Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 7.ª SECÇÃO | ||
Relator: | FÁTIMA GOMES | ||
Descritores: | AÇÃO EXECUTIVA ADMISSIBILIDADE DE RECURSO RECURSO DE REVISTA DUPLA CONFORME FORMAÇÃO DE APRECIAÇÃO PRELIMINAR | ||
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Data do Acordão: | 07/06/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | NEGADA | ||
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Sumário : | Sendo aplicável o art.º 854.º do CPC e estando impedida a revista, ao abrigo do art.º 671.º, n.º2 do CPC, a dupla conformidade que ocorra não permite a remessa à formação. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça
I. Relatório A – Em 2 de Junho de 2023 a relatora proferiu o seguinte despacho-convite (transcrição) “Despacho 1. UNICRE – INSTITUIÇÃO FINANCEIRA DE CRÉDITO, S.A., Exequente nos autos, não se conformando com o Acórdão proferido no dia 27 de janeiro de 2023, veio dele interpor recurso de revista excepcional, nos termos conjugados dos artigos 671.º, 672.º n.º 1 alínea a), 674.º n.º 1 alínea a), 675.º e 676.º do CPC, formulando as seguintes conclusões (transcrição): A. O presente recurso de revista, tem por fundamento a violação de lei substantiva e a errada aplicação da lei de processo, pelo que deve considerar-se preenchidos os pressupostos de que depende a sua admissibilidade (artigos 674º alínea a), 675º n.º 1 e 676º, todos do CPC), concretamente no que concerne à interpretação e aplicação do n.º 8 do artigo 751.º do CPC e demais normas legais relativas à prestação espontânea de caução. B. No caso em apreço a Recorrente considera que foi feita pelo Tribunal da Relação uma interpretação errónea das mais diversas normas legais relativas à prestação espontânea de caução. Concretizando, C. O Tribunal da 1.ª Instância e o Tribunal recorrido consideraram que a caução a prestar pelo Executado deve ter conta o valor do bem penhorado cuja substituição requer, e não, como pretende a exequente, o valor da quantia exequenda – e é com este entendimento que a Recorrente não se conforma. D. Com efeito, o valor da caução a prestar (quando substitutiva de penhora realizada nos autos) não poderá ser aferido com base no valor aposto pelo Agente de Execução, no Auto de Penhora do imóvel penhorado e que corresponde ao valor patrimonial tributável do mesmo. E. Principalmente quando este valor está absolutamente desconforme considerando a área do imóvel e os valores do mercado imobiliário atuais. F. Se a caução para substituição da penhora visa a garantia da dívida exequenda, dúvidas não subsistem que a caução a prestar só será idónea se tiver por referência o montante do crédito exequendo e acessórios, incluindo os juros que, em estimativa, se preveja que venham a vencer em resultado da paragem do processo executivo. G. Só assim o princípio da proporcionalidade e da adequação serão respeitados. H. No âmbito dos presentes autos, o Executado deduziu incidente de prestação espontânea de caução, oferecendo uma garantia bancária à primeira solicitação, no montante de €30.000,00 (trinta mil euros) tendo em vista a substituição das penhoras efetuadas no âmbito dos presentes autos. I. Designadamente, para a substituição da penhora do prédio misto, sito no Vale de ..., ..., parte urbana composta por casa de habitação de r/chão com nove dependências e um corredor e secção rústica composta por cultura arvense de sobreiros, oliveiras, pinhal, dependências agrícolas, terreno estéril, horta e cultura arvense de regadio – descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º 229 da freguesia ..., inscrito na matriz urbana sob o artigo n.º 177 e matriz rústica sob o artigo n.º 1, secção N, ambos da freguesia ..., concelho ..., registada pela AP. 2500 de 2022/04/18. J. Aquando da penhora do aludido imóvel, o Sr. Agente de Execução elaborou o respetivo auto de penhora, tendo imputado – no campo 14 do aludido auto – o montante de €38.336,27 ao imóvel penhorado. K. Exercendo o seu legal direito, deduziu a Exequente a competente Oposição ao Incidente de Prestação Espontânea de Caução, impugnando e opondo-se à aceitação, pelo Tribunal a quo, como idónea a garantia bancária apresentada pelo Executado, atenta a manifesta insuficiência do montante a caucionar. L. Porquanto, a garantia bancária apresentada pelo Executado tinha como limite máximo o montante de €30.000,00 (trinta mil euros) quando, de acordo com a nota justificativa provisória elaborada pelo Sr. Agente de Execução em 27-05-2022, naquela data, o total da quantia exequenda (capital em dívida acrescido dos respetivos juros e despesas prováveis) ascendia a € 55.870,96 (cinquenta e cinco mil oitocentos e setenta mil euros e noventa e seis cêntimos). M. O que representa, desde logo, uma discrepância de mais de €25.000,00 (vinte e cinco mil euros) entre o montante da garantia bancária que o Executado se propôs a prestar e o total da quantia exequenda computado pelo Sr. Agente de Execução por referência a maio de 2022. N. Sucede, porém, que o Tribunal de 1.ª Instância determinou que a caução a prestar pelo Executado deveria ter em conta o valor imputado ao bem penhorado pelo Sr. Agente de Execução no auto de penhora de 18-04-2022, e cuja substituição foi requerida pelo Executado, no montante de € 38.336,27 (trinta e oito mil trezentos e trinta e seis euros e vinte e sete cêntimos). O. O Tribunal da Relação de Lisboa, no douto aresto que antecede, manteve, na íntegra, este entendimento – e é este Acórdão que é objeto do presente recurso. P. Ora, considerando que a finalidade da caução substitutiva da penhora realizada é garantir igualmente os fins da execução e que constitui um mero sucedâneo da penhora já realizada nos autos, e bem assim, tratando-se de uma caução meramente substitutiva da penhora já anteriormente realizada nos autos, o respetivo valor tem de coincidir, tão somente, com o da quantia exequenda, acrescido das despesas previsíveis da execução, que para o efeito se presumem ser dos montantes percentuais indicados no artigo735.º n.º3 do CPC, facilmente se intui que a garantia bancária proposta – e aceite pelo Tribunal a quo – não poderia ser considerada idónea, nem suscetível de representar liquidez suficiente para pagamento da dívida exequenda e demais custos prováveis e, por isso, apta a substituir a penhora realizada nos autos com o consequente levantamento da mesma. Porquanto, Q. Em conformidade com o disposto no artigo 753.º, n.º 1, do Código do Processo Civil, sempre que seja penhorado algum bem ou direito ao executado, o Agente de Execução elabora o Auto de Penhora, efetuando uma descrição sumária do bem e atribuindo-lhe um valor – o qual é meramente indicativo. R. Ora, o imóvel penhorado no âmbito dos presentes autos – cuja substituição por caução foi requerida pelo aqui Recorrido –, é um prédio misto, tendo a sua fração rústica 153,13500ha e a sua componente urbana uma área bruta de construção de 235,0000 m2, sito na freguesia ..., concelho ..., distrito .... S. Assim, não é minimamente plausível que o seu valor patrimonial ascenda somente a €40.182,64(quarenta mil cento e oitenta e dois euros e sessenta e quatro cêntimos) – valor correspondente ao somatório do valor patrimonial atual de cada um dos mencionados prédios. T. Nem tão-pouco ao montante € 38.336,27 (trinta e oito mil trezentos e trinta e seis mil euros e vinte e sete cêntimos), aposto pelo Senhor Agente de Execução no Auto de Penhora, nomeadamente no campo 14. U. Na medida em que o valor atribuído ao bem penhorado é uma mera estimativa, uma vez que, antes da venda de qualquer bem, designadamente, um bem imóvel, ele será devidamente avaliado por um avaliador credenciado para o efeito, sendo que tal avaliação ocorrerá sempre antes da venda do bem onerado com tal garantia real. V. Tratando-se, assim, de um mero juízo de prognose, mais se adensa o caráter de estimativa, e de relegação para um momento futuro do valor de um bem, pelo que não se poderia ter como vinculativo, muito menos, como elemento único a considerar na computação do valor da dívida exequenda. W. Até porque, aquele montante infere-se pelo somatório do valor patrimonial constante da caderneta predial do prédio urbano inscrito na respetiva matriz predial sob o artigo n.º 177 e do prédio rústico inscrito na respetiva matriz predial sob o artigo n.º1,secção N, sendo que o valor matricial dos bens inscritos, sem prejuízo de eventual avaliação corretiva pela Autoridade Tributária, é da responsabilidade do interessado declarante/proprietário e serve apenas fins de natureza fiscal. X. De resto, não é minimamente crível, que um imóvel com área rústica cultivável com 153,13500ha e com uma componente urbana, com uma área bruta de construção de 235,0000 m2, tenha um valor patrimonial tributável de € 38.336,27 (trinta e oito mil trezentos e trinta e seis mil euros e vinte e sete cêntimos). Y. Ademais, ainda que nenhuma das partes tivesse diligenciado pela determinação desse valor real, ao Tribunal recorrido sempre se impunha o exercício dessa tarefa, em conformidade com o disposto no artigo 411.º do CPC. Z. Neste sentido, atento a Oposição ao Incidente de Prestação Espontânea de Caução deduzido pela Exequente e aqui Recorrente, onde impugnou o valor da caução proposta e opôs-se à sua aceitação, pelo Tribunal a quo, atenta a manifesta insuficiência do montante a caucionar, incumbia, pois, ao Tribunal recorrido providenciar pelas diligências probatórias que permitissem determinar o valor real do imóvel, para, assim, se indagar acerca da suficiência ou insuficiência da caução por oferecida. AA. Constituindo a caução um meio de garantia especial das obrigações, deve a mesma, até em termos meramente semânticos, mas, também, e sobretudo técnicos, assegurar o cumprimento da obrigação garantida. BB. Confrontado com um pedido de prestação de caução cabia, pois, ao Tribunal recorrido apreciar a sua suficiência e propriedade. CC. Foi aqui que o Tribunal a quo falhou tendo, ao invés, concluído pela suficiência do montante proposto, desconsiderado, por completo, não só a desconformidade do valor patrimonial do imóvel penhorado, como também o valor apurado pelo Sr. Agente de Execução como estando em dívida em 27-05-2022. DD. No caso vertente, a prestação de caução foi requerida pelo Executado, tendo como finalidade a substituição das penhoras efetuadas nos autos. EE. Por seu turno, a Exequente deduziu oposição invocando que a garantia proposta não só é insuscetível de representar liquidez suficiente para pagamento da dívida exequenda e custos prováveis como, também, não é idónea para substituir a penhora já concretizada nos autos principais, uma vez que não é proporcional nem adequada. FF. Assim, de harmonia com o preceituado no artigo 909.º, n.º 3, do CPC, sendo impugnada a idoneidade da garantia oferecida, o Juiz profere decisão, após realização das diligências necessárias, aplicando-se o disposto nos artigos 294.º e 295.º do referido diploma legal; sendo a caução oferecida julgada inidónea, é aplicável o disposto no artigo seguinte, ou seja, devolve-se ao exequente o direito de indicar o modo de prestação da caução. GG. Acresce que, não havendo acordo quanto ao montante da garantia a prestar, em face do disposto no artigo 623.º, n.º 3, do CC, incumbe ao Tribunal ajuizar da idoneidade e suficiência da garantia prestada, sendo que, na apreciação da idoneidade terá necessariamente de se ter em conta a depreciação que os bens podem sofrer em consequência da venda forçada, bem como, as despesas que esta pode acarretar, em conformidade com o disposto no artigo 909.º, n.º 2, do CPC. HH. Em face do ora expendido, crê-se ser pacífico afirmar que, no âmbito do processo de execução, a caução prestada pelo Executado com a finalidade de obter o cancelamento da penhora do imóvel supra identificado, tem por função específica a de garantir ao credor - quanto aos riscos da substituição da garantia de pagamento, mormente os que eventualmente decorreriam da possível dissipação do seu património -, de que, sendo os embargos julgados improcedentes, o crédito do exequente possa ser tendencialmente pago pelo montante da garantia prestada. II. Questão diversa é a da avaliação da sua idoneidade na vertente da suficiência, em concreto, ou seja, se de um ponto de vista fáctico, a caução é suficiente quer numa perspetiva do seu montante quer na vertente temporal. JJ. E, conforme supra se deixou expresso, no caso em apreço, é manifesto que o montante acautelado pelo Executado não suficiente para garantir a dívida exequenda e das despesas previsíveis da execução. KK. Ademais, no âmbito dos presentes autos, após o falecimento da executada AA, a ora Recorrente deduziu contra o aqui Recorrido incidente de habilitação de herdeiros, para através deste prosseguir a ação executiva contra os herdeiros. LL. Por conseguinte, após prolação de sentença a julgar procedente o pedido de habilitação de herdeiros deduzido e, em consequência, declarado o aqui Recorrido o único herdeiro da falecida executada, determinou-se o prosseguimento da execução contra o mesmo. MM. Como é consabido, na execução movida contra o herdeiro só podem penhorar-se os bens que o mesmo tenha recebido do autor da herança, conforme consagra o artigo 744.º n.º 1 do CPC, sendo que a sua responsabilidade é a que decorre do preceituado no artigo 2071.º do Código Civil. NN. E, de acordo como o que a ora Recorrente conseguiu apurar, o único bem que o Recorrido herdou –e, portanto, que é suscetível de responder pelas dívidas da herança – é precisamente o imóvel penhorado no âmbito dos presentes autos. OO. Destinando-se a caução a obter a substituição da penhora efetuada ao supramencionado imóvel, esta substituição permitirá ao Executado manter a disponibilidade desse bem e, bem assim, onerá-lo ou aliená-lo da forma que entender, ficando, assim, a Recorrente despojada da sua maior garantia e com uma caução cujo valor (arbitrado pelo Tribunal a quo) não é suficiente para garantir o pagamento da dívida exequenda. PP. Em face do exposto, não poderia o Tribunal recorrido considerar como idónea a caução, no valor de € 38.336,27 para garantir o pagamento da quantia exequenda, a qual, em maio de 2022, se cifrava em € 55.870,96 (cinquenta e cinco mil oitocentos e setenta euros e noventa e seis cêntimos). QQ. Na verdade, o valor a caucionar deverá ser apurado na data em que a o incidente de prestação de caução for deduzido, tendo por objeto o montante da dúvida exequenda nessa data e não com base num qualquer valor que se tenha apurado – de forma indiciária, diga-se – em data anterior.” 2. No tribunal recorrido foi proferido o seguinte despacho, relativo à admissão do recurso: “Não obstante o acórdão sob sindicância seja confirmativo da decisão da 1.ª instância, o que tanto obstaria à revista (art.º 671/3) estando em tempo, atentas as razões indicadas no requerimento de interposição de revista excepcional, suportado no art.º 672/1/a, assistindo-lhe legitimidade, admite-se o recurso, cabendo ao Supremo a decisão quanto à verificação dos pressupostos da revista (art.º 671/3). Notifique e oportunamente subam os autos ao Supremo Tribunal de Justiça.” 3. Recebidos os autos no STJ, incumbe ao relator verificar se alguma circunstância obsta à admissão do recurso, nomeadamente se podem não estar cumpridos os requisitos gerais de admissão da revista – tipo de decisão, legitimidade, tempo da apresentação do recurso, valor/alçada – antes de remeter os autos à formação a que se reporta o art.º 672.º do CPC. 4. Nessa análise a relatora disse: “Analisada a situação verifica-se que os requisitos em causa estão preenchidos, apenas se verificando ocorrer dupla conforme – art.º 671.º, n.º1 do CPC: - acórdão recorrido decide do mérito da causa decidindo sobre se a penhora pode ser substituída por caução; - acórdão e sentença decidem no mesmo sentido; - acção comporta requisito da sucumbência (sucumbência aferida a partir do valor da dívida € 55.870,96 deduzida a caução prestada, que excede, assim, metade do valor da alçada do Tribunal de que se recorre); - recurso interposto em prazo e por quem tem legitimidade. Dupla conforme – Sentença decidiu: a caução a prestar pelo executado deve ter conta o valor do bem penhorado cuja substituição requer, e não, como pretende a exequente, o valor da quantia exequente. Acórdão decidiu: confirmando a sentença, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diversa.” E decidiu remeter os autos à formação. 5. Por acórdão da formação de 10/5/2023, veio o processo remetido de novo à relatora, por se entender que o recurso de revista não seria admissível, ao abrigo do art.º 854.º do CPC, o que determinaria não poder a formação conhecer do pedido de admissão da revista excepcional, com a seguinte justificação: “Ora, no caso vertente, estamos perante um apenso, deduzido pelo executado, BB, à ação executiva para pagamento de quantia certa que lhe foi movida por UNICRE – Instituição Financeira de Crédito, SA, pelo que tudo indica que existe um obstáculo à admissibilidade do recurso de revista geral, por força do artigo 854.º do Código de Processo Civil, que deve ser aferido pelo Relator originário a quem o processo foi distribuído.” O Artigo 854.º do CPC diz: “Sem prejuízo dos casos em que é sempre admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, apenas cabe revista, nos termos gerais, dos acórdãos da Relação proferidos em recurso nos procedimentos de liquidação não dependente de simples cálculo aritmético, de verificação e graduação de créditos e de oposição deduzida contra a execução.” Na situação dos autos não estamos perante nenhum dos casos indicados no art.º 854.º do CPC como sendo admissível o recurso de revista. 6. Atento o exposto, prefigura-se existir um obstáculo à admissão da revista (regra) – que deve ser levado ao conhecimento das partes, nos termos do art.º 655.º do CPC, para emitirem a sua opinião, após o que se decidirá. Decisão: Notifiquem-se as partes, nos termos do art.º 655.º do CPC. Prazo legal. Sem custas. Lisboa, 1 de Junho de 2023 Fátima Gomes (fim de transcrição)
B - Em resposta o recorrente disse: “…7. Com efeito, o Venerando Tribunal da Relação de Lisboa proferiu acórdão pugnando pela idoneidade da prestação de caução no valor de € 38.336,27, por considerar que o valor da caução deve circunscrever-se ao valor dos bens penhorados nos autos, ou seja, que a caução a prestar pelo Executado deve ter em conta o valor do bem penhorado cuja substituição requer. 8. Por não se conformar com a decisão plasmada no acórdão prolatado pelo Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, a Exequente interpôs recurso excecional de revista desta decisão. 9. E fê-lo, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 671.º, 672.º n.º 1 alínea a), 674.º n.º 1 alínea a), 675.º e 676.º do CPC, mormente, por considerar que a questão que subjaz, pela sua relevância jurídica, carece de uma apreciação distinta e, em consequência, de uma melhor aplicação do direito. 10. Tendo devidamente elencado as razões pelas quais considera que ser premente uma melhor aplicação do Direito. 11. As quais, sinteticamente aqui, novamente, se aduzem: a. A finalidade da ação executiva é a de exigir e obter, de forma coerciva, o cumprimento de uma obrigação, baseando-se num documento - o título executivo - , que determina o seu fim ou limites, sendo por ele que se conhece, com precisão, o conteúdo da obrigação do devedor, e que se concretiza através da apreensão dos bens do património do devedor que se mostrem necessários para o credor ver realizado o seu direito, pela adjudicação de tais bens, ou pelo produto da sua venda. b. A substituição da penhora por caução tem ínsita a ideia de troca, de alteração, do tipo de garantia; a garantia advinda da penhora é substituída por uma garantia diferente. c. De resto, a caução, enquanto garantia especial da obrigação, exige que ela se mostre, em face das circunstâncias concretas do caso, capaz de assegurar a completa satisfação do crédito do exequente quer isto dizer que, aconteça o que acontecer, dentro de padrões de normalidade, é certo o integral pagamento da obrigação cujo cumprimento coercivo se reclama. d. Por conseguinte, o juízo de suficiência da caução mais do que um juízo meramente hipotético é um juízo de certeza e, consequentemente, está sujeito a critérios exigentes e só se basta, se não com uma certeza absoluta, com uma alta probabilidade. e. Consequentemente, “na aferição da suficiência da caução haverá de se considerar i) não só a totalidade da dívida exequenda no momento em que a caução poderá ser chamada a satisfazer a mesma (o que inclui os juros vincendos até então) mas, também, ii) os encargos da execução (de cujo pagamento depende o pagamento da quantia exequenda) e iii) os créditos a serem pagos antes do crédito exequendo”1. f. Tendo presente estas premissas, a decisão que antecede, de que é idónea a caução substitutiva de penhora de imóvel, no montante de € 38.336,27 (trinta e oito mil trezentos e trinta e seis mil euros e vinte e sete cêntimos) por ter sido este o valor atribuído pelo Sr. Agente de Execução, no auto de penhora, ao prédio misto penhorado, colide com os princípios basilares do processo civil em particular e do Direito em geral. g. O imóvel penhorado no âmbito dos presentes autos – cuja substituição por caução foi requerida – , é um prédio misto, tendo a sua fração rústica 153,13500ha e a sua componente urbana uma área bruta de construção de 235,0000 m2, sito na freguesia ..., concelho ..., distrito ..., não sendo minimamente plausível que o seu valor patrimonial ascenda somente a € 40.182,64 (quarenta mil cento e oitenta e dois euros e sessenta e quatro cêntimos) – valor correspondente ao somatório do valor patrimonial atual de cada um dos mencionados prédios. h. Nem tão-pouco é verossímil que o aludido prédio tenha um valor de €38.336,27 (trinta e oito mil trezentos e trinta e seis mil euros e vinte e sete cêntimos), cf. aposto pelo Senhor Agente de Execução no Auto de Penhora, nomeadamente no campo 14. i. É patente que este valor está absolutamente desconforme considerando a área do imóvel e atento os valores do mercado imobiliário atuais. j. De resto, o valor atribuído ao bem penhorado é uma mera estimativa, uma vez que antes da venda de qualquer bem, particularmente, de um bem imóvel, ele será devidamente avaliado por um avaliador credenciado para o efeito, sendo que tal avaliação ocorrerá sempre antes da venda do bem onerado com tal garantia real. k. Até porque “o princípio da proporcionalidade implica a formulação de um juízo de prognose, segundo o qual o valor do crédito exequendo a ponderar reporta-se ao momento em que previsivelmente o mesmo virá a ser satisfeito (RL 12-5-16, 20516/10). Releva ainda o valor de mercado de venda do bem a penhorar, decorrendo das regras da experiência comum que, normalmente, um bem móvel usado terá um valor inferior ao da aquisição (RG 16-3-17, 202120/14).2” (Destaque nosso). l. Ora, julgando-se idónea a caução prestada, em substituição do imóvel penhorado – este sim suficiente para acautelar o pagamento da quantia exequenda, o Executado e ora Recorrido poderá aliená-lo, ficando, assim, a Recorrente despojada da sua maior garantia e com uma caução cujo valor, arbitrado pelo Tribunal a quo, não é suficiente para garantir o pagamento da dívida exequenda. m. Atento todo este panorama, a conclusão do Tribunal de 1.ª Instância e, posteriormente, do Tribunal da Relação de Lisboa, de que a caução é idónea por corresponder ao montante atribuído pelo Sr. Agente de Execução, no auto de penhora, ao prédio misto penhorado, fazendo tábua rasa ao montante apurado pelo Sr. Agente de Execução na nota justificativa provisória que elaborou em 27-05-2022, de onde resulta que, naquela data, o total da quantia exequenda (capital em dívida acrescido dos respetivos juros e despesas prováveis) ascendia a € 55.870,96 (cinquenta e cinco mil oitocentos e setenta mil euros e noventa e seis cêntimos), merece censura e uma apreciação distinta por este douto Tribunal, que culmine numa melhor aplicação do direito e com a sua devida revisão. 12. No entanto, prefigura-se a este douto Tribunal, existir um obstáculo à admissão da revista, atento o preceituado no artigo 854.º do CPC. 13. Salvo o devido e havido respeito e melhor opinião, não pode a Exequente concordar com este entendimento. Senão vejamos: 14. Preceitua o artigo 852.º do CPC que: “Aos recursos de apelação e de revista de decisões proferidas no processo executivo são aplicáveis as disposições reguladoras do processo de declaração e o disposto nos artigos seguintes”. 15. Consagra, ainda, o artigo 854.º do CPC que “Sem prejuízo dos casos em que é sempre admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, apenas cabe revista, nos termos gerais, dos acórdãos da Relação proferidos em recurso nos procedimentos de liquidação não dependente de simples cálculo aritmético, de verificação e graduação de créditos e de oposição deduzida contra a execução.” (Destaque nosso). 16. É, assim, cristalino de que na primeira parte daquele preceito normativo há, portanto, uma clara remissão para os artigos 627.º e ss., 644.º e ss. e 671.º e ss. do CPC. 17. Ademais, sobre este tema, como bem refere António Abrantes Geraldes3 “por via da remissão constante no artigo 852.º, está restringida a recorribilidade para o Supremo nos casos em que se verifique uma situação de dupla conforme (art.º 671.º, n.º 3), sem embargo da aplicabilidade do artigo 672.º, quando houver fundamentos excecionais” (Destaque nosso)4. 18. E, como acima se disse, a Exequente e aqui Recorrente interpôs o presente recurso, estribado no disposto no artigo 672.º, n.º 1, alínea a) do CPC, por considerar que a questão cujo conhecimento pelo Tribunal Superior se requer, pela sua relevância jurídica, carece de uma apreciação distinta e, em consequência, de uma melhor aplicação do direito. 19. Ora, é manifesto que das disposições conjugadas dos artigos 852.º e 854.º do CPC, está salvaguardada a possibilidade de recurso de revista excecional para o Supremo Tribunal de Justiça, previsto no artigo 672.º, n.º 1, do CPC, conquanto, verificada uma situação de dupla conforme entre a decisão da 1.º instância e o Acórdão do Tribunal da Relação, estejam reunidos os demais pressupostos gerais do recurso de revista. 20. Perante o exposto, no caso sub judice, entende a Recorrente que os pressupostos processuais estão devidamente preenchidos e salvaguardados, sendo, por isso, admissível o recurso excecional de revista o que, desde já, se requer.”
II. Fundamentação. Relevam os elementos constantes do relatório supra. Dispensados os vistos.
C - Conhecendo Na resposta ao convite do Tribunal o recorrente não rebate a argumentação apresentada e que fundamentaria a não admissão da revista, ainda que lhe tivessem sido facultados todos os elementos interpretativos disponíveis, incluindo o acórdão da formação, que deixou claro não haver possibilidade de admissão de revista excepcional se o recurso de revista normal não foi possível por haver norma especial impeditiva do mesmo, como sucede com o art.º 854.º do CPC e não se verificando, nem vindo alegada, nenhuma das circunstâncias em que se poderia o tribunal socorrer do art.º 671.º, n.º2, ou do art.º 629.º, n.º2 do CPC. Deve, assim, dar-se aqui por reproduzida a fundamentação constante do despacho convite e decidir que o recurso de revista normal não é admissível, sendo irrelevante que ocorra uma situação de dupla-conforme, por força das disposições conjugadas do art.º 854.º e 671.º, n.º1, 2 e 3 do CPC, e ainda do art.º 672.º do CPC.
III. Decisão Pelos fundamentos indicados, não se toma conhecimento do objecto do recurso, ficando prejudicada a sua remessa à formação a que se reporta o art.º 672.º do CPC. Custas pelo recorrente.
Lisboa, 6 de Julho de 2023
Relatora: Fátima Gomes
1º Adjunto: Dr Oliveira Abreu
2º Adjunto: Dr Nuno Pinto Oliveira |