Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
996/04.3TTLSB-C.L1.S1
Nº Convencional: 4ª SECÇÃO
Relator: ANTÓNIO LEONES DANTAS
Descritores: ACIDENTE DE TRABALHO
REMIÇÃO DE PENSÃO
REMIÇÃO FACULTATIVA
Data do Acordão: 12/10/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA
Área Temática:
DIREITO DO TRABALHO - ACIDENTES DE TRABALHO / REMIÇÃO DE PENSÕES.
Legislação Nacional:
DECRETO-LEI N.º 143/99, DE 30-04: - ARTIGO 56.º, N.º2.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO:
-DE 19/12/2005, PROCESSO N.º 0544117, EM WWW.DGSI.PT .
Sumário :

1 – As condições estabelecidas nas alíneas do n.º 2 do artigo 56.º do Decreto-Lei n.º 143/99, de 30 de abril, relativamente a remição parcial de pensões aferem-se em função da pensão fixada ao sinistrado, globalmente considerada, independentemente da divisão da responsabilidade pelo respetivo pagamento por várias entidades.

2 – O equilíbrio de interesses subjacente à remição parcial de pensões estabelecido no dispositivo referido no número anterior impede a imputação na quota de um dos co-obrigados pelo pagamento da pensão do capital da remição parcial e a imputação na quota do outro, ou outros, da pensão sobrante.

Decisão Texto Integral:

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:


I

1 - Por acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 30/04/2008, transitado em julgado, a COMPANHIA DE SEGUROS AA, S.A. e a BB – …, Ld.ª, foram condenadas a pagar à sinistrada CC a pensão anual e vitalícia de € 6.194,40, com efeitos a partir de 20/10/2004, anualmente atualizável, sendo 60,88% da responsabilidade da seguradora e 39,12% da responsabilidade da entidade empregadora, em consequência de acidente de trabalho, de que lhe resultou uma incapacidade parcial permanente de 40,384%, com incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual desde a data da alta (19/10/2004).

2 - Em 15/04/2011, a sinistrada veio requerer, ao abrigo do disposto no artigo 33º, n.º 2 da Lei 100/97, de 13/09, e do artigo 56º do Decreto-lei n.º 143/99, de 30/04, a remição parcial da pensão da responsabilidade da BB - …, Ldª, alegando que se verificam os requisitos previstos nestes preceitos legais.

A BB – ..., Ld.ª, notificada deste requerimento apresentado pela sinistrada, opôs-se à requerida remição, alegando que a parcialidade ou totalidade da remição devem ser consideradas em relação à totalidade da pensão de cada uma das entidades responsáveis, e não por referência à proporção que cada uma está obrigada a pagar. No que respeita à possibilidade de remição parcial da pensão de que é responsável, essa possibilidade encontra-se vedada por lei, já que tendo sido fixada uma IPP superior a 30% (40,384%), a remição só é legalmente admissível, em primeiro lugar, se a pensão sobrante for igual ou superior a 50% da remuneração mínima mensal mais elevada, e esse requisito não se verifica no caso em apreço.

Alegou ainda que, mesmo que se considerasse a remição parcial da pensão legalmente admissível, estava absolutamente impossibilitada de pagar o capital de remição, porquanto não dispõe nem de valores, nem de património que lhe permitam pagar tal valor.

3 - Por despacho de 15 de abril de 2014, foi deferia a pretensão da sinistrada, nos termos seguintes:

«A sinistrada veio requerer a remição parcial da pensão a cargo da empregadora.

Esta opôs-se, sustentando que a remição só pode ser efetuada em relação à totalidade da pensão e não apenas em relação à quota parte da empregadora; que, mesmo em relação a sua quota-parte os requisitos legais para tal não se mostram preenchidos e que não tem possibilidades de pagar o capital resultante de tal remição.

Apreciando.

No que respeita ao primeiro e segundo argumentos da empregadora, os mesmos não são procedentes.

Com efeito, a pensão remível pode incidir apenas em relação a um dos responsáveis, desde que seja efetuada dentro dos limites legais impostos pelo art. 56º, n.º 2, al. b) do DL 143/99, de 30/04.

No que respeita à alegada impossibilidade de pagar, por parte da entidade empregadora, tal argumento não tem qualquer suporte legal.

Nestes termos, concordando integralmente com o exposto pelo Digno Magistrado do Mº Pº a fls. 1076 a 1078, que aqui se subscreve, defere-se parcialmente o requerido, ou seja, defere-se a remição da pensão dentro dos limites legais impostos pelo art. 56º, n.º 2, al. b) do DL 143/99, de 30/04.

Notifique.»

4 - Inconformada com este despacho, dele apelou a Ré BB – ... para o Tribunal da Relação de Lisboa.

Este Tribunal veio a conhecer do recurso interposto, por decisão sumária, datada de 31 de dezembro de 2014, proferida nos termos do artigo 656.º do Código de Processo Civil, tendo decidido negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida.

Não satisfeita com esta decisão, dela reclamou a recorrente para a conferência, nos termos do n.º 3 do artigo 652.º do mesmo código.

Por acórdão proferido em conferência, datado de 25 de fevereiro de 2015, foi decidido indeferir a reclamação apresentada e confirmar o despacho do relator.

5 - Irresignada com esta decisão dela recorreu a Ré para este Supremo Tribunal, de revista, enquadrando o recurso apresentado como revista excecional e integrando nas alegações apresentadas as seguintes conclusões:

«1) A R. não se conforma com o teor do douto acórdão proferido pelo tribunal a quo que, conhecendo da reclamação apresentada pela Recorrente fez seu, confirmando o teor da decisão singular proferida pelo Venerando Juiz Desembargador Relator, no âmbito do recurso por si interposto da decisão proferida pelo tribunal de 1ª Instância, através da qual, tão douto decisor, conhecendo do pedido de remição de fls. 1023 a 1026 formulado pela sinistrada CC, registado no Citius sob a Refª 800176, decidiu e cita-se “ …concordando-se integralmente com o exposto pelo Digno Magistrado do M.P, a fls 1076 a 1078, que aqui se subscreve, defere-se parcialmente o requerido: defere-se a remição da pensão dentro dos limites legais impostos pelo art.º 56.º n.º 2, al. b) do Dec. Lei n.º 143/99 de 30.04”, dado acometer à aqui Recorrente, o dever de, só por si, proceder à satisfação integral do capital de remição.”

Assim sendo, porquanto:

2) A douta deliberação de cujo teor ora se recorre, (daqui por diante abreviadamente mencionada por acórdão recorrido) encontrar-se em contradição com douta deliberação proferida pelo Venerando Tribunal da Relação de Coimbra, (doravante mencionada por acórdão fundamento) pelo acórdão emanado em 23.11.2013, no âmbito do Proc. N.º 899/09.5TTLRA (Processo na Relação de Coimbra N.º 899/09.5TTLRA.C1), transitado em julgado – cfr. cópias do seu teor e nota de trânsito junta aos autos como o demonstra o doc. N.º 1-

3) Proferida no domínio da mesma legislação e, sobre a mesma questão fundamental de direito, sem que se conheça, pelo menos, até ao momento, a prolação de um qualquer acórdão de uniformização de jurisprudência, com o qual o acórdão recorrido se mostre conforme.

4) Pois na verdade, enquanto no acórdão fundamento, concluiu-se que “O caráter unitário das pensões por acidente de trabalho, devidas ao trabalhador sinistrado ou ao seu cônjuge, ainda que por duas entidades (seguradora e entidade patronal), não permite uma apreciação individualizada de cada quota-parte da pensão devida por cada um dos obrigados ao seu pagamento para efeitos de se saber se essa pensão é ou não remível e, na afirmativa, em que condições.”

E, determinou-se que tanto o capital de remição quanto o devido a título de pensão sobrante, fosse satisfeito na exata medida das percentagens anteriormente fixadas para cada um dos coobrigados na sua satisfação,

5) No acórdão recorrido entendeu-se de forma antagónica, uma vez que se reconhece à sinistrada a faculdade (direito potestativo) de requerer a remição da quota-parte da pensão da responsabilidade da aqui Recorrente,

Para além de determinar-se que, quer o capital de remição quer o devido a título de pensão sobrante, sejam satisfeitos em percentagens diversas às que, para a sua satisfação haviam sido fixadas pelo acórdão de 30/04/2008.

Para além do supra

6) O Douto acórdão recorrido, encontra-se eivado do vício de violação de lei, seja,

a) Porque, reconhece à sinistrada um direito potestativo que a lei não lhe confere – o de peticionar e ver deferido o pedido de remição total ou parcial de uma quota-parte na responsabilidade no pagamento da pensão vitalícia - e, como tal, ainda que por erro de interpretação e aplicação viola o disposto no art.º 56.º n.º 2 do D.L. 143/99, de 30.04, ou,

b) Porque, através da sua deliberação, ao fixar na pessoa da aqui Recorrente, o dever de satisfazer a totalidade do capital de remição, obrigando-a a responder na percentagem de 100%, contraria modificando e, como tal elevando a quota-parte da responsabilidade então deliberada e fixada pela deliberação de 30/04/2008, já transitada, na percentagem de 39,12%, e,

c) ainda ao determinar que a pensão sobrante seja suportada pela aqui Recorrente na percentagem de 7,45% modifica reduzindo a então percentagem determinada pela deliberação de 30/04/2008, já transitada e fixada em 39,12%,

- violando dessa forma a autoridade do caso julgado daquela deliberação (30.04.2008) e, como tal o disposto nos art.s 619 e 621.º do C.P.C.

7) Devendo em consequência o douto acórdão recorrido e, posto em crise, ser revogado in totum por douto acórdão que reconhecendo a bondade da fundamentação aduzida, julgue procedente o presente recurso e, em consequência declare indeferido o requerido, por inadmissibilidade legal da pretensão da Requerente, tal como aquela foi formulada.

8) Admitindo porém sem condescender que outro possa ser o douto entendimento de V. Exas., Venerandos Juízes Conselheiros, então, que julgando parcialmente procedente o presente recurso, determinem não só que a remição opere, dentro dos limites legais, como ainda, que, tanto a satisfação do capital de remição, quanto a pensão sobrante, seja materializada por cada um dos coobrigados, na exata medida então fixada pelo acórdão referido em 6).»

6 - A recorrida respondeu ao recurso integrando nas alegações apresentadas as seguintes conclusões:

«I – Da Inadmissibilidade do Recurso Excecional de Revista

a) Da falta de junção de cópia do acórdão-fundamento

1.ª) Nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 672.º do CPC, além da indicação dos aspetos de identidade que determinam a contradição alegada, deveria a Recorrente ter junto também cópia do acórdão-fundamento com o qual o acórdão recorrido se encontra em oposição.

2.ª) O n.º 2 do artigo 612.º do CPC comina expressamente que a falta de tal junção deve conduzir à rejeição do recurso em causa, cominação essa que tem vindo a ser acompanhada por parte do Colendo Supremo Tribunal de Justiça.

3.ª) Não tendo a Recorrente junto às suas alegações de recurso cópia do acórdão-fundamento, nem tão pouco de qualquer outro elemento de onde conste o teor de tal decisão, deve o Colendo Supremo Tribunal de Justiça rejeitar o recurso excecional de revista nos termos dos n.ºs 2 e 3 do artigo 672.ºº do CPC.

Por cautela de patrocínio, mesmo que assim não suceda,

b) Da inexistência de oposição de julgados

4.ª) O acórdão-fundamento não contém qualquer elemento contraditório para com o teor da decisão constante do acórdão recorrido.

5.ª) Resulta do acórdão-fundamento que nada obsta a que se proceda a uma remição parcial de quota-parte da responsabilidade de uma pensão anual e vitalícia, não podendo apenas ocorrer a remição obrigatória e total de tal prestação.

6.ª) Não se aborda no acórdão-fundamento nenhuma questão relacionada com a violação de caso julgado, contrariamente ao que acontece relativamente ao acórdão recorrido.

7.ª) Tendo o acórdão recorrido confirmado a remição parcial da pensão atribuída à Recorrida, à semelhança do que ocorreu no caso a que se encontrava subordinado o acórdão-fundamento, e não se tendo este último pronunciado acerca de qualquer questão relacionada com violação de caso julgado, não existe fundamento para a apresentação de recurso excecional de revista consagrado na alínea c) do n.º 1 do artigo 672.º do CPC, pelo que deve o recursos ser rejeitado nos termos dos nº 2 e 3 do artigo 672.º do CPC.

Sem conceder, caso o Colendo Supremo Tribunal de Justiça admita recurso, e analise o mérito da sua substância,

II – De Jure Constituto

a) Da violação da autoridade de caso julgado

8.ª) Contrariamente ao que é alegado pela Recorrente, o acórdão recorrido não contraria nem modifica a responsabilidade que foi atribuída à Recorrente pela decisão proferida nos autos no dia 30 de abril de 2008.

9.ª) O acórdão recorrido limita-se a remir parcialmente a quota-parte da pensão devida pela Recorrente à Recorrida, com inteiro respeito pelo artigo 56.º nº2 do Decreto-Lei nº143/99, e sempre dentro da margem de responsabilidade de 39,12% que foi atribuída à Recorrente nos presentes autos.

b) Da violação do disposto no artigo 56.º n.º 2 do Decreto-Lei nº 143/99, de 30 de abril

10.ª) A remição parcial da quota-parte da pensão que responsabiliza a Recorrente perante a Recorrida não viola de modo algum o artigo 56.º n.º2 do Decreto-Lei nº143/99, na medida em que, pelo contrário, dá efetiva aplicação a tal norma legal.

11.ª) A própria letra do artigo 56º nº2 do Decreto-Lei n.º 143/99 não restringe que não possa ser parcialmente remida a quota-parte de responsabilidade de um dado sujeito, sendo que a jurisprudência dos Tribunais superiores tem interpretado tal norma como sendo compatível com a realização de tais remições parciais e facultativas.

12.ª) O acórdão recorrido não violou qualquer disposição legal, termos em que não deve ser concedido provimento ao presente recurso pelo Colendo Supremo Tribunal de Justiça, confirmando-se por inteiro a decisão recorrida.»

Termina referindo que «deve ser rejeitado o recurso excecional de revista interposto pela Recorrente, considerando que o mesmo não preenche os requisitos de admissibilidade constantes do artigo 672.º, n.º1, alínea c) e n.º 2, alínea c) do CPC» e que «caso o recurso interposto pela Recorrente venha a ser admitido, deve ser-lhe negado provimento, na medida em que o acórdão recorrido não violou qualquer disposição legal.»

7 - Por acórdão da formação a que se refere o n.º 3 do artigo 672.º do Código de Processo Civil, datado de 9 de julho de 2015, foi determinada a distribuição do presente processo como revista, nos termos gerais.

Essa decisão decorre do facto de, nos termos do artigo 7.º da Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, não ser aplicável ao presente processo o disposto no n.º 3 do artigo 671.º do Código de Processo Civil, atenta a data da respetiva instauração.

Neste Tribunal o Exm.º Procurador-Geral Adjunto proferiu parecer, nos termos do n.º 3 do artigo 87.º do Código de Processo do Trabalho, referindo em síntese conclusiva que «a decisão proferida pelo Tribunal a quo fez uma interpretação correta do artigo 56.º do Dec. lei n.º 143/99, de 30 de abril, ao confirmar o despacho que permitiu a remição parcial da pensão devida à sinistrada por um dos corresponsáveis na reparação do acidente, não se tendo verificado violação de caso julgado, pelo que deveria ser negado provimento ao recurso, (…) sendo de confirmar o Acórdão sub judice).

Sabido que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente, nos termos do disposto nos artigos 635.º, n.º 3, e 639.º do Código de Processo Civil, ressalvadas as questões de conhecimento oficioso, está em causa na presente revista saber:

a) – Se a decisão recorrida, confirmando a decisão da 1.ª instância, violou o caso julgado relativamente à decisão que tinha fixado a responsabilidade da Recorrente pelo pagamento da pensão devida à sinistrada;

b) – Se a decisão recorrida, ao permitir a remição da pensão devida à sinistrada relativamente a uma das corresponsáveis violou o disposto no artigo 56.º, n.º 2 do Decreto-lei n.º 143/99, de 30 de abril.


II

1 – No âmbito do presente recurso de revista retoma a recorrente a arguição de violação de caso julgado pela decisão recorrida, na parte em que confirmou a decisão proferida pelo Tribunal de 1.ª instância que deferira a pretensão da Autora relativamente à remição da quota da responsabilidade Ré BB, Ld.ª na sua pensão.

No recurso de apelação que interpôs contra aquela decisão a Ré suscitou aquela questão, nos seguintes termos:

«6ª) - Não o tendo feito, ainda que por erro, tanto na apreciação dos factos quanto na interpretação do direito, violou não só o disposto no art. 56º, n.º 2 do DL 143/99, de 30.04, como ainda a autoridade do caso julgado material descrito em 2) e, como tal o disposto nos arts. 619º,  n.º l e 621º todos do CPC.

Pois, na verdade,

7ª) - O art. 56º,  n.º 2 do DL 143/99, de 30/04, acomete tanto à beneficiária da pensão quanto aos obrigados à sua satisfação, o direito potestativo de peticionarem a remição da pensão e, já não, como foi o entendimento do douto tribunal a quo, o direito potestativo de peticionarem no todo ou em parte a remição de uma qualquer quota-parte da responsabilidade fixada para a satisfação da pensão.

8ª) - Bem se compreendendo que assim seja, pois que, o caráter unitário da pensão fixada, não permite uma apreciação individualizada de cada quota-parte da pensão devida por cada um dos obrigados para efeitos de se saber se a pensão é ou não remível e, na afirmativa, em que condições.

9ª) - Por outro lado, ao prosseguir-se o entendimento do tribunal a quo, impede-se que os co-‑obrigados, a ser essa a sua vontade, exerçam ou possam exercer o seu direito de remir, pelo menos na amplitude legalmente fixada.

10ª) - Faz-se recair, tal como ocorre com a decisão posta em crise, apenas, sobre um dos co-‑obrigados, o dever de honrar a totalidade do capital de remição e,

11ª) - Por essa forma, tal como ocorre com referência à decisão proferida, viola-se a autoridade do caso julgado material violando-se o disposto nos arts. 619, n.º l e 621º todos do CPC,

12ª) - Pois, modifica-se por decisão posterior, a quota-parte fixada a cada um dos obrigados, tanto para o caso de ocorrência de extinção parcial da obrigação (in casu, - satisfação do capital de remição), quanto, no que diz respeito à pensão sobrante.

13ª) - Devendo em consequência o douto despacho proferido e, posto em crise, ser revogado in totum por douto acórdão que reconhecendo a bondade da fundamentação ora aduzida, julgue procedente o presente recurso e, em consequência declare indeferido o requerido, por inadmissibilidade legal da pretensão da Requerente, tal como aquela foi formulada.»

O Tribunal da Relação veio a considerar improcedente esta arguição com base no seguinte:

«A questão que se suscita neste recurso consiste em saber se a remição parcial da pensão deve ser repartida pelas duas entidades responsáveis na medida das respetivas quotas-partes de responsabilidade, ou se pode incidir na totalidade ou parcialmente apenas sobre a quota-parte da responsabilidade da entidade empregadora, desde que respeitados os requisitos previstos no art. 56º, n.º 2 do DL 143/99, de 30/04.

A decisão recorrida concluiu que a remição da pensão, neste caso, pode incidir parcialmente sobre a quota-parte da responsabilidade da recorrente, desde que respeitados os requisitos previstos no art. 56º, n.º 2 do DL 143/99, de 30/04.

A recorrente sustenta que esta decisão viola o disposto no art. 56º, n.º 2 do DL 143/99, de 30/04, e viola a autoridade do caso julgado, na medida em que por decisão desta Relação, de 30/04/2008, transitada em julgado, ficou em definitivo fixada a proporção da repartição das responsabilidades entre as duas entidades responsáveis, a seguradora e a entidade empregadora, em respetivamente, 60,88% e 39,12%. Sendo o capital de remição calculado com base na pensão fixada à sinistrada, esse capital tem necessariamente de ser preenchido por prestações das duas entidades responsáveis, na medida das respetivas quotas-partes. Sustenta ainda a recorrente que sejam quais forem as contas que se façam, haverá sempre um quota-parte da recorrente (39,12%) e uma quota-parte da seguradora (60,88%) e que, ao proceder de forma diferente e ao fazer incidir a remição apenas sobre a quota-parte da entidade empregadora, o despacho recorrido contrariou o decidido no acórdão desta Relação, que fixou em definitivo a proporção de responsabilidades das duas entidades responsáveis, devendo prevalecer o decidido neste acórdão.

Adianta-se, desde já, que a argumentação da recorrente não procede, já que não se verifica o condicionalismo previsto nos arts. 619º e 625º, n.º 1 do CPC, ou seja, no caso em apreço, não estamos perante duas decisões contraditórias sobre a mesma pretensão. Para tal suceder seria essencial que as duas decisões (a desta Relação e a do despacho impugnado) tivessem incidido sobre o mesmo objeto, ou seja, que a parte dispositiva das duas decisões tivesse incidido e resolvido o mesmo ponto concreto, de direito e de facto, o que não é manifestamente o caso (cfr. Prof. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Volume V, Anotação ao art. 675º, pág. 192).

De qualquer forma sempre se dirá que tanto no despacho impugnado, como no cálculo do capital da remição a proporção da responsabilidade da recorrente é rigorosamente mantida, pois esta não vai pagar mais qualquer quantia do que o devido na proporção a seu cargo.»

Merecem a nossa adesão estas considerações uma vez que as decisões em causa têm objeto diverso: a proferida no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 30 de Abril de 2008, já transitada em julgado, incide sobre a reparação das consequências do acidente sofrido pela Autora e sobre a fixação da quota da responsabilidade da recorrente na pensão que àquela é devida, enquanto a segunda se debruça sobre a remição daquela quota.

Improcede, deste modo, a questão suscitada sobre a violação de caso julgado na decisão da 1.ª instância confirmada pela decisão recorrida.

2 – Resulta do n.º 1 do artigo 33.º da Lei n.º 100/97, de 13 de setembro, sob a epígrafe «remição de pensões» que «sem prejuízo do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 17.º, são obrigatoriamente remidas as pensões vitalícias de reduzido montante, nos termos que vierem a ser regulamentados» e decore do n.º 2 do mesmo dispositivo que «podem ser parcialmente remidas as pensões vitalícias correspondentes a incapacidade igual ou superior a 30%, nos termos a regulamentar, desde que a pensão sobrante seja igual ou superior a 50% do valor da remuneração mínima mensal garantida mais elevada».

A Lei n.º 100/97, de 13 de setembro, foi regulamentada pelo Decreto-Lei n.º 143/99, de 30 de abril, tendo entrado em vigor no dia 1 de outubro de 1999, por força do disposto no artigo 71.º deste último diploma, que dedicou à remição das pensões devidas por acidente de trabalho seu artigo 56.º, que é do seguinte teor:


«Artigo 56.º

Condições de remição


1 - São obrigatoriamente remidas as pensões anuais:

a) Devidas a sinistrados e a beneficiários legais de pensões vitalícias que não sejam superiores a seis vezes a remuneração mínima mensal garantida mais elevada à data da fixação da pensão;

b) Devidas a sinistrados, independentemente do valor da pensão anual, por incapacidade permanente e parcial inferior a 30%.

2 - Podem ser parcialmente remidas, a requerimento dos pensionistas ou das entidades responsáveis e com autorização do tribunal competente, as pensões anuais vitalícias correspondentes a incapacidade igual ou superior a 30% ou as pensões anuais vitalícias de beneficiários em caso de morte, desde que cumulativamente respeitem os seguintes limites:

a) A pensão sobrante não pode ser inferior a seis vezes a remuneração mínima mensal garantida mais elevada;

b) O capital de remição não pode ser superior ao que resultaria de uma pensão calculada com base numa incapacidade de 30%.»     

No domínio da reparação dos acidentes de trabalho a remição das pensões é uma das formas de reparação do dano derivado do acidente, consagrando a lei duas formas de remição: a obrigatória, prevista no n.º 1 deste dispositivo, e a facultativa prevista no seu n.º 2.

São obrigatoriamente remíveis as pensões «devidas a sinistrados e a beneficiários legais de pensões vitalícias que não sejam superiores a seis vezes a remuneração mínima mensal garantida mais elevada à data da fixação da pensão» e as «devidas a sinistrados, independentemente do valor da pensão anual, por incapacidade permanente e parcial inferior a 30%».

Estão em causa, conforme refere CARLOS ALEGRE, pensões de reduzido montante, sendo esta forma de reparação, a «única forma que a lei prevê para que a entidade responsável delas se desonere»[1].

Ao lado das pensões obrigatoriamente remíveis a lei prevê o regime da remição facultativa de pensões, que está no centro do litígio a resolver no âmbito do presente recurso.

Resulta do n.º 2 do artigo 56.º do Decreto-Lei n.º 143/99 que podem ser objeto de remição parcial as «pensões anuais vitalícias correspondentes a incapacidade igual ou superior a 30% ou as pensões anuais vitalícias de beneficiários em caso de morte», desde que se mostrem preenchidos cumulativamente os seguintes limites: «a pensão sobrante não pode ser inferior a seis vezes a remuneração mínima mensal garantida mais elevada» e «o capital de remição não pode ser superior ao que resultaria de uma pensão calculada com base numa incapacidade de 30%».     

Da análise do regime consagrado verifica-se que a remição facultativa é sempre parcial, nunca podendo atingir a pensão na totalidade, incide sobre pensões por incapacidade igual ou superior a 30% e sobre pensões anuais e vitalícias de beneficiários em caso de morte, desde que a parte não remida, ou seja a parte sobrante, não seja inferior a «seis vezes a remuneração mínima mensal garantida mais elevada» e desde que «o capital de remição» recebido pelo sinistrado ou beneficiário, não seja «superior ao que resultaria de uma pensão calculada com base numa incapacidade de 30%.»     

A remição pode ser requerida pelos pensionistas, ou pelas entidades responsáveis, e está sempre sujeita a autorização do tribunal competente.

Importa ter aqui presente que resulta do n.º 1 do artigo 37.º da Lei n.º 100/97, de 13 de setembro, sob a epígrafe «sistema e unidade de seguro» que «as entidades empregadoras são obrigadas a transferir a responsabilidade pela reparação prevista na presente lei para entidades legalmente autorizadas a realizar este seguro» e do n.º 3 do mesmo dispositivo que «quando a retribuição declarada para efeito do prémio de seguro for inferior à real, a entidade seguradora só é responsável em relação àquela retribuição» e «a entidade empregadora responderá, neste caso, pela diferença e pelas despesas efetuadas com a hospitalização, assistência clínica e transporte, na respetiva proporção».

Nas palavras de CARLOS ALEGRE «a chamada remição facultativa, (…) difere da anterior, dita obrigatória, não já porque o montante da pensão é de tal modo reduzido, que seria mais inconveniente do que vantajoso forçar o sinistrado, a recebê-la em pequeníssimas frações, mas porque, não sendo o seu montante de tal forma elevado, cuja remição pudesse criar dificuldades financeiras, às entidade seguradoras, é suficiente para que o seu recebimento unitário, se mostre “economicamente mais útil” para o sinistrado. Assim, o critério que impõe a remição (por isso, dita obrigatória) é o do seu pequeno montante e consequente desvantagem (para o sinistrado e seguradora) em pagamentos periódicos; o critério que permite a remição (por isso, dita facultativa) é o da maior utilidade económica para o sinistrado, sem gravames financeiros prejudiciais para a seguradora. O legislador, numa linha de pensamento que privilegia o pagamento de uma pensão, ao longo de toda a vida do sinistrado, em detrimento de um pagamento unitário, por razões que se prendem, alegadamente, com a proteção do sinistrado contra si próprio, consente a remição agora, em termos muito mais liberais do que anteriormente».[2]


III

1 - Está em causa no presente recurso saber se é possível remir parcialmente uma pensão, nos termos do n.º 2 do artigo 56.º do Decreto-Lei n.º 143/99, de 30 de abril, em que a responsabilidade pelo respetivo pagamento esteja dividida entre uma seguradora e a empregadora da sinistrada, imputando a parte a remir na quota da responsabilidade da empregadora.

Recorde-se que no requerimento apresentado na 1.ª instância a sinistrada, aqui recorrida, referia expressamente que «pretende ver remida parcialmente a sua pensão vitalícia correspondente a 39,12 % do capital remível da responsabilidade da requerida Entidade patronal (…) ficando a ora Requerente a auferir mensalmente o remanescente a título de pensão vitalícia a cargo da R. Seguradora» e concluindo «requer a remição parcial da pensão anual e vitalícia que lhe é devida, correspondente a 39,12 % a cargo da Ré BB».

As instâncias responderam afirmativamente à pretensão da requerente.

A decisão recorrida, na parte que releva no âmbito da presente revista, tem a seguinte fundamentação:

«2. Da alegada violação do caso julgado e do disposto no art. 56º, n.º 2 do DL 143/99

(…)

A reparação do acidente de trabalho, como se sabe, pode ser efetuada através do pagamento da pensão anual ou com pagamento do capital de remição. Neste caso, a recorrente pagará mais em capital de remição, mas vai passar a pagar muito menos pensão do que pagaria se se seguisse o critério por ela defendido.

Como afirma Carlos Alegre (Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais – 2ª edição, pág. 240), com a remição da pensão não há uma novação da obrigação, nem qualquer outra transformação em obrigação de caráter diferente: apenas a forma de a pagar é diferente, num modo ou noutro, porque a pensão, enquanto direito vitalício permanece, de forma latente, embora, mas sempre com a possibilidade (teórica) de ressurgir.

Ou seja, a remição facultativa consiste apenas numa forma de pagamento diferente da reparação do acidente, no pressuposto de existir uma maior utilidade económica para o sinistrado. E nesta forma de pagamento diferente da reparação do acidente, a recorrente não vai pagar mais do que resulta da sua quota-parte de responsabilidade na reparação do acidente, nem as quotas-partes de responsabilidade fixadas por decisão desta Relação são minimamente postas em causa.

A remição da pensão pode, por isso, incidir perfeitamente apenas sobre a quota-parte de um dos responsáveis, desde que, tendo em conta a pensão total, não exceda os limites impostos pelo art. 56º, n.º 2 do DL 143/99, de 30/04, ou seja, desde que a pensão sobrante não seja inferior a seis vezes a remuneração mínima mensal garantida mais elevada e o capital de remição não seja superior ao que resultaria de uma pensão calculada com base numa incapacidade de 30%.

E a sinistrada tem a faculdade (o direito potestativo) de requerer a remição dessa quota-parte da pensão da responsabilidade da recorrente.

Em suma, contrariamente ao alegado pela recorrente, a remição parcial da pensão autorizada pelo despacho impugnado, não viola o estatuído no art. 56º, n.º 2 do DL 143/99, nem põe minimamente em causa as quotas-partes de responsabilidade pelo pagamento da pensão, estipuladas por acórdão desta Relação de 30/04/2008, pelo que não existe qualquer contradição entre aquele despacho e esta decisão, nem se verifica qualquer violação da lei, designadamente dos preceitos legais que a apelante refere.»

2 – A recorrente louva-se para além do mais, do acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra proferido no processo n.º 899/09.5TTLRA.C1, de 21 de novembro de 2013[3], de que foi extraído o seguinte sumário:

«I – O caráter unitário das pensões por acidente de trabalho, devidas ao trabalhador sinistrado ou ao seu cônjuge, ainda que por duas entidades (seguradora e entidade patronal), não permite uma apreciação individualizada de cada quota-parte da pensão devida por cada um dos obrigados ao seu pagamento para efeitos de se saber se essa pensão é ou não remível e, na afirmativa, em que condições.

II – As pensões desta natureza constituem um todo único, ainda que a responsabilidade pelo seu pagamento esteja distribuída por mais de uma pessoa ou entidade.

III – Só no caso do seu montante global não exceder o limite fixado nos artºs 56 e 57º do Dec.Lei nº 143/99, de 30/04 é que a sua remição será possível».

Este aresto segue de perto o acórdão do Tribunal da Relação do Porto proferido no processo n.º 0544117, de 19 de dezembro de 2005[4], de que foi extraído o seguinte sumário:

«I - Podem ser parcialmente remidas, a requerimento dos pensionistas ou das entidades responsáveis e com autorização do tribunal competente, as pensões anuais vitalícias correspondentes a incapacidade igual ou superior a 30%, ou as pensões anuais vitalícias de beneficiários legais (em caso de morte), desde que cumulativamente respeitem os seguintes limites: a) a pensão sobrante não pode ser inferior a seis vezes a remuneração mínima mensal garantida mais elevada; b) o capital de remição não pode ser superior ao que resultaria de uma pensão calculada com base numa incapacidade de 30%.

II - Sendo a pensão da responsabilidade de duas entidades, não é possível remir a totalidade da quota da pensão da responsabilidade de uma delas.»

Na fundamentação deste acórdão referiu-se o seguinte:

«Ora, sendo a pensão uma só, mas sendo duas ou mais as entidades responsáveis pelo seu pagamento, a remição, sendo uma forma de extinção da obrigação, impõe a intervenção conjunta dos sujeitos passivos ou, pelo menos, que se trate o interesse de cada um deles na mesma proporção em que aceitaram - ou foram condenados a - pagar a pensão.

Tal significa que, como no caso em apreço, não é possível remir a totalidade da quota da pensão - parcial - da responsabilidade de uma entidade com o argumento de que a parte remível da pensão - global - é superior. Na verdade, como refere o Tribunal a quo no despacho de sustentação, tal entendimento levaria a impossibilitar a outra entidade – a seguradora – de exercer o seu direito a remir, pelo menos na amplitude legalmente admissível.

(…)

Estabelecida na proporção a responsabilidade das entidades - seguradora e patronal - na formação da pensão, igual proporção tem de ser observada na remição [extinção] dela, sob pena de se poder postergar o direito de remir daquela que – ainda – não exerceu o direito correspondente. Aliás, sendo as remições facultativas sempre parciais, como resulta do disposto no Art.º 56.º n.º 2, corpo, do Decreto-Lei n.º 143/99, de 30 de abril, tal significa que a entidade responsável ou as entidades responsáveis, ficam obrigadas a pagar sempre uma parte da pensão, sob a forma de renda, depois de efetuada a remição e que corresponde, naturalmente, à parte proporcional da pensão não remida. Trata-se de questão de elementar justiça e corresponde aos ensinamentos da doutrina.

[Cfr. José Augusto Cruz de Carvalho, in ACIDENTES DE TRABALHO E DOENÇAS PROFISSIONAIS, 1980, pág. 223:

- As pensões constituem um todo único ainda que a responsabilidade pelo seu pagamento esteja distribuída por mais de uma pessoa ou entidade. Só no caso do seu montante global não exceder o limite fixado neste artigo, a sua remição será possível.

- É lícita a remição de pensões dentro dos limites estabelecidos na lei. No caso de uma pensão exceder os limites ali fixados, embora a responsabilidade pelo seu quantitativo esteja repartida por mais de uma pessoa não é possível a remição das frações (Parecer Inspetor Jud., Henrique Parreira, in Bol. INTP, X, págs. 12 e 375)].»

Esta jurisprudência assenta, em síntese, na consideração de que na apreciação do direito a remir parcialmente uma pensão, direito que assiste a cada um dos responsáveis pelo seu pagamento, não pode ser posto em causa o direito do outro corresponsável, pelo que a remição parcial não pode ser imputada apenas na quota de um dos responsáveis, mas terá que ser imputada proporcionalmente na quota dos dois.

Deste modo, de acordo com esta jurisprudência, as condições estabelecidas nas alíneas do n.º 2 do artigo 56.º terão de ser aferidas em função do valor unitário e global da pensão, devendo, quer na determinação do capital de remição, quer da pensão sobrante manter-se na distribuição de responsabilidades a proporção inicialmente fixada.

3 – Na ponderação das condições subjacentes à remição parcial das pensões, previstas no n.º 2 do artigo 56.º do Decreto-Lei n.º 143/99, de 30 de abril, o legislador procurou criar uma situação de equilíbrio, por um lado, entre os interesses do sinistrado e, por outro, os interesses dos responsáveis pelo pagamento das pensões.

Os interesses do sinistrado estão presentes, nomeadamente, no facto de não ser possível a remição global das pensões, garantindo-lhe um rendimento ao longo da sua vida e evitando uma gestão menos cuidada dos capitais de remição. Permite-se, contudo, a remição parcial das pensões potenciando dessa forma ao sinistrado a receção de um capital que poderá investir de acordo com aquilo que defina como de seu interesse, matéria que o tribunal não pode hoje sindicar.

A sujeição da remição a uma parte apenas da pensão salvaguarda também os interesses dos responsáveis pelo pagamento das pensões, que apesar de poderem ter de caucionar o respetivo pagamento, não são, contudo, obrigados ao pagamento em bloco dos quantitativos que estejam em causa e por cujo pagamento sejam responsáveis, em vez do pagamento das partes da pensão por que sejam responsáveis ao longo da vida do sinistrado.

No caso de pensões com responsabilidade de pagamento dividida por seguradoras e entidades empregadoras, esta dimensão de equilíbrio mantém-se, nas proporções respetivas e não pode ser posta em causa no âmbito da remição.

Na verdade, a divisão de responsabilidades é alheia à verificação do preenchimento das condições de remição de pensões definidas no artigo 56.º do referido diploma, condições que têm de ser aferidas em função da dimensão unitária da pensão devida ao sinistrado e da fração da pensão globalmente considerada cuja remição é pedida, independentemente da divisão de responsabilidades que possa existir entre a empregadora e a seguradora.

Assim, a incidência da remição apenas na quota de um dos corresponsáveis pelo pagamento da pensão quebra o equilíbrio de interesses entre o sinistrado e os responsáveis subjacente à remição facultativa das pensões e que tem expressão nos direitos respetivos, não podendo concentrar-se a responsabilidade pelo pagamento do capital da parte da pensão remida no responsável por essa quota e transformar a quota não afetada com a remição em pensão sobrante, nomeadamente, para os efeitos de indagar do preenchimento das condições estabelecidas naquele artigo.

As condições da remição facultativa são deste modo aferidas em função da pensão globalmente considerada, independentemente da divisão da responsabilidade pelo respetivo pagamento, pelo que a remição parcial de uma pensão com pagamento dividido por vários responsáveis incide sobre as várias quotas da pensão, na proporção respetiva.


IV

Em face do exposto, acorda-se em conceder a revista e em revogar a decisão recorrida, indeferindo-se a remição parcial da pensão requerida pela sinistrada.

Custas, na revista e nas instâncias, pela recorrente.

Junta-se sumário do acórdão.

Lisboa, 10 de dezembro de 2015

António Leones Dantas (relator)

Melo Lima

Mário Belo Morgado

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[1] Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais, Regime Jurídico Anotado, 2.ª edição, Almedina, 2009, p.p. 157 e 158.
[2] Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais, Regime Jurídico Anotado, 2.ª edição, Almedina, 2009, p. 240.
[3] Disponível nas Bases de Dados Jurídicas da DGSI.
[4] Disponível nas Bases de Dados Jurídicas da DGSI.