Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
747/03.0TTALM-B.L1.S1
Nº Convencional: 4ª. SECÇÃO
Relator: GONÇALVES ROCHA
Descritores: EXECUÇÃO LABORAL
OPOSIÇÃO
RECURSO
Apenso:
Data do Acordão: 07/07/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA
Área Temática:
DIREITO PROCESSUAL LABORAL - RECURSOS / MODO DE INTERPOSIÇÃO DOS RECURSOS.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - PROCESSO DE DECLARAÇÃO / RECURSOS / RECLAMAÇÃO DO DESPACHO DE INDEFERIMENTO DO RECURSO.
Doutrina:
- Albino Mendes Baptista, Introdução ao Direito Processual do Trabalho, Quid Juris, 1999, 145.
- Mendes Baptista, “Código de Processo do Trabalho”, anotado, 2.ª edição, 201, em anotação ao artigo 81.º do C.P.T. de 2000, e que havia sido aprovado pelo D.L. n.º 480/99, de 9-11.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGO 689.º, N.º 2.
CÓDIGO DO PROCESSO DO TRABALHO (CPT): - ARTIGOS 81.º, N.º1, 88.º, 90.º, 98.º, 98.º-A.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

-DE 17/1/90, IN B.M.J. 393/552.

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JURISPRUDÊNCIA DAS RELAÇÕES:

-ACÓRDÃO DA R.E., DE 22/2/2000, NO RECURSO 128/99.
-ACÓRDÃO DA R.P., DE 12/3/90, C.J., 257/2.
Sumário :
I- Ao modo de interposição de recurso de apelação num processo de oposição à execução laboral aplica-se o regime estabelecido no nº 1 do artigo 81º do Código do Processo do Trabalho, devendo o requerimento de interposição de recurso conter a alegação do recorrente.

II- Assim, não vindo o requerimento de interposição da apelação acompanhado das respectivas alegações, não pode ser admitido o recurso.

Decisão Texto Integral:

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:

1---

AA exequente nos autos de execução de sentença em que são executados

BB e

CC (na qualidade de ex-sócios da sociedade dissolvida e liquidada “DD, Ldª”), reclamou para a conferência do despacho da relatora, proferido a fls. 289, que decidiu não conhecer do objecto do recurso que o primeiro havia interposto da sentença que julgou procedente a oposição à execução e à penhora apresentada pelos executados, confirmando a decisão da 1ª instância[1], que havia rejeitado o recurso por falta de alegação.

         

E tendo a conferência indeferido a reclamação, interpôs AA a presente revista, tendo rematado a sua alegação com as seguintes conclusões:

1º -Ao processo declarativo decorrente da execução de sentença ainda que do foro laboral, aplica-se o disposto no CPC, por remissão do CPT.

2°-Não existe no CPT qualquer norma que mande aplicar disposições aos recursos em processo executivo laboral de normas exclusivas do processo declarativo laboral. Com efeito, no Código de Processo de Trabalho em vigor à data da interposição em juízo da acção de impugnação do despedimento (2003), aprovado pelo Decreto-Lei n° 480/99 de 9 de Novembro, consta um regime diverso de recursos do que era constante do processo civil também nessa data, mas referente apenas no primeiro caso (CPT) ao processo de declaração no Título IV, Capitulo I (com epigrafe Processo Comum), e secção VII;

3o - As normas que regiam então o processo executivo das sentenças laborais remetiam expressamente, para tudo o que não estivesse especificamente previsto de forma diferente no título V, capítulo II (Execução baseada em sentença de condenação), para o regime do Código de Processo Civil (art. 91°, n° 7, do CPT de 1999).

4-O Código de Processo Civil é que se aplicará então em recursos interpostos em sede de execução, uma vez que tal matéria está expressamente regulada nas normas de processo civil atinentes à execução.

5°-A aplicação de normas de carácter especial terminará então a partir deste momento, aplicando-se a lei geral e concretamente o CPC, por remissão.

6°-O que se encontra em causa no processo de execução não é já a determinação e verificação da legitimidade do pedido do autor em face das normas laborais, mas antes a execução de uma decisão já formulada sobre esse pedido e transitada em julgado, ainda que sobre matéria laboral.

7°~Aplicando-se normas de carácter geral ao processo declarativo que corre por apenso às execuções de sentença do foro laboral, inclusive as que determinam prazos, excepto onde a lei preveja expressamente de outro modo.

8°-O tribunal de 1a Instância aplicou ao presente processo em sede de recursos o disposto no NCPC e não qualquer norma do CPT, para recusar a admissão de recurso ao recorrente.

9o O tribunal da Relação de Lisboa proferiu inicialmente uma decisão de admissão do recurso aplicando ao caso o CPC anterior, tal como o recorrente havia entendido.

10° Entende-se então que se verifica uma excepção do caso julgado devendo ser aplicada a primeira decisão proferida pela Relação de Lisboa, julgando admissível o recurso.

Os recorridos não alegaram.

Subidos os autos a este Supremo Tribunal, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se pela negação da revista, argumentando que não foi violado o caso julgado, e que o regime de interposição do recurso a seguir no presente caso é o do CPT, pelo que sempre o recorrente deveria ter acompanhado o requerimento de interposição da apelação com as respectivas alegações.

Cumpre pois decidir.

2-- - -

         

Para tanto, o acórdão recorrido teve em conta os seguintes factos:
           
a) A acção declarativa cuja sentença foi dada à execução foi intentada em 2003;
b) A acção executiva teve início em 3/5/2007.
c) A oposição à execução deu entrada em 22/4/2010 e foi decidida em 4/2/2013 (cfr. fls. 141/149).
d) Em 7/4/2014, o exequente, através de patrona nomeada oficiosamente na sequência de requerimento que apresentara em 15/2/2013, veio interpor recurso da sentença de oposição à execução, não apresentando alegações.

3---

E decidindo:

Para se perceber melhor o objecto do recurso, temos de dizer que em 3 de Maio de 2007, o ora recorrente, AA, intentou uma acção emergente de contrato de trabalho contra “DD, Ldª, que terminou com decisão de condenação da R na quantia de 13 582,44 euros.

Em 3/5/2007, teve início a acção executiva dirigida contra a mencionada empresa DD, L.dª.

E tendo, entretanto, sido dissolvida, requereu o exequente a continuação da execução contra os seus sócios BB e CC, o que foi deferido por despacho de 24/11/2008.

         

E tendo-lhes sido penhorado um lote de terreno para construção, vieram deduzir oposição à execução e à penhora em 23/4/2010.

E seguindo os autos o seu curso, veio a ser proferida em 4/2/2013, decisão a determinar a extinção da execução dirigida contra os mencionados BB e CC, bem como a ordenar o levantamento da penhora do lote de terreno que havia sido penhorado.

Foi desta sentença que o exequente veio interpor recurso de apelação por mero requerimento, e sem vir acompanhado das alegações, recurso que não foi admitido na 1ª instância.

E assim, o que está em causa é o despacho de não recebimento deste recurso.

Efectivamente, o exequente reclamou desta decisão, reclamação que foi deferida pelo Senhor Vice-Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa por entender que tendo a sentença recorrida sido proferida antes da entrada em vigor da Lei 41/2013, é essa data que releva e não a da apresentação do recurso, como claramente resulta do respectivo artigo 7º, considerando assim aplicável ao recurso o disposto nos artigos 685º, nº 1 e 698º, nº 2 do CPC, na redacção anterior ao DL 303/2007, de 24/8.     

Perante este despacho o tribunal de 1ª instância admitiu a apelação, decisão que a Ex.mª relatora entendeu não dever seguir, pelo que, e indeferindo a interposição do recurso, não conheceu do mesmo.

E tendo o exequente reclamado para a conferência, foi proferido o acórdão recorrido que desatendeu a reclamação.

Conhecido o curso dos autos, estamos agora em condições de conhecer da revista, na qual o recorrente coloca as seguintes questões:

a) Violação do caso julgado;

b) Definição do regime de interposição da apelação para se decidir se o requerimento de interposição devia vir acompanhado das alegações.

Sendo estas as questões vejamos então cada uma delas.

3.1------

Com o advento do DL nº 303/2007 de 24 de Agosto, as reclamações contra a não admissão dum recurso passaram a ser decididas pelo relator do recurso, diploma que alterou o artigo 688º do CPC, alterações que apenas se aplicavam aos processos ajuizados a partir de 1 de Janeiro de 2008, conforme determinado nos seus artigos 11º, nº 1 e 12.

No regime anterior, estas reclamações eram dirigidas ao Presidente do Tribunal que seria competente para julgar o recurso, sendo por isso que se compreende que tenha sido o Senhor Vice-Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa a decidir a reclamação que o exequente havia feito do despacho da 1ª instância que não admitiu a apelação, tendo-se considerado que sendo a execução de 2007, é esta data a relevante para definir o regime processual aplicável e não a da interposição da oposição à execução.

           

Sustenta o recorrente que ao não admitir a apelação, a relatora violou o caso julgado, mas não tem razão.

Efectivamente, o despacho do Senhor Vice-Presidente salvaguardou o nº 2 do artigo 689º do CPC, na redacção anterior à conferida por aquele Decreto-Lei, que expressamente confere ao relator a quem for distribuído o recurso a possibilidade de decidir em sentido contrário.

Por isso, e improcedendo esta primeira questão, vejamos então qual o regime de interposição de recurso que é aplicável.

3.2---

Sustenta o recorrente que ao processo de oposição à execução de sentença ainda que do foro laboral, se aplica o regime previso no Código de Processo Civil, por remissão do CPT.

Advoga por isso que, não existindo no CPT qualquer norma que mande aplicar aos recursos surgidos em processo executivo laboral as normas do processo declarativo laboral, o regime do recurso é o do CPC na versão anterior à que foi conferida pelo DL nº 303/2007.

E nesta linha argumentativa, defende que o requerimento de interposição do recuso não tinha que ser acompanhado das alegações da apelação.

A Relação não aderiu a este entendimento, argumentando para tanto:

“Não obstante, na sistemática do CPT a matéria dos recursos constitua uma secção (a VII) do Título IV (do Livro I – Do Processo Civil) relativo ao Processo de Declaração, sendo que o Processo de Execução é tratado no Capítulo V e os Processos Especiais no Capítulo VI, sempre temos entendido que as normas respeitantes aos recursos (art. 79º a 87º) - tal como sucedia, aliás, no CPT de 1981, cuja sistemática foi mantida (vide art. 74º a 85) - têm carácter geral[2], sendo aplicáveis não só ao processo declarativo, mas também aos processos executivos e aos processos especiais, ou seja, a todos os processos cíveis que correm termos na jurisdição laboral. Esse entendimento radica na especialidade do direito processual do trabalho que desde sempre visou imprimir ao processo judicial maior celeridade e economia processuais, sendo que algumas das regras que lhe conferiam essa característica têm, aliás, vindo a ser adoptadas pelo processo civil nas últimas reformas a que tem sido submetido, como é o caso de obrigatoriedade de apresentação das alegações com o requerimento de interposição de recurso (que deu causa à presente reclamação), adoptada pela reforma dos recursos introduzida no processo civil pelo DL 303/2007, de 24/8.

É certo que a regulamentação dos recursos no CPT é muito incompleta, exigindo que, em tudo o que nela não estiver previsto, se recorra ao disposto pelo CPC, tal como sucede, aliás, com a disciplina das execuções (cfr. art. 98º-A do CPT actual ou 91º nº 7 na redacção anterior ao DL 295/2009).

Não vemos, porém, fundamento para alterar esta orientação.

Não é pelo facto de, em grande medida, a tramitação da execução e da oposição à execução atinentes a créditos laborais ter seguido o disposto no CPC - dado o CPT não conter regulação completa da matéria - que os recursos interpostos no âmbito da execução ou da oposição à execução deixam de ser regulados pela disciplina do CPT, no que neste estiver previsto. Não deixam de o ser, desde logo, no que tem a ver com o prazo de interposição que, no processo laboral, é inferior ao do processo civil (cfr. art. 80º do CPT e 637º do CPC) e, pela mesma razão, não podem deixar de o ser, no que se refere à obrigatoriedade de apresentação das alegações com o requerimento de interposição do recurso.

Entendemos, pois, que não assiste razão ao reclamante.”

Sufragamos esta argumentação da Relação, que não nos suscita qualquer reserva.

Na verdade, não há razão alguma para não aplicar aos recursos surgidos no processo executivo laboral o regime próprio do Código de Processo do Trabalho, afastando assim a aplicação do regime recursório do Código de Processo Civil, salvo as lacunas do processo laboral.

É certo que o CPT em sede de execuções é muito exíguo na sua regulamentação, pois mantém em vigor apenas os artigos 88º, 90º, 98º.

Por outro lado, é também certo que em tudo o que não se encontre especialmente regulado no título respeitante às execuções (o V), se aplicam as regras do Código do Processo Civil relativas ao processo de execução, conforme determina o artigo 98º-A do CPT.

No entanto, esta remissão não abrange o regime recursivo a adoptar, pois neste sentido aponta a história do preceito.

Efectivamente, o artigo 101º do CPT/81 também remetia para o regime do processo comum de execução.

Mas apesar disso, sempre se entendeu que esta remissão não abrangia as normas do CPC respeitantes aos recursos, pois esta matéria estava regulada, expressamente, no CPT.

E nesta linha, entendia-se que o regime de interposição dos recursos constante do artigo 76º daquele Código (CPT/81) era aplicável aos recursos interpostos em processos executivos, pelo que devia o requerimento de interposição vir acompanhado das respectivas alegações.

Neste sentido se pronunciava a jurisprudência deste Supremo Tribunal, podendo citar-se o acórdão de 17/1/90, in BMJ 393/552.

Também assim se entendeu no acórdão da RE de 22/2/2000, no recurso 128/99 vindo da comarca de Odemira, argumentando-se com as preocupações de celeridade processual advindas do regime recursório do Código do Processo do Trabalho e que nenhuma razão havia para não serem respeitadas, doutrina também sufragada no acórdão da RP de 12/3/90, CJ, 257/2.

Também Mendes Baptista em anotação ao artigo 81º do CPT de 2000, e que havia sido aprovado pelo DL nº 480/99 de 9/11, se pronuncia neste sentido, conforme se colhe do seu Código de Processo do Trabalho, anotado, 2ª edição, pgª 201. 

Assim sendo, e improcedendo esta questão, temos que concluir que bem decidiu a Relação.

4----

Termos em que se acorda nesta Secção Social em negar a revista, mantendo-se a decisão recorrida que indeferiu a reclamação para a conferência do despacho do relator que não admitiu a apelação.

Custas a cargo do recorrente.

Anexa-se sumário do acórdão

Lisboa, 7 de Julho de 2016

Gonçalves Rocha (Relator)

Ana Luísa Geraldes

Ribeiro Cardoso

                                       

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[1] Que era: por o recurso ter sido apresentado após a entrada em vigor da L. 41/2013, considerava-se, nos termos do respectivo art. 7º, 1, aplicável o regime decorrente do DL 303/2007, de 24/8, com as alterações introduzidas pela mesma lei, uma vez que a acção executiva fora instaurada antes de 1/1/2008. Porque, quer o actual art. 637º, nº 2 do CPC, quer a versão anterior do art. 684º-B, nº 2, fazem depender a interposição do recurso da apresentação imediata das alegações e, no caso isso não ter sucedido, rejeitara o recurso.
Apresentada reclamação deste despacho, foi a mesma julgada procedente pelo despacho de fls. 250/251 do Sr. Vice-Presidente deste tribunal, dado que a decisão recorrida fora proferida antes da entrada em vigor da L. 41/2013, sendo essa a data que releva e não a da apresentação do recurso, como claramente resulta do respectivo art. 7º, considerando assim aplicável ao recurso o disposto nos art. 685º nº 1 e 698º nº 2 do CPC, na redacção anterior ao DL 303/2007, de 24/8.

[2] Neste sentido se pronunciou Albino Mendes Baptista in “Introdução ao Direito Processual do Trabalho”, Quid Juris, 1999, pag.145 (embora referindo-se ao art. 76º do CPT de 1981).