Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
4/12.0SVLSB-M.S1
Nº Convencional: 3.ª SECÇÃO
Relator: PAULO FERREIRA DA CUNHA
Descritores: RECURSO DE REVISÃO
TRÁFICO DE ESTUPEFACIENTES
SENTENÇA
ACÓRDÃO
NULIDADE DE ACÓRDÃO
IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
TRIBUNAL DA RELAÇÃO
ACUSAÇÃO
JUIZ
CRIME
CONDENAÇÃO
TRÂNSITO EM JULGADO
INDEPENDÊNCIA DOS TRIBUNAIS
ISENÇÃO
PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA
INADMISSIBILIDADE
Data do Acordão: 05/05/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO DE REVISÃO
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO
Sumário :
I -    Um acórdão de um Tribunal da Relação chamado a julgar a matéria de facto dada como provada e não provada pela sentença anteriormente proferida em 1.ª Instância, obedecendo, em sede de recurso, aos preceitos previstos nos arts. 372, 380, 379 e 425 do Código de Processo Penal, integra, nessa perspetiva, o conceito de sentença (lato sensu), para efeitos de admissibilidade de pedido de revisão.

II - Os tribunais são órgão de soberania (cf. art.110, n.º 1 da CRP) e os juízes, enquanto titulares desse órgão de soberania, administram a justiça em nome do povo (cf. art. 202. da CRP) e são independentes e apenas devem obediência à lei (cf. art. 203 da CRP). É também alicerce e legitimação da função jurisdicional a confiança pública na independência e na isenção do poder judicial.

III - Só perante uma decisão definitiva (transitada em julgado), que condene um Juiz por um crime cometido no exercício da sua função no processo, é que essa confiança pública pode e deve ser afetada.

IV - No caso, o recorrente pretende a revisão de acórdão da Relação – que tornou definitiva a confirmação da sua condenação pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes agravado – com base na circunstância de ter sido deduzida acusação contra o Juiz Desembargador que subscreveu o referido acórdão (que conheceu da arguição de nulidades que o arguido havia suscitado), acusação essa em que lhe são imputados factos de que resultará não ter sido o próprio a redigir o texto daquele acórdão, mas apenas o tendo assinado. Todavia, estamos apenas perante factos indiciados numa acusação e não na posse de factos provados por sentença transitada em julgado.

V - Importando o recurso de revisão o “sacrifício” do caso julgado, da estabilidade das decisões transitadas – corolário da segurança jurídica –, só deve ceder quando também, do outro lado da balança, se consolide uma outra realidade com idêntica segurança jurídica. Por tal motivo, o legislador exige, nos casos das als. a) e b) do n.º 1 do art. 449. do CPP, a existência de uma sentença transitada em julgado.

VI - A autorização da revisão não implica automaticamente a libertação do condenado (que se encontre a cumprir pena). De acordo com o art. 457, n.º 2, do CPP, em caso de autorização da revisão e o condenado se encontrar a cumprir pena de prisão, caberá ao STJ decidir, em função da gravidade da dúvida sobre a justiça da condenação, se a execução da pena deve ser suspensa. Há, assim, dois juízos autónomos: um para a autorização da revisão (cf. fundamentos do n.º 1 do art. 449 do CPP); e outro para a suspensão da execução da pena (cf. n.º 2 do art. 457 do CPP). Ou seja, o efeito útil pretendido pelo arguido com o presente recurso de revisão (suspensão da execução da pena) – acaso fosse concebível (que não é) prescindir da exigência de sentença transitada em julgado que condene o Juiz em crime cometido no exercício de funções no processo – também estaria dependente dessa ponderação (da gravidade da dúvida sobre a condenação). Assim, julga-se improcedente o recurso, negando a revisão.

Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça




I

Relatório



1. AA, devidamente identificado nos Autos, foi condenado pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p.e p. no art. 21, n.º 1 e 24, al. c) da Lei n.º 15/93, de 22-01, na pena de 7 anos e 6 meses de prisão, por acórdão proferido pela 1.ª Secção Criminal da Instância Central do Tribunal Judicial da Comarca ……… – Juiz …, em 16-06-2014.


2. Inconformado com essa decisão condenatória, o ora Recorrente interpôs recurso para o Tribunal da Relação ………, o qual, por Acórdão de 08-01-2015 (1.º acórdão da Relação), julgou parcialmente procedente o recurso do arguido AA, e outro, declarando nulo o acórdão recorrido, que deveria ser formulado nos seguintes termos:

a)   Não podem ser valorados, para a formação da convicção do tribunal, os dados de tráfego e de localização referidos em supra 4.1.1., C);

b)   A factualidade referida deve constar da decisão de facto, conforme tenha sido apurada pelo tribunal;

c)   O novo acórdão deverá cumprir o disposto no art. 374º, nº 2, do CPP; Para cumprimento do decidido, reabrir-se-á se necessário a audiência de julgamento.”.


3. Nessa sequência, o Tribunal de 1.ª Instância, em 10-07-2015, proferiu novo Acórdão, que condenou o arguido AA na pena de 7 anos e 6 meses de prisão, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p.e p. no artigo 21, n.º 1 e 24, al. c), da Lei n.º 15/93, de 22-01.


4. Irresignado com essa decisão condenatória, o ora Recorrente, entre outros, interpôs recurso para o Tribunal da Relação …, o qual, por Acórdão datado de 21-04-2016 (2.º Acórdão da Relação), julgou o recurso do arguido, entre outros, não provido.

Por Acórdão do Tribunal da Relação …, datado de 30-06-2016 (3.º Acórdão da Relação), o Tribunal reformulou o anterior Acórdão proferido, iniciando-o, dizendo que

Por manifesto lapso, no e-mail contendo o acórdão que foi enviado para a reprografia a fim de ser tirada a respectiva cópia do mesmo, não constou a análise que foi feita relativa ao recurso do arguido FF, apesar de devidamente elencado e autonomizado no relatório do acórdão. Assim, antes de se apreciar os requerimentos de nulidades invocados pelos restantes arguidos, quanto ao acórdão, que se mantêm actuais, corrige-se, nos termos do artº 380º, n.º 1, al. b) do CPP, o manifesto lapso verificado, incorporando, no novo acórdão, a análise ao recurso do arguido FF.”.


5. O arguido AA suscitou nulidades (por omissão de pronúncia e por excesso de pronúncia) relativamente ao acórdão de 21-04-2016 (e consequentemente relativamente ao acórdão de 30-06-2016, que fazia parte integrante do acórdão de 21-04-2016), constando do requerimento o seguinte:

“É verdade que o acórdão termina de forma enigmática quando decide: “Por ora, este tribunal de recurso conheceu de todas as nulidades invocadas pelos arguidos ora recorrentes, sendo que por uma questão de lógica processual, evitando a prática de actos inúteis, não se conhecerá do que falta conhecer no âmbito dos recursos dos arguidos (...) Fica assim prejudicado, por ora, o conhecimento das restantes questões objecto dos vários recursos.” Ao que parece o acórdão prevê que futuramente conhecerá do que falta conhecer...

VEJAMOS AS INACREDITÁVEIS OMISSÕES E PECADOS DO ACÓRDÃO.

A folhas 5 e seguintes o acórdão transcreve as conclusões do “pseudo” recurso do recorrente. Inacreditavelmente, não foi este o recurso interposto pelos recorrentes! Repetimos, este não é o recurso dos recorrentes!

Posto isto, ou melhor – aliás, pior – o que se segue no acórdão é de fazer arrepiar o bom senso processual.

Como é óbvio a decisão pronunciou-se sobre o que os recorrentes não alegaram e não se pronunciou sobre o que alegaram. VEJAMOS,

I)    A fls. 117 do acórdão, sob o título “A) - Nulidade da prova resultante de escutas telefónicas em fase de inquérito”

Conforme se constata do recurso dos recorrentes, em nenhum ponto esta questão foi levantada, pelo que o acórdão conheceu de questões de que não podia tomar conhecimento (artigo 379º, nº 1 al. c) do CPP).

II)   A fls. 128 do acórdão, sob o título “B- Nulidade da prova resultante de registos fotográficos de imagem”

Também desta feita, conforme se constata do recurso dos recorrentes, em nenhum ponto esta questão foi levantada, pelo que o acórdão conheceu de questões de que não podia tomar conhecimento (artigo 379º, nº 1 al. c) do CPP).

III)    A fls. 149 do acórdão, sob o titulo “D) - A arguição de nulidade: utilização de um outro meio de prova cuja valoração seria proibida – sentença proferida noutro processo” Ainda desta feita, conforme se constata do recurso dos recorrentes, em nenhum ponto esta questão foi levantada, pelo que o acórdão conheceu de questões de que não podia tomar conhecimento (artigo 379º, nº 1 al. c) do CPP).

AO INVÉS O ACÓRDÃO NÃO SE PRONUNCIOU SOBRE QUESTÕES DE QUE DEVIA PRONUNCIAR-SE

IV) (...)

Assim, como se alcança das conclusões acima transcritas o acórdão omitiu pronuncia sobre:

- a impugnação da prova;

- da perda dos bens a favor do Estado Português;

A não pronúncia sobre estas questões alegadas pelos recorrentes acarreta, também por esta via, a nulidade do acórdão, conforme artigo 379º, nº 1 al. c) do CPP).”


6. Na sequência das nulidades arguidas, o Tribunal da Relação ……, proferiu acórdão, datado de 15-12-2016 (4.º Acórdão da Relação), transitado em julgado em 06-11-2017, em que consta:

“Por força do despacho que, nos termos do disposto no art. 379.º do CPP, deferiu alguns dos vícios de omissão de pronúncia invocados pelos arguidos, de que padeciam os acórdãos desta Relação, datados de 21-04-2016 e de 30-06-2016, (este que conheceu a situação do arguido FF) que conduziram à nulidade do mesmo, iremos elaborar novo acórdão que conheça, agora, dessas questões que ficaram por analisar e só destas, porquanto, outras nulidades já foram conhecidas e resolvidas anteriormente.

(…)

3.1.1. Quanto ao recurso dos arguidos AA e BB

Alegam, em síntese, os arguidos que o acórdão em causa omitiu pronúncia sobre a impugnação da prova e sobre a perda dos bens a favor do Estado Português. Estas são as únicas duas questões que fazem parte do objecto do recurso destes arguidos, pese embora, anteriormente, terem invocado, outras questões que já foram analisadas pelo tribunal. A) – Impugnação da Prova/factos dados como provados nos pontos 30 a 50, 55, 67 a 69 (…)”

   E decidiu:

“a) julgar provido o recurso da arguida BB, e, em consequência determinar a entrega dos seguintes objectos em ouro que se encontram apreendidos; um (1) fio em metal de cor amarela, com 56 cm de comprimento e 74 gramas de peso; um (1) fio em metal de cor amarela, com 54 cm de comprimento e 18,8 gramas de peso, com uma (1) medalha em forma de coração, também em metal de cor amarela; um (1) fio em metal de cor prateada, com 55,5 cm de comprimento.

b) julgar não providos os restantes recursos respeitantes aos arguidos AA, CC, EE e FF.”.


7. O arguido encontra-se em cumprimento de pena a que foi condenado nestes autos, tendo atingido o meio da pena em 12-03-2021.


8. Veio agora o arguido AA interpor recurso extraordinário de revisão, nos termos do disposto no art. 449, n.º 1, al. d), do Código de Processo Penal. No respetivo recurso apresentou as seguintes Conclusões:

“a) O arguido foi condenado na pena de 7 (sete) anos e 6 (seis) meses de prisão, encontrando-se a cumprir pena à ordem destes autos, sendo que tem o meio da pena previsto para 12.03.2021.

b) Após a elaboração de 4 (quatro) Acórdãos do Tribunal da Relação ……, e de o Acórdão de 1.ª Instância ter sido declarado nulo uma vez, o trânsito em julgado ocorre em 06.11.2017.

c) Recentemente, o arguido teve acesso a novos factos que suscitam graves dúvidas sobre a sua condenação.

d) Em causa está a prolação da Acusação do Processo n.º 19/16... -……, vulgarmente designado por …….. .

e) Nos seus artigos 2318 e 2319, os arguidos NN e OO são acusados de esta redigir o acórdão do presente processo, em nome daquele.

f) Aqui em causa, está o último dos acórdãos proferidos pelo Tribunal da Relação, no dia 15.12.2016, dos presentes autos.

g) O Magistrado a quem cabia a elaboração do Acórdão que dirimia as questões de nulidades invocadas, de extrema importância, não foi o responsável pela mesma.

h) Refere o artigo 449.º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Penal que admite-se a revisão de sentença quando “uma outra sentença transitada em julgado tiver dado como provado crime cometido por juiz ou jurado e relacionado com o exercício da sua função no processo;”.

i) O facto de se vir a saber, de forma superveniente, do facto de não ter sido o Juiz competente a elaborar o Acórdão, mas sim outra pessoa que se fez passar por ele com a sua anuência, retira toda a confiança de que as questões foram analisadas de forma isenta e justa.

j) Sempre se dirá que a prova ora conhecida consta de uma peça processual não provada, nem tão pouco transitada em julgado, que apenas vale o que vale.

k) Não nos podemos esquecer que para os factos em causa serem dados como provados, a final, implica um longo e demorado processo que poderá levar anos a ser decidido.

l) Anos esses que são essenciais para o ora recorrente, atendendo que este se encontra em cumprimento de pena e correríamos o risco de, quando dados como provados os factos, já o arguido ter cumprido a sua pena na íntegra.

m) Esperar pelo trânsito em julgado de factos que constam na referida acusação, faz perder a toda a utilidade do presente recurso de revisão de sentença, no caso em apreço, devendo os factos ora trazidos a conhecimento do Tribunal serem devida e cautelosamente analisados, com o que há e nos moldes que há.”


9. Na sua resposta, o Digno Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal de 1.ª Instância pronunciou-se, apresentando a seguinte Motivação:

“I – O recurso interposto pelo arguido vem pedir a revisão da sentença que o condenou alegando, se bem se percebe, que poderão existir dúvidas sobre a justiça, não propriamente da sua condenação pela prática de crime de tráfico de estupefacientes agravado proferida em primeira instância, posteriormente mantida nos seus precisos termos em sede de recurso (matéria quanto à qual nada refere), mas antes quanto à conformidade com a lei e a justiça do Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação …. que, por último, analisou e decidiu os recursos interpostos, por diversos arguidos, do segundo Acórdão condenatório proferido nos presentes autos em 1ª instância.

Para tanto, alega o arguido ter chegado ao seu conhecimento o teor duma acusação proferida pelo Ministério Público num determinado processo, segundo a qual o Juiz ………relator do mencionado Acórdão se teria socorrido do auxílio de terceira pessoa (no caso a sua esposa, também ela Juíza ……), para redigir tal peça processual, posteriormente aprovada e publicada em conferência.

Mais vem o arguido alegar que tal actuação do referido Juiz … relator desse Acórdão será susceptível de integrar crime “relacionado com o exercício da sua função no processo”, tal como resultaria da imputação efectuada na acusação contra o mesmo deduzida pelo Ministério Público (1), em termos susceptíveis de integrar o fundamento de revisão de sentença que é previsto na alínea b) do nº 1 do art. 449º do Código de Processo Penal.

Porém, consciente de que não existe, nem é certo se e quando virá a existir, uma “sentença transitada em julgado” que considere provada a eventual prática de tal crime, procura o arguido fundamentar o seu pedido de revisão de sentença no disposto na alínea d) desse mesmo nº 1 do art. 449º do Código de Processo Penal, alegando que o simples facto de o Acórdão em causa poder não ter sido redigido pelo Juiz ………. a quem cabia relatá-lo e que o assinou como tal seria, se bem se percebe, suficiente para gerar “graves dúvidas sobre a justiça da condenação” proferida em primeira instância.

II – Perante estas alegações do arguido, deverá começar por se assinalar a circunstância, atípica em relação àquelas que terão estado na origem da previsão da possibilidade de interposição de recurso extraordinário de revisão em processo penal, de não ser impugnada a validade ou justiça duma sentença propriamente dita, necessariamente proferida em primeira instância (ainda que por um Tribunal superior, nos casos em que o mesmo disponha de competência para tanto), mas antes de um Acórdão proferido em sede de recurso – questão susceptível de ter relevância quanto à determinação do Tribunal competente para apreciar e instruir o presente pedido de revisão de “sentença” e também, certamente, para efeitos de determinação dos procedimentos a efectuar caso fosse concedida a pretendida revisão.

Com efeito, não estando aqui em causa uma sentença, no sentido definido nos artigos 372º e seguintes do Código de Processo Penal, uma eventual procedência do pedido de revisão formulado deveria, salvo melhor opinião, ter unicamente as consequências previstas para a revisão do “despacho que tiver posto fim ao processo”, nos termos e para os efeitos previstos, nomeadamente, nos art. 449º, nº 2 e 464º do Código de Processo Penal; sendo que, mesmo que se entenda qualificar o Acórdão da Relação impugnado pelo arguido como integrando uma “sentença”, ainda que meramente complementar da anteriormente proferida em primeira instância(3), o “novo julgamento” a efectuar não poderia deixar de ser, tão somente, o relativo à apreciação, em sede de recurso, das questões tratadas no Acórdão da Relação que o arguido pretenderá que seja revisto (art. 460º do Código de Processo Penal).

III – Em qualquer caso, independentemente da relevância e pertinência destas considerações prévias, deverá igualmente referir-se que, sendo manifesto não se verificar, no caso, o fundamento de eventual revisão que é previsto na alínea b) do nº 1 do art. 449º do Código de Processo Penal, por falta de qualquer sentença transitada que dê como provada a prática por juiz de crime “relacionado com o exercício da sua função no processo”, julga-se tão pouco ser aplicável, neste caso, a previsão da alínea d) desse mesmo nº 1.

Com efeito, o arguido parece pressupor que o simples facto de o Juiz … a quem caberia relatar o Acórdão proferido, cujo teor veio a ser aprovado e publicado em conferência (ou seja, por um colectivo de Juízes …, que fizeram necessariamente suas as respectivas conclusão e decisão), seria suficiente para suscitar “graves dúvidas sobre a justiça da condenação” proferida em primeira instância.

Porém, mesmo que se desse como provada tal factualidade no âmbito do presente procedimento de revisão (e seria certamente necessária uma comprovação autónoma e detalhada das circunstâncias nas quais terão ou não ocorrido os factos descritos na acusação invocada pelo arguido), não se vê que a simples elaboração duma qualquer peça processual por pessoa diferente do juiz que deveria fazê-lo e que vem a assiná-la como autor, por muito censurável disciplinar e até criminalmente que tal conduta possa vir a ser considerada, acarrete necessariamente dúvidas sobre a justiça da decisão proferida – muito menos dúvidas susceptíveis de se repercutirem, como aqui seria certamente necessário, sobre a justiça da condenação proferida em primeira instância, que não poderá ser afectada pela mera circunstância de não terem sido respeitadas regras de carácter meramente  deontológico em momento  posterior.

Desde logo, ao contrário do que o arguido procura insinuar, não está aqui em causa qualquer questão de competência, uma vez que o Acórdão em causa foi aprovado e publicado pelo colectivo de Juízes …. a quem cabia decidir o recurso interposto, conforme resulta dos autos e nem sequer é contestado pelo arguido.

Sendo assim, para que realmente pudesse considerar-se verificada a previsão da alínea d) do nº 1 do art. 449º do Código de Processo Penal, seria no mínimo necessário que o arguido alegasse e provasse que a concreta decisão proferida nesse Acórdão o fora em termos susceptíveis de pôr em causa, em si mesma e por si só, a realização da justiça – algo que nem sequer procura fazer e que não será certamente fácil, tendo em conta que quer o Tribunal de primeira instância quer o Ministério Público, em ambas as instâncias, também não tiveram quaisquer dúvidas em subscrever as considerações e decisões em matéria de facto e de decisão de perda de bens a favor do Estado que foram apreciadas e confirmadas no Acórdão ora impugnado pelo arguido.

IV – Face ao exposto, não procurando sequer o arguido explicar e provar em que medida o circunstancialismo que rodeou a elaboração do Acórdão por si impugnado seria efectiva e concretamente susceptível de gerar “graves dúvidas sobre a justiça da condenação” contra si proferida em primeira instância, deverá ser rejeitada a pretendida revisão de tal Acórdão, por se não verificarem os pressupostos previstos na alínea d) do nº 1 do art. 449º do Código de Processo Penal.

Caso diferente sucederia, em princípio, se realmente houvesse já sentença transitada dando como provada a prática por juiz de crime “relacionado com o exercício da sua função no processo”, uma vez que a alínea b) do nº 1 do art. 449º parece presumir que a efectiva prática de tal crime imporá, por si só, a necessidade de revisão da   justiça da decisão proferida.

Porém, não sendo esse o caso e não podendo presumir-se uma futura condenação, muito menos adivinhar os seus exactos contornos, não se vê qualquer razão para que essa mera possibilidade justifique a revisão da condenação do arguido nos presentes autos – muito menos para que lhe seja concedida, conforme parece pretender, a suspensão da execução da pena de prisão aplicada, ao abrigo do disposto no nº 2 do art. 457º do Código de Processo Penal, enquanto decorrer o julgamento do processo no qual tal  futura condenação  poderá vir a ser proferida.

Conclui-se assim dever ser negada a revisão de sentença pretendida pelo arguido, por falta de fundamento legal bastante.”


10. Nos termos do disposto no artigo 454, do CPP, em 06-01-2021, foi prestada informação pelo Meritíssimo Juiz, sendo, em suma, do seguinte teor:

“Considerando o disposto no art. 454º do Código de Processo Penal, cumpre lavrar informação sobre o mérito do pedido. (…)

Pronunciando-nos quanto ao mérito do pedido, como bem referiu o Ministério Público, não está a ser impugnada a validade ou justiça duma sentença propriamente dita, necessariamente proferida em primeira instância, ainda que por um Tribunal superior, nos casos em que o mesmo disponha de competência para tanto, mas de um Acórdão proferido em sede de recurso.

Por razões de economia e celeridade processuais, e sem prejuízo de opinião contrária, o presente incidente está a ser tramitado na primeira instância ao invés de se ter procedido à remessa integral dos autos ou, pelo menos, do presente apenso ao Venerando Tribunal da Relação … .

Se se entender que compete a este Tribunal proferir a informação a que alude o citado art. 454º nada impedirá a remessa do presente apenso para tal efeito.

Contudo, e para que os autos não sofram mais delongas, e, tendo em conta que o arguido recorrente se encontra em cumprimento de pena de prisão efectiva, entendemos impulsionar os autos, deixando, desde já, consignada tal informação.

Quanto à admissibilidade de tal recurso em relação ao Acórdão proferido em recurso e posto em crise, mesmo que se não entenda se tratar de uma sentença, o que não fazemos por considerarmos que os acórdãos dos tribunais superiores são sentenças, como resulta dos arts. 365º a 380º e 425º do Código de Processo Penal, tendo em consideração que pôs fim ao processo, entendemos que o nº 2 do art. 449º do mesmo diploma legal permite o presente recurso de revisão.

O recorrente nas motivações citou o art. 449º, nº 1, alínea d) do Código de Processo Penal, mas já nas conclusões invocou a alínea b) do mesmo diploma legal.

Dispõe este último preceito legal que “1 - A revisão de sentença transitada em julgado é admissível quando (...) b) Uma outra sentença transitada em julgado tiver dado como provado crime cometido por juiz ou jurado e relacionado com o exercício da sua função no processo”, acrescentando-se na alínea d) que “d) Se descobrirem novos factos ou meios de prova que, de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo, suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação”.

Quanto à previsão da alínea b), como bem assinalou o Ministério Público, não se verifica o fundamento de eventual revisão, por falta de qualquer sentença transitada que dê como provada a prática por juiz de crime “relacionado com o exercício da sua função no processo”.

Contudo, não nos podemos esquecer que a existir o trânsito em julgado de decisão que considere como provada a prática por juiz de crime relacionado com o exercício da sua função no processo, tal pode preencher a previsão deste preceito legal.

Cumpre também não esquecer que tal trânsito será necessariamente demorado pela natural demora do julgamento de um processo com especial complexidade e que, estando o arguido a cumprir pena de prisão efectiva, pode estar esgotado o efeito útil do recurso de revisão.

No que respeita à alínea d), como bem assinalou o Ministério Público, a simples elaboração de uma qualquer peça processual por pessoa diferente do juiz que deveria fazê-lo e que vem a assiná-la como autor, por muito censurável disciplinar e até criminalmente que tal conduta possa vir a ser considerada, não implica necessariamente dúvidas sobre a justiça da decisão proferida e muito menos dúvidas susceptíveis de se repercutirem, como aqui seria certamente necessário, sobre a justiça da condenação proferida em primeira instância, que não poderá ser afectada pela mera circunstância de não terem sido respeitadas regras de carácter meramente deontológico em momento posterior, não estando aqui em causa qualquer questão de competência, uma vez que o Acórdão em causa foi aprovado e publicado pelo colectivo de Juízes ……. a quem cabia decidir o recurso interposto, conforme resulta dos autos.

Como também assinala o Ministério Público, quer o Tribunal de primeira instância quer o Ministério Público, em ambas as instâncias, também não tiveram quaisquer dúvidas em subscrever as considerações e decisões em matéria de facto e de decisão de perda de bens a favor do Estado que foram apreciadas e confirmadas no Acórdão ora impugnado pelo arguido.


11. Neste Tribunal, a Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta pronunciou-se pela improcedência do recurso.


12. Cumprido o disposto no art. 417, n.º 2 do CPP, respondeu o arguido ao parecer da Exma. Procuradora-Geral adjunta, no sentido de contraditar os argumentos aduzidos pela mesma e, mantendo, em suma, a posição já assumida nos autos.


Sem vistos, dada a situação pandémica em curso, na vigência do estado de calamidade.

Cumpre apreciar e decidir em conferência.



II

Do Acórdão Recorrido



Dá-se por integralmente reproduzido o teor do acórdão objeto do recurso de revisão – acórdão do Tribunal da Relação …. datado de 15-12-2016 – o qual, brevitatis causa, não se transcreve, dada a sua extensão.

Desde logo, foram dados como provados os seguintes factos, com específico interesse para o Recorrente, sem prejuízo da integralidade do Acórdão:

“(…) Por sua vez, foram os arguidos AA, BB, CC, FF e HH, conjuntamente com os arguidos JJ e EE, investigados, igualmente pela …. Esquadra de Investigação Criminal da PSP, pela prática de crime de tráfico de estupefacientes, entre o mês de Janeiro de 2012 e o dia 07 de Março de 2013;

Efectuadas diligências visando os arguidos, nomeadamente, vigilâncias policiais, com recolha de fotogramas, e intercepções telefónicas, foi então verificado o desenvolvimento de tal actividade levada a cabo sob a coordenação do arguido AA, gerida, essencialmente, através de contactos pessoais com colaboradores e clientes;

Tal actividade de tráfico de estupefacientes tinha como escopo a obtenção dos avultados lucros daí resultantes e contou, designadamente, com a colaboração do arguido CC, a quem incumbia efectuar entregas de estupefaciente e recebimento de dinheiro;

O arguido CC em Janeiro e Fevereiro de 2012, data em que residia na Rua …, em …, utilizava os veículos automóveis da marca ……, modelo ……., de cor ……, com a matrícula ….-GI-…., e da marca …., modelo ……., de cor ….., com a matrícula ….-FC-….;

Tendo, designadamente, no dia …-02-2012, em …, utilizando o dito veículo com a matrícula ….-FC-…., contactado diversos indivíduos cuja identificação se desconhece, no Bairro ………. e no Bairro ……… (junto da Rua ………);

Os arguidos CC e AA encontraram-se no dia …-02- 2012, perto da agência do Banco Banif sita na Urbanização ………, em ………, após o que se deslocaram para a residência do primeiro, junto da qual o segundo arguido deixou o seu veículo estacionado;

O arguido CC contactou, no dia …-02-2012, no ……, em …….., um indivíduo cuja identificação se desconhece;

No dia …-03-2012, os arguidos CC e AA encontraram-se na residência do primeiro arguido, em ………, após o que o segundo dos mesmos saiu e, fazendo-se transportar no veículo da marca ………, de cor ……… e com a matrícula ….-AJ-….., deslocou-se à residência dos seus pais, sita na Rua …….., em …..…, …….;

Cerca de uma hora depois, aqueles dois arguidos mantiveram uma conversação telefónica no decurso da qual o arguido AA referiu que se encontrava na "sede" e solicitou ao arguido CC que fosse lá ter;

Seguidamente, o arguido CC saiu da sua residência e, fazendo-se transportar no veículo com a matrícula …-GI-…, deslocou-se a ……, onde o aguardava o arguido AA;

Após ter chegado, o arguido CC retirou do porta-bagagens do veículo que então conduzia (com a matrícula …-GI-…) uma mochila de cor clara, que transportou para o interior da garagem onde se encontrava o arguido AA; Passados alguns instantes, o arguido CC saiu da garagem, trazendo numa mão um saco em plástico de cor branca, que colocou no interior daquele último veículo (com a matrícula …..-GI-….), atrás do banco do condutor;

No dia …-03-2012, o arguido CC encontrou-se em ……, em ……, com um indivíduo conhecido por "DD" e referenciado com o tráfico de estupefacientes;

No dia …-03-2012, os arguidos CC e AA encontraram-se junto da referida residência dos pais do segundo arguido, sita em ……, ……, tendo então o mesmo AA cavado um buraco no quintal daquela, local esse de onde retirou algo;

No dia …-04-2012, os arguidos AA, CC e JJ, fazendo-se então transportar, respectivamente, nos veículos automóveis com as matrículas …-DF-…, …-FC-…. e …-FA-…, encontraram-se junto da entrada da Herdade ………, na ……, tendo, nesse espaço de tempo, o primeiro arguido se deslocado à sua residência, sita no interior da mesma ………., e, após tal, entregue um saco em papel ao segundo arguido, que este guardou na mala do veiculo que conduzia;

Continuaram os arguidos AA, CC e JJ a contactar entre si, pessoal ou telefonicamente - os dois primeiros arguidos de modo não regular entre finais de Agosto e a primeira quinzena de Dezembro de 2012 - tendo em vista, no mais, a marcação de encontros -. costumando aquele último arguido utilizar cabines telefónicas públicas e referir-se a ele próprio ou ao seu interlocutor como tratando-se do "Senhor KK";

O arguido CC tinha o usa desde, pelo menos, Maio de 2012, de uma garagem, que arrendou, sita no imóvel correspondente ao n.º …. da Rua ……, Rio ……, ………;

Local esse onde o referido arguido se deslocou, nomeadamente, nos dias 9, 16 e 25 do mesmo mês de Maio de 2012;

O arguido CC deslocou-se a …, em Espanha, na noite de 14 para 15 de Junho de 2012;

Mantiveram os arguidos AA e BB, que então viviam em união de facto, no dia 10-09-2012 contactos telefónicos relacionados com um contacto de um tal LL, tendo, designadamente, a mencionada arguida (re) enviado ao primeiro diversas mensagens escritas (SMS), dando-lhe conhecimento de que o mesmo LL pedia para que aquele lhe ligasse e do número através do qual deveria fazê-lo na sequência do que o arguido AA e o referido LL contactaram telefonicamente;

O arguido AA deslocou-se a Espanha no dia 12-09-2012;

No dia …-09-2012, pelas 19h45, o arguido AA deslocou-se à Quinta ……, em …….., tendo saído do bar da colectividade denominada  "Á……., explorado pelo arguido JJ, trazendo numa mão um saco de papel, de cor castanha, que colocou no lugar do "pendura" do suprareferido veículo da marca …….., com a matrícula ….-DF-…., após o que abandonou o local no mesmo veículo;

Também os arguidos AA e HH mantinham então, entre si, frequentes contactos telefónicos e encontros, alguns relacionados com a actividade de tráfico de estupefacientes;

Encontros esses que ocorriam, por exemplo, nas Bombas de Combustível da Galp sitas ………, em ………, na supra-referida residência dos pais do arguido AA, numa oficina de pneus situada em ………, em ………, ou num descampado existente junto do Stand de Vendas Imobiliárias ………, em ………;

Locais que denominavam como o "nosso local", ''nosso escritório", "escritório", "nosso sitiozinho" ou "colectividade";

Sendo aquele "escritório" o acima referenciado descampado;

E sempre na sequência de indicações fornecidas pelo arguido AA, designadamente quanto às horas e aos locais, não dando o mesmo, porém, pormenores relativos ao que pretendia, guardando-os para o contacto pessoal;

Tendo tais encontros ocorrido, nomeadamente, nos dias … de Setembro e 01, 02, 04 e 16 de Outubro de 2012 e 22 de Janeiro de 2013;

No dia …-11-2012, o arguido AA, utilizando então o supra referido veiculo com a matricula …-DF-…., deslocou-se ao talho do seu irmão, sito no …….., em ………, tendo ai procedido á contagem e ao acondicionamento de vários maços de notas, que colocou na sua mala;

Seguidamente, o arguido AA deslocou-se â Pastelaria "…", sita ……, em ……, onde permaneceu alguns minutos, tendo, acto contínuo, aguardado, nas imediações, na Rua ……. com a Rua …, em …, pela chegada do arguido EE;

Pelas 16h25, o arguido EE, conduzindo então o veículo da marca …, modelo ……, de cor ……. e com a matrícula …-GG-…, registado em nome do arguido FF, parou o mesmo em frente àquele veículo com a matrícula …-DF-…. e efectuou sinais de luzes, após o que os dois veículos iniciaram marcha e seguiram juntos até ………, sendo o veículo conduzido pelo primeiro arguido estacionado na Rua ………. e o veículo conduzido pelo arguido AA estacionado na Rua ………, junto à rotunda;

Tendo o arguido AA permanecido no interior do veículo com a matrícula …- DF-…., veio o arguido EE a sair do veículo que conduzia e a entrar, para o lugar do "pendura", naquele primeiro veículo, que então reiniciou marcha e se dirigiu até às imediações da supramencionada residência dos pais do mesmo AA, sita em ….., ……., onde foi estacionado, cerca das 16h50;

Acederam depois os arguidos AA e EE à residência dos tios do primeiro, sita no n.º ….. da referida artéria e contígua à residência dos pais do mesmo arguido, sendo visível que este apenas transportava uma mala de cor bege ao ombro;

Tendo o arguido AA acedido então, pelo quintal, comum àquelas duas residências contíguas, à habitação dos seus pais, veio o mesmo a regressar ao dito quintal, onde se demorou cerca de 15 minutos, após o que voltou à residência dos seus tios e abandonou esta, acompanhado do arguido EE e continuando a transportar a mencionada mala;

Cerca das 17h 15, fazendo-se transportar no supra-referido veículo com a matrícula …-DF-…. os arguidos AA e EE dirigiram-se até junto daquele veículo com a matrícula …-GG-…., então estacionado ……….., em ………., aí tendo chegado cerca das 17h38;

O arguido EE saiu então do veículo com a matrícula …-DF-…., levando consigo um saco de cores amarela e azul, fornecido pelo arguido AA, vindo a entrar no veículo com a matrícula ….-GG-…. pelo lado do condutor e a colocar o mencionado saco por baixo do banco do condutor;

Fez-se então o arguido EE transportar naquele último veículo até à Rua …, em ……, onde estacionou o mesmo veículo, próximo do n° …. da referida artéria, pelas 18h00;

O arguido EE saiu então da sua viatura, levando consigo o dito saco de cores amarela e azul, tendo seguido apeado até à Rua …, onde entrou, para o lugar do condutor, no veículo da marca …, modelo ……, de cor ………. e com a matrícula …-91-…, propriedade de MM, aí estacionado em frente do n.º ….. da mesma artéria, sem qualquer ocupante no seu interior;

De seguida, o arguido EE escondeu o saco que transportava junto ao banco do "pendura" e ajustou o mesmo banco, de forma a ficar na sua posição mais avançada, tendo, passados dois ou três minutos, saldo daquele último veículo, regressado ao veículo com a matrícula …-GG-…. e, fazendo-se transportar neste, abandonado o local;

No dia ...-11-2012, pouco antes das 10h55, MM deslocou-se a …, para tanto se tendo feito transportar no ciclomotor da marca …, modelo ……, de cor ……, com a matrícula ….-NE-…., de sua propriedade, que estacionou nas imediações da Rua …;

Dirigiu-se, depois, o referido MM, ao seu veículo automóvel, da marca ………, com a matricula …-91-…, nessa altura estacionado na suprareferida artéria e cuja bateria já se encontrava sem qualquer corrente eléctrica;

Introduziu-se então o mencionado MM, pelas 10h55, naquele veículo automóvel, tendo dal retirado diversos artigos, designadamente, da zona dos pés do "pendura", após o que saiu do mesmo veículo;

Tendo elementos da PSP que se encontravam no local suspeitado de que o dito MM teria ido buscar produto estupefaciente ao interior do referido veículo automóvel, vieram os mesmos, ainda na Rua …, a interceptar (e deter no âmbito do NUIPC 125/12…) tal indivíduo, quando este já se encaminhava para o seu ciclomotor;

Efectuada revista ao mencionado MM, foi encontrada na posse do mesmo, ocultada na zona do baixo-ventre, no interior das calças que aquele trajava, uma embalagem, com a inscrição "ALDRABÃO" manuscrita, contendo um produto suspeito de ser estupefaciente;

Mais foram então encontrados na posse daquele indivíduo uma chave do veículo automóvel com a matrícula …-91-…., duas chaves do ciclomotor com a matricula ….- NE-…. e uma chave de cadeado de disco, com o respectivo porta chaves, e a quantia monetária de € 353,45 (trezentos e cinquenta e três euros e quarenta e cinco cêntimos) do Banco Central Europeu, repartida em sete (7) notas de € 20, dezassete (17) notas de € 10, oito (8) notas de € 5, uma (1) moeda de € 2, uma (1) moeda de € 1, duas (2) moedas de € 0,20 e uma (1) moeda de € 0,05, então suspeita de provir de vendas de produtos estupefacientes;

Efectuada, nessa sequência, busca ao supra-referido veículo automóvel com a matrícula …-91-…., foi encontrado, por debaixo do banco da frente do lado direito, tapado pelo tapete, um saco em plástico, de cores amarela e azul, com a inscrição "……", em cujo interior se encontravam duas embalagens idênticas àquela que o referido MM transportava dissimulada junto ao corpo, assim igualmente suspeitas de conterem estupefaciente;

Foram, ainda, no decurso de tal busca, encontradas no interior daquele veículo, designadamente, no porta-luvas, duas embalagens suspeitas de conterem, também, produtos estupefacientes;

Submetidos a teste rápido e pesados tais produtos, veio a concluir-se tratarem-se os mesmos de: a embalagem encontrada na posse do dito MM, dissimulada junto ao corpo, heroína, com o peso bruto aproximado de 573,40 gramas; as duas embalagens que se encontravam no interior do mencionado saco em plástico, de cores amarela e azul, heroína, com o peso bruto total e aproximado de 1035,16 gramas; uma das embalagens encontradas no interior do porta-luvas do supra-referido veiculo automóvel, cocaína, com o peso bruto aproximado de 14,82 gramas; e a outra embalagem encontrada no interior do mesmo porta-luvas, produto indeterminado ou de "corte", com o peso bruto aproximado de 352,84 gramas;

Foi o referido MM sido detido e foram então apreendidos a tal individuo as embalagens, a quantia monetária, os veículos, as chaves, o porta chaves e o saco em plástico já referenciados, bem assim o certificado de matrícula referente ao ciclomotor com a matrícula ….-NE-…., um capacete da marca MOS, de cor branca, próprio para veículos de duas rodas, e um telemóvel da marca Samsung, modelo GT -E 1050, de cor preta, com o n. o de série ………., com cartão SIM da rede Vodafone, com o n.° ……..;

Foram todos os supra-aludidos produtos suspeitos, entretanto, sujeitos a exame laboratorial, tendo-se então concluído tratarem-se os mesmos de: -a embalagem encontrada na posse do dito MM, dissimulada junto ao corpo, heroína, com o peso bruto de 574,400 gramas e o peso líquido de 547,699 gramas; as duas embalagens que se encontravam no interior do mencionado saco em plástico, de cores amarela e azul, heroína, com o peso bruto total de 1034,900 gramas e o peso líquido total de 995,070 gramas; uma das embalagens encontradas no interior do porta-luvas do supra-referido veículo automóvel, cocaína (cloridrato), com o peso bruto de 14,800 gramas e o peso líquido de 14,159 gramas; e a outra embalagem encontrada no interior do mesmo porta luvas, cafeína e paracetamol, com o peso bruto de 354,000 gramas;

No dia …-11-2012, cerca das 13h50, na Rua ………, em ………, veio a ter lugar um encontro entre os arguidos AA (que chegou no veículo com a matrícula …-DF-….), JJ e EE (que chegaram no veículo com a matrícula ….-FA-…., ocupando os lugares de condutor e "pendura", respectivamente), tendo aquele primeiro arguido efectuado, no decurso do mencionado encontro, uma chamada telefónica;

No dia …-01-2013, os arguidos AA e EE deslocaram-se ao sul de Espanha, fazendo-se transportar no veículo da marca ……, de cor ……. e com a matrícula …-AJ-…, tendo regressado na manhã do dia seguinte;

Sendo que depois da chegada à Herdade ……, na ………, o arguido EE deslocou-se para a Quinta ……, em ………, tendo utilizado o veículo da marca …….., com a matrícula ….-GE-….;

Utilizava então o arguido AA locais de apoio à actividade de tráfico de estupefacientes, designadamente, as residências sitas no Casal ……, e na Rua ……, ambas em ……, ……..; -

Locais esses onde o referido arguido se deslocou, nomeadamente no dia 22-01-2013, data em que se encontrou com o arguido HH na ………., em ………., tendo ambos os arguidos se deslocado então no veiculo automóvel do mencionado HH, com a matrícula ….-FE-…., primeiro, à residência sita no ………., e, depois, à residência sita na Rua …………, cuja porta foi fechada pelo arguido AA, imóveis esses anteriormente arrendados pelo mesmo HH tendo em vista a guarda do estupefaciente, e que assim serviam como "casas de recuo";

No dia …-02-2013, pelas 09h23, o veículo da marca ……. e com a matrícula ….-LX-…. foi interceptado pela GNR na A2, na zona de ………, em ……., por ser conduzido em excesso de velocidade pelo arguido JJ, tendo então sido levantado o correspondente Auto de Contra-Ordenação;

Cerca das 18h08 o referido veículo com a matrícula ….-LX-…. chegou à zona da rotunda do Centro Sul, em ………, e é imobilizado junto do veículo com a matrícula ….-DF-…., que ali se encontrava estacionado, sendo conduzido pelo arguido AA, seguindo como acompanhantes os arguidos JJ e EE;

Após, os arguidos AA, JJ e EE saíram do dito veiculo com a matrícula ….-LX-…. e dirigiram-se à respectiva bagageira, tendo o mesmo AA mexido em algo que se encontrava no interior da mesma;

Fechada a dita bagageira, veio, depois, o arguido AA a introduzir-se no veículo com a matrícula ….-DF-…. e a fazer-se transportar neste, tendo, por sua vez, arguido JJ passado a conduzir o veículo da marca …… e com a matrícula ….-LX-…. o qual reiniciou marcha, nele seguindo como "pendura" o arguido EE;

No dia …-03-2013, o arguido AA deslocou-se a ……, …, Loures, passando pelo entroncamento da ……. com o ……….;

No dia …-03-2013, os arguidos AA e CC encontravam-se …, em …, tendo, seguidamente, se deslocado para a zona de ………;

Pelas 18h00, o veículo da marca ……. modelo ………, com a matrícula ….- FC-…., conduzido pelo arguido CC e onde seguia à "pendura" o arguido AA, entrou no ………, vindo a imobilizar-se junto da supra-referida residência com o n.º 10;

Deslocaram-se então os arguidos AA e CC para o pátio que dava acesso ã porta de entrada daquela residência, tendo o primeiro arguido seguido à frente e aberto o portão do pátio (uma pequena grade em madeira), bem assim a porta da mencionada residência com o nº …., com uma chave que o mesmo [AA] possuía, sendo seguido pelo arguido CC;

Pelas 18h05, os mesmos arguidos saíram daquela residência, seguindo o arguido CC à frente do arguido AA, tendo este último fechado a porta da residência e o portão do pátio;

Após, aqueles arguidos deslocaram-se para o veículo com a matrícula ….- FC-…., no qual abandonaram o local em direcção a ..…., seguindo, novamente, o arguido CC como condutor e o arguido AA á "pendura";

No dia …-03-2013, pelas 12h35, chegou à Rua …….., …….., em ………, o arguido CC, indivíduo de confiança de AA e em sua representação, a conduzir o veículo da marca ….. modelo ….., de cor …… e com a matrícula ….-FC-…., que estacionou num lugar vago, próximo do entroncamento formado por aquela artéria com a Rua ……….;

Passados breves minutos, chegou ao local o veiculo da marca …….., modelo …., de cor branca e com a matrícula ….-BE-…., conduzido pelo arguido FF, indivíduo de confiança de pessoa não apurada e em sua representação, que estacionou em segunda fila, no lado oposto da via onde se encontrava o arguido CC, momento em que este saiu do referido veículo com a matricula ….-FC-…. e deslocou-se para o lugar do "pendura*' daquele primeiro veículo, tendo os mesmos arguidos mantido então um diálogo de cerca de 15 minutos;

Os arguidos CC FF estavam encarregues de estabelecerem os contactos relacionados com a entrega de produto estupefaciente que iria ocorrer no dia seguinte a de efectuar o transporte respectivo entre o AA e o destinatário que FF representava;

Pelas 12h55, o arguido CC saiu daquele veículo com a matrícula ….-BE-…., tendo-se deslocado e introduzido no veículo com a matrícula ….-FC-…., momento em que o arguido FF abandonou aquele local, o que o referido CC fez também, alguns minutos depois, cada um dos mesmos arguidos no veículo que conduzia;

Deslocou-se então o arguido FF para a Avenida ………., tendo estacionado o dito veículo com a matrícula ….-BE-…. próximo do lote …. da mesma artéria onde residia, encontrando-se então a cerca de 50 metros daquele veículo, igualmente estacionado, um outro veículo, normalmente utilizado pelo arguido EE, com a matrícula ….-GG-….;

No dia …-03-2013, pelas 14h15, vindo da direcção de … pela Estrada Nacional n º …., sentido ….., o arguido CC conduzia o veículo da marca ….., modelo …….., de cor preta e com a matrícula …..-FC-…., tendo, ao chegar junto da residência sita na Rua …, …, abrandado a marcha, quase até parar, e olhado para a porta da mesma residência;

Retomando de seguida a marcha em direcção à residência sita no …, ……, onde chegou passados 2 a 3 minutos, tendo o mencionado arguido CC estacionado o veículo em frente ao portão de acesso ao pátio de tal residência;

Acto contínuo, o arguido CC acedeu à mesma residência através do respectivo pátio, fazendo uso de uma chave que trazia consigo, após o que regressou, logo de seguida, ao exterior, transportando dois (2) sacos de cor preta com algum volume e peso, dada a força que era visível que aquele então empregava, tendo-os colocado na bagageira do veículo com a matricula ….-FC- ….;

E voltado novamente ao interior da referida habitação, de onde tornou a sair, transportando agora um (1) saco de viagem de cor preta, também com algum volume e peso, que colocou junto ao banco do "pendura" daquele veículo;

Após, o arguido CC deslocou-se novamente à mencionada residência, tendo saído passados instantes, fechado a porta com a chave que possuía, acedido ao veiculo com a matrícula ….-FC-…. e abandonado o local em direcção a ……, pelas 14h28;

Em ….., o dito veículo, conduzido pelo arguido CC, tomou o sentido da A8, na qual entrou, circulando nesta via até à Calçada …, que percorreu, entrando de seguida no Eixo Norte-Sul, sentido Sul, saindo depois para a 2a Circular, sentido Sintra, tendo seguido por Benfica-Fonte Nova, Estrada de Benfica, Rua …, Rua …, Rua …, sentido …., Travessa …. e Avenida … e, já em …, virado para a Estrada ……, vindo a aceder ao Parque de Estacionamento situado no "Parque …", em …, Lisboa, onde foi parqueado por aquele arguido;

Nesse momento, cerca das 15h00, o arguido CC saiu do mencionado veículo, tendo sido contactado pelo arguido FF, condutor do veículo da marca …, modelo ….., de cor branca e com a matrícula ….-BE- …., que já ali se encontrava parqueado, dirigindo-se ambos para junto da bagageira do veículo conduzido pelo arguido CC, que foi então aberta por este, altura em que o mesmo FF começou a retirar um dos supra aludidos sacos em plástico;

Decidiu então a equipa da PSP presente no local proceder à abordagem dos mencionados arguidos, tendo acedido ao referido Parque, altura em que os mesmos CC e FF detectaram o veículo policial, o que motivou que aquele último arguido largasse o saco novamente para o interior da dita bagageira e o CC fechasse esta última, afastando-se ambos dos veículos cerca de 10 metros, mas mantendo-se ã conversa, altura em que foram abordados e informados das suspeitas que sobre eles recaíam;

Após tal, foram os arguidos CC e FF sujeitos a revista e detidos e os veículos em que os mesmos se faziam transportar alvo de busca;

Na sequência da revista efectuada ao arguido CC, veio a ser apreendido:

um (1) telemóvel da marca Samsung, com o IMEI …, contendo um (1) cartão da Vodafone com o n.º …07; a quantia monetária de € 310 (trezentos e dez euros); uma (1) chave de cor dourada, com as inscrições "…….." e "Chavo ……" (da porta da residência sita no ……., ……); uma (1) chave de cor prateada, com as inscrições "…….." e "………" (da porta da residência sita na Rua …., …); e um (1) veículo, supra-aludido, da marca ……., modelo …, de cor preta e com a matrícula …..-FC-…..., e a respectiva chave;

No interior do veículo conduzido pelo arguido CC (com a matrícula ….-FC-….), foi verificado que os dois (2) sacos em plástico que o mesmo tinha colocado na bagageira ocultavam um (1) fardo de "placas" de "haxixe" cada urti e que o saco de viagem colocado e transportado no lugar do "pendura" ocultava um (1) fardo de "placas" de semelhante produto;

Foram então apreendidos ao arguido CC: três (3) fardos de "haxixe", com o peso bruto total e aproximado de 92,400 quilogramas; um (1) saco de viagem de co preta, com a inscrição "SPORTS"; e dois (2) sacos em plástico de cor preta, de grandes dimensões.

Na sequência da revista efectuada ao arguido FF, veio a ser apreendido: um (1) papel manuscrito com as inscrições "15h00 - parque ………", "15h30 – …….", "17h00 - ………" e "17h30 - Preta" - referentes às horas e aos locais onde o dito FF tinha encontros agendados, sendo que os três (3) fardos de "haxixe" acima aludidos, encontrados na posse do arguido CC, se destinavam ao mesmo FF, respeitando a indicação "15h00 - parque ….." ao encontro marcado com o referido CC e as indicações "15Hh30 - ……..", "17h00 - …" e "17h30 - Preta" aos três (3) encontros que o primeiro arguido tinha agendado para fazer a entrega dos mencionados três (3) fardos de "haxixe"; um (1) telemóvel da marca Samsung, com o IMEI …; uma quantia monetária de € 10 (dez euros); e um (1) veículo, supra-referido, da marca …, modelo …, de cor branca e com a matrícula ….-BE-…., e a respectiva chave;

Submetido a teste rápido e pesado o produto suspeito de ser estupefaciente apreendido ao arguido CC, veio a concluir-se tratar-se o mesmo de "haxixe", com o peso bruto total e aproximado de 92,400 quilogramas;

Sujeito, entretanto, aquele produto suspeito a exame laboratorial, concluiu-se ser o mesmo, efectivamente, canabis (resina), vulgo "haxixe", com o peso bruto total de 92 782,134 gramas, tendo então sido recolhida (para análise) uma amostra com o peso líquido total de 282,134 gramas e constituída a respectiva amostra cofre com o peso líquido total de 281,533 gramas, e tendo o remanescente o peso bruto total de 92 500 gramas;

O arguido JJ, pelas 16h24 do dia …-03-2013 entrou em contacto com o arguido AA» ao qual perguntou se sabia alguma coisa do "rapaz" e se estaria tudo bem com ele;

No mesmo dia, pelas 16h48 e pelas 17h17, o arguido AA tentou, sem êxito, contactar com o arguido CC, telefonando para um telemóvel deste, primeiramente, a partir do seu próprio telemóvel e, depois, a partir de uma cabine pública;

No dia …-03-2013, pelas 18h35, elementos da PSP interceptaram, na Rua …, em ……, os arguidos AA e BB, tendo estes sido então postos ao corrente da existência de Mandados de Busca e Apreensão para as residências por si utilizadas, bem assim, desde logo, sujeitos a revista;

Na sequência da revista efectuada ao arguido AA, veio a ser-lhe apreendido a quantia monetária de € 160 (cento e sessenta euros) que se encontrava num bolso das calças do mesmo; o veículo da marca ……, modelo ……. de cor ……… e com a matrícula …..-AJ-…., avaliado em mais de € 24 000; um (1) porta-chaves com as letras "…….", com duas (2) chaves desse veículo; o Documento Único Automóvel do referido veículo; um (1) telemóvel da marca Samsung, modelo Duas, com os IMEI …. e …… contendo dois cartões SIM, um deles da rede TMN e o outro da rede Vodafone; e - um (1) relógio da marca Citizen, com o número de série ……….;

Na sequência da revista efectuada à arguida BB, veio a ser apreendido: a quantia monetária de € 3050 (três mil e cinquenta euros) que se encontrava dentro de um envelope; e a quantia monetária de € 15 090 (quinze mil e noventa euros) que se encontrava dentro de um saco em plástico, montantes e objectos esses então transportados no interior da respectiva mala;

No dia …-03-2013, deslocaram-se diversos elementos da PSP à residência sita na Herdade …, em …, a fim de dar cumprimento ao Mandado de Busca e Apreensão emitido relativamente a esse imóvel, habitado pelos arguidos AA e BB (diligência a que assistiu esta arguida);

Realizada a correspondente busca entre as 19h00 e as 19h30 e tendo sido percorridos o exterior e todas as dependências do mesmo imóvel, vieram a ser encontrados e, consequentemente, apreendidos os seguintes artigos: - no exterior da residência: o veículo da marca …, de cor …, com a matrícula ….-DF-…, avaliado em mais € 3000; e o Documento Único Automóvel desse veículo; -na sala: duas (2) chaves do referido veículo; um (1) telemóvel da marca Vodafone, modelo …, de cor preta, com o IMEI ….; uma (1) chave do supramencionado veiculo da marca …, com a matrícula ….-AJ-....; a quantia monetária de €505 (quinhentos e cinco euros), repartida por dezoito (18) notas de €20 (vinte euros), catorze (14) notas de € 10 (dez euros) e uma (1) nota de € 5 (cinco euros); um (1) fio em metal de cor amarela, com 56 cm de comprimento e 74 gramas de peso; um (1) fio em metal de cor amarela, com 54 cm de comprimento è 1S,8 gramas de peso, com uma (1) medalha em forma de coração, também em metal de cor amarela; um (1) fio em metal de cor prateada, com 55,5 cm de comprimento; um (1) relógio da marca …, de cor prateada e com mostrador de cor preta, com o número de série ……; um (1) relógio da marca …… de cor prateada e com mostrador de cor branca, sem número de série; um (1) relógio da marca ….., de cor dourada e com mostrador de cor preta, com o número de série …; um (1) relógio da marca …., de cor prateada e com mostrador da mesma cor, com o número de série ……; um (1) relógio da marca ….., de cor dourada e com mostrador da mesma cor, com o número de série …; um (1) relógio da marca …., de cor branca e com mostrador da mesma cor, com o número de série …; e um (1) computador da marca …, de cor cinzenta, com o nº de série …, com bateria e cabo de alimentação; - no quarto: a quantia monetária de € 230 (duzentos e trinta euros), repartida por uma (1) nota de € 20 (vinte euros), vinte (20) notas de € 10 (dez euros) e duas (2) notas de € 5 (cinco euros); e um (1) computador portátil da marca ….., de cor cinzenta, com o n.º de série ……, com bateria e apenas parte do cabo de alimentação; e -na arrecadação: a quantia monetária de € 700 (setecentos euros), repartida por trinta e sete (37) moedas de € 2 (dois euros), sessenta e uma (61) moedas de € 1 (um euro) e mil cento e trinta (1130) moedas de €0,50 (cinquenta cêntimos); No dia …-03-2013, deslocaram-se diversos elementos da PSP à residência sita no …., a fim de dar cumprimento ao Mandado de Busca e Apreensão emitido relativamente a esse imóvel (diligência a que assistiu o arguido AA);

Realizada a correspondente busca entre as 19h45 e as 20h15 horas e tendo sido percorridas todas as dependências do mesmo imóvel, vieram a ser encontrados e, consequentemente, apreendidos, designadamente, na cozinha, os seguintes artigos: oito (8) fardos de um produto suspeito de ser “haxixe” - sendo que dois (2) deles estavam ocultos em sacos em plástico de cor preta e um (1) outro encontrava-se aberto em cima de uma cadeira; dois (2) sacos desportivos de nylon de cor preta, com o logótipo "SPORTS"; e diversos sacos em plástico de cores preta e verde; Tal residência não reunia as mfnimas condições de habitabilidade, uma vez que estava desprovida de qualquer tipo de mobiliário, bem como não tinha energia eléctrica, servindo então, apenas, acondicionamento/armazenamento do produto estupefaciente; Submetido a teste rápido e pesado o produto suspeito de ser para o estupefaciente apreendido aquando da realização daquela última busca, veio a concluir-se tratar-se o mesmo, de facto, de "haxixe", com o peso bruto total e aproximado de 248,950 quilogramas;

Sujeito, entretanto, aquele produto suspeito a exame laboratorial, concluiu-se ser o mesmo, efectivamente, canabis (resina), vulgo "haxixe"P com o peso bruto total de 249 989,745 gramas, tendo então sido recolhida (para análise) uma amostra com o peso líquido total de 289,745 gramas e constituída a respectiva amostra-cofre com o peso liquido total de 289,133 gramas, e tendo o remanescente o peso bruto total de 249 700,000 gramas;

No dia ...-03-2013, deslocaram-se diversos elementos da PSP â residência sita na Rua ……, ……, a fim de dar cumprimento ao Mandado de Busca e Apreensão emitido relativamente a esse imóvel (diligência a que assistiu o arguido AA);

Realizada a correspondente busca entre as 20h 15 e as 20h40 e tendo sido percorridas todas as dependências do mesmo imóvel, vieram a ser encontrados e, consequentemente, apreendidos os seguintes artigos: -na sala: uma (I) prensa hidráulica da marca "CIATA" e vários componentes metálicos, que, usados de forma agrupada, servem para moldar e prensar produto estupefaciente; - no quarto, debaixo de uma cama insuflável; uma (1) mochila da marca "PUMA", de cor azul, contendo no seu interior três (3) embalagens de um produto suspeito de ser heroína, com o peso bruto total e aproximado de 1550,92 gramas; e um (1) invólucro de fita plástica de cor castanha, idêntico àquele usado para envolver os fardos de "haxixe"; e - na cozinha: uma (1) calculadora da marca Electronic Calcufator, de cores verde e branca; uma (1) tesoura com cinco centímetros de lâmina e platinas cor de laranja; e uma (1) factura/contrato da EDP, em nome do arguido HH, e respectivo talão de pagamento por Multibanco;

A prensa apreendida, que se encontra apta a funcionar, serviu para prensar/compactar embalagens de heroína em formato de - kg (meio quilograma), sendo as embalagens de heroína apreendidas na Rua ……,-n.º ……., ……., totalmente idênticas (designadamente, no formato) às que foram apreendidas a MM no âmbito do NUIPC 125/12…. e que haviam sido previamente entregues pelo arguido AA ao arguido EE;

Também esta última residência não tinha condições de habitabilidade, desde logo, electricidade, encontrando-se o interior da mesma praticamente desprovido de móveis, sendo a primeira então usada, apenas, como local de corte e acondicionamento do produto estupefaciente, para posterior venda deste;

Submetido a teste rápido e pesado o produto suspeito de ser estupefaciente apreendido aquando da realização daquela última busca, veio a concluir-se tratar-se o mesmo de heroína, com o peso bruto total e aproximado de 1550,920 gramas;

Foi aquele produto suspeito, entretanto, sujeito a exame laboratorial, tendo-se então concluído conter o mesmo resíduos de heroína, com o peso bruto total de 1548 gramas e o peso líquido total de 1504,283 gramas;

No dia …-03-2013, deslocaram-se diversos elementos da PSP à residência sita na Avenida…, em …, a fim de dar cumprimento ao Mandado de Busca e Apreensão emitido relativamente a esse imóvel, habitado pelos pais do arguido AA e frequentado por este último (diligência a que assistiu o mesmo arguido);

Realizada a correspondente busca entre as 20h45 e as 22h00 e tendo sido percorridas todas as dependências do mesmo imóvel, garagem, quintal e anexos, vieram a ser detectadas e, consequentemente, apreendidas, designadamente, no quintal existente nas traseiras de tal habitação, no interior de um balde em plástico que se encontrava enterrado: vinte e três (23) saquetas de "REDRATE"; e duas (2) lamelas de comprimidos "NOSTAN" (cada lamela com dez comprimidos);

No dia …-03-2013, deslocaram-se diversos elementos da PSP â residência sita na Rua …, ……, a fim de dar cumprimento ao Mandado de Busca e Apreensão emitido relativamente a esse imóvel, habitado pelo arguido HH (diligência a que assistiu o mesmo arguido, sendo que para levar a cabo tal diligência houve necessidade de proceder ao arrombamento da respectiva porta de entrada);

Realizada a correspondente busca entre as 23h15 e as 23h50 e tendo sido percorridas todas as dependências do mesmo imóvel, vieram a ser encontrados e, consequentemente, apreendidos os seguintes objectos: - no quarto do arguido HH debaixo da cama: uma (1) arma de caça, da marca ….., de calibre 12, com o número …; e doze (12) cartuchos do mesmo calibre; e - num móvel existente na sala: um (1) telemóvel da marca Nokia, de cores preta e cinzenta, com o IMEI …, contendo um (1) cartão da operadora TMN; um (1) telemóvel da marca Samsung, modelo GT-E 1050, com o IMEI ……, contendo um (1) cartão da operadora TMN; um (1) telemóvel da marca Nokia, de cor preta, modelo 6500C, com o IMEI …, sem cartão; e um (1) contrato de arrendamento em que o arguido HH é o segundo outorgante;

Relativamente à arma de caça apreendida encontra-se a mesma manifestada/licenciada em nome de II, correspondendo à mesma o Livrete nº …, não possuindo o arguido HH em seu nome qualquer documentação referente à mesma arma (Registo ou Manifesto) ou, tão- pouco, Licença de Uso e Porte de Arma;

Examinada a acima referida arma de caça, foi concluído tratar-se de uma (1) espingarda da marca K.F.C., de calibre 12, com o no …, com um cano de 64,5 cm de comprimento, de funcionamento semi-automático e encontrando-se apta a disparar;

Examinados os supramencionados cartuchos, foi concluído tratarem-se os mesmos de doze (12) cartuchos de calibre 12, carregados de chumbos e encontrando-se aptos a deflagrar;

No dia …-03-2013, deslocaram-se diversos elementos da PSP à residência sita na Av. ……, …, a fim de dar cumprimento ao Mandado de Detenção referente ao arguido JJ, bem assim ao Mandado de Busca e Apreensão emitido relativamente a esse imóvel, habitado pelo mesmo arguido (diligência a que este assistiu);

Tendo o referido JJ sido interceptado, pelas 10h50, junto á saída do condomínio onde se situa aquela residência, quando se fazia transportar no veículo da marca ….., com a matrícula …..-IP-….;

Realizada a correspondente busca entre as 10h45 e as 13h00 e tendo sido percorridas todas as dependências do mesmo imóvel, vieram a ser encontrados e, consequentemente, apreendidos os seguintes artigos: - na sala, em cima da mesa de jantar: dois (2) manuscritos de um caderno de apontamentos, juntos a fls. 1286 e 1287; um (1) telemóvel da marca Samsung, modelo GT-E1170, com o IMEI …., e a respectiva bateria, contendo um (1) cartão da rede TMN; e um (1) telemóvel da marca LG, modelo A 110, com o IMEI …. contendo um (1) cartão da rede Vodafone, referente ao número …58; - na sala, no interior de urna gaveta do aparador (mesa de centro): vários talões de depósito, referentes a valores numerários; um (1) contrato-promessa de compra e venda da habitação alvo de busca; e uma (1) factura da venda do veículo da marca …, com a matrícula ….-IP-…., no valor de € 54 000; - no interior da garagem: uma (1) mota de água da marca Bombardier, com o número ……., e a respectivo reboque, com a matrícula ….-IP-…., referente ao supra-aludido veículo da marca ….., com as chaves do cadeado do mesmo reboque; e uma (1) moto da marca "….", modelo ……, de cor …., com a matrícula ….-…..-PS, registada em nome do arguido JJ, com a respectiva chave (encontrando-se ambas as chaves das motas em cima da mesa da sala da referida residência); e - no parque de estacionamento do condomínio: um (1) veículo da marca …, modelo ……., de cor …., com a matrícula ….-IP-…., registado em nome do "G…, Lda.", do qual o mesmo JJ era sócio-gerente; um (1) veículo da marca ………, modelo …….., de cor …., com a matrícula …..-FA-…., registado em nome de GG (companheira do arguido JJ); e um (1) veículo da marca …., modelo …., de cor …, com a matrícula ….-GG-…., registado em nome do arguido FF; Tendo o arguido JJ sido então, na mesma ocasião, sujeito a revista, veio, na sequência desta, a ser apreendido àquele: um (1) telemóvel da marca Iphone, de cor preta, com o IMEI …; e a quantia monetária de € 170 (cento e setenta euros), repartida por três (3) notas de € 20 e onze (11) notas de € 10; No dia 22-03-2013, pelas 16h00, a fim de dar cumprimento ao Mandado de Detenção referente ao mesmo individuo, elementos da PSP interceptaram na Rua …, em …, o arguido EE; Tendo o mencionado arguido EE sido então, nessa ocasião, sujeito a revista, veio, na sequência desta, a ser apreendida àquele uma (1) chave do veiculo da marca …….., modelo …, de cor …, com a matrícula ….- GG-…., registada em nome do arguido FF;

Ainda no dia …-03-2013, deslocaram-se diversos elementos da PSP à residência sita na Rua …, …, a fim de aí realizar busca a tal imóvel, habitado pelo referido arguido EE, diligência essa cuja realização veio a ser autorizada (e à qual o mesmo arguido assistiu);

Realizada a correspondente busca entre as 18hOO e as 18h30 e tendo sido percorridas todas as dependências do mencionado imóvel, veio a ser encontrada e, consequentemente, apreendida uma (1) máquina da marca "SEETECH", modelo CF-100E, própria para contagem de dinheiro (notas);

Actuaram os arguidos EE e AA, por um lado, e este último, CC, FF e HH, por outro, conforme acordo prévio nesse sentido estabelecido (nas datas acima indicadas aos mesmos respeitantes), em comunhão e conjugação de esforços, levando a cabo, desse modo concertado, os seus desígnios ilícitos;

Os arguidos EE, AA, CC, FF e HH destinavam ou sabiam que se destinavam os supra referidos produtos estupefacientes à venda a terceiros, mediante a obtenção, em seu beneficio, de contrapartidas monetárias, nomeadamente, que lhes permitissem adquirir como adquiriram, bens de valor;

Os arguidos EE, AA, CC, FF e HH conheciam a natureza e as características estupefacientes dos referidos produtos;

O arguido HH tinha ainda conhecimento das características da espingarda de caça e dos cartuchos que foram encontrados na sua posse, bem assim de que não podia, nas condições acima descritas, deter os mesmos;

A arguida BB era conhecedora da descrita actividade ilícita do arguido AA, utilizando em proveio próprio as quantias monetárias daí resultantes;

Agiram os arguidos EE, AA, CC, FF e HH livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo os mesmos que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei;

Mais se provou quanto aos arguidos:

AA:

o arguido é o mais novo de dois filhos, tendo crescido num agregado familiar residente num meio rural da zona de …, cuja dinâmica ficou caracterizada por uma forte coesão entre os seus elementos;

As limitações sócio-económicas do agregado determinaram o ingresso precoce do arguido na vida laboral;

A trajectória escolar do arguido foi breve e marcada por insucesso e fraco investimento, tendo abandonado os estudos com cerca de 12 anos de idade, altura em que se iniciou laboralmente no ramo do açougue, um armazém de carne de um primo;

Desde então, e até aos 24 anos, o arguido exerceu regularmente a actividade de …, ramo em que o irmão se estabeleceu e, paralelamente, desenvolveu actividade laboral como … num estabelecimento de …;

O arguido evidenciou desde cedo um comportamento muito activo, com facilidades ao nível do relacionamento interpessoal, aspectos que favorecem a que gozasse de forte popularidade no meio desportivo e laboral;

Nestes contextos de actividade nocturna e de treino da modalidade desportiva de Power Lifíing foi estabelecendo sociabilidades e referências de amizade com vários indivíduos, envolvendo-se em situações de risco que culminaram com a sua prisão quando tinha 24 anos;

Durante o cumprimento de uma pena iniciado em 1993, e no decurso de uma saída precária, o arguido não se apresentou na data devida, tendo-se ausentado para Espanha, onde esteve preso  ….-….-2001 a ….-….-2002, data em que foi entregue às autoridades portuguesas, cumprindo o resto da pena no EP … e até 2004, altura em que saiu em liberdade condicional, cujo termo estava previsto para ….-…..- 2007;

Em ….-…..-2006 veio a ser preso preventivamente no âmbito de um outro processo, tendo, em 2008, sido absolvido nesse processo;

Após a saída em liberdade, passou a trabalhar como comercial de máquinas de jogos e de diversão, as quais acompanha no âmbito da firma "Cosmos-Diversões;

Concomitantemente, exerceu funções remunerada enquanto ………. e praticava a modalidade desportiva ……, como atleta……; Ao nível afectivo, ainda antes da primeira prisão, mantinha uma relação amorosa que terminou devido ao falecimento da namorada, vítima de acidente de viação; Em …. estabeleceu união de facto com uma cidadã ……….., aqui radicada há já alguns anos, vindo posteriormente a estabelecer novo relacionamento afectivo com outra cidadã …, co-arguida no presente processo;

Aquando da sua detenção nestes autos, o arguido residia com a sua namorada, a co-arguida BB, numa habitação arrendada na Herdade …., sendo ele o único suporte económico do casal, já que a mesma não exercia qualquer actividade profissional;

Apesar de residir na margem sul, o arguido mantinha um convívio próximo com os país» evidenciando a dinâmica familiar um funcionamento harmonioso, baseado em relações de afectividade e cooperação;

O arguido apresenta-se como um indivíduo dinâmico, com facilidades ao nfvel do relacionamento interpessoal, sobressaindo o forte espírito empreendedor e a capacidade de trabalho;

Quando retomar a liberdade, pretende integrar numa fase inicial o agregado familiar de origem constituído pelos pais;

O arguido encontra-se preso no Estabelecimento Prisional ……, onde mantém um comportamento adaptado às normas e beneficia de visitas dos pais e da namorada; A Equipa que elaborou o relatório social do arguido conclui que «O processo de desenvolvimento de AA decorreu num contexto familiar organizado, pautado pela estabilidade relacional e pela preocupação dos progenitores na transmissão de valores e normas sociais.

Contudo a sua trajectória de vida parece ter sido prejudicada pela facilidade com que estabelece relações de convívio e da predisposição para aderir a situações de risco, tendo sido neste contexto, que com 24 anos foi condenado numa longa pena de prisão. Esta experiência não se apresentou consistentemente dissuasora do estabelecimento de novos contactos com a justiça.

Em termos pessoais, o arguido apresenta limitações no juízo crítico perante a adopção de comportamentos transgressores

Por outro lado, a persistência na manifestação dos seus comportamentos criminais, com registos de diversos contactos com o Sistema de Administração da Justiça Penal e Prisional, associada ao contexto das suas sociabilidades, também elas desviantes e anti-normativas, assumem-se como factores de risco que introduzem um cenário de prognose desfavorável quanto ao comportamento futuro do arguido»; Por acórdão de 26-10-1994, transitado em julgado, proferido no âmbito do Proc, Comum Colectivo nº 12980/93….., que correu termos no …. Juízo Criminal do Tribunal Judicial ………, foi o arguido condenado, pela prática dos crimes de roubo, homicídio, na forma tentada, ofensas corporais e detenção de arma proibida, p. e p. pelos arts. 306.°, n.os 1, 3, al. a), 4 e 5, com referência ao art. 297/, nº 1, ais. a) e b), do CPenal, 131°, 132°, n? 2, al. c), 22.°, 23. °, 144° e 260.°, todos do CPenal, com referência ao art. 3.°, n.? 1, al. d), do DL 207-N75, cometidos em 29-10-1993, na pena de 15 (quinze) anos de prisão, que cumpriu, tendo a mesma sido declarada extinta (reportada a 05-11-2007) por despacho de 02-04-2009;

Por sentença de 25-10-1985, transitada em julgado, proferida no âmbito do Proc. Comum Singular nº 52/95 (17702/91……), que correu termos no …… Juízo Criminal de …., ….. Secção, foi o arguido condenado, pela prática de um crime de ofensas corporais, p. e p. pelo art 142/ do CPenal, cometido em 14-07-1991, na pena de 6 (seis) meses de prisão, substituídos por igual tempo de multa, à taxa diária de PTE 500$00 (quinhentos escudos), num total de PTE 90 000$00 (noventa mil escudos), ou em alternativa 120 (cento e vinte) dias de prisão, totalmente perdoada, nos termos do art. 8°, nos 1, ai. c), e 11, da Lei 15/94, de 11-05, com a condição de o arguido não incorrer em infracção dolosa no prazo de 3 anos a partir de 12 de Maio de 1994;

Por acórdão de 15-12-2011, transitado em julgado, proferido no âmbito do Proc. Comum Colectivo n° 9/10…., que correu termos na … Vara Criminal …, foi o arguido condenado, pela prática de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelos arts, 86", nº 1, aL c)t e 3°, n.º 4, da Lei 5/2006, de 23-02, com a redacção dada pela Lei 17/2009, de 16-05, cometido em 16-10- 2010, na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão, cuja execução foi suspensa por igual período; CC:

O arguido cresceu no seio de uma família de condição socioeconómica mediana, sendo o mais velho de três irmãos, habitando numa zona perto …, mas que à época tinha características rurais;

Ao nível escolar, o arguido deixou a escola após concluir o 12° ano de escolaridade, por falta de motivação para ingressar no ensino superior e desejo de autonomia financeira, optando por iniciar vida profissional aos 21 anos numa empresa multinacional de assistência às caixas Multibanco;

Trabalhou como efectivo nesta empresa durante cerca de 12 anos, acabando por se despedir voluntariamente em virtude de pretender iniciar negócios no …. na área da ……..;

Aos 25 anos, iniciou namoro com uma jovem menor, que à data tinha 15 anos, passando ambos a co-habitar em casa dos pais da companheira na zona ….;

Mais tarde contraíram matrimónio e passaram a viver de forma independente e desta união nasceu uma filha, actualmente com 13 anos de idade;

O arguido esteve no … durante cerca de três meses para dar inicio a um conjunto de negócios na área…, nomeadamente um ……. e um ………, que acabou por não ter continuidade acabando por perder todo o dinheiro investido;

Ao regressar a Portugal deu início a uma actividade laboral na área da segurança e vigilância em ambientes nocturnos, bares e discotecas, iniciando consumos de cocaína e outras substâncias estupefacientes em pastilhas;

Na sequência de problemas, designadamente financeiros, o casal acabou por se divorciar, ficando o arguido a habitar na casa de morada de família;

O arguido estabeleceu entretanto mais duas relações amorosas, as quais já terminaram;

À data da prisão no âmbito do actual processo, o arguido vivia em casa própria e encontrava-se laboralmente activo numa empresa de segurança/vigilância;

Não mantinha consumos abusivas de álcool e/ou drogas, dedicam dose, nos seus tempos livres, ao desporto, frequentando o ginásio e Kickboxing;

Em termos futuros, perspectiva vir a arrendar uma habitação para viver de fornia autónoma e vir a trabalhar no ramo automóvel;

No estabelecimento prisional o arguido apresenta um comportamento e uma postura adaptados, não registando sanções disciplinares, encontrando-se a trabalhar na biblioteca;

Durante a reclusão recebe visitas dos familiares, mãe, tia e irmãos, bem como da ex-mulher e filha;

A Equipa que elaborou o relatório social do arguido conclui que «CC registou um processo de socialização, no agregado familiar de origem num ambiente caracterizado como estável e estruturante e com medianas condições sacio-económicas.

No plano pessoal, apresenta um discurso afável mas elaborado e manipulador, esforçando-se por apresentar uma imagem de si equilibrada e ajustada aos valores da sociedade que integra, valorizando a autonomia económica e os bens materiais, revelando reduzido juízo crítico e dificuldades de auto-análíse, justificando os seus comportamentos com as necessidades económicas e o ambiente nocturno onde trabalhava,

Ao nível relacional e afectivo, evidencia sinais de impulsividade e dificuldades de auto-controle em situações de tensão emocional.

Neste contexto, consideramos que o processo de reinserção social consistente e adequado do arguido terá necessariamente de passar por um investimento do próprio na realização de uma profunda interiorização das suas fragilidades e de consciência crítica dos seus comportamentos e, consequentemente, no seu empenho na aquisição de melhores competências pessoais que compensem tais défices»; Por acórdão de 14-06-2005, transitado em julgado em 14-07-2005, proferido no âmbito do Proc, Comum Colectivo, n.º 30/03…, que correu termos na … Vara Criminal de …., … Secção, foi o arguido condenado, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p, e p. pelo art. 21 ° do DL 15/93 de 22-01, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão, cuja execução foi suspensa pelo período de 3 (três) anos; Por acórdão de 30-05-2013, transitado em julgado em 01-07-2013, proferido no âmbito do Proc. Comum Colectivo, nº 1838/10…, que correu termos no Juízo de Média Instância Criminal de …, ….. Secção, Juiz …., foi o arguido condenado, pela prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art. 152.°, n.º 1, al. a), do CPenal, cometido em 15-11-2010, na pena de 14 (catorze) meses de prisão, cuja execução foi suspensa por igual período;

(…)”



III

Fundamentação

A

Questões Prévias e

Thema decidendum



1. É consensual o entendimento de que, sem prejuízo do conhecimento oficioso de certas questões legalmente determinadas – arts. 379, n.º 2 e 410, n.º 2 e 3 do CPP – é pelas Conclusões apresentadas em recurso que se recorta ou delimita o âmbito ou objeto do mesmo (cf., v.g., art. 412, n.º 1, CPP; v. BMJ 473, p. 316; jurisprudência do STJ apud Ac. RC de 21/1/2009, Proc. 45/05.4TAFIG.C2, Relator: Conselheiro Gabriel Catarino; Acs. STJ de 25/3/2009, Proc. 09P0486, Relator: Conselheiro Fernando Fróis; de 23/11/2010, Proc. 93/10.2TCPRT.S1, Relator: Conselheiro Raul Borges; de 28/4/2016, Proc. 252/14.9JACBR., Relator: Conselheiro Manuel Augusto de Matos).


2. Nada parece obstar, prejudicialmente, liminarmente e em abstrato, ao conhecimento do recurso.


3. A questão levantada pelo Recorrente funda-se na alegação de que deve ser concedida a revisão do acórdão da Relação ……… de 15-12-2016 que julgou as nulidades (por omissão de pronúncia) do acórdão do Tribunal da Relação …….. de 21-04-2016 (e de 30-06-2016) e, consequentemente decidiu julgar o recurso do arguido AA não provido, com fundamento no art. 449, n.º 1, als. b) e d) do CPP.


4. Para o efeito, fundamenta que o recorrente teve acesso a novos factos que suscitam graves dúvidas sobre a sua condenação, por causa da prolação da Acusação do Processo n.º 19/16… (vulgarmente designado por ……), em que, nos seus artigos 2318 e 2319, os arguidos NN e OO são acusados de esta redigir, em nome daquele, o último dos acórdãos proferidos, nos presentes autos, pelo Tribunal da Relação, no dia 15 de Dezembro de 2016, pelo que o Magistrado a quem cabia a elaboração do Acórdão que dirimia as questões de nulidades invocadas, de extrema importância, não terá sido, assim, o responsável pela mesma, e ao não ter sido o Juiz competente a elaborar o acórdão, mas sim outra pessoa que se fez passar por ele com a sua anuência, retiraria toda a confiança de que as questões foram analisadas de forma isenta e justa.


5. Por último, alega que, apesar de a prova ora conhecida constar de uma peça processual não provada, nem tão pouco transitada em julgado, para os factos em causa serem dados como provados, a final, implica um longo e demorado processo que poderá levar anos a ser decidido, que tais anos são essenciais para o recorrente, atendendo que este se encontra em cumprimento de pena, correndo-se o risco de, quando dados como provados os factos, já o arguido ter cumprido a sua pena na íntegra, considerando que esperar pelo trânsito em julgado de factos que constam na referida acusação, faz perder a toda a utilidade do presente recurso de revisão de sentença, e entendendo assim dever-se suspender a execução da pena do requerente nos termos do artigo 457, n.º 2 do Código de Processo Penal.



B

Regime Jurídico do Recurso



1. Previamente, importa fazer uma brevíssima panorâmica do regime jurídico do recurso de revisão em apreço.

O recurso extraordinário de revisão de sentença tem a sua tramitação processual prevista nos arts 449 e ss. do CPP.

Assim, elencando de forma taxativa, os fundamentos da revisão pro societate e pro reo, prevê o art. 449, n.º 1, do CPP, que a revisão de sentença transitada em julgado é admissível quando:

a) uma outra sentença transitada em julgado tiver considerado falsos os meios de prova que tenham sido determinantes para a decisão (consiste na fabricação de meios de prova documentais e/ou manipulação de depoimentos invocados na fundamentação da decisão da matéria de facto de forma decisiva);

b) uma outra sentença transitada em julgado tiver dado como provado crime cometido por juiz ou jurado relacionado com o exercício da sua função no processo;

c) os factos que servirem de fundamento à condenação forem inconciliáveis com os dados como provados noutra sentença e da oposição resultarem graves dúvidas sobre a justiça da condenação (são os factos que permitiram a imputação do crime e a determinação das penas sancionatórias do comportamento ilícito);

d) se se descobrirem novos factos ou meios de prova que de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo, suscitem dúvidas sobre a justiça da condenação (são aqueles factos que eram, justificadamente, desconhecidos ou ignorados pelo recorrente ao tempo do julgamento e por isso não puderam ser apresentados antes deste);

e) se descobrir que serviram de fundamento à condenação novas provas proibidas nos termos dos n.°s 1 a 3 do artigo 126.°;

f) seja declarada, pelo Tribunal Constitucional, a inconstitucionalidade com força obrigatória geral de norma de conteúdo menos favorável ao arguido que tenha servido de fundamento à condenação;

g) uma sentença vinculativa do Estado Português, proferida por uma instância internacional, for inconciliável com a condenação ou suscitar graves dúvidas sobre a sua justiça.”

Por sua vez, o n.º 3 daquele normativo estabelece de forma expressa a inadmissibilidade da revisão com fundamento na alínea d) do n.º 1, quando o único fim seja corrigir a medida concreta da sanção aplicada. Tal como refere este Tribunal no acórdão de 05-02-2020[1]

No nosso regime, pressuposto negativo da revisão amparada na invocação de novos factos ou meios de prova, é que não tenha como fim único corrigir a medida concreta da sanção aplicada. O que bem se compreende porquanto a dosimetria da pena é uma típica questão de direito e o recurso de revisão está concebido como remédio para emendar flagrantes e graves erros quando se constata que existe insuficiente conhecimento da totalidade da realidade histórica, a decisão em matéria de facto.”.


2. Pode ser objeto de revisão qualquer sentença penal, singular ou colegial, desde que transitada em julgado, bem como, qualquer despacho que tenha posto fim ao processo crime.


3. Os fundamentos do recurso de revisão previstos nas als. a) e b) têm na sua base considerações de ordem pública, pelo que se podem designar de fundamentos pro societate.

Nos demais, o fundamento tem em vista a proteção do condenado contra situações de erro judiciário clamoroso, por isso se considerando fundamentos pro reo.


4. Nos termos do art. 451 do CPP, prevê-se a instância onde deve ser apresentado o pedido (n.º 1), e a forma como o mesmo deve ser formulado, devendo constar do requerimento a exposição dos fundamentos da revisão e a indicação dos meios de prova que a suportam (n.º 2), assim como a indicação dos documentos que devem instruir o requerimento, ou seja, cópia certificada da decisão revidenda com indicação do trânsito em julgado (n.° 3).


5. O recurso de revisão é um regime excecional que restringe o princípio da intangibilidade do caso julgado que deriva do princípio da segurança jurídica e da proteção da confiança inerentes a qualquer Estado de Direito, em nome da salvaguarda das exigências de justiça e da verdade material.

Porém, o princípio res judicata pro veritate habetur, é um princípio de utilidade e não de justiça (que, precisamente, além de princípio, é ainda um mais alto Valor) e assim não pode impedir a revisão de sentença, quando haja fortes elementos de convicção de que a decisão proferida não corresponde em matéria de facto à verdade histórica que o processo penal quer e precisa em todos os casos alcançar[2].

Como bem explica Maia Gonçalves, procura-se

"[…] uma solução de compromisso entre o interesse de dotar de firmeza e segurança o acto jurisdicional e o interesse de que não prevaleçam as sentenças que contradigam ostensivamente a verdade, e através dela, a justiça, solução que se revê na consagrada possibilidade limitada de revisão de sentenças penais […]"[3].

Tal recurso enquanto meio processual especialmente vocacionado para reagir contra clamorosos e intoleráveis erros judiciários ou casos de flagrante injustiça, tem consagração constitucional no art. 29, n.º 6 da CRP, na medida em que ali se prevê que os cidadãos injustamente condenados têm direito, nas condições que a lei prescrever, à revisão de sentença e à indemnização pelos danos sofridos. No mesmo sentido, no art. 4.º, n.º 2, do protocolo adicional n.º 7 à CEDH prevê-se que a descoberta de factos novos ou recentemente revelados ou a existência de um vício fundamental anterior permitem a reabertura do processo, nos termos da lei e do processo penal do Estado em causa, constituindo tal regime uma exceção ao caso julgado que visa a salvaguarda do direito à liberdade e do direito a uma condenação justa de acordo com as regras constitucionais e do processo penal.

O recurso de revisão apenas pode ser admitido excecionalmente, em casos em que se evidencie ou, pelo menos, se indicie com uma probabilidade muito séria a injustiça da condenação. Qualificado como extraordinário, é um recurso com regime processual e substantivo próprios, sendo que

“[…] do carácter excepcional deste recurso extraordinário decorre necessariamente um grau e exigência na apreciação da respectiva admissibilidade, compatível com tal incomum forma de impugnação, em ordem a evitar a vulgarização, a banalização dos recursos extraordinários […]"[4].

O recurso extraordinário de revisão não tem por objecto a reapreciação do anterior julgado, pois não consubstancia uma fase normal de impugnação da sentença penal. É um procedimento excepcional e extraordinário que visa a realização de um novo julgamento com base em algum dos fundamentos indicados no n.º 1 do art. 449.ºdo CPP: "A revisão tem a natureza de um recurso, em regra, sobre a questão de facto. Não se trata de uma revisão do julgado, mas de um julgado novo sobre novos elementos de facto."[5].

Destarte, só circunstâncias “substantivas e imperiosas” devem permitir a quebra do caso julgado, de modo a que este recurso extraordinário não se transforme numa ‘apelação disfarçada[6].



C

Do Caso em Apreço



1. O recorrente, no introito da sua peça recursória, expressamente salienta que “vem, nos termos da al. d) do n.º 1 do art. 449.º do CPP, requerer revisão de sentença”.

Todavia, se atentarmos às Conclusões de recurso, verificamos que, pese embora no introito venha pedir a revisão de sentença, o pedido de revisão incide sobre um acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa datado de 15-12-2016 [cfr. conclusão f)], que conheceu de nulidades por omissão de pronúncia suscitadas, relativamente ao acórdão proferido em sede de recurso, pelo Tribunal da Relação de Lisboa datado de 21-04-2016 (e de 30-06-2016).

Resulta das pp. 108 e ss. do acórdão de 15-12-2016 – que julgou o recurso do arguido AA não provido – que os arguidos AA e BB alegam que o acórdão omitiu pronúncia sobre a impugnação da prova - impugnação da prova/factos dados como provados nos pontos 30 a 50, 55, 67 a 69 e sobre a perda dos bens a favor do Estado Português. Este acórdão conheceu de ambas as questões, tendo relativamente à impugnação da referida matéria de facto, considerado que o Tribunal de 1.ª Instância fez uma correta, ponderada e adequada apreciação da prova, estando corretamente julgada a factualidade dada como provada.


2. Posto isto, constata-se que, in casu, não estamos perante um pedido de revisão de uma sentença/acórdão propriamente dito, proferido pelo Tribunal de 1.ª Instância, mas sim perante um acórdão, proferido em sede de recurso, pelo Tribunal da Relação que conheceu de nulidades (por omissão de pronúncia) de um outro acórdão, também ele proferido em sede de recurso, pelo Tribunal da Relação …….

.

Todavia, entendemos que um Acórdão da Relação quando é chamado a julgar a matéria de facto dada como provada e não provada pela sentença anteriormente proferida em primeira instância, obedecendo aquele acórdão, proferido em sede de recurso, aos preceitos previstos nos arts. 372, 380, 379 e 425, todos do Código de Processo Penal, integra, nessa perspetiva, o conceito de sentença (em sentido amplo), para efeitos de admissibilidade de pedido de revisão.

No caso, temos como certo que o acórdão objeto de pedido de revisão, apenas se circunscreve à apreciação de nulidades por omissão de pronúncia do acórdão anteriormente proferido pelo Tribunal da Relação. Contudo, o conhecimento dessa nulidade por omissão de pronúncia refere-se a impugnação da matéria dada como provada pelo Tribunal de 1.ª Instância – impugnação dos factos provados n.ºs 30 a 50, 55, 67 a 69 – cuja matéria foi apreciada e decidida no acórdão de 15-12-2016.


3. Um acórdão que conhece e decide de uma nulidade suscitada (omissão de pronúncia sobre a impugnação da matéria de facto provada), relativamente a um acórdão anteriormente proferido, é um complemento desse anterior acórdão e faz parte integrante daquele.


4. Contudo, sempre se dirá que a existir fundamento para autorizar a revisão, apenas se poderá circunscrever ao acórdão que se pretende a revisão, ou seja, às questões tratadas no Acórdão da Relação (de 15-12-2016).

Concorda-se com o parecer da Senhora Procuradora Geral Adjunta quando refere que

Acresce que, ainda que existisse fundamento e fosse autorizada a revisão, dessa autorização não decorria a invalidade da decisão condenatória, mas apenas o início da “fase do juízo rescisório”, ou seja, a apreciação por outro Tribunal da Relação das questões objecto do acórdão a rever, podendo essa apreciação determinar ou não a alteração da decisão sobre a sua condenação”.


5. Também entendemos que relativamente à tramitação do referido processo ter corrido no Tribunal da 1.ª Instância e não no Tribunal da Relação, atentos os motivos invocados (evitar demoras na tramitação) na informação a que alude o art. 454 do CPP, e dado que nenhum direito do arguido foi restringido, entendemos que inexiste qualquer irregularidade na tramitação do presente recurso de revisão.


6. O recorrente invoca como fundamentos da revisão os previsto na al. b) e d), do n.º 1, do referido art. 449, do CPP.

Comecemos pela análise da al. b) do n.º 1 do art. 449 do CPP.

De acordo com o art. 449, n.º 1, al. b) do CPP:

A revisão de sentença transitada em julgado é admissível quando uma outra sentença transitada em julgado tiver dado como provado crime cometido por juiz ou jurado e relacionado com o exercício da sua função no processo.”

O recurso de revisão representa, a procura do ponderado e adequado equilíbrio entre dois importantes vetores constituintes e estruturantes do sistema jurídico ou ordem jurídica vigente: a estabilidade da decisão derivada do caso julgado e as exigências de justiça. E por isso, é apenas admissível em casos muito específicos, taxativamente previstos no art. 449, do CPP e impõe o preenchimento claro dos seus pressupostos.

Dado que os fundamentos da revisão previstos no art. 449 do CPP são taxativos, não são consentidas leituras elásticas dos mesmos.  Conforme resulta do acórdão do STJ de 18-09-2007[7]

IV - Sendo taxativos os fundamentos da revisão extraordinária das decisões, por contender com o nuclear princípio da intangibilidade do caso julgado, que só consente as excepções previstas na lei, a interpretação elástica desses fundamentos é vedada ao julgador, sob pena de subversão daquele princípio, podendo abrir portas à incerteza e segurança das decisões judiciais transitadas.” E no mesmo sentido Acórdão do STJ de 07-04-2011[8] “II - Interpretação mais ampla deste preceito constituiria uma infracção ao princípio do processo equitativo do art. 20.º, n.º 4, da CRP, bem como ao princípio da confiança ali previsto.”

E o legislador foi claro e exigente quanto aos fundamentos pro societate, ou seja, os previstos nas als. a) e b), convocando que os mesmos têm que estar dados como provados por sentença transitada em julgado.


7. Para a situação que ora nos ocupa – al. b) do n.º 1 do art. 449 do CPP – importa realçar que os tribunais são órgão de soberania (cf. art.110, n.º 1 da CRP) e que os juízes, enquanto titulares desse órgão de soberania, administram a justiça em nome do povo (cf. art. 202. da CRP) e são independentes e apenas devem obediência à lei (cf. art. 203 da CRP). Face a tais prerrogativas, está subjacente à função jurisdicional uma confiança pública na independência e na isenção do poder judicial. Só mediante uma decisão definitiva (transitada em julgado) que condene um Juiz por um crime cometido no exercício da sua função no processo, é que essa confiança pública pode e deve ser afetada. Estamos assim perante uma exigência qualificada.


8. No caso, o recorrente pretende a revisão do acórdão da Relação de 15-12-2016 – com este acórdão tornou-se definitiva a confirmação da sua condenação pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes agravado – com base na circunstância de ter sido deduzida acusação contra o Juiz …. que subscreveu o referido acórdão [que conheceu da arguição de nulidades que o arguido AA havia suscitado quanto ao acórdão de 21-04-2016 (e 30-06-2016)], acusação essa em que lhe são imputados factos de que resultará não ter sido o próprio a redigir o texto daquele acórdão, mas apenas o tendo assinado.

Todavia, estamos apenas perante factos indiciados numa acusação e não com factos provados por sentença transitada em julgado.

Como refere Pereira Madeira[9] “o fundamento referido na alínea b) só releva como fundamento de revisão quando provado (...) por sentença transitada em julgado, já que não poderá ser aceite de ânimo leve uma alegada prevaricação do ou dos julgadores, afinal uma suspeita que afectará o cerne da confiança pública sem a qual não há sistema de justiça aceitável”.

No mesmo sentido Simas Santos[10] quando refere que “No dolo de julgamento incluiu-se o comportamento criminosa do julgador (juiz ou jurado). Assim acontece quando a decisão a rever tenha sido proferida, v.g. por corrupção, concussão ou abuso de poder e haja uma sentença transitada em julgado.”

E ainda com o mesmo ensinamento para o recurso de revisão (em matéria civil), veja-se Luís Correia de Mendonça e Henriques Antunes[11] “(…) deve-se começar por instaurar no competente tribunal processo crime contra o juiz, e, só depois do trânsito em julgado da respetiva sentença condenatória, se proporá no cível o recurso de revisão”

Ou seja, é pressuposto obrigatório e imprescindível para a autorização da revisão com fundamento na al. b) do n.º 1 do art. 449 do CPP, a existência de sentença (criminal) transitada em julgado que dê como provado crime cometido por Juiz relacionado com o exercício das suas funções no processo.

Tem-se clara consciência de que esta al. b) do n.º 1 do art. 449 do CPP tem subjacente acautelar “o prestígio dos órgãos de administração da justiça: sobre a sua seriedade não pode pairar nenhuma suspeita. Para além do direito fundamental à revisão da sentença penal condenatória injusta (art. 29.º, n.º 6, da CRP) estaria, aqui, também em causa a confiança pública na independência e na isenção do poder judicial. O Estado não poderia permitir a manutenção de uma sentença suspeita de ser o fruto de um crime cometido pelo juiz no exercício das suas funções.”[12]

Todavia, para além do que supra mencionámos, a exigência de sentença transitada em julgado, que condene o Juiz em crime relacionado com o exercício da sua função no processo, também se impõe face ao princípio de presunção de inocência do arguido, in casu, do Juiz … NN, constitucionalmente consagrado no art. 32., n.º 2, do CRP[13]

Pois não se pode abalar a força de um caso julgado condenatório, in casu, do arguido AA, quando, na outra face (do outro lado, no outro prato da balança), na presente data, temos um arguido (Juiz ……) que se presume inocente quanto à prática do crime de abuso de poder (crime relacionado com o exercício da sua função no processo).

Importando o recurso de revisão o “sacrifício” do caso julgado, da estabilidade das decisões transitadas - corolário da segurança jurídica -, só deve ceder quando também, do outro lado da balança, se consolide uma outra realidade com idêntica segurança jurídica. Por tal motivo, o legislador exige nos casos das als. a) e b) do n.º 1 do art. 449. do CPP, a existência de uma sentença transitada em julgado.

Só a sentença transitada em julgado que dê como provado crime cometido por Juiz e relacionado com o exercício da sua função no processo, e não factos indiciados da prática desse crime, é que revelam a segurança jurídica exigível para abalar o trânsito em julgado de uma sentença condenatória, in casu, do arguido AA.

           

9. O que temos na presente data, são factos indiciados numa acusação. O arguido ainda não exerceu o contraditório sobre os mesmos, nomeadamente carreando para os autos outra versão, outros contornos e circunstâncias em que os mesmos possam ter ocorrido.

Para se consentir a revisão, na presente data, como pretendido pelo arguido/recorrente AA, ter-se-ia que presumir que os factos ocorreram nos termos constantes na acusação. Todavia, esta presunção é claramente violadora do princípio da presunção de inocência, relativamente ao arguido Juiz ……. NN.


10. O princípio da estabilidade e segurança jurídica de ambas as situações – da decisão a rever, por um lado, e decisão que servirá de fundamento para rever, por outro – impõe que tenhamos que estar perante uma sentença transitada em julgado que condene um Juiz por um crime praticado no exercício da sua função no processo. Tal é conditio sine qua non.


11. Defende o arguido que dadas as delongas dos processos-crimes e uma vez que está a cumprir a pena a que foi condenado, pode estar esgotado o efeito útil do recurso de revisão se se aguardar pela sentença (transitada em julgado) do Processo …..

É verdade que há processos longos e demorados e que a sentença transitada em julgado do Processo ….., poderá eventualmente vir a demorar anos. Laboramos, porém, apenas, como é óbvio, no plano das hipóteses, nesta asserção.

Todavia, o que importa para a apreciação do recurso, antes de tudo, é outra ordem de razões, não hipotéticas (mesmo que se eventualmente “plausíveis” – quem sabe!?), mas de facto.

Por um lado, não podemos, na presente data, presumir que o arguido (Juiz …………) vai ser condenado, com vista a antecipar a utilidade de um recurso de revisão. Tal equivaleria a uma gravíssima presunção da condenação, substituição ao curso natural do processo, enfim, a um rol de violações de lei e de princípios.

E por outro lado, a questão nunca cairá num limbo de não-decisão nem de não prestação de Justiça. Pois a revisão é admissível ainda que, no limite, a pena se viesse a encontrar cumprida (cf. art. 449, n.º 4, do CPP). Mas estamos já no domínio das antevisões. Não se podendo julgar por antecipação ou futurologia relativamente a situações que impõem pressupostos de prova existentes no momento em que se opera o julgamento.


12. Acresce que, ao contrário do que faz crer o recorrente, a autorização da revisão não implica automaticamente a libertação do condenado (que se encontre a cumprir pena). Pois não pode ser olvidado que, de acordo com o art. 457, n.º 2, do CPP, em caso de autorização da revisão e o condenado se encontrar a cumprir pena de prisão, caberá ao Supremo Tribunal de Justiça decidir, em função da gravidade da dúvida sobre a justiça da condenação, se a execução da pena deve ser suspensa.

Ou seja, ainda que a revisão seja autorizada, o arguido poderá continuar a cumprir a pena a que foi condenado, por se entender que a gravidade da dúvida sobre a justiça da condenação não é de tal forma premente que justifique a libertação imediata do condenado.


13. Há, assim, dois juízos autónomos: um juízo para a autorização da revisão (cf. fundamentos do n.º 1 do art. 449 do CPP); e outro juízo para a suspensão da execução da pena (cf. n.º 2 do art. 457 do CPP).

Quer isto dizer que o efeito útil pretendido pelo arguido com o presente recurso de revisão (suspensão da execução da pena) – acaso fosse concebível (que não é) prescindir da exigência de sentença transitada em julgado que condene o Juiz em crime cometido no exercício de funções no processo – também estava dependente dessa ponderação (da gravidade da dúvida sobre a condenação).


14. Na resposta ao parecer do Ministério Público (art. 417, n.º 2, do CPP), o recorrente alega que “o último acórdão, aquele que pôs termo ao processo, não terá sido elaborado pelo Magistrado responsável pela sua elaboração, o que levanta sérias dúvidas acerca da estabilidade e segurança confiada à Justiça.” e que “Daí se entenda que, até trânsito do processo ……, sempre deverá o arguido aguardar os seus termos com a execução da sua pena suspensa, conforme previsto no artigo 457.º, n.º 2 do CPP”

Porém, o art. 457, n.º 2 do CPP só se aplica nas situações em que foi autorizada a revisão. E inexistem revisões autorizadas condicionalmente, ou seja, in casu, não se pode autorizar a revisão do acórdão até se decidir por sentença transitada em julgado o processo …… .

Os pressupostos da revisão têm de estar preenchidos no momento em que a mesma é apreciada e decidida. Não se pode autorizar uma revisão sob condição e suspender a execução da pena sob condição.

Por tudo o que atrás se expos, conclui-se que não se verifica o fundamento de revisão, previsto no art. 449, n.º 1, al. b), do CPP.


15. Conforme supra referimos, no introito do seu recurso, o arguido chama também à colação a al. d) do n.º 1 do art. 449.º do CPP, alegando nas conclusões de recurso (al. c) que “Recentemente, o arguido teve acesso a novos factos que suscitam graves dúvidas sobre a sua condenação”.

Este novo facto a que o arguido teve acesso é a circunstância de ter sido deduzida acusação contra o Juiz … que subscreveu o referido acórdão de 15-12-2016 [que julgou as nulidades (por omissão de pronúncia) do acórdão de 21-04-2014 (e de 30-06-2016), julgando não provido o recurso do arguido AA], acusação essa em que lhe são imputados factos de que resultará não ter sido o próprio a redigir o texto daquele acórdão, mas apenas o tendo assinado.

Verifica-se assim que o mesmo facto é utilizado para fundamentar o recurso de revisão, nos termos da al. b) e nos termos da al. d) do n.º 1 do art. 449 do CPP.

O que o recorrente está a fazer, laborando em confusão de fundamentos, é invocar o fundamento subjacente à revisão, previsto na al. b) do n.º 1 do art. 449 do CPP – o alegado cometimento pelo Juiz de crime relacionado com o exercício da sua função no processo, mas dado que não possui sentença transitada em julgado, fá-lo por via ínvia [chamando também à colação o fundamento na al. d)].

Porém, só há lugar a fundamento de revisão de sentença, com base em crime cometido por Juiz relacionado com o exercício da função no processo, se o crime cometido for provado por sentença (criminal) transitada em julgado. Como parece evidente, à luz das leis e dos princípios que as regem. O contrário abalaria o próprio Estado de Direito.

A condenação de Juiz na prática de um crime, a existir, tem de ser declarada pelo meio próprio, uma sentença transitada em julgado, dado que, nestas situações, por razões facilmente apreensíveis e que acima se referiram, a exigência do legislador é qualificada.

Ou seja, enquanto não for dado como provado por sentença (criminal) transitada em julgado o cometimento de crime por Juiz (relacionado com a sua função no processo), não há lugar a fundamento de revisão de sentença - como impõe o art. 449, n.º 1, al. b), do CPP.


16. No caso, estamos apenas perante factos indiciados, constantes de uma acusação – e não perante factos definitivamente dados como provados, por sentença criminal transitada em julgado – de cometimento, pelo Juiz, de crime relacionado com o exercício da sua função no processo. Uma acusação não prova que o arguido (in casu, o Juiz …. NN) cometeu o crime. Apenas uma sentença (criminal) transitada em julgada prova a existência do crime.


17. Neste contexto, também não há graves dúvidas sobre a justiça da condenação.

Veja-se neste sentido, mutatis mutandis, o seguinte Acórdão do STJ 18-02-2021, Proc. n.º 274/16.5GAMCN-D.S1 - 5.ª Secção (Relator: Conselheiro António Gama)[14]:

“II - A pretensão do recorrente de provar, através de testemunhas, que o depoimento da ofendida que serviu de base à condenação, era falso, é um meio inidóneo para provar a falsidade de um depoimento em audiência de julgamento. III - Só há lugar à revisão da sentença, com base em falsidade de depoimento, se a falsidade resultar de uma outra sentença transitada em julgado. IV - Consequentemente, não é de admitir o pedido como invocação de novos factos e novos meios de prova, quando o que está em causa é à alegação de que a vítima mentiu em julgamento. O que o recorrente está a fazer, com uma patente troca de etiquetas, é invocar a falsidade do meio de prova produzido no julgamento, mas fá-lo por via ínvia, sem juntar certidão da sentença onde tal falsidade tenha sido declarada. Essa falsidade, a existir, tem de ser declarada pelo meio próprio, uma sentença transitada em julgado, dado que, nestas situações, por razões facilmente apreensíveis, a exigência do legislador é qualificada. “


18. Por tudo o que se expôs, entende-se que a pretensão do recorrente não tem fundamento legal, face às exigências de Justiça que subjazem ao recurso de revisão.



IV

Dispositivo,



Termos em que, decidindo em conferência, a 3.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça acorda julgar improcedente o recurso, negando a revisão.


Custas pelo Recorrente.

Taxa de Justiça: 3 UCs


Supremo Tribunal de Justiça, 5 de maio de 2021


Ao abrigo do disposto no artigo 15.º-A da Lei n.º 20/2020, de 1 de maio, o relator atesta o voto de conformidade da Ex.ma Senhora Juíza Conselheira Adjunta, Dr.ª Maria Teresa Féria de Almeida.


Dr. Paulo Ferreira da Cunha (Relator)

Dr.ª Maria Teresa Féria de Almeida (Juíza Conselheira Adjunta)

Dr. António Pires da Graça (Juiz Conselheiro Presidente)


_________

[1] Acórdão proferido no Proc. n.º 3741/15.4JAPRT-D.P1.S1 (Relator: Conselheiro Nuno Gonçalves), disponível em www.dgsi.pt.
[2] Pereira Madeira, in ‘Código de Processo Penal Comentado’, 2.ª edição, Coimbra, Almedina, 2016, p. 109.
[3] In “Código de Processo Penal Anotado e Comentado”, 15.a edição, Coimbra, Almedina, 2005, pp. 918 e 919.
[4] Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27-11-2019, proferido no Proc. n.º 209/17.8T8VVD-B.S1 - 3.ª Secção (Relator: Conselheiro Raúl Borges),  com sumário disponível em www.stj.pt/Jurisprudência/ Acórdãos/Sumários de acórdãos/ Criminal – Ano de 2019.
[5] Pereira Madeira, op. cit. supra, p. 1507.
[6] Pinto de Albuquerque, Paulo in “Comentário do Código de Processo Penal à Luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem”, Lisboa, Universidade Católica Editora, 2008, 2.ª edição atualizada, p. 1196.
[7] Revista n.º 2203/07 - 6.ª Secção (Relator: Fonseca Ramos), disponível in www.dgsi.pt.
[8] Agravo n.º 1242-L/1998.P1.S1 - 2.ª Secção (Relator: Bettencourt de Faria), disponível in www.dgsi.pt.
[9] In “Código de Processo Penal Comentado”, 2.ª edição, Coimbra, Almedina, 2016, em anotação ao art. 449, p. 1508.
[10] E Manuel Leal-Henriques in Recursos Penais, 9.ª Edição, Lisboa, Rei dos Livros, p. 242.
[11] In Dos recursos (regime do DL n.º 303/2007, de 24-08), Lisboa, Quid juirs, p. 341.
[12] João Conde Correia in “Mito do caso julgado e a revisão propter nova”, Coimbra, Coimbra Editora, 1.ª edição, dezembro de 2010, p. 486.
[13] Art. 32.º, n.º 2 da CRP: “Todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação, devendo ser julgado no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa.”
[14] Disponível in www.dgsi.pt.