disso, que parece ser mais apropriada aos casos de responsabilidade civil objectiva, isto é, independente de culpa do agente. Com efeito, como atrás afirmámos, a teoria da causalidade adequada parece ter sido desenvolvida tendo sobretudo como paradigma condutas negligentes, pondo o acento tónico no controlo, quando não na previsibilidade, ex ante, das consequências de uma conduta que poderia ter sido evitada pelo agente. No âmbito da responsabilidade objetiva e muito particularmente da responsabilidade pelo risco, parece que o fundamental deveria antes ser em que medida é que o dano representou uma concretização do risco criado pelo agente e que funda a sua responsabilidade, pertencendo portanto à esfera de risco deste. Aliás, também entre nós alguma doutrina considera que na responsabilidade objetiva, mesmo no domínio do Código Civil, deveria aceitar-se a teoria do escopo ou âmbito de protecção da norma de preferência àqueloutra da causalidade adequada. Não é por acaso, aliás, que noutros ordenamentos — é o que sucede, por exemplo, na Alemanha — se tem questionado da bondade da aplicação da teoria da causalidade adequada no domínio da responsabilidade por acidentes de trabalho, sendo que uma parte da doutrina alemã prefere aqui uma outra teoria de imputação que designa da "condição essencial". Aquele setor da doutrina germânica que critica a utilização no contexto dos acidentes de trabalho da teoria da causalidade adequada tende, precisamente, a sublinhar que esta parece assentar numa noção de responsabilidade pessoal e subjetiva do agente, ao que acresce que a imputação de responsabilidade, no domínio dos acidentes de trabalho, deveria ser feita mesmo que o dano em concreto não pudesse, à partida, ser considerado provável. Em suma, deveria fazer-se uma interpretação teleológica das normas de tutela no âmbito dos acidentes de trabalho, atendendo à função social dessas normas, para verificar se um acidente e as suas consequências estão ou não cobertas pelo domínio de protecção das normas. Também no nosso sistema há alguns indícios de que o conceito de causalidade relevante no domínio dos acidentes de trabalho não corresponde exactamente à causalidade adequada do direito civil ou configura aquilo a que PEDRO ROMANO Martinez chamou um nexo causal "simplificado". Em primeiro lugar, recorde-se que a fórmula legal é muito ampla abrangendo as consequências directas e indirectas do acidente. Interessa a este respeito não esquecer que historicamente a nossa lei sobre acidentes de trabalho foi muito mais influenciada pelo direito francês do que pelo ordenamento jurídico alemão, ao contrário do que no nosso direito civil se passa em matéria de responsabilidade civil. Ora se, no contexto da teoria da causalidade adequada, expressões como dano direto e indi-reto, mediato ou imediato, não parecem ter grande importância, a referência às consequências directas e indirectas do acidente assume um outro valor e significado quando se atenta a que no Código Civil francês, à semelhança do que também se passa no Código Civil italiano, as consequências indemnizáveis de uma conduta cingiam-se, em princíio aos danos diretos. A fórmula adoptada pelas leis em matéria de acidentes de trabalho era, portanto, à partida, mais abrangente. Mas, e sobretudo, importa atender às consequências em matéria de causalidade de uma predisposição patológica do lesado. A não ser que esta tenha sido dolosamente ocultada, "não exclui o direito a reparação integral", como dispõe o n.° 1 do artigo 11.° da Lei n.° 98/2009. O mesmo, aliás, se passa com uma conduta grosseiramente negligente do sinistrado que também só relevará quando for a causa exclusiva do acidente. Uma e outra solução parecem prefigurar um entendimento mais lasso ou mais amplo da "causa" do que resultaria, porventura, das teorias da causalidade adequada. Pelo menos no domínio do regime regra, em matéria de responsabilidade civil por acidentes de trabalho, que é o da responsabilidade objetiva do empregador (acompanhada de seguro obrigatório de responsabilidade civil) parece-nos que se deveria, por conseguinte, dar preferência à teoria do escopo de proteção da norma. Reconhecemos, no entanto, que poderia não haver grande diferença prática com a teoria da causalidade adequada, caso se entenda que a variante consagrada pelo Código Civil foi a da causalidade adequada na sua formulação negativa. Contudo, seria importante não converter a exigência de prova pelo lesado do nexo de causalidade — quando o sinistrado não puder beneficiar da presunção legal — em uma prova diabólica ou quase impossível, por ter que se demonstrar o que teria ocorrido no mundo hipotético ou imaginário em que a conduta do empregador não teria tido lugar. Tomemos, a este respeito, como exemplo o caso decidido pelo STJ, e já atrás referido, em que uma empresa não licenciada para explorar uma pedreira contrata um trabalhador, também ele não legalmente habilitado para manusear explosivos, sendo que a empresa também não elabora qualquer plano de prevenção: negar, como se negou, o nexo de causalidade entre estas condutas culposas e a morte do trabalhador, ocorrida quando este trabalhava com explosivos, porque não é possível demonstrar que essa morte não teria ocorrido se não tivessem existido todas aquelas condutas culposas é, quanto a nós, entendimento que não só esvazia a função preventiva da norma, como leva longe demais a ficção da alternativa hipotética. Expliquemo-nos melhor: por um lado, quem cria culposamente uma fonte de perigo, violando uma norma de proteção, deve responder, mesmo de acordo com a teoria da causalidade adequada, pelas consequências normais, prováveis, dessa fonte de perigo, só podendo excluir a sua responsabilidade se se tiver verificado uma circunstância extraordinária ou anómala que explique que naquele caso concreto a conduta do agente, contrariamente ao que é normal, foi condição de verificação do dano. Além disso, importa não esquecer que mesmo nas empresas legalmente habilitadas a explorar pedreiras e que contratem trabalhadores autorizados a proceder a rebentamentos e a outros trabalhos com explosivos e ainda que a empresa cumpra a lei e realize planos de prevenção de acidentes de trabalho, tal não implica que a sinistralidade laboral se deduza a zero. O cumprimento destas obrigações legais não garante que os acidentes de trabalho desapareçam, mas permite, ou assim se espera, reduzir significativamente o risco da sua produção. Se esta é a estrutura da obrigação do empregador — mais similar a uma obrigação de meios do que de resultado ou garantia — a tal estrutura se deveria também atender para verificar se há ou não um juízo de imputação plausível entre a conduta do agente e o dano ocorrido”. Tendo em conta estes ensinamentos, não pode deixar de se concluir, com já avançámos, pela bondade da solução adoptada no acórdão recorrido- o sinistro foi uma consequência normal, previsível da violação das regras de segurança, independentemente de se não estar apurado, com rigor, a vertente naturalística, a dinâmica do acidente. Tivessem sido observadas as regras de segurança concretamente omitidas e o acidente não teria, com absoluta certeza, ocorrido. Nas palavras do acórdão, independentemente dos motivos que tenham determinado a queda do sinistrado (desequilíbrio, desatenção ou outra) - o que se não apurou em concreto de forma detalhada -, a violação das apontadas normas de segurança surge como condição relevante e efectiva para a ocorrência do sinistro laboral. Este apresenta-se como consequência normal, típica ou provável daquela violação. Nas palavras do douto Parecer do MoPo, “independentemente da causa desencadeante do acidente – leia-se queda –, este não se tinha efetivamente verificado se a recorrente tivesse tomado qualquer uma daquelas medidas de segurança. Ou seja, não precisamos de ter conhecimento de todo o circunstancialismo do acidente para concluir que, não fora a omissão das condições de segurança, ele não tinha ocorrido. O ónus da prova que impendia sobre a seguradora encontra-se, assim, cumprido”. Sendo que, por outro lado, “para preencher os requisitos na teoria da causalidade adequada, na sua formulação negativa, é suficiente que a prova do nexo causal entre a omissão das condições de segurança e o acidente surja, de uma forma segura, como uma consequência normal e previsível da violação das regras segurança, e não propriamente que se tenha que provar em concreto a conditio sine qua non. Tal prova não nos parece exigível, nem justificável, podendo conduzir à impossibilidade, ou quase impossibilidade, de se conseguir obter prova do nexo de causalidade entre a violação das regras de segurança e o acidente”. Com a consequente improcedência do recurso. x Decisão: Pelo exposto, acorda-se em negar a revista, confirmando-se o acórdão recorrido. Custas pela Recorrente. Lisboa, 23/06/2023 Ramalho Pinto (Relator) Domingos Morais Mário Belo Morgado
Sumário (da responsabilidade do Relator).
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1. Alterou a redacção do facto 31o, retirando matéria conclusiva; eliminou os factos 36o, 37o, 39o e 40o, 41o43o, 44o, 45o e 46o por se tratar de matéria conclusiva. Quanto aos factos 39o e 40o. para além de conclusivos, o Tribunal da Relação considerou também que o inverso resulta do facto 62o.↩︎ |