Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
531/14.5T8FAR.E1.S1
Nº Convencional: 7ª SECÇÃO
Relator: ANTÓNIO DA SILVA GONÇALVES
Descritores: IMPUGNAÇÃO PAULIANA
REQUISITOS
CRÉDITO
EXIGIBILIDADE DA OBRIGAÇÃO
INTERPRETAÇÃO DA LEI
CAUSA PREJUDICIAL
PODERES DO TRIBUNAL
Nº do Documento: SJ
Data do Acordão: 04/06/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO CIVIL - DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / GARANTIA GERAL DAS OBRIGAÇÕES.
Doutrina:
- Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, 4.ª edição, II volume, 436, 439, 440, 441, 442, 446; Das Obrigações em Geral, 7.ª Edição, Volume II, 450 e nota 1.
- Pires de Lima e Antunes Varela, “Código Civil” Anotado, Volume I, 4.ª Edição - revista e actualizada, 626.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 289.º, N.º 1, 610.º, 612.º, 614.º, 615.º.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

-DE 26.05.1994, C.J., 1994, TOMO 2, 114.
-DE 28.03.1996, C.J., 1996, TOMO 1, 159.
Sumário :
I. Do exame dos preceitos legais contidos nos artigos 610.º e 612.º, ambos do Cód. Civil, resulta que, para além de outros, é requisito necessário para que o credor possa recorrer ao instituto da impugnação pauliana, a anterioridade do crédito, ou seja, o crédito deve ter nascido antes do acto a impugnar ou sendo posterior ter sido o acto realizado dolosamente com o intuito de impedir a satisfação do direito do futuro credor;

 II. Perscrutando a “ratio” que está por detrás e fundamenta aqueles normativos (artigos 610.º e 614.º do C.Civil), orientada no sentido de que o credor deve ser acautelado dos atos do devedor que atentem contra a segurança do seu crédito e que esta garantia só tem sentido relativamente a ações praticadas pelo devedor já depois de estar constituído o débito, a isto não obstando o facto de o direito do credor não ser ainda exigível, destes princípios havemos de aprontar que o que importa valorizar é a data da criação do crédito, que terá de ter nascido antes do ato impugnado.

 III. A formação do crédito da recorrente ocorreu em data anterior ao ato impugnado, pois que os factos que determinaram a responsabilidade da ré "CC, L.da" se concretizaram entre 1992 e 1994 e o contestado negócio da venda da fracção autónoma "AJ" foi outorgado através da escritura pública de 31/07/1996.

 IV. Da decisão deste Supremo Tribunal que, no âmbito do processo n.º 297/1999/1.º Juízo do (extinto) Tribunal Judicial de Albufeira, foi proferida em 12.11.2013 e transitou em 19.02.2014, o que resulta é que, confirmando o crédito da autora - firmado entre 1992 e 1994 - em relação à ré "CC, L.da", deste aresto haveremos de inferir que o crédito da autora se constituiu previamente à ultimação da venda realizada e que a autora desaprova.

 V. Os tribunais não criam direitos “ex novo”; a sua função é jurisdicionalmente apreciar e julgar o pedido formulado na ação pelo demandante, criteriosamente interpretando e aplicando a lei aos factos trazidos a juízo e depois comprovados em julgamento.

Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

"AA, SA" (anteriormente denominada BB, SA), com sede em ............., Vale de Cambra, veio demandar "CC, L.da", com sede em Faro e DD e mulher EE, residentes em Faro, pedindo que a ven­da efectuada por escritura pública de 3 de Julho de 1996 pela qual a l.ª Ré vendeu aos 2.º s réus, pelo preço de 24.000.000$00 (119711,49€) a fracção autónoma designada pe­las letras "00", que corresponde ao segundo andar direito, destinada a habitação, do prédio urbano em regime de propriedade horizontal, denominado "E....", sito na ........ em Faro, descrito na Conservatória do Registo Predial de Faro sob o n.º .... da freguesia da Sé, seja declarada ineficaz em relação à A. na me­dida do que se mostrar necessário para integral satisfação do seu crédito.

A autora alegou, em síntese, ter um crédito sobre a 1.ª ré no valor de 4.499.022,35€ (901.973.000$00), acrescido de juros de mora, e que esta vendeu à Ré EE, casada com o Réu DD, assumindo este a qualidade de sócio-gerente da 1.ª ré, a fracção acima identificada, visando a diminuição das garantias da cobrança do crédito da autora.

Os RR apresentaram contestação alegando a 1.ª ré a invia­bilidade da acção impugna o alegado pela autora; por sua vez, os 2.º s réus alegam a inep­tidão da petição inicial e impugnam o demais alegado pela A.

Os 2.º s réus invocam ainda a existência de causa prejudicial e requerem a suspensão da instância com esse fundamento até à existência de decisão transitada daquele processo.

  Foi ordenada a suspensão da instância.

    Depois de cessada a suspensão, o processo seguiu os seus termos e, após a audiência final, foi proferida sentença que julgou a acção improceden­te e absolveu os réus do pedido.

     Desta sentença recorreu a autora para a Relação de Évora que, por acórdão de 12/07/2016 (cfr. fls. 893 a 941), revogou a sentença recorrida e, julgando a ação procedente, declarou ineficaz em relação à autora, na medida do que se mostrar necessário para integral satisfação do seu crédito, a venda descrita no n.º XII da exposição da matéria de facto.

Inconformados, recorrem agora para este Supremo Tribunal os réus DD e mulher EE, que alegaram e concluíram pelo modo seguinte:

1. No que concerne à primeira questão suscitada no douto Acórdão recorrido e que respeita à questão da anterioridade ou não do crédito invocado pela recorrente face à data do acto impugnado lê-se se naquele aresto que "não se exige, para este requisito da anterioridade do crédito, uma decisão judicial que o reconheça e, muito menos ainda, que tal decisão tenha transitado em julgado".

2. E, citando Menezes Leitão, acrescenta que “é apenas relevante a data de constituição do crédito e não a data em que o credor obteve um título executivo sobre o devedor".

3. Ora a recorrida, à data da escritura de compra e venda outorgada em 31 de Julho de 1996, ainda não detinha nenhum crédito sobre a devedora,

4. Pois tal crédito só se constituiu com a decisão proferida pelo Supremo Tribunal de Justiça e que transitou em julgado em 19 de Fevereiro de 2014, pois, até essa data, nenhum crédito existia.

5. Aliás alegar-se que a partir dessa data é que passou a existir um título executivo é totalmente irrelevante para o caso em apreço pois

6. Sendo certo que os recorrentes aceitam que a data em ter em consideração para efeitos de constituição do crédito da recorrida não seja a data de trânsito em julgado do douto Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça no âmbito daquele processo

7. Mas sim a data da decisão proferida em 1 a instância pois só nesse momento em que foi constituído o crédito que a recorrida invoca.

8. Até essa data não exista nenhum crédito.

9. Deste modo o negócio que a recorrida pretende ver declarado ineficaz no tocante a si é anterior a essa decisão porquanto o mesmo ocorreu em 1996 e aquela decisão, como consta dos autos, ocorreu em 8 de Junho de 2011.

10. Tanto mais que somente a partir da data da decisão proferida pelo Supremo Tribunal de Justiça no âmbito daquele processo é que foi constituído um crédito da recorrida sobre a R CC, L.da pois (e o douto Acórdão recorrido omite tal circunstância) esta R havia sido condenada naquele processo pelo douto Acórdão do Tribunal da Relação de Évora a pagar á ora recorrida a quantia de 30.000,00 euros.

11. Ora a R CC, L.da tinha e ainda hoje tem património suficiente para pagar essa quantia como resulta dos documento referente ao processo executivo que corre termos pela Comarca de Faro - Silves­ - Instância Central - 2.ª Secção de Execução - .... n.º ..../14.4T8SLV e de que resulta inequivocamente que a R CC, L.da é proprietária de diversas fracções autónomas que foram penhoradas (e ainda se encontram penhoradas) pela aqui recorrida.

12. Se o Supremo Tribunal de Justiça não tivesse alterado aquela decisão os presentes autos teriam sido declarados extintos por o património da CC, L.da" ser suficiente para pagar o crédito da recorrida.

13. Pois a questão nuclear é simples: saber a data de constituição do crédito invocado pela recorrente.

14. E a resposta só pode ser, salvo o devido respeito por melhor opinião, uma: o direito de crédito constitui-se com a douta sentença que transitou em julgado em 19 de Fevereiro de 2014 e não antes e só neste data é que foi determinado que o crédito era de montante superior a 4.000.000,00 euros e não de 30.000,00 euros.

15. Ou seja: o crédito invocado pela aqui recorrida só se constituiu em data posterior á outorga da escritura dos autos.

16. E esta questão do montante do crédito foi omitida por completo no douto Acórdão recorrido é decisiva para a questão de se saber se esse acto diminuiu ou não a garantia patrimonial do crédito.

17. Na verdade e face á circunstância da CC, L.da ser ainda hoje proprietária de um património suficiente para garantir a quantia de 30.000,00 euros em que havia sido condenada.

18. Só com o douto Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça é que o crédito da recorrida sobre a R CC, L.da atingiu um montante que tornou o património desta insuficiente para garantir a divida.

19. Pois até essa data e de acordo com o douto Acórdão proferido nesses mesmos autos pelo Tribunal da Relação de Évora esse crédito no montante de 30.000,00 estava garantido.

20. E na data da outorga da escritura não havia qualquer crédito constituído pelo que esta questão não se colocava.

21. Deste modo sendo o crédito da recorrida posterior ao acto só poderia proceder o pedido da recorrida se o mesmo tivesse sido realizado com dolo como dispõe a norma vertia no art° 610 n.º 1 do C.C.

Terminam pedindo que seja revogado o acórdão recorrido e seja substituído por outro que absolva os recorrentes do pedido.

Contra-alegou a recorrida"AA, SA" pedindo a manutenção do julgado.

         Corridos os vistos legais, cumpre decidir.

    

                 Estão provados os factos seguintes:

   I. A A. BB, SA, agora denominada AA, SA, tem por objecto social o comércio de madeiras e outros materiais de construção, ferragens, tintas e vernizes, material eléctri­co e decorativo, mobiliário, utilidades domésticas e artigos de adorno.

  II. A Ré CC, Lda., tem por objecto social a construção e repara­ção de edifícios, trabalhos que concorrem para a construção de edifícios, construções e obras públicas não especificadas, compra e venda de imóveis, exploração de hotéis, de aparthotéis, de cafés, restaurantes, pensões e similares e tem como sócios e gerentes FF e DD.

  III. Por sentença de proferida no Processo n.º 297/1999 do 1.º Juízo do (extin­to) Tribunal Judicial de Albufeira de 8.06.2011 foi decidido:

 A) Condenar os réus GG,HH, FF,II,JJ, "KK Lda.", "PP, Lda.", "CC, Lda." e "NN, Lda." a pagar solidariamente à autora (BB, SA/AA, SA) indemnização no montante de € 100.000,00 (cem mil euros), acrescida de juros à taxa legal, a partir da data da decisão até ao real reembolso;

  B) Condenar os Réus GG,HH, FF,II eJJ e "KK Lda.", "PP, Lda.", "CC, Lda." e "NN, Lda." a pagar solidariamente à autora "AA, SA" a indemnização no montante de 2.564.198,87€ (dois milhões, quinhentos e sessenta e quatro mil e cento e noventa e oito euros e oitenta e sete cêntimos) acrescida de juros contados, à taxa le­gal, desde a data da denúncia no processo crime;

C) Condenar os Réus GG, HH, FF,II eJJ e "KK Lda.", "PP, Lda.", "CC, Lda." e "NN, Lda." a pagar solidariamente à autora "AA, SA" a indemnização que se vier a apurar em incidente de liquidação relativamente aos danos referidos nos pontos 1.55 e 1.56 dos factos provados desta sentença na parte que exceder os danos já apurados nos pon­tos 1.59, 1.61, 1.62, 1.63 e 1.64;

D) Absolver os Réus DD e "MM, Lda." do peticionado pela autora "AA, SA"; e

E) Absolver os restantes réus do demais peticionado pela autora."

IV. A sentença referida em III foi objecto de recurso, tendo o Tribunal da Relação de Évora, por acórdão de 7.02.2013, concedido parcial procedência às apela­ções e acordado:

a) Em determinar que, relativamente ao valor de 100.000,00 € fixado na al. a) da parte decisória da sentença, relativo ao dano patrimonial indirecto, a responsabi­lidade dos réus apelantes QQ, NN, Lda., se cinge ao valor de 30.000,00 € (trinta mil euros), em solidariedade entre si e com o réu GG

   b) b)Em determinar que, relativamente a esse mesmo valor de 100.000,00€ fixado na al. a) da parte decisória da sentença, relativo ao dano patrimonial indirecto, a responsabilidade da ré CC, Lda., se cinge ao valor de 30.000,OO€ (trinta mil euros), em solidariedade com o réu GG;

   c) Em alterar o valor da indemnização fixada na al. b) da parte decisória da sentença recorrida (relativa aos danos emergentes liquidados) para a quantia de 2.164.197,87€ (dois milhões, cento e sessenta e quatro mil cento e noventa e sete euros e oitenta e sete cêntimos), em resultado da dedução da quantia global de 400.000,00€ que foi entretanto entregue à autora;

   d) Em determinar que, desse valor global, a responsabilidade dos réus ape­lantes QQ e Construções NN, Lda., se cinge ao va­lor de 2.191,81€ (dois mil, cento e noventa e um euros e oitenta e um cêntimos), em solidariedade entre si e com o réu GG;

   e) Em determinar que, desse valor global, a responsabilidade da ré apelante CC, Lda., se cinge ao valor da madeira que recebeu, nos termos referidos no ponto 1.68 dos factos provados, valor esse a liquidar em sede de execução de sentença;

   f) Em revogar a sentença recorrida na parte relativa à condenação dos réus apelantesII, Construções NN, Lda., e CC, Lda., no pagamento da indemnização referida na al. c) da parte decisória da sentença (relativa aos danos ali referidos, a liquidar em execução de sentença), absolvendo os mesmos, nessa parte, do pedido;

  g) Em determinar que, tendo sido entregues à autora o iate e sinal da pro­messa de compra do veículo Saab referidos nos pontos 1.97 e 1.98 da matéria de facto, o respectivo valor, a liquidar em sede de execução de sentença, seja deduzido à in­demnização (a que se refere a al. c) da parte decisória), indemnização essa também a liquidar em execução de sentença.

  h) No mais se mantendo o decidido na sentença.

 V. Do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora foi interposto recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, o qual, por acórdão de 12.11.2013, transitado em 19.02.2014, decidiu:

     “...nega-se a Revista interposta pelo Réu FF, dando-se provimento à Revista interposta pela Autora e em consequência altera-se a decisão ínsita no Acórdão sob recurso, condenando-se solidariamente os Réus GG, HH, FF,II eJJ e "KK Lda.", "PP, Lda.", "CC, L.da" e NN, Lda., a pagar à autora/recorrente AA, SA, a indemnização no montante de 100.000,00 € (cem mil euros) a título de danos patrimoniais indirectos, a que acrescerão juros contados, à taxa legal, a partir da data da presente decisão até ao real reembolso, bem como a satisfazer-lhe a indemnização no montante de 2.564.198,87€ (dois milhões, quinhentos e sessenta e quatro mil cento e noventa e oito euros e oitenta e sete cêntimos) acrescida de juros contados, à taxa legal, desde a data da denúncia no processo crime, a título de danos patrimoniais directos, mantendo-se no mais o decidido".

 VI. As decisões acima referidas basearam-se na seguinte factualidade:

1. “Por acórdão datado de 27 de Janeiro de 1999, já transitado em julgado, proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça nos autos do processo 00/97, actualmente 000/99, que correu termos no 2º Juízo deste Tribunal decidiu-se, além do mais, condenar o ali arguido e aqui Réu GG como autor material de um crime de abuso de confiança, previsto e punido pelo artigo 300º, n.º s 1 e 2, alínea a), do Código Penal, na versão de 1982, na pena de seis anos e seis meses de prisão; corno autor material de um crime de falsificação de documentos, previsto e punido, por força do disposto no artigo 2.º, nº 4. do Código Penal, pelo artigo 228º', nº s 1, alíneas a) e b) e 2, conjugado com o artigo 229º, nº 1, na versão de 1982 desse Código, na pena de três anos de prisão e setenta dias de multa à taxa diária de cinco mil escudos, o que perfaz a multa global de trezentos e cinquenta mil escudos, correspondendo-lhe em alternativa quarenta e seis dias de prisão; condenar o ali arguido, ora Réu HH, como co-autor material de um crime de abuso de confiança, previsto e punido pelo artigo 300º, nºs 1 e 2, alínea a), do Código Penal, na versão de 1982, na pena de três anos e quatro meses de prisão; condenar o ali arguido, ora Réu KK como co-autor material de um crime de abuso de confiança, previsto e punido pelo artigo 3000, nºs 1 e 2, alínea a), do Código Penal, na versão de 1982, na pena de quatro anos e nove meses de prisão; condenar o ali arguido, ora Réu FF, como co-autor material de um crime de abuso de confiança, previsto e punido pelo artigo 300º, n.°s 1 e 2, alínea a), do Código Penal, na versão de 1982, na pena de quatro anos e seis meses de prisão; condenar o ali arguido, ora Réu QQ, corno co-autor material de um crime de abuso de confiança, previsto e punido pelo artigo 300º, nºs 1 e 2, alínea a), do Código Penal, na versão de 1982, na pena de três anos e quatro meses de prisão, todos pelos seguintes factos que aqui se reproduzem: 

   1. O arguido GG era, desde 1992, o único gerente da sucursal da assistente nos presentes autos, "BB, S.A.", onde antes se encontravam as instalações das sociedades denominadas "RR, Lda" e " Lda", sita em ....... - Albufeira;

 2. A assistente iniciou ai as suas actividades comerciais em 1988, em termos de sucursal;

 3. Este arguido, desde pelo menos 1984, desempenhava ai as suas funções e durante o ano de 1995 até ser detido auferia mensalmente de vencimento cerca de 370.000$00 (ilíquidos), de ajudas de custo cerca de 47000$00 e em senhas de gasolina cerca de 37.000$00;

4. Nessa qualidade de gerente dessa sucursal o arguido GG tinha como funções, além de outras relacionadas com a representação da assistente, a apreciação de clientes e a concessão de crédito de fornecimentos de madeiras e seus derivados que constituíam o objecto da sociedade sua representada e efectuar compras, de acordo com os seus critérios de gestão, com excepção dos produtos produzidos pela própria assistente e suas associadas, bem como contratar serviços a terceiros;

  5. Com efeito, a assistente, no âmbito das suas actividades, tinha por vezes necessidade de obter junto de outros fornecedores fora do seu conjunto de empresas, madeiras que não fossem transformadas por aquelas, como era o caso de derivados de pinho e de mogno e ainda os mencionados serviços, que consistiam na aplicação dos materiais que vendia aos seus clientes;

  6. Para esse efeito, o director financeiro da assistente, cuja sede se situava em Vale de Cambra, enviava regularmente cheques ao arguido GG, por forma a que este ficasse sempre com cerca de 6 desses títulos, contendo todos eles apenas e só a assinatura daquele director e ficando esse arguido na posse dos mesmos;

 7. Assim sempre que fosse necessário efectuar o pagamento daqueles fornecimentos o arguido GG preenchia o cheque com os elementos necessários e, uma vez que se tratava de urna conta bancária conjunta, que carecia de duas assinaturas, o mesmo arguido assinava igualmente o respectivo cheque;

8. Este procedimento foi-se prolongando no tempo até ao momento em que o arguido GG foi detido à ordem deste processo;

  9. Em momento que não se logrou apurar do mês de Janeiro de 1992 o arguido GG concebeu um plano que consistia na aquisição de serviços e de madeiras e seus derivados que não fossem tratados, fornecidos ou, de algum modo, produzidos ou transformados por nenhuma das empresas que fizessem parte do grupo daquelas que eram associadas da assistente e das qualidades designadamente já referidas, por forma a fazer aumentar o volume de bens adquiridos apenas em termos contabilísticos sem que fisicamente existissem, bens ou serviços esses que seriam pagos pela assistente, revertendo essas importâncias nomeadamente para o seu património;

  10. Para tanto era necessário obter junto de particulares ou empresas, que além do mais se relacionassem comercialmente com a assistente, a colaboração necessária e assim o arguido GG teria de conseguir colaboradores que lhe permitissem, por um lado, surgir como fornecedores de serviços e materiais não produzidos pela assistente e, por outro lado, surgissem num mecanismo cruzado de compra e venda corno adquirentes de parte desses materiais e serviços pelo menos, em virtude do aumento fictício de "stocks" que esse plano proporcionava, procedendo a lançamentos nas suas contas correntes, com o conhecimento dos mesmos;

   11. Parte dessas compras fictícias, pelo modo sobredito, uma vez que não tinham qualquer correspondência com a realidade tinham assim por destino a realização imediata de dinheiro;

  12. Outra parte a liquidação., por encontro de contas, de fornecimentos de materiais ou serviços verdadeiros, efectivamente prestados pela assistente;

 13. Ainda outra parte para a amortização de contas correntes ou de valores titulados;

  14. Para esse efeito o arguido GG contactou os arguidos KK, JJ, HH e II em momentos não concretamente apurados, expondo-lhes o seu plano atrás referido e pedindo-lhes a sua colaboração;

 15. O arguido KK era sócio-gerente das sociedades "LL., L.da" e "MM, L.da,", que partilhavam das mesmas instalações em Lagos para as suas actividades, designadamente de transformação de madeiras e sendo que o arguido NN era empregado de escritório dessa primeira sociedade;

  16. O arguido HH para além de ter urna carpintaria em Jungeiros era sócio gerente da sociedade "PP, L.da" de construção civil;

 17. O arguido QQ era sócio-gerente da sociedade "NN, L.da de construção civil, na qual fazia parte também uma carpintaria em Tavira;

  18. O arguido FF tinha igualmente uma carpintaria em S...., Loulé e além disso era sócio-gerente da sociedade “CC, Lda." com o arguido DD, que se dedicava igualmente à construção civil;

  19. Com excepção do arguido NN, todos estes arguidos por si ou em representação das respectivas sociedades mantinham relações comerciais com a assistente, através da aludida sucursal;

  20. Quanto ao arguido JJ o arguido GG propôs-lhe, o que foi aceite, que o mesmo actuasse como fornecedor da assistente de madeiras e seus derivados já referidos em 5°, nomeadamente por via da sociedade "LL., Lda." que lhe arranjasse facturas de fornecimentos à assistente de terceiros que não correspondessem a verdadeiras operações comerciais e que aceitasse facturação "falsa" da assistente mandada emitir pelo arguido GG, dirigida a essa sociedade nomeadamente, referente a materiais de outros fornecimentos "fictícios" que à assistente fossem feitos;

 21. Nessa medida no período compreendido entre os dias 3 1/1/92 e 25/07/95 o arguido JJ na execução do acordado apresentou a facturação constante do anexo VI de fls. 1 a 180 e do anexo VII de fls. 343 a 541, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, dela constando materiais designadamente em pinho e mogno, sendo que peio menos todos os materiais em pinho jamais foram fornecidos, o mesmo acontecendo em grande parte com os materiais em mogno, cujas quantidades não foi possível concretamente apurar;    

Essas facturas do ponto 25. são:

folhas dos apensosValor da factura Materiais
2 do apenso VI e 345 do adenso VII3.912.480$00 Mogno
4 do apenso VI e 347 do apenso VII3.906.923$00 Mogno
do apenso VI e 349 do apenso VII3.976.391$00 Mogno
8 do apenso VI e 351 do apenso VII3.940.262$00 Mogno
10 do apenso VI e 353 do apenso VII3.989.174$00 Mogno
12 do apenso VI e 355 do apenso VII3.858.020$00 Mogno
14 do apenso VI e 357 do apenso VII3.990.285$00 Mogno
16 do apenso VI e 343 do apenso VII3.901.365$00 Mogno
18 do apenso VI e 367 do apenso VII3.951.383$00 Mogno
20 do apenso VI e 365 do apenso VII3.970.278$00 Mogno
22 do apenso VI e 363 do apenso VII3.956.940$00 Mogno
24 do apenso VI e 361 do apenso VII3.501.225$00 Mogno
26 do apenso VI e 359 do apenso VII3.879.135$00 Mogno
28 de apenso VI e 369 do apenso VII3.995.843$00 Mogno
30 dc apenso VI e 371 do apenso VII3.994.731$00 Mogno
32 do apenso VI e 373 do apenso VII3.954.717$00 Mogno
34 do apenso VI e 375 do apenso VII3.951.383$00 Mogno
36 dc apenso VI e 379 do apenso VII3.972.501$00 Magno
38 de apenso VI e 377 do apenso VII3.804.665$00 Mogno
40 de apenso VI e 381 do apenso Vil3.840.233$00 Mogno
42 do apenso VI e 383 do apenso VII3 978.059$00 Mogno

46 do apenso VI e 388 do apenso VII3.957.000$00 Mogno
48 do apenso VI e 390 do apenso VII3.967.200$00 Mogno
50 do apenso VI e 392 do apenso VII3.857.000$00 Mogno
52 do apenso VI e 394 do apenso VII3.879.040$00 Pinho
54 do apenso VI e 396 do apenso VII3.845.980$00 Pinho
56 do apenso VI e 398 do apenso VII3.928.630$00 Pinho
58 do apenso VI e 400 do apenso VII3.945.180$00 Pinho
60 do apenso VI e 402 do apenso VII3.845.980$00 Pinho
62 do apenso VI e 404 do apenso VII3.363.000$00 Pinho
64 do apenso VI e 406 do apenso VII3.890.060$00 Pinho
66 do apenso VI e 408 do apenso VII3.868.020$00 Pinho
68 do apenso VI e 410 do apenso VII3.973.320$00 Pinho
70 do apenso VI e 412 do apenso VII3.868.020$00 Pinho
72 do apenso VI e 414 do apenso VII3.939.650$00 Pinho
74 do apenso VI e 416 do apenso VII3.829.450$00 Pinho
76 do apenso VI e 418 do apenso VII3.868.020$00 Pinho
78 do apenso VI e 420 do apenso VII3.890.060$00 Pinho
80 do apenso VI e 422 do apenso VII60.320$00 Sem material
81 do apenso VI e 424 do apenso VII3.890.060$00 Pinho
83 do apenso VI e 426 do apenso VII3.868.020$00 Pinho
85 do apenso VI e 428 do apenso VII3.967.200$00 Pinho
87 do apenso VI e 430 do apenso VII3.989.240$00 Pinho

89 do apenso VI e 432 do apenso VII3.791.982$00 Pinho
91 do apenso VI e 434 do apenso VII3.922.018$00 Pinho
93 do apenso VI e 436 do apenso VII3.945.160$00 Pinho
95 do apenso VI e 438 do apenso VII3.868.020$00 Pinho
97 do apenso VI e 440 do apenso VII3.845.980$00 Pinho
99 do apenso VI e 442 do apenso VII3.967.200$00 Pinho
101 do apenso VI e 444 do apenso VII3.989.240$00 Pinho
103 do apenso VI e 446 do apenso VII3.834.960$00 Pinho
105 do apenso VI e 448 do apenso VII3.581.500$00 Pinho
109 do apenso VI e 453 do apenso VII3.890.060$00 Pinho
111 do apenso VI e 455 do apenso VII3.967.200$00 Pinho
113 do apenso VI e 457 do apenso VII3.912.100$00 Pinho
115 do apenso VI e 459 do apenso VIl3.967.200$00 Pinho
117 do apenso VI e 461 do apenso VII3.967.200$00 Pinho
119 do apenso VI e 463 do apenso VIl3.939.650$00 Pinho
121 do apenso VI e 465 do apenso VII3.934.140$00 Pinho
123 do apenso VI e 467 do apenso VII3.922.018$00 Pinho
125 do apenso VI e 469 do apenso VIl3.687.292$00 Pinho
127 do apenso VI e 471 do apenso VII3.995.852$00 Pinho
130 do apenso VI e 473 do apenso VII3.916.508$00 Pinho
132 do apenso VI e 475 do apenso VII3.912.100$00 Pinho
134 do apenso VI e 477 do-apenso VII3.812.920$00 Pinho

136 do apenso VI e 479 do apenso VII3.790.880$00 Pinho
138 do apenso VI e 481 do apenso VIl3.912.100$00 Pinho
140 do apenso VI e 483 do apenso VII3.983.730$00 Pinho
142 do apenso VI e 485 do apenso VII3.834.960$00 Pinho
144 do apenso VI e 487 do apenso VII3.098.824$00 Pinho
146 do apenso VI e 489 do apenso VII3.588.112$00 Pinho
148 do apenso VI e 491 do apenso VII1.856.870$00 Pinho
150 do apenso VI e 493 do apenso VIl2.865.200$00 Pinho
152 do apenso VI e 495 do apenso VIl3.594.504$00 Pinho
154 do apenso VI e 497 do apenso VIl2.827.732$00 Sem material
156 do apenso VI e 499 do apenso VIl3.040.418$00 Mogno e outro
158 do apenso VI e 501 do apenso VIl3.366.830$00 Mogno e outro
160 do apenso Vi e 503 do apensoVII3.686.410$00 Outro
152 do apenso VI e 505 do apenso VIl2.535.702$00 Pinho
164 do apenso VI e 507 do apenso VII3.186.984$00 Mogno
166 do apenso VI e 509 do apenso VII1.229.832$00 Mogno
Mogno e Pinho
169 do apenso VI s 523 do apenso VII3.262.581$00 (este valor
699.200$00)
171 do apenso VI e 521 do apenso VII3.443.750$00 Mogno
173 do apenso VI e 519 do apenso VII3.147.312$00 Pinho
175 do apenso VI e 517 do apenso VII4.639.420$00 Outro

177 do apenso VI e 515 do a penso VII3.773.446$00 Pinho
179 do apenso VI e 513 do apenso VII3.361.860$50 Pinho
525 do apenso VIl4.613.093$50 Pinho
528 do apenso VII2.414.484$00 Outro
530 do apenso VII1.228.500$00 Sem material
533 do apenso VII2.457.000$00 Sem material
537 do apenso VIl2.457.000$00 Sem material
540 do apenso VII2.457.000$00 Sem material
Total336.941.276$00
Total das mercadorias em Pinho203.875.024$00

  22. O valor total destas facturas foi integralmente liquidado por encontro de contas entre a assistente e a "LL, Lda.", ou com fornecimentos efectivos da assistente ou com a facturação comercial constante de fls. 291 a 397 do anexo VI, tudo também conforme o acordado entre o arguido GG e o arguido JJ;

  23. Acresce ainda que, das facturas de fornecimentos efectivos de materiais da assistente dirigidos à sociedade "LL, L.da", só parte desses materiais foram entregues a esta sociedade e a outra parte foi entregue ou à sociedade "PP, L.da," do arguido HH, ou a este, ou ao arguido FF, ou à sociedade "CC, L.da." bem como ainda à sociedade "NN, L.da," do arguido QQ;

  24. Tudo também conforme o acordado entre o arguido GG e o arguido JJ, e já que a sociedade "LL, Lda." não tinha capacidade que lhe permitisse transformar ou intermediar as quantidades de madeiras constantes dessas facturas, do anterior número;

25. Por outro lado o arguido JJ apresentou ao arguido GG outras facturas de "fornecedores" de serviços como é o caso das que se intitulam como sendo da "SS, L.da" e de um tal "TT", constantes de fls. 297 a 340 e 596 a 641 do anexo VII, cujo teor se dá aqui por reproduzido, sendo que os serviços a que se reportam essas facturas não foram efectivamente prestados à assistente não obstante a ela estarem dirigidas; Essas facturas do ponto 25. são:

Folhas do apensoValor da factura
2975.562.400$00
2993.334.500$00
3012.749.500$00
1161.696.500$00
3051.907.100$00
3132.707.503$00
3162.707.497$00
3331.740.000$00
3352.424.400$00
3371.890.800$00
3403.619.200$00
5965.808.905$00
5987.055.100$00
6006.935.220$00
6027.605.000$00
6143.159.000$00
6173.217.500$00
6203.238.560$00
6252.971.800$00
6362.866.500$00
Total72.656.985$00

26. Essas facturas de “fornecedores" de serviços foram liquidadas através dos cheques da assistente de fls. 1014 a 1016, 1019 a 1026 e 1155 do vol. III, fls. 1512, 1513, 1516 e 1517 do vol. V, cujo teor se dá aqui por reproduzido, que o arguido GG tinha em seu poder nos termos já referidos, tendo-os assinado;

27. Para o arguido GG pelo menos reverteram os valores dos cheques de fls. 1016 e 1155 do vol. III e para o arguido JJ reverteram, pelo menos, os valores dos cheques de fls. 1014, 1015, 1021, 1022 e 1023 do mesmo volume;

28. No entanto o cheque de fls. 1025 do vol. III foi endossado ao arguido NN e na sua conta depositada do B.P.A (nº .........), por motivos não concretamente apurados, sendo que o seu valor foi depois devolvido quer para o arguido GG quer para o arguido JJ (fls. 5141/2 do vol. XVI);

29. O arguido GG era titular de 16 contas bancárias, uma no B.P.I., uma no B.N.U., uma no Finibanco, uma na C.C.A.M. de Albufeira, uma no B.C.I., duas no B.P.A., sete no B.C.P. e duas na Nova Rede;

30. Das suas contas nº 0000000 do B.C.P. de Albufeira e nº0000000 do mesmo banco foram depositadas em contas do arguido JJ, nomeadamente com os n° 00000 do CC.A.M. de Vila do Bispo, 00000 do B.C.P. de Albufeira,000000 da U.B.P., 00000do B.F.B. e 00000do B.N.U., o montante de 64.940.000$00 nos anos de 1993 a 1995;

 31. Por seu turno no que concerne ao arguido HH, o arguido GG propôs-lhe, o que por ele foi aceite, que o mesmo encomendasse madeira que seria ficticiamente fornecida pela assistente, deste modo tentando-se esgotar os "stocks" fictícios criados em virtude do plano mencionado nos n°s 9 a 13, sendo que o "pagamento" da respectiva facturação mandada emitir por si, GG, seria através de aceites de letras sucessivamente a serem amortizadas e reformadas, com dinheiro que era entregue ao arguido HH pelo arguido GG, dinheiro esse que provinha dos proventos produzidos pela execução do seu plano;

 32. Em consequência o arguido HH recebeu entre os dias 3 1/8/93 e 7/10/93, as facturas com os nºs ....., .......,.....,.......,.......,...,.... no total de 45.085.573$00, conforme teor de fls. 53 a 80 do anexo XII que aqui se dá por reproduzido, cujo conteúdo não correspondia a qualquer operação de fornecimentos pela assistente;

 33. Este valor foi liquidado por aceite do mesmo montante com vencimento em 20/02/94, conforme teor de fls. 2284/5, vol. VI, que aqui se dá por reproduzido;

 34. Este aceite foi reformado em 22/02/94 com um novo aceite de 40.000.000$00, vencendo em 20/5/94 (fls. 227 7/8 do vol. VI), sendo o valor da amortização liquidada por cheque regularmente sacado pela sociedade "PP, L.da." que o arguido HH era sócio-gerente, cheque esse que foi pago;

 35. Em 20/5/94 este novo aceite foi reformado para 35.000.000$00, com vencimento em 20/07/94 (fls. 2286, 2287, vol. VI) e pago o valor amortizado de 5.000.000$00;

 36. Em 20/07/94 o arguido HH reformou novamente este ultimo aceite para 30.000.000$00, através de um novo aceite com vencimento diferido para 20/10/94 (tis. 2288, vol. VI), e pagou o valor amortizado;

 37. No período compreendido entre os dias 28/10/93 e 26/11/93 o arguido HH recebeu, provenientes da assistente e cuja emissão foi ordenada pelo arguido GG, nove facturas com os nºs ...., ......, ...., ..., ....., ......., ....., ........ e ...., no total de 44.312.444$00, relativas a encomendas que tinham apenas por objectivo aumentar o volume dos bens adquiridos contabilisticamente de acordo com o já mencionado (fls. 84 a 116 do anexo XII);

 38. 0 arguido HH aceitou uma letra daquela importância, com vencimento em 20/03/94 que foi reformada (fls. 2290/1 do vol. VI);

 39. Foram ainda emitidas as facturas da assistente com os nºs ...., ....., ....., ....., ...., .., .......,......, ...., ......, ..... (fls. 120, 124, 387, 392, 397, 402, 406, 411, 416, 421, 425, 429 do anexo III) que foram enviadas ao arguido HH e por este recebidas e sendo que as dos nºs ..... e ....não correspondem a qualquer operação comercial real;

40. Em 06/06/94 o arguido HH aceitou uma letra de 38.000.000$00, com vencimento em 30/09/94, que engloba além das facturas mencionadas no n° transacto outras despesas (fls. 2273/4 do vol. VI);         

 41. Em 15/09/94 o arguido HH aceitou uma outra letra de câmbio no valor de 38.000.000$00, com vencimento em 19/12/94 (fls. 2271/2 do vol, VI) resultante do recebimento pela "PP, Lda." das facturas com os nºs.....,.....,.....,......,......,......,........,.....,...,....,.... e .... do anexo XII), sendo que as facturas ..... e ..... não correspondem a qualquer operação comercial, propondo-se o mesmo arguido com esse título regularizar também vários documentos de despesas bem como algumas devoluções, entre elas um saque no montante de 2.014.139$00 (fls. 19 1/2 do anexo XII-A);

 42. A este arguido foram ainda remetidas as facturas com os nºs....,......,........,...e ...... que não correspondiam a qualquer fornecimento efectivo (fls. 53, 130, 132 e 135 do anexo XII);

 43. Uma vez que o aceite e as reformas de letras por parte do arguido HH se destinavam em grande medida a manter saldos, por forma a assistente ser enganada, o arguido GG, como forma igualmente de pagamento da sua colaboração e para as amortizações acima mencionadas, transferiu da sua conta n° 0000000 do B.C.P. para a conta n° 00000000, cujo titular era o arguido HH, o montante de, pelo menos, 19.398.017$00 no período compreendido entre 22/03/94 e 01/03/95 (fls. 178, 193, 218 e 245 do anexo 1V-A e fls. 13 do anexo 1V-B);

 44. Outra forma de pagamento que o arguido GG utilizou para com o arguido HH, consistiu na entrega de madeira pertença da assistente, cujo preço esta nunca recebeu, que constava na proposta de carga para entrega à cliente da mesma "LL, Lda." nomeadamente, a quem era facturado esse material, em instalações ou obras da "PP, Lda." e numa carpintaria que o arguido HH possuía em Jungeiros conforme já foi mencionado, sendo que essa facturação consta de fls. 395 a 516 do anexo VI e este procedimento já foi aludido nos transactos nº 22 e 23, tudo conforme o acordado entre estes dois arguidos, bem como com a anuência do arguido JJ;

47. Relativamente ao arguido FF, o arguido GG propôs-lhe que também apresentasse facturação em seu nome como fornecedor da assistente e que arranjasse facturas de "fornecimentos" de terceiros que não correspondessem a verdadeiras operações, o que o mesmo aceitou;

48. Para esgotar os "stocks" ficticiamente criados pelo modo sobredito propôs-lhe também o arguido GG, o que por ele foi aceite, que a sociedade "CC, Lda." recebesse igualmente facturação da assistente que não correspondesse a qualquer negócio real;

49. Assim entre os dias 27/05/92 e 27/01/93, sob responsabilidade do arguido GG foram emitidas sete facturas da assistente para a sociedade "CC, L.da", com os nºs ....., ......,......, ......., ....... ..... e ......, no montante de 32,017,624$00, conforme teor de fls. 9 a 23 do anexo X, que aqui se dá por reproduzido, que não correspondiam a qualquer negócio real, tendo sido enviadas para tal sociedade;

50. Nem o arguido FF nem a sociedade que representava tinham meios humanos e materiais para transformarem ou aplicarem nas suas obras tamanhas quantidades de madeiras;

51. Acresce que o material descriminado nos documentos que eram dirigidos a essa sociedade, atento à sua qualidade e proximidade temporal da facturação, se destinavam a fases de construção muito diferentes;

52. De facto, enquanto que numas facturas a madeira destinava-se à cofragem, aplicada na fase inicial das obras, outras destinavam-se à aplicação de acabamentos;

53. Nesse período de tempo a sociedade "CC, L.da," apenas tinha um único edifício em construção, sendo que o arguido GG possui o apartamento melhor identificado a fls. 41 a 43, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, adquirido a essa sociedade;

54. O valor da facturação apresentada à sociedade "CC, L.da”, foi amortizada em quantia não concretamente apurada, destinando-se tal a conferir um aspecto de normalidade nas relações comerciais e sendo que o dinheiro para isso provinha da própria assistente;

55. Por sua vez o arguido FF apresentou ao arguido GG outras facturas de "fornecedores" como é o caso das que se intitulam como sendo da sociedade "UU, L.da" e de um tal VV, sendo este enquanto apenas prestador de serviços constantes de fls. 4 a 103 e 10? a 294 do anexo V. cujo teor se dá por integralmente reproduzido, o cerco é que os materiais e serviços a que se reportam essas facturas não foram efectivamente fornecidos não obstante à assistente estarem dirigidas;

56. Quando lhe eram apresentadas essas facturas o arguido GG "liquidava" o seu valor através dos chegues da assistente de fls. 1029 a 1060, 1062 a 1090, 979 a 1012, 1157 do Vol, III, 1509, 1510, 1511 e 1515 do Vol. V, cujo teor se dá aqui por reproduzido, que tinha em seu poder nos termos já referidos, tendo-os assinado;

57. Relativamente à UU, Lda.", dois desses cheques para pagamento das facturas de fls. 82 e 54 do anexo VII com os nºs 2050 e 2074 foram depositados em conta bancária do arguido DD (fls. 1007/8 e 997.998 do vol. III) por motivos não concretamente apurados, sendo que os seus montantes foram devolvidos ao arguido GG e FF, conforme teor de fls, 3049, 3050 e 3051 do Vol. IX;

  58. Oito deles foram depositados na conta do arguido NN para pagamento de outras tantas facturas, conforme teor de fls. 980/1, 98415,99011, 988/9, 986/7, 979 e 1001.2 e 1157 (Vol. III), por motivos não concretamente apurados, sendo que os seus valores nomeadamente reverteram para os arguidos GG ou JJ, através de depósitos também em contas bancárias;

 59. Três desses cheques, no montante de 3A94,697$00, foram assinados no seu verso por XX, funcionária da assistente, sob ordem do arguido GG, quantia essa que reverteu a favor deste arguido (fls. 1006. 1009 1003 do vol. III);

 60. Seis desses cheques entregues como forma de pagamento de factura que se intitulam da "UU, L.da", foram assinados por pessoa cuja identidade não foi possível apurar;

 61. Dois desses cheques, no montante de 7.328.079$00 foram depositados em conta do arguido FF (fls. 1011/2 e 1004/5 do Vol. III) revertendo para ele esse valor;

  62. Dos 16 cheques no montante de 63.207.440$00 da assistente referentes a algumas facturas do ano de 1994 que são intituladas corno sendo do VV acima mencionadas, os seus valores reverteram a favor do arguido GG (fls. 1029 a 1035, 1041, 1044/5 a 1059 do Vol. III);

63. Relativamente ainda aos cheques para pagamento das facturas intituladas como sendo de XX o cheque de 4.739.764$00 de fls. 000000 (Vol. III) reverteu para o arguido FF e o cheque de 4.930.000$00 de fls. 1514 do vol. V foi depositado em conta do arguido DD por motivos não concretamente apurados, sendo que pelo menos 3.180.000$00 foram devolvidos por este arguido ao arguido GG (cfr. fls. 3052);

64. No ano de 1995 dos cheques no montante de 121.263.985$00 da assistente referentes ainda às facturas que são intituladas como sendo do mesmo VV, os seus valores reverteram igualmente a favor do arguido GG, fazendo desse dinheiro coisa sua;

65. Nunca as necessidades de stock da assistente ou de prestações de serviços atingiu, nesta zona e nos anos de 1993 a 1995 tais dimensões, nem existiam obras de construção civil de clientes da mesma que absorvessem tanta madeira;

     66. Na conta do arguido DD foram efectuadas ainda pelo arguido GG alguns depósitos bancários no montante de 11.690.000$00 (conta nº 0000000000000), por motivos não concretamente apurados (fls. 23, 110.42 e 106 dos anexos IV-A e B);

 67. O arguido GG procedeu ainda a depósitos no montante global de 11.250.000$00 na conta do B.E.S. com o n' 00000000, titulada pela sociedade "CC, L.da", por essa via pelo menos entrando no património dessa sociedade (fls. 88 do anexo I V-A e 14, 118 e 187 do anexo 1V-B);

  68. Outra forma que o arguido GG utilizou como forma de pagamento pela colaboração do arguido FF consistiu na entrega de madeira pertença da assistente, cujo preço esta nunca recebeu e cuja designação constava na proposta de carga para entrega à cliente da BB, Lda." do arguido JJ a quem era facturado esse material, em instalações e/ou obras da "CC, Lda." e ainda na carpintaria que o arguido FF possuía em S....., sendo que essa facturação consta de N. ... a .... do anexo VI e esta forma de procedimento já foi referida nos transactos nºs 22 e 23, tudo conforme o acordado entre estes dois arguidos, bem como com o conhecimento e acordo do aludido arguido JJ;

  Essas facturas do ponto 68. são:

Folhas do apensoValor da fatura
182490.818$00
1862.000,005$00
1902.111.514$00
194 e 1955.683.030$00
201139.350$00
206747.797$00
2101.900.670$00
213301.142$00
21731.320$00
220273.663$00
224 e 2253.054.847$00
2328.106$00
236172.559$00
240185.697$00
Total17.100.518$00

     69. Na verdade, embora nas propostas de carga emitidas pela sucursal de Albufeira da assistente constasse sempre corno cliente a "LL, Lda.' onde o material deveria ser descarregado, era anotado regra geral à margem de cada documento assim emitido o verdadeiro local de descarga que era, consente os casos, as instalações ou obras dos arguidos HH e FF ou das sociedades 'PP, L.da", "CC, L.da" e "NN, L.da”;

70. Acresce que o arguido GG transferiu da sua conta do B.C.P com o n° 000 0000 para a conta do B.E.S. com o nº 0000000 de que era titular o arguido FF pelo menos cerca de 25.000.000$00, beneficiando dessa quantia em parte este arguido;

71. Relativamente ao arguido QQ o arguido GG propôs-lhe, o que por ele foi aceite, que encomendasse madeiras que seriam ficticiamente fornecidas pela assistente, assim as facturando, mais uma vez com o intuito de esgotar os "stocks" artificialmente criados pelo modo sobredito;

72. Em consequência disso foram emitidas por ordem do arguido GG e remetidas ao arguido QQ as facturas ...... de 26/05/94 de 8.030.100$00, ..... de 26/5.94 de 9.879.720$00, ..... de 26/5/94 de 8.154.800$00,..... de 26/5/94 de 7.64.736$00, ..... de 27/5/94 de 4.135.000$00, ..... de 27/5/94 de 13.920.000$00, ..... de 30.6/94 de 4,825.000$00, ..... de ... de 6.512.000$00, ... de 30/6194 de 3,712,000$00, ..... de 30/6/94 de 3.201.600$00. ..... de 30/6/94 de 6,229.200$00, ..... de 3 de 4.698.000$00, ...... de 30.6/94 de 1.484.800$00, .....de 19/7/94 de 4.872.000$00,...... de 29/8/94 de 4.184.000$00 e ..... de 5/10/94 de 4.264.624$00, constantes de fls. 1286 a 1314 do vol. IV, as quais não correspondem a qualquer fornecimento efectivo;

73.A carpintaria que o arguido QQ a possuía em Tavira era apenas um pequeno espaço com cerca de 15 m2, não tendo empregados nem obras e meios técnicos que lhe permitissem transformar as quantidades de madeira que constavam daquelas facturas;

74.A factura com o n° 00000 continha exactamente os mesmos materiais que constavam da factura nº 000 que o arguido JJ através da "LL, L.da" tinha remetido à assistente, portanto incluída naquelas que são mencionadas no n° 001 destes factos provados, conforme teor de fls. 66 do anexo VI e fls. 1308. vol. IV;

75. Para regularização contabilística e nomeadamente para titularem a dívida originada pela emissão das facturas indicadas em 72, conforme o igualmente combinado entre arguidos GG e QQ, foram emitidas letras no valor global de 100.419.894$00, rendo a primeira como data de emissão o dia 28/7/94 e a última 24/11/94, com vencimento respectivamente para os dias 20/12/94 e 20/5/95, constantes de fls. 3669 a 3675 do vol. XI, cujo teor se dá aqui por reproduzido;

76. Não se logrou apurar no entanto, quem assinou no local de aceite dessas letras, embora o arguido QQ tivesse anuído que se assinasse no local do aceite como se ele fosse um aceite validamente prestado;

77. Essas letras foram dadas á execução pela assistente, a correr seus termos no Tribunal da Comarca de Faro, sob os nºs .... e .....5;

78. Como forma de pagamento desta colaboração do arguido QQ, como foi acordado com o arguido GG, fez-se-lhe entrega de madeira pertença da assistente, cujo preço esta nunca recebeu e cuja designação constava na proposta de carga para entrega à cliente da "BB, Lda." do arguido JJ a quem era facturado esse material, em instalações e/ou obras da sociedade NN, Lda.", sendo que essa facturação consta de fls. 246 a 289 do anexo VI e este modo de procedimento já foi mencionado nos transcritos nºs 22 e 23, com o conhecimento e acordo do arguido JJ; Essas facturas do ponto 78. são:

Folhas do apensoValor da factura
246106.163$00
250121.954$00
255211.302$00
Total439.419$00

79.O arguido GG ainda para esgotar os "stocks" artificialmente criados na execução do plano por si concebido, ordenava a emissão de facturas e outra documentação que não tinha qualquer expressão na realidade, com a designação de clientes individuais ou sociedades, alguns deles inexistentes, titulando as facturas com letras em branco que nomeadamente outros clientes recebiam;

 80. Assim, per sua responsabilidade Foram emitidos os documentos de vendas a dinheiro, constantes do anexo VIII, ...... de 2 1/9/95 em nome de "ZZ. Lda.", de 12.276,....., ..... de 21/9/95 em nome de "AAA, no valor de 8,918,20850-0, ..... de ....... em nome de BBB, no valor de 8,595.176500, ...... de 21/9/95 em nome de CCC, no valor de 10.513,152$" .....de 21/9/95 em nome de "DDD, Lda.", - no valor de 11898.474$00, ....... de 22/9/95 em nome de EEE, no valor de 2.580.979$00 e ........de 10/10/95 em nome de "FFF. Lda." no valor de 7.583.493500;

 81. Através do mesmo esquema sob a responsabilidade do arguido GG foram emitidas Facturas e procedia-se a lançamentos nas contas correntes de clientes;

82. Emitiu-se  a  factura  ......  de  24/7/95  em  nome  de  "Soc.  GGG L.da” no valor de 1.930.500$00 que nunca chegou a ser entregue ao cliente, nem a respectiva mercadoria;

83. Emitiram-se as facturas em nome de “HHH, L.da” com os nºs ....... de 20/7/95, no valor de 2.193.750$00 e .... de 20/7/95 no valor de 1.755.000$00, cujo saldo de conta cliente era apenas de 8.645$00 e em nome da “III, L.da”, a factura n° ...... de 11/7/95 no valor de 5.499.000$00, cujo saldo da conta cliente era apenas de 17.399$00;

 84. Emitiu-se a factura .......de 11/7/95 no valor de 1.404.000$00 em nome de “JJJ”, cujo saldo com a assistente era, na realidade nulo;

 85. Emitiram-se as facturas ..... de 30/6/95 de 2.457.000$00,.... de 29/3/95 de 2.589.480$00, ..... de 27/3/95 de 10.389.600$00, ..... de 26/11/94 de 3.340.800$00, ..... de 26/11/94 de 3.340.800$00,..... de 3/10/94 de 38.923$00, ....... de 30/6/95 de 4.352.400$00, ...... de 24/7/95 de 3.264.300$00,.... de 24/7/95 de 1.462.500$00,..... de 20/7/95 de 4.282.200$00, ...... de 23/7/95 de 3.738.150$00, ..... de 11/7/95 de 4.241.250$00 e ........ de 11/7/95 de 5.686.200$00 em nome de “KKK, L.da”, que não correspondiam a qualquer fornecimento;

 86. Em nome de “LLL Lda.” foram emitidas as facturas ..... de 20/7/95 de 1.755.000$00, .... de 11/7/95 de 1.404.000$00,...de 20/7/95 de 2.106.000$00 e .... de 11/7/95 de 2.632.500$00 que não correspondem a qualquer fornecimento;

 87. Em nome de “MMM, Lda.” Foi emitida a factura n° ..... de 11/7/95 no valor de 3.708.900$00 que não corresponde a qualquer fornecimento;

88. Em nome  de “NNN”, foram  emitidas as facturas ...  de  11/7/95 de 5.576.840$00, .... de 30/6/95 de 3.861.000$00,....., de 31/3/95, de 1.421.550$00, .... de 24/3/95 de 2.603.250$00, de .... de 24/3/95 de 3.246.750$00, .... de 26/l l/94 de 4.640.000$00, ...... de 26/11/94 de 2.505.600$00, .... de 4/7/94 de 25.643$00 que também não correspondem a qualquer fornecimento;

 89. Em nome da Sociedade “OOO, S.A.” foram emitidas as facturas constantes do XI com os nºs .... de 31/l/95 de 5.616.000$00, ..... de 31/1/95 de 5.616.000$00, ..... de 31/1/95 de 5.616.000$00, ..... ...S de 31/1 /95 de 5.616.000$00, .... de 31/l/95 de 5.616.000$00, ..... de 1/3/95 de 13.647.465$00,.... de 3/3/95 de 3.759.210$00,...... de 29/3/95 de 3.502.980$00, ..... de 29/3/95 de 2.187.900$00, 0...... de 10/4/95 de 26.658.450$00, ... de 29/4/95 de 4.972.500$00, ..... de 29/4/95 de 5.616.000$00, ..... de 29/4/95 de 4.534.500$00, ...... de 29/4/95 de 5.031.000$00, ....de 29/4/95 de 5.089.500$00, .... de 5/5/95 de 5.294.250$00, ..... de 10/7/95 de 5.733,000$00, ..... de 10/7/95 de 5.791.500$00, .... de 11/7/95 de S.616.000$00, .... de 11/7/95 de 5.733.000$00,.... de 11/7/95 de 5.791.500$00 e ..... de 11/7/95 de 5.616.000$00, que não correspondiam a qualquer fornecimento real;

90. Ainda e sempre com intenção de manter artificialmente este giro, através da emissão de documentos de vendas a dinheiro e facturas, o arguido GG beneficiando da confiança que vários clientes da assistente nele depositavam conseguia deles a entrega de letras em branco nas quais na sua posse escrevia neles valores que não eram os correspondentes às encomendas que os mesmos faziam, artificio que utilizava para manter o equilíbrio escritural e ocultar a apropriação de bens e valores para si e para os arguidos JJ, HH,FF e QQ, que consoante o caso, não lhes eram devidos;

91. Quando os verdadeiros clientes recebiam os avisos de saque em montantes que não correspondiam ás suas reais encomendas, por serem muito superiores às importâncias devidas, o arguido GG alegava tratar-se de erro informático;

 92. O arguido NN por motivos não concretamente apurados consentiu que fossem efectuados depósitos bancários nas contas de que era titular com os nºs 000000 da U.B.P. c 000000 do B.P.A. pelo arguido GG sendo que os valores desses depósitos reverteram novamente para o arguido GG nomeadamente através de depósitos que aquele efectuou na conta já mencionada deste com o n° 0000000 do B.C.P. de Albufeira;

93. Os arguidos GG, HH, JJ, FF e QQ agiram com intenção de obterem para si um enriquecimento ilegítimo, através de engano sobre factos que de forma astuciosa e como supra descrito, provocaram, determinando que a assistente praticasse actos que lhe causaram prejuízos consideravelmente elevados;

94. Os arguidos GG, HH, JJ, FF e QQ agiram com intenção de, através de falsificação de documentos, fazendo neles constar factos jurídicos que merecem a tutela do direito, causar tal prejuízo à assistente, bem sabendo que com as suas condutas punham em causa a confiança desses documentos;

 95. Estes mesmos arguidos agiram livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei;

 96. Com as importâncias recebidas devido à sua conduta acima descrita, contra a vontade e sem autorização da assistente, e que foram integrados no seu património, o arguido GG adquiriu os veículos Fcrrari 00-00-00, Lancia Delta 00-00-00, BMW M3 00-00-00, SAAB 00-00-00, SAAB 00-00-00; SAAB 00-00-00 e Honda 00-00-00;

97. Do mesmo modo e com essas importâncias o arguido GG adquiriu ainda o iate melhor identificado no auto de apreensão de fls. 147;

98. O veículo SAAB 00-0-00 apreendido a fls. 130 foi já entregue (fls. 734, vol. II) sendo que o montante pago pelo arguido GG como sinal da promessa de compra e venda desse veículo foi depositada a fls. 728 do mesmo volume, dinheiro esse também proveniente da conduta acima descrita deste arguido;

99. O arguido QQ, em representação da sociedade “NN, Lda.” enviou as custas de fls. 5, 6, 36 a 41 dos autos apensos n° 300/96, cujo teor se dá aqui por reproduzido, aos aí assistentes respetivamente PPP e QQQ, o primeiro ao tempo Presidente do Conselho Fiscal da assistente destes autos e o segundo Presidente do Conselho de Administração da mesma;

 100. À sucursal da assistente em Albufeira por vezes deslocavam-se o seu administrador RRR c o seu diretor financeiro SSS;

101. Todos os anos, nessa sucursal, procedia-se a inventário de “existências” utilizando-se nomeadamente o método da “amostragem” e, por vezes deslocava-se uma “auditoria” para verificação da sua contabilidade;

102. O arguido GG granjeava de grande confiança dos seus superiores hierárquicos e era-lhe conferida pela assistente grande margem de liberdade no exercício das suas funções;

103. Em Janeiro de 1994 a sociedade “PP, Lda.” era devedora da assistente, estando a débito a sua conta corrente contabilística com esta;

104. O arguido HH enquanto gerente dessa sociedade aceitou todas as letras de fls. 2237 a 2291 do vol. VI, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;

105. O mesmo arguido emitiu ainda os cheques a favor da assistente cujas cópias constam de fls. 2634 a 2645, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;

106. O arguido GG emitiu a favor do arguido HH os cheques constantes de fls. 15 a 17, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;

107. Durante o ano de 1990 a “LL, L.da” enquanto fornecedora da “TTT, L.da” fez vendas a esta no montante de 7.690.410$00;

108. Durante o ano de 1991 a mesma sociedade forneceu à “BB, S.A." e à “TTT, L.da” no montante global de 8.324.597$00;

109. Os cheques cujas cópias constam de f]s. 4774, 4776 c 4778 do Vol XV, cujo teor se dá aqui por reproduzido foram depositados na conta do arguido GG 0000000 do B.C.P.;

110. O arguido GG em representação da assistente subscreveu o documento de fls. 4780 do Vol. XV, cujo teor se dá aqui por reproduzido;

111. Em 04.10.93 o arguido GG aceitou a letra de fls 3417 (Vol. X), cujo teor se dá aqui por reproduzido;

112. Em 06.04.94 foi celebrado o contrato de fls. 3420 a 3431 do Vol. X, cujo teor se dá aqui por reproduzido;

113. O arguido GG aceitou as letras de fls 3417 e 3469, que aqui se dão por reproduzidas;

114. Os cheques de fls ........., 3435, 3441, 3445, 3447 e 3448 foram depositados na conta do arguido GG 0000000 do BCP;

115. O arguido FF emitiu o cheque de fls. 3497, cujo teor se dá aqui por reproduzido;

116. Em 08.02.95 entre a sociedade “CC, L.da” e o arguido GG foi celebrado o contrato promessa de fls. 1899 c 1900, cujo teor se dá aqui por reproduzido (Vol. VI);

117. O arguido FF na sociedade “CC, Lda.” tinha a seu cargo a gestão de toda a parte financeira e contabilística e nessa sociedade o arguido DD tinha por seu turno a gestão de toda a actividade de construção e comercialização dos imóveis construídos pela firma;

118. O cheque constante de fls. 23 a 24 do anexo 1V-A do arguido GG para o arguido DD foi depositado na conta que pertence ao “UUU” (fls. 3053. Vol IX);

 119. Do valor constante no n° ...transato pelo menos 6.000.000$00 reverteram para a assistente através dos cheques de fls. ............ do Vol. IX;

 120. O arguido GG tem quatro filhos, todos menores com, respectivamente, 3, 5, 9 e 11 anos de idade, sendo um deles deficiente;

 121. A esposa trabalha como educadora de infância e aufere mensalmente cerca de 200.000$00 líquidos;

122. Paga de renda de casa 100.000$00 mensais;

123. Tem o curso complementar dos liceus e socialmente é considerado;

124. Não lhe são conhecidos antecedentes criminais;

125. O arguido HH tem duas filhas, estando uma delas a seu cargo;

126. Em Maio de 1993 teve um acidente de que lhe resultaram graves sequelas;

127. Estudou até à 4° classe;

 128. Não lhe são conhecidos antecedentes criminais;

129. O arguido JJ está separado de facto e tem duas filhas maiores, estando a pagar os estudos a uma delas;

130. Tem duas lojas em Lagos e uma casa em construção;

131. Estudou até à 4.ª classe e é considerado socialmente;

132. Não lhe são conhecidos antecedentes criminais;

133. O arguido FF vive em casa sua e tem uma filha maior a seu cargo;

134. Tem duas lojas na Quarteira;

  135. Tem dois carros e estudou até à 4ª classe;

 136. É bem visto socialmente e não lhe são conhecidos antecedentes criminais;

 137. O arguido DD tem dois filhos, um menor e outro maior, estando ambos a seu cargo;

138. A esposa aufere cerca de 150.000$00 mensais;

139. Vive cm casa própria e estudou até ao 5° ano do ensino técnico;

 140. Não lhe são conhecidos antecedentes criminais, sendo considerado socialmente;

 141.O arguido QQ tem dois filhos que não estão a seu cargo;

 142. Vive maritalmente e está obrigado a pagar de alimentos à sua ex-esposa 50.000$00 mensais;

143. Vive em casa de que será comproprietário;

 144. Estudou até à 4' classe e é considerado socialmente;

 145. Não lhe são conhecidos antecedentes criminais;

 146. O arguido NN é casado e tem dois filhos, ambos a seu cargo, sendo um deles menor;

 147. A esposa trabalha e aufere cerca de 65.000$00;

 148. Vive numa casa para a qual paga uma prestação;

 149. Estudou até à 4' classe e é considerado socialmente;

150. Não lhe são conhecidos antecedentes criminais (alínea A) dos factos assentes).

  2. Em 31 de Dezembro de 1995, em virtude da actuação referida na alínea A) dos factos assentes, faltavam, nos armazéns da autora em Albufeira, materiais no valor de 33.000.000$00, valor esse correspondente à diferença entre os materiais inscritos na contabilidade e os existentes em armazém (resposta ao artigo 3º da base instrutória).

 3. A Autora integra-se no universo do grupo “BB”, com interesses na área industrial e financeira (resposta ao artigo 4º da base instrutória).

  4. A atuação referida em A) afetou a imagem da autora (resposta ao artigo 5º da base instrutória).

  5. Encontrando-se a Autora implementada em todo o território nacional e sendo conhecida de todos os empresários e considerada no universo industrial e financeiro português como empresa íntegra e com uma imagem sólida, honesta e em franco crescimento (resposta ao artigo 6º da base instrutória).”

VII. No âmbito do processo-crime identificado em VI. foi requerida e ordenada a prestação de uma caução económica de 150.000.000$00 pelos arguidos e por despacho de 27.03.1997 foi ordenado o reforço da caução para o montante de 900.000.000$00 a prestar solidariamente pelos arguidos.

VIII. No mesmo despacho referido em VII. foi decretado o arresto dos bens dos arguidos, entre os quais várias fracções do Edifício da Ré CC, Lda., denominado Edifício B......

IX. Pela ap. .... de 29.09.1997 foi registado o arresto da fracção 00 do prédio urbano em regime de propriedade horizontal denominado “Edifício ...., sito na Av.........., freguesia da Sé, em Faro, descrito na CRP de Faro sob o n.º .......

X. A ora A. deduziu pedido de indemnização civil contra os arguidos, entre os quais o ora Réu DD, no âmbito do referido processo-crime, tendo as partes sido remetidas para os meios comuns.

XII. Por escritura pública de 3.07.1996 aquela Ré, representada pelos sócios e gerentes FF e DD, declarou vender à Ré EE, casada sob o regime da comunhão de adquiridos com DD a fracção denominada “00” do prédio referido em XI, correspondente ao segundo andar direito, destinada a habitação, composta por dois halls, sala, quatro quartos, cozinha, despensa, três casas de banho, três balcões e garagem na sub cave, marcada com o número seis, pelo preço de 24.000.000$00, que a vendedora aí declarou já ter recebido da compradora.

XIII. O processo-crime acima identificado teve ampla divulgação na imprensa nacional e regional e nos meios de comunicação social.

XIV. Desde a detenção do arguido GG no âmbito daquele processo-crime, ocorrida em Outubro de 1995, que o réu DD tinha conhecimento da existência do processo.

XV. O Réu DD este preso preventivamente e em obrigação de permanência na habitação no âmbito daquele processo-crime desde Agosto de 1996 e durante alguns meses.

XVI. O Réu DD cumpriu a medida de obrigação de permanência na habitação na fracção referida em XII.

XVII. No acórdão proferido pelo STJ em 27.01.1999 constava como morada de DD a fracção referida em XII

XVIII. Pelo menos desde a celebração da escritura referida em XII e até à data a fracção referida na citada escritura constitui a casa de morada de família dos RR DD e EE.

XIX. A Ré CC, L.da, à data da escritura referida em XII, era proprietária de várias fracções no Edifício...... as quais foram arrestadas no âmbito do processo-crime.

XX. A Ré CC, Lda., procedeu à venda de várias fracções do Edifício ....... a terceiros alheios a qualquer um dos processos acima referidos.

XXI. O Réu DD foi absolvido no âmbito do processo-crime referido em VI.1., o que determinou o levantamento do arresto referido em IX.

XXII. O valor das fracções arrestadas à Ré CC, Lda., é inferior ao valor global referido em V.

XXIII. A venda realizada através da escritura referida em XII tenha sido com a intenção de impedir a satisfação do direito de crédito da A.


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   Nesta ação de impugnação pauliana pretende a autora “AA, SA” que seja declarada ineficaz em relação a si e na me­dida do que se mostrar necessário para integral satisfação do seu crédito, a ven­da da fracção autónoma, designada pe­las letras ..", do prédio urbano em regime de propriedade horizontal, denominado "E....", sito na .................., em Faro, descrito na Conservatória do Registo Predial de Faro sob o n.º ..... da freguesia da Sé, concretizada por escritura pública de 3/07/1996 e na qual a ré "CC, L.da" declara vender tal imóvel aos réus DD e mulher EE, pelo preço de 24.000.000$00 (€ 119711,49).

    A sustentar a sua pretensão alega a demandante que tem um crédito sobre a ré "CC, L.da" no valor de € 4.499.022,35 (901.973.000$00) e que aquela venda visa a diminuição das garantias da cobrança do seu crédito.

      A 1.ª instância julgou a acção improceden­te e absolveu os réus do pedido

  A Relação, todavia, considerando que se verificam os requisitos da impugnação pauliana (art.º 601.º do C.Civil), designadamente que o crédito da autora é anterior ao negócio impugnado, julgou a ação procedente, e, em consequência, declarou ineficaz em relação à autora, na medida do que se mostrar necessário para integral satisfação do seu crédito, a venda daquela fração que a ré "CC, L.da" fez aos réus DD e mulher EE.

      É contra esta deliberação que reagem os réus DD e mulher EE.

  Para os recorrentes, o crédito invocado pela autora “AA, SA” só se constituiu em data posterior à outorga da escritura de 3/07/1996; e não havendo qualquer crédito constituído na data da outorga da escritura, isto é, sendo o crédito da recorrida posterior ao acto da venda, a impugnação pauliana só poderia proceder se o mesmo tivesse sido realizado com dolo (art° 610.º, n.º 1 do C.Civil).


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                            Vejamos se lhe assiste a razão.

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  I. A impugnação pauliana (termo que tem origem em "Paulus", pretor romano que primeiro abordou e deu a conhecer esta figura jurídica), caracteriza-se pela faculdade que a lei põe ao dispor do credor de poder rescindir judicialmente os actos celebrados pelo devedor e lesivos do seu crédito ("eventus damni").


   Tem a impugnação pauliana a natureza jurídica de uma acção pessoal na medida em que o acto impugnado só ao credor impugnante aproveita e apenas dentro dos limites do interesse na satisfação do seu crédito - é uma acção vincadamente pessoal e, por isso, os seus interesses se medem pelo interesse do credor que a promove  (Prof. Antunes Varela; ob. cit.; pág. 444), isto é, reveste um carácter pessoal, já que os seus efeitos aproveitam apenas ao credor que a tenha requerido (Ac. do S.T.J. de 28.03.1996; C.J., 1996, tomo 1, pág. 159).
     Diversamente do que acontece com a nulidade do negócio jurídico - que obriga à restituição de tudo o que tiver sido prestado ou, se a restituição em espécie não for possível, o valor correspondente (art.º 289.º, n.º 1, do C.Civil) - o acto impugnado na acção pauliana apenas o torna ineficaz em relação ao credor impugnante; e uma vez que "a procedência da pauliana não envolve a destruição do acto impugnado, porque visa apenas eliminar o prejuízo causado à garantia patrimonial do credor impugnante, isso significa que, uma vez reparado esse prejuízo, nenhuma razão subsiste para não manter a validade da parte restante do acto, não atingida pela impugnação pauliana" (Prof. Antunes Varela; ob. citada; pág. 446).

II. Do exame dos preceitos legais contidos nos artigos 610.º e 612.º, ambos do Cód. Civil, resulta que são requisitos necessários para que o credor possa a este instituto recorrer:

a) Anterioridade do crédito, ou seja, o crédito deve ter nascido antes do acto a impugnar ou sendo posterior ter sido o acto realizado dolosamente com o intuito de impedir a satisfação do direito do futuro credor;

b) A impossibilidade ou agravamento de impossibilidade de satisfação integral do crédito em resultado desse mesmo acto.

c) Tratando-se de acto oneroso é ainda necessária a má fé do devedor e do terceiro, entendendo-se por má fé a consciência do prejuízo que o acto causa ao credor.
    Compreende-se que só os créditos anteriores ao acto impugnado mereçam a tutela que ora consideramos, uma vez que todos os que posteriormente se verificarem não podem estar protegidos pela garantia patrimonial dos bens antes alienados.
     Só quando o acto de disposição envolver dolo do devedor, isto é, tiver sido praticado com o fim de prejudicar o futuro credor, é que é admissível a impugnação do acto mesmo que seja anterior ao aparecimento do crédito.
     "Os casos que a lei compreensivelmente pretendeu abranger (com a parte final da a. a) do art.º 610.º) são aqueles a que os autores dão a designação expressiva da fraude preordenada. Trata-se dos casos em que o devedor, para obter o crédito, faz dolosamente crer ao credor que certos bens por ele alienados ou onerados ainda pertencem ao seu património, como bens livres de quaisquer encargos" (Prof. Antunes Varela; Obrigações; II; pág. 439).
     A impossibilidade ou agravamento de impossibilidade de satisfação integral do crédito que do acto do devedor vai resultar para o credor traduz-se na situação de o impugnante ter ficado praticamente na impossibilidade de poder obter a realização do seu direito através da atinente acção executiva para satisfação do seu crédito - "com a sua nova formulação quis a lei abranger os casos em que, não determinando embora o acto a insolvência do devedor, dele resulte, no entanto, a impossibilidade prática, de facto, de pagamento forçado do crédito" (Prof. Antunes Varela; ob. cit.; pág. 436).
     Para que haja má fé do devedor e do terceiro adquirente do bem, necessário se torna que ambos estejam moralmente convencidos que, em consequência do acto de alienação, vai advir dano a considerar para o credor - "o devedor e o terceiro podem agir com outra intenção, em busca dum outro objectivo, mas com perfeita consciência do prejuízo que vão causar. E é tanto quanto basta, no pensamento da lei, para que a pauliana proceda (Prof. Antunes Varela; ob. citada; pág. 440), não se exigindo também que tenha de haver uma atitude prévia de concertação entre o alienante (devedor) e o terceiro (adquirente) com o fim de atentar contra o património do credor (Ac. do S.T.J. de 26.05.1994; C.J., 1994, tomo 2, pág. 114).
     Tenha-se na devida conta que "não obsta à impugnação a nulidade do acto realizado pelo devedor" (art.º 615.º do C.Civil), isto é, não tem o credor que, previamente à impugnação pauliana, pedir a declaração da nulidade do acto, se para tanto houver fundamento, tendo liberdade para optar por uma ou outra situação.
     E pode o credor ter razões para enveredar pela impugnação pauliana a que não será estranha a "circunstância de a pauliana envolver para o terceiro participante no acto um tratamento mais severo do que o que resulta da nulidade do acto" (Prof. Antunes Varela; ob. citada; pág. 442).

  III. Dos requisitos legalmente exigidos para que a impugnação pauliana possa proceder (artigos 610.º e 612.º, ambos do Cód. Civil), questionam os recorrentes (compradores da fração autónoma "...”) tão só a verificação da anterioridade do crédito da autora em relação à sua devedora (a ré "CC, L.da" e no montante de € 4.499.022).

Muito embora os factos que determinaram a responsabilidade da ré "CC, L.da" se reportem a data anterior ao ato impugnado - ocorreram em 1992 a 1994 - o certo é que, à data da escritura de compra e venda - outorgada em 31/07/1996 - a recorrida/autora ainda não detinha nenhum crédito sobre a devedora "CC, L.da", pois que tal crédito só se constituiu com a decisão proferida na 1.ª instância - em 8.06.2011 - consignando os recorrentes que só a partir da data da decisão proferida pelo Supremo Tribunal de Justiça no âmbito do processo n.º ......1.º Juízo do (extin­to) Tribunal Judicial de Albufeira -  acórdão de 12.11.2013 e transitado em 19.02.2014 - é que foi constituído um crédito da recorrida sobre a ré “CC, L.da”.

         Será assim?

    - Cremos bem que não.
   - Pontificando o estatuído nos artigos 610.º e 614.º do C.Civil, deles depreendemos que a impugnação pauliana constitui um instrumento técnico-jurídico que a lei disponibiliza em favor dos credores com vista a tutelar a sua garantia patrimonial em relação a atos do devedor que se mostrem ofensivos dessa garantia, entre os quais se destacam, é evidente, os atos de alienação de bens ou de transmissão de direitos, bem como a renúncia de direitos existentes no seu património (Prof. Antunes Varela; Das Obrigações em Geral; II volume; 4.ª edição, pág. 441).

   O ato prejudicial da garantia patrimonial do credor, consubstanciado numa específica e real desvantagem para o credor, no encalço de alcançar a satisfação integral do seu crédito ou redundar no agravamento de impossibilidade de o embolsar, há-de ter como pressuposto a anterioridade do crédito referentemente ao ato lesivo impugnando - é à data do ato impugnado que se deve atender para determinar se dele resulta a impossibilidade, par o credor, de obter a satisfação integral do seu crédito, ou agravamento dessa impossibilidade; por isso, se nessa data, o obrigado ainda possuía bens de valor bastante superior ao montante do crédito, a impugnação deve ser julgada improcedente - Pires de Lima e Antunes Varela; Código Civil Anotado; Volume I; 4.ª Edição - revista e actualizada; pág. 626.

   Perscrutando a “ratio” que está por detrás e fundamenta aqueles normativos (artigos 610.º e 614.º do C.Civil), orientada no sentido de que o credor deve ser acautelado dos atos do devedor que atentem contra a segurança do seu crédito e que esta garantia só tem sentido relativamente a ações praticadas pelo devedor já depois de estar constituído o débito, a isto não obstando o facto de o direito do credor não ser ainda exigível, destes princípios havemos de aprontar que o que importa valorar é a data da criação do crédito, que terá de ter nascido antes do ato impugnado.
   “Só os titulares anteriores a esse acto se podem considerar lesados com a sua prática, porque só eles podiam legitimamente contar com os bens saídos do património do devedor como valores integrantes da garantia patrimonial do seu crédito”; não é necessário, porém, que o crédito já se encontre vencido, para que o credor possa reagir contra os actos (de diminuição da garantia patrimonial) anteriores ao vencimento, contanto que a constituição do crédito seja anterior ao acto” - Prof. Antunes Varela; Das Obrigações em Geral; 7.ª Edição, Volume II; pág. 450 e nota 1.

   A formação do crédito da recorrente ocorreu em data anterior ao ato impugnado, pois que os factos que determinaram a responsabilidade da ré "CC, L.da" se concretizaram entre 1992 e 1994 e o contestado negócio da venda da fracção autónoma ".. foi outorgado através da escritura pública de 31/07/1996.

    Ora, se é assim, está verificada a exigência legal da “anterioridade do crédito” predisposto nos artigos 610.º e 612.º, ambos do Cód. Civil, para que a credora/autora se possa valer do instituto da impugnação pauliana.
   
    Ajustando a lei ao caso concreto, a sentença acolhe ou rejeita, no todo ou em parte, o pedido formulado pelo autor, deste modo conferindo, ou não, a justeza da questão jurídica em discussão na demanda e tal e qual assim ficou definida em julgamento.
    
    Da decisão deste Supremo Tribunal que, no âmbito do processo n.º .../1999/1.º Juízo do (extin­to) Tribunal Judicial de Albufeira, foi proferida em 12.11.2013 e transitou em 19.02.2014, o que resulta é que, confirmando o crédito da autora - firmado entre 1992 e 1994 - em relação à ré "CC, L.da", deste aresto haveremos de inferir que o crédito da autora se constituiu previamente à ultimação da venda realizada e que a autora desaprova.

   Os tribunais não criam direitos “ex novo”; a sua função é jurisdicionalmente apreciar e julgar o pedido formulado na ação pelo demandante, criteriosamente interpretando e aplicando a lei aos factos trazidos a juízo e depois comprovados em julgamento.
    
          Concluindo:

   1. Do exame dos preceitos legais contidos nos artigos 610.º e 612.º, ambos do Cód. Civil, resulta que, para além de outros, é requisito necessário para que o credor possa recorrer ao instituto da impugnação pauliana, a anterioridade do crédito, ou seja, o crédito deve ter nascido antes do acto a impugnar ou sendo posterior ter sido o acto realizado dolosamente com o intuito de impedir a satisfação do direito do futuro credor;
    2. Perscrutando a “ratio” que está por detrás e fundamenta aqueles normativos (artigos 610.º e 614.º do C.Civil), orientada no sentido de que o credor deve ser acautelado dos atos do devedor que atentem contra a segurança do seu crédito e que esta garantia só tem sentido relativamente a ações praticadas pelo devedor já depois de estar constituído o débito, a isto não obstando o facto de o direito do credor não ser ainda exigível, destes princípios havemos de aprontar que o que importa valorizar é a data da criação do crédito, que terá de ter nascido antes do ato impugnado.
   3. A formação do crédito da recorrente ocorreu em data anterior ao ato impugnado, pois que os factos que determinaram a responsabilidade da ré "CC, L.da" se concretizaram entre 1992 e 1994 e o contestado negócio da venda da fracção autónoma "..." foi outorgado através da escritura pública de 31/07/1996.
   4. Da decisão deste Supremo Tribunal que, no âmbito do processo n.º ........º Juízo do (extin­to) Tribunal Judicial de Albufeira, foi proferida em 12.11.2013 e transitou em 19.02.2014, o que resulta é que, confirmando o crédito da autora - firmado entre 1992 e 1994 - em relação à ré "CC, L.da", deste aresto haveremos de inferir que o crédito da autora se constituiu previamente à ultimação da venda realizada e que a autora desaprova.
  5. Os tribunais não criam direitos “ex novo”; a sua função é jurisdicionalmente apreciar e julgar o pedido formulado na ação pelo demandante, criteriosamente interpretando e aplicando a lei aos factos trazidos a juízo e depois comprovados em julgamento.

 Pelo exposto, nega-se a revista e confirma-se o acórdão recorrido.
                 

Custas pelos recorrentes.


    
 Supremo Tribunal de Justiça, 06 de bril de 2017.



António da Silva Gonçalves (Relator)

António Joaquim Piçarra

Fernanda Isabel Pereira

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XI. Em 1995 encontrava-se em fase final de construção o edifício da Ré “CC, Lda.”, denominado Edifício ......., sito na A. ....... em Faro, composto por 49 fracções autónomas, destinadas a habitação, comércio e parqueamento automóvel, descrito na CRP de Faro sob o nº .....da (então) Freguesia da Sé46. Acrescente-se ainda que dado inexistir qualquer madeira fornecida à assistente pela sociedade "LL, L.da,", quanto ao referido em 21 designadamente, o arguido GG dava ordens aos trabalhadores da sucursal de que era gerente para que assinassem um documento da empresa designado por ”Nota de Entrada" que era suporte do registo contabilístico de entradas no inventário de existências da BB — sem que aquele material constante da “Guia de Remessa" respectiva fosse contado fisicamente, alegando que o mesmo se encontrava em obras de outros clientes e desta forma logrando ocultar a sua actuação, induzindo em erro a assistente.     45.O valor desta madeira que o arguido HH recebeu mas facturada em nome da LL, Lda." ascendeu a 15.039.810$00;