Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
538/14.2TVLSB.L1.S1
Nº Convencional: 7ª SECÇÃO
Relator: ANTÓNIO SILVA GONÇALVES
Descritores: CONTRATO DE SWAP
PACTO ATRIBUTIVO DE JURISDIÇÃO
REGULAMENTO (CE) 44/2001
CLÁUSULA CONTRATUAL GERAL
TRIBUNAL COMPETENTE
Data do Acordão: 04/21/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO EUROPEU - COMPETÊNCIA JUDICIÁRIA EM MATÉRIA CIVIL E COMERCIAL.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - TRIBUNAL / COMPETÊNCIA / COMPETÊNCIA INTERNACIONAL / COMPETÊNCIA INTERNA / COMPETÊNCIA EM RAZÃO DA MATÉRIA / EXTENSÃO E MODIFICAÇÕES DE COMPETÊNCIA / PACTOS ATRIBUTIVOS DE JURISDIÇÃO.
Doutrina:
- Gomes Canotilho, Direito Constitucional, 913.
- José Alberto dos Reis, Comentário…, 1.º, 106.
- Lebre de Freitas, “Código de Processo Civil” Anotado, I, 124.
- Miguel Teixeira de Sousa, A Competência Declarativa dos Tribunais Comuns, 36.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 62.º, 65.º, 94.º, 101.º, 102.º E 105.º, N.º 1.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGO 8.º, N.º 2.
LEI DAS CLÁUSULAS CONTRATUAIS GERAIS (LCCG): - ARTIGO 19.º, N.º1, AL. G).
Legislação Comunitária:
CONVENÇÃO DE BRUXELAS DE 27/09/1968: - ARTIGO 23.º.
REGULAMENTO (CE) N.º 44/2001, DE 16-01: - ARTIGOS 23.º, 66.º.
REGULAMENTO (UE) N.º 1215/2012, DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO, DE 12/12/2012.
REGULAMENTO N.º 44/2001, DO CONSELHO, DE 22.12.2000 (QUE VEIO SUBSTITUIR A CONVENÇÃO DE BRUXELAS DE 1968 NA PARTE QUE DIZ RESPEITO À COMPETÊNCIA JUDICIÁRIA): – ARTIGOS 1.º, N.º1, 2.º, N.º1, 3.º, N.º1, 60.º, N.º1.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

-DE 12.06.1997, BMJ, 468.º, 324.
-DE 11.02.2015, DISPONÍVEL EM WWW.DGSI.PT.
-DE 26.01.2016, DISPONÍVEL EM WWW.DGSI.PT.
-DE 04.02.2016, DISPONÍVEL EM WWW.DGSI.PT.
Jurisprudência Internacional:
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DA UNIÃO EUROPEIA:

- ACÓRDÃOS OWUSU (PROCESSO C- 281/02), DE 01-03-2005; LINDNER (PROCESSO C- 327/10), DE 17-11-2011 E MALETIC (PROCESSO C-478/12), DE 14-11-2013.
Sumário :
I - Do que está proposto no art. 23.º do Regulamento (CE) n.º 44/2001 de 16-01 podemos inferir que, para a confirmação da competência de um tribunal de um Estado-Membro da CE para julgar os litígios surgidos entre as partes relativamente a “uma determinada relação jurídica”, basta que pelo menos um dos sujeitos processuais se encontre domiciliado em território de um Estado-Membro e que o pacto atributivo da competência abranja, igualmente, um tribunal de outro Estado-Membro.

II - O que o Regulamento (CE) n.º 44/2001 de 16-01 quis apadrinhar foi a ideia de que, circunscrevendo-se o litígio a cidadãos de cada um dos Estados-Membros, nada há que estorve que os subscritores de assinalado contrato confiram a competência para julgar os eventuais futuros litígios a um Estado-Membro diferente daquele em que ambas as partes estão domiciliadas, para tanto bastando que os interesses no contrato protegido se não contenham completamente cingidos ao espaço territorial do Estado-Membro em que as partes movimentem as suas conveniências patrimoniais.

III - Os contratos de swap (contratos derivados) celebrados pelas partes, uma exigência da moderna atividade bancária e empresarial sustentada na ideia de que cada vez mais as previsões económicas se tornam inalcançáveis, são eles próprios intrinsecamente caracterizados como ajustes de natureza internacional, conotados com a ligação a outro Estado-Membro – são contratos de cariz internacional, redigidos em inglês, sujeitos à lei inglesa, com terminologia anglo-saxónica –  e de molde a caracterizarem a “estraneidade”  estabelecida pelo art. 23.º da Convenção de Bruxelas.

IV - A validade do pacto de jurisdição, constante de uma cláusula contratual geral integrada num contrato, há-de ser ponderada unicamente nos termos em que o consente o que está descrito no art. 23.º do Regulamento (CE) n.º 44/2001 de 16-01, sendo inaplicável o regime jurídico interno das cláusulas contratuais gerais e estando proibidos os Estados-Membros de acrescentarem outros requisitos de validade a essa convenção. Quer isto dizer que, atenta a autonomia e o exclusivismo do normativo inserto no art 23.º do Regulamento n.º CE 44/2001, fica prejudicada a abordagem da eventual aplicação do disposto em normas de direito nacional exauridas nos arts. 94.º do NCPC (2013) e 19.º, n.º 1, al. g), da LCCG.

Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça




AA, S.A.” intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo comum e forma ordinária, contra o “BB, S.A.”, pedindo que sejam declarados nulos especificados contratos de swap (contratos derivados), restituindo-se o à autora o montante de € 2.809.662,49, acrescido de juros de mora à taxa comercial vincendos e vencidos até restituição integral do montante peticionado.

Caso assim não se entenda, pede a autora, subsidiariamente, que seja reconhecida a resolução dos contratos de derivados financeiros em crise, com fundamento na alteração das circunstâncias; e, caso assim não se entenda, pede, subsidiariamente, que o réu seja declarado civilmente responsável pelos danos causados à autora.


Não obstante, nos termos do contrato ISDA celebrado entre a autora e o réu (cláusula 13 do ISDA Master Agreement (cfr. doc. n.º 1) tenha sido atribuída competência aos tribunais ingleses para dirimir qualquer litígio referente à validade, interpretação e execução do desse mesmo contrato, sustenta a autora que, porque é em Lisboa que se situa a sede do réu, são competentes para apreciar esta acção os tribunais judiciais de Lisboa, tudo porque este pacto de jurisdição encontra-se fora do escopo do n.º 1 do artigo 23.º do Regulamento (CE) n.º 44/2001 do Conselho, de 22 de Dezembro de 2000, na versão actualmente em vigor (“Regulamento de Bruxelas”), que determina que as partes, com sede em Estados-Membros da União Europeia, podem convencionar que “um tribunal ou os tribunais de um Estado-Membro têm competência para decidir quaisquer litígios que tenham surgido ou possam surgir de uma determinada relação jurídica.

Tanto a autora como o réu são pessoas colectivas portuguesas, o contrato que está na base da presente acção foi celebrado em Portugal e o lugar do cumprimento da integralidade das obrigações dele decorrentes é em Portugal.

Estamos, pois, perante uma situação jurídica puramente interna, que não apresenta nenhuma conexão com o território de qualquer outro estado, pelo que não se encontra preenchido o pressuposto espacial de aplicação do Regulamento de Bruxelas e, em virtude dessa consequente inaplicabilidade, aplicar-se-ão as disposições que regem esta matéria, constantes do Código de Processo Civil, conclui a autora.

    

Cumulativamente, o pacto de jurisdição sempre seria inválido por aplicação do regime das cláusulas contratuais gerais plasmado no Decreto-lei n.º 446/85, de 25 de Outubro.

De acordo com a alínea g) do artigo 19.º deste diploma, são proibidas as cláusulas contratuais gerais que estabeleçam um foro competente que envolva graves inconvenientes para uma das partes, sem que os interesses da outra o justifiquem.

A escolha dos tribunais ingleses representa graves inconvenientes para a autora (custos de deslocação, não domínio da língua estrangeira, custos mais elevados com a defesa, etc.) sem que exista um interesse atendível da parte do réu que justifique tal escolha.

De facto, uma vez que as duas partes são portuguesas e todos os elementos de conexão do contrato se relacionam com a ordem jurídica portuguesa, não existe um interesse do réu que deva ser aqui tido em conta.

Para além do mais, todo o direito imperativo português é aplicável ao presente litígio, pelo que um tribunal estrangeiro teria dificuldades acrescidas para o dirimir de forma adequada.



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Fundamentada no despacho de adequação formal proferido a fls. 3316-3317 e considerando que nesta fase processual está apenas em discussão e apreciação a exceção dilatória da incompetência internacional dos tribunais portugueses, o tribunal da 1.ª instância, depois de inquirir as testemunhas indicadas pelas partes no que tange à matéria controvertida respeitante a tal exceção, proferiu a seguinte decisão:

Pelo exposto, julgo a exceção dilatória da violação de pacto privativo de jurisdição procedente por provada e, em consequência, absolvo a Ré da instância.


Desta decisão apelou a demandante para a Relação de Lisboa, que alegou e concluiu pela forma seguinte:

1. Na sentença, considerou-se, erradamente, o pacto privativo de jurisdição celebrado pelas partes válido e eficaz à luz do ordenamento jurídico português e, como tal, o réu, ora recorrido, foi absolvido da instância, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 278.º, n.º 1, a), do CPC.

2. A sentença merece vários reparos, tendo violado o artigo 23.°, n.º 1, do Regulamento de Bruxelas bem como o artigo 94.°, n.º s 1 e 3, do CPC, e o artigo 19.°, g), da LCCG.


A. Carácter puramente interno da relação jurídica em crise.

3. A aplicação do Regulamento de Bruxelas pressupõe a existência de uma relação jurídica transnacional, ou seja de um elemento de estraneidade que ligue a relação jurídica a mais do que uma jurisdição, tal como reconhecido na Sentença recorrida e como o demonstram inequivocamente os Acórdãos Maletic, Owusu e Lindner.

4. No caso vertente, não há nenhum elemento do tipo dos elencados na jurisprudência do TJUE - cfr. Acórdãos Maletic, Owusu e Linder - susceptível de conferir carácter transnacional à relação jurídica em crise, visto que ambas as partes são pessoas colectivas de direito português, os contratos em crise foram celebrados em Portugal e o lugar do cumprimento da integralidade das obrigações deles decorrentes é também em Portugal.

5. Contrariamente ao que pretende o Recorrido, a internacionalidade do litígio não pode fundar-se: (i) no facto de os contratos de financiamento celebrados pela Recorrente com terceiros possuírem elementos de conexão com outras ordens jurídicas; (ii) no uso da língua inglesa; (iii) na aplicação da lei inglesa; (iv) no facto de estarmos perante um produto importado que se insere num mercado internacional; (v) na suposta actuação do Recorrido como mero intermediário; (vi) no facto de o capital social do Recorrido ser detido por uma pessoa colectiva estrangeira; (vii) na possibilidade, nunca concretizada, de o Recorrido poder fazer e receber pagamentos através das suas filiais em Londres e no Luxemburgo ou (viii) na escolha pelas partes do contrato ISDA (aqui enquadrado como lex mercatoria).

6. Não há qualquer ligação entre os contratos de mútuo celebrados pelo Recorrente e os swaps em crise, já que os segundos não contêm qualquer referência aos primeiros, sendo a respectiva existência totalmente autónoma.

7. Ademais, como salienta o Recorrido na sua contestação, a abstracção relativamente à realidade subjacente é característica dos derivados em geral: de facto, e como de resto aconteceu no caso do swap de 2006, o contrato de mútuo, mesmo que sirva de referência a um contrato swap, pode ser resolvido antecipadamente sem que isso implique a resolução automática do contrato swap.

8. Os swaps em crise não têm qualquer relação material com os supostos financiamentos subjacentes, conforme alegado na petição inicial.

9. Seria absurdo que a redacção de um contrato numa língua estrangeira ou a mera escolha de uma lei estrangeira - que só será efectiva na medida em que não contrarie as disposições imperativas da lei portuguesa, nos termos do artigo 3.°, n.º 3, da Convenção de Roma - fosse critério bastante de transnacionalidade para este efeito.

10. Mais se diga que sustentar a transnacionalidade da relação jurídica com base na adopção do contrato ISDA - do qual consta o pacto privativo de jurisdição controvertido - conduz a um evidente vício de raciocínio, o qual consiste numa petição de princípios.

11. Não pode ser o contrato ISDA a validar a cláusula privativa de foro constante do próprio modelo ISDA, sob pena de, para além do vício lógico identificado, se desconsiderarem múltiplos elementos que concorrem para a qualificação de uma dada relação como interna ou como internacional.

12. A Sentença procurou definir o contrato ISDA como exemplo de uma nova lex mercatoria, cuja especial uniformidade facilitaria o conhecimento pelos interessados do regime legal aplicável. A mera adopção do contrato ISDA seria, por si só, elemento de transnacionalidade suficiente para caracterizar qualquer relação jurídica abrangida pelo seu escopo como internacional.

13. Acontece, porém, que o contrato ISDA é, conforme aliás foi dado como provado na Sentença, um mero modelo, cujo elevado grau de padronização e de pré-formatação visa facultar às partes um quadro pré-definido quanto às regras aplicáveis no âmbito das relações por si abrangidas.

14. Ora, as circunstâncias descritas não são de molde a localizar imediatamente as relações sujeitas ao contrato ISDA no plano internacional.    

Nada obsta a que relações jurídicas puramente internas - como sucede no presente caso - se subordinem ao contrato ISDA. Todavia, a circunstância de se tratarem de relações internas, o que decorre de um conjunto de circunstâncias exógenas relativamente ao teor do próprio contrato, inquina o pacto de jurisdição ali vertido.

15. O mesmo se diga relativamente à alegação de que estamos perante um produto importado que se insere num mercado internacional.

16. Trata-se de um contrato de balcão (“over lhe counter") e não de um contrato transaccionado em mercado organizado, pelo que não se vislumbra o conteúdo material destes dois conceitos.

17. O facto de os contratos swap usarem como referência a taxa Euribor não pode obviamente ser critério para os definir como contratos internacionais.

Usando tal argumentação, cairíamos no absurdo de sustentar que todos os contratos que tomam como referência esta taxa, incluindo, por exemplo, os contratos de crédito à habitação celebrados entre bancos e cidadãos nacionais, domiciliados em Portugal, seriam ipso facto contratos internacionais.

18. O Recorrido não actuou como mero intermediário nos contratos swap.

19. A Recorrente nunca teve conhecimento, nem aquando da celebração dos contratos, nem ao longo da respectiva execução, de que o Recorrido tenha celebrado contratos simétricos com terceiros ou quem seriam esses terceiros, sendo que, em todo o caso, tais contratos não têm qualquer relação jurídica com os contratos aqui em disputa.

20. O facto de o Recorrido pertencer a um grupo internacional não é relevante para este efeito.

21. Se assim fosse, bastaria a existência de um accionista domiciliado além-fronteiras para que estivéssemos perante uma situação transnacional; tal corresponderia, desde logo, à desconsideração da autonomia jurídica da entidade contratante.

22. Todos estes elementos foram erradamente considerados pelo Tribunal a quo como relevantes para caracterizarem a situação em crise como transnacional, ainda que de forma acessória.

23. Contrariamente ao decidido no Acórdão, o facto de, ao abrigo do contrato ISDA, o Recorrido poder receber e fazer pagamentos através das filiais em Londres e no Luxemburgo, não configura elemento de estraneidade relevante.

24. Tal implicaria que através de mera referência contratual, e independentemente da sua verificação factual, se poderia afastar a competência dos tribunais portugueses para dirimir uma situação puramente interna.

25. Não se compreende como pode ser dada relevância a uma possibilidade prevista como meramente hipotética num contrato-quadro que servirá em teoria para regular uma infinidade de transacções por um período de tempo indefinido e não ao que concretamente foi estipulado para as transacções swap ora em discussão.

26. As próprias Confirmations (contratos que documentam as transacções ora em crise e que prevalecem sobre o ISDA e o Schedule) não prevêem a possibilidade de o Recorrido actuar através das suas filiais em Londres ou no Luxemburgo, estabelecendo antes que o Recorrido actuaria sempre através da sua sede, sita na Rua …, n.º 75, 1100- Lisboa.

27. Assim, nas transacções ora em discussão, a utilização das filiais em Londres e no Luxemburgo pelo Recorrido não só não aconteceu (como já vimos o local de cumprimento das obrigações foi Portugal) como nem sequer era uma possibilidade concreta prevista pelas partes nas Confirmations.

28. A teleologia subjacente à exigência de um elemento efectivo de estraneidade como pressuposto de aplicação do Regulamento de Bruxelas prende-se com a necessidade de garantir que cada Estado-Membro mantenha jurisdição efectiva sobre disputas puramente internas, desiderato que manifestamente se frustraria caso fossem considerados relevantes elementos de conexão ténues e, ou, artificiais.

29. Caso assim não fosse - ou através de construções de maximalismo extremo do conceito de elemento de estraneidade - permitir-se-ia a atribuição de competência à jurisdição de um Estado membro para dirimir litígios que dizem exclusivamente respeito a um outro Estado membro.

30. Ora, de tal interpretação decorreria que a jurisdição nacional passaria a ser meramente facultativa o que não foi, nem poderia ter sido, a intenção do legislador europeu. Desde logo, semelhante interpretação violaria frontalmente os princípios da proporcionalidade e da subsidiariedade que enquadram o processo legislativo europeu.

31. O que releva neste âmbito é a nacionalidade, o domicílio das partes bem como o local efectivo do cumprimento contratual, conforme jurisprudência do TJUE acima referida.

32. Não se conhece nenhuma decisão de qualquer destes tribunais que tenha fundamentado a internacionalidade do litígio em qualquer outro elemento.

33. Estamos, pois, perante uma situação jurídica portuguesa puramente interna, que não apresenta nenhuma conexão com o território de qualquer outro Estado, pelo que não se encontra preenchido o pressuposto espacial ou pessoal de aplicação do Regulamento de Bruxelas.


B. Inadmissibilidade do pacto de jurisdição à luz do artigo 94.º do CPC.

34. Sendo inaplicável o Regulamento de Bruxelas, a designação convencional da jurisdição competente para conhecer dos litígios eventualmente decorrentes de certa relação jurídica tem de se conformar com o disposto no artigo 94.º do CPC, que pressupõe, entre outros requisitos, cumulativamente que: (i) a relação controvertida tenha conexão com mais de uma ordem jurídica; (ii) [a designação seja] justificada por um interesse sério de ambas as partes ou de uma delas, desde que não envolva inconveniente grave para a outra.

35. Conforme exposto, a situação é puramente interna sendo, que cumulativamente, a escolha da jurisdição inglesa não é justificada por um interesse sério das partes, conforme se reconhece na Sentença recorrida, envolve inconveniente grave para a Recorrente.

36. Aliás, a escolha da jurisdição inglesa envolve grave inconveniente para o Recorrente.

Efectivamente, a distância, os custos decorrentes de litigar no estrangeiro, a língua a adoptar no processo, bem como a circunstância de a Recorrente não ter qualquer experiência em litígios do mesmo género e perante jurisdições estrangeiras, constituirão obstáculos insuperáveis a uma defesa eficaz dos seus interesses.

37. Entre custas judiciais, honorários de advogados, honorários de peritos e outros custos, incluindo traduções, a Recorrente precisaria de, no mínimo, despender dois milhões de euros para conduzir um litígio deste tipo perante os tribunais ingleses.

38. O facto de todo o direito imperativo português ser aplicável, por força do artigo 3.º, n.º 3, da Convenção de Roma, à discussão material do litígio constitui, evidentemente, um obstáculo de monta, i.e., um grave inconveniente, à respectiva dirimição por um tribunal de uma jurisdição estrangeira.


C. Inadmissibilidade do pacto de jurisdição à luz da LCCG.

39. Ainda que se qualificasse a relação jurídica em crise como internacional para efeitos do Regulamento de Bruxelas, exercício que se faz sem conceder, o pacto de jurisdição sempre seria inválido à luz da LCCG, designadamente do respectivo artigo 19.°, alínea g).

40. O contrato ISDA é um contrato padronizado, estando inclusivamente, as partes impossibilitadas de o alterar ao abrigo da protecção jurídica dada aos direitos de autor e direitos conexos existindo, portanto, um "pacto privativo de jurisdição assente numa cláusula elaborada de antemão, que as partes se limitaram a aceitar, cujo conteúdo não foi previamente elaborado e que o destinatário não pode influenciar, remetendo-nos, assim, para a apreciação do regime das cláusulas contratuais gerais e para a necessidade de ponderar a proteção do aderente a este tipo de negociação pré-formulada, sejam as cláusulas gerais elaboradas pelo proponente, pelo destinatário ou por terceiros (artigo 1.º n.º s 1 e 2, e artigo 2.°, do Decreto-Lei 11. 0446/85) ", conforme considerou o Tribunal da Relação de Lisboa, a propósito de documentação ISDA igual à dos presentes autos.

41. Estamos, claramente, perante um contrato padronizado, pré-elaborado por uma entidade estranha à relação contratual, sendo que, atentas as circunstâncias do caso concreto, elencadas supra, existem graves inconvenientes na escolha da jurisdição inglesa para a Recorrente sem que exista um interesse sério do Recorrido.

42. A Recorrente, enquanto investidor não qualificado, é equiparada a consumidor para efeitos de aplicação da LCCG, nos termos do artigo 321.º, n.º 3, do Código dos Valores Mobiliários.

Termina pedindo que seja revogada a sentença recorrida que declarou o Tribunal a quo incompetente.


Contra-alegou o recorrido/réu “BB, S.A.” pedindo a manutenção do julgado e requerendo, nos termos do disposto no artigo 678.º do Código de Processo Civil, que o RECURSO SEJA PER SALTUM PARA O SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA, porquanto o recurso per saltum é admissível:

a) A decisão recorrida pela 1.ª instância pôs termo ao processo, pelo que se inclui nas decisões referidas no n.º 1 do artigo 644.º do CPC;

b) O valor da causa e da sucumbência (€ 2.809.662,49) é superior ao da alçada da Relação;

c) As partes suscitaram apenas questões de direito; e

d) As partes não impugnaram qualquer decisão interlocutória.

 

Corridos os vistos legais, cumpre decidir.

    

Com relevância para a apreciação da exceção, a sentença recorrida considerou provados os factos seguintes:

1. A A. é uma empresa pública regional, sob a forma de sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos, que prossegue fins de interesse público, regendo-se pela lei comercial e pelos seus estatutos, aprovados pelo Decreto Legislativo Regional n.º 9/2001/M, de 10 de Maio (alterado pelo Decreto Legislativo Regional n.º 11/2002/M de 16 de Julho).

2. A A. tem por objeto a conceção, promoção, construção e gestão de projetos, ações e empreendimentos que contribuam de forma integrada para o desenvolvimento económico, social, desportivo e cultural dos concelhos de Porto Moniz, São Vicente e Santana.

3. No âmbito do desenvolvimento da sua atividade e da prossecução do seu objeto social, a A. celebrou os seguintes contratos de financiamento como mutuária:

- Contrato de financiamento datado de 13 de Dezembro de 2002 (alterado a 17 de Janeiro de 2003), sendo co-mutuárias da A. a CC, S.A., a DD, S.A., a Sociedade de Desenvolvimento do …, S.A. e a EE, Sociedade Gestora, S.A. - em conjunto as “Empresas Públicas Regionais” - e mutuante a FF B.V. (“FF”), no montante de € 190.000.000,00, com vencimento em 2022 (cf. documento de fls. 88-121, cujo teor se dá por reproduzido)

- Contrato de financiamento datado de 30 de Outubro de 2007, sendo as Empresas Públicas Regionais igualmente co-mutuárias da A. e mutuantes o Banco GG, S.A. (“Banco GG”) e o Banco HH, S.p.A. (“Banco HH”), no valor de € 125.000.000,00, com vencimento em 2032 (cf. documento de fls. 125-158, cujo teor se dá por reproduzido).

4. A taxa de juro estabelecida em ambos os contratos encontrava-se indexada à taxa de juro Euribor a seis meses.

5. Neste contexto, tornou-se imperativo cobrir o risco da flutuação de tais taxas de juro, pelo que a A. procedeu à contratação de dois contratos de derivados financeiros com o R..

6. Com data de 13.6.2006, a Autora - representada por II e por JJ - e a ré subscreveram o denominado “Contrato quadro” junto a fls. 56-72 (versão em inglês) cuja tradução está junta a fls. 2908-2921 (10º Vol.), cujo teor se dá por reproduzido.

7. Nos termos do Ponto 13 do acordo referido em 1, «13. Lei aplicável e Jurisdição

a) Lei Aplicável. O presente Contrato rege-se pela lei indicada no Anexo, sendo interpretado em conformidade com essa mesma lei.

b) Jurisdição. Com respeito a qualquer processo, ação ou procedimento relativo ao presente Contrato (“Processos”), cada parte, irrevogavelmente:

(i) submete-se à jurisdição dos tribunais ingleses, caso se estipule que o presente Contrato é regulado pelo direito inglês, ou à jurisdição não exclusiva dos tribunais do Estado de Nova Iorque e do Tribunal Federal de Primeira Instância (district court) dos Estados Unidos situado no Burgo de Manhattan na Cidade de Nova Iorque, caso se estipule que o presente Contrato é regulado pelas leis do Estado de Nova Iorque; e

(ii) renuncia às objeções que possa em qualquer momento ter em relação ao foro de qualquer Processo instaurado em qualquer um desses tribunais, renuncia a todas as alegações de que esse Processo foi instaurado em foro inadequado e, em acréscimo, renuncia ao direito de alegar, com respeito a esse Processo, que o tribunal não tem competência sobre essa parte.

Nenhuma disposição contida neste Contrato impede qualquer uma das partes de instaurar Processos em qualquer outra Jurisdição (fora, caso se estipule que o presente Contrato é regulado pelo direito inglês, dos Estados Contratantes (contracting states) na aceção do Artigo 1 (3) da Lei da Jurisdição e Sentenças Civis de 1982 (Civil Jurisdiction and Judgments Act 1982), com as alterações, aditamentos ou promulgações que estiverem em vigor na data em questão), e a instauração de Processos numa ou mais jurisdições não impede a instauração de Processos em qualquer outra jurisdição.»

8.   Juntamente com o ISDA Master Agreement, a Autora e o Banco BB assinaram, em 8 de Março de 2007 (e com os efeitos reportados a 13 de Junho de 2006) a Schedule to the ISDA Master Agreement (Anexo)junto a fls. 247-266 (versão em inglês) cuja tradução está junta a fls. 3048-3053 (11º vol.), cujo teor se dá por reproduzido.

9.   Na Schedule to the ISDA Master Agreement constam as seguintes cláusulas:

a)Parte 4: Disposições Diversas

(c) Escritórios. O disposto na Cláusula 10 (a) é aplicável ao presente Contrato.

(d) Parte com Várias Sucursais. Para efeitos do disposto na Cláusula 10(c) do presente Contrato:-

A Parte A não é uma Parte com Vária Sucursais.

A Parte B é uma Parte com Várias Sucursais e pode atuar através dos Escritórios em Londres e Luxemburgo.

(...)

(h) Lei Aplicável. O presente Contrato rege-se pela lei inglesa, sendo interpretado de acordo com a mesma lei” (...)

b)Parte 5: Disposições Diversas

(...)

(f) Declarações Adicionais. A Cláusula 3.ª é alterada sendo adicionadas as seguintes subsecções (g), (h), (i) e (j):

«(g) Atua no Contrato e em cada Transação como parte principal (e não está a agir como agente ou em qualquer outra qualidade, fiduciário ou a qualquer outro título).

(h) Atividade. Celebrou o presente Contrato (incluindo cada Transação) no âmbito da sua atividade (incluindo serviços de intermediação financeira) ou para financiar a sua atividade.

Declara e aceita que todas as transações realizadas ao abrigo do Contrato (i) serão apropriadas para a condução e gestão da sua atividade, (ii) serão realizadas sem fins especulativos, e (iii) são transações realizadas para fins de hedging ou gestão de riscos relacionados com os seus ativos ou responsabilidades assumidas, ou que venha a possuir ou a assumir no exercício da sua atividade.

(i) Não Dependência. (a) Realizou e continuará a fazer uma análise e avaliação por sua conta dos benefícios, riscos e adequação de cada transação e Documentação Relevante (como definido infra) no contexto da sua condição financeira, fiscal, regulatória, contabilística e legal, com base no aconselhamento seus assessores aconselhamento dos assessores que considerou necessários; (b) a outra parte não está a atuar como seu fiduciário, agente ou conselheiro em relação a qualquer transação e não se baseou, não se está a basear e não se vai basear em qualquer comunicação da outra parte, tratando-se ou não de uma declaração ou garantia, feita pela outra parte em relação a qualquer transação exceto o expressamente previsto na Cláusula 3.ª do Contrato ou na Documentação Relevante (c) não se está a basear em qualquer comunicação (escrita ou oral) da outra parte como conselho de investimento ou como recomendação para realizar aquela transação; (d) no entendimento de que as informações e explicações relativas aos termos e condições de uma transação não devem ser consideradas conselho de investimento ou recomendação para realizar aquela transação. Nenhuma comunicação (escrita ou oral) recebida da outra parte deve presumir-se assegurar ou garantir os resultados esperados daquela transação.

«Documentação Relevante» significa o Contrato, qualquer Documento de Garantia de Crédito ou qualquer Confirmação».

10. A contratação pela A. junto do R. de um instrumento derivado, para cobertura do financiamento no montante de € 190.000.000, decorreu no âmbito de uma operação integrada de cobertura de risco de taxa de juro, a que se refere a Resolução n.º 1207/2005, de 18 de Agosto (cf. documento de fls. 198-207, cujo teor se dá por reproduzido).

11. Neste âmbito, o R. foi selecionado para a apresentação final de cotação de fecho das Operações.

12. Na sequência do processo de negociação acima descrito, foram celebrados entre as partes os seguintes contratos de swap de taxa de juro:

N.º  MontanteNocional  DataInício  DataMaturidade  Passivo ubjacente

120   21.000.000,00   09-06-2008  08-11-2032  Empréstimo GG/HH EUR 125M

139  21.147.000,00  11-05-2006  13-12-2022   Empréstimo FF EUR 190M

13. Ambas as transações foram suportadas pelo acordo referido em 6 e 7. de acordo com o modelo elaborado pela InternationalSwaps and Derivativaties Association Inc. (doravante "ISDA").

14. Ao abrigo do acordo referido em 6 e 7 r as partes podem concluir várias transações contratuais (geralmente por telefone ou por via eletrónica).

15. Posteriormente, estas transações são reduzidas a escrito num documento do qual constam os respetivos termos e condições (doravante, "Confirmation").

16. A sede do Réu é em Lisboa.

17. Ambas as partes no contrato são portuguesas.

18. A escolha dos tribunais ingleses representa graves inconvenientes para a A. (custos de deslocação, não domínio da língua estrangeira, custos mais elevados com a defesa).

19. Os contratos referidos em 6 a 8 e 12 foram celebrados em Portugal.

20. A taxa Euribor é usada como referência para o cálculo das prestações das partes.

21. O contrato ISDA é um contrato padronizado, pré-elaborada por uma entidade estranha à relação contratual.

22. Nos termos desse contrato, as partes apenas podem atribuir competência à jurisdição inglesa ou à jurisdição do Estado de Nova Iorque, através do Schedule.

23. A Autora fez da assinatura do ISDA uma condição do concurso porquanto no convite solicita-se as declarações de aceitação do ISDA Master Agreement "como condição de participação nas operações financeiras".

24. O Banco BB é detido em 99.89% pelo Banco BB, um banco com sede em Espanha.

25. O Banco BB atuou na qualidade de banco internacional consoante referido sob 35.

26. A RAM já sabia que o Banco BB atuava no mercado de derivados na qualidade de banco internacional porquanto já tinha celebrado um ISDA Master Agreement com o Banco KK em 2002 (na altura já detido pelo Banco BB) de acordo com o qual o Banco KK era considerado Multibranch Party, podendo fazer e receber pagamentos em qualquer transação também através da sua filial em Londres ou nas Ilhas Caimão.

27. O swap de 2006 (referido em 12) visa reduzir a exposição à variação da taxa de juro do financiamento da FF, B.V. e tal objetivo consta expressamente do convite formulado pela RAM.

28. A FF, B.V. é uma sociedade com sede na Holanda.

29. O contrato de financiamento da FF, BV, é redigido em inglês, com o contributo da sociedade de advogados inglesa Allen and Overy, e prevê que os pagamentos dos mutuários devem ser efetuados para a conta do banco HSBC Bank plc, em Londres, em datas definidas por referência ao fuso horário de Londres, e está sujeito à lei inglesa e aos tribunais ingleses.

30. Relativamente ao swap de 2008, também o contrato de financiamento subjacente é redigido em inglês e celebrado por um banco estrangeiro: a Banca HH S.p.A.

31. Um dos fundamentos pelos quais as partes escolheram os tribunais ingleses para dirimir os litígios relativos a produtos financeiros foi o de que os contratos de swap (que integram o ISDA Master Agreement) são contratos de cariz internacional, redigidos em inglês, sujeitos à lei inglesa, com terminologia anglo-saxónica.

32. A taxa Euribor é relacionada com o mercado europeu e não apenas com o mercado interno português.

33. O Banco BB agiu como mero intermediário nos contratos de swap, uma vez que celebrou contratos simétricos com o Banco BB, com sede em Espanha.

34. Os swaps são um produto do mercado internacional em que os bancos atuam como intermediários de partes localizadas em diferentes ordenamentos jurídicos.

35. Ciente de que se trata de um mercado internacional é que o convite da RAM foi endereçado a bancos internacionais, sendo que o Banco BB se apresentou na qualidade de banco internacional, designadamente com filiais em Londres e Luxemburgo.

36. Quem não segue a forma standard (ISDA Master Agreement) está a criar obstáculos à transação do produto nesse mercado, o que prejudica o adquirente.

37. A RAM foi assessorada pelo Banco LL entre novembro de 2005 e julho de 2006 e pela sociedade de advogados MM & Associados em dezembro de 2005.

38. Ao atuar da forma descrita em 23, a Autora foi a proponente da cláusula do foro, não tendo sugerido à Ré qualquer alteração à cláusula referida sob 7.

39. O Banco BB apresentou propostas de alteração do ISDA Master Agreement.




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A autora “AA, S.A.” celebrou com o réu “BB, S.A.”, como mutuária, dois pormenorizados contratos de financiamento - contratos de swap (contratos derivados): a taxa de juro estabelecida em ambos os contratos encontrava-se indexada à taxa de juro Euribor a seis meses e, neste contexto, tornou-se imperativo cobrir o risco da flutuação de tais taxas de juro.

No que diz respeito à “lei aplicável e jurisdição” (ponto 13 do acordo - Lei aplicável e Jurisdição) assentaram as partes em que os contratos assim subscritos se regem pela lei indicada no Anexo integrante do acordado e que “com respeito a qualquer processo, ação ou procedimento relativo ao presente Contrato (“Processos”), cada parte, irrevogavelmente, se submete à jurisdição dos tribunais ingleses, caso se estipule que o presente Contrato é regulado pelo direito inglês, ou à jurisdição não exclusiva dos tribunais do Estado de Nova Iorque e do Tribunal Federal de Primeira Instância (district court) dos Estados Unidos situado no Burgo de Manhattan na Cidade de Nova Iorque, caso se estipule que o presente Contrato é regulado pelas leis do Estado de Nova Iorque”.

Houve renúncia às objeções que possam em qualquer momento ter em relação ao foro de qualquer processo instaurado em qualquer um desses tribunais, renúncia a todas as alegações de que esse processo foi instaurado em foro inadequado e, em acréscimo, ao direito de alegar, com respeito a esse processo, que o tribunal não tem competência sobre essa parte.


A demandante “AA, S.A.” vem pedir na ação que sejam declarados nulos estes contratos de swap (contratos derivados), restituindo o Banco demandado à autora o montante de € 2.809.662,49, acrescido de juros de mora à taxa comercial vincendos e vencidos até restituição integral do montante peticionado.


A 1.ª instância julgou a exceção dilatória da violação de pacto privativo de jurisdição procedente por provada e, em consequência, absolveu o réu da instância.


É contra esta decisão que a autora reage neste recurso “per saltum” para este Supremo Tribunal, arguindo que o pacto privativo de jurisdição celebrado pelas partes é inválido e ineficaz à luz do ordenamento jurídico português e por violação do artigo 23.°, n.º 1, do Regulamento de Bruxelas, do artigo 94.°, n.º s 1 e 3, do C.P.Civil e  do artigo 19.°, g), da LCCG.

 


Vamos procurar demonstrar que não assiste razão à recorrente.


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I. Das regras de incompetência internacional é que sobressai a designada incompetência absoluta, desta forma balizando o exercício da função jurisdicional pelo conjunto dos tribunais portugueses no quadro de relações jurídicas confrontadas com mais de uma ordem jurídica estrangeira.

O critério a seguir para desvendar este conflito de jurisdições é o que está contido no art.º 62.º do C.P.Civil[1], nele se indicando as circunstâncias de que depende a competência internacional dos tribunais portugueses, isto é, traçando a órbita dentro da qual se move a jurisdição portuguesa em confronto com as jurisdições estrangeiras.[2]

   

Do cotejo do que dispõem o art.º 62.º do C.P.Civil e do que se estatui no n.º 2 do art.º 8.º da nossa Lei Fundamental[3] poderemos dizer que neste contexto se dá especial prevalência ao que vem estabelecido em tratados, convenções, regulamentos comunitários e leis especiais e às normas constantes de convenções internacionais regularmente ratificadas ou aprovadas vigoram na ordem interna após a sua publicação oficial e enquanto vincularem internacionalmente o Estado Português, anotando-se a este propósito que a nossa Constituição terá, assim, aderido "à tese da recepção automática, condicionada apenas ao facto de a eficácia interna depender da sua publicação oficial" e que a ideia do legislador constituinte foi a de aceitar a vigência das normas internacionais como tais e não como normas internas.[4]

  

Concretizando estes conceitos temos que, aferindo as regras de competência internacional, o regime jurídico a ter em conta no modo de exercício da função jurisdicional afecta ao tribunais portugueses no que há de comum quanto a situações jurídicas que estão em contacto com outra ordem jurídica estrangeira, há-de ser o que advier a cada caso concreto atinente ao estatuído na norma de competência pontificada no art.º 65.º do C.P.Civil e, ainda, do que estiver regulado nas convenções internacionais pelo Estado Português assumidas.

Outrossim, no contexto de termos de tomar uma opção de ordem selectiva, cumpre fazer notar que no seu campo específico de aplicação as convenções internacionais prevalecem sempre sobre as normas processuais portuguesas,[5] princípio que vem sido também observado pelo nosso Supremo Tribunal inequivocamente, decidindo nesta conformidade - as normas da Convenção de Bruxelas de 27.09.1968, respeitantes à competência internacional, prevalecem sobre os artigos 65.º, 65.º -A, 99.º,  1094 A e 1102.º do C.P.Civil.[6]

    

O Regulamento n.º 44/2001, do Conselho, de 22.12.2000, integra as disposições que definem a competência dos tribunais dos Estados comunitários, consubstanciando um peculiar diploma legislativo que absorve, derrogando-as, as normas reguladoras da competência internacional previstas na lei interna de cada Estado-Membro e mantendo a vigência da lei de cada Estado tão-só quando a especificada situação particular em exame se não compreender no âmbito de aplicação daquele Regulamento.

Tratando-se da abordagem de regras de incompetência internacional, isto é, de legislação que condiciona o exercício da função jurisdicional dos tribunais portugueses e cuja infracção determina a absolvição do réu da instância (artigos 101.º, 102.º e 105.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), a apreciação desta excepção dilatória, uma condição necessária para que o tribunal se possa pronunciar sobre o mérito da causa através de uma decisão de procedência ou de improcedência, terá de ser ajuizada à luz do pedido e da causa de pedir formulados pelo autor na petição inicial e/ou completada pelos dados transcritos pelo réu na sua contestação, circunscrita à parte em que suscita a dita excepção dilatória - como qualquer outro pressuposto processual, a competência é aferida em relação ao objecto apresentado pelo autor. [7]


Visou este Regulamento - Regulamento n.º 44/2001, do Conselho, de 22.12.2000 - que veio substituir a Convenção de Bruxelas de 1968 na parte que diz respeito à competência judiciária -  unificar, no âmbito da sua aplicação, as normas de conflito de jurisdição em matéria civil e comercial, independentemente da natureza da jurisdição (artigo 1.º, n.º 1), estabelecendo a regra do domicílio como factor de conexão essencialmente relevante para determinação da competência internacional do tribunal e no sentido de que as pessoas domiciliadas no território de um Estado-Membro devem ser demandadas, independentemente da sua nacionalidade, perante os tribunais desse Estado (artigo 2.º, n.º 1) e, de forma especial, estabelecendo também que as pessoas domiciliadas no território de um Estado-Membro só podem ser demandadas perante os tribunais de um outro Estado Membro por força das regras enunciadas nas secções 2 a 7 do respectivo capítulo (artigo 3.º, n.º 1).

Por força deste Regulamento as sociedades comerciais têm domicílio no lugar em que tiverem a sua sede social, a sua administração principal ou o seu estabelecimento principal (artigo 60.º, n.º 1).


II. Argumentando que o pacto privativo de jurisdição celebrado pelas partes é nulo, inválido e ineficaz à luz do ordenamento jurídico português e por violação do artigo 23.°, n.º 1, do Regulamento de Bruxelas, do artigo 94.°, n.º s 1 e 3, do C.P.Civil e  do artigo 19.°, g), da LCCG, entende a recorrente/autora que a resolução do diferendo que opõe as partes deve ser atribuída aos tribunais portugueses, tudo porque a acção sub judice, denunciadamente, na sua estrutura processual compreende sinais - pessoas jurídicas, pedido, causa de pedir, cumprimento da obrigação - que se conjugam e intersectam apenas com a jurisdição do Estado Português.

Estamos, pois, perante uma situação jurídica puramente interna, que não apresenta nenhuma conexão com o território de qualquer outro estado, pelo que não se encontra preenchido o pressuposto espacial de aplicação do Regulamento de Bruxelas e, em virtude dessa consequente inaplicabilidade, ajustar-se-ão as disposições, que regem esta matéria, constantes do Código de Processo Civil, conclui a autora.


Será assim?

III. Pactuaram as partes que ambos os contratos de swap (contratos derivados), que subscreveram, se regem pela lei indicada no Anexo (integrante do acordado) - ficavam submetidos  à jurisdição dos tribunais ingleses, desta feita afastando a competência internacional dos tribunais portugueses para apreciar o presente pleito através de circunstanciado pacto privativo e cometendo esta competência aos tribunais ingleses.


Poderá este detalhado ajuste, atributivo da competência da presente demanda aos tribunais ingleses, estar aferido de falta autoridade jurídica de modo a torná-lo insubsistente para sujeitar os seus subscritores ao que nele se contém?


Não nos parece que assim possa ser.

Aplicando-se o Regulamento (CE) n.º 44/2001 de 16/01 “em matéria civil e comercial e independentemente da natureza da jurisdição” -  o Regulamento (UE) n.º 1215/2012, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12/12/2012, não é aplicável ao nosso caso (art.º 66.º ) -  estatui o seu art.º 23.º:

1. Se as partes, das quais pelo menos uma se encontre domiciliada no território de um Estado-Membro, tiverem convencionado que um tribunal ou os tribunais de um Estado-Membro têm competência para decidir quaisquer litígios que tenham surgido ou que possam surgir de uma determinada relação jurídica, esse tribunal ou esses tribunais terão competência. Essa competência será exclusiva a menos que as partes convencionem em contrário. Esse pacto atributivo de jurisdição deve ser celebrado:

a) Por escrito ou verbalmente com confirmação escrita; ou

b) Em conformidade com os usos que as partes estabeleceram entre si; ou

c) No comércio internacional, em conformidade com os usos que as partes conheçam ou devam conhecer e que, em tal comércio, sejam amplamente conhecidos e regularmente observados pelas partes em contratos do mesmo tipo, no ramo comercial considerado ….


Deste normativo podemos inferir que, para a confirmação da competência de um tribunal de um Estado-Membro da CE para julgar os litígios surgidos entre as partes relativamente a “uma determinada relação jurídica”, basta que pelo menos um dos sujeitos processuais se encontre domiciliado em território de um Estado-Membro e que o pacto atributivo da competência abranja, igualmente, um tribunal de outro Estado-Membro.

    

Neste enquadramento regimental, advoga a autora/recorrente que, para além do que atrás dissemos, a aplicação do Regulamento (CE) n.º 44/2001 de 16/01 (Regulamento de Bruxelas I) pressupõe também a existência de uma relação jurídica transnacional - elemento de estraneidade - que ligue a relação jurídica a mais do que uma jurisdição, o que não sucede no caso vertente.

   

Parece-nos, porém, que não é isso o que resulta do elemento filológico de interpretação tirado do sentido das palavras que integram o texto consignado naquela prescrição regulamentar.

A “ratio” de tal preconizado dispositivo aponta para a ideia de que, para a validade da estipulação da competência internacional apoiada no princípio da liberdade contratual, não deve a relação contratual em litígio qualificar-se como relação absolutamente interna em toda a sua plenitude, deste forma se aderindo ao conceito amplo do pressuposto da “internacionalidade” e que a jurisprudência do TJUE também aprova.


Para caracterizar a “estraneidade”, idealmente contida no art.º 23.º do Regulamento, é suficiente que o possível cumprimento das obrigações contratuais possa ocorrer no Estado-Membro a quem se defere a competência e que a conexão dos acordos celebrados se configure, visivelmente, como estando envolvidos no âmbito de um encadeamento de interesses financeiros de perfil internacional.

    

O que o Regulamento (CE) n.º 44/2001 de 16/01 quis apadrinhar foi a ideia de que, circunscrevendo-se o litígio a cidadãos de cada um dos Estados-Membros, nada há que estorve que os subscritores de assinalado contrato confiram a competência para julgar os eventuais futuros litígios a um Estado-Membro diferente daquele em que ambas as partes estão domiciliadas, para tanto bastando que os interesses no contrato protegido se não contenham completamente cingidos ao espaço territorial do Estado-Membro em que as partes movimentem as suas conveniências patrimoniais.


Os contratos de swap (contratos derivados) celebrados pelas partes, uma exigência da moderna atividade bancária e empresarial sustentada na ideia de que cada vez mais as previsões económicas se tornam inalcançáveis, são eles próprios intrinsecamente caracterizados como ajustes de natureza internacional, conotados com a ligação a outro Estado-Membro - são contratos de cariz internacional, redigidos em inglês, sujeitos à lei inglesa, com terminologia anglo-saxónica - e de molde a caracterizarem a “estraneidade” estabelecida pelo art.º 23.º da Convenção de Bruxelas.

Reparemos que estes contratos de swap se destinam a financiar a mutuária/autora de modo que fiquem acautelados os riscos de flutuação das taxas de juro nos empréstimos concedidos pelo Banco/réu, o Banco Santander Totta atuou na qualidade de banco internacional, estão redigidos em língua inglesa, é a lei inglesa a aplicar ao litígio e está admitida a possibilidade do seu cumprimento em Londres ou nas Ilhas Caimão, circunstancialismo jurídico-factual este que faz determinar que estamos perante uma relação contratual onde não falta a “internacionalidade” capaz de facultar o juízo de que estão verificados os requisitos do pacto de jurisdição que ora analisamos.


É por este sentido que se vem norteando o Tribunal de Justiça da União Europeia - Acórdãos Owusu (processo C- 281/02), de 01-03-2005; Lindner (processo C- 327/10), de 17-11-2011 e Maletic (processo C-478/12), de 14-11-2013.

“…Para que a escolha do tribunal seja válida é desnecessário que exista qualquer conexão entre o objecto do litígio e o tribunal designado, não sendo valoráveis, designadamente, os hipotéticos inconvenientes, para uma das partes, da localização do foro convencionado - Ac. STJ de 04.02.2016; Lopes do Rego (Relator); www.dgsi.pt.


IV. Arrazoa a recorrente/autora no sentido de que, valendo-se do estatuído no art.º 19.º, alínea g), da LCCG (Decreto-Lei 11. 0446/85),[8] o pacto de jurisdição sempre seria inválido.


Esta motivação não lhe pode aproveitar.

É que a validade do pacto de jurisdição, constante de uma cláusula contratual geral integrada num contrato, há-de ser ponderada unicamente nos termos em que o consente o que está descrito no art. 23.º do Regulamento (CE) n.º 44/2001 de 16/01, sendo inaplicável o regime jurídico interno das cláusulas contratuais gerais e estando proibidos os Estados-Membros de acrescentarem outros requisitos de validade a essa convenção.

O regime estabelecido no Regulamento CE 44/2001 prevalece sobre as disposições de direito interno que regulam os pactos ou convenções acerca da competência internacional, contendo uma disciplina exaustiva da validade e admissibilidade destes, insusceptível de ser complementada com outras e adicionais exigências, previstas no regime adjectivo da competência internacional no direito interno: daqui decorre naturalmente que - sendo aplicável tal Regulamento - não pode condicionar-se a validade de pacto de jurisdição, celebrado com base nas disposições de Direito Comunitário, em função da invocação de requisitos, previstos na lei de processo interna, mas ali não contempladas - como ocorre precisamente com a exigência de que exista uma conexão efectiva da ordem escolhida com a matéria litigiosa e se mostre adequada e justificada a escolha do tribunal feita pelas partes (Ac. STJ de 4.02.2016; Lopes do Rego (Relator); www.dgsi.pt).


Quer isto dizer que, atenta a autonomia e o exclusivismo do normativo inserto no art. 23.º do Regulamento n.º CE 44/2001, fica prejudicada a abordagem da eventual aplicação do disposto em normas de direito nacional exauridas nos artigos 94.º do C.P.Civil e 19.º, n.º 1, al. g), da LCCG.


É assim que esta temática vem sendo tratada por este Supremo Tribunal de Justiça:

1. A noção de pacto de jurisdição vertida no Regulamento n.º 44/2001 é autónoma relativamente aos direitos nacionais dos Estados-Membros e deve ser interpretada como um conceito autónomo.

Perante o regime do Regulamento n.º 44/2001, para que a escolha do tribunal seja válida é desnecessário que exista qualquer conexão entre o objecto do litígio e o tribunal designado, não sendo valoráveis, designadamente, os hipotéticos inconvenientes, para uma das partes, da localização do foro convencionado - Acórdão de 11/02/15; Gregório Silva Jesus (Relator); www.dgsi.pt.

2. Segundo jurisprudência pacífica do TJUE, os requisitos de validade e de convenção de competência apenas são aqueles que constam do art. 23.º do Regulamento n.º 44/2001, pelo que o direito dos Estados-Membros não pode acrescentar outros; e ainda para que a escolha do tribunal seja válida não é necessário que exista uma qualquer conexão entre o objecto do litígio e o tribunal designado, não sendo valoráveis, consequentemente, hipotéticos inconvenientes para uma das partes (no caso, para a recorrente), decorrentes da localização do foro convencionado.

Em função da autonomia e exclusividade do normativo inserto no art. 23.º do Regulamento n.º 44/2001, não cabe aquilatar, por estar prejudicado, da eventual aplicação do disposto em normas de direito nacional, nomeadamente, as vertidas nos artigos 94.º do NCPC (2013) e 19.º, n.º 1, al. g), da LCCG - Acórdão de 26.01.2016; Garcia Calejo (Relator); www.dgsi.pt.

3. A validade do pacto de jurisdição, constante de uma cláusula contratual integrada num contrato de swap celebrado entre uma empresa pública regional e determinado banco, em que foi aquela a propor ao banco as cláusulas que integram os contratos em litígio, objecto, aliás, de um específico procedimento negocial, em que a dita empresa foi coadjuvada por outra entidade bancária, é analisada, exclusivamente segundo o disposto no art. 23.º do Regulamento n.º 44/2001, sendo inaplicável o regime jurídico interno das cláusulas contratuais gerais - Acórdão de 04.02.2016; Lopes do Rego (Relator); www.dgsi.pt.


Não pode, assim, o recurso proceder.


Concluindo:

1. Do que está proposto no art.º 23.º do Regulamento (CE) n.º 44/2001 de 16/01 podemos inferir que, para a confirmação da competência de um tribunal de um Estado-Membro da CE para julgar os litígios surgidos entre as partes relativamente a “uma determinada relação jurídica”, basta que pelo menos um dos sujeitos processuais se encontre domiciliado em território de um Estado-Membro e que o pacto atributivo da competência abranja, igualmente, um tribunal de outro Estado-Membro.

2. O que o Regulamento (CE) n.º 44/2001 de 16/01 quis apadrinhar foi a ideia de que, circunscrevendo-se o litígio a cidadãos de cada um dos Estados-Membros, nada há que estorve que os subscritores de assinalado contrato confiram a competência para julgar os eventuais futuros litígios a um Estado-Membro diferente daquele em que ambas as partes estão domiciliadas, para tanto bastando que os interesses no contrato protegido se não contenham completamente cingidos ao espaço territorial do Estado-Membro em que as partes movimentem as suas conveniências patrimoniais.

3. Os contratos de swap (contratos derivados) celebrados pelas partes, uma exigência da moderna atividade bancária e empresarial sustentada na ideia de que cada vez mais as previsões económicas se tornam inalcançáveis, são eles próprios intrinsecamente caracterizados como ajustes de natureza internacional, conotados com a ligação a outro Estado-Membro - são contratos de cariz internacional, redigidos em inglês, sujeitos à lei inglesa, com terminologia anglo-saxónica - e de molde a caracterizarem a “estraneidade” estabelecida pelo art.º 23.º da Convenção de Bruxelas.

4. A validade do pacto de jurisdição, constante de uma cláusula contratual geral integrada num contrato, há-de ser ponderada unicamente nos termos em que o consente o que está descrito no art. 23.º do Regulamento (CE) n.º 44/2001 de 16/01, sendo inaplicável o regime jurídico interno das cláusulas contratuais gerais e estando proibidos os Estados-Membros de acrescentarem outros requisitos de validade a essa convenção.

Quer isto dizer que, atenta a autonomia e o exclusivismo do normativo inserto no art. 23.º do Regulamento n.º CE 44/2001, fica prejudicada a abordagem da eventual aplicação do disposto em normas de direito nacional exauridas nos artigos 94.º do C.P.Civil e 19.º, n.º 1, al. g), da LCCG.


Pelo exposto, nega-se a revista e confirma-se o acórdão recorrido.

Custas pela recorrente.


Supremo Tribunal de Justiça, 21 de abril de 2016.


António da Silva Gonçalves (Relator)

Fernanda Isabel Pereira

Pires da Rosa

____________________

[1] Artigo 62.º (fatores de atribuição da competência internacional)

Os tribunais portugueses são internacionalmente competentes:

  a) Quando a ação possa ser proposta em tribunal português segundo as regras de competência territorial estabelecidas na lei portuguesa;

 b) Ter sido praticado em território português o facto que serve de causa de pedir na ação, ou algum dos factos que a integram;

   c) Quando o direito invocado não possa tornar -se efetivo senão por meio de ação proposta em território português ou se verifique para o autor dificuldade apreciável na propositura da ação no estrangeiro, desde que entre o objeto do litígio e a ordem jurídica portuguesa haja um elemento ponderoso de conexão, pessoal ou real.


[2] Prof. José Alberto dos Reis; Comentário; 1.º; pág. 106.

[3] Artigo 8º (Direito internacional)

  1. As normas e os princípios de direito internacional geral ou comum fazem parte integrante do direito português.

  2. As normas constantes de convenções internacionais regularmente ratificadas ou aprovadas vigoram na ordem interna após a sua publicação oficial e enquanto vincularem internacionalmente o Estado Português.

 3. As normas emanadas dos órgãos competentes das organizações internacionais de que Portugal seja parte vigoram directamente na ordem interna, desde que tal se encontre estabelecido nos respectivos tratados constitutivos.

 4. As disposições dos tratados que regem a União Europeia e as normas emanadas das suas instituições, no exercício das respectivas competências, são aplicáveis na ordem interna, nos termos definidos pelo direito da União, com respeito pelos princípios fundamentais do Estado de direito democrático (redacção dada pela Lei Constitucional nº 1/2004, de 24-07 (Sexta Revisão Constitucional).

[4] Gomes Canotilho; Direito Constitucional; pág. 913).

[5] Lebre de Freitas; Código de Processo Civil Anotado; I, pág. 124.
[6] Ac. STJ de 12-6-97; BMJ; 468.º; 324.

[7] Miguel Teixeira de Sousa; A Competência Declarativa dos Tribunais Comuns; pág. 36.

[8] São proibidas, consoante o quadro negocial padronizado, designadamente, as cláusulas contratuais gerais que “estabeleçam um foro competente que envolva graves inconvenientes para uma das partes, sem que os interesses da outra o justifiquem”.