Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
1684/14.8T8VCT.G1.S2
Nº Convencional: 6ª SECÇÃO
Relator: ANA PAULA BOULAROT
Descritores: AUTORIDADE DO CASO JULGADO
EXCEPÇÃO DE CASO JULGADO
VIOLAÇÃO
Data do Acordão: 02/26/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA
Área Temática:
DIREITO CIVIL – RELAÇÕES JURÍDICAS / FACTOS JURÍDICOS / NEGOCIO JURÍDICO / INTERPRETAÇÃO – DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / FONTES DAS OBRIGAÇÕES / CONTRATOS / RESOLUÇÃO DO CONTRATO.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL – PROCESSO DE DECLARAÇÃO / ARTICULADOS / PETIÇÃO INICIAL / CONTESTAÇÃO / EXCEÇÕES / SENTENÇA / EFEITOS DA SENTENÇA / RECURSOS / REVISÃO.
Doutrina:
- Ana Prata, O contrato-promessa e o seu regime civil, 2.ª reimp., edição 1994, Almedina, p. 624;
- Castro Mendes, Limites Objectivos do Caso Julgado Em Processo Civil, p. 109 e 110;
- Mariana França Gouveia, A causa de pedir na acção declarativa, 2004, p. 394;
- Miguel Teixeira de Sousa, O objecto da sentença e o caso julgado material (O estudo sobre a funcionalidade processual), BMJ 325, 1983, p. 168 ; Preclusão e “contrário contraditório”, CDP n.º 41, 2013, p. 24 a 27;
- Rui Pinto Duarte, A interpretação dos contratos, Almedina, 2016, p. 54.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 236.º, N.º 2, 237.º E 432.º.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 555.º, 580.º, 581.º, 619.º, N.º 1, 620.º, N.º 1, 621.º, 696.º, 697.º, 698.º, 699.º, 700.º, 701.º E 702.º.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGO 2.º.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:


- DE 07-03-2017, RELATOR PINTO DE ALMEIDA;
- DE 05-09-2017, RELATOR JÚLIO GOMES;
- DE 13-11-2018, RELATOR JOSÉ RAINHO.
Sumário :

I A figura da autoridade do caso julgado – que é distinta da excepção do caso julgado e que não supõe a tríplice identidade por esta exigida – visa garantir a coerência e a dignidade das decisões judiciais.

(APB)

Decisão Texto Integral:

ACORDAM, NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

I A e N, intentaram a presente ação declarativa de condenação, com processo comum, contra T, LDA, e CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS, SA (CGD), alegando, em síntese, que o Autor, no dia 11/08/2000, celebrou um contrato promessa com a sociedade, C Propriedades, Lda, mediante o qual se comprometeu a comprar-lhe, livre de ónus ou encargos, um armazém pela mesma construído, pelo preço de 30.000.000$000.

Não obstante ter pago 27.000.000$00, a título de sinal, porém, nunca celebrou o contrato de compra e venda definitivo, por aquela sociedade ter entrado em crise financeira.

Fruto dessa crise, a mesma sociedade cedeu a sua posição contratual à Ré T, que passou a ocupar o lugar de promitente vendedora do referido armazém, mas agora pelo preço global de 177.779,376, contemplado num outro contrato promessa de compra e venda celebrado com os AA., o qual incorporava todo o demais conteúdo do contrato anterior.

Entretanto, foi-lhes cedida a posse do dito armazém, mas ficou convencionado que o remanescente de 14.963.946 só seria pagou aquando da celebração do contrato definitivo.

E este, efetivamente, veio a ser celebrado no dia 21/05/2003. Porém, ficou pendente o registo de uma hipoteca a favor da Caixa Geral de Depósitos, S.A.

Por isso, acordaram as partes que os 14.963.946 em falta seriam pagos quando a Ré procedesse ao distrate da dita hipoteca, o que aquela se comprometeu a fazer até 31/12/2003, prazo que convencionaram poder ser prorrogado por seis meses, uma única vez e a pedido da Ré.

Tal distrate, no entanto, nunca veio a ser realizado. Isto, apesar de já terem decorrido todos os prazos e de para isso a referida Ré ter sido interpelada informal e formalmente, incluindo com concessão de novo prazo para cumprimento, sob pena dos Autores perderem o interesse no cumprimento dos contratos. Mas, nada foi feito, tendo a dita Ré encerrado toda a sua atividade.

Neste contexto, consideram ambos os contratos (o último contrato promessa e o contrato de compra e venda) definitivamente incumpridos.

Por isso, pedem que (i) se reconheça que é imputável à Ré T o incumprimento culposo e definitivo do contrato de compra e venda e da anterior promessa; (ii) que se considerem resolvidos ambos os contratos; e (iii) se condene a Ré T a pagar-lhes a quantia de 210.036,06€, acrescida de juros de mora, à taxa máxima legal, até efetivo e integral pagamento.

Contestou a Ré, CGD, concluindo não se verificar qualquer incumprimento definitivo dos aludidos contratos e consequentemente pela improcedência da acção.

A Ré T foi citada editalmente e o Ministério Público assumiu a sua representação em juízo, sem, no entanto, contestar.

Foi proferida sentença na qual se julgou improcedente a presente ação quanto ao pedido de resolução do contrato promessa celebrado entre a Ré T e o Autor, no dia 26 de Dezembro de 2002, pedido do qual foram absolvidos os Réus.

Esta decisão, no entanto, veio a ser revogada em sede de recurso, tendo aí sido determinado que os autos prosseguissem “para apreciação do mérito do pedido de resolução do contrato promessa na sentença final após apreciação do pedido de resolução do contrato definitivo”.

Entretanto, foi também proferida sentença na qual se julgou parcialmente procedente a presente ação e, consequentemente, declarou-se resolvido o contrato de compra e venda “celebrado entre o Autor e a Ré T em 21 de Maio de 2003, condenando esta a restituir ao Autor a quantia de € 134.675,43, actualizada pela aplicação do coeficiente de desvalorização da moeda de 1,20, até à data da citação, acrescida de juros de mora a contar da citação, à taxa de 4% ao ano, contados sobre esse capital actualizado, até integral e efectivo pagamento”.

Quando conhecido o resultado do já referido recurso, foi, no dia 11 de Setembro de 2017, determinada a realização de uma nova audiência prévia para seleção dos temas da prova considerados relevantes para o objeto que aí se considerou como sobrante; ou seja, a resolução do contrato promessa de compra e venda celebrado no dia 26 de Dezembro de 2002.

Dado a conhecer às partes o despacho que assim decidiu, nenhuma delas reagiu.

 

Foi proferida sentença que julgou improcedente a presente ação quanto ao pedido de resolução do contrato promessa celebrado entre a Ré T e o Autor, no dia 26 de Dezembro de 2002, pedido do qual absolveu as Rés.

Inconformados com esta sentença, reagiram os Autores, através de recurso de Apelação, o qual, a final, veio a ser julgado improcedente, com a manutenção do decidido.

Irresignados recorrem de novo os Autores, agora de Revista, com fundamento na violação do caso julgado, artigo 629º, nº2, alínea a) do CPCivil, apresentando as seguintes conclusões:

- A sentença proferida pelo Tribunal de Viana do Castelo, que julgou por uma segunda vez improcedente o pedido de resolução, por incumprimento, do contrato promessa de compra e venda, violou o caso julgado material formado pelo primeiro acórdão proferido nos autos, pela Relação de Guimarães.

- Por essa razão, o acórdão recorrido, ao confirmar essa sentença, violou ele também o caso julgado material formado pelo anterior acórdão da Relação de Guimarães, com o qual, aliás, entrou em flagrante contradição.

- Ao celebrarem o negócio prometido, nos termos em que o celebraram e que resultam dos autos, consentindo que a vendedora levantasse a hipoteca em prazo que iniciava depois de celebrada a venda, os contraentes não derrogaram a cláusula da promessa de comporá e venda, segundo a qual a coisa prometida deveria ser vendida livre de ónus ou encargos.

- A resolução, por incumprimento do contrato prometido, dada a eficácia retroactiva daquela, destrói todos os efeitos produzidos pela celebração do contrato prometido, e recoloca os contraentes na situação em que se e encontravam antes, ou seja, unidos pelo contrato-promessa.

- Verificando-se, subsequentemente, que o cumprimento da própria promessa se revelava como impossível, impõe-se seja declarada a sua resolução por incumprimento.

- Dando-se por resolvido o contrato-prometido, é irrecusável reconhecer que a promessa cumprida através da sua realização, deve igualmente ser declarada incumprida, e, devido a esse incumprimento, resolvida.

- Uma vez resolvidos por incumprimento, o contrato prometido e a promessa, deve a Ré T ser condenada no pedido, e obrigada a pagar aos Autores o valor da coisa prometida à data do incumprimento - Eur 207.655,36 - depois de deduzido o preço convencionado - Eur 177.779,37 - e acrescido da parte do preço paga, ou seja Eur 134.675,43, sendo que esta última quantia, nos termos da sentença, que nessa parte se não impugnam, devem ser actualizados pela aplicação do factor de correcção monetária 1,20, para a quantia de Eur 161.610,516.

Nas contra alegações os Réus pugnam pela manutenção do julgado, uma vez que entendem não haver qualquer violação do caso julgado.

II O único problema a solucionar neste recurso é o de saber se houve, ou não, por parte da segunda instância, a violação do caso julgado formado pelo Acórdão produzido em sede de recurso de Apelação anteriormente julgado.

As instâncias declararam como assente a seguinte factualidade:

a) No dia 11 de Agosto de 2000, a sociedade Propriedades, Lda, na auto-intitulada qualidade de promitente-vendedora, e A, na auto-intitulada qualidade de promitente-comprador, celebraram o acordo, por eles apelidado de contrato de promessa de compra e venda, nos termos do qual a primeira prometia vender ao segundo, e este prometia comprar, o direito ao prédio descrito na cláusula Ia do dito acordo, conforme se retira de fl. 14 dos presentes autos e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;

b) Nos termos do dito acordo, designadamente da cláusula 8ª, n° 4, "a escritura só poderá ser realizada se nenhum ónus ou encargo, de qualquer espécie ou natureza impender sobre o armazém objecto do negócio";

c) No dia 26 de Dezembro de 2002, a sociedade T, Lda, na auto-intitulada qualidade de promitente-vendedora, e A, na auto-intitulada qualidade de promitente-comprador, celebraram o acordo, por eles apelidado de contrato promessa de compra e venda, nos termos do qual a primeira prometia vender ao segundo, e este prometia comprar a fracção autónoma designada pela letra 'B' a que corresponde pavilhão destinado a indústria, armazenagem, comércio e/ou serviços constituído por dois pisos, melhor descrito na cláusula 1ª do dito acordo, conforme se retira de fls. 15 a 17 dos presentes autos e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;

d) Nos termos do dito acordo, designadamente da cláusula 2a, alínea a), o valor da venda consta no contrato promessa de compra e venda celebrado a 11.08.2000, entre C, Lda e o segundo outorgante, que fica anexo e faz parte deste contrato";

e) No dia 21 de Maio de 2003, foi celebrado, por escritura pública, no Segundo Cartório Notarial da …, entre o Autor A e a Ré T, um acordo, por estes apelidado de compra e venda, com os termos que constam de fls. 18 e 19 dos presentes autos e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;

f) Nos termos do referido acordo o Autor declarou comprar e a Ré T declarou vender a fração autónoma identificada pela letra "B" correspondente a um pavilhão, destinado a indústria, armazenagem, comércio e/ou serviços, de rés-do-chão e andar, com a composição constante da descrição registal, do prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal, situado no lugar de …., descrito na Conservatória do Registo Predial …;

g) Nos termos do referido acordo, "sobre o prédio recai uma hipoteca a favor da Caixa Geral de Depósitos, S.A., registada na Conservatória pela inscrição C-um, que garante a dívida de cento e quarenta e dois mil quinhentos e dezanove euros e doze cêntimos obrigando-se a sociedade a proceder ao seu cancelamento, quanto à fracção ora vendida, até trinta e um de Dezembro do ano em curso, prazo este prorrogável por uma única vez, por seis meses, a pedido da vendedora";

h) Foi ainda acordado no acto "que a venda é feita pelo preço de oitenta e cinco mil e quatrocentos euros. (...) Que do referido preço a sociedade vendedora recebeu, neste acto, a importância de sessenta e quatro mil seiscentos e sessenta e cinco euros e quarenta e cinco cêntimos, devendo a restante parte do preço, no valor de vinte mil setecentos e trinta e quatro euros e cinquenta e cinco cêntimos, ser paga pelo comprador logo que a sociedade proceda ao levantamento e distrate da hipoteca atrás referida;

i) Em 17 de Outubro de 2012, o Autor enviou a M a missiva cuja cópia se encontra a fl. 24 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;

j) O gerente da Ré, T, Lda, é, desde 13 de Fevereiro de 2009, F, conforme os termos constam da certidão permanente da Conservatória do Registo Comercial que antecede e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;

k) São sócios da Ré, desde 13 de Fevereiro de 2009, F e M, conforme os termos constam da certidão permanente da Conservatória do Registo Comercial que antecede e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;

1) "Encontra-se inscrita a favor da Ré, Caixa Geral de Depósitos, S.A., na descrição predial n° 658119940103, da Conservatória do Registo Predial de Valença, através da apresentação AP.6, de 2002/01/16, a constituição de uma hipoteca para garantia de um crédito de 1.870.493,006, até ao limite de 2.615.884,46€, conforme se retira da cópia da certidão de fls. 45 a 47 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, hipoteca essa constituída por escritura pública celebrada no dia 26/02/2002;

m) Na sequência dos acordos de promessa de compra e venda, cujos termos constam de fls. 14 a 17 dos presentes autos e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, celebrados entre o Autor, por um lado, e a sociedade C Propriedades, Lda e a sociedade Ré, por outro, o primeiro entregou a estas a quantia global de 134.675,436;

n) A Ré T encontra-se sem atividade e o seu gerente incontactável e com paradeiro incerto;

o) A fração descrita na alínea b) tinha, em Outubro de 2012, o valor de 207.655,366;

p) Em 2001, o gerente da C, entregou as chaves da fração prometida vender, então já construída, ao Autor, tendo este, a partir daí a ocupá-la e usá-la exclusivamente, a zelar pela sua conservação e a limpá-la, e nela depositando coisas suas, pagando os respetivos consumos de água e luz, até hoje.

Façamos, antes de mais um pequeno périplo sobre as decisões já proferidas nos autos, para melhor compreensão da problemática solvenda.

Lê-se no anterior Acórdão da Relação que incidiu sobre a decisão produzida em sede da primeira audiência prévia, fls 94 a 97 verso, no que tange ao pedido de resolução do contrato promessa, cfr fls 89 a 100 do apenso de Apelação em separado:

«[O]bjeto do recurso

Sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso, são as conclusões das alegações de recurso que delimitam o âmbito da apelação (arts. 635, 637, n.° 2, e 639, n.°s 1 e 2, do CPC). Tendo em conta o teor daquelas, colocam-se as seguintes questões:

A. Qual o conteúdo do contrato-promessa celebrado entre as partes? Foi cumprido?

B. A parte cumpridora pode, na mesma ação, pedir a resolução do contrato definitivo e a do anterior contrato-promessa?

II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Os factos relevantes são os que constam do relatório. A 1ª instância considerou na sua decisão os seguintes factos, que os Recorrentes não discutem e que já estão acima contemplados:

a) Em 26/12/2002, os Autores e a Ré T celebraram entre si e por escrito um acordo por elas apelidado de Contrato de Promessa de Compra e Venda com os termos que melhor constam de fls. 15 verso a 17 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

b) No dia 21/05/2003, foi celebrado entre as partes, por escritura pública, o acordo por elas apelidado de compra e venda com os termos que constam de fls. 18 e 19 dos presentes autos e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

III. APRECIAÇÃO DO MÉRITO DO RECURSO

A. Do conteúdo da prestação debitória do contrato-promessa

Na decisão do tribunal a quo ora em recurso foi entendido que, tendo sido celebrado o contrato de compra e venda do armazém estava cumprido o contrato-promessa. Lê-se na fundamentação de direito, com interesse para o objeto do recurso:

«Comparando os contratos celebrados e referidos nas alíneas que antecedem, especialmente os termos do contrato promessa de fls. 15 verso a 17, verifica-se que com a celebração por escritura pública do contrato de compra e venda foi satisfeito o interesse do credor, neste caso, o interesse dos autores na lógica e no enquadramento do contrato promessa. Com efeito, lidas e analisadas as cláusulas deste instrumento contratual (no qual não é referido, por uma única vez, a situação do imóvel quanto aos ónus que sobre ele impendia, não sendo mencionada qualquer obrigação relativamente ao distrate ou expurgo de uma hipoteca) verificamos que a prestação em causa nesse instrumento contratual foi integralmente satisfeita (questão diferente é saber se o interesse do credor com fundamento no contrato de compra e venda foi integralmente satisfeito).» Ora bem, não é a celebração de um qualquer contrato definitivo de compra e venda com objeto mediato idêntico ao visado com a promessa do mesmo tipo contratual que constitui cumprimento dessa promessa. O contrato-promessa só se considera cumprido quando os obrigados à celebração do negócio prometido o concluem nos termos convencionalmente estabelecidos, o que implica «não apenas que celebrem tal negócio, como que este não sofra de qualquer vício ou disfunção suscetível de afetar a posição jurídico-patrimonial visada pelo (por cada um dos) credor» (Ana Prata, O contrato-promessa e o seu regime civil, 2.a reimp. da ed. de 1994, Almedina, p. 624, sobre o cumprimento com modificações relativamente ao inicialmente projetado na promessa, v. pp. ss.).

Posto isto, há que, antes do mais, interpretar o contrato-promessa, identificar nele o conteúdo das obrigações assumidas pelas partes, ou seja, perceber a que comportamentos se vincularam. Só então poderemos concluir se o contrato-promessa dos autos foi ou não cumprido com a celebração do definitivo.

Desde já dizemos que não concordamos com a interpretação que o tribunal a quo fez do contrato-promessa celebrado em 26/12/2002 entre os Autores e a l.ª Ré (fls. 15v.° a 17). Na cláusula 2.ª, al. a) desse contrato lê-se: «O valor da venda consta no contrato promessa de compra e venda celebrado a 11/08/2000, entre "C, Lda." e o segundo outorgante; que fica anexo e faz parte deste contrato» (sublinhado nosso). A cláusula 3.ª do contrato-promessa de 11/08/2000, por seu turno, tem o seguinte teor: «Dos armazéns cujo projeto se encontra aprovado, a primeira outorgante promete vender ao segundo, livre de quaisquer ónus ou encargo, e o segundo promete comprar, a fração autónoma (armazém) designado pela denominação "n.°2", correspondente ao armazém n.° 2 do projeto aprovado pela C.M.» (sublinhado nosso). Assim sendo, é um dado insofismável que o objeto imediato do contrato-promessa celebrado entre as partes era a obrigação de emitir as declarações negociais correspondentes ao contrato definitivo, sendo este a compra e venda de um imóvel livre de quaisquer ónus ou encargos. Não é portanto correto dizer-se, como consta da decisão recorrida, que no contrato-promessa não seja referida a situação do imóvel quanto aos ónus que sobre ele impendiam, não seja mencionada qualquer obrigação relativamente ao distrate ou expurgo da hipoteca.

Em todo o caso, vamos imaginar, para que dúvidas não remanesçam, que o contrato-promessa não tinha a referência à desoneração do bem, por remissão para o texto do primitivo contrato-promessa. Num tal caso, perante a omissão, haveria que ir mais longe no processo hermenêutico, perscrutando, antes do mais se era conhecida das partes a vontade real de cada uma delas, pois sendo-o a interpretação do contrato far-se-á de acordo com ela. Apesar de esta diretriz constar do n.° 2 do art. 236 do CC - e como tal após a regra que afirma que a declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante -, sendo conhecida a vontade real das partes, é ela que prevalece na interpretação do contrato (Rui Pinto Duarte, A interpretação dos contratos, Almedina, 2016, p. 54).

No contrato de compra e venda ocorre a troca do direito de propriedade sobre uma coisa por um preço. O valor da coisa depende, em maior ou menor medida, dos ónus e encargos que sobre ela impendem, podendo estes até destituí-la de qualquer valor (basta que esteja a garantir pagamento de dívida de valor superior ao seu e que o devedor não tenha qualquer outra forma de a satisfazer - nem outras garantias especiais, nem património, nem crédito). O preço de um bem é, portanto, totalmente dependente do facto de ser vendido livre ou onerado e, neste caso, da avaliação dos ónus. Ambas as partes no contrato dos autos conheciam o bem dele objeto e, logo, o seu valor, pelo que não podiam deixar de saber que o preço correspondia ao bem desonerado. A l.ª Ré conhecia, considerando o preço, que a vontade real dos Autores era a de adquirirem o bem livre de ónus e encargos (cfr. art. 236, n.° 2, do CC).

Não fosse conhecida pela Ré a real vontade dos Autores, socorrendo-nos do critério interpretativo constante do n.° 1 do art. 236 - a declaração vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante -, chegaríamos à mesma conclusão. Por defeito, a compra e venda por determinado preço, nada constando expressamente em contrário, reporta-se ao bem totalmente livre de ónus e encargos; estes, como referimos, diminuem o valor do bem, em maior ou menor medida, podendo até anulá-lo. O preço de um bem é, portanto, totalmente dependente do facto de ser vendido livre ou onerado e, neste caso, da avaliação dos ónus. Consequentemente, quem promete comprar ou compra por dado valor, nada sendo especificado em contrário, fá-lo no pressuposto de que o bem está desonerado. Quem promete vender ou vende bem onerado tem de o declarar expressamente.

Se o caso fosse duvidoso (e não é), por via do disposto no art. 237 do CC - segundo o qual, nos casos duvidosos prevalece, nos negócios onerosos, o sentido que conduzir ao maior equilíbrio das declarações - atingiríamos o mesmo desiderato: a promessa reportava-se à compra e venda do imóvel desonerado.

Concluímos, portanto, que o conteúdo das prestações debitórias do contrato-promessa era a futura emissão de declarações de compra e de venda do identificado armazém, livre de quaisquer ónus e encargos, pelo preço acordado. O contrato definitivo celebrado entre as partes não cumpria essa especificação.

Consequentemente, o tribunal a quo não podia ter julgado improcedente o pedido de resolução do contrato-promessa com o aludido fundamento.

B. Da cumulação dos pedidos de resolução do contrato definitivo e do contrato-promessa

Concedemos, porém, que o contrato definitivo efetivamente celebrado deu cabal cumprimento ao contrato-promessa, satisfazendo integralmente o interesse do credor naquele contrato.

As partes são lives de modificar, de comum acordo, os contratos entre eles celebrados, incluindo os contratos-promessa. Se podiam ter alterado o contrato-promessa celebrado, também podiam celebrar diretamente um contrato definitivo que integrasse essas desejadas alterações. Ana Prata di-lo desta forma eloquente que aqui se reproduz: «Se, como qualquer contrato, também a promessa pode evidentemente ser modificada por subsequente acordo das partes, a especificidade aqui está em que, sem que tal acordo tenha aparentemente intervindo, os contraentes podem, nos comportamentos solutórios, que em alguma medida são, também eles, comportamentos livres, introduzir as modificações que lhes aprouverem, estejam elas ou não previamente acordadas» (ob. cit., p. 625).

Com efeito, afigura-se-nos lógico e correto afirmar que, se as partes celebraram o contrato definitivo nos moldes em que o fizeram, foi porque entenderam que assim ficavam satisfeitos e/ou acautelados os seus interesses.

É um dado que, no caso sub judice, a compra prometida reportava-se ao armazém desonerado. Uma vez que, na data do contrato definitivo, o armazém se mantinha onerado com hipoteca, a 1ª Ré obrigou-se a distratá-la em dado prazo, ficando parte do preço a pagar apenas quando o distrate se concretizasse. Pensaram as partes que, com esta nova obrigação, ficava assegurado o interesse dos Autores no bem livre e o seu direito a que o distrate fosse efetuado.

Sucede que a l.ª Ré não cumpriu a sua obrigação de cancelar a hipoteca e, com fundamento nesse incumprimento, os Autores pedem a resolução do contrato definitivo. A resolução de um contrato é equiparada quanto aos seus efeitos à nulidade do negócio jurídico, tendo, portanto, efeitos retroativos (art. 289, ex vi do art. 433, ambos do CC), com as especificidades do art. 434 do CC.

Uma vez resolvido o contrato de compra e venda, nenhum óbice existe à resolução do contrato-promessa que o antecedeu.

Nos termos do disposto no art. 555 do CPC, o autor pode deduzir cumulativamente contra o mesmo réu, num só processo, vários pedidos que sejam compatíveis, se não se verificarem as circunstâncias que impedem a coligação (diferentes formas de processo ou diferentes tribunais absolutamente competentes - art. 37 do CPC). No caso, nada obsta à cumulação dos pedidos de resolução dos dois contratos.

Do exposto resulta que o tribunal a quo não podia antecipar o conhecimento do pedido de resolução do contrato-promessa, nem considerá-lo cumprido estando pendente um pedido de resolução do contrato definitivo com fundamento em incumprimento deste.

(…)

IV. DECISÃO

Face ao exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar a apelação totalmente procedente, revogando o despacho recorrido na parte objeto de recurso, devendo os autos prosseguir para apreciação do mérito do pedido de resolução do contrato-promessa na sentença final após apreciação do pedido de resolução do contrato definitivo.».

E, na sequência do assim decidido e da sentença entretanto proferida quanto à resolução do contrato de compra e venda, o primeiro grau, pronunciou-se da seguinte forma quanto ao pedido de resolução do contrato promessa que se encontrava pendente:

«[a]s partes celebraram o contrato definitivo nos termos em que entenderam e transmitiram a fracção na situação em que entenderam.

Um dos principais efeitos do cumprimento é a extinção da relação obrigacional.

As partes prestando o que prestaram extinguiram as obrigações decorrentes do contrato-promessa que celebraram e fizeram surgir novas obrigações com a celebração do contrato definitivo.

Consequentemente, o contrato-promessa celebrado em 26 de Dezembro de 2002 extinguiu-se com a celebração do contrato de compra e venda em 21 de Maio de 2003.

A resolução pressupõe o incumprimento de um contrato válido e vigente.

Assim, não pode ser resolvido um contrato que se extinguiu em momento prévio. O cumprimento, tal como a resolução, são modos de extinção das relações obrigacionais complexas e um deles não pode, por definição, suceder ao outro. Não se pode pois resolver o que já se extinguiu pelo cumprimento, pois já não existe no ordenamento jurídico.

Mas será que com a resolução do contrato definitivo, o contrato-promessa celebrado anteriormente, e que antecedeu esse contrato definitivo, poderá renascer no ordenamento jurídico, valendo como tal e, consequentemente, passível de ser resolvido?

Não pode, porque aqui estamos no domínio do cumprimento/incumprimento das obrigações e não no domínio das invalidades negociais.

A resolução é uma declaração dirigida à parte contrária no sentido de que o contrato se considera como não celebrado, destruindo-se a relação contratual, em princípio validamente constituída, com base num facto posterior à celebração do contrato — cfr. artigos 432° e seguintes do Código Civil. O incumprimento, de uma parte relativamente à outra que cumpriu ou está disposta a cumprir, consubstancia a condição, geral ou típica, do exercício do direito de resolução no âmbito de um contrato bilateral.

(…)

Com efeito, a resolução não tem como consequência a colocação dos contraentes numa situação imaginária e ficcionada, como se o contrato definitivo não tivesse sido celebrado e como se estes não estivessem, aquando da celebração, no domínio - válido e legítimo — das suas próprias vontades; tem apenas, e não é pouco, o carácter retroactivo da liquidação (incidente, necessariamente, sobre o que se prestou), concretizada, no caso, pela sentença já proferida quanto ao contrato definitivo.

Em suma, não só pretenderam as partes, ao celebrar o contrato definitivo, extinguir o contrato-promessa, como os efeitos da resolução do contrato definitivo não fizeram renascer o contrato-promessa extinto (porque cumprido).

Improcede, por isso, a acção quanto ao pedido de resolução do contrato-promessa celebrado entre as partes em 26 de Dezembro de 2002.»

Quid inde?

Insurgem-se os Autores contra o Aresto produzido nestes autos, que manteve a sentença de primeiro grau produzida na sequência daqueloutro Acórdão, constante de fls 137 a 143, no que concerne à improcedência do pedido de resolução do contrato promessa, uma vez que, na sua tese, a sentença proferida neste sentido pelo Tribunal de Viana do Castelo, violou o caso julgado material formado por aquele Aresto e por essa razão, o Acórdão agora recorrido, ao confirmar essa decisão, violou ele também o caso julgado material formado pelo mesmo Acórdão da Relação de Guimarães, com o qual, aliás, entrou em flagrante contradição; efectivamente, ao celebrarem o negócio prometido, nos termos em que o celebraram e que resultam dos autos, consentindo que a vendedora levantasse a hipoteca em prazo que iniciava depois de celebrada a venda, os contraentes não derrogaram a cláusula da promessa de comporá e venda, segundo a qual a coisa prometida deveria ser vendida livre de ónus ou encargos e verificando-se, subsequentemente, que o cumprimento da própria promessa se revelava como impossível, impõe-se seja declarada a sua resolução por incumprimento e consequentemente a promessa cumprida através da sua realização, deve igualmente ser declarada incumprida, e, devido a esse incumprimento, resolvida.

Sempre s.d.o.c., estamos perante um raciocínio circular.

Se não.

Os Autores formularam, cumulativamente, dois pedidos, a saber: a resolução, por incumprimento da Ré T, do contrato de compra e venda do imóvel havido com o Autor; e da promessa de compra e venda que sobre o mesmo incidiu.

Primeiramente, o Tribunal entendeu julgar improcedente o pedido de resolução do contrato promessa, fls 96 e 97, sendo que dessa decisão foi interposto recurso de Apelação que subiu e foi decidido em separado, tendo prosseguido os autos principais para conhecimento do pedido de resolução do contrato de compra e venda referente ao imóvel objecto da promessa.

O primeiro grau, de fls 124 a 129, declarou resolvido o contrato de compra e venda, dando provimento parcial ao pedido formulado pelos Autores, decisão essa que não foi objecto de qualquer impugnação.

Entretanto, os autos tiveram de prosseguir para cumprimento da decisão produzida em sede da Apelação julgada em separado, quanto ao pedido de resolução do contrato promessa, que supra extractamos, da qual resultou a obrigação de conhecimento pelo Tribunal de tal pedido, após o conhecimento daqueloutro, o que já havia ocorrido.

O segundo grau, naqueloutra decisão, não entendeu que ambos os contratos estavam dependentes um do outro no que tange à apreciação da respectiva operância e validade, antes concluiu que a apreciação do (in)cumprimento do contrato promessa não poderia ser antecipada à apreciação da (in)subsistência do contrato definitivo com fundamento num eventual incumprimento daquela promessa.

Com razão.

Se o fundamento invocado para o incumprimento de um contrato de compra e venda consiste na invocação da quebra das cláusulas ajustadas num acordo prévio de promessa daquele, óbvio que se terá de apurar primeiramente se no mesmo se cumpriu pontualmente o que as partes se obrigaram nestoutra, ou se o seu incumprimento se deveu a outros motivos e, apurados estes, passar-se ao conhecimento do restante peticionado, pois as consequências contratuais advenientes de uma e outra são díspares.

Imputam os Recorrentes ao Acórdão em tela a violação do caso julgado formado naquele primeiro Aresto.

Uma das tarefas primordiais do Estado de direito democrático é a garantia dos direitos e liberdades fundamentais e o respeito pelos seus princípios, e, por isso, o princípio da segurança jurídica e da protecção da segurança dos cidadãos aparece-nos como uma das traves mestras da manutenção da ordem jurídica.

Tal princípio encontra-se expressamente consagrado no artigo 2º da CRPortuguesa e deve ser tido como sendo politicamente conformado, explicitando as valorações fundamentadas do legislador constituinte, assumindo-se como princípio classificador do Estado de Direito Democrático, o que implica um mínimo de certeza e segurança nos direitos das pessoas e nas expectativas juridicamente criadas a que está imanente uma ideia de protecção da confiança dos cidadãos e da comunidade na ordem jurídica e na actuação do Estado.

Dentro de tal princípio destaca-se, além do mais, o caso julgado, como seu postulado máximo.

Sendo o caso julgado um ponto em que o binómio dialéctico justiça-segurança cede em favor da segurança, poderá concluir-se que uma limitação ao alcance do instituto será sempre favorável à justiça, «(…) Se uma sentença injusta pode aequare quadrata rotundis ou facere de albo nigrum, valha-nos a ideia de que esta quadratura do círculo ou este escurecimento do branco só é irremediável quanto à decisão; as decisões futuras, prejudiciais ou finais, continuarão a poder ser livre e justamente quadradas e brancas.(…)», apud Castro Mendes, Limites Objectivos do Caso Julgado Em Processo Civil, 109/110.

Resulta do artigo 619º, n.º 1 que «Transitada em julgado a sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele nos limites fixados pelos artigos 580.º e 581.º, sem prejuízo do disposto nos artigos 696.º a 702.º.», dispondo o normativo inserto no artigo 620º, nº1, no que ao caso julgado formal diz respeito que «As sentenças ou os despachos que recaiam unicamente sobre a relação processual têm força obrigatória dentro do processo.», acrescentando o artigo 621º,todos do CPCivil, além do mais, que «A sentença constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que julga; (…)».

A figura da autoridade do caso julgado – que é distinta da excepção do caso julgado e que não supõe a tríplice identidade por esta exigida – visa garantir a coerência e a dignidade das decisões judiciais.

Referimo-nos à excepção de caso julgado, quando a eadem quaestio se suscita na ação ulterior como thema decidendum do mesmo processo e falamos em autoridade de caso julgado quando a eadem quaestio se coloca na ação subsequente como questão de outro tipo (fundamental ou mesmo tão somente instrumental), cfr Mariana França Gouveia, A causa de pedir na acção declarativa, 2004, 394; Miguel Teixeira de Sousa, O objecto da sentença e o caso julgado material (O estudo sobre a funcionalidade processual), in BMJ 325, 1983, 168; Miguel Teixeira de Sousa Preclusão e “contrário contraditório”, Cadernos de Direito Privado n.º 41, 2013, 24/27; inter alia os Ac STJ de 7 de Março de 2017 (Relator Pinto de Almeida, aqui primeiro Adjunto)), 5 de Setembro de 2017 (Relator Júlio Gomes) e de 13 de Novembro de 2018 (Relator José Rainho, aqui segundo Adjunto).

In casu, os Recorrentes defendem que a decisão plasmada no primeiro Aresto imporia que se declarasse resolvido a seu favor o contrato promessa celebrado com a Ré T, como que uma consequência lógica da decidida resolução entretanto produzida do contrato de compra e venda com a mesma havido e cujo objecto era o imóvel objecto do contrato promessa.

Contudo, veja-se que a sentença de primeiro grau que declarou resolvido o contrato de compra e venda, fundamentou a resolução na circunstância de em tal contrato – escritura de compra e venda –ter sido estipulado entre as partes que a outorgante vendedora, aqui Recorrida, se obrigou a expurgar a hipoteca constituída a favor da Ré CGD, que incidia sobre o imóvel, até 31 de Dezembro de 2003, prazo este prorrogável por uma única vez a pedido da vendedora, o que foi omitido, conduzindo assim ao incumprimento definitivo do mesmo.

Foi o incumprimento por banda da Ré vendedora, das obrigações assumidas no contrato de compra e venda que originou a sua destruição e não, como pretende a Recorrente, um eventual incumprimento do contrato promessa de compra e venda, por incumprimento das suas cláusulas contratuais, maxime, da prevenida na 2ª a), com referência à 3ª do primeiro contrato, cfr fls 14 a 16 (promessa de venda do prédio livre de ónus e encargos), e por o imóvel ter sido objecto da escritura de compra e venda onerado com a hipoteca à Ré CGD, em virtude da derrogação do projectado prometido, no que a este particular diz respeito, com a assunção de novas obrigações no âmbito do contrato definitivo. 

Assim sendo, como se concluiu no Aresto impugnado, não se pode «basear o incumprimento do dito contrato promessa no inadimplemento de tal obrigação. Nem, consequentemente, o direito de resolução que os Apelantes lhe associam.», «[a] autoridade de caso julgado garante a vinculação dos tribunais e dos particulares a uma decisão anterior, pelo que impõe que aqueles tribunais e estes particulares aca (e, neste sentido, repitam) o que foi decidido anteriormente (quanto, por exemplo, a uma questão que é prejudicial para o conhecimento de uma outra questão).», apud Miguel Teixeira de Sousa, in Contradição e «contrário contraditório», lc, 25.

Termos em que claudicam, in totum, as conclusões de recurso, porque inexiste qualquer violação da autoridade do caso julgado.

III Destarte, nega-se a Revista, mantendo-se a decisão ínsita no Acórdão censurado.

Custas pelos Recorrentes.

Lisboa, 26 de Fevereiro de 2019

Ana Paula Boularot (Relatora)

Pinto de Almeida

José Rainho