Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
24/19.4JBLSB.L1.S1
Nº Convencional: 5.ª SECÇÃO
Relator: M. CARMO SILVA DIAS
Descritores: RECURSO DE ACÓRDÃO DA RELAÇÃO
CONFIRMAÇÃO IN MELLIUS
REJEIÇÃO PARCIAL
PENA ÚNICA
MEDIDA DA PENA
Data do Acordão: 04/07/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO.
Sumário :
I - Os tribunais, incluindo os da Relação, devem cuidar da fundamentação da pena única, de modo que se torne percetível o seu raciocínio e compreensível a pena única aplicada.
II - Também para efeitos de determinação da medida da pena única, apenas são atendidos os factos dados como provados e o que deles se pode extrair (uma vez que há que fazer uma nova reflexão sobre os factos em conjunto com a personalidade do arguido, pois só dessa forma se abandonará um caminho puramente aritmético da medida da pena para se procurar antes adequá-la à personalidade unitária que nos factos se revelou, sendo a pena única o resultado da aplicação dos “critérios especiais” estabelecidos no art. 77.º, n.º 2, do CP, não esquecendo, ainda, os “critérios gerais” do art. 71.º do CP) e não os factos alegados pelo recorrente, que ficaram por demonstrar.
Decisão Texto Integral:

Proc. n.º 24/19.4JBLSB.L1.S1

Recurso

Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça

I-Relatório

1. No processo comum (tribunal coletivo) n.º 24/19.... do Juízo Central Criminal ..., Juiz ..., comarca ..., por acórdão de 12.07.2021, foram, além do mais, condenados (no que aqui interessa):

 - o arguido AA:

a) pela prática, em co-autoria, de um crime de roubo qualificado p. e p. pelos artigos 210.º, nºs 1 e 2, alínea b), e art. 204, n.º 1, alíneas e) e h), e n.º 2, alíneas a) e g), todos do Código Penal, na pena de 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de prisão (24/19);

b) pela prática, em cumplicidade, de um crime de roubo qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 210.º, nºs 1 e 2, alínea b), e art. 204, n.º 1, alíneas e) e h), e n.º 2, alíneas a), f) e g), e artigos 22.º e 27.º, todos do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão (37/19);

c) pela prática, em co-autoria, de um crime de roubo qualificado p. e p. pelos artigos 210.º, nºs1 e 2, alínea b), e art. 204, n.º 1, alínea f), e n.º 2, alíneas a), f) e g), todos do Código Penal, na pena de 7 (sete) anos de prisão (135/20);

d) pela prática, em co-autoria, de um crime de furto qualificado p. e p. pelos artigos 210.º, nºs1 e 2, alínea b), e art. 204, n.º 2, alíneas e) e h), do Código Penal, na pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão (1035/19);

e) pela prática, em autoria, de um crime de branqueamento simples p. e p. pelo art. 368.º-A, n.ºs 1 e 2, do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 3 (três) meses de prisão;

f) pela prática, em co-autoria, de um crime de detenção de arma proibida p. e p. pelos art. 86.º, n.º 1, alínea e d), da Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro (redacção da Lei n.º 50/2013) na pena de 1 (um) ano e 3 (três) meses de prisão.

Em cúmulo jurídico na pena única de 11 (onze) anos de prisão;

- o arguido BB:

a) pela prática, em co-autoria, de um crime de roubo qualificado p. e p. pelos artigos 210.º, nºs1 e 2, alínea b), e art. 204, n.º 1, alíneas e) e h), e n.º 2, alíneas a) e g), todos do Código Penal, na pena de 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de prisão (24/19);

b) pela prática, em co-autoria, de um crime de roubo qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 210.º, nºs 1 e 2, alínea b), e art. 204, n.º 1, alíneas e) e h), e n.º 2, alíneas a), f) e g), e artigos 22.º, todos do Código Penal, na pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão (37/19);

c) pela prática, em co-autoria, de um crime de roubo qualificado p. e p. pelos artigos 210.º, nºs1 e 2, alínea b), e art. 204, n.º 1, alínea f), e n.º 2, alíneas a), f) e g), todos do Código Penal, na pena de 7 (sete) anos de prisão (135/20);

d) pela prática, em co-autoria, de um crime de roubo simples p. e p. pelo artigo 210.º, n. 1, Código Penal, na pena de 3 (três) anos de prisão (684/19);

e) pela prática, em co-autoria, de um crime de furto qualificado p. e p. pelos artigos 210.º, nºs1 e 2, alínea b), e art. 204, n.º 2, alíneas e) e h), do Código Penal, na pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão (1035/19);

f) pela prática, em co-autoria, de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelos art. 86.º, n.º 1, alínea e d), da Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro (redacção da Lei n.º 50/2013) na pena de 1 (um) ano e 3 (três) meses de prisão.

Em cúmulo jurídico na pena única de 12 (doze) anos de prisão.[1]

2. Inconformados com essa decisão, recorreram, entre outros, os arguidos AA e BB, para o Tribunal da Relação ..., o qual por acórdão de 2.12.2021[2], decidiu julgar parcialmente procedentes os recursos e, em consequência:

- absolveu o arguido AA (e outro arguido) da prática do crime de branqueamento, previsto e punido pelo artigo 368º-A do Código Penal e, procedendo à reformulação do cúmulo jurídico, condenou-o na pena única de 10 (dez) anos de prisão;

- absolveu o arguido BB da prática do crime de roubo, p. e p. pelo artigo 210, n.º 1 do Código Penal e, procedendo à reformulação do cúmulo jurídico das penas impostas, condenou-o na pena única de 10 (dez) anos e 6 (seis) meses de prisão;

- e, no mais, quanto a estes arguidos, manteve o acórdão recorrido.

3. Inconformados com essa decisão, cada um dos arguidos AA e BB interpôs recurso para este Supremo Tribunal de Justiça.

3.1. O arguido AA apresentou as seguintes conclusões:

1- Veio o recorrente, AA, condenado, no NUIPC, 24/19…, na prática de um crime de roubo agravado, em co-autoria, a uma pena de 6 anos e 6 meses de prisão; no NUIPC 37/19...., na prática de um crime de roubo qualificado, na forma tentada, como cúmplice, numa pena de 2 anos e 6 meses de prisão, no NUIPC 1035/19. ..., na prática de um furto qualificado, numa pena de 3 anos e 6 meses de prisão, no NUIPC 135/20…, na prática de um roubo qualificado, numa pena de 7 anos, uma pena de 1 ano e 3 meses pela prática de um crime de detenção de arma proibida e por último, uma pena de 2 anos e 3 meses de prisão pela prática de um crime de branqueamento simples, tendo em cúmulo sido condenado a onze anos de prisão.

2- Tendo interposto recurso, veio o Tribunal da Relação ..., a absolver o arguido da prática do crime de branqueamento de capitais simples, a que havia sido condenado, procedendo em cúmulo, a uma condenação ao arguido de dez anos de prisão.

3- O recorrente não se conformou, com a decisão emanada neste douto Acórdão, proferido pelo Tribunal da Relação ..., considerando que as penas parcelares aplicadas a cada um dos ilícitos e em cúmulo se demonstram excessivas, violando o princípio das penas e os princípios de necessidade, proporcionalidade e adequação, nunca, devendo em cúmulo jurídico a pena a aplicar ao arguido ser superior a sete anos de prisão efectiva.

4- Para tal, importa conhecer e analisar os factos para em concreto proceder á correcta e justa, por legal, aplicação, ao arguido, de cada uma das penas parcelares respeitantes a cada um dos ilícitos efectivamente praticados e consequentemente realizar-se a (necessárias) retificação da pena unitária, em cúmulo jurídico.

5- Dos factos analisados, com importância para o presente recurso, em face da condenação por detenção de arma proibida, o mesmo considera, a mesma injusta por ilegal, atento que face á prova produzida e dada como provada, tanto pelo Tribunal a quo, bem como pelo Tribunal ad quem, tanto pelo Tribunal a quo, o mesmo nunca usou, acedeu ou sequer teve na disponibilidade a arma ilegal, conduto, o mesmo encontra-se condenado por este crime.

6- Pelo que, não pode o recorrente, aceitar tal condenação, uma vez que não praticou o ilícito, que esta não prática se encontra provada nos autos. Resultando do exposto, uma clara e ilegal contradição, entre os factos assentes a matéria dada como provada e a condenação do arguido por detenção de arma proibida, pelo que urge rectificar esta condenação, tendo o recorrente se ser absolvido.

7- Percorrendo os ilícitos constantes dos autos e, fazendo a enunciação temática dos mesmos, conforme resultou da acusação, do douto acórdão, tanto do Tribunal a quo bem como do Tribunal da Relação ..., se dirá sobre a matéria afecta ao NUIPC 24/19.... – Nesta matéria o arguido encontra-se condenado, em co-autoria, pela prática de um crime de roubo, a seis anos de prisão efectiva, tendo este sido praticado no dia 8 de maio de 2019, no ATM situado no interior do Centro Comercial ..., pertença do Banco 1..., contudo o arguido não praticou este crime, pelo que consequentemente, sobre o mesmo inexistem quaisquer provas, conforme também resulta dos autos.

8- Todas as testemunhas ouvidas, referente a esta matéria, são unanimes em apresentar que a máquina ATM não funcionava há mais de uma semana, apresentando como informação, o não ter dinheiro e, nesta medida não o disponibilizando.

9- Conforme foi dito por todas as testemunhas, seria impossível conhecer que pese embora a ATM não funcionasse, a mesma continha dinheiro.

10- Ninguém sabia (incluindo-se os funcionários em questão), quando se iria proceder à reparação da ATM, tendo esta reparação sido adiada por diversas vezes.

11- Pelo que a tese da acusação e factos dados como provados, de que o recorrente AA, na companhia do arguido CC, foram no dia 7 alugar um veículo e nesse mesmo dia sobre um plano previamente gizado, procederam ao reconhecimento do local, cai por terra, uma vez que reconhecendo que a ATM, não tinha dinheiro, seria impensável desenhar um plano para assaltar um ATM e assumir os riscos inerentes à prática deste ilícito, sem que na mesma tivesse valores.

12- Dando como provado que o recorrente e o arguido CC, alugaram um veículo no dia 7, inexiste qualquer prova de que este foi o veículo utilizado na prática do ilícito.

13- Mais, mesmo que existisse uma presunção, de que havia sido este veículo, desconhece-se, por ausência total de prova, se o recorrente AA, ou o arguido CC, se utilizaram o veículo, se o cederam a título oneroso ou gratuito a terceiros o referido veículo, sequer que conheciam a vontade dos demais arguidos.

14- Neste ilícito, a prova produzida em sede de Audiência de Discussão e Julgamento, são as imagens CCTV (interior e exterior) e os fotogramas do local. Pelo que, da visualização das mesmas, se retira de forma fácil que o recorrente não praticou o ilícito em questão.

15- Nesta senda, veio o Tribunal a quo, considerar que o arguido CC, alugou o veículo no dia 7 com o recorrente, não existindo mais provas, veio o mesmo absolvido. Por sua vez, veio o recorrente pela prática dos mesmos factos do que o arguido CC – aluguer do veículo em conjunto com o arguido CC, condenado a uma pena de prisão efectiva de seis anos, pena esta exactamente igual aos demais arguidos que praticaram o ilícito. Existindo uma errada compreensão dos factos e incorrecta aplicação da Lei.

16- Conforme estatuído, do n.º 2 do art. 32º da Constituição da República Portuguesa, este princípio é uma imposição dirigida ao juiz no sentido de este se pronunciar de forma favorável ao réu, quando não tiver certeza sobre os factos decisivos para a solução da causa.

17- Neste contexto o princípio do in dubio pro reo constitui um limite normativo do princípio da livre apreciação da prova, na medida em que impõe, orientação vinculativa para o caso de dúvida sobre os factos: em tal situação, impõe-se que o Tribunal decida pro reo.

18- Pelo que, o douto Tribunal a quo e ad quem, ao decidir, nos termos expostos no douto acórdão, existe claramente um vício, conforme descrito na al. a) do n.º 2 do art. 410º do Código Penal.

19- Sendo a realidade fática idêntica objecto de tratamento idêntico, teria de existir a mesma solução, sob clara violação da Lei.

20- Também ainda, em sentido contrário ao douto acórdão, a prova produzida em sede de Audiência de Discussão e Julgamento, o próprio inspector, DD, inspector que dirigiu a investigação, prestando o seu testemunho, afirmou, que este ilícito, para além dos arguidos que surgem nos fotogramas de forma clara, foi apenas praticado por mais dois elementos, sendo que, foi o CC e depois o EE, que no dia 8 de maio, activaram as antenas de tráfego de dados.

21- Ora, mais se sublinha a total ausência de prova, de que o arguido e recorrente, AA, no dia 8 de maio tenha sequer estado no local da prática do ilícito, pelo que, conforme amplamente analisado, esteve verdadeiramente mal, este douto Tribunal a quo na análise que realizou tanto dos factos bem como das provas, pelo que se impõe, sob clara violação da Lei, que o arguido sobre estes factos venha absolvido.

22- Em análise ao NUIPC 37/19…, nesta matéria e sobre este ilícito, veio o recorrente condenado enquanto cúmplice. Das imagens CCTV visualizadas, em sede de Audiência de Discussão e Julgamento, verificamos que o ilícito foi praticado por dois sujeitos, não sendo nenhum deles o arguido.

23- Para além destas imagens, inexiste qualquer outra prova da prática do ilícito e da autoria do mesmo. Mesmo, a testemunha ouvida, FF, inspector da Polícia Judiciária, veio apresentar que este crime foi cometido por três sujeitos, os dois sujeitos visualizados de forma directa nas imagens e um outro sujeito caucasiano, que surge nas imagens fora do Shopping, conforme foram visualizadas em sede de Audiência de Discussão e Julgamento. Não existindo dúvida dos autores do ilícito.

24- Ora daqui decorre, de forma peremptória, que não sendo o recorrente AA, nenhum dos dois indivíduos de raça negra que surgem nas imagens, não sendo o mesmo de raça caucasiana, tendo o ilícito sido perpetrado por três indivíduos, de forma objectiva e clara por esclarecedora, se conclui, que o arguido, AA, é alheio à prática do presente ilícito.

25- Ora, dos factos dados como provados, inexiste qualquer prova de que o arguido AA e ora recorrente, procedeu ao aluguer da viatura utilizada na prática do ilícito e ao seu pagamento. Tendo o recorrente alugado uma viatura, em conjunto, com a testemunha GG, sublinhando-se que eram realizados os alugueres de forma reiterada no tempo, há pelo menos um ou dois anos, pelo que desconhecendo-se a viatura utilizada na prática do ilícito, não se poderá impor que foi o arguido AA e a testemunha GG, a alugar a mesma.

26- Pelo que, claramente existe erro notório na apreciação da prova, nos termos do vertido no art. 410º n.º 2 al. c) do Código de Processo Penal.

27- Mais, neste ilícito, o veículo que se presume ter sido utilizado, mas do qual inexiste qualquer prova, é alugado, não só pelo arguido AA, mas também pela testemunha, GG, que nos presentes autos, pese embora tenha sido constituído arguido, contra o mesmo, inexistiu qualquer acusação. Não existiu prova, da intervenção de que cada uma das partes teve no aluguer e sequer na posse do veículo referido.

28- Ora, sendo que a Testemunha, GG, sequer foi acusada, muito se estranha este entendimento deste douto Tribunal, ao condenar o arguido e recorrente, AA, pela sua comparticipação como cúmplice, inexistindo qualquer prática ilícita tomada por este arguido, em face do presente ilícito. Tal como foi, pela testemunha, GG, que sequer foi acusada.

29- Ora, não existe qualquer prova, de que o arguido e recorrente, AA, de forma dolosa (entendendo-se o dolo na sua dualidade, o conhecer e querer a prática do ilícito) acrescendo a esta a perspectiva objectiva e subjectiva, viesse prestar qualquer auxílio na prática do presente ilícito.

30- Conforme foi entendimento deste mesmo Tribunal a quo, em sede de primeira tipologia criminal supra analisada mas referente, ao arguido CC, Veio este Douto Tribunal entender ter-se como provado que este arguido alugou o veículo, que noutro dia (alegadamente face à ausência de prova), teria sido utilizado na prática do ilícito. Contudo vieram considerar o arguido, CC, inocente da prática do ilícito, atento que apenas teria em conjunto com o recorrente AA, procedido ao aluguer do veículo.

31- Ora, não se pode conceber e aceitar decisões distintas em factos e condutas iguais. Existe um claro desfavorecimento do arguido AA, o que não se pode aceitar, por violação do princípio da igualdade – Todos os cidadãos são iguais têm a mesma dignidade social e são iguais perante a Lei” no 1 do art. 13º da Constituição da República Portuguesa.

32- Em face do presente, impunha-se a este douto Tribunal a quo, uma decisão conforme o direito, atento que apenas este Tribunal poderia aplicar o “in dúbio pro reo”, não podendo desfavorecer o arguido ainda para mais, tendo o arguido, CC, exactamente idêntica relevância nos presentes autos ao do recorrente.

33- Ora, do exposto, resulta, que o arguido AA, encontra-se claramente prejudicado, em face da não aplicação ao mesmo do princípio legal, in dúbio do reo, inscrito no art. 32º n.º 2 da Constituição da República Portuguesa.

34- Caso se entendesse que o arguido, teria agido a título de cúmplice também se impunha que esta pena viesse atenuada face á pena em que os autores do ilícito vieram efectivamente condenados, existindo uma clara desproporção, que nesta medida é ilegal.

35- Sobre a temática circunscrita ao NUIPC 1035/19…, não se provou a intenção ilegítima de apropriação das botijas de gás, pelo não tendo sequer existido apropriação, impunha-se uma pena totalmente diferente da aplicada, devendo a mesma ser drasticamente atenuada.

36- Conhecendo assim os factos, para em concreto poder proceder-se á correcta aplicação da pena parcelar a cada um dos ilícitos, tendo por base, o grau de participação de cada um dos agentes, o grau de culpa, tendo por principio assente, que a determinação da pena, deve ser realizada em função da culpa e das exigências de prevenção geral e da integração e da prevenção especial de socialização, nos termos do previsto no art. 71º e 40º ambos do Código Penal, deve no caso concreto, corresponder às necessidades de tutela dos bens jurídicos em causa e/ou às exigências sociais decorrentes das lesões ocorridas, sem esquecer que deve ser preservada a dignidade Humana do recorrente.

37- Ora, o recorrente, AA, veio condenado, nos diversos crimes como autor material, na mesma pena que os demais arguidos, contudo, como se encontra demonstrado, de forma primeira que mesmo praticou os ilícitos e/ou mesmo a pena aplicada a título de cumplicidade encontra-se excessivamente aplicada, pelo que, não se aceita ou tão pouco compreende a decisão do Tribunal, por clara violação do vertido no art. 40º, 71º, 77º e 78º todos do Código Penal, que mesmo considerando que o mesmo havia conhecido da prática dos ilícitos, a pena parcelar a impor teria de ser totalmente diferente, sendo claramente atenuada.

38- Mais, os ilícitos transcritos nos autos, sucederam todos no mesmo período temporal, em poucos meses ano, tendo o arguido face ao registo criminal junto aos autos, apenas praticado ilícitos nos cinco anos que antecederam a sua prisão, há mais de dois anos que não pratica qualquer ilícito, tendo por atenção a postura do arguido, uma pessoa jovem, correcta, não violenta, não se afigura, em face das penas parcelares, aplicadas ao recorrente, as mesmas como necessárias e proporcionais, sendo as mesmas claramente excessivas. Em sede de douto Acórdão do Tribunal da Relação ..., veio o arguido absolvido, pela prática em autoria, de um crime de branqueamento de capitais simples, p. e p. pelo art. 368-A n.º 1 e n.º 2 do Código Penal, na pena de dois anos e três meses de prisão. Contudo, este douto Tribunal ad quem, não veio analisar ou rectificar as penas parcelares aplicadas em sede absolvição, bem como em face da intervenção (ou ausência da mesma) do recorrente nos crimes supra explanados conforme matéria fática aqui trazida á colação tão só seja possível a aplicação do direito, tendo aplicado em cúmulo jurídico, uma pena ao recorrente, claramente excessiva por injustificada e nesta medida ilegal.

39- Pelo exposto, torna-se líquido que as penas parcelares, em que o recorrente veio condenado são excessivas. Sendo consequentemente excessivo o cúmulo jurídico aplicado ao arguido, atentos os crimes, individualmente tidos, a comparticipação e culpa do agente, tudo devendo ser pesado e sopesado, atenta a conduta, pessoa e idade do arguido.

40- No demais, entende-se que a punição do concurso de crimes tem como efeito prático beneficiar o arguido, já que a pena no cúmulo jurídico deve ser sempre inferior ao somatório das penas parcelares.

41- A finalidade das penas, é ao lado da protecção de bens jurídicos, a reintegração do agente na sociedade, pelo que a aplicação da pena do concurso de crimes, nunca pode resultar num desfavorecimento da reintegração do agente como seja o agravamento da punição.

42- Assim, a pena de 10 anos, aplicada ao arguido, em cúmulo jurídico, deve ter-se, como excessiva, por violadora do vertido no art. 40º, 77º, 78º, 80º todos do Código Penal e, nesta medida claramente ilegal, para que no fim do cumprimento, seja possível alcançar a reintegração do agente e consequentemente a sua reabilitação social. Pelo que existiu, claramente, uma incorrecta ponderação de todas as circunstâncias que a Lei prescreve ao presente caso.

43- O recorrente pugna pelo correcto entendimento dos factos e consequente aplicação do direito, devendo o mesmo vir absolvido quanto ao crime de detenção de arma proibida, atenta a contradição existente, devendo ainda ser absolvido, nos termos do previsto no art. 355º do Código de Processo Penal, da autoria dos crimes de roubo qualificado, devendo as demais penas parcelares serem atenuadas, condenando-se, o recorrente, in extremis, em cúmulo a uma pena única que não ultrapasse os sete anos de prisão.

44- Nestes termos deve ser dado total provimento ao presente recurso, revogando-se o Acórdão recorrido e, em última instância, absolver o arguido de crimes que não praticou, reduzir as suas penas parcelares aplicadas e consequentemente a aplicada em sede de cúmulo jurídico.

            Termina pedindo o provimento do recurso, revogando-se o Acórdão recorrido, com a consequente absolvição dos crimes que não praticou e, em última instância, reduzidas as penas individualmente consideradas e, consequentemente, o cúmulo jurídico a uma pena única que não ultrapasse os 7 anos de prisão.

3.2. O arguido BB apresentou as seguintes conclusões:

1. Na Acusação era imputado ao arguido BB a autoria material, em concurso real, das seguintes infrações criminais:

a. • um crime de associação criminosa, na forma consumada, p. e p. pelo art. 299.º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal;

b. • um crime de roubo qualificado, na forma consumada, p. e p. pelo artigo 210.º n.º 1 e n.º 2, alínea b), ex vi do disposto no artigo 204.º n.º 1 alíneas e) e h) e n.º 2 alíneas a), e g), todos do Código Penal (NUIPC 24/19);

c. • um crime de roubo qualificado, na forma tentada, p. e p. pelo artigo 210.º, n.º 1 e n.º 2, alínea b), ex vi do disposto no artigo 204.º, no 1 al. e) e h) e n.º 2 alíneas a), f) e g), e artigo 22.º, do Código Penal (NUIPC 37/19);

d. • um crime de ofensa à integridade física qualificada, na forma consumada, p. e p. pelo artigo 145.º, n.º 1, al. a) e n.º 2, ex vi do disposto no artigo 132.º, n.º 2, al. g), do Código Penal (NUIPC 37/19);

e. • um crime de roubo, na forma consumada, p. e p. pelo artigo 210.º n.º 1 (e n.º 2, alínea b), ex vi do disposto no artigo 204.º n.º 2, alínea g), e n.º 4), todos do Código Penal (NUIPC 684/19);

f. um crime de roubo qualificado, na forma consumada, p. e p. pelo artigo 210.º n.º 1 e n.º 2, alínea b), ex vi do disposto no artigo 204.º n.º 1 al. f), e n.º 2, alíneas a), e), f) e g), todos do Código Penal (NUIPC 135/20);

g. um crime de furto qualificado, na forma consumada, p. e p. pelo artigo 203.º n.º 1, e artigo 204.º n.º 2 alíneas e) e g), todos do Código Penal (NUIPC 1035/19);

h. um crime de branqueamento agravado, p. e p. pelo artigo 368- A, nºs 1, 2 e 6, do Código Penal;

i. um crime de detenção de armas proibidas p. e p. pelo artigo 86.º, n.º 1, alínea d) da Lei 5/2006 de 23 de fevereiro.

2. Realizado o julgamento, por Acórdão do Tribunal Criminal ..., o qual, em síntese, por considerar que se fez prova, na audiência de discussão e julgamento, da culpabilidade do recorrente – a qual, segundo o douto acórdão ora posto em crise – haverá agido com dolo, decidiu condenar o arguido em co-autoria material de:

a) pela prática, em co-autoria, de um crime de roubo qualificado p. e p. pelos artigos 210.º, n.ºs 1 e 2, alínea b), e art. 204, n.º 1, alíneas e) e h), e n.º 2, alíneas a) e g), todos do Código Penal, na pena de 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de prisão (24/19);

b) b) pela prática, em co-autoria, de um crime de roubo qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 210.º, n.ºs 1 e 2, alínea b), e art. 204, n.º 1, alíneas e) e h), e n.º 2, alíneas a), f) e g), e artigos 22.º, todos do Código Penal, na pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão (37/19);

c) pela prática, em co-autoria, de um crime de roubo qualificado p. e p. pelos artigos 210.º, n.ºs 1 e 2, alínea b), e art. 204, n.º 1, alínea f), e n.º 2, alíneas a), f) e g), todos do Código Penal, na pena de 7 (sete) anos de prisão (135/20);

d) pela prática, em co-autoria, de um crime de roubo simples p. e p. pelo artigo 210.º, n. 1, Código Penal, na pena de 3 (três) anos de prisão (684/19);

e) pela prática, em co-autoria, de um crime de furto qualificado p. e p. pelos artigos 210.º, n.ºs 1 e 2, alínea b), e art. 204, n.º 2, alíneas e) e h), do Código Penal, na pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão (1035/19);

f) pela prática, em co-autoria, de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelos art. 86.º, n.º 1, alínea e d), da Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro (redacção da Lei n.º 50/2013) na pena de 1 (um) ano e 3 (três) meses de prisão.

3. O que resultou na condenação de uma pena única de doze (12) anos de prisão;

4. Por não se poder conformar com o douto Acórdão e, até por mera cautela de patrocínio, quanto à prova dada como provada e, à medida da pena, em que, caso se optasse pela condenação, que deveria ter sido mais reduzida e em última instância, nunca superior a uma pena de sete/oito anos de prisão, se recorreu ao TR.…;

5. Levantou-se, em “Questão Prévia” a INEXISTÊNCIA DO CRIME:

a. do ROUBO QUALIFICADO (por parte do aqui Recorrente BB no NUIPC 24/19…);

b. do ROUBO QUALIFICADO NA FORMA TENTADA, (por parte do Recorrente BB no NUIPC 37/19....);

c. do ROUBO SIMPLES (por parte do Recorrente BB no NUIPC 684/19…);

d. do FURTO QUALIFICADO no NUIPC 1035/19….

6. Entendeu o Recorrente que os crimes supra referenciados nunca se verificaram em relação ao aqui Recorrente, ao abrigo do disposto no nº 1 do artº 210, e 204, do CPP;

7. Apreciado seu recurso em sede de TR.…, foi o mesmo julgado parcialmente procedente, tendo sido absolvido do crime de roubo “ao estafecta da ...” e, assim reformulado o seu cúmulo jurídico, para uma pena de prisão de 10 anos e seis meses.

8. Contudo, nunca foi analisada a questão das penas parcelares, que o arguido Recorrente considerou exageradas e desproporcionais;

9. Por inexistir prova suficiente para se dar como provado os crimes em causa – por parte do arguido seja a que título for – com a mínima certeza exigível.

10. Assim, invoca-se a insuficiência de prova cabal, conforme se demonstrará infra.

11. Mais invoca o Recorrente, caso assim não se entenda, em última análise, o Princípio do In Dubio Pro Reo, princípio que sempre levaria a concluir que os elementos existentes nos autos não permitem ultrapassar a dúvida razoável acerca do valor, devendo a decisão recair a favor do arguido, com a sua absolvição.

12. Sem prejuízo do que infra se dirá sobre o julgamento, o mínimo que se esperaria era uma absolvição dos crimes de “roubo” dos Proc. 24/19..., Proc. 37/19..., e Proc. 1035/19... e (nas circunstancias narradas), quer pelas circunstâncias em que ocorreram os factos, quer face ao decurso do julgamento, nem que fosse face ás duvidas criadas, que implicaria, em última instância a aplicação do Principio “In Dubio Pro Reo”, pelas razões que se passam a expor:

- Nos crimes de roubo no Centro Comercial ... e Centro Comercial ... existe uma nítida presunção de comportamentos pela acusação que o tribunal valorou como certa erradamente. Aqui não nos podemos esquecer que o ónus da prova pertence à Acusação e na nossa modesta opinião, parece-nos, pela prova que se produziu em sede de audiência que a mesma é deficiente, bem como os depoimentos não trazem nada de concreto para se afigurar com a razoável certeza que o arguido aqui Recorrente é o mesmo dos ditos fotogramas retirados do sistema de vigilância do ... e do próprio Centro Comercial;

- Aliás, até se socorre o Douto Tribunal ... de fotogramas, de um blusão usado pelo arguido em 2018 para tirar o seu Cartão de Cidadão para dizer que é o mesmo do que estão nos fotogramas dos assaltos, esquecendo-se que se trata de um blusão de uso comum na comunidade africana, mas que para o Tribunal é uma peça fundamental para se identificar o Recorrente, sem nunca o mesmo ter sido apreendido, ou identificado em mais assaltos sequer;

- Igualmente determinou o tribunal como fulcrais umas calças apreendidas a fls. 1483 dos autos, que nada têm a ver com as calças vistas nos fotogramas do assalto, é só uma questão de comparação, para vermos que esse raciocínio está prejudicado e deveria ter conduzido a outro resultado;

- Depois de visualizadas as imagens do sistema de vigilância (CCTV), não se descortina qualquer violência ou uso de armas, pelo menos é o que decorre da visualização das imagens.

13. E esta leitura dos factos é mais flagrante nos alegados crimes de roubo supra mencionados, por não passaram de meras presunções de comportamentos, sem qualquer prova a secundar essas conclusões.

14. Artigo 412º nº 3 alínea a) do CPP – Pontos de facto da matéria dada como provada que o recorrente considera incorrectamente julgados: 1 a 7; 13; 17 a 20; 22; 25 a 27; 35; 36; 38; 39; 41 a 44; 46; 47; 49; 56; 59, 71 a 78; 81; 82; 83; 85 a 89; 91; 92; 94 a 99; 103 a 106; 109; 110; 111; 113; 114; 116; 117; 120 a 125; 137 e 138;

15. Relativamente à execução do assalto à ATM existente no interior do Centro Comercial ... (1 de Julho de 2019), o Tribunal contou, em primeira linha, com os depoimentos das testemunhas HH e II (vigilantes da empresa E.…), bem como com a reportagem fotográfica de fls. 32, o relatório do LPC (Local do crime) de fls. 123 e com o auto de visionamento das imagens de CCTV de fls. 52 do Apenso 37/19 (reportadas ao DVD que consta do Apenso A). O vigilante II foi inicialmente agredido com murros na cabeça e nas costas e veio também a ser rasteirado e a sofrer uma descarga eléctrica de taser no corpo após ter tentado fugir para o exterior do Centro Comercial (Depoimento da vigilante II, relatório pericial médico de fls. 17 e boletim de exame médico de 195). Os dois assaltantes que entraram no Centro Comercial e interagiram com o vigilante II juntaram-se na fuga a um terceiro indivíduo que se encontrava apeado no exterior e, posteriormente, estes três indivíduos entraram para o interior de ..., de cor ..., com a matrícula ...-SZ-.., conduzido por um quarto indivíduo (Depoimento do vigilante HH e Auto de notícia de fls. 115). Resulta destas imagens que os assaltantes em apreço eram de raça negra e ambos traziam as respectivas cabeças tapadas com capuzes do vestuário que então trajavam, sendo que usavam também óculos escuros para ocultar parcialmente o próprio rosto.” A única controvérsia, segundo o Douto Tribunal que foi alimentada e contrariada até ao final do julgamento reside apenas na identidade dos autores de tais factos ilícitos, sendo que entende o Tribunal que, a sintonia mais fina da prova reunida e produzida permitiu colocar fim a esta controvérsia. Argumenta o Douto Tribunal, que estes assaltos ocorreram na mesma área geográfica do ..., no interior de Centros Comerciais e que as imagens da videovigilância revelam que os assaltantes intervenientes nas abordagens às ATM’s apresentam semelhanças físicas entre si, pelo que não restam dúvidas da sua autoria. À face da prova globalmente produzida, conclui o Tribunal, que foram os arguidos BB e JJ que entraram no referido centro comercial e se apoderaram dos cacifos da ATM ali existentes. “As imagens de videovigilância captadas pelos sistemas existentes no estabelecimento “Óptica D.… e no interior do próprio centro comercial fornecem-nos a presença e intervenção dos arguidos BB e JJ (vide Autos de visionamento de fls. 81 e 89, fotografias associadas aos cartões de cidadão de fls. 357 e 364, fotogramas e fotografias de fls. 365 e 366). A correspondência facial não suscita dúvidas, sendo que o arguido BB até usou no assalto o mesmo casaco que trajava quando foi tratar do cartão do cidadão.” Só que esta conclusão é falível, porque esse casaco não foi sequer apreendido e a sua semelhança é perfeitamente justificável, já que é um casaco de fácil aquisição, não tendo qualquer particularidade que o evidenciasse para justificar essa conclusão, que não passa de uma presunção.

16. Relativamente à execução do assalto à ATM existente no interior no Centro Comercial ..., a acusação imputa este assalto aos arguidos AA, EE, BB e JJ e o Tribunal concluiu nesse sentido. Refere que o assalto foi executado por quatro indivíduos, tendo entrado dois no centro comercial e tendo ficado dois indivíduos no exterior (segundo o depoimento de HH). Entendeu o Tribunal que face à prova globalmente produzida, que foram os arguidos BB e JJ que entraram no referido centro comercial e que tentaram apoderar-se dos cacifos da ATM ali existentes. As imagens de videovigilância captadas pelos sistemas existentes no interior do próprio centro comercial, quando conjugadas com as fotografias do vestuário que veio a ser apreendido na sua posse, fornecem-nos a presença e intervenção dos arguidos BB e JJ (vide Auto de visionamento da imagens de CCTV de fls. 52 do Apenso 37/19; auto de apreensão de fls. 164 e fotografias do casaco acolchoado e das calças de fato treino de BB de fls. 177 e 179 do Apenso D; auto de busca e apreensão de fls. 2436-2430, maxime fotografias dos ténis e calças de ganga de JJ de fls. 2445, 2447 e 2448 dos autos principais; e cotejo fotográfico de fls. 205-208 do Apenso 37/19). - Só que este raciocínio esbarra com a lógica das ditas fotografias. É que se fizermos uma comparação dos fotogramas de fls.1483 dos autos e as fotos das calças apreendidas ao arguido não são as mesmas. Isso é mais que notório, se atentar-mos que umas têm um fecho na parte final da perna e as outras têm o fecho a terminar uns 10 cm antes do final da perna, logo só se pode concluir que não são as mesma, bem como as apreendidas são do tamanho S (sendo uma pessoa de 1,85 não lhe servem, eram do seu irmão). Sem prescindir!

21. Pelo que forçosamente terá que ser absolvido destes factos, sob pena de se subverter a prova produzida em sede de discussão e julgamento.

22. No que concerne à subtracção das garrafas de gás, entende aqui o Tribunal que “os arguidos BB, KK, LL e AA foram surpreendidos a carregar duas garrafas de gás para o interior da viatura ..., com a matrícula ...-TQ-... (depoimento do agente da PSP MM). A viatura automóvel ... e as garrafas de gás em apreço foram apreendidas pela PSP (Autos de apreensão de fls. 5 e 7 do Apenso 1035/19). No interior deste veículo ... foram encontrados objectos usualmente associados à actividade criminosa, nomeadamente um pé de cabra (depositado no chão entre as duas filas de bancos), quatro luvas, um gorro e uma caixa de ferramentas de punção e de corte de precisão (Relatório de inspecção judiciária de fls. 14 e fotografias de fls. 18 do Apenso 1873/19). Ainda que não tivessem sido observados a entrar no armazém, é manifesto que os quatro arguidos se deslocaram a este armazém para se apoderarem das aludidas garrafas de gás e que os mesmos participaram conjuntamente na sua execução em virtude do peso muito elevado dos objectos em apreço.”

23. Contudo, entendemos que isto só por si, não passa de mera presunção, porque não se sabe com toda a certeza se as subtraíram, se as encontraram, ou outra situação.

24. Ou seja, essa “prova” nestes quatro crimes supra mencionados, não encontra suporte em mais nenhuma prova produzida em audiência de discussão e julgamento, já que o Acórdão é omisso na actuação do aqui arguido BB, a não ser na tal presunção baseada apenas em um elemento isolado sem nada mais a corroborar essa conclusão e, assim se presume coisas que não aconteceram.

25. Desde logo, constatamos, da mera leitura do Acórdão, que o Tribunal recorrido omitiu por completo na fundamentação da matéria de facto quais os concretos elementos de prova que O levaram a considerar provado qual os factos praticados pelo arguido e o Venerando TR.… não aprofundou essa análise.

26. Não fazendo qualquer referência a elemento de prova que tenha, no seu entender, servido para sustentar a sua decisão sobre este facto, a não ser a mera presunção.

27. Isto é, nos autos em concreto, não há prova da sua actuação, a não serem presunções de comportamentos o que, no nosso modesto entendimento não foi feito de modo assertivo com as provas de que dispunha.

28. Ou será suficiente, fazer-se a analogia “ás regras da experiência”, aos fotogramas sem mais prova a corroborar esses fotogramas – quando por exemplo em relação a um dos arguidos foi feito pelo LPC uma perícia aos dados biométricos da face e em relação ao aqui Recorrente não, para sustentar essa condenação.

29. Parece-nos que não! Bem como se analisarmos o douto Acórdão, parece-nos que quanto a este arguido nada de suficiente existe que possa sustentar a sua condenação nos crimes em causa.

30 - Artigo 412 nº 3 alínea b) do CPP - As provas que impõem decisão diversa da recorrida:

31. Como já se referiu, da audiência de discussão de julgamento não resultaram provas que o arguido e recorrente tenha actuado na forma descrita, pelo contrário. Não se pode o Tribunal “agarrar” á matéria fáctica vertida na douta acusação, associar-se fotogramas e algumas presunções em relação a fotogramas e localizações celulares – até em contradição com a reportagem fotográfica das calças de fato de treino da ... e dizer que são as mesmas, quando pela comparação das mesmas se constata exactamente o contrário - e simplesmente esquecer-se de tudo o resto, o que parece ter sido o caso.

32. É que por muito que custe ao Tribunal aceitar, a verdade é esta:  o arguido nega que tenha roubado quem quer que seja, e sendo certo que o ónus da prova cabe á Acusação; as testemunhas ofendidas e outras não identificam o aqui arguido Recorrente como interveniente nos actos erradamente dados como provados, ao contrário da Ofendida do Proc. 135/20… referente ao assalto à residência de ..., que faz o reconhecimento em sede de inquérito de forma perfeitamente contrário à Lei, já que não se observaram os requisitos legais e, com a desculpa de que foi difícil arranjar pessoas parecidas na Zona Prisional afecta à P.J., só que a Lei é clara no seu 147º nº 2 do CPP e, este acto deve ser declarado NULO por violar grosseiramente o que a Lei estipula para este acto, o bem como a Ofendida neste caso, começa por afirmar no seu depoimento de 22 de Abril de 2021, para o qual se remete e se dá por reproduzido para os devidos efeitos, que “eles estavam com caras descobertas, mas tinham capuzes”, logo questiona-se como é que passados meses dos factos se recorda com toda a certeza e identifica o arguido recorrente na PJ. Só se encontra uma justificação, ou foi instrumentalizada ou os outros que faziam parte da linha de reconhecimento eram completamente diferentes, o que foi o caso; não há nenhum auto de reconhecimento positivo do arguido por parte dos Ofendidos, além desta Ofendida, com as violações supra mencionadas; As Testemunhas da Acusação que foram ouvidas, não dizem nada de relevante acerca da participação do arguido BB, a não serem meras presunções de comportamentos que o Tribunal retira por força de conclusões não fundamentadas; E muito mal andou o tribunal, ao fazer-se valer só dos depoimentos destorcidos dos Ofendidos prestados em sede audiência – e pouco mais – como se fossem verdades supremas as suas declarações/presunções, quando existiam outras que simplesmente contrariavam essa “Dinâmica dos factos” e, nenhum deles fala – pelo menos é o que decorre da leitura do Acórdão; Agarra-se o Douto Tribunal, aos fotogramas dos dois assaltos aos ATMS dos Centros Comerciais, para dizer que um dos suspeitos é o aqui Recorrente BB – “As imagens de videovigilância captadas pelos sistemas existentes no interior do próprio centro comercial, quando conjugadas com as fotografias do vestuário que veio a ser apreendido na sua posse, fornecem-nos a presença e intervenção dos arguidos BB e JJ (vide Auto de visionamento da imagens de CCTV de fls. 52 do Apenso 37/19; auto de apreensão de fls. 164 e fotografias do casaco acolchoado e das calças de fato treino de BB de fls. 177 e 179 do Apenso D; auto de busca e apreensão de fls. 2436-2430, maxime fotografias dos ténis e calças de ganga de JJ de fls. 2445, 2447 e 2448 dos autos principais; e cotejo fotográfico de fls. 205-208 do Apenso 37/19). – só esse raciocínio é falível, porque as calças de fato de treino não são as mesmas, como será fácil de analisar; A verdade é que para um dos arguidos, o JJ foi identificado pelo tribunal porque “A perícia de imagem criminalística também encontrou compatibilidade entre um dos indivíduos que interveio no assalto de 8 de Maio e um dos indivíduos que interveio no assalto de 1 de Julho, particularmente na compleição física, postura e forma de andar (com os pés para dentro), isto por referência àquele que aqui consideramos ser JJ (Relatório do LPC de fls. 767).” Contudo, igual procedimento também foi feito e analisado pelo LPC, onde se suspeitava que o individuo nº2 seria o Recorrente BB e, o que é que diz o relatório: inconclusivo, ou seja, os peritos acharam inconclusivo. Contudo, misteriosamente a investigação presume com toda a certeza que o Ind. 2 é o arguido BB, sem mais e, o Douto Tribunal colhe esta presunção como válida para firmar o seu raciocínio e assim condenar o arguido por estes dois assaltos/roubos?? No caso vertente, quanto muito esperar-se-ia que o Tribunal não condenasse o arguido por estes crimes, pelo menos face ao princípio “In Dubio Pro Reo” absolvesse o arguido BB; Igual entendimento se deveria fazer no roubo do Proc. 135/20... - apesar de neste concordarmos que existem já indícios mais relevantes – no sentido que face ás dúvidas criadas pelo reconhecimento ilegal que foi feito e, face à ausência de prova suficiente que forçosamente nos coloca sérias dúvidas quanto à participação efectiva do arguido (apesar de ter sido encontrada uma nota de €500 na sua casa), também se deveria aplicar o princípio “In Dubio Pro Reo”e se absolvesse o arguido;

33. Do Erro Notório na apreciação da Prova: - Não se percebe a condenação do arguido aqui recorrente, nos crimes de roubo dos processos que o arguido pugna por inocência, face à prova produzida em audiência de discussão e julgamento, supra rebatida;

34. Mal andou o douto Tribunal, quando erradamente deu como provado estes crimes que nunca existiram – pelo menos no que ao arguido BB aqui recorrente concerne.

35. Aliás, parece que praticamente o que serviu de suporte à convicção do Tribunal foi a versão da acusação, e a interpretação aleatória e abusiva feita pelas declarações do Inspector da PJ FF e Ofendida NN e as localizações celulares, o que leva a concluir que foi essencialmente com estes elementos que se deu como provado estes crimes;

36. Existe um erro notório na valoração da prova dos roubos nos dois Centros Comerciais – Proc. Nº 24/19... e Proc. Nº 37/19... – já que o fundamento para fazer essa ligação são os fotogramas que evidenciam umas calças de fato de treino, ás calças apreendidas na sua casa, como descritas nos autos de preensão resultantes da busca domiciliárias e descritas a fls.2238 dos autos “- Umas (1) calças de fato treino de algodão, da marca ..., tamanho S e cor ..., com bolsos laterais com ... fecho eclair de cor ... no final de cada perna, rasgadas na zona da cintura” e fotografadas a fls.196 dos autos – para a qual se remete para melhor comparação com as dos fotogramas retiradas das imagens da gravação do dia dos assaltos a fls.1483 dos autos, onde se encontram as duas em contraposição como se fossem as mesmas, mas note-se nesse pormenor das fotos 1 com marcações (setas) 4 e 5 desse fotograma com as fotos 7 e 8 (as que se encontram no centro dessa página 1483) e note-se com atenção que os fechos eclair numa vai até final (as apreendidas na busca domiciliária) e a do fotograma terminam antes, uns 10cm antes do final das calças;

37. Aqui é percetível a olho nu que não são as mesmas calças, pelo pormenor do fechos éclair nos fundos das calças, em que uma vai até final das calças (as apreendidas na sua casa) e as dos fotograma não vão até ao fundo como se vê na seta 5 do fotograma 1 de suspeito. Só não vê quem não quer ver esse pormenor, bem como até pelo tamanho das mesmas (as apreendidas são tamanho S, que não servem sequer ao arguido, são do seu irmão);

39. Será suficiente estes “elementos” para se presumir que o arguido perpetuou em co-autoria os crimes referenciados?

41. Parece-nos bastante temerárias estas conclusões, isoladas de qualquer elemento mais assertivo da participação do aqui Recorrente nos crimes em análise;

42. Mas quais são os factos concretos da participação do Recorrente BB nos crimes em causa que o possam associar na co-autoria dos roubos?

43. Perguntas como uma única resposta: - NÃO HÁ NADA DE CONCRETO que possa concluir que o arguido tenha praticado os factos descritos e impugnados pelo arguido;

44. Aliás, existem contradições que deveriam levar à aplicação do Princípio “IN DUBIO PRO REO”, matéria já amplamente já rebatida.

45. Aqui deparámos com um “erro notório”. Sabe-se que é jurisprudência corrente no S.T. Justiça que existe erro notório na apreciação da prova, vício previsto na al. c) do nº 2 do artº 410º do CPP, quando se dão como provados factos que, face às regras de experiência comum e a lógica do homem médio, não se teriam podido verificar. Por outro lado, como é entendimento pacífico face à expressa e inequívoca exigência da lei (artº 410, nº 2 citado), este vício tem de resultar do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum.

46. Ora veja-se, as regras da experiência, e a lógica do homem médio face aos elementos carreados nos autos e aos tipos de crimes em questão, não é minimamente previsível que os factos pudessem ter sucedido como o Tribunal conclui e afirma no douto Acórdão;

47. Assim, no caso em apreço, é manifesto o erro que o recorrente põe em causa tem a ver com este vício elencado no artº 410º, nº 2 do CPP, o que transparece do texto da decisão recorrida, quer por si só quer conjugada pelas regras da experiência. Pelo que se requer a correcção deste erro;

48. A este respeito, desde já se advoga que as normas constitucionais que se consideram violadas são as vertidas no artº 13, nº 2 do artº 32º, nº 6 do artº 29º e nº 4 do artº 30º da Constituição da R. Portuguesa;

49. Ou seja, o recorrente entende que da matéria fáctica resultante da audiência de julgamento resulta na existência de contradições com o plasmado na douta acusação e em autos constantes do processo que, em última análise serviriam para a aplicação do Princípio “IN DUBIO PRO REO”.

50. Assim, com o devido respeito, há que pôr em dúvida a racionalidade e a coerência do juízo ou processo lógico – indutivo que terá conduzido à convicção dos julgadores, ponderado que terá sido – e admitimo-lo, nessa parte – o conjunto de toda a prova produzida, na estrita obediência – que ora não se questiona – ao mandamento do artº 127 do CPP.

51. É que não podemos descurar esta hipótese, quando está em causa a condenação de uma pessoa que pode estar inocente, tendo em atenção até o que é normal nos nossos tribunais.

52. Até dizemos mais, até pode suceder que o arguido não seja inocente no sentido estrito da palavra, mas face à prova produzida em sede de discussão e julgamento, não temos a menor dúvida que a mesma é insuficiente para a sua condenação, pelo menos é esse entendimento que fazemos, em que não existe prova suficiente nem cabal para se deduzir essa certeza exigível e necessária para se condenar uma pessoa, pelo que deveria funcionar em última instância o Princípio “In Dubio Pro Reo”, porque forçosamente tem que nos assolar a dúvida que a realidade dos factos possa ter sucedido como alegado no Acórdão aqui posto em crise e, assim absolver o arguido pelas dúvidas suscitadas.

53. Até diremos - no campo das hipóteses – imaginemos que até o arguido é o que se diz, a verdade é que não podemos esquecer que o ónus da prova pertence á acusação e, esta NADA fez, ou trouxe ás audiências, em sede Julgamento que possa sustentar esta condenação, no que ao aqui Recorrente diz respeito.

54. Mas, na verdade e, depois de analisada toda a prova produzida em sede de audiência, não vislumbramos outras referências objectivas que permitam relacionar o comportamento da Recorrente com os factos objectos da Douta Acusação, que lhe é atribuída no Acórdão, pelo menos no enquadramento fáctico descrito;

55. Assim sendo, a decisão tomada e sustentada na prova produzida em sede de discussão e julgamento, parece-nos insuficiente para se condenar o arguido numa pena, o que a nós nos parece - na nossa modesta opinião – que estaremos perante um caso de “insuficiência da fundamentação da decisão do Tribunal de 1ª Instância”, no seu Acórdão já que nada de relevante se conseguiu provar em relação a este arguido, nem sequer sustenta um acto concreto que diga que o arguido fez isto ou aquilo e, nesse entendimento, face ao 355º do CPP, quanto muito teríamos que nos socorrer do Princ. In Dubio Pro Reo e, absolver o arguido Recorrente, por falta de provas, ou por dúvidas que forçosamente nos terão que assolar, como o TR... o fez no crime do roubo do “estafecta da ...”;

56. Na verdade, todos os factos relativos ao aqui Recorrente, não têm suporte em prova existente nos autos;

57. Sendo que, a participação deste arguido nos factos, de acordo com a prova produzida (ou não produzida) em sede de Julgamento, é uma PARTICIPAÇÃO PRESUMIDA, tendo o Acórdão recorrido dado como provada matéria de facto aqui impugnada com base na presunção, não com base em qualquer prova, como decorre da simples leitura do Acórdão;

58. Incorre, pois, o TRIBUNAL “AD QUO” NA VIOLAÇÃO DO PRINCIPÍO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA, INEXISTINDO, POIS, PROVA CABAL OU SUFICIENTE PARA SUSTENTAR A ACÇÃO CRIMINOSA DO ARGUIDO SUSCEPTÍVEL DE INTEGRAR A CO-AUTORIA, DEVENDO A FACTUALIDADE IMPUGNADA SER DADA COMO NÃO PROVADA NOS MOLDES EXPOSTOS, E O ARGUIDO ABSOLVIDO DA PRÁTICA DE QUALQUER ILICITO NESTES AUTOS, o que deveria ter sido constatado pelo TR.…;

59. Verifica-se uma clara VIOLAÇÃO DO PRINCIPÍO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA;

60. Neste sentido e, nesta situação, o Princípio da Presunção de Inocência estabelece os limites do Princípio da Livre Apreciação da Prova que rege a apreciação desta prova testemunhal, impedindo que se presuma uma actuação do arguido Recorrente consubstanciadora dos crimes em causa;

61. Quanto á medida da pena – e só fazemos este reparo, por mera cautela de patrocínio, porque pugnamos pela ABSOLVIÇÃO DO ARGUIDO BB nos processos de roubo e furto julgados, com excepção do de posse de arma proibida - parece-nos que o arguido foi duplamente condenado, já que além do crime em si, também terá ponderado - no nosso modesto entendimento – o facto de o arguido não ter prestado declarações -interpretado à contrário pela constatação que a co-arguida OO, a fls.60 do douto acórdão foi beneficiada por ter prestado declarações - e isso parece-nos demasiado penalizador e violador do artº 13 da CRP , e isso parece-nos demasiado penalizador.

62. É que se fizermos uma comparação com a pena a que o arguido foi sujeito e outros casos idênticos, facilmente se verifica que a mesma é desproporcional e injusta em comparação com outros processos idênticos e, isto em termos meramente comparativos – até com os restantes co-arguidos - sendo que o ónus da prova pertence á ACUSAÇÃO;

63. Face a toda a informação vertida nos autos, mesmo que o arguido devesse ser condenado – o que se nega, a não ser no crime de posse de arma proibida - a pena aplicada é ainda assim exagerada e inadequada;

64. O arguido BB não irá fazer mais considerações além das já feitas, mas sempre dirá que a pena aplicada não foi justa nem equitativa, face ao Julgamento e a outras situações que se passam nos nossos Tribunais, em que a indivíduos de menos credibilidade se dá uma oportunidade, ao se aplicar uma pena mais equitativa e justa;

65. Ou seja, caso vingue a tese da acusação e persista a condenação do Recorrente pelos crimes que veio condenado no acórdão aqui posto em crise e, só neste considerando, então os valores das penas individualmente considerados são mesmo assim elevados e, só nesse sentido então somos do entendimento que a pena correcta – caso se entenda que deve ser condenado – para os respectivos crimes devem ser reduzidos. Ora veja-se:

(A) -No Proc.24/19... (Roubo no Centro Comercial ...), o aqui Recorrente foi condenado a uma pena seis anos e seis meses de prisão (6.6 anos), o que é exagerado face à ausência de qualquer violência empregue, ou sequer uso de arma e, até ao modo como terá decorrido o roubo segundo as testemunhas/ofendidas, devendo a mesma ser reduzida para um patamar a rondar os quatro anos (4) de prisão e não mais do que isso;

(B) No Proc. 37/19... (Roubo na forma tentada, no Centro Comercial ...), o aqui Recorrente foi condenado a uma pena de quatro anos e seis meses de prisão (4,6), sendo que igualmente não houve violência nem uso de qualquer arma de acordo com as testemunhas /ofendidas, devendo a mesma ser reduzida para um patamar a rondar os dois anos de prisão e, não mais do que isso;

(C) No Proc. 135/20... (Roubo na residência de ...), o aqui Recorrente foi condenado a uma pena de sete anos de prisão (7), sendo que neste caso a pena não deve ser superior a quatro (4) anos de prisão;

(D) No Proc.1035/19... (Furto de Botijas de Gás) aqui o Recorrente foi condenado a três anos e seis (3,6) meses de prisão, sendo que aqui no máximo, face aos factos dados como provados, o máximo que deveria apanhar deveria rondar os dois (2) anos;

(E) No crime de detenção de arma proibida, o aqui Recorrente foi condenado a uma pena de um (1,3) ano e três meses, sendo que aqui pelo resultado da peritagem feita pelo LPC e, pela fraca potência da “arma”, a pena nunca deveria ser superior a seis (6) meses, por ser o mais justo, nem se ter provado que a mesma foi usada.

66. Assim face aos artigos 71º, 72º e 73º do C. Penal, o mínimo que se poderia esperar era, face a todas as circunstâncias já narradas, que as penas impostas fossem mais leves, nas proporções acima descriminadas, sendo certo que se entende que ao aqui arguido deveria ter sido aplicada – caso se provasse a sua culpa pelos fundamentos esgrimados supra - uma pena de prisão única inferior ao cúmulo jurídico operado e, nunca numa pena de prisão efectiva de dez anos e seis meses de prisão, mas sim numa pena única que ronde os sete/oito anos de prisão;

67. Só assim se poderia obter um dos fins das penas: - a plena recuperação e reintegração na Sociedade.

68. Assim sendo, face aos artigos 71º, 72º, conjugados com o artº50, todos do C.P., o mínimo que se poderia esperar é que, a pena imposta fosse reduzida, face a todas as circunstâncias do caso vertente.

69. É que ainda era susceptível de ser comunitariamente suportável para suportar e para cumprir a função de prevenção geral e, possam responder à maior exigência de reintegração social;

70. Esta pena aplicada não parece se enquadrar na intenção do legislador;

71. O nosso sistema penal, tem subjacente um direito mais reeducador do que sancionador, sem esquecer que a reinserção social, para ser conseguida, não poderá descurar os interesses fundamentais da comunidade, prevendo uma atenuação da pena, se para tanto concorrerem razões no sentido de que assim se facilitará aquela reinserção e, nesse sentido também vai o “Relatório Social”;

72. É exactamente nestes casos em que a ideia de prevenção especial que também preside aos fins das penas, assume especial relevo;

73. O principal escopo das penas aplicadas, é evitar que voltem a cometer crimes e que se tornem cidadãos responsáveis, socialmente úteis e cumpridores da lei, como é o caso do aqui Recorrente, que nunca tinha estado preso e, lhe serviu de exemplo para o futuro este tempo que estado em prisão preventiva;

74. Caberá ao julgador, no caso vertente apreciar os seus critérios de aplicação;

75. Atendendo aos já referidos princípios gerais de direito e à visada reinserção social, afere-se, salvo o devido respeito, como excessivamente gravosa e, acima de tudo, contraproducente a pena aplicada;

76. As circunstâncias e contornos que tomou os crimes praticados pelo ora Recorrente e descritos no douto acórdão, assim como as descritas condições pessoais do arguido constantes dos autos, deveriam ser consideradas como tendo um relevo especial, impondo-se uma atenuação especial da pena, prevista nos artigos 72º e 73º do CP;

77. Assim sendo, tais factos, devem ser susceptíveis de baixar a pena a um patamar que, sendo ainda comunitariamente suportável para cumprir a função de prevenção geral, possa responder à maior exigência de reintegração social;

78. Assim, atenta a prova produzida em julgamento e, no nosso modesto entendimento não se fez prova em relação ao arguido quanto aos crimes de roubo e furto, porque não existe qualquer prova contra o arguido, mas sim porque a prova que existe é meramente circunstancial e insuficiente para se ter a necessária certeza de que o arguido tenha actuado da forma descrita pela Acusação, e caso se mantenha a decisão de condenar o arguido pelos crimes vertidos no Douto Acórdão, deverá a pena aplicada ser especialmente atenuada nos termos do artº 73, nº 1 al. a) e b) do CP, condenando-se o ora Recorrente em pena de prisão inferior, que ronde os sete/oito anos de prisão, operado o cúmulo jurídico;

79. Contudo, na nossa mais humilde opinião, pugnamos pela ABSOLVIÇÃO do arguido nos crimes supra impugnados, porque efectivamente não se fez qualquer prova, não porque o tribunal não tenha trilhado todos os “carreiros” possíveis para o resultado da sua convicção, mas porque aliado ao facto de, por força do artº355 do CPP, em sede de audiência não se ter feito a dita prova do que se alegava;

80. Ou seja, “sem ovos não se pode fazer uma omelete” e, o facto de na fase da investigação indiciar que o arguido possa ter praticado os factos, a verdade é que NADA SE PROVOU em sede de audiência de discussão e julgamento, pelo que forçosamente terá que se aplicar o Princ. In Dubio Pro Reo e absolver o arguido, sem prescindir!

            Termina pedindo o provimento do recurso, revogando-se o Acórdão recorrido e sendo absolvido dos crimes que não cometeu e, em última instância, reduzindo-se as penas individualmente aplicadas e, por força disso também, em cúmulo jurídico, a pena única deve ser reduzida a 7 ou 8 anos de prisão.

4. Os recursos foram admitidos, por despacho de 11.01.2022, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito suspensivo.

5. O Ministério Público junto do Tribunal da Relação respondeu aos recursos, apresentando as seguintes conclusões:

1. O Tribunal recorrido fez a sua apreciação e concluiu de forma assertiva, segundo as regras da experiência e da livre apreciação da prova, nos termos do disposto no artigo 127, do C. P. Penal.

2. Não estamos perante factos que tenham suscitado dúvidas ao Tribunal recorrido, pelo que não se coloca, nem tem de ser colocada, qualquer discussão acerca do princípio "in dúbio pro reo", como invoca o recorrente.

3. O princípio in dubio pro reo, em sede de matéria de facto, só poderá incluir-se no âmbito da apreciação dos vícios da decisão recorrida indicados no art. 410.º, n.º 2, do CPP, se resultarem directamente do texto desta, por si só ou em conjugação com as regras da experiência.

4. A fundamentação do acórdão satisfaz plenamente as exigências legais, de completude, coerência e respeito pelo critério da apreciação da prova, podendo concluir-se que o texto da decisão recorrida não evidencia vício que possa incluir-se na previsão do n.º 2, do art. 410.º, do CPP, susceptível de revelar qualquer dúvida quanto às conclusões obtidas na fixação da matéria de facto.

5. A medida das penas de prisão aplicadas e a sua efectividade, mostram-se exaustivamente fundamentadas e cumprem os requisitos exigidos pelos artigos 40º, 50°, 702, 71°; 72º e 73º, todos do Código Penal.

Termina pedindo a rejeição dos recursos, por serem manifestamente improcedentes, confirmando-se o acórdão da Relação impugnado.

6. Subiram os autos a este Supremo Tribunal de Justiça e, a Srª. PGA emitiu parecer no sentido de, por haver “dupla conforme”, ser irrecorrível o ac. do TR... de 2.12.2021 quanto a todas as questões (processuais e/ou substantivas) colocadas relativas às penas parcelares inferiores a 8 anos (devendo ser, nessa parte, rejeitado cada um dos recursos em análise) e, apenas ser elegível para apreciação no STJ, a matéria relativa à pena única superior a 8 anos, concluindo, pelos motivos que indicou, que as mesmas devem ser mantidas, não merecendo provimento os recursos na parte objeto de apreciação.

7. No exame preliminar a Relatora ordenou que fossem cumpridos os vistos legais com o envio das peças processuais que fossem solicitadas, tendo-se realizado depois a conferência e, dos respetivos trabalhos, resultou o presente acórdão.

Cumpre, assim, apreciar e decidir.

II. Fundamentação

Factos


8. Resulta do acórdão da 1ª instância a seguinte decisão sobre a matéria de facto (devendo ter-se em atenção que a decisão sobre a matéria de facto foi confirmada pelo Ac. do TR.… de 2.12.2021, salvo quanto à participação do arguido BB nos pontos 60 a 70 dados como provados e respetiva motivação, ou seja, ressalvada a participação desse arguido BB no assalto aí descrito, pelos motivos indicados no mesmo acórdão da Relação):

“1. Em data não concretamente apurada, mas anterior ao dia 8 de Maio de 2019, os arguidos AA, também conhecido por “PP”, EE, também conhecido por “QQ”, BB, também conhecido por “RR”, e JJ, também conhecido por “SS”, decidiram dedicar-se, em conjunto à apropriação de valores existentes nos cacifos de máquinas ATM, quando fossem transportados por vigilantes ou manuseados por técnicos de manutenção desses equipamentos.

2. Na concretização dos planos previamente gizados entre aqueles arguidos, alguns dos arguidos actuavam encapuzados com utilização de armas, violência e ameaças, para se apropriarem dos bens e do dinheiro das vítimas.

3. Tal plano foi estabelecido por forma a obterem ganhos patrimoniais, procedendo à divisão do dinheiro e bens de que se apoderavam.

4. Para as deslocações necessárias na prática desses assaltos, alugavam viaturas automóveis na empresa de aluguer de viaturas “S.…” sita na ... em ..., bem como em outras empresas do mesmo setor, ou viaturas em nome de outros indivíduos.

5. Os arguidos BB e LL planearam assaltos na via pública.

6. Os arguidos AA, BB, LL e KK planearam a subtraçcão de bens em estabelecimentos.

7. Por seu turno, os arguidos AA, BB e KK planearam assaltos em residências com recurso a violência física e armas.

NUIPC 24/19.... (Centro Comercial ...)

8. No dia 7 de Maio de 2019, o arguido CC, acompanhado do arguido AA, celebrou um contrato de aluguer da viatura ... de matrícula ...-PN-.. tendo o arguido AA pago o valor desse contrato.

9. Nesse mesmo dia, da parte da tarde, quando se encontravam na posse da viatura citada, os arguidos AA e CC deslocaram-se ao ..., sendo este último com o objetivo de proceder aos reconhecimentos de locais em que poderia encetar roubos de valores, nomeadamente no Centro Comercial ..., planeado para o dia seguinte.

10. De seguida, pelas 19h00, deslocaram-se novamente à ..., onde na empresa de aluguer de viaturas “S.…” procederam à devolução da viatura ..., e saíram na posse de nova viatura alugada, da marca ..., de matrícula ...-SV-...

11. A mesma viatura seria utilizada no dia seguinte para um assalto no ....

12. O contrato de aluguer da viatura foi celebrado novamente em nome do arguido CC, tendo tal contrato sido igualmente pago pelo arguido AA.

13. Conforme previamente planeado, os arguidos AA, EE, BB e JJ deslocaram-se na viatura alugada da marca ..., de matrícula ...-SV-..., na manhã de 08 de Maio de 2019 para o ....

14. O arguido AA levou consigo o seu telemóvel pessoal no qual se encontrava inserido o cartão SIM da “...” correspondente ao número ...95, e o arguido EE levou o seu telemóvel pessoal no qual se encontrava inserido o cartão SIM da “...” correspondente ao número ...92, o qual tinha começado a utilizar no dia anterior.

15. Nessa localidade começaram a observar as movimentações dos técnicos de manutenção das máquinas ATMs, que nessa manhã, cerca das 11h00, tinham agendada uma intervenção na ATM situada no interior do Centro Comercial ..., pertença do Banco 1..., sito na Rua ..., ....

16. Conforme plano elaborado, os arguidos BB e JJ iriam subtrair o dinheiro mediante o uso de força física e violência enquanto os arguidos AA e EE iriam ficar na retaguarda e vigilância na viatura, assegurando a fuga.

17. Cerca das 11h20m, quando o técnico informático da empresa D.…, TT, e o técnico da empresa P.…, UU, se encontravam junto da máquina ATM em intervenção, com o cofre aberto e os cacifos contendo dinheiro colocados no chão, os suspeitos BB e JJ receberam indicações para se deslocarem para o interior do Centro Comercial, por parte dos suspeitos AA e EE que se encontravam nas imediações.

18. Os arguidos BB e JJ desceram apeados a Rua ... para entrarem pela porta ... do Centro Comercial.

19. Ao passarem defronte do estabelecimento comercial “Óptica D.…”, e por se encontrarem ainda na via pública, estes dois suspeitos não tinham tapado os seus rostos, sendo os mesmos captados pelas camaras de videovigilância daquele estabelecimento.

20. O arguido BB usava nesse momento o mesmo casaco com que se apresentou para ser fotografado nos serviços de identificação civil, aquando da emissão do seu cartão de cidadão a ... de 2018.

21. Por seu turno, o arguido JJ usava os mesmos boxers de cor ... que lhe vieram a ser apreendidos na sua residência em 18-02-2020.

22. Quando os arguidos BB e JJ chegaram ao local onde estava a máquina ATM, o arguido BB colocou o braço à volta do pescoço do TT, que nesse momento estava agachado junto ao cofre da ATM, manietou-o e atirou-o ao chão tendo perguntado “onde está o dinheiro”.

23. UU, vigilante da empresa de transporte de valores, estava algo afastado do local onde se desenrolava o assalto a olhar o sucedido.

24. Acto contínuo, o arguido JJ pegou nos dois cacifos contendo notas do BCE no valor facial de €10 e €20, que totalizavam 65 980,00 (sessenta e cinco mil, novecentos e oitenta euros) e fugiu do local na posse do dinheiro.

25. Acto contínuo, o arguido BB colocou-se igualmente em fuga.

26. Estes arguidos correram apeados para a mesma zona de onde surgiram, subindo a Rua ... e reuniram-se com os arguidos AA e EE.

27. Depois, colocaram-se todos em fuga na viatura de marca ..., de matrícula ...-SV-.., a qual se encontrava estacionada nas ruas limítrofes, para não ser detetada por possíveis testemunhas.

28. No dia 8 de Maio de 2019, o arguido AA comprou um telemóvel ... no valor de 1083,99 euros na W... tendo tal compra sido paga com parte das notas subtraídas.

29. A partir desta data o arguido AA deixou de utilizar o número ...95 e começou a utilizar o cartão telefónico da “...” correspondente ao número ...68.

30. No dia 13 de Maio de 2019, nas instalações da GNR ..., o arguido AA tinha na sua posse 1361 euros ainda proveniente deste roubo.

*

31. Com vista a ocultar o seu domicílio às autoridades e ainda para despender as quantias ilicitamente obtidas, JJ e EE acordaram em viver juntos em habitação arrendada, ficando o contrato em nome de OO, que ficaria responsável pela entrega dos pagamentos à senhoria.

32. Assim, em execução de tal desígnio 7 de Junho de 2019, o arguido JJ entrega 700 euros em dinheiro a VV para pagamento de caução e renda do apartamento sito na Rua ..., ..., ..., Quinta ..., data a partir da qual os arguidos passaram a residir em tal morada.

33. Também para que a residência daqueles arguidos não tivesse registos, JJ e EE passam a residir permanentemente nesse apartamento, utilizando os dados pessoais da arguida OO para a celebração dos contratos e despesas associadas à habitação, designadamente de eletricidade e ..., que eram assegurados por esta arguida com o dinheiro que lhe era entregue por aqueles.

34. Nesta decorrência, estes dois arguidos entregam, até Março de 2020, 2800 euros relativos às rendas do apartamento, 20,20 euros de pagamento à CM ... pelo consumo de água e ainda outros valores para pagamento de eletricidade e à operadora ....

NUIPC 37/19.... (CENTRO COMERCIAL ...)

35. No seguimento do roubo bem-sucedido a 8 de maio de 2019, os arguidos AA, BB, JJ e um indivíduo não identificado decidiram efetuar novo roubo a vigilantes de transporte de valores para abastecimento a máquinas ATM.

36. Para consumar o roubo, aqueles arguidos decidiram que iriam alugar outra viatura à empresa de aluguer de viaturas “S.…” pelo que o arguido AA se deslocou àquela empresa no dia 24-6-2020 na companhia de GG.

37. Foi na ocasião celebrado contrato de aluguer da viatura de marca ..., de matrícula ...-SZ-..., em nome deste, tendo tal viatura ficado a partir de então na posse do arguido AA.

38. Assim, no dia 30 de Junho de 2019, os arguidos AA e BB deslocaram-se ao ..., nesta viatura, com o objetivo de proceder a reconhecimentos de locais em que poderiam encetar roubos de valores, nomeadamente no Centro Comercial ...”, planeado para o dia seguinte.

39. Conforme previamente planeado, os arguidos BB, JJ e dois indivíduos não identificados deslocaram-se na viatura alugada de marca ..., de matrícula ...-SZ-..., na manhã de 01 de Julho de 2019 para o ....

40. Nessa localidade começaram a seguir as movimentações dos vigilantes da E.…, que seguiam numa VTV e cerca das 13h45 tinham agendado um transporte de cacifos com dinheiro para a máquina ATM propriedade do “Banco 2...” e situada no interior do Centro Comercial ...”, sito na Rua ..., ....

41. Pelas 13 horas e 50 minutos, os arguidos BB e JJ desceram apeados a Rua ... para entrarem pela porta ... do Centro Comercial ficando os demais comparticipantes no exterior, sendo que um destes que ficou nessa altura em posição de vigilância junto da viatura onde o outro aguardava na posição do condutor.

42. O arguido JJ usava nesse momento as mesmas calças com um rasgão na zona da coxa da perna esquerda com que foi fotografado, em fotografia publicada a 29 de Novembro de 2018 na rede social Facebook que lhe viriam a ser apreendidas na sua residência, e empunhava uma arma elétrica tipo “taser” dissimulada sob forma de lanterna, pertencente ao arguido BB.

43. Já o arguido BB usava nessa ocasião o mesmo casaco cinzento acolchoado e calças desportivas com riscas laterais, peças de vestuário que lhe foram apreendidas em 10-3-2020.

44. Quando o funcionário da empresa E.…, II (porta-valores) estava a proceder à troca dos cacifos vazios por cacifos carregados com notas de valor facial de €20 e €10, que totalizavam € 36 000,00 e depois de ter colocado os cacifos no dispensador, foi abordado pelos arguidos BB e JJ, que tinham as cabeças cobertas por capuzes e estavam a usar óculos escuros, que começaram a gritar “o dinheiro, o dinheiro”.

45. De imediato, um dos arguidos agarrou II por trás, ao mesmo tempo que dizia “dá-me o dinheiro, onde está o dinheiro” e após um dos suspeitos desferiu-lhe um murro que o atingiu na cabeça.

46. II foi depois agarrado pelo arguido BB, enquanto o arguido JJ empunhava uma arma elétrica tipo “taser” na sua direção.

47. Os arguidos continuadamente exigiram a II que lhes entregasse os cacifos com notas, porém, como aqueles já haviam sido bloqueados pela máquina, já não havia possibilidade de os extrair.

48. Em ato continuo, II explicou e demonstrou que já não era possível retirar os cacifos naquele momento, uma vez que após colocar os cacifos no dispensador automaticamente a máquina tranca-os e impossibilita a sua extração, sendo necessário efetuar novos procedimentos técnicos para os desbloquear.

49. Em face disso, um dos arguidos começou a puxar os cacifos do dispensador, para os tirar à força, o que não veio a acontecer, enquanto o outro arguido mantinha II agarrado.

50. A dado momento, II sentiu que o arguido que o estava a agarrar aliviou o aperto e com um safanão libertou-se e tentou fugir, no entanto, acabou por cair uns metros mais a frente.

51. II acabou por ser agarrado novamente pelos dois arguidos que o puxaram por uma perna e o arrastaram até ao local onde estava a máquina ATM, a fim de o obrigar a entregar os cacifos com notas.

52. Quando o II se encontrava prostrado no chão, o arguido JJ atingiu-o na zona do tórax, do lado esquerdo, com descargas elétricas provocadas pela arma elétrica tipo “taser”, o que lhe causou dores.

53. Não obstante o II dizer que era impossível tirar os cacifos do dispensador, o arguido JJ continuou a agredi-lo, até que os arguidos acabaram por encetar a fuga apeada para a rua, numa altura em que várias pessoas no Centro Comercial gritavam por ajuda.

54. O condutor da VTV da E..., HH, seguiu no encalço dos arguidos, observando que os dois arguidos que agrediram o seu colega se dirigiram em corrida para a viatura de marca ..., de matrícula ..-SZ-.., para onde entrou também o indivíduo que se encontrava na esquina da Praceta ... em posição de vigilância.

55. Ao volante da viatura, estacionada na Rua ..., encontrava-se o outro individuo não identificado que de imediato arranca tendo percorrido as Ruas ..., passando junto do supermercado Aldi onde o condutor da VTV da E... a perde de vista.

56. Entre as 11h00 e as 14h30 desse dia, os arguidos JJ e BB desligaram os seus telemóveis pessoais que habitualmente utilizavam, de forma a não serem detetados por localização celular.

57. Cerca das 16h00 do dia 2 de Julho de 2019, WW entregou a viatura de marca ..., de matrícula ...-SZ-..., na rent-a-car “S.…”.

NUIPC 1873/19.... (... ...-TQ-...)

58. Em Setembro de 2019, o arguido LL contactou pessoalmente com XX, tendo-a convencido a facultar a sua documentação pessoal e de rendimentos para registar em seu nome a viatura ... de matrícula ..-TQ-.., e celebrar um crédito automóvel para pagamento dessa mesma viatura, no valor de 30.000 euros.

59. Tal viatura destinava-se a ser usada por si e ainda pelos arguidos BB, AA, e KK em crimes contra a propriedade tendo ficado na posse deste arguido no período compreendido entre 27-11-2019 e 7-12-2019.

NUIPC 684/19.... (ESTAFETA DA T.…)

60. No dia 1-12-2019, o arguido BB contata telefonicamente o arguido LL e combinam que no dia seguinte iriam colocar em prática esse.

61. Assim na execução de tal desígnio, no dia 2 de Dezembro de 2019, cerca das 10 horas, os arguidos LL, BB deslocaram-se na viatura ... citada, para a freguesia ..., concelho ....

62. O objetivo dessa deslocação seria levarem a cabo um assalto na via pública através de recurso a força física para apropriação de valores tais como objetos valiosos de joalharia, relógios, carteiras que transeuntes transportassem consigo.

63. O arguido BB levou consigo o seu telemóvel pessoal com o IMEI ...70 no qual se encontrava inserido o cartão SIM da “...” correspondente ao número ...07, e o arguido LL levou o seu telemóvel pessoal no qual se encontrava inserido o cartão SIM da “...” correspondente ao número ...49.

64. Entre as 11h00 e as 13h00, os arguidos circularam nas freguesias da ... e ..., efetuando vários seguimentos e vigilâncias a pessoas que identificavam como alvos de assaltos a concretizar de imediato.

64. Cerca das 13h05, a testemunha YY conduzia um motociclo na Rua ... no ..., para efetuar uma entrega de pizzas encomendadas por via telefónica momentos antes por uma cliente, na loja “T.…” na ....

65. Ao avistarem o motociclo, os arguidos colocaram a viatura ... de matrícula ...-TQ-... à frente do mesmo.

66. Após ter parado o motociclo, um dos arguidos que seguia no lugar do pendura, saiu da viatura ... e dirigiu-se ao YY, exigindo a entrega das pizzas que transportava, tendo o último recusado e dito que não o poderia fazer.

67. De seguida o outro arguido também saiu exigindo de forma intimidatória e agressiva ao YY que entregasse o que transportava consigo, sob pena de as coisas “lhe correrem mal”.

68. Temendo pela sua integridade física, YY viu-se forçado a colaborar com os intentos dos arguidos.

69. Um dos referidos arguidos apoderou-se das chaves da mala do motociclo, e entregou-as ao outro dos referidos arguidos, o qual abriu a mala e retirou do interior dois sacos térmicos que se encontravam na mala do motociclo, contendo pelo menos 3 pizzas no valor de 34,84 euros e um terminal para pagamento automático PDA no valor de 200 euros, que eram pertença da empresa T....

70. Após os arguidos colocaram-se em fuga na posse dos suprarreferidos objetos.

NUIPC 1035/19.... (GARRAFAS DE GÁS)

71. No dia 07 de dezembro de 2019, cerca das 02h00, os arguidos LL, BB, AA e KK, deslocaram-se na viatura ... de matrícula ...-TQ-... para a freguesia ..., concelho ....

72. O objetivo desta deslocação seria levarem a cabo um furto em armazém através de arrombamento e escalamento, de botijas de gás guardadas no interior da oficina e armazém sito na Rua ..., Quinta ..., no ..., propriedade de ZZ.

73. O arguido BB levou consigo o seu telemóvel pessoal com o IMEI ...70 no qual se encontrava inserido o cartão SIM da “...” correspondente ao número ...07.

74. Cerca das 01h40, o arguido BB contacta telefonicamente o amigo de nome AAA, utilizador do número ...19, questionando-o se conhecia algum soldador, porque precisava de um com urgência.

75. Os arguidos introduziram-se no interior da oficina de ZZ através do telhado, após terem forçado as telhas de zinco, e retiraram duas botijas de oxigénio e acetileno, com o valor total de 660 euros, colocando-as de seguida na mala da viatura ... de matrícula ...-TQ-...

76. Acto contínuo, na posse de tais objetos, os arguidos abandonaram o armazém.

77. Cerca das 02h30, depois de alertados por residentes nas imediações, agentes da PSP ... intercetaram e identificaram os arguidos no local, na posse da viatura ... e das botijas subtraídas, tendo as mesmas sido apreendidas.

NUIPC 135/20.... (RESIDÊNCIA ...)

78. Em data anterior a 17 de Fevereiro de 2020, o arguido KK acordou com o arguido AA em que este fosse buscar uma viatura que havia sido comprada pela testemunha BBB residente em ..., colega do seu irmão KK, ao stand de automóveis D.… situado na Rua ..., ... ....

79. No acto de entrega, em 17-2-2020, este arguido AA assinou um termo de recepção da viatura.

80. No decorrer dos meses de Novembro de 2019 a Fevereiro de 2020, no decurso dos serviços de limpeza e arrumações domésticas que prestava uma vez por semana no apartamento sito na Rua ... em ..., a arguida CCC apercebeu-se que os proprietários da habitação ali guardavam valores, nomeadamente uma elevada quantia em dinheiro, num dos quartos de dormir.

81. A arguida CCC partilhou esse conhecimento com o arguido KK, que informou desse facto o seu irmão e arguido AA, bem como BB.

82. Com o objetivo de planearem a forma como iriam proceder ao roubo desses valores, e com o intuito de que a arguida CCC não fosse associada ao mesmo, ficou acordado que os arguidos KK, AA e BB iriam deslocar-se à residência para consumar o roubo.

83. No dia 19 de Fevereiro de 2020, quarta-feira, conforme habitualmente a arguida CCC deslocou-se a esta residência para realizar o seu trabalho doméstico.

84. Cerca das 19h00 de 20 de fevereiro de 2020, os arguidos AA, BB encontram-se nas imediações da residência sita na Rua ... em ....

85. Nessa ocasião, o arguido BB levou consigo o seu telemóvel pessoal com o IMEI ...70 no qual se encontrava inserido o cartão SIM da “...” correspondente ao número ...07, e o arguido AA levou o seu telemóvel pessoal com o IMEI ...60 no qual se encontrava inserido o cartão SIM da “...” correspondente ao número ...85.

86. No final do dia 27 de fevereiro de 2020, cerca das 17h00 os arguidos BB e AA através de conversação telefónica confirmam nova deslocação para no dia seguinte para ..., tendo o arguido BB dito que iria levar a arma elétrica, a qual guardava na sua residência.

87. Cerca das 07h00 de 28/02/2020, os arguidos AA e KK, que se deslocavam numa viatura não identificada, chegam ao ... para irem buscar o arguido BB.

88. Após acordo e conluio com os arguidos, a arguida CCC deslocou-se à residência de NN no dia 28 de fevereiro de 2020 cerca as 10h15, para realizar o seu trabalho de limpeza doméstica numa sexta-feira, ao invés do que era habitual, que era às quartas-feiras.

89. Ao chegar à porta de entrada do prédio, a arguida CCC contactou via “...” através do seu número ...82 a proprietária NN para esta lhe abrir a porta.

90. Nesse momento os arguidos AA e BB já se encontravam na zona a aguardar a sua chegada conforme previamente combinado, e seguiram atrás dela depois de entrar no prédio, tal como tinham sido informados desse procedimento a seguir pela arguida CCC.

91. O arguido BB levou consigo o seu telemóvel pessoal com o IMEI ...70 no qual se encontrava inserido o cartão SIM da “...” correspondente ao número ...07, e o arguido AA levou o seu telemóvel pessoal com o IMEI ...60 no qual se encontrava inserido o cartão SIM da “...” correspondente ao número ...85.

92. O arguido KK levou consigo o telemóvel com o IMEI ...47 no qual se encontrava inserido o cartão SIM da “...” correspondente ao número ...86, cartão ativado no dia anterior e utilizado apenas para os factos.

93. Em conversações telefónicas mantidas minutos antes, os arguidos BB e KK, comentaram no decorrer da preparação do assalto para terem cuidados de forma a não referirem o nome da arguida CCC enquanto estivessem no interior da residência, e para esperarem que a mesma passasse por eles e entrasse no prédio, tal como tinham sido previamente informados.

94. Após abertura da porta de entrada, os arguidos AA e BB manietam a proprietária NN com recurso a força física e separam-na da arguida CCC, ficando esta oculta na casa de banho do corredor, após ter indicado ao arguido AA o local exacto onde se encontravam as notas, no quarto de dormir.

95. O arguido BB desloca NN para a sala, e atinge-a com uma arma elétrica tipo “taser”, dissimulada sob forma de lanterna, que lhe foi apreendida na sua residência a 10/03/2020 (modelo ... 50000W, recarregável e com voltagem de 17 800 Volts).

96. Enquanto os arguidos AA e BB permanecem no interior da residência, o arguido KK contacta telefonicamente o segundo, tendo este informado que já tinham entrado e para ele ficar atento às movimentações no exterior.

97. Os arguidos AA e BB apoderam-se de 22.000,00€ em notas do BCE, que se encontravam guardados numa caixa no roupeiro do quarto, e um relógio de pulso da marca ...”, que estava no interior da residência citada.

98. Acto contínuo, na posse de tal dinheiro e relógio saem da residência e deslocando-se para junto do arguido KK que os aguardava no exterior, colocando-se em fuga na viatura que os transportara ao local.

99. Pouco depois a proprietária NN consegue soltar-se e sai de casa para o exterior.

100. De seguida a arguida CCC também sai para o exterior, e após chegada ao local de elementos da PSP, refere aos mesmos que tinha ficado fechada na casa de banho, de forma a não levantar suspeitas sobre o seu envolvimento.

101. A casa de banho daquele apartamento era uma divisão cuja porta não fechava à chave a partir do exterior.

102. Após estes factos, a arguida CCC não voltou a contactar os proprietários da residência, por saber que os mesmos iriam desconfiar do seu envolvimento nos factos.

*

103. Após o roubo, os arguidos AA, BB e KK deslocam-se para a cidade ..., nessa mesma tarde.

104. Permanecem nas cidades do ..., ... e ... entre as 16h00 de 28/02/2020 e as 16h00 de 29/02/2020, período durante o qual na posse de parte das notas do BCE roubadas o arguido BB efetua diversas compras de perfumes, acessórios de vestuário e calçado, em lojas da “...”, “...”, “...” e “...”, produtos pelos quais pagou 237,73 € em dinheiro (62€ + 25,46€ + 56,27€ + 27€ + 67€).

105. No dia 29/02/2020 pelas 16h00 os arguidos AA e BB regressam a ..., utilizando para o efeito um comboio da CP.

106. Por ter ficado sem viatura em nome de terceiros na qual se pudesse deslocar, e ainda na posse de parte das notas do BCE roubadas, o arguido AA entrega a DDD as quantias de 40,00 € e 560,00 €, para que o mesmo proceda ao aluguer em seu nome respetivamente das viaturas ... ...-TR-... e ... ...-XN-..., nas datas de 29/02/2020 e 03/03/2020.

107. Com recurso a parte das notas do BCE roubadas, em 01/03/2020 o arguido AA efetua diversas compras de acessórios de vestuário e calçado, em lojas da “...” e “...” em ...”, produtos pelos quais pagou 228,98 € em dinheiro (65€ + 163,98€).

108. Com recurso a parte das notas do BCE roubadas, os arguidos AA e BB no dia 02/03/2020 deslocam-se ao “Hotel ...” na viatura ... ...-TR-... e pagam em dinheiro as quantias de 167,00 € (cento e sessenta e sete euros) pela estadia.

109. Com recurso a parte das notas do BCE roubadas, em 05/03/2020 o arguido BB efetua compra de vestuário, em loja da “...” no ..., produto pelo qual pagou 69,95 € em dinheiro.

110. O arguido BB guardou o relógio da marca ...” e uma nota do BCE no valor facial de 500 € com o número de série ...07, objectos que tinha retirado em 28/02/2020 em ..., e que lhe foram apreendidos a 10/03/2020 na sua habitual residência sita Praceta ..., ..., no ....

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111. Foram realizadas buscas domiciliárias à residência da mãe de JJ, sita na Rua ..., ..., ..., e na respetiva sala comum e cozinha foram encontrados os seguintes objetos pertencentes ao arguido EEE:

a.  Uma pistola de calibre 7,65 mm de cor ... e marca ... n.º de série ...03, sem aptidão para realizar quaisquer disparos, e respetivo carregador contendo duas munições de marca ..., calibre 7,65.

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112. Os arguidos AA e BB, agiram, concertadamente e de comum acordo, durante um longo período de tempo, com a finalidade de praticar vários ilícitos criminais.

113. Os arguidos KK AA, BB recorreram a CCC para obter informações que permitiram consumar o roubo de que foram vítimas NN e FFF.

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114. Os arguidos AA, EE e JJ bem sabiam que usar o dinheiro ilicitamente subtraído, ocultando a sua proveniência, que desse modo dificultavam a sua apreensão por parte das autoridades e o ressarcimento dos ofendidos, pondo em causa a eficaz realização da justiça, tendo agido de comum acordo e comunhão de esforços nesse sentido.

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115. Os arguidos AA, EE, BB e JJ agiram de forma a subtrair e fazer suas as quantias monetárias supra referidas, o que lograram conseguir fazer no dia 8 de Maio de 2019 colocando os ofendidos na impossibilidade de lhes oferecer qualquer tipo de resistência.

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116. Os arguidos BB e JJ não lograram, no dia 30 de Junho de 2019, subtrair os bens pretendidos por motivos alheios às suas vontades, não se tendo coibido de para o efeito usarem de força física, atuarem de modo súbito, colocando os ofendidos na impossibilidade de lhes oferecer qualquer tipo de resistência tendo utilizado, de comum acordo, uma arma elétrica tipo “taser”.

117. O arguido AA sabia que o veículo ... ...-SZ-... iria ser utilizado num assalto a realizar por estes arguidos.

118. O arguido JJ, atuou em comunhão de esforços e vontade com os outros suspeitos, na execução de um plano estabelecido por todos, com o propósito, concretizado, de molestar o corpo e a saúde de II, querendo desta forma impossibilitar qualquer defesa a este ofendido.

119. Os arguidos BB e JJ conheciam bem as características da arma que este trazia consigo e da sua capacidade letal, bem sabendo que a detenção da mesma era proibida e punida por lei, mas acordaram na utilização da arma para a execução do plano estabelecido por todos.

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120. Os arguidos LL e BB quiseram subtrair e fazer suas as pizzas e o PDA supra referidos, que se encontravam na posse de YY, não se tendo coibido de para o efeito usarem de força física, atuarem de modo súbito, colocando o aquele ofendido na impossibilidade de lhes oferecer qualquer tipo de resistência.

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121. Os arguidos LL, KK, BB e AA quiseram subtrair e fazer suas as botijas de acetileno e oxigénio, que se encontravam no interior da oficina armazém sito na Rua ..., ..., Quinta ..., pertencentes a ZZ, tendo desejado entrar em tal local através do arrombamento do telhado, não ignorando que a tal se opunha o legítimo dono de tais bens e local.

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122. Os arguidos KK, AA e BB quiseram apropriar-se com o uso da força física, de 22 000 euros e um relógio de marca ... pertencentes a NN e FFF, que se encontravam guardados na sua residência, tendo atuado de comum acordo e comunhão de esforços para entrar em tal residência e se apropriar de tais bens, não se tendo coibido de para tal efeito usarem de força física, atuarem de modo súbito, colocando a ofendida NN na impossibilidade de lhes oferecer qualquer tipo de resistência.

123. A arguida CCC ao prestar as informações que prestou aos arguidos KK, AA e BB, bem sabia que auxiliavam estes a subtrair 22.000 euros do interior da residência de NN e FFF.

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124. Os arguidos AA e BB quiseram ainda adquirir bens de natureza corpórea com o dinheiro proveniente dos factos acima descritos.

125. Assim, o arguido AA quis despender, em 8-5-2019, 1083 euros na Worten para compra de bens bem sabendo que o fazia com quantias obtidas de facto ilícito.

126. O arguido AA quis despender, em 14-5-2019, 224 euros na empresa de aluguer de automóveis “S.…” bem sabendo que o fazia com quantias obtidas de facto ilícito.

127. O arguido AA quis despender, em 19-5-2019, 150 euros em aluguer de viatura, na empresa “S.…” bem sabendo que o fazia com quantias obtidas de facto ilícito.

128. O arguido AA quis despender, em 24-6-2019, 474,90 euros, na empresa de aluguer de automóveis “S.…”, bem sabendo que o fazia com quantias obtidas de facto ilícito.

129. O arguido AA quis despender, em 24-6-2019, 474,90 euros na empresa de aluguer de automóveis “S.…”, bem sabendo que o fazia com quantias obtidas de facto ilícito.

130. O arguido AA quis despender, em 29-2-2020, 40 euros na empresa de aluguer de automóveis “S.…” bem sabendo que o fazia com quantias obtidas de facto ilícito.

131. O arguido AA quis despender, em 1-3-2020, 228,98 euros na loja ..., para compra de equipamentos desportivos, bem sabendo que o fazia com quantias obtidas de facto ilícito.

132. O arguido AA quis despender, em 3-3-2020, 560 euros na empresa de aluguer de veículos “S.…” bem sabendo que o fazia com quantias obtidas de facto ilícito, tendo entregue tal dinheiro a DDD.

133. O arguido EE quis despender, em 13-6-2019, 763 euros na loja conforama, para aquisição de um sofá, bem sabendo que o fazia com quantias obtidas de facto ilícito.

134. Os arguidos JJ e EE quiseram despender, entre Julho de 2019 e Fevereiro de 2020, 2800 euros, em rendas de casa alugada a VV, sabendo que o faziam com quantias obtidas de facto ilícito.

135. Para tal efeito, estes arguidos entregavam tais montantes à arguida OO que depois entregava tal dinheiro à senhoria.

136. Os arguidos AA e BB quiseram despender, em 2-3-2020, 167 euros no Hotel ..., bem sabendo que o fazia com quantias obtidas de facto ilícito.

137. Os arguidos AA, EE, BB, JJ, LL, KK e CCC sabiam que os seus comportamentos eram proibidos e punidos por lei, tendo agido sempre de forma livre, voluntária e consciente.

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Mais se provou (arguido AA):

122.          O arguido AA compareceu no julgamento e não prestou declarações.

123.          O arguido apresenta a seguinte condenação averbada no respetivo registo criminal:

a.         No processo n.º 149/13..., mediante decisão transitada em julgado em 19 de Junho de 2014, o referido arguido foi condenado na pena de multa, pela prática, em 13 de Fevereiro de 2013, de um crime de detenção de arma proibida.

b.         No processo n.º 177/16..., mediante decisão transitada em julgado em 19 de Junho de 2019, o referido arguido foi condenado na pena de multa, , pela prática, em 9 de Maio de 2016, de um crime de receptação.

c.         No processo n.º 37/16..., mediante decisão transitada em julgado em 13 de Fevereiro de 2019, o referido arguido foi condenado na pena de 2 anos e 3 meses de prisão, suspensa na execução por igual período de tempo, com sujeição a regime de prova, pela prática, em 19 de Maio de 2016, de um crime de tráfico de estupefacientes.

d.         No processo n.º 767/17..., mediante decisão transitada em julgado em 29 de Janeiro de 2019, o referido arguido foi condenado na pena de multa, pela prática, em 19 de Junho de 2017, de um crime de detenção de arma proibida.

e.         No processo n.º 192/19..., mediante decisão transitada em julgado em 28 de Abril de 2021, o referido arguido foi condenado na pena de 6 meses de prisão, suspensa na execução pelo período de um ano, com sujeição a regime de prova, pela prática, em 6 de Maio de 2019, de um crime de consumo de estupefacientes

(RELATÓRIO SOCIAL)

124.          O arguido AA nasceu em .../.../1995.

125.          É o mais novo de uma fratria de três e cujo desenvolvimento decorreu no agregado da família de origem.

126.          O pai faleceu quando o arguido era recém-nascido, pelo que a mãe assegurou sozinha o sustento e educação do agregado, cuja situação económica tinha sofrido um agravamento com o desaparecimento do pai; todavia, foi referido que as necessidades básicas eram asseguradas.

127.          Apesar da ausência do pai na sua educação, aparentemente o arguido não denota défices psicoafectivos, tendo o seu processo de desenvolvimento decorrido num ambiente familiar equilibrado, havendo preocupação pela parte da mãe em proporcionar aos descendentes um contexto facilitador em termos de aquisição de valores e normas de conduta ajustadas.

128.          O arguido entrou para a escola em idade própria, referindo que foi um aluno regular, pontuando duas retenções por falta de motivação para o estudo das matérias escolares.

129.          Completou o 8° ano de escolaridade, tendo abandonado o percurso escolar no decurso da frequência de uma formação profissional.

130.          Após a desistência dos estudos, o arguido permaneceu cerca de dois anos desocupado de qualquer atividade socialmente útil, dando inicio ao percurso laboral como distribuidor de publicidade de forma precária.

131.          O seu percurso laboral apresenta-se pouco significativo, com algumas inserções pouco duradouras e indiferenciadas.

132.          Na área da saúde o arguido referiu que até ser preso consumia haxixe com regularidade, minimizando esta adição.

133.          No âmbito dos relacionamentos com os seus pares o arguido verbalizou que a maior parte dos seus amigos desenvolveriam uma atividade profissional ou estudariam.

134.          No período da adolescência, o arguido teve contactos com o sistema de justiça, tendo-lhe sido aplicadas medidas tutelares educativas com intervenções da DGRSP.

135.          Em 2016, na sequência da mãe se ter deslocado para a ... por motivos de doença, o arguido permaneceu em Portugal sem ocupação regular, não podendo assim contar com o apoio da mãe.

136.          Esta terá ficado desempregada devido à situação de doença, o que originou a perda da habitação que havia adquirido com recurso a empréstimo bancário.

137.          No âmbito de uma ocupação onde cuidava de um senhor idoso, a família deste emprestou-Ihe uma pequena moradia ... em ... no sentido de alocar a família, nesta altura constituída pela mãe e arguido; todavia, o arguido recusou a mudança de habitação e de zona de residência, tendo-se deslocado para a ..., cidade onde a família já havia habitado e onde o arguido tinha as suas referências de amizade.

138.          A mãe deslocava-se àquela cidade com frequência no sentido de o convencer a viver em ..., contudo, o arguido escondia-se da mesma com a conivência dos amigos, desconhecendo assim a mãe o seu modo de vida.

139.          O arguido referiu que no período precedente à situação de prisão mantinha-se desempregado, não possuindo qualquer atividade socialmente útil.

140.          O arguido não se inscreveu no IEFP, nem encetou diligências no sentido de obter uma inserção laboral regular e com vínculos contratuais.

141.          Relativamente aos consumos de haxixe, o arguido refere que cessou os mesmos aquando da sua entrada no EP...; contudo, não denota consciência critica quanto aos malefícios daquela substância na sua saúde e no seu percurso vivencial

142.          Ao nível das características pessoais, o arguido não revela ser portador de autonomia pessoal para fazer as opções de vida mais vantajosas para si, denotando lacunas ao nível da capacidade de descentração e de prever consequências dos seus atos.

143.          O arguido minimiza os factos sob julgamento, mostrando-se mais preocupado com a situação de reclusão e desfecho do atual processo.

144.          O presente processo teve um impacto negativo mais significativo ao nível da perda de liberdade, tendo em conta que o arguido não possuía quaisquer responsabilidades sociofamiliares e laborais, apresentando um estilo de vida destruturado.

145.          A nível institucional, o arguido mantém um comportamento adequado e normativo, sem sanções disciplinares.

*

Mais se provou (arguido BB:

146.          O arguido BB compareceu no julgamento e não prestou declarações.

147.          O arguido apresenta as seguintes condenações averbadas no respetivo registo criminal:

a.         No processo n.º 492/12..., mediante decisão transitada em julgado em 15 de Abril de 2013, o referido arguido foi condenado na pena única de 1 ano de prisão, suspensa por igual período de tempo, com sujeição a regras de conduta, pela prática, em 2 de Maio de 2012, de três crimes de roubo simples.

b.         No processo n.º 822/18..., mediante decisão transitada em julgado em 28 de Novembro de 2018, o referido arguido foi condenado na pena de multa, pela prática, em 27 de Janeiro de 2018, de um crime de condução sem habilitação legal.

c.         No processo n.º 423/18..., mediante decisão transitada em julgado em 1 de Outubro de 2018, o referido arguido foi condenado na pena de multa, pela prática, em 15 de Julho de 2018, de um crime de condução sem habilitação legal. Tal pena veio a ser convertida em pena de prisão subsidiária.

d.         No processo n.º 625/18..., mediante decisão transitada em julgado em 29 de Janeiro de 2020, o referido arguido foi condenado na pena de multa, pela prática, em 8 de Agosto de 2018, de um crime de condução sem habilitação legal.

(RELATÓRIO SOCIAL)

148.          O arguido BB nasceu em .../.../1995.

149.          BB é natural de ..., onde viveu até aos cinco anos, idade, tendo então viajado para Portugal com a progenitora e o irmão mais velho (uterino), para se juntarem ao seu progenitor, à data a residir em Portugal e a trabalhar na construção civil.

150.          O arguido tem ainda seis irmãos consanguíneos.

151.          Em Portugal, nasceu o seu irmão mais novo e a dinâmica familiar vivida, foi descrita como sendo harmoniosa e afectuosa, tendo o agregado familiar um adequado nível de vida durante a sua infância.

152.          Após a deslocação do progenitor para o ..., por motivos laborais, este viria a estabelecer um relacionamento afectivo extraconjugal, alegadamente desconhecido do agregado familiar do arguido, e na sequência do qual veio a cometer o crime de homicídio na pessoa da ex-companheira.

153.          Devido à prisão do progenitor, quando o arguido tinha catorze anos de idade, e ainda no presente, a cumprir uma pena de dezanove anos, a estabilidade emocional e as condições de vida do agregado familiar, e do próprio arguido, alteraram-se significativamente.

154.          Até então, a progenitora não desenvolvia qualquer actividade laboral (em ... trabalhava como ...), e desde então teve de desenvolver uma actividade para garantir a subsistência dos três filhos.

155.          O salário mínimo que auferia, insuficiente para custear todos os encargos com a habitação, comprada com recurso a empréstimo bancário, e para garantir a subsistência do agregado familiar, levou a que a situação económica da família começasse a ser precária.

156.          Apesar de o arguido ter sido descrito como bom aluno, o seu percurso escolar decorreu até à frequência do 11.º ano (que não concluiu) e até aos vinte e um anos de idade, idade em que desistiu do curso profissional de electricidade, por motivos que não soube especificar.

157.          Iniciou então a sua actividade profissional numa padaria, vindo posteriormente a exercer outras actividades, tais como, servente e pintor da construção civil, como montador de palcos num circo e como soldador na ..., onde permaneceu poucos meses.

158.          Todas estas actividades, foram exercidas por períodos muito reduzidos de tempo, por insatisfação do próprio arguido relativamente à remuneração auferida e por alegados incumprimentos das entidades patronais no pagamento do salário acordado com o próprio.

159.          À data da prisão, BB coabitava com a progenitora e com o irmão de ... anos de idade e estudante, numa habitação arrendada desde 2019, uma vez que a habitação adquirida com empréstimo bancário foi penhorada, por incapacidade do agregado em pagar as prestações de amortização do empréstimo no valor de 600€.

160.          A habitação onde residem foi descrita pela progenitora como sendo uma barraca, cedida/arrendada (nem sempre consegue pagar a renda num valor não especificado) por um proprietário de uma oficina, mas que não possui condições de habitabilidade e de reduzidas dimensões, tipologia ....

161.          A progenitora é o único elemento do agregado que exerce actividade laboral, nomeadamente como auxiliar de acção médica na ..., auferindo de vencimento o salário mínimo nacional.

162.          O agregado recebe ainda algum apoio por parte do Banco Alimentar e da Paróquia ..., ao nível de bens alimentares.

163.          O progenitor, preso há onze anos, já beneficiou de Licenças de Saída Jurisdicional na habitação do agregado familiar, e mantém o relacionamento conjugal com a progenitora do arguido.

164.          Antes de preso, o arguido e o irmão visitavam o progenitor no Estabelecimento Prisional ..., onde ainda cumpre pena e mantendo com este um relacionamento descrito pela progenitora, como sendo harmonioso e afectivo.

165.          No plano laboral, o arguido não exercia qualquer actividade, justificando esta inactividade com a actual situação de pandemia.

166.          Apesar de ter saído por iniciativa própria da fábrica da ..., onde trabalhou apenas alguns meses por considerar que “exigiam muito e pagavam pouco”, o arguido verbalizou que gostaria de voltar a trabalhar no mesmo local, onde auferia o salário de 800€/mês.

167.          Ao nível afectivo, o arguido manteve uma relação de namoro; porém, esta terá terminado quando tinha vinte e quatro anos de idade por alegada traição por parte da namorada, situação que a progenitora relatou como pesarosa para o arguido.

168.          Quando em meio livre, o arguido planeia voltar a coabitar com progenitora até se autonomizar em termos habitacionais e económicos.

169.          O seu irmão mais velho já tem agregado próprio e vive de forma autónoma.

170.          Em termos pessoais e no relacionamento com o seu interlocutor, o arguido revela uma postura pouco confiante, reservada e pouco empática, procurando não se expor, nem expressar os seus pensamentos, opiniões e sentimentos.

171.          Sobre o seu percurso de vida e criminal também não faz qualquer análise crítica, denotando alguma desvalorização do mesmo.

172.          Face à actual situação jurídico-penal, BB enquadra-a num contexto de “azar” e não se revê na acusação que sobre si recai.

173.          Face a esta postura, não tece qualquer análise critica sobre a sua responsabilidade na sua constituição como arguido, bem como, sobre a tipologia de crime de que está acusado e eventuais danos causados.

174.          No estabelecimento prisional já foi alvo de uma sanção disciplinar por posse de telemóvel e que negou ser seu.

175.          Recebe a visita da progenitora e do irmão mais novo, com os quais mantém um relacionamento próximo e afectuoso.

176.          A progenitora mostra grande proximidade e afetividade pelo arguido, considerando que as necessidades vividas no seio familiar, não justificavam a eventual prática de crimes porque sempre priorizou as necessidades dos filhos em detrimento das suas.

(…)[3]

C) MOTIVAÇÃO DO JULGAMENTO DA MATÉRIA DE FACTO

1. O juízo probatório positivo e negativo alcançado pelo Tribunal fundou-se na análise global e sistemática das declarações prestadas por alguns dos arguidos em sede de julgamento, dos depoimentos das testemunhas ouvidas em sede de audiência de julgamento e da prova pericial e documental constante dos autos, nomeadamente os relatórios de diligência externa, as imagens captadas pela videovigilância instalada nos locais assaltados, os autos de revista, busca e apreensão, os autos de exame e avaliação dos objectos apreendidos, as reportagens fotográficas, os relatórios dos exames periciais das armas apreendidas, as transcrições das escutas telefónicas autorizadas e os autos de análise de tráfego telefónico, tudo à luz da regra da livre apreciação e das restrições legais existentes, com a concorrência de critérios objectivos que permitam estabelecer um substrato racional de fundamentação e de convicção.

A multiplicidade de arguidos envolvidos e as particularidades de cada uma das situações típicas descritas na pronúncia exigem a motivação individualizada por referência a cada tema ou conjunto temático da prova.  

2. Os principais temas da prova a analisar neste julgamento são: a) os assaltos às ATM existentes no interior dos Centros Comerciais; b) o assalto ao estafeta; c) o furto das garrafas de gás; d) o assalto à residência de ...; e) os branqueamentos; f) as apreensões das armas e munições; g) e a associação criminosa

Vejamos então sucessivamente cada um destes temas de forma mais ou menos pormenorizada consoante a controvérsia existente, sendo certo que apenas um dos arguidos prestou declarações no julgamento, a saber, a arguida OO.

3. Relativamente à prática dos assaltos às ATM pelos arguidos AA, BB, JJ e EE, a prova produzida não suscitou quaisquer dúvidas quanto ao juízo probatório positivo parcial alcançado nesta matéria, mas não deixa de haver restrições importantes a fazer.

Ninguém – incluindo os próprios arguidos, não obstante o seu absoluto silêncio adoptado até ao final do julgamento – colocará em crise que as duas ATM dos autos tivessem sido assaltadas (vide os depoimentos das testemunhas ouvidas em julgamento que estavam no interior e no exterior dos centros comerciais e as imagens recolhidas através da videovigilância que constam dos suportes digitais juntos aos autos).

Foram os referidos arguidos que os executaram?

É indiscutível que estes quatro arguidos se conheciam e se relacionavam socialmente entre si, ao ponto de terem estado todos presentes no jantar de aniversário do arguido AA ocorrido em 23 de Setembro de 2019 (Auto de diligência e fotografias de fls. 615-619).

Porém, o julgamento revelou que o relacionamento entre estes arguidos foi muito além das festas de aniversário.

3.1. Relativamente à execução do assalto à ATM existente no interior do Centro Comercial ... (8 de Maio de 2019), o Tribunal contou, em primeira linha, com os depoimentos das testemunhas TT (técnico da empresa D.…) e UU (vigilante da empresa P.…), bem como com as fotografias do local de fls. 58-65, o relatório do LPC (Local do crime) de fls. 170 e os autos de visionamento das imagens de CCTV de fls. 81 e 89 (reportadas aos DVD que constam do Apenso A).   

A ATM em apreço apresentava uma mensagem de erro no dispensador de notas desde 2 de Maio e a intervenção técnica da D.… na ATM, com a abertura do cofre assegurada pela P.…, foi agendada para dia 8 de Maio de 2019, pelas 11 horas (Mensagens de correio eletrónico de fls. 144, trocadas entre a SIBS, a P... e D..., bem como depoimentos das testemunhas GGG e HHH).

Tal intervenção técnica determinou a efectiva retirada temporária dos cacifos com dinheiro da ATM para o chão, para viabilizar o acesso ao dispensador das notas (Depoimento de TT).

Enquanto estava agachado a intervir no dispensador das notas, o técnico TT foi agarrado por um dos assaltantes do sexo masculino que o segurou pelas costas com o braço à volta do pescoço, sendo que o outro assaltante do sexo masculino acabaria por agarrar e empurrar o vigilante UU para o chão (Depoimentos de TT e UU e imagens da videovigilância).

Os dois assaltantes entraram no Centro Comercial e fugiram deste com o produto do assalto, fazendo-o invariavelmente pela porta ... do Centro Comercial, a qual permite o acesso para a Rua ... (Fotografias de fls. 58-65 e imagens da videovigilância).

Resulta destas imagens que os assaltantes em apreço eram de raça negra e ambos traziam as respectivas cabeças tapadas com capuzes do vestuário que então trajavam.

A ATM tinha € 66 000,00 no seu cofre no momento da execução do assalto e os assaltantes levaram consigo os dois cacifos com € 65 980,00, excepto uma nota de 20,00€ que ficou na ATM (Informação da P.… de fls. 3277).

Relativamente à execução do assalto à ATM existente no interior do Centro Comercial ... (1 de Julho de 2019), o Tribunal contou, em primeira linha, com os depoimentos das testemunhas HH e II (vigilantes da empresa E.…), bem como com a reportagem fotográfica de fls. 32, o relatório do LPC (Local do crime) de fls. 123 e com o auto de visionamento das imagens de CCTV de fls. 52 do Apenso 37/19 (reportadas ao DVD que consta do Apenso A).   

Nesta situação, não estava em causa qualquer intervenção técnica na ATM mas antes uma operação de reabastecimento da ATM, a qual acabou por ser realizada devido a um ligeiro atraso dos assaltantes que não conseguiram deitar a mão aos cacifos carregados com notas antes de eles serem inseridos no cofre e ficarem bloqueados.

O vigilante II foi inicialmente agredido com murros na cabeça e nas costas e veio também a ser rasteirado e a sofrer uma descarga eléctrica de taser no corpo após ter tentado fugir para o exterior do Centro Comercial (Depoimento da vigilante II, relatório pericial médico de fls. 17 e boletim de exame médico de 195).

Os dois assaltantes que entraram no Centro Comercial e interagiram com o vigilante II juntaram-se na fuga a um terceiro indivíduo que se encontrava apeado no exterior e, posteriormente, estes três indivíduos entraram para o interior de ..., de cor ..., com a matrícula ...-SZ-..., conduzido por um quarto indivíduo (Depoimento do vigilante HH e Auto de notícia de fls. 115).       

Resulta destas imagens que os assaltantes em apreço eram de raça negra e ambos traziam as respectivas cabeças tapadas com capuzes do vestuário que então trajavam, sendo que usavam também óculos escuros para ocultar parcialmente o próprio rosto.

Os cacifos em apreço continham no seu interior a importância global de € 36 000,00 em dinheiro (depoimento da testemunha III, funcionário da P.…).  

A única controvérsia que foi alimentada e contrariada até ao final do julgamento reside apenas na identidade dos autores de tais factos ilícitos; porém, a sintonia mais fina da prova reunida e produzida até agora permitiu colocar fim a esta controvérsia.

Dir-se-á, desde logo, que estes assaltos ocorreram na mesma área geográfica do ..., no interior de Centros Comerciais e que as imagens da videovigilância revelam que os assaltantes intervenientes nas abordagens às ATM’s apresentam semelhanças físicas entre si.   

3.2. Por referência à data do assalto no Shopping ..., realizado no dia 1 de Julho de 2019, o aludido veículo ... ...-SZ-... estava então alugado a WW pela locadora “S...” (cópia do contrato de fls. 71 do Apenso 37/19).

WW foi constituído arguido na fase de inquérito e recusou prestar depoimento como testemunha no julgamento, após ter beneficiado do arquivamento do processo no final do inquérito.

JJJ, gerente da “S...”, foi ouvido no julgamento e confirmou a celebração do referido contrato e não conseguiu então relacionar o aluguer desta viatura com os arguidos destes autos.

Esta testemunha não deixaria de referir que o arguido AA já tinha estado no seu estabelecimento. 

Tendo sido decidida a leitura do depoimento prestado por esta testemunha durante a investigação, resulta do mesmo que WW compareceu nas instalações da “S.…” a levantar a aludida viatura na companhia de um indivíduo de raça negra de nome AA, sendo que este último já tinha intervindo antes por referência a outras viaturas alugadas na “S.…” e tinha sido o responsável pelos pagamentos dos alugueres, sempre realizados a dinheiro (Auto de fls. 540). 

Não obstante a testemunha JJJ não se recordar daquilo que tinha declarado durante o inquérito, tal depoimento não dever suscitar quaisquer dúvidas sobre quem era o aludido “AA”, pois o arguido AA telefonava para a S... e falava directamente com JJJ, que já conhecia notoriamente de anteriores ocasiões, para se inteirar da existência de viaturas disponíveis para alugar (Vide sessões n.º 667 (14.08.2019) e 5706 (05.11.2019) do alvo ...50, transcritas a fls. 52 e 162).

Por outro lado, é manifesto que o arguido AA conhece a testemunha WW e conversam entre si (Vide sessões n.º 1849 (12.08.2019) e 1901 (12.08.2019) do alvo ...40, transcritas a fls. 43 e 44).

3.3. Por referência à data do assalto no Centro Comercial ..., sito igualmente no ..., realizado no dia 8 de Maio de 2019, cerca das 11h19m, existem igualmente relações com o arguido AA.

No período compreendido entre 4 e 7 de Maio de 2019, o arguido CC alugou o veículo ..., com a matrícula ...-PN-..., na locadora “S...”, fornecendo o contacto telefónico ...95 (cópia do contrato de fls. 158 do Apenso 37/19). 

No período compreendido entre 7 e 14 de Maio de 2019, CC alugou o veículo ..., com a matrícula ...-SV-..., na locadora “S...”, fornecendo o contacto telefónico ...95 (cópia do contrato de fls. 159 do Apenso 37/19). 

No período compreendido entre 14 e 19 de Maio de 2019, CC alugou o veículo ..., com a matrícula ...-SQ-..., na locadora “S...”, fornecendo o contacto telefónico ...95 (cópia do contrato de fls. 160 do Apenso 37/19).

No período compreendido entre 25 e 24 de Junho de 2019, KKK alugou o veículo ..., com a matrícula ...-UP-..., na locadora “S...”, fornecendo o contacto telefónico ...68 (cópia do contrato de fls. 161 do Apenso 37/19).

A testemunha JJJ deu conta de que um indivíduo de raça negra de nome AA interveio por referência a estas viaturas alugadas na “S...” e tinha sido o responsável pelos pagamentos dos alugueres, sempre realizados a dinheiro (Auto de fls. 540). 

Aliás, na manhã de dia 13 de Maio de 2019, o arguido AA veio a ser identificado pela GNR na posse da referida viatura ... (Vide Relatório de Diligência Externa de fls. 1032, relativo ao processo NUIPC 192/19...).    

É manifesto que o arguido AA conhece o co-arguido CC e conversam entre si (Vide sessão n.º 996 (10.08.2019) do alvo ...40, transcritas a fls. 24).

Acresce que o referido cartão telefónico n.º ...95 era o cartão telefónico usado pelo arguido AA entre 1 e 9 de Maio de 2019, pois era através daquele que este arguido comunicava com a sua mãe LLL e com os co-arguidos (Auto de análise de tráfego telefónico de fls. 547 e relatório de exame de fls. 3139 com a lista de contactos existente no telemóvel apreendido ao arguido EE).

Aliás, no dia 10 de Maio de 2019, foi o próprio arguido AA que manteve conversa telefónica com JJJ da S... fazendo uso deste número (Auto de diligência externa de fls. 1030 extraído do processo 122/19.... (fls. 1025).

Por seu turno, o referido cartão telefónico n.º ...68 era o cartão telefónico usado pelo arguido AA entre 8 de Maio (19h46m) e 10 de Julho de 2019, pois era através daquele que este arguido comunicava com a sua mãe LLL e com todos os co-arguidos (Auto de análise de tráfego telefónico de fls. 691).

Aliás, no dia 16 de Maio de 2019, foi o próprio arguido AA que o indicou como seu contacto telefónico quando prestou termo de identidade e residência perante a GNR no âmbito do processo 122/19.... (fls. 1025).   

3.4. Foquemos agora a nossa atenção nos executores materiais principais do assalto realizado no Centro Comercial ....

A acusação imputa este assalto aos arguidos AA, EE, BB e JJ.

É inequívoco que, o arguido AA se relacionava com os co-arguidos EE, BB, JJ por referência ao período temporal sob julgamento e que todos andam interessados no aluguer de carros, falando amiúde no aluguer de carros entre si ou contactando para as empresas de rent a car (Vide sessão n.º 18 (06.08.2019) do alvo ...40, transcrita a fls. 26 do Apenso A; sessão n.º 295 (06.08.2019) do alvo ...40, transcrita a fls. 27; sessão n.º 232 (07.08.2019) do alvo ...00 (07.08.2019), transcrita a fls. 30; sessão n.º 656 (10.08.2019) do alvo ...40, transcrita a fls. 39); sessão n.º 847 (14.08.2019) do alvo ...40, transcrita a fls. 60); sessão n.º 234 (17.01.2020) do alvo ...40, transcrita a fls. 234).

À face da prova globalmente produzida, dir-se-á, por referência aos arguidos acusados da sua prática, que foram os arguidos BB e JJ que entraram no referido centro comercial e se apoderaram dos cacifos da ATM ali existentes.

As imagens de videovigilância captadas pelos sistemas existentes no estabelecimento “Óptica D... e no interior do próprio centro comercial fornecem-nos a presença e intervenção dos arguidos BB e JJ (vide Autos de visionamento de fls. 81 e 89, fotografias associadas aos cartões de cidadão de fls. 357 e 364, fotogramas e fotografias de fls. 365 e 366).

A correspondência facial não suscita dúvidas, sendo que o arguido BB até usou no assalto o mesmo casaco que trajava quando foi tratar do cartão do cidadão.

Acresce que os boxers de cor ... que foram usados por JJ, nesta ocasião, vieram a ser-lhe apreendidos uns meses mais tarde (Auto de apreensão de fls. 2436-2430, maxime fotografias de fls. 2439 e 2446, extraído do processo n.º 152/19...).

Por outro lado, no dia 8 de Maio de 2019, pelas 11h11m, o aludido cartão telefónico n.º ...95, usado pelo arguido AA, activou a célula BTS que abrange a localização do centro comercial em apreço, no âmbito de uma chamada realizada a partir do número ...92, sendo que este número era utilizado pelo arguido EE (Vide autos de análise de tráfego telefónico de fls. 295 e 691; sessão n.º 18 (06.08.2019) do alvo ...40, transcrita a fls. 26 do Apenso A; Auto de apreensão do telemóvel com o IMEI associado àquele número de fls. 209 do Apenso D).

Naquela ocasião, o técnico da D.… já estava junto à ATM e faltavam ainda cerca de 8 minutos para a entrada dos assaltantes no centro comercial, sendo que o número ...92 activou uma célula BTS junto à célula BTS atividade pelo telemóvel do arguido AA (Vide auto de visionamento das imagens de CCTV de fls. 89, auto de análise de tráfego telefónico de fls. 295).

Tal presença não deve surpreender pois, no dia 6 de Maio de 2019, pelas 9.54 horas, o arguido EE andava a conduzir um veículo automóvel na companhia dos co-arguidos AA e BB (Relatório de exame de fls. 3139 e vídeo existente no telemóvel apreendido a EE). 

Acresce que a fotografia encontrada no telemóvel de BB e o fato de treino aqui envergado por EE não deixam margem para dúvidas de que era o arguido EE que caminhava do outro lado da rua nos precisos momentos em que os co-arguidos BB e JJ se deslocaram para o Centro Comercial e fugiram deste, fazendo estes uso do passeio junto à Óptica D... (auto de visionamento de fls. 1960 e fotografia do relatório de exame aos telemóveis de fls. 3154).

Imediatamente a seguir a este assalto, pelas 15.30 horas, o arguido AA, desempregado e sem quaisquer rendimentos, foi adquirir um telemóvel e uma capa no valor global de € 1 083,99 (auto de busca e apreensão de fls. 4 do Apenso D e informação da W.… de fls. 1834).

Por seu turno, os arguidos JJ e EE, então sem qualquer fonte regular de rendimentos, ficaram na disponibilidade de dinheiro que lhes permitiria iniciar o arrendamento de um apartamento, com interposição fictícia da co-arguida OO, no mês imediatamente seguinte ao da execução do assalto (declarações da co-arguida OO, depoimento da testemunha VV e documento de fls. 304 do Apenso D).

Relativamente aos demais arguidos imputados nesta parte, importa dizer que apenas se provou a intervenção de CC na locação da viatura que veio a ser usada na execução do assalto no Centro Comercial ..., não tendo sido produzida qualquer prova sobre o conhecimento que este tinha sobre a projetada utilização criminosa deste veículo pelos co-arguidos.

A mera intervenção na locação do veículo, ainda que no interesse de terceiro, não o coloca na posição de comparticipante a qualquer título.    

Ficou igualmente por provar que a arguida OO tivesse recebido intencionalmente qualquer parte do produto deste assalto para proceder à sua guarda nos termos alegados na acusação.

3.5. Foquemos agora a atenção nos executores materiais principais do assalto realizado no Centro Comercial ....

A acusação imputa este assalto aos arguidos AA, EE, BB e JJ.

Sabemos que o assalto foi executado por quatro indivíduos, tendo entrado dois no centro comercial e tendo ficado dois indivíduos no exterior (depoimento de HH).

À face da prova globalmente produzida, dir-se-á, por referência aos arguidos acusados da sua prática, que foram os arguidos BB e JJ que entraram no referido centro comercial e que tentaram apoderar-se dos cacifos da ATM ali existentes.

As imagens de videovigilância captadas pelos sistemas existentes no interior do próprio centro comercial, quando conjugadas com as fotografias do vestuário que veio a ser apreendido na sua posse, fornecem-nos a presença e intervenção dos arguidos BB e JJ (vide Auto de visionamento da imagens de CCTV de fls. 52 do Apenso 37/19; auto de apreensão de fls. 164 e fotografias do casaco acolchoado e das calças de fato treino de BB de fls. 177 e 179 do Apenso D; auto de busca e apreensão de fls. 2436-2430, maxime fotografias dos ténis e calças de ganga de JJ de fls. 2445, 2447 e 2448 dos autos principais; e cotejo fotográfico de fls. 205-208 do Apenso 37/19).

A perícia de imagem criminalística também encontrou compatibilidade entre um dos indivíduos que interveio no assalto de 8 de Maio e um dos indivíduos que interveio no assalto de 1 de Julho, particularmente na compleição física, postura e forma de andar (com os pés para dentro), isto por referência àquele que aqui consideramos ser JJ (Relatório do LPC de fls. 767).    

Quem eram os outros dois indivíduos que estavam no exterior a prestar apoio aos referidos arguidos?

Existe uma forte possibilidade de terem sido os arguidos AA e EE, conforme anteriormente sucedido, mas não se conseguiu ir além da confirmação da aludida intervenção do primeiro no aluguer do veículo automóvel usado e no seu manifesto interesse na utilização do mesmo num novo assalto.

Relativamente ao arguido EE, não existe qualquer meio de prova que aponte para a sua intervenção efectiva na execução material deste assalto a qualquer título.

4. Avançando agora para a matéria do assalto ao estafeta, realizado no dia 2 de Dezembro de 2019, pelas 13h05m, na localidade de ... (auto de notícia de fls. 23 do Apenso 684/19).

YY, estafeta da T.…, conduzia então uma motorizada quando foi assaltado por dois indivíduos de raça negra que se faziam transportar no veículo ..., com a matrícula ...-TQ-... (depoimento da testemunha YY). 

A propriedade sobre esta viatura estava registada a favor de XX e a mesma estava então dada como furtada desde 27 de Novembro de 2019 (Depoimento da testemunha XX, ficha de registo automóvel de fls. 42 do Apenso 1873/19 e auto de denúncia de fls. 2). 

No dia 4 de Dezembro de 2019, os arguidos BB e AA fizeram-se transportar na referida viatura até ao centro comercial ... (Auto de fls. 1073 dos autos principais).

No dia 2 de Dezembro de 2019, pelas 13h09m, o arguido BB esteve na localidade de ... (Vide auto de análise de tráfego telefónico de fls. 947).

No mesmo local, comungando da mesma intenção de assaltar alguém, estava o co-arguido LL (vide comunicações telefónicas constantes das sessões n.º 24327, 24377, 24380, 24385, 24387 do Alvo ...40, as quais constam a fls. 177 e 187-196 do Apenso A).

Na presença destes elementos probatórios, impõe-se concluir que os arguidos BB e LL foram os assaltantes, não tendo sido possível apurar a intervenção do arguido KK. 

Os bens subtraídos e respectivo valor foram alcançados a partir dos depoimentos das testemunhas YY e MMM.

5. Avançando agora para a matéria da subtracção das garrafas de gás, realizado no de dia 7 de Dezembro de 2019, pelas 2h30m, na armazém sito na Rua ..., ..., ... (auto de notícia de fls. 51 do Apenso 1035/19).

O modo de execução da entrada furtiva no referido armazém e os objetos que foram daqui subtraídos sem qualquer autorização mostram-se descritos no depoimento prestado no julgamento pelo respectivo proprietário ZZ, sendo que este não estava presente no local no momento da execução destes factos.

 O armazém onde ocorreram estes factos encontra-se documentado nas fotografias de fls. 111 e 112 do Apenso 1035/19.    

Por outro lado, a execução destes factos não passou despercebida e foi accionada a presença da PSP naquele mesmo local (auto de notícia de fls. 2 do Apenso 1035/19 e imagem de satélite de fls. 111). 

Aqui chegados, os arguidos BB, KK, LL e AA foram surpreendidos a carregar duas garrafas de gás para o interior da viatura ..., com a matrícula ...-TQ-... (depoimento do agente da PSP MM). 

A viatura automóvel ... e as garrafas de gás em apreço foram apreendidas pela PSP (Autos de apreensão de fls. 5 e 7 do Apenso 1035/19).

No interior deste veículo ... foram encontrados objectos usualmente associados à actividade criminosa, nomeadamente um pé de cabra (depositado no chão entre as duas filas de bancos), quatro luvas, um gorro e uma caixa de ferramentas de punção e de corte de precisão (Relatório de inspecção judiciária de fls. 14 e fotografias de fls. 18 do Apenso 1873/19).    

Ainda que não tivessem sido observados a entrar no armazém, é manifesto que os quatro arguidos se deslocaram a este armazém para se apoderarem das aludidas garrafas de gás e que os mesmos participaram conjuntamente na sua execução em virtude do peso muito elevado dos objectos em apreço.

Fica, assim, explicada a razão pela qual o arguido BB necessitava urgentemente de um soldador nesta noite (vide comunicações telefónicas constantes das sessões n.º 24926 e 24928 do Alvo ...40, as quais constam a fls. 290 e 291 do Apenso A

6. Avancemos agora para a matéria do assalto realizado na residência sita em ....

Sobre aquilo que aconteceu no interior da referida residência só foi possível ouvir a ofendida NN no julgamento, pois esta estava sozinha em casa quando foi assaltada e os arguidos imputados nesta matéria remeteram-se totalmente ao silêncio.

A forma de execução do assalto dada como provada resulta deste depoimento, o qual se reputa integralmente verosímil e crível.

NN veio a reconhecer positivamente os arguidos AA e BB como os dois indivíduos que entraram na sua residência contra a sua vontade (Autos de reconhecimento pessoal de fls. 54 e 57).

Tais reconhecimentos não suscitam quaisquer dúvidas, pois esta ofendida esteve cara a cara com os assaltantes durante um período de tempo suficiente para tanto, sendo que estes optaram por executar o assalto de rosto descoberto.

A presença destes arguidos na respetiva residência resulta igualmente de outros meios de prova.

A deslocação automóvel destes arguidos a partir da margem sul do ... em direcção a ... e sua presença no local do assalto na data em apreço resulta à saciedade do auto de análise de tráfego telefónico de fls. 1358 dos autos principais e das comunicações telefónicas constantes das sessões n.º 31664 e 31695 do Alvo ...40 e n.º 10591 do Alvo ...50, as quais constam a fls. 250-255 do Apenso A.

Numa destas conversações telefónicas mantidas com o arguido AA, o arguido BB afirma expressamente que tem consigo “o martelo do Thor, da faísca”, numa alusão quase explicita à arma elétrica que veio a ser usada na execução do assalto (sessão n.º 31664).

Aliás, os arguidos AA e BB, residentes na margem sul do ..., também tinham estado em ... no dia 20 de Fevereiro de 2020, cerca das 19h27m, dir-se-ia em actividade preparatória para aquilo que viria a suceder oito dias mais tarde (Auto de análise de tráfego telefónico de fls. 1358 dos autos principais). 

Acresce que o relógio de pulso ... subtraído da residência e uma das notas de € 500 - com o mesmo número de série - que foi igualmente subtraída desta mesma residência vieram a ser apreendidos na posse do arguido BB (Vide depoimento da testemunha NN, fotografias de fls. 30-32 e 39-41 do Apenso 135/20, Auto de apreensão e fotografias de fls. 164, 174 e 179-181 do Apenso D).

Foi igualmente encontrada, na posse deste mesmo arguido, uma arma elétrica, ficando assim definitivamente explicada a alusão ao “martelo do Thor, da faísca”, sendo que NN sofreu uma descarga na respetiva cintura durante o assalto (Vide depoimento da ofendida, auto de apreensão de fls. 164 do Apenso D e relatório pericial do LPC de fls. 3132). 

Mais delicada é a alegada intervenção dos demais arguidos aqui envolvidos no libelo acusatório.

A arguida CCC era então empregada doméstica dos proprietários da residência assaltada, sendo que esta prestação já durava há cerca de quatro meses e aquela tinha necessariamente conhecimento dos bens e valor ali existentes, tanto mais que tinha acesso ao roupeiro do quarto do casal onde estava a caixa com o dinheiro e também já tinha sido observada a abrir, sem autorização, uma gaveta no móvel onde estava então guardado o aludido relógio de pulso (Vide depoimento das testemunhas NN e FFF).

A entrada à força dos dois assaltantes nesta residência coincidiu precisamente com a chegada a este local da arguida CCC e esta terá sido empurrada por aqueles contra a proprietária após esta lhe abrir a porta do seu apartamento (Vide depoimento da testemunha NN).

 Durante a execução do assalto, a proprietária não a observou a fazer nada, nem lhe ouviu dizer nada de relevante, sendo que a mesma, após a saída dos assaltantes, viria a chorar e a relatar que tinha sido colocada pelos assaltantes no interior da casa de banho existente na residência, não deixando de repetir várias vezes a expressão “estraguei a minha vida!” (Vide depoimento da testemunha NN).

E qual era a relação existente entre esta arguida e os demais co-arguidos?

O telemóvel da arguida NNN consta da lista de contactos telefónicos da arguida CCC, sendo que houve uma troca de 42 chamadas e mensagens entre os respetivos telemóveis entre os dias 10 e 29 de Fevereiro de 2020, sendo que última comunicação verificada antes do assalto teve lugar em 26 de Fevereiro de 2020, pelas 17h29m (Informação da ... de fls. 2122, termo de identidade e residência prestado por NNN e auto de análise de tráfego telefónico de fls. 2115).

Acresce que a arguida NNN residia com o arguido KK (termos de identidade e residência constantes dos autos). 

Por seu turno, a presença do arguido KK no local do assalto na data em apreço resulta à saciedade dos autos de análise de tráfego telefónico de fls. 2125 e 2144 dos autos principais e da comunicação telefónica constante da sessão n.º 10591 do Alvo ...50, as quais consta a fls. 253 do Apenso A.

O arguido KK está no exterior do prédio, junto à entrada da rua, a dar indicações ao arguido BB relativamente à aproximação da arguida CCC e adverte aquele expressamente para não mencionar o nome desta e para assumir o sotaque brasileiro quando falar.

O arguido KK diz-lhe ainda que irá ficar parado na “curva” existente “lá em baixo”, no “fim da rua”, o que o coloca no carro de apoio à fuga dos co-arguidos BB e AA.  

Esta preocupação com a possível revelação do nome da arguida CCC junto da proprietária da residência assaltada assume uma única relevância possível e que se traduz necessariamente no encobrimento da sua intervenção nestes factos, pois tal seria evidente se NN ouvisse algum dos assaltantes a pronunciar o nome da referida arguida.

Só isto explica a espera e a entrada conjunta dos arguidos com a co-arguida CCC e que os mesmos tivessem acertado em cheio na data em que esta foi prestar o seu serviço após ter ocorrido uma alteração de datas – sexta –feira ao invés da costumada quarta-feira – previamente acordada entre esta e a ofendida no início da semana em apreço (vide depoimento da testemunha NN). 

A escolha desta residência concreta para a realização do assalto passou necessariamente pela revelação dos bens e valores ali existentes e esta revelação foi levada a cabo pela arguida CCC.

Fica assim explicada a razão pela qual a arguida exclamava que tinha estragado a sua vida e, não menos relevante, porque é que nunca mais se apresentou ao serviço, sendo que as restrições de movimentação associadas ao COVID-19 não se iniciaram na primeira semana de Março de 2020.    

Havia seguramente muitas residências na margem sul que podiam ter sido igualmente assaltadas pelos arguidos, mas a informação sobre a existência de uma caixa valiosa, com uma quantidade considerável de notas de € 500 no seu interior – e não propriamente o relógio –, já justifica uma travessia do ..., conforme já sucedera com os assaltos às ATM.

É certo que esta informação chegou a KK e não havendo prova de contactos diretos deste com a arguida CCC, importa concluir que os mesmos lhe chegaram através do telemóvel da arguida NNN com quem aquele residia, tendo havido dezenas de comunicações estabelecidas entre os respetivos telemóveis nos dias que antecederam as idas dos co-arguidos a ....

Havendo acessibilidade do arguido KK ao telemóvel de NNN, não era necessário que NNN tivesse intervindo directamente como intermediária, bastando àquele arguido falar directamente com a arguida CCC através do referido telemóvel, não havendo, assim, prova relevante relativamente à efectiva intervenção de NNN nos termos alegados na acusação.  

A utilização neste assalto do veículo ..., com a matrícula ..-XN-.., ficou por demonstrar, pois foi apenas possível apurar que o arguido AA entrou na sua posse no dia 17 de Fevereiro de 2020 – junto de um stand automóvel sito na Monte ... –, e que, em princípio, a viatura terá ficado na disponibilidade destes arguidos até ser entregue pelo arguido KK à proprietária BBB no início de Março de 2020 – residente no ... (depoimentos das testemunhas BBB e OOO, sessões n.º 9879 (15.02.2019) e 9982 (17.02.2019) do alvo ...50, transcrita a fls. 244 do Apenso A, documentação da compra e entrega da viatura pela D... de fls. 1720 e seguintes, registo de infração da Via ... de fls 1930 com captação de matrícula de 21.02.2020 na portagem de ...).

Porém, num contexto em que os arguidos em apreço acediam ao uso de várias viaturas automóveis, torna-se inviável concluir com segurança pela sua efectiva utilização ininterrupta e exclusiva neste período de tempo superior a uma quinzena, e, em especial, neste dia.

7. Avançando para o tema dos branqueamentos, estão aqui em causa os bens e serviços que foram pagos pelos arguidos com o produto dos assaltos.

No ano de 2019, os arguidos AA, BB, JJ e EE não trabalhavam e, por isso, não auferiam qualquer rendimento que lhes permitisse as compras de artigos de vestuário, perfumes e telemóveis, bem como o aluguer de viaturas e a locação de imóveis (Depoimento da testemunha DD e declarações fiscais constantes do Apenso E).

A verdade é que os arguidos fizeram várias despesas com o dinheiro obtido nos assaltos à ATM do Centro Comercial ... e à residência de ....         

Os autos contêm prova testemunhal e documental que comprovam as seguintes despesas:

a)  A aquisição a dinheiro pelo arguido AA, de um telemóvel e de uma capa no valor global de € 1083,99, no dia 8 de Maio de 2019, pelas 15.30 horas (auto de busca e apreensão de fls. 4 e informação da W... de fls. 1834);

b) A aquisição a dinheiro pelo arguido BB, de perfumes, vestuário e calçado no valor global de € 237,73, entre os dias 28 e 29 de Fevereiro de 2019 (auto de busca e apreensão de fls. 164);

c)  A entrega de 600,00 em dinheiro pelo arguido AA a DDD para proceder ao aluguer de duas viaturas entre os dias 29 de Fevereiro e 3 de Março de 2020 (depoimento da testemunha DDD, contrato de aluguer de fls. 1616 e extracto bancário de fls. 1870 e auto de visionamento de fls. 1698);

d) O pagamento a dinheiro pelo arguido BB, de dois quartos no Hotel ..., no valor global de € 167,00, no dia 1 de Março de 2020 (Factura de fls. 1328);

e)  A aquisição a dinheiro pelo arguido AA, de vestuário, calçado e perfume no valor global de € 228,98, no dia 1 de Março de 2020 (auto de busca e apreensão de fls. 4);

f)  A aquisição a dinheiro na loja ... pelo arguido BB, de vestuário, no valor global de € 69,95, no dia 3 de Março de 2020 (Informação da ... de fls. 2147).

g)  O pagamento das rendas pelos arguidos JJ e EE, relativas ao contrato de arrendamento celebrado em nome da co-arguida OO, por referência ao apartamento sito na Rua ..., ..., Quinta ..., nomeadamente as rendas vencidas entre Junho de 2019 e Março de 2020, num total de € 2 800,00 (Depoimento da testemunha VV, cópia do contrato de arrendamento de fls. 304 do Apenso D, declarações da arguida OO).    

(…)

No que respeita à intenção de dissimular a origem ilícita dos bens em causa, a mesma só ocorre nos alugueres de viaturas e no arrendamento celebrados em nome alheio, pois todas as mais aquisições foram meros actos de consumo com o produto dos assaltos, sendo que os arguidos até se identificam nessas transacções e guardaram consigo os documentos relativos a essas transações que vieram a ser apreendidos.

 8. Abordemos agora o tema das armas e munições.

No que respeita à arma elétrica encontrada na posse do arguido BB, importa ter presente o auto de busca e apreensão de fls. 164 e o exame pericial de balística de fls. 3132, sendo que a medição deu conta de uma voltagem máxima inferior à anunciada no próprio aparelho.  

Trata-se da arma que foi utilizada pelos arguidos JJ e BB na execução do assalto no centro comercial do ..., e pelos arguidos AA, BB e KK na execução do assalto na residência de ..., sendo que a detenção desta arma antes e depois dos assaltos era conhecida e desejada por estes arguidos.

A matéria de facto relativa à alegada posse das armas de fogo e munições por referência ao arguido EEE mostra-se, à partida, comprovada pelo auto de busca e apreensão de fls. 257, pelo depoimento da testemunha PPP e pelo relatório pericial do LPC de fls. 2065.

O arguido residia no domicílio buscado e veio a ser identificado pela proprietária da residência como o possuidor dos objectos em apreço.

No entanto, importa fazer importantes ressalvas resultantes do alheamento revelado relativamente aos exames periciais realizados no inquérito, pois a perícia revelou que a pistola de calibre 7,65 mm não estava em condições de realizar quaisquer disparos devido a anomalias existentes.

Por outro lado, a acusação não especificou o estado das munições, nomeadamente se estavam em boas condições, conforme alcançado no exame pericial.

Acresce que a perícia também revelou que a outra arma apreendida não é uma pistola de calibre 6,35mm, conforme alegado na acusação, mas antes uma arma com a configuração de pistola de calibre nominal 8mm apenas para munições detonantes, sem projéctil, ainda que seja passível de ser convertida de forma a utilizar munições com projétil.

Deste modo, fica seriamente prejudicada a prova dos factos alegados e do correspetivo dolo relativamente a este arguido.

9. Passemos agora à análise da questão da existência de uma associação criminosa, a qual, não obstante a respectiva autonomia dogmática relativamente aos crimes cometidos ou a cometer pelos associados criminosos, apenas se coloca, no caso concreto, como sucede na maioria dos casos, por inferência relativamente aos assaltos detectados e dados como provados.

Tendo sido provada a intervenção de vários arguidos nos diversos crimes descritos na acusação, importa constatar que apenas se provou uma actuação reiterada, regular e continuada dos arguidos AA e BB ao longo do período de tempo delimitado na acusação.

Uma vez comprovada a actuação destes arguidos em vários assaltos e furtos, ficou por comprovar a tese da acusação relativamente à intervenção dos demais co-arguidos.

Ora, não foi possível dar como provado, com o grau de certeza exigível para a condenação criminal, que o arguido CC tivesse conhecimento dos concretos dos assaltos levados a cabo pelos co-arguidos e que lhes prestassem qualquer tipo de apoio por referência a esses assaltos.

Por outro lado, os arguidos JJ e EE saem de cena quando ainda não tinham passado dois meses sobre o assalto executado no Centro Comercial ... e o arguido LL só surge sob os holofotes durante a primeira quinzena de Dezembro de 2019.

Finalmente, o arguido KK, irmão do co-arguido AA, só assume protagonismo entre 7 de Dezembro de 2020 e 28 de Fevereiro de 2021, não havendo qualquer organização relevante, nem qualquer divisão distintiva de tarefas criminosas.   

10. A contraprova testemunhal essencialmente abonatória desenvolvida pelos arguidos, nomeadamente pelos arguidos AA, BB, JJ e EE, não anulou o alcance probatório dos demais meios de prova acima considerados.

As deslocações relevantes de AA entre a margem sul e a margem norte estão documentadas nas intercepções telefónicas e nas localizações celulares analisadas e vão muito para além das alegadas idas à residência da respectiva mãe (depoimento de QQQ).

A boa conduta evidenciada pelo arguido BB no respetivo meio familiar não coloca em crise a actuação criminosa deste fora de portas (depoimento de RRR).

O arguido JJ pode ter recebido calças de ganga, com rasgos, a título de presente no Natal de 2019, mas as calças que aqui relevam são aquelas que o mesmo já tinha em 29 de Novembro de 2018 e partilhou no respetivo Facebook (depoimento da testemunha SSS).

(…)

11. Para o apuramento da factualidade respeitante às condições sociais e familiares dos arguidos relevaram os relatórios sociais oportunamente elaborados pela DGRS, os depoimentos das testemunhas abonatórias arroladas pelos, tendo o arguido KK inviabilizado o apuramento da sua situação pela DGRS.

12. Finalmente, a existência de condenações sofridas pelos arguidos foi alcançada a partir dos respectivos certificados de registo criminal juntos aos autos.”

Direito

9. Como sabido, o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respetiva motivação que apresentou (art. 412.º, n.º 1, do CPP).

Os  poderes de cognição do Supremo Tribunal de Justiça restringem-se exclusivamente ao reexame da matéria de direito (art. 434.º do CPP), sem prejuízo do conhecimento oficioso dos vícios previstos no art. 410.º, n.º 2 do CPP ou, na redação introduzida pela Lei n.º 94/2021, de 21.12, visto o disposto no art. 5.º do CPP (ou seja, desde que da aplicabilidade imediata da lei nova não haja um agravamento sensível e ainda evitável da situação processual do arguido ou quebra da harmonia e unidade dos vários atos do processo), sem prejuízo do disposto nas alíneas a) e c) do n.º 1 do art. 432.º

Vejamos, então, cada um dos recursos.

9.1. Recurso do arguido AA

Analisadas as conclusões do recurso apresentado pelo arguido AA para o STJ, verifica-se que coloca as seguintes questões, as quais até já suscitara no seu recurso para a Relação[4]:

1.º Do enquadramento jurídico dos factos quanto ao crime de detenção de arma proibida, que considera não ter cometido e, por isso, ser essa condenação ilegal;

2.º- violação do princípio in dubio pro reo;

3.º - existência dos vícios previstos no art. 410.º, n.º 2, als. a) e c) do CPP;

4.º - violação do princípio da igualdade (art. 13.º da CRP);

5.º - serem excessivas e desproporcionadas as penas individuais[5] e única que lhe foram impostas, tendo sido violados os artigos 40.º, 77.º, 78.º e 80.º do Código Penal.

Pois bem.

Compulsado o teor do acórdão do Tribunal da Relação sob recurso verifica-se que o mesmo analisou e decidiu (além do mais), as questões acima referidas colocadas pelo recorrente AA e, inclusivamente, porque o absolveu do crime de branqueamento, reduziu (para 10 anos de prisão) a pena única (de 11 anos de prisão) que lhe fora imposta na 1ª instância.

Portanto, resulta do acórdão do TR.… sob recurso que existe dupla conforme parcial, isto é, houve um duplo juízo condenatório quanto às questões de facto e de direito que a defesa entendeu colocar no seu recurso, sendo reduzida a pena que lhe foi imposta.

A existência de dupla conforme, inclui a confirmação in mellius[6], ou seja, a decisão da Relação que, como sucede neste caso, confirma o acórdão da 1ª instância, melhorando a situação do condenado, na medida em que reduziu/diminuiu a pena que lhe tinha sido aplicada na 1ª instância por o ter absolvido de um dos crimes (o de branqueamento).

A confirmação in mellius integrando um juízo confirmativo “é relevante para os efeitos da al. f) do nº 1 do art. 400º do CPP” e garante o duplo grau de jurisdição consagrado pelo art. 32.º, n.º 1 da CRP, não havendo, assim, violação do direito ao recurso, nem tão pouco dos direitos de defesa do arguido (arts. 32.º, n.º 1 e 20.º, n.º 1, da CRP).

Isto significa, visto o disposto nos arts. 400.º, n.º 1, al. f) e 432.º, n.º 1, al. b), do CPP, que o acórdão do Tribunal da Relação é irrecorrível na parte em que confirma a condenação da 1ª Instância (princípios da dupla conforme condenatória e da legalidade), salvo quanto à pena única que lhe foi imposta por ser superior a 8 anos de prisão.

Considerando o disposto no art. 400.º n.º 1, als. e) e f) do CPP, a não admissibilidade do recurso vale separadamente para as penas parcelares e para a pena conjunta, podendo acontecer que não sejam recorríveis todas ou algumas daquelas, mas já o seja a pena única[7].

Aliás, decidiu-se no Ac. do TC (plenário) n.º 186/2013, “Não julgar inconstitucional a norma constante da alínea f), do n.º 1, do artigo 400.º, do Código de Processo Penal, “na interpretação de que havendo uma pena única superior a 8 anos, não pode ser objeto do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça a matéria decisória referente aos crimes e penas parcelares inferiores a 8 anos de prisão.”

Portanto, não pode o recorrente pretender uma terceira apreciação das questões colocadas, nos casos em que há limitações legais.

De resto, esqueceu o recorrente que os recursos destinam-se a apreciar a decisão de que se recorre (neste caso o Acórdão do Tribunal da Relação ... impugnado) e não para apreciar questões novas que não foram colocadas no Tribunal recorrido (ressalvado aquelas que devam ser conhecidas oficiosamente, o que não é o caso), nem para voltar a reapreciar as mesmas questões que já foram colocadas em anterior recurso (neste caso relativos ao acórdão da 1ª instância) e decididas definitivamente, por se verificar o condicionalismo previsto nos arts. 400.º, n.º 1, al. f) e 432.º, n.º 1, al. b), do CPP.

Portanto, se o recorrente pretendia impugnar o acórdão do Tribunal da Relação, deveria ter apresentado as razões pelas quais discordava dessa decisão, na parte em que era suscetível de recurso, de forma a que as questões que suscitasse pudessem ser apreciadas por este Tribunal (e não repetir questões e argumentação -reproduzindo até, na quase totalidade, a motivação do recurso apresentada ao Tribunal da Relação, ainda que com outra ordem- que estavam já definitivamente decididas, por haver dupla conforme).

Com efeito, o Acórdão da Relação ... é definitivo quanto às questões que apreciou e que o recorrente volta a colocar no recurso para o STJ, salvo quanto à reapreciação da medida da pena única que lhe foi imposta, por ser superior a 8 anos de prisão.

Assim, as questões de facto, as questões processuais, as questões de direito, suscitadas nesse âmbito em que não é admissível o recurso para o STJ (como sucede com as questões que repetiu - i) ao enquadramento jurídico dos factos quanto ao crime de detenção de arma proibida, que considera não ter cometido e, por isso, ser essa condenação ilegal; ii) à violação do princípio in dubio pro reo; iii) existência dos vícios previstos no art. 410.º, n.º 2, als. a) e c) do CPP; iv) violação do princípio da igualdade (art. 13.º da CRP); v) serem excessivas e desproporcionadas as penas individuais que lhe foram impostas, tendo sido violados os artigos 40.º, 77.º, 78.º e 80.º do Código Penal - sobre as quais o acórdão do TR... já se pronunciou e decidiu definitivamente) não podem ser conhecidas, nem sindicadas por este Supremo Tribunal.

Em conclusão: nessa parte, não se toma conhecimento do recurso, por inadmissibilidade legal, uma vez que há dupla conforme parcial.

Improcedem, pois, as questões acima referenciadas nos pontos i) a v) que o recorrente pretende ver reapreciadas.

Adiante iremos analisar a questão relativa à medida da pena única imposta no acórdão da Relação sob recurso, que pode ser sindicada por este STJ, tendo presente que, não ocorrendo os vícios previstos no art. 410º, nº 2, do CPP, nem nulidades ou irregularidades de conhecimento oficioso, considera-se definitivamente fixada a decisão proferida sobre a matéria de facto acima transcrita, a qual se mostra devidamente sustentada e fundamentada.

9.2. Recurso do arguido BB

Analisadas as conclusões do recurso apresentado pelo arguido BB para o STJ, verifica-se que coloca as seguintes questões:

1.º- existência dos vícios previstos no art. 410.º, n.º 2, als. a) e c) do CPP;

2.º- incorreta valoração da prova e violação da presunção de inocência e do princípio in dubio pro reo;

3.º- erro de julgamento quanto à decisão sobre a matéria de facto;

4.º- serem excessivas e desproporcionadas as penas individuais e única que lhe foram impostas, tendo sido violados os artigos 13.º da CRP, 50.º, 71.º a 73.º do CP.

Ora, compulsado o teor do acórdão do Tribunal da Relação verifica-se que as questões que ali colocou foram as seguintes (tal como foram identificadas nessa mesma decisão):

“- Da existência dos vícios previstos nas alíneas a) e c) do n.º 2 do artigo 410º do Código de Processo Penal – insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e erro notório na apreciação da prova;

- Da incorrecta valoração da prova produzida em julgamento;

- Da violação do princípio in dubio pro reo (n.º 2 do artigo 32º da Constituição da República Portuguesa);

- Da dosimetria das penas parcelares e da pena única.”

Pois bem.

Compulsado o teor do acórdão do Tribunal da Relação sob recurso verifica-se que o mesmo analisou e decidiu (além do mais), as questões acima referidas colocadas pelo recorrente e, inclusivamente, porque o absolveu do crime de roubo no processo n.º 684/19..., reduziu (para 10 anos e 6 meses de prisão) a pena única (de 12 anos de prisão) que lhe fora imposta na 1ª instância.

Portanto, resulta do acórdão do TR.… sob recurso que existe dupla conforme parcial, isto é, houve um duplo juízo condenatório quanto às questões de facto e de direito que a defesa entendeu colocar no seu recurso, sendo reduzida a pena que lhe foi imposta.

A existência de dupla conforme, inclui a confirmação in mellius[8], ou seja, a decisão da Relação que, como sucede neste caso, confirma o acórdão da 1ª instância, melhorando a situação do condenado, na medida em que reduziu/diminuiu a pena que lhe tinha sido aplicada na 1ª instância por o ter absolvido de um dos crimes (o de roubo acima aludido).

A confirmação in mellius integrando um juízo confirmativo “é relevante para os efeitos da al. f) do nº 1 do art. 400º do CPP” e garante o duplo grau de jurisdição consagrado pelo art. 32.º, n.º 1 da CRP, não havendo, assim, violação do direito ao recurso, nem tão pouco dos direitos de defesa do arguido (arts. 32.º, n.º 1 e 20.º, n.º 1, da CRP).

Isto significa, visto o disposto nos arts. 400.º, n.º 1, al. f) e 432.º, n.º 1, al. b), do CPP, que o acórdão do Tribunal da Relação é irrecorrível na parte em que confirma a condenação da 1ª Instância (princípios da dupla conforme condenatória e da legalidade), salvo quanto à pena única que lhe foi imposta por ser superior a 8 anos de prisão.

Considerando o disposto no art. 400.º n.º 1, als. e) e f) do CPP, a não admissibilidade do recurso vale separadamente para as penas parcelares e para a pena conjunta, podendo acontecer que não sejam recorríveis todas ou algumas daquelas, mas já o seja a pena única[9].

Aliás, decidiu-se no Ac. do TC (plenário) n.º 186/2013, “Não julgar inconstitucional a norma constante da alínea f), do n.º 1, do artigo 400.º, do Código de Processo Penal, “na interpretação de que havendo uma pena única superior a 8 anos, não pode ser objeto do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça a matéria decisória referente aos crimes e penas parcelares inferiores a 8 anos de prisão.”

Portanto, não pode o recorrente pretender uma terceira apreciação das questões colocadas, nos casos em que há limitações legais.

De resto, esqueceu o recorrente que os recursos destinam-se a apreciar a decisão de que se recorre (neste caso o Acórdão do Tribunal da Relação ... impugnado) e não para apreciar questões novas que não foram colocadas no Tribunal recorrido (ressalvado aquelas que devam ser conhecidas oficiosamente, o que não é o caso), nem para voltar a reapreciar as mesmas questões que já foram colocadas em anterior recurso (neste caso relativos ao acórdão da 1ª instância) e decididas definitivamente, por se verificar o condicionalismo previsto nos arts. 400.º, n.º 1, al. f) e 432.º, n.º 1, al. b), do CPP.

Portanto, se o recorrente pretendia impugnar o acórdão do Tribunal da Relação, deveria ter apresentado as razões pelas quais discordava dessa decisão, na parte em que era suscetível de recurso, de forma a que as questões que suscitasse pudessem ser apreciadas por este Tribunal (e não repetir questões e argumentação -reproduzindo até, na quase totalidade, a motivação do recurso apresentada ao Tribunal da Relação, ainda que em parte com outra metodologia- que estavam já definitivamente decididas, por haver dupla conforme).

Com efeito, o Acórdão da Relação ... é definitivo quanto às questões que apreciou e que o recorrente volta a colocar no recurso para o STJ, salvo quanto à reapreciação da medida da pena única que lhe foi imposta, por ser superior a 8 anos de prisão.

Assim, as questões de facto, as questões processuais, as questões de direito, suscitadas nesse âmbito em que não é admissível o recurso para o STJ (como sucede com as questões que repetiu – i) existência dos vícios previstos no art. 410.º, n.º 2, als. a) e c) do CPP; ii) incorreta valoração da prova e violação da presunção de inocência e do princípio in dubio pro reo; iii) erro de julgamento quanto à decisão sobre a matéria de facto; iv) serem excessivas e desproporcionadas as penas individuais que lhe foram impostas, tendo sido violados os artigos 13.º da CRP, 50.º, 71.º a 73.º do CP- sobre as quais o acórdão do TR... já se pronunciou e decidiu definitivamente) não podem ser conhecidas, nem sindicadas por este Supremo Tribunal.

Em conclusão: nessa parte, não se toma conhecimento do recurso, por inadmissibilidade legal, uma vez que há dupla conforme parcial.

Improcedem, pois, as questões acima referenciadas nos pontos i) a iv) que o recorrente pretende ver reapreciadas.

Adiante iremos analisar a questão relativa à medida da pena única imposta no acórdão da Relação sob recurso, que pode ser sindicada por este STJ, tendo presente que, não ocorrendo os vícios previstos no art. 410º, nº 2, do CPP, nem nulidades ou irregularidades de conhecimento oficioso, considera-se definitivamente fixada a decisão proferida sobre a matéria de facto acima transcrita, a qual se mostra devidamente sustentada e fundamentada.

9.3. Os autos prosseguem para conhecimento da questão da apreciação da medida da pena única aplicada a cada um dos recorrentes, sendo nessa parte analisados os respetivos recursos para este STJ, tendo presente que cada um deles alega ter sido a mesma excessiva e desproporcionada.

Pois bem.

A esse propósito escreveu-se no acórdão do TR.… sob recurso, quanto ao arguido AA:

Assim, e neste particular, é de proceder o recurso, devendo o arguido AA ser absolvido da prática do crime de branqueamento. Sendo de absolver o arguido da prática deste crime, importa proceder à reformulação do cúmulo jurídico das penas e à determinação de uma outra pena única.

Considerando a factualidade no seu conjunto e a personalidade do arguido, nos termos do artigo 77.º, do Código Penal, decide-se condenar o arguido na pena única de 10 (dez) anos de prisão.”

Por seu turno, escreveu-se no acórdão do TR.… sob recurso, quanto ao arguido BB:

Quanto à medida das penas parcelares e da pena única.

Além das três condenações em pena de multa pela prática do crime de condução sem habilitação legal, o arguido BB foi já condenado a 15 de Abril de 2013, numa pena de 1 ano de prisão, suspensa na sua execução, pela prática de um crime de roubo simples. No que respeita a cada um dos crimes e na determinação concreta de cada uma das penas parcelares, o tribunal a quo ponderou o grau de culpa do arguido, o grau de ilicitude dos factos, as elevadas exigências de prevenção especial - aferidas desde logo, pela multiplicidade de ilícitos cometidos e antecedentes criminais do arguido -, bem como as elevadas exigências de prevenção geral, não merecendo o acórdão recorrido qualquer censura.

Sendo de absolver o arguido da prática do crime de roubo simples referido supra, é de proceder à reformulação do cúmulo jurídico das penas e à determinação de uma outra pena única.

Considerando a factualidade no seu conjunto e a personalidade do arguido, nos termos do artigo 77.º, do Código Penal, decide-se condenar o arguido BB na pena única de 10 (dez) anos e 6 (seis) meses de prisão.”

10.1. Como se referiu anteriormente, importa apreciar a questão da pena única, que cada um dos recorrentes considera excessiva e desproporcionada.

Vejamos então.

Pressuposto essencial do concurso superveniente de penas (tal como decorre do disposto nos arts. 77.º, n.º 1 e 78.º, n.º 1, do CP) é a prática de diversos crimes pelo mesmo arguido antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles.

O designado “cúmulo jurídico de penas” não é uma forma de execução de penas parcelares, mas antes um caso especial de determinação da pena[10].

A exigência de realização de cúmulo jurídico em caso de conhecimento superveniente de concurso tem a sua explicação: basta atentar no disposto no art. 77.º, n.º 1, do CP, sobre as regras de punição do concurso, onde se estabelece um regime especial de punição, que consiste na condenação final numa única pena, considerando-se, “na medida da pena, em conjunto, os factos e a personalidade do agente”.

A justificação para este regime especial de punição radica nas finalidades da pena, exigindo uma ponderação da culpa e das razões de prevenção (prevenção geral positiva e prevenção especial), no conjunto dos factos incluídos no concurso, tendo presente a personalidade do agente[11].

Na determinação da pena única a aplicar, há que fazer uma nova reflexão sobre os factos em conjunto com a personalidade do arguido, pois só dessa forma se abandonará um caminho puramente aritmético da medida da pena para se procurar antes adequá-la à personalidade unitária que nos factos se revelou (a pena única é o resultado da aplicação dos “critérios especiais” estabelecidos no mesmo art. 77.º, n.º 2, não esquecendo, ainda, os “critérios gerais” do art. 71.º do CP[12]).

10.2. Recurso do arguido AA

O recorrente tendo sido condenado pela 1ª instância na pena única de 11 anos de prisão, a qual foi reduzida pela Relação para 10 anos de prisão, argumenta em termos essencialmente teóricos e, em resumo, sustenta que foi-lhe aplicada pena única excessiva por, na sua perspetiva, não cumprir com os princípios da necessidade, proporcionalidade e adequação, devendo para o efeito sopesar-se a intervenção do agente, o seu grau de culpa nos ilícitos efetivamente cometidos, sendo uma pessoa, totalmente transformada, renovada, nestes quase dois anos de prisão preventiva, encontrando-se seriamente empenhado na sua recuperação, tencionando reorganizar a sua vida pessoal, social e afetiva e trabalhar, no mais curto espaço de tempo, pelo que tendo ocorrido uma incorreta ponderação de todas as circunstâncias que a Lei prescreve no presente caso, a pena única a aplicar não deverá ser superior a 7 anos de prisão, para promover a sua reintegração social e reabilitação social, assim se satisfazendo as finalidades das penas.

Analisando a decisão sob recurso no que respeita à justificação dada para a referida pena única (10 anos de prisão) aplicada ao arguido/recorrente, verificamos que ainda que se compreenda a redução da pena única imposta ao recorrente, a verdade é que o tribunal da Relação podia ter sido mais cuidadoso na fundamentação dessa parte da sua decisão.

Neste caso concreto, a pena aplicável (a moldura abstrata do concurso de penas) tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos crimes em concurso (por força do disposto no art. 77.º, n.º 2, do CP, não pode ultrapassar 20 anos e 9 meses de prisão) e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos mesmos crimes em concurso (neste caso 7 anos de prisão), o que significa que a pena única terá de ser encontrada na moldura abstrata entre 20 anos e 9 meses de prisão e 7 anos de prisão.

Repare-se que em causa está o concurso de 3 crimes de roubo qualificados (dos quais 2 são consumados e cometidos como co-autor e 1 é tentado e cometido como cúmplice), um crime de furto qualificado (consumado cometido em co-autoria) e um crime de detenção de arma proibida (consumado cometido em co-autoria), tendo o arguido antecedentes criminais (5 condenações anteriores), que o não motivaram a alterar o seu comportamento.

O desvalor das condutas do arguido, o seu desprezo perante pautas mínimas de convivência societária, o facto de ter cometido o conjunto dos crimes em apreciação nestes autos no período indicado nos factos provados (entre 8.05.2019 e 28.02.2020), a sua postura de não interiorização das condutas delituosas, apesar do que se apurou quanto às suas condições de vida, revelam bem como o ilícito global agora em apreciação foi determinado por alguma propensão ou tendência criminosa.
De facto, apesar da sua jovem idade, vista a natureza e variedade dos crimes cometidos (como decorre da globalidade dos factos em conjunto) podemos afirmar que há uma adequação da sua personalidade aos factos cometidos, manifestada igualmente na indiferença que revelou pelos bens jurídicos violados, reveladora de uma certa tendência para a prática dos tipos de ilícitos criminais cometidos.
De resto, não se extrai da matéria de facto apurada que o recorrente tivesse interiorizado o desvalor das condutas que praticou, revelando sentido crítico.

A conexão entre os crimes cometidos, é grave, tendo de ser vistos no seu conjunto, considerando o espaço de tempo da sua atuação e a personalidade do arguido (avessa ao direito), que se mostra adequada aos factos cometidos, revelando uma certa tendência para a prática dos tipos de ilícitos criminais cometidos, bem como não esquecendo, relativamente ao ilícito global, as elevadas exigências de prevenção geral (para reafirmar, perante a comunidade, a validade das normas violadas) e de prevenção especial (considerando todo o seu percurso de vida, apesar das oportunidades que foi tendo, mas que foi desaproveitando).
E, no juízo de prognose a fazer pelo tribunal não se vê que haja razões para reduzir a pena única que lhe foi imposta, considerando as suas carências de socialização e tendo presente o efeito previsível da mesma (pena única aplicada) sobre o seu comportamento futuro, a qual não é impeditiva da sua ressocialização, quando chegar o momento próprio, sendo conveniente e útil que no EP vá interiorizando o desvalor da sua conduta, adote uma postura socialmente aceite e cumpra as regras da instituição (o que, por certo, se tal se justificar, poderá a seu tempo contribuir para beneficiar de medidas flexibilização que o vão preparar para a liberdade, medidas essas a determinar pelo tribunal competente para o efeito).
Da consideração global de todos os factos apurados e da personalidade do arguido/recorrente não se extrai que se possa formular um juízo mais favorável ou que se justifique efetuar qualquer correção e, por isso, se conclui que não é caso de reduzir a pena única aplicada ao recorrente.
De resto, ao contrário do que alega em sede de motivação de recurso, não se provou, designadamente, que seja uma pessoa transformada, renovada, designadamente que se tenha modificado durante todo o período em que tem estado preso preventivamente (já cerca de 2 anos), encontrando-se seriamente empenhado na sua recuperação, tencionando reorganizar a sua vida pessoal, social e afetiva, estando disposto a trabalhar, no mais curto espaço de tempo.
De recordar que, para efeitos de determinação da medida da pena única, apenas são atendidos os factos dados como provados e não os factos alegados pelo recorrente, que ficaram por demonstrar.

Na perspetiva do direito penal preventivo, julga-se na medida justa, sendo adequado, ajustado e proporcionado manter a pena única de 10 anos de prisão aplicada pela Relação (que não ultrapassa a medida da sua culpa, que é elevada), assim contribuindo para a sua futura reintegração social e satisfazendo as finalidades das penas.

A pretendida redução da pena mostra-se desajustada e comprometia irremediavelmente a crença da comunidade na validade das normas incriminadoras violadas, não sendo comunitariamente suportável aplicar pena única inferior à que lhe foi imposta.

De resto, a pena única aplicada pela Relação é equilibrada e respeita ainda a harmonia adequada e diferenciação a estabelecer em relação às penas que foram aplicadas aos demais arguidos, tendo em atenção a participação de cada um deles nos respetivos factos apurados, bem como particulares circunstâncias pessoais dadas como provadas.

Em conclusão: improcede o recurso do arguido AA na parte que era possível analisar, sendo certo que não foram violados os princípios e as disposições legais que era possível aplicar neste caso.

10.2. Recurso do arguido BB

O recorrente tendo sido condenado pela 1ª instância na pena única de 12 anos de prisão, a qual foi reduzida pela Relação para 10 anos e 6 meses de prisão, argumenta, em resumo, que devia ser ainda reduzida a pena única para os sete/oito anos de prisão, por ser comunitariamente suportável e para cumprir a função de prevenção geral e responder à maior exigência de reintegração social, importando ter presente a ideia de prevenção especial que também preside aos fins das penas, assumindo especial relevo, sendo o principal escopo das penas aplicadas, evitar que voltem a cometer crimes e que se tornem cidadãos responsáveis, socialmente úteis e cumpridores da lei, como é o caso do aqui Recorrente, que nunca tinha estado preso e, lhe serviu de exemplo para o futuro este tempo que tem estado em prisão preventiva, devendo igualmente ponderar-se as circunstâncias e contornos que tomou nos crimes praticados, assim como as suas condições pessoais de vida (as quais deveriam ter um relevo especial, impondo-se uma atenuação especial da pena, prevista nos artigos 72º e 73º do CP).

Analisando a decisão sob recurso no que respeita à justificação dada para a referida pena única (10 anos e 6 meses de prisão) aplicada ao arguido/recorrente BB, verificamos que ainda que se compreenda a redução da pena única imposta ao recorrente (perante a referida absolvição do crime de roubo), o tribunal da Relação podia ter sido mais cuidadoso na fundamentação dessa parte da sua decisão.

Neste caso concreto, a pena aplicável (a moldura abstrata do concurso de penas) tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos crimes em concurso (por força do disposto no art. 77.º, n.º 2, do CP, não pode ultrapassar 22 anos e 9 meses de prisão) e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos mesmos crimes em concurso (neste caso 7 anos de prisão), o que significa que a pena única terá de ser encontrada na moldura abstrata entre 22 anos e 9 meses de prisão e 7 anos de prisão.

Repare-se que em causa está o concurso de 3 crimes de roubo qualificados (dos quais 2 são consumados e cometidos em co-autoria e 1 é tentado e cometido também em co-autoria), um crime de furto qualificado (consumado cometido em co-autoria) e um crime de detenção de arma proibida (consumado cometido em co-autoria), tendo o arguido antecedentes criminais (4 condenações anteriores, uma das quais por 3 crimes de roubo simples, ainda que tivesse sido condenado em pena de prisão cuja execução foi suspensa, com sujeição a regras de conduta), que o não motivaram a alterar o seu comportamento.

O desvalor das condutas do arguido, o seu desprezo perante as regras mínimas de convivência societária, o facto de ter cometido o conjunto dos crimes em apreciação nestes autos no período indicado nos factos provados (entre 8.05.2019 e 28.02.2020), a sua postura de não interiorização das condutas delituosas, apesar do que se apurou quanto às suas condições de vida (sendo certo que se encontrava desempregado e o seu percurso profissional era irregular), revelam bem como o ilícito global agora em apreciação foi determinado por alguma propensão ou tendência criminosa.
De facto, apesar da sua jovem idade, vista a natureza e variedade dos crimes cometidos (como decorre da globalidade dos factos em conjunto) podemos afirmar que há uma adequação da sua personalidade aos factos cometidos, manifestada igualmente na indiferença que revelou pelos bens jurídicos violados, reveladora de uma certa tendência para a prática dos tipos de ilícitos criminais cometidos.
De resto, não se extrai da matéria de facto apurada que o recorrente tivesse interiorizado o desvalor das condutas que praticou, revelando sentido crítico (antes pelo contrário, tanto mais que no EP até já foi alvo de uma sanção disciplinar, o que mostra que deve esforçar-se por alterar o seu comportamento).

A conexão entre os crimes cometidos, é grave, tendo de ser vistos no seu conjunto, considerando o espaço de tempo da sua atuação e a personalidade do arguido (avessa ao direito), que se mostra adequada aos factos cometidos, revelando uma certa tendência para a prática dos tipos de ilícitos criminais cometidos, bem como não esquecendo, relativamente ao ilícito global, as elevadas exigências de prevenção geral (para reafirmar, perante a comunidade, a validade das normas violadas) e de prevenção especial (considerando todo o seu percurso de vida, apesar das oportunidades que foi tendo, mas que foi desaproveitando).
E, no juízo de prognose a fazer pelo tribunal não se vê que haja razões para reduzir a pena única que lhe foi imposta, considerando as suas carências de socialização e tendo presente o efeito previsível da mesma (pena única aplicada) sobre o seu comportamento futuro, a qual não é impeditiva da sua ressocialização, quando chegar o momento próprio, sendo conveniente e útil que no EP vá interiorizando o desvalor da sua conduta, adote uma postura socialmente aceite e cumpra as regras da instituição (o que, por certo, se tal se justificar, poderá a seu tempo contribuir para beneficiar de medidas flexibilização que o vão preparar para a liberdade, medidas essas a determinar pelo tribunal competente para o efeito).
Da consideração global de todos os factos apurados e da personalidade do arguido/recorrente não se extrai que se possa formular um juízo mais favorável ou que se justifique efetuar qualquer correção e, por isso, se conclui que não é caso de reduzir a pena única aplicada ao recorrente.

De resto, ao contrário do que alega em sede de motivação de recurso, não se provou, designadamente, que o período de reclusão já sofrido lhe serviu de exemplo para futuro (pelo contrário, indicia-se o contrário face à sanção disciplinar de que já foi alvo no EP).

Acrescente-se que não se pode confundir o momento da determinação da medida da pena individual com o momento da determinação da medida da pena única, sendo certo que a atenuação especial da pena apenas funciona quando se determina a medida da pena individual.

Daí que, neste momento em que se aprecia a pena única, não há lugar à aplicação da pretendida atenuação especial, sendo certo que, mesmo para efeitos de determinação da medida da pena única, apenas são atendidos os factos dados como provados e não os factos alegados pelo recorrente, que ficaram por demonstrar.

Na perspetiva do direito penal preventivo, julga-se na medida justa, sendo adequado, ajustado e proporcionado manter a pena única de 10 anos e 6 meses de prisão aplicada pela Relação (que não ultrapassa a medida da sua culpa, que é elevada), assim contribuindo para a sua futura reintegração social e satisfazendo as finalidades das penas.

A pretendida redução da pena mostra-se desajustada e comprometia irremediavelmente a crença da comunidade na validade das normas incriminadoras violadas, não sendo comunitariamente suportável aplicar pena única inferior à que lhe foi imposta.

De resto, a pena única aplicada pela Relação é equilibrada e respeita ainda a harmonia adequada e diferenciação a estabelecer em relação às penas que foram aplicadas aos demais arguidos, tendo em atenção a participação de cada um deles nos respetivos factos apurados, bem como particulares circunstâncias pessoais dadas como provadas.

Em conclusão: improcede o recurso do arguido BB na parte que era possível analisar, sendo certo que não foram violados os princípios e as disposições legais que era possível aplicar neste caso.

                                               *

III - Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes desta Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça em:

- não tomar conhecimento do recurso, por inadmissibilidade legal, na parte em que é impugnado o Acórdão da Relação, quanto à condenação dos Recorrentes AA e BB, pelos crimes e nas penas parcelares (face ao disposto nos arts. 399º, 400º, n.º 1, als. e) e f), 432º, n.º 1, al. b), 420º, n.º 1, al. b), e 414º, n.ºs 2 e 3, do CPP);

- no mais, negar provimento aos recursos interpostos pelos arguidos AA e BB.

Custas por cada um dos recorrentes/arguidos, fixando-se a taxa de justiça individual em 6 UC`s.

*

Processado em computador e elaborado e revisto integralmente pela Relatora (art. 94.º, n.º 2 do CPP), sendo assinado pela própria, pelo Senhor Juiz Conselheiro Adjunto e pelo Senhor Juiz Conselheiro Presidente.

*

Supremo Tribunal de Justiça, 7.04.2022

                                                  

Maria do Carmo Silva Dias (Relatora)

Cid Geraldo

Eduardo Almeida Lourenço

___________________________________________________


[1] No mesmo acórdão também foram condenados:

- O arguido JJ:

a) pela prática, em co-autoria, de um crime de roubo qualificado p. e p. pelos artigos 210.º, n.os 1 e 2, alínea b), e art. 204, n.º 1, alínea e), e n.º 2, alíneas a) e g), todos do Código Penal, na pena de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão (24/19);

b) pela prática, em co-autoria, de um crime de roubo qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 210.º, n.os 1 e 2, alínea b), e art. 204, n.º 1, alínea e), e n.º 2, alíneas a), f) e g), e artigos 22.º, todos do Código Penal, na pena de 4 (quatro) anos (37/19);

c) pela prática, em co-autoria, de um crime de branqueamento agravado p. e p. pelo art. 368.º-A, n.ºs 1, 2 6, do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 9 (nove) meses de prisão;

d) pela prática, em co-autoria, de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelos art. 86.º, n.º 1, alínea e d), da Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro (redacção da Lei n.º 50/2013) na pena de 9 (nove) meses de prisão.

Em cúmulo jurídico na pena única de 7 (sete) anos e 6 (seis) meses de prisão;

- O arguido EE:

a) pela prática, em co-autoria, de um crime de roubo qualificado p. e p. pelos artigos 210.º, n.os 1 e 2, alínea b), e art. 204, n.º 1, alínea e), e n.º 2, alíneas a) e g), todos do Código Penal, na pena de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão (24/19);

b) pela prática, em co-autoria, de um crime de branqueamento agravado p. e p. pelo art. 368.º-A, n.ºs 1, 2 6, do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 9 (nove) meses de prisão;

Em cúmulo jurídico na pena única de 6 (seis) anos e 3 (três) meses de prisão;

- O arguido LL:

a) pela prática, em co-autoria, de um crime de roubo simples p. e p. pelo artigo 210.º, n. 1, Código Penal, na pena de 3 (três) anos de prisão (684/19);

b) pela prática, em co-autoria, de um crime de furto qualificado p. e p. pelos artigos 210.º, n.os 1 e 2, alínea b), e art. 204, n.º 2, alíneas e) e h), do Código Penal, na pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão (1035/19);

Em cúmulo jurídico na pena única de 4 (quatro) anos de prisão;

- O arguido KK:

a) pela prática, em co-autoria, de um crime de roubo qualificado p. e p. pelos artigos 210.º, n.os 1 e 2, alínea b), e art. 204, n.º 1, alínea f), e n.º 2, alíneas a) e f) , todos do Código Penal, na pena de 7 (sete) anos de prisão (135/20);

b) pela prática, em co-autoria, de um crime de furto qualificado p. e p. pelos artigos 210.º, n.os 1 e 2, alínea b), e art. 204, n.º 2, alíneas e) e g), do Código Penal, na pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão (1035/19);

Em cúmulo jurídico na pena única de 8 (oito) anos de prisão;

- A arguida CCC pela prática, em cumplicidade, de um crime de roubo qualificado p. e p. pelos artigos 210.º, n.os 1 e 2, alínea b), e artigo 204, n.º 1, alínea f), e n.º 2, alíneas a) e f), e 27.º, todos do Código Penal, na pena de 3 (três) anos de prisão (135/20).

[2] No acórdão do TRL de 2.12.2021 julgaram-se, ainda, parcialmente procedentes os recursos interpostos pelos arguidos:

- JJ, sendo absolvido da prática do crime de branqueamento, p. e p. no artigo 368º-A do Código Penal e, reformulado o cúmulo jurídico, foi condenado na pena única de 6 (seis) anos de prisão;

- CCC, sendo suspensa, com regime de prova, a execução da pena de prisão de 3 (três) anos em que foi condenada por igual período;

-no mais, e quanto a estes arguidos, foi mantido o acórdão recorrido.

Também foram julgados totalmente improcedentes os recursos interpostos pelos arguidos LL e KK, sendo nessa parte mantido na íntegra o acórdão recorrido.
[3] Mais se provou, quanto aos demais arguidos:

Mais se provou (arguido JJ):

177.        O arguido JJ compareceu no julgamento e não prestou declarações.

178.        O arguido não apresenta qualquer condenação averbada no respetivo registo criminal.

(RELATÓRIO SOCIAL)

179.        O arguido nasceu em … de 1997.

180.        JJ sendo natural da …, é o elemento do meio de uma fratria de três irmãos, fruto do relacionamento dos progenitores que se separaram quando este tinha 5 anos.

181.        Desde então, ficou a cargo da mãe, embora tenha mantido contactos regulares com o progenitor que residia na ... e possuía ligações ao sistema de Administração da justiça penal.

182.        Neste sentido, ainda que no agregado materno beneficiasse de imposição de normas e regras, existiria no agregado do pai um modelo educativo mais permissivo e desculpabilizante.

183.        No que diz respeito ao percurso académico, o arguido iniciou a frequência escolar em idade própria, apresentando um percurso regular até ao 6º ano, sem qualquer retenção.

184.        Desde então, evidenciou algum insucesso, tendo registado duas retenções no 7º ano de escolaridade e uma no 8º ano, motivo pelo qual foi encaminhado para o curso de formação, “formação e educação de práticas educativas”, pelo estabelecimento de ensino, Escola Básica …, não tendo apresentado problemas significativos ao nível da assiduidade, aproveitamento ou comportamento.

185.        Concluiu o 9º ano de escolaridade no ano de 2014, quando contava 17 anos de idade.

186.        Assim, ainda que o arguido apresentasse rotinas estruturadas em torno da atividade escolar, frequentaria contextos sociais problemáticos, onde residia a família paterna, ao qual, desenvolveu a sua rede de sociabilidade, perante os quais desenvolveram permeabilidade e sentimento de gratificação.

187.        Por tais circunstâncias a progenitora do arguido, numa tentativa de cessação daqueles contactos, diligenciou para que o mesmo emigrasse para a …. Assim, em Setembro de 2014 o arguido emigrou integrando o agregado da família da tia materna.

188.        Naquele país, dedicou-se à aprendizagem da língua Francesa e ao desenvolvimento da actividade profissional, ao qual, frequentou curso de formação na área de eletricista e de segurança que o arguido referiu que ocorreu com sucesso.

189.        Neste país, ingressou na vida laboral, desenvolvendo funções como operário no ramo da construção civil referindo que auferia cerca de €1.600,00 (mil e seiscentos) euros.

190.        Em 2018, o arguido refere que devido à ausência de suporte e nostalgia familiar, regressou para Portugal realizando trabalho pontuais como indiferenciado na área da construção civil e na colheita da pinha, sem qualquer vínculo laboral.

191.        Em termos de saúde, JJ, não referenciou problemas de saúde.

192.        No que respeitas ao comportamento aditivo, assume que consume pontualmente, em contexto com pares, designadamente, consumo de álcool, mas nega consumos diários assumindo uma atitude de desvalorização face ao seu comportamento aditivo, considerando o mesmo controlado, negando necessidade de acompanhamento terapêutico especializado na área dos comportamentos aditivos

193.        No período que antecedeu à atual prisão preventiva, JJ, encontrava-se a residir com um amigo, EE, numa habitação arrendada, de tipologia T2, localizada na zona do ….

194.        A nível laboral encontrava-se a realizar trabalhos pontuais na colheita da pinha, sem qualquer vínculo laboral.

195.        Ao longo da reclusão, JJ, depende essencialmente do apoio da mãe, do pai e do irmão, beneficiado das suas visitas.

196.        Em termo individuais, da nossa avaliação, denota ser um individuo que, aparentemente, revela alguma imaturidade aliada ao reduzido sentido de responsabilidade, desenvolvendo permeabilidade evidenciando dificuldade em envolver-se de forma regular em atividades estruturadas e em distanciar-se de situações menos normativas, mantendo o convívio com pares desviantes.

197.        Em termos futuros, tem o apoio da mãe, que exerce funções como auxiliar de um lar localizado em …, auferindo o salario mínimo nacional, ao qual, foi confirmado pela própria.

198.        O arguido menciona também ter o apoio do progenitor e dos irmãos não tendo sido possível contactar, uma vez que, o mesmo não tinha contacto dos mesmos.

199.        Em termos profissionais, em liberdade, pretende regressar a … à procura de emprego apresentando um discurso pouco estruturado quanto ao que realmente deseja concretizar, uma vez que, não tem assegurado qualquer projeto nem dispõe de perspetivas de emprego.

200.        JJ, encontra-se preso preventivo no estabelecimento prisional de … à ordem dos presentes autos encontrando-se inativo a nível laboral.

201.        Teve anteriores contactos com a justiça ao nível penal e no tutelar educativo.

202.        Em meio prisional, o arguido apresenta um comportamento adequado e uma postura de acordo com as normas vigentes, verificando-se um registo ausente de sanções disciplinares.

203.        Quanto à sua conduta jurídica-penal o arguido mostra-se receoso, sendo de admitir que a situação de privação de liberdade em que o arguido se encontra não parece ter afetado de forma significativa, uma vez que, a data da presente reclusão o mesmo não estava integrado profissionalmente numa actividade estruturada, mantendo o convívio com pares desviantes.

204.        JJ demonstra uma atitude de desvinculação perante o presente processo jurídico- penal, circunstância e uma deficitária interiorização do desvalor dos seus comportamentos.

(…)

Mais se provou (arguido LL):

122.        O arguido compareceu no julgamento e não prestou declarações.

123.        O arguido apresenta as seguintes condenações averbadas no respetivo registo criminal:

a.            No processo n.º 1063/13..., mediante decisão transitada em julgado em 11 de Maio de 2015, o referido arguido foi condenado na pena de 1 ano de prisão, suspensa por igual período de tempo, pela prática, em 12 de Setembro de 2013, de um crime de furto qualificado.

b.            No processo n.º 692/13..., mediante decisão transitada em julgado em 1 de Dezembro de 2014, o referido arguido foi condenado na pena de multa, pela prática, em 24 de Novembro de 2013, de um crime de furto simples.

c.             No processo n.º 440/15..., mediante decisão transitada em julgado em 13 de Setembro de 2016, o referido arguido foi condenado na pena de 1 ano e 6 meses de prisão, suspensa na execução por igual período de tempo, com sujeição a regime de prova, pela prática, em 4 de Maio de 2015, de um crime de roubo simples.

d.            No processo n.º 236/16..., mediante decisão transitada em julgado em 27 de Abril de 2016, o referido arguido foi condenado na pena de multa, pela prática, em 8 de Fevereiro de 2016, de um crime de condução sem habilitação legal.

e.             No processo n.º 42/17..., mediante decisão transitada em julgado em 7 de Junho de 2017, o referido arguido foi condenado na pena de 5 meses de prisão, suspensa na execução pelo período de um ano, com sujeição a deveres, pela prática, em 7 de Maio de 2017, de um crime de condução sem habilitação legal.

f.             No processo n.º 1048/20..., mediante decisão transitada em julgado em 19 de Abril de 2021, o referido arguido foi condenado na pena de 9 meses de prisão, suspensa na execução pelo período de 1 ano e 3 meses, com sujeição a deveres, pela prática, em 7 de Maio de 2017, de um crime de condução sem habilitação legal.

g.             No processo n.º 452/21..., mediante decisão transitada em julgado em 25 de Maio de 2021, o referido arguido foi condenado na pena única de multa e de 1 ano de prisão, sendo esta suspensa na execução pelo período de 2 anos e 6 meses, com sujeição a regime de prova, pela prática, em 3 de Abril de 2021, de um crime de falsificação de documento e de um crime de condução sem habilitação legal.

(RELATÓRIO SOCIAL)

124.        O arguido nasceu em … de 1994.

125.        LL nasceu em …, sendo filho único do relacionamento afetivo existente entre os progenitores, o qual não perdurou.

126.        A primeira infância foi passada junto da mãe e avó, sendo que teria cerca de 4 anos quando ambas emigraram para Portugal, ficando o arguido entregue aos cuidados de uns tios, iniciando a escolaridade no país de origem.

127.        Aos 8 anos de idade veio para Portugal, agregando-se à mãe, na medida em que a mesma já havia obtido trabalho estável na área de restauração, como cozinheira, dispondo de apartamento localizado na zona do …, nas proximidades de um bairro de génese clandestina (bairro …) maioritariamente habitado por indivíduos e famílias provenientes dos PALOP.

128.        O arguido ingressou no sistema de ensino público, mas a adaptação ao contexto escolar não se verificou linear, uma vez que as dificuldades no domínio da língua foram um entrave às aprendizagens, fazendo com que o mesmo se desinteressasse dos estudos, agregando-se a pares igualmente desmotivados, desprovidos de regras e com comportamentos tendencialmente disruptivos, pelo que paulatinamente o afastamento à escola foi em crescendo, tendo completado apenas o 6º ano de escolaridade.

129.        A mãe, entretanto, constituiu nova família, tendo decidido com o padrasto do arguido mudar para uma outra casa, na tentativa de se afastarem daquela zona.

130.        Desta relação o arguido veio a ter mais dois irmãos.

131.        Todavia a dinâmica relacional do arguido não sofreu alteração, tendo ainda estabelecido outras amizades com jovens de um outro bairro também conotado com problemáticas sociais de cariz delituoso (...), sendo que face aos comportamentos socialmente desajustados foi alvo de intervenção judicial no âmbito da Promoção e Proteção e no âmbito Tutelar Educativo, vindo a estar cerca de três anos integrado em Centro Educativo, tendo ainda assim realizado o 3º ciclo do ensino básico.

132.        Após atingir a maioridade e cessada a medida tutelar, LL regressou a casa da mãe, tendo começado a trabalhar como carteiro, nos CTT, porém durante pouco tempo, ingressando em curso profissional de hotelaria e bar para realizar o ensino secundário, mas que, entretanto, abandonou.

133.        Com cerca de 21 anos de idade, iniciou vida em comum com TTT, sua namorada desde os 16 anos, tendo nascido o primeiro filho do casal, dois anos mais tarde.

134.        Esta conjuntura familiar não veio a revelar-se contentora em termos de ligação à rede paritária, que manteve, bem como os comportamentos socialmente desajustados, estabelecendo inevitavelmente contactos com o sistema de justiça penal.

135.        Entre Setembro de 2016 e Março de 2018, o arguido e família residiam em casa arrendada, no …, concelho de ..., tendo o mesmo realizado até então um curso de manobrador de empilhadores e algumas experiências laborais na construção civil, numa fábrica de embalamento de carnes e em empresa de logística no parque industrial de … (A.…), entre outras, mas que não se revelaram situações estáveis.

136.        Em dezembro de 2019, o núcleo familiar do arguido havia aumentado com o nascimento do seu segundo filho, estando a família a residir em ….

137.        Em termos laborais, LL estaria de novo a trabalhar no parque industrial de ..., através da empresa de trabalho temporário “W...”, aludindo o mesmo a uma situação financeira estável, na medida em que a sua companheira também continuava laboralmente ativa, a trabalhar na área de restauração.

138.        A convivialidade com os amigos de outrora, maioritariamente residentes no bairro ... e na ..., seria esporádica.

139.        Atualmente, LL, de 27 anos de idade, constitui agregado com a companheira e os dois filhos do casal, coabitando em casa arrendada.

140.        O arguido alude a que tem vindo a estar integrado profissionalmente, sendo que em dezembro de 2020 e janeiro de 2021 trabalhou para a empresa “V.., Lda.”, numa bomba de combustível, localizada no ..., auferindo um vencimento entre os 750 e os 1003€ líquidos/mês, referindo que será convocado sempre que necessário.

141.        Nos dias de folga, realizará ainda entregas/distribuição de pequenas encomendas para a empresa D…, retirando mais alguns proventos.

142.        Segundo o mesmo, face à pandemia da COVID-19, a sua companheira esteve em situação de lay off, porém já terá retomado a atividade laboral.

143.        LL tende a passar uma ajustada imagem de si próprio, mencionando não pretender estabelecer novos contactos com o sistema de justiça penal e que os amigos não exercem influência negativa sobre si.

Mais se provou (arguido KK):

144.        O arguido KK não compareceu injustificadamente no julgamento.

145.        O arguido apresenta as seguintes condenações averbadas no respetivo registo criminal:

a.            No processo n.º 1191/13..., mediante decisão transitada em julgado em 25 de Junho de 2014, o referido arguido foi condenado na pena de multa, pela prática, em 3 de Novembro de 2013, de um crime de condução sem habilitação legal.

b.            No processo n.º 132/14..., mediante decisão transitada em julgado em 25 de Outubro de 2016, o referido arguido foi condenado na pena de multa, pela prática, em 2 de Setembro de 2014, de um crime de condução sem habilitação legal.

c.             No processo n.º 1077/14..., mediante decisão transitada em julgado em 1 de Dezembro de 2014, o referido arguido foi condenado na pena de multa, pela prática, em 9 de Setembro de 2014, de um crime de condução sem habilitação legal.

d.            No processo n.º 50/15..., mediante decisão transitada em julgado em 17 de Abril de 2015, o referido arguido foi condenado na pena de multa, pela prática, em 5 de Março de 2015, de um crime de condução sem habilitação legal.

e.             No processo n.º 458/15..., mediante decisão transitada em julgado em 9 de Novembro de 2017, o referido arguido foi condenado na pena de multa, pela prática, em 13 de Maio de 2015, de um crime de furto simples.

f.             No processo n.º 674/15..., mediante decisão transitada em julgado em 26 de Abril de 2016, o referido arguido foi condenado na pena de 1 ano de prisão, suspensa por igual período de tempo, pela prática, em 23 de Julho de 2015, de um crime de roubo simples.

g.             No processo n.º 214/18..., mediante decisão transitada em julgado em 4 de Fevereiro de 2019, o referido arguido foi condenado na pena de 5 meses de prisão, substituída por trabalho comunitário, pela prática, em 7 de Dezembro de 2018, de um crime de condução sem habilitação legal.

(RELATÓRIO SOCIAL)

146.        O arguido nasceu em … de 1990.

147.        O arguido não compareceu injustificadamente junto da DGRSP, com isso inviabilizando a elaboração do relatório social.

Mais se provou (arguido CCC):

148.        A arguida compareceu no julgamento e não prestou declarações.

149.        A arguida não apresenta qualquer condenação averbada no respetivo registo criminal.

(RELATÓRIO SOCIAL)

150.        A arguida nasceu em … de 1982.

151.        CCC nasceu a 00-00-1982, na …, fruto da relação conjugal dos progenitores, sendo a mais nova de uma fratria de 3 irmãs.

152.        A situação familiar é descrita como positiva, quer em termos financeiros, quer afetivamente, encontrando-se os progenitores ativos laboralmente, o pai como empregado numa empresa e a mãe como funcionária pública.

153.        Para aquisição de uma melhor escolaridade, as duas irmãs mais velhas, UUU e VVV, nascidas em 1972 e 1974, respetivamente vieram para Portugal ingressando num colégio particular gerido por congregação religiosa.

154.        Aos 5 anos de idade, CCC acompanhou a mãe a Portugal, viagem que inicialmente tinha por objetivo ser uma visita, mas que se tornou definitiva, dado que quer a progenitora quer a arguida não mais regressaram ao país de origem.

155.        Em território nacional, fixaram residência na área da grande …, designadamente em ..., concelho de ..., localidade onde a arguida inicia a escolaridade aos 6 anos, tendo o percurso escolar e a infância decorrido dentro de parâmetros de normalidade.

156.        Profissionalmente, a progenitora deu continuidade à atividade na função pública, desempenhando funções Hospital ....

157.        O pai de CCC nunca se juntou ao seu agregado familiar, nem mesmo em visita, permanecendo até falecer na …, pelo que a sua presença física não é recordada, sendo, no entanto, a figura paterna descrita de afetuosa.

158.        Após conclusão do 8º ano de escolaridade, o agregado familiar mudou de residência tendo-se fixado no ..., Concelho de ..., onde CCC continuou a sua escolaridade e concluiu o 11º ano, no qual registou uma reprovação.

159.        Aos 18 anos de idade, por opção própria, não quis prosseguir a sua formação escolar ou profissional e começou a trabalhar, tendo exercido funções, em part time, na Cenoura, loja de vestuário infantil, e algum tempo depois, em full time na P.…, Loja de Bijuteria/vestuário.

160.        Aos 22 anos, inicia funções na I.…, loja de lingerie, onde desempenhou funções durante 12 anos, cessando as suas funções com a categoria de supervisora de várias lojas da marca.

161.        Nesta categoria profissional, tinha como vencimento base 900€, montante ao qual mensalmente acresciam subsídios e prémios de desempenho, auferindo cerca de 2.500 / 3.000€/mês.

162.        A cessação da atividade laboral foi motivada por problemas clínicos - pele atópica grave e problemas respiratórios - do seu filho WWW, nascido a ...-...-2016, situação que inviabilizou a conciliação da atividade profissional com a familiar.

163.        Em dezembro de 2017, contando com o apoio da sua progenitora e do pai do WWW para os cuidados necessários ao seu filho, CCC reinicia atividade laboral por conta própria na área das limpezas auferindo cerca de 1.000€/mês.

164.        Após a separação do pai do seu filho no ano de 2019, CCC manteve-se a coabitar com a progenitora, seu grande suporte familiar.

165.        Em termos formativos, nesse ano frequentou e concluiu os cursos de Gestão de Condomínio, com a duração de 15 horas e de Personal Organizer Home Pro, com a carga horaria de 24 horas.

166.        CCC, matem-se a residir na morada constante dos autos – …, com a progenitora e o filho WWW.

167.        Com referência ao seu agregado de origem, o pai faleceu há cerca de 4 anos no seu país de origem (o qual nunca abandonou) e as duas irmãs encontram-se integradas em agregados familiares próprios, a residir uma na região do ... e a outra em habitação próxima da arguida.

168.        Em termos escolares CCC em março de 2020, inscreveu-se e iniciou o Curso de Vendas ministrado pelo IEFP, tendo por objetivo a obtenção de equivalência ao 12º ano.

169.        Atualmente aguarda o reinício do curso, o qual foi suspenso dado o período de confinamento decretado pelo Governo Português por motivo da atual situação pandémica provocada pelo SARS Cov 2.

170.        Pretende ainda frequentar o Curso de Formação de Formadores, para o qual já efetuou inscrição.

171.        Em termos laborais, retomou a atividade na área das limpezas, atividade que apenas desempenha aos fins de semana, período no qual pode contar com o apoio da sua mãe, para cuidar do filho menor WWW.

172.        A economia familiar é descrita como sustentável, dado que ao rendimento por si auferido, em média 450€, acresce a pensão de 150€ paga pelo pai do WWW e ainda o rendimento resultante da confeção/venda de máscaras e viseiras, atividade à qual se dedicou na sequência da pandemia.

173.        A sua progenitora atualmente de 75 anos, é proprietária da casa de habitação - a qual se encontra integralmente paga - e aufere cerca de 1000€/mês de reforma.
[4] No acórdão da Relação … foram identificadas, no recurso apresentado pelo arguido AA as seguintes questões a decidir:

“- Da existência dos vícios previstos nas alíneas a) e c) do n.º 2 do artigo 410º do Código de Processo Penal – insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e erro notório na apreciação da prova;

- Da impugnação da matéria de facto;

- Da violação do princípio in dubio pro reo (n.º 2 do artigo 32º da Constituição da República Portuguesa);

- Da violação do princípio da igualdade (artigo 13º da Constituição da República Portuguesa);

- Do enquadramento jurídico dos factos quanto ao crime de detenção de arma proibida e de branqueamento de capitais.

- Da dosimetria da pena imposta quanto ao crime de roubo qualificado p. e p. pelos artigos 210.º, n.ºs 1 e 2, alínea b) e 204.º, n.º 1, alínea f) e n.º 2, alíneas a), f) e g), todos do Código Penal (NUIPC 135/20... - residência de ...).”
[5] Quanto a esta questão das penas individuais o recorrente apenas discutiu a sua dosimetria quanto aos crimes que admitiu ter cometido, pois quanto às restantes, como se verifica da motivação de recurso do acórdão da 1ª instância, pugnou pela absolvição dos respetivos crimes, tendo a Relação se pronunciado igualmente sobre essa questão (da dosimetria das penas individuais impugnadas -cf. p. 100 do acórdão da Relação).
[6] Neste sentido, Pereira Madeira, in AAVV, Código de Processo Penal Comentado, Coimbra: Almedina, 2014, p. 1254.
[7] Ver Ac. TC (Plenário) n.º 186/2013, acessível no site do Tribunal Constitucional.
[8] Neste sentido, Pereira Madeira, in AAVV, Código de Processo Penal Comentado, Coimbra: Almedina, 2014, p. 1254.
[9] Ver Ac. TC (Plenário) n.º 186/2013, acessível no site do Tribunal Constitucional.
[10] Ver Ac. do TC nº 3/2006, DR II Série de 7/2/2006.
[11] Neste sentido, Germano Marques da Silva, Direito Penal Português, Parte Geral, III, Teoria das Penas e das Medidas de Segurança, Editorial Verbo, 1999, p. 167 e Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal Português, Parte Geral, II, As consequências jurídicas do crime, Editorial Notícias, 1993, p. 291. Acrescenta este último Autor que “tudo se deve passar como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique. Na avaliação da personalidade – unitária – do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma «carreira») criminosa, ou tão só, a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta. De grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização).
[12] Ver Jorge de Figueiredo Dias, ob. cit., p. 291.