Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
2236/15.0T8AVR.P1.S1
Nº Convencional: 4ª. SECÇÃO
Relator: GONÇALVES ROCHA
Descritores: CONTRATO A TERMO
VALIDADE
REMISSÃO ABDICATIVA
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
RETRIBUIÇÕES INTERCALARES
SUBSÍDIO DE ALIMENTAÇÃO
PRÉMIO DE ASSIDUIDADE
Data do Acordão: 02/22/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA EM PARTE
Área Temática:
DIREITO DO TRABALHO - CONTRATO DE TRABALHO / CONTRATO A TERMO RESOLUTIVO - CESSAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO / DESPEDIMENTO ILÍCITO.
DIREITO CIVIL - DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / FONTES DAS OBRIGAÇÕES / RESPONSABILIDADE CIVIL / INDEMNIZAÇÃO.
Doutrina:
- Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, 7.ª ed., II vol., 243, 247 ss..
- Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria geral do Direito Civil, 4.ª edição por António Pinto Monteiro e Paulo Mota Pinto, 2.ª reimpressão, Coimbra, 2012, 444.
- Júlio Gomes, Direito do Trabalho, Vol. I, Coimbra Editora, 599.
- Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 13.ª Edição, 319.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 234.º, 236.º, N.º1, 494.º, 496.º, N.ºS 1 E 3, 863.º, N.º 1.
CÓDIGO DO TRABALHO (CT) /2009: - ARTIGOS 140.º, N.ºS 1, 2, AL. F), E 5, 141.º, N.º 1, ALÍNEA E), E N.º 3, 147.º, N.º 1, ALÍNEA C), 349.º, N.ºS 2, 3 E 5, 366.º, 389.º, N.º1, AL. A), 390.º, N.º 1.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

-DE 01/04/2009, PROCESSO N.º 3048/08, DA 4.ª SECÇÃO.
-DE 15/02/2006, PROCESSO N.º 2844/05; DE 24/02/2010, PROCESSO N.º 333/07.5TTMAI-A.S1; E DE 17/06/2010, PROCESSO N.º 173/07.1TTMAI.S1, DENTRE MUITOS OUTROS.
-DE 27/5/2010, PROCESSO N.º 467/06.3TTCBR.C1.S1.
-DE 18/01/2012, PROCESSO N.º 1947/08.1TTLSB.L1.S1.
-DE 02/12/2013, PROCESSO N.º 273/12.6T4AVR.C1.S1, 4ª SECÇÃO, CONSULTÁVEL EM WWW.DGSI.PT (NO MESMO SENTIDO, VEJAM-SE OS ACÓRDÃOS DE 14/04/2010, PROCESSO N.º 977/06.2TTCBR.C1.S1, DE 24/02/2015, PROCESSO N.º 178/12.0TTCLD.L1.S1).
Sumário :
I Para que se possa afirmar a validade do termo resolutivo aposto ao contrato é necessário que se explicitem no seu texto os factos que possam reconduzir ao motivo justificativo indicado e que tais factos tenham correspondência com a realidade.

II - A invocação no contrato de um “aumento de encomendas do mercado escocês”, sem mais qualquer concretização, constitui uma justificação genérica e vaga que não permite ao tribunal efectuar um juízo de adequação da justificação à hipótese legal e à duração estipulada para o contrato.

III – Considera-se celebrado por tempo indeterminado o contrato a termo e a sua renovação por período deferente da duração inicial, quando o seu texto não contém factos concretizadores dos acréscimos temporários de trabalho que nele foram invocados.

IV – A declaração de “nada mais ter a receber” do empregador “seja a que título for”, constante de um “acordo” assinado pelo trabalhador no dia em que cessou o contrato a termo que vigorara, não consubstancia uma remissão abdicativa se o trabalhador ao efectuá-la apenas estava a receber as quantias legalmente devidas na perspectiva do contrato a termo que vigorara, pois não tendo havido negociações prévias em que a questão da renúncia a tal impugnação tivesse sido discutida, não se pode depreender da declaração do trabalhador que fosse sua vontade renunciar à faculdade de impugnar a validade do termo do contrato, tanto mais que nenhuma quantia lhe era paga para o compensar, minimamente que fosse, da renúncia a esse direito.

V- Conforme resulta do n.º 1 do artigo 496.º do Código Civil na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.

VI- Tendo resultado provado que em consequência da situação de desemprego provocado pela denúncia ilícita do contrato de trabalho o trabalhador sofreu preocupação e angústia em relação ao seu futuro, situação agravada pelas limitações físicas resultantes da IPP de 15% resultante dum acidente de trabalho sofrido ao serviço da empregadora, justifica-se a atribuição duma compensação por danos não patrimoniais que foi fixada em 2 000 euros.

VII- Sendo o despedimento declarado ilícito tem o trabalhador direito a receber as retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do Tribunal, abrangendo as retribuições intercalares todas as prestações que seriam devidas ao trabalhador caso não tivesse ocorrido o despedimento.

VIII- O subsídio de refeição não está incluído nas retribuições intercalares devidas ao trabalhador ilicitamente despedido, se ele não alegou nem provou o valor que excede os gastos normais que o trabalhador suporta com a sua alimentação quando vai trabalhar.

IX- Constituindo o prémio de assiduidade um incentivo pecuniário que visa combater o absentismo e premiar a assiduidade do trabalhador, a sua atribuição reveste natureza notoriamente aleatória e ocasional, não podendo por isso ser considerado no cômputo das retribuições intercalares devidas ao trabalhador ilicitamente despedido. 

Decisão Texto Integral:

Processo n.º 2236/15.0T8AVR.P1.S1

4.ª Secção

Revista


Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:

1---                                                                                                               

 AA intentou uma acção com processo comum, emergente de contrato de trabalho, contra

“BB, S.A.” pedindo:

a) que seja declarada a nulidade do termo aposto no contrato de trabalho que celebrou com a R. e respectiva renovação, devendo por tal motivo o contrato ser convertido em contrato de trabalho sem termo, desde 30.01.2013 e consequentemente, ser declarada a nulidade do despedimento, porque não foi precedido do respectivo procedimento;

b) que seja reconhecido e declarado o A. como trabalhador efectivo vinculado à R., com a remuneração que auferia ao serviço desta e antiguidade que detinha e com ocupação em funções compatíveis com o seu estado de saúde actual; ou, se por tal vier a optar, ser a ré condenada no pagamento de indemnização, em substituição da reintegração;

c) a condenação da R. a pagar-lhe:

- as retribuições mensais, subsídio de alimentação, prémio de assiduidade, subsídio de turno nocturno, gratificação anual, férias, subsídio de férias e Natal, que deixou de auferir desde 21.10.2014 (dia seguinte ao da alta) até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal, no valor global de € 8.308,16 (até Junho de 2015, inclusive);

- os restantes créditos salariais que venham a vencer-se na pendência da lide;

- € 30.000,00, a título de danos não patrimoniais;

- juros de mora, desde o seu vencimento, até efectivo e integral pagamento.

d) no caso de condenação em reintegração do A, a condenação da R. em cláusula penal compensatória, no valor de € 100,00, por cada dia de atraso no cumprimento integral da obrigação.

Alegou para tanto que, em 30 de Janeiro de 2013, celebrou com a R. um denominado contrato de trabalho a termo resolutivo certo, com final previsto para 29 de Julho de 2013, com a categoria profissional de operador de máquinas; que o motivo justificativo invocado para a contratação a termo foi para fazer face a um acréscimo temporário de produção do estabelecimento industrial, Secção de “Capsulagem”, decorrente do aumento de encomendas de rolhas do mercado escocês; que em 11 de Julho de 2013 foi acordada a renovação do dito contrato para vigorar entre 30 de Julho de 2013 e 29 de Julho de 2014, com a mesma categoria de operador de máquinas, indicando-se como motivo justificativo fazer face ao acréscimo temporário de produção, decorrente do aumento de encomendas de rolhas do mercado britânico, verificando-se a necessidade temporária do trabalhador na Secção de “Acabamentos Mecânicos”; que em 24 de Fevereiro de 2014, foi vítima de um acidente de trabalho, nas instalações da R; que por carta datada de 21 de Maio de 2014, a R. lhe comunicou a intenção de não renovar o contrato de trabalho e que se deveria considerar desvinculado da empresa a partir de 29 de Julho de 2014; que tal carta só lhe foi entregue em mão na semana anterior a 29 de Julho de 2014, não tendo a caducidade do contrato sido comunicada com a antecedência mínima de 15 dias (artigo 344º, n.º 1 do CT) o que equivale a um despedimento ilícito; que, na realidade, nunca trabalhou na Secção de “Capsulagem”, mas sempre nos “Acabamentos Mecânicos”, por ordem e no interesse da R; que a justificação usada no contrato inicial e na renovação se referem a mercados distintos (“mercado escocês”  e “mercado britânico”) e são vagas e genéricas, porque não identificam nem quantificam o cliente ou os clientes da R., que deram origem ao aumento de encomendas, não se sabendo se se trata de clientes já existentes ou de novos clientes, nem se o alegado acréscimo temporário da produção de rolhas para os referidos mercados se limitou ao período compreendido entre o início do contrato de trabalho a termo celebrado e o fim da respectiva renovação, nem se referindo o motivo da imprevisibilidade do sucessivo aumento de encomendas de rolhas, não sendo possível a apreciação externa da veracidade e validade dos motivos invocados para a aposição do termo no contrato de trabalho e respectiva renovação, o que determina a nulidade da estipulação do termo resolutivo, devendo o contrato ser qualificado como sem termo; que após o acidente de trabalho, a R contratou um novo empregado para o substituir; que do acidente resultou uma IPP de 15%; que está no desemprego porque não tem condições para alcançar um novo trabalho, passando a viver apenas com o subsídio de desemprego, ficando numa situação económica ainda mais difícil, quando deixar de o receber, porque tem um filho menor a cargo, e a mulher apenas recebe uma remuneração mensal média de cerca de € 200; que a inesperada comunicação de caducidade do seu contrato de trabalho produziu-lhe angústia, vivendo num estado de ansiedade, com sinais de perturbação comportamental, ficando desgostoso e abalado por não ter capacidade para trabalhar normalmente nem meios económicos para fazer face às despesas diárias do agregado familiar, pelo que tem direito a indemnização por danos não patrimoniais.

Realizada a audiência de partes, e não tendo esta derivado na sua conciliação, contestou a R, alegando, em suma:

que por acordo datado do dia 29 de Julho de 2014, A. e R. liquidaram contas entre si, em relação ao contrato de trabalho e à sua cessação, mediante o pagamento pela R. ao A, da importância de € 2.769,10, que o A. recebeu, declarando que por esse acordo nada mais tinha a receber da R, fosse a que título fosse; que esse acordo constitui uma transacção e simultaneamente, uma renúncia abdicativa, pelo que nada mais tem o A. a receber; que o contrato e a renovação se justificaram pelo motivo que deles consta: acréscimo temporário de produção no estabelecimento industrial, decorrente do aumento de encomendas de rolhas no mercado escocês/britânico, de que não havia garantias de continuidade; que o A. foi admitido como operador de máquinas, inicialmente na Secção de “Capsulagem”, tendo depois do período de formação inicial, passado para a de “Acabamentos Mecânicos”, do mesmo estabelecimento industrial; que o acréscimo de trabalho na produção das rolhas capsuladas verificou-se em todo o estabelecimento que as produzia e não apenas numa secção ou parte do respectivo processo produtivo, pelo que não faz sentido dizer que o motivo foi alterado na renovação contratual, uma vez que foi exactamente o mesmo motivo que esteve na origem da prorrogação do prazo contratado; que a caducidade do contrato do A. se deveu ao facto do volume de encomendas ter normalizado, tornando desnecessário o acréscimo de mão de obra temporário admitido para o efeito; que o contrato e a sua renovação são perfeitamente válidos e legítima a sua cessação, por caducidade, devendo a acção ser julgada improcedente.

O A. respondeu à contestação alegando que o documento que assinou, no final do contrato, constitui um mero recibo de quitação dos valores referentes aos créditos que lhe eram devidos à data da cessação do contrato de trabalho e não uma remissão abdicativa; que não houve negociações prévias entre as partes para a cessação do contrato e a fixação da indemnização; que é aplicável o regime das cláusulas contratuais gerais (Dec. Lei n.º 446/85), perante o disposto no artigo 105.º do Código do Trabalho. E não tendo existido uma negociação prévia para a elaboração do texto, o texto do documento não lhe foi entregue com a antecedência necessária para que pudesse alcançar sobre o mesmo um conhecimento completo e efectivo, tanto mais que estava de baixa médica, e física e psicologicamente frágil; que desse modo, e por referência ao artigo 8º, al. a) do diploma legal em apreço, deve ser excluído o parágrafo/cláusula onde o A. declara nada mais ter a receber da R., seja a que título for; que a presunção da aceitação da caducidade do contrato a termo certo resultante do dito acordo obrigava também a que neste fossem discriminadas as concretas prestações e em que medida poderiam estar incluídas na compensação global de € 2.769,10, o que não ocorreu; que, mesmo que se entendesse ter existido uma presunção da aceitação da caducidade do contrato, tal invocação representaria um abuso de direito, porque por desconhecimento daquela importância, comunicada no próprio dia da assinatura do documento, o A. não pôde atempadamente, tomar uma posição devidamente esclarecida; que o alegado acordo foi apresentado ao A. e assinado no dia 29 de Julho de 2014, último dia de trabalho ao serviço da R. e está sujeito aos constrangimentos da subordinação que inibiam o autor contratualmente durante o período vinculístico.

Conclui assim pela improcedência da excepção invocada pela R.

Foi proferido despacho saneador, dispensando-se a audiência preliminar e a organização da matéria de facto assente e base instrutória, tendo sido fixado à acção, neste despacho judicial, o valor de € 38.308,16.

Realizado o julgamento foi proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu a R. do pedido.
Inconformado, apelou o A, tendo o Tribunal da Relação do … acordado em julgar o recurso parcialmente procedente e, decidindo que:
“5.1. declara-se a nulidade do termo aposto no contrato de trabalho que o recorrente AA celebrou com a recorrida “BB, S.A” e respectiva renovação, considerando-se o primeiro contratado sem termo desde 30 de Janeiro de 2013;
5.2. declara-se ilícito o despedimento de que foi alvo o recorrente AA, porque não foi precedido do respectivo procedimento;
5.3. condena-se a recorrida “BB, S.A” a proceder à reintegração do recorrente AA com a remuneração que auferia ao serviço desta no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade;
5.4. fixa-se em € 80 diários a sanção pecuniária compulsória devida pela recorrida por cada dia de atraso no cumprimento da reintegração;
5.5. condena-se a “BB, S.A” a pagar ao recorrente AA as retribuições (de base), prémio de assiduidade mensal e subsídio de alimentação  referidos no facto 26., vencidas e vincendas desde 25 de Maio de 2915 até ao trânsito em julgado do presente acórdão, sem prejuízo das deduções das quantias que o A. haja recebido, nesse período, a título de subsídio de desemprego - que deverão ser entregues pela Ré à Segurança Social, em conformidade com o estabelecido na al. c) do n.º 2 do art. 390º do Código de Trabalho -, a liquidar em oportuno incidente de liquidação [arts. 609º, nº 2, e 358º, nº 2, do CPC], quantia global que será acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde o trânsito em julgado da liquidação que venha a ser efectuada das referidas quantias (Este item foi depois rectificado pela Relação);
5.6. condena-se a recorrida “BB, S.A” a pagar ao recorrente AA a quantia de € 2.000,00, a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a presente data;
5.7. absolve-se a recorrida “BB, S.A” dos demais pedidos.”

É agora a R que, inconformada, nos traz revista, cuja alegação rematou com as seguintes conclusões:

1ª O contrato foi validamente celebrado a termo certo, como decorre da estipulação contratual retratada nos factos 2 e 6 e dos factos invocados como motivo para a celebração temporária do vínculo comprovados em sede de julgamento (factos 7 a 14 e 19), pelo que tendo o acórdão recorrido entendido que o termo aposto era nulo e que o A. estava contratado sem termo e foi despedido ilicitamente, com as consequências legais, fez incorrecta aplicação do art° 140° do CT.

2ª O contrato de trabalho do A. é um válido contrato a termo certo, para satisfação de necessidades temporárias de trabalho da R. e ao abrigo do art° 140° do Código do Trabalho, pelo que a caducidade comunicada ao A. operou, não existindo qualquer despedimento ilícito, ficando prejudicados os restantes segmentos decisórios (pontos 5.2, 5.3, 5.4, 5.5 e 5.6).

3ª Ficou provado que (facto 20) por acordo datado do dia 29.7.2014, A. e R. liquidaram contas entre si em relação ao contrato de trabalho e à sua cessação, mediante o pagamento, pela R. ao A, da importância de 2.769,10 euros, que o A. recebeu da R. por transferência bancária, declarando expressamente que por esse acordo nada mais tinha a receber da R. fosse a que título fosse.

4ª Este acordo constitui uma transacção, nos termos do art° 1.250° do CC e, simultaneamente, na posição que a R. advoga, constitui uma renúncia abdicativa, nos termos do art° 863° do CC, tudo configurando uma excepção peremptória, invocada nos termos e com os efeitos do n° 3 do art° 576° do CPC, que provoca a total improcedência da acção.

5ª Sem prejuízo do que se defendeu, sempre se dirá que nas retribuições intercalares (ponto 5.5 do acórdão) não podem ser considerados os valores que pressupõem a efectividade de funções e de serviço, nomeadamente o prémio de assiduidade mensal e o subsídio de alimentação.

6ª Também não há fundamento de facto para a condenação em danos não patrimoniais (ponto 5.6), nos termos do art° 496° do CC.

7ª O acórdão não considerou o recebimento da quantia de 643,89 euros, a título de compensação pela caducidade do contrato (factos 20/21/22), questão de que devia ter tomado conhecimento, como se arguiu, face à posição que tomou e que deve ser levada em linha de conta nas remunerações a pagar (ponto 5.5), mantendo-se a ilicitude do despedimento, como crédito da R. e como suscitou no art° 24° da contestação.

8ª A decisão recorrida violou as normas citadas nas conclusões anteriores, salvo o devido respeito.

Pede assim a revogação do acórdão com repristinação da sentença da 1ª instância.

O A também alegou, concluindo desta forma:

           

1- Em termos formais, a expressão "... aumento de encomendas de rolhas do mercado escocês../constante do contrato de trabalho a termo resolutivo certo, celebrado entre as partes em 30.01.2013, deverá ser entendida como vaga e genérica porque desprovida de um conteúdo concreto.

2- Na cláusula 3ª, n.º 2 e restantes daquele contrato de trabalho também não consta o motivo a justificar a relação entre o prazo acordado de 6 meses (ou 5 meses e 1 semana) e o aumento das encomendas, "temporário" e "excepcional", para o mercado escocês [artigo 141º, nº l, alínea e) e nº 3 do Código do Trabalho], representando tal falta ou insuficiência que seja considerado sem termo [artigo 147º, nº2º; c)]

 

3- Embora a questão não tenha sido apreciada e decidida, numa perspectiva substantiva ou material, também não ficou provado o constante daquela cláusula relativamente ao alegado "acréscimo temporário e excepcional da actividade da empresa " [artigo 140º; nº 2; f) do Código do Trabalho] devido ao aumento de encomendas de rolhas para o mercado escocês.

4- O acréscimo de actividade da recorrente nunca poderia ser considerado "excepcional", nomeadamente porque não ocorreu só para um dos mercados do Reino Unido.

5- Com efeito, provou-se que, nomeadamente nos anos de 2013 e 2014, existiu um acréscimo de encomendas de rolhas de cortiça a nível mundial, aliás muito superior ao proveniente daqueles mercados em que, relativamente a estes, nem sequer foi possível quantificar discriminadamente nos mapas de vendas que a mesma juntou aos autos na contestação.

6.3- A ré nem sequer provou que à cessação do contrato de trabalho por alegada caducidade em 29 de Julho de 2014, correspondeu a cessação do aumento de encomendas para o mercado britânico. Apenas provou que o aumento de produção se manteve, pelo menos, até à data da renovação do contrato de trabalho a termo do autor em 11.07.2013.

7.3- De um modo contraditório com as próprias regras da experiência comum existiu um prazo de vigência de 6 meses para o contrato de trabalho inicial devido ao aumento de encomendas de rolhas de cortiça do mercado escocês, considerado o mais importante do Reino Unido, e um prazo de 12 meses devido ao aumento de encomendas semelhantes proveniente do mercado britânico, qualificado pela ré como um mercado sem expressão ou significado.

8.3- O alegado "acordo" deverá ser qualificado como um mero documento de quitação (artigo 787º/2 do CC), e não contrato de remissão (artigos 863º/2 e seg. do C.C), pelo qual o autor nada mais tem a haver da ré em termos decorrentes apenas da cessação do contrato de trabalho aqui em apreço se vier a ser declarado que a mesma ocorreu por caducidade a partir de 29.07.2014.

9.3- Do teor daquele "acordo" e nas circunstâncias em que foi assinado, nada demonstra que o aqui recorrido tivesse em vista propor e obter o acordo da recorrente no sentido de renunciar à impugnação da validade do contrato a termo.

10.3- Como se espera, se vier a ser declarado que a cessação do contrato de trabalho a termo resolutivo certo não ocorreu por fundamento na caducidade, mas por despedimento ilícito, face à repristinação dos efeitos jurídicos do contrato de trabalho celebrado em 30.01.2013, o aqui recorrido adere aos direitos que foram reconhecidos no acórdão aqui em apreço.

Pugna assim pela manutenção do mesmo.

Subidos os autos, constatando o relator que a recorrente havia deduzido no requerimento de interposição da revista a nulidade de omissão de pronúncia resultante do trabalhador ter recebido a compensação pela caducidade do contrato no montante de 643, 89 euros, valor que não havia sido considerado no dispositivo do acórdão, ordenou-se a baixa dos autos à Relação.

E veio depois a proferir-se acórdão em conferência a rectificar o ponto 5.5 do mesmo dispositivo nos seguintes termos:

“5.5. Condena-se a “BB, S.A” a pagar ao recorrente AA as retribuições (de base), prémio de assiduidade mensal e subsídio de alimentação referidos no facto 26., vencidas e vincendas desde 25 de Maio de 2015 (conforme rectificação de fls. 256) até ao trânsito em julgado do presente acórdão, a que se deverá deduzir o valor pago pela R ao A a título de compensação pela caducidade do contrato de trabalho (643,89 euros) e as quantias que o A. haja recebido, nesse período, a título de subsídio de desemprego - que deverão ser entregues pela Ré à Segurança Social, em conformidade com o estabelecido na al. c) do n.º 2 do art. 390º do Código de Trabalho -, tudo a liquidar em oportuno incidente de liquidação [arts. 609º, nº 2, e 358º, nº 2, do CPC], quantia global que será acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde o trânsito em julgado da liquidação que venha a ser efectuada das referidas quantias.”

Subidos os autos, emitiu o Senhor Procurador Geral Adjunto proficiente parecer no sentido de se negar a revista, em virtude da declaração de fls. 36 não configurar uma remissão abdicativa e da recorrente não ter indicado no contrato a termo uma motivação justificativa que permita aferir da veracidade da mesma, dado o seu carácter vago e genérico.

A recorrente veio responder, discordando desta posição do MP.

Cumpre decidir.

2----

Para tanto, provados estão os seguintes factos:

1. Em 30.01.2013, o A. e a R. celebraram um denominado contrato de trabalho a termo resolutivo certo de 6 meses, pelo qual o A. teria a categoria profissional de “Operador de Máquinas”.

2. Segundo a cláusula 3ª, n.º 2 do referido contrato de trabalho, o motivo justificativo para o termo certo fundamentou-se no seguinte:

“(...) o presente contrato é celebrado a termo certo porque se destina fazer face ao acréscimo temporário de produção no estabelecimento industrial, secção “Capsulagem” para que o trabalhador foi contratado, decorrente do aumento de encomendas de rolhas do mercado escocês, conforme previsto na alínea f) do numero 2 do art.º 140º do CT “Acréscimo excepcional da actividade da empresa”. Sendo, assim, previsível a duração desta necessidade temporária da empresa, recorreu-se a um termo certo de 05 (cinco) meses e 01 (uma) semana, para que o presente Contrato dure apenas pelo tempo necessário à satisfação da mesma”.

3. De acordo com a cláusula 1.ª do contrato, o seu termo ocorreria em 29.07.2013.

4. Em 11.07.2013, foi acordada a renovação do contrato de trabalho por 12 meses, até 29.7.2014, com a indicação de que o A. continuaria a ter a categoria profissional de Operador de Máquinas.

*5. Nos termos da cláusula 3.ª, n.º 1, a renovação do contrato vigoraria entre 30.07.2013 e 29.07.2014.

6. O motivo justificativo indicado na cláusula 3ª, n.º 2 da renovação do contrato a termo foi:

 “Fazer face ao acréscimo temporário de produção no estabelecimento industrial, para que o trabalhador foi contratado, decorrente do aumento de encomendas de rolhas “capsuladas” do mercado Britânico e de que não há garantias de continuidade, situação esta que ocorrerá temporariamente, verificando-se a necessidade temporária deste trabalhador na secção “Acabamentos Mecânicos”, conforme previsto na alínea f, do nº 2 e também do nº 1 do Código do Trabalho, aprovado pela Lei nº 7/2009, de 12 de Fevereiro (“Acréscimo excepcional da actividade da empresa”). Prevê-se que esta necessidade temporária tenha uma duração de 12 meses. Porque se destina à satisfação de necessidades temporárias desta e pelo período de tempo estritamente necessário a satisfação dessas necessidades, sendo por isso considerada uma actividade eventual e não duradoura. Sendo, assim, previsível a duração desta necessidade temporária da empresa, recorreu-se a mais um termo certo de 12 meses, para que o presente Contrato dure apenas pelo tempo necessário à satisfação da mesma”.

7. Aquando da celebração do contrato de trabalho a termo entre A. e R., em Janeiro de 2013, verificou-se um aumento de encomendas de rolhas capsuladas por parte do mercado escocês, de que não havia garantias de continuidade, provocando um aumento de produção no estabelecimento industrial da R. de Lourosa, que as produzia e onde o A. prestava serviço.

8. Esse aumento de produção motivou a contratação por parte da R. de 8 trabalhadores (entre os quais o A.), em Janeiro de 2013, para fazer face a esse acréscimo de trabalho.

9. Tendo-se tal aumento de produção mantido pelo menos até à data da renovação do contrato de trabalho a termo do A., em 11/07/2013.

10. À data da celebração do contrato de trabalho a termo entre as partes (30/01/2013), já existia na R. a “Secção de Acabamentos Mecânicos”.

11. Na R., os trabalhadores recebem uma formação inicial, a fim de poderem ser polivalentes e habilitados a prestar serviço da sua categoria em qualquer secção, em função das necessidades.

12. O A. foi admitido como operador de máquinas, inicialmente na Secção de Capsulagem, tendo, após o período de formação inicial, passado para a Secção de Acabamentos Mecânicos do mesmo estabelecimento industrial.

13. O acréscimo de trabalho na produção das rolhas capsuladas para o mercado escocês, verificou-se em todo o estabelecimento que as produz, e não apenas numa secção ou parte do respectivo processo produtivo.

14. O mercado escocês é para a R. o mais importante e o único verdadeiramente relevante, no que respeita ao Reino Unido (também designado comummente de “Grã-Bretanha”), constituindo a Inglaterra, Irlanda do Norte e País de Gales mercados sem expressão ou significado para a R..

15. No dia 24.02.2014, pelas 21:30 horas, o A. foi vítima de um acidente de trabalho, nas instalações da R., tendo-lhe o perito médico do Gabinete Médico- Legal e Forense de ... atribuído uma IPP de 15% e fixado a data da consolidação médico-legal das lesões em 20.10.2014.

16. O processo de acidente de trabalho corre os seus termos, sob o n.º 690/14.7T8VFR, nos serviços do Ministério Público desta Instância Central do Trabalho de ….

17. Por missiva datada de 21.5.2014, estando o A. ainda de baixa médica, a R. comunicou-lhe que:

 “Nos termos e para os efeitos do disposto no n.° 1 do art.º 344º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 37/2009, de 12 de Fevereiro e do disposto no nº 2 da clausula 9ª do seu Contrato de Trabalho a Termo Certo celebrado em 30/01/2013, vimos informá-lo(a) de que, não estando nós interessados em renovar o referido contrato, o mesmo caducará no seu termo, pelo que se deverá considerar desvinculado desta empresa a partir do dia 29/07/2014, sendo esse o seu último dia de trabalho ao serviço da BB, S.A. Assim sendo, agradecemos que se dirija ao Departamento de Recursos Humanos da empresa, a fim de lhe serem pagas as importâncias a que, nos termos da Lei, tem direito (…)”.

18. Missiva essa que o A. assinou, nela escrevendo “Tomei conhecimento”.

19. Aquando da comunicação da caducidade do contrato de trabalho, a R. entendeu que o volume de encomendas não justificava já a manutenção do contrato de trabalho do A. (e de outros 3 trabalhadores, de entre os oito admitidos aquando do A., cujos contratos igualmente caducaram, na mesma altura).

20. A. e R. assinaram escrito particular intitulado “Acordo”, datado de 29.7.2014, com o seguinte teor:

“Acordo

Aos 29 dias do mês de Julho de 2014 entre:

BB, S.A. (…), a seguir designada por primeira outorgante

e

Sr. AA (…), adiante designado(a) por segundo outorgante,

Foi acordado, nesta data, liquidar contas entre ambos os outorgantes, em relação ao Contrato de Trabalho entre eles celebrado e a sua cessação, mediante o pagamento pela primeira outorgante ao segundo outorgante da importância de EUR. 2.769,10 (dois mil setecentos e sessenta e nove euros e dez cêntimos).

Por este Acordo, o segundo outorgante declara expressamente, nada mais ter a receber da primeira outorgante, seja a que título for”.

21. A R. pagou efectivamente ao A. a referida quantia de € 2.769,10, por transferência bancária.

22. Os € 2.769,10 (líquidos) pagos pela R. ao A, discriminam-se da seguinte forma, de acordo com as contas da R. (em valores ilíquidos, excepto a “Compensação Caducidade Contrato”): Complemento Acidentes de Trabalho: € 825,96; Subsídio de férias: € 604,71; Prop. Subsídio de Férias: € 470,31; Pagamento de Ferias Não Gozadas: € 893,09; Proporcional Ferias: € 470,31; Compensação Caducidade Contrato: € 643,89.

23. O dito “acordo” foi assinado pelo A. no dia 29/07/2014.

24. Nesse dia, o A. encontrava-se de baixa médica.

25. Não ocorreram quaisquer negociações prévias entre a R. e o A. para a cessação do contrato e para o pagamento da quantia estabelecida no dito “acordo”.

26. O A., à data da cessação do contrato de trabalho, auferia mensalmente os seguintes rendimentos de trabalho (sujeitos a descontos para a Segurança Social e IRS, excepto o subsídio de alimentação): € 715,44 de vencimento base; € 24,94 de prémio de assiduidade mensal; € 5,37 por dia de subsídio de alimentação.

27. O A. recebia “horas nocturnas”.

28. No mês de Dezembro de 2013, o A. recebeu € 142,95, a título de “subsídio turno nocturno horário fixo”.

29. Com data de Dezembro de 2013, a R enviou uma carta ao A, a agradecer o esforço e dedicação ao serviço da empresa, motivo pelo qual lhe oferecia uma gratificação.

30. Em Dezembro de 2013, o A. recebeu, tal como os demais trabalhadores da R., uma “gratificação anual”, no valor de € 300,00.

31. Essa gratificação no valor de € 300,00 que o A. recebeu em Dezembro de 2013, tal como os demais trabalhadores assalariados da R., foi uma espécie de distribuição de lucros, destinada a compensar o esforço e dedicação dos trabalhadores, não tendo sido prevista no contrato de trabalho celebrado.

32. O A. vive com o subsídio de desemprego, que lhe foi atribuído com efeitos a partir de 14/10/2014, no valor de € 14,74/dia, pelo período de 450 dias.

33. O A. tem um filho menor, e a sua mulher encontra-se presentemente desempregada.

34. O facto de se encontrar desempregado e limitado fisicamente, em consequência do acidente de trabalho que sofreu, causa preocupação e angústia ao A.

35. A ré publicita que vende rolhas de cortiça para mais de 15 mil clientes activos em 82 países.

3----

Sendo pelas conclusões que se afere o objecto do recurso, constatamos que a recorrente suscita as seguintes questões:

a) Remissão abdicativa;

b) Validade do termo aposto ao contrato;

c) Caso esta matéria improceda, pretende a recorrente que nas retribuições intercalares não podem ser considerados os valores que pressupõem uma efectividade de funções e de serviço, nomeadamente o prémio de assiduidade mensal e o subsídio de alimentação.

d) Indemnização por danos não patrimoniais;

e) O acórdão não considerou o recebimento da quantia de 643,89 euros, recebida pelo A a título de compensação pela caducidade do contrato.

3.1---

Começando por esta última, temos de dizer que esta matéria foi apreciada, sem qualquer reparo das partes, na sequência da baixa dos autos à Relação, conforme já se disse na parte final do item número 1.

E suscitando-se as questões da remissão abdicativa e da validade do termo aposto ao contrato, por uma questão lógica impõe-se apreciar primeiro esta última, pois se se julgar válido o termo do contrato ficarão prejudicadas todas as demais matérias suscitadas na revista.

3.2----

Quanto à validade do termo:

    
As partes celebraram o “Contrato de Trabalho a Termo Resolutivo Certo” documentado a fls. 8, de acordo com o qual o A foi admitido ao serviço da R para o exercício das funções correspondentes à categoria profissional de “Operador de Máquinas”, mediante a retribuição mensal de € 703,95, contrato que foi celebrado por 6 meses, com início em 30 de Janeiro de 2013 e termo em 29 de Julho de 2013.
A estipulação do termo ficou fundamentada do seguinte modo:

“(...) o presente contrato é celebrado a termo certo porque se destina fazer face ao acréscimo temporário de produção no estabelecimento industrial, secção “Capsulagem” para que o trabalhador foi contratado, decorrente do aumento de encomendas de rolhas do mercado escocês , conforme previsto na alínea f) do numero 2 do art.º 140º do CT “Acréscimo excepcional da actividade da empresa”. Sendo, assim, previsível a duração desta necessidade temporária da empresa, recorreu-se a um termo certo de 05 (cinco) meses e 01 (uma) semana, para que o presente Contrato dure apenas pelo tempo necessário à satisfação da mesma”.

Em 11.07.2013, foi acordada a renovação do contrato de trabalho por 12 meses, até 29.7.2014, com a indicação de que o A. continuaria a ter a categoria profissional de Operador de Máquinas, tendo sido este o motivo justificativo que lhe foi aposto:

 “Fazer face ao acréscimo temporário de produção no estabelecimento industrial, para que o trabalhador foi contratado, decorrente do aumento de encomendas de rolhas “capsuladas” do mercado Britânico e de que não há garantias de continuidade, situação esta que ocorrerá temporariamente, verificando-se a necessidade temporária deste trabalhador na secção “Acabamentos Mecânicos”, conforme previsto na alínea f), do nº 2 e também do nº 1 do Código do Trabalho, aprovado pela Lei nº 7/2009, de 12 de Fevereiro (“Acréscimo excepcional da actividade da empresa”). Prevê-se que esta necessidade temporária tenha uma duração de 12 meses. Porque se destina à satisfação de necessidades temporárias desta e pelo período de tempo estritamente necessário a satisfação dessas necessidades, sendo por isso considerada uma actividade eventual e não duradoura. Sendo, assim, previsível a duração desta necessidade temporária da empresa, recorreu-se a mais um termo certo de 12 meses, para que o presente Contrato dure apenas pelo tempo necessário à satisfação da mesma”.

As instâncias divergiram na solução que foi dada à questão da validade do termo, pois a Relação, revogando a sentença, concluiu pela sua invalidade, sendo contra tal juízo que reage a recorrente.

Vejamos então se tem razão.

3.2.1---

Com o advento do DL nº 372-A/75, de 14 de Julho, que veio proibir os despedimentos sem justa causa, as empresas começaram a socorrer-se da contratação a prazo prevista na LCT que admitia tal contratação sem quaisquer limitações, desde que o contrato constasse de documento escrito, conforme resultava do artigo 10º.

Para travar esta fuga indiscriminada para a contratação a prazo, o DL nº 781/76 de 28/X tentou impor-lhe algumas restrições, embora estas intenções do legislador não tivessem obtido êxito, pois no domínio da sua vigência este tipo de contratação atingiu níveis quase escandalosos, por permitir a contratação temporária sem grandes limitações.

Esta situação foi profundamente alterada com o DL nº 64-A/89 de 27/2, que partindo duma concepção substancialmente diferente daquela em que se fundara o legislador de 1976, quis restringir a contratação a termo a situações rigorosamente tipificadas, por forma a adequar o novo regime aos imperativos constitucionais de segurança no emprego consagrados no artigo 53º da CRP.

Assim, a contratação a termo passou a ter carácter excepcional, visando permitir que as empresas se adaptassem às flutuações do mercado e criar condições para uma maior absorção de volume de emprego, por forma a favorecer grupos socialmente mais vulneráveis que desta forma teriam acesso ao trabalho, embora com carácter temporário.

Nesta linha, e escorado no já mencionado princípio constitucional da segurança no emprego, que impõe que a regra seja a contratação por tempo indeterminado, o DL nº 64-A/89, de 27/2, apenas admitia a celebração de contratos a termo em situações excepcionais de satisfação de necessidades de carácter precário ou sazonal, expressamente tipificadas no artigo 41, nº 1, e impondo o seu nº 2 que a celebração de contratos a termo fora destes condicionalismos importaria a nulidade do termo.

E para se permitir um verdadeiro controlo destas contratações e se poder averiguar se as razões invocadas pela entidade empregadora correspondiam à realidade, impunha-se que o contrato fosse reduzido a escrito, devendo conter a indicação do motivo justificativo da sua celebração por forma a mencionar-se as circunstâncias e factos concretos que haviam determinado esta contratação, conforme resultava dos artigos 42º, nº 1, alínea e) deste diploma e do 3º da Lei 38/96 de 31/8.

O Código do Trabalho aprovado pela Lei 99/2003 de 27 de Agosto e que entrou em vigor em 1 de Dezembro de 2003, acolheu também estas orientações, tendo introduzido porém, algumas alterações.

Assim e contrariamente ao regime da LCCT, que se limitava a indicar as situações em que era permitida a contratação a termo, o artigo 129º, nº1 daquele CT começava por estatuir que o contrato de trabalho a termo só podia ser celebrado para a satisfação de necessidades temporárias da empresa e pelo período estritamente necessário à satisfação dessas necessidades, constando do nº 2 o elenco, meramente exemplificativo, das situações que justificavam a contratação a termo.

Por outro lado e quanto às formalidades do contrato, tinha este de ser escrito, conforme advinha do artigo 127º, impondo-se que dele constasse, para além doutras menções, a indicação do termo estipulado e do respectivo motivo justificativo, conforme impunha a alínea e) do nº 1 do artigo 131º.

Além disso, a indicação do motivo justificativo da aposição do termo devia ser feita pela menção expressa dos factos que o integravam, por forma a estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado, (conforme resultava do nº 3 do supracitado preceito), considerando-se sem termo o contrato em que falte a redução a escrito, bem como aquele em que se omitam ou sejam insuficientes as referências exigidas naquela alínea e) do nº 1.

Quanto ao CT de 2009, o legislador optou por manter a técnica legislativa do CT/2003, começando por estabelecer no nº 1 do artigo 140º que o contrato de trabalho a termo só pode ser celebrado para satisfação de necessidade temporária da empresa e pelo período estritamente necessário à satisfação dessa necessidade, constando também do nº 2 o elenco, meramente exemplificativo, das situações que justificam a contratação a termo, considerando-se, nomeadamente, necessidade temporária da empresa as seguintes:

a) substituição directa ou indirecta de trabalhador ausente ou que, por qualquer motivo, se encontre temporariamente impedido de trabalhar;

b) substituição directa ou indirecta de trabalhador em relação ao qual esteja pendente em juízo acção de apreciação da licitude do despedimento;

c) substituição directa ou indirecta de trabalhador em situação de licença sem retribuição;

d) substituição de trabalhador a tempo completo que passe a prestar trabalho a tempo parcial por período determinado;

e) actividade sazonal ou outra cujo ciclo anual de produção apresente irregularidades decorrentes da natureza estrutural do respectivo mercado, incluindo o abastecimento de matéria-prima;

f) acréscimo excepcional de actividade da empresa;

g) execução de tarefa ocasional ou serviço determinado precisamente definido e não duradouro;

h) execução de obra, projecto ou outra actividade definida e temporária, incluindo a execução, direcção e fiscalização de trabalhos de construção civil, obras públicas, montagens e reparações industriais, em regime de empreitada ou em administração directa, bem como os respectivos projectos e outra actividades complementar de controlo e acompanhamento.

Para além das situações previstas no n.º 1 do artigo 140.º e exemplificadas nas alíneas do seu n.º 2, o artigo 140.º admite ainda a celebração de um contrato a termo nos seguintes casos, conforme resulta do seu nº 4:

a) lançamento de uma nova actividade de duração incerta, bem como início de laboração de empresa ou estabelecimento pertencente a empresa com menos de 750 trabalhadores;

b) contratação de trabalhador à procura de primeiro emprego, em situação de desemprego de longa duração ou noutra prevista em legislação especial de política de emprego.

No respeitante às formalidades do contrato, manteve-se a obrigatoriedade da sua redução a escrito, devendo constar do documento a indicação do termo estipulado e do respectivo motivo justificativo, que deve ser feita com a menção expressa dos factos que o integram, por forma a estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado, conforme estabelece o artigo 141º, nº 1, alínea e), e nº 3.

Com este requisito visa-se, um duplo objectivo: a verificação externa da conformidade da situação concreta com a hipótese legal ao abrigo da qual se contratou, por um lado; e por outro, a averiguação acerca da realidade e adequação da justificação invocada face à duração estipulada, porquanto o contrato a termo – nas palavras de Monteiro Fernandes[1]…só pode ser (validamente) celebrado para certos (tipos de) fins e na medida em que estes o justifiquem.

Por isso, ocorre a invalidade do termo se o documento escrito omite ou transcreve de forma insuficiente as referências respeitantes ao termo e ao seu motivo justificativo, face à prescrição do artigo 147º, nº 1, alínea c).

Assim, e conforme se decidiu no acórdão deste Supremo Tribunal de 2/12/2013, Processo n.º 273/12.6T4AVR.C1.S1, 4ª Secção, consultável em www.dgsi.pt, a indicação do motivo justificativo da celebração de contrato de trabalho a termo constitui uma formalidade “ad substantiam”, tendo que integrar, forçosamente, o texto do contrato, pelo que a insuficiência de tal justificação não pode ser suprida por outros meios de prova.[2]

Donde ser de concluir que as fórmulas genéricas constantes das várias alíneas do nº 2 do art. 140º do Código do Trabalho têm de ser concretizadas em factos que permitam estabelecer a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado, por forma a permitir a verificação externa da conformidade da situação concreta com a tipologia legal e que é real a justificação invocada e adequada à duração convencionada para o contrato.

Por isso, tal indicação deve ser feita de forma suficientemente circunstanciada para permitir o controlo da existência da necessidade temporária invocada pela empresa no contrato, possibilitando também, quanto àquelas necessidades temporárias, que se comprove que o contrato a termo é celebrado pelo período estritamente necessário à satisfação dessas necessidades[3], cabendo ao empregador a prova dos factos que justificam a celebração de contrato de trabalho a termo, conforme prescreve o n.º 5 do mencionado artigo 140º.

Postas estas considerações, vejamos então o caso presente.

3.3---
Entendeu a Relação que o texto do convénio celebrado não esclarece de modo suficiente, quais eram os factos ou circunstâncias que acarretaram o acréscimo “excepcional” da actividade da R. e se o aumento de encomendas ali invocado era meramente “temporário”, alinhando para tanto a seguinte argumentação:

 “Relembrando o teor da cláusula contratual em que é exposta a motivação do contrato [facto 2.], verificamos que, para além da referência ao preceito legal em que funda a motivação - alínea f) do numero 2 do art.º 140º do CT “Acréscimo excepcional da actividade da empresa” – o objectivo ali assinalado - fazer face ao acréscimo temporário de produção no estabelecimento  (…) decorrente do aumento de encomendas de rolhas do mercado escocês – mostra-se traçado com contornos manifestamente vagos.

É vago porque, com a singela referência que ficou a constar do contrato ao “aumento de encomendas de rolhas do mercado escocês”, sem quaisquer outras especificações, fica sem se perceber se esse aumento se inscreve no normal desenvolvimento da actividade empresarial da recorrida, com a progressão natural do volume de encomendas dos seus clientes ou a expansão também natural (e, até, eventualmente programada) da sua actividade a novos clientes do mercado escocês, ambos determinativos do aumento das necessidades de produção da sua empresa, ou se há apenas uma intensificação extraordinária da actividade da R. que, pela sua singularidade e transitoriedade, acarreta um aumento temporário e excepcional das suas necessidades produtivas mas não justifica a admissão de um trabalhador por tempo indeterminado, sendo que apenas nesta segunda hipótese se justificaria a contratação a termo nos termos da alínea f), do n.º 2 do artigo 140.º do Código do Trabalho por haver um “[a]créscimo excepcional da actividade da empresa”.

O invocado aumento de encomendas do mercado escocês, na sua vacuidade, será ainda susceptível de justificar a existência de um “acréscimo” da actividade de produção, é certo, mas nada mais, designadamente não denotando que esse aumento seja “temporário” como constitui pressuposto do n.º 1 do artigo 140.º e, muito menos, “excepcional”, como exige a invocada alínea f) do n.º 2 do mesmo preceito, não permitindo ao tribunal efectuar um juízo de adequação da justificação invocada face à hipótese legal e à duração estipulada para o contrato[4].”

Também sufragamos este juízo decisório e a fundamentação para tanto desenvolvida.
Efectivamente, é notoriamente vaga a razão invocada no contrato que foi celebrado em 30 de Janeiro com termo para o dia 29 de Julho de 2013, pois o acréscimo temporário de produção no estabelecimento industrial, secção “Capsulagem” para que o trabalhador foi contratado, decorrente do aumento de encomendas de rolhas do mercado escocês, conforme previsto na alínea f) do numero 2 do art.º 140º do CT “Acréscimo excepcional da actividade da empresa”, deveria ter sido suportada em factos que a atestassem e que permitissem a sua sindicabilidade.

Por isso, socorrendo-se a empresa das fórmulas genéricas da lei, com uma referência muito vaga a um alegado aumento de encomendas do mercado escocês, sem qualquer concretização desta situação, não podemos concluir pela verificação dos requisitos da alínea f) do n.º 2 do artigo 140.º do Código do Trabalho, pois não é possível sindicá-la, nem é possível estabelecer qualquer relação entre a justificação invocada e o termo estipulado.

E o mesmo se diga relativamente à justificação constante da renovação do contrato por mais 12 meses, pois é igualmente vago e genérico dizer-se que foi para fazer face ao acréscimo temporário de produção no estabelecimento industrial, para que o trabalhador foi contratado, decorrente do aumento de encomendas de rolhas “capsuladas” do mercado Britânico e de que não há garantias de continuidade, situação esta que ocorrerá temporariamente, verificando-se a necessidade temporária deste trabalhador na secção “Acabamentos Mecânicos”, conforme previsto na alínea f), do nº 2 e também do nº 1 do Código do Trabalho, aprovado pela Lei nº 7/2009, de 12 de Fevereiro (“Acréscimo excepcional da actividade da empresa”).
 

Efectivamente, além de se tratar duma menção vaga, genérica e sem qualquer concretização, também não se percebe a alusão que é feita a um aumento de encomendas de rolhas capsuladas provindo do mercado britânico, quando se apurou que o mercado escocês é que é para a R o mais importante e o único verdadeiramente relevante, e no que respeita ao Reino Unido (também designado comummente de “Grã-Bretanha”), a Inglaterra, Irlanda do Norte e o País de Gales constituem mercados sem expressão ou significado para a actividade da recorrente.

Donde termos de concluir que quer o motivo justificativo aposto ao contrato inicial, quer a razão invocada para a sua renovação por mais 12 meses, não estão alicerçados em factos que permitam a sua sindicabilidade e a verificação externa da conformidade da situação invocada com a hipótese legal mencionada no contrato. Além disso, também não permite a conformação e adequação da justificação invocada com a duração estipulada.
Por isso, a falta de concretização do motivo justificativo, seja pelo recurso às fórmulas legais contidas nas alíneas do n.º 2 do art. 140.º do Código do Trabalho, seja pelo recurso a expressões vagas, genéricas ou imprecisas, acarreta a invalidade do termo acordado, tendo que se considerar que o contrato foi celebrado por tempo indeterminado, conforme se decidiu.
Temos assim de concluir pela improcedência do recurso nesta parte.

3.4----

Quanto à remissão abdicativa:

Conforme resulta do facto 20, por acordo datado do dia 29.7.2014, A. e R. liquidaram contas entre si em relação ao contrato de trabalho que então cessava, mediante o pagamento pela R ao A da importância de 2.769,10 euros, que este recebeu, declarando que nada mais tinha a receber da R, fosse a que título fosse.

Pretende a recorrente que esta declaração constitui uma transacção, nos termos do artigo 1250° do CC, integrando uma renúncia abdicativa, nos termos do artigo 863° do CC, situação que configurando uma excepção peremptória expressamente invocada, provoca a total improcedência da acção.

O recorrido contrapõe que o alegado "acordo" deverá ser qualificado como um mero documento de quitação, nos termos do artigo 787º/2 do CC, e não como contrato de remissão (artigos 863º/2 e seg. do CC), pois do seu teor e das circunstâncias em que foi assinado, nada demonstra que que quisesse renunciar à impugnação da validade do contrato a termo.

Tendo a Relação entendido que tal declaração não integra uma remissão abdicativa, é contra tal juízo que reage a recorrente.

Vejamos então se tem razão.

A remissão é uma das causas de extinção das obrigações, para além do cumprimento, assumindo natureza contratual conforme resulta expressamente do nº 1 do artigo 863º do CC, donde resulta que o credor pode remitir a dívida por contrato com o devedor.

Assim a remissão duma dívida traduz-se numa renúncia manifestada pelo credor à prestação devida pelo devedor, tendo esta declaração a virtualidade de extinguir a obrigação desde que se verifique a aceitação do devedor, ainda que esta possa ser tácita, conforme prevê o artigo 234º do C.C.

Por isso e conforme sustenta Antunes Varela, (in ‘Das Obrigações em Geral’, 7ª ed., II vol., p. 247 ss.), “a remissão constitui a renúncia do credor ao direito de exigir a prestação, feita com a aquiescência da contraparte, necessitando de revestir a forma de contrato, quer se trate de remissão donativa, quer de remissão puramente abdicativa”.

Assim sendo, para ocorrer a remissão é fundamental que a declaração negocial tenha precisamente carácter remissivo, ou seja, que com ela a parte credora declare, sem margem para dúvidas, que renuncia à prestação em dívida pelo devedor.

O direito laboral prevê esta forma de extinção das obrigações resultantes dum contrato de trabalho ou da sua cessação, nomeadamente no artigo 349º do CT (2009) a que correspondia o disposto nos artigos 393º e 394º do CT (2003).

Assim, por expressa previsão da norma, trabalhador e empregador poderão fazer cessar o contrato de trabalho através dum acordo, que deverá revestir a forma escrita (349º/2), devendo constar do documento a data da produção dos seus efeitos (nº 3), e podendo para além disso as partes acordar numa compensação pecuniária de natureza global para o trabalhador, presumindo-se então que nesta compensação foram incluídos e liquidados todos os créditos devidos ao trabalhador à data da cessação do contrato ou exigíveis por força desta cessação (nº 5).

O acordo celebrado neste caso poderá integrar uma remissão abdicativa do trabalhador. Também nas situações de despedimento colectivo o recebimento da totalidade da compensação devida pelo empregador faz presumir a aceitação do despedimento, que só poderá ser impugnado se o trabalhador entregar ou colocar à disposição do empregador a totalidade da compensação recebida, conforme resulta dos nºs 4 e 5 do artigo 366º do CT, doutrina que também é aplicável ao despedimento por extinção do posto de trabalho e por inadaptação do trabalhador, conforme estabelecem os artigos 372º e 379º, nº 1 do mesmo compêndio legal.

Assim, nestes casos a aceitação do despedimento pelo trabalhador por falta de devolução da compensação recebida implicará a renúncia à sua impugnação e aos direitos decorrentes da sua ilicitude.

Quanto aos demais casos, tudo se resume em apurar se a declaração do trabalhador, nos termos em que se mostra elaborada, assume carácter remissivo, ou seja, se podemos concluir da mesma que ele quis renunciar a impugnar judicialmente a validade do termo aposto ao contrato e a reclamar os direitos daí emergentes.

Por isso, temos de apurar se a parte credora declarou que renuncia aos direitos que veio reclamar nestes autos, afastando definitivamente da sua esfera jurídica os instrumentos de tutela do seu interesse que a lei lhe conferia, conforme acentua Antunes Varela, “Das obrigações em geral”, pgª 243, 2º volume, 7ª edição.

Na verdade, tratando-se dum contrato de remissão, este constitui um negócio jurídico bilateral que pressupõe um conteúdo intelectual (o credor tem que saber que o crédito se mostra insatisfeito) e um conteúdo volitivo (o credor pretende renunciar ao crédito), pelo que a vontade de remitir deverá, de forma concludente, resultar da interpretação da declaração negocial aferida em função do concreto circunstancialismo de cada caso.

Para tanto, e recorrendo aos critérios que o nº 1 do artigo 236º do CC estabelece, a declaração valerá com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante (nº 1).

 

De qualquer forma, a doutrina da impressão do destinatário não pode ser atendida se o declarante não puder razoavelmente contar com esse sentido, conforme resulta da parte final daquele nº 1, o que constitui uma limitação subjectiva ao critério objectivista, impelindo o intérprete à ponderação das circunstâncias de cada caso[5].

Ora, atendendo às circunstâncias em que foi feita a declaração do trabalhador (que com o pagamento da importância de 2.769,10 euros nada mais tinha a receber da R, fosse a que título fosse), não podemos concluir que fosse sua intenção renunciar à faculdade de impugnar a validade do termo que foi aposto ao contrato.

Efectivamente, essa declaração consta do documento de acerto final de contas respeitantes ao contrato que cessava naquela data, dizendo respeito a:

Complemento de acidente de trabalho de que o trabalhador tinha sido vítima ao serviço da recorrente (€ 825,96);

Subsídio de férias (604,71euros);

Proporcionais de subsídio de férias (€ 470,31);

Pagamento de férias não gozadas (€ 893,09);

Proporcional de férias: (€ 470,31);

Compensação Caducidade Contrato (€ 643,89).

Ora, considerando que esta declaração foi subscrita pelo A. no dia 29/07/2014, último dia de vigência do contrato de trabalho, encontrando-se o trabalhador de baixa médica;

Que não ocorreram quaisquer negociações prévias entre a R. e o A. para a cessação do contrato e para o apuramento das quantias recebidas.

Que estes valores constituem os montantes do que legalmente estava em dívida ao trabalhador na perspectiva do contrato a termo que vigorara, não vemos qualquer razão para que o trabalhador, ao receber o que lhe era devido, tivesse que renunciar à faculdade de impugnar a validade do termo aposto ao contrato.

Por outro lado, não tendo havido negociações prévias em que esta questão tivesse sido discutida, nunca a declaratária podia depreender da declaração do trabalhador que fosse sua vontade renunciar à faculdade de impugnar a validade do termo do contrato, tanto mais que nenhuma quantia era paga para o compensar, minimamente que fosse, da renúncia a esse direito.

Pelo exposto, não podemos concluir da declaração do trabalhador que ela tivesse o carácter remissivo que a recorrente propugna, pelo que temos de julgar improcedente esta questão.

3.5----

Quanto aos danos não patrimoniais:

A decisão recorrida considerou razoável e adequado compensar a angústia e preocupação que o recorrente sofreu em consequência do despedimento ilícito de que foi alvo, fixando-lhe um quantum indemnizatório de € 2.000.

Para tanto argumentou que:

“Nesta matéria, ficou provado que o facto de se encontrar desempregado e limitado fisicamente, em consequência do acidente de trabalho que sofreu, causa preocupação e angústia ao A, que tem um filho menor, e a sua mulher encontra-se presentemente desempregada e vive com o subsídio de desemprego, que lhe foi atribuído com efeitos a partir de 2014/10/14, no valor de € 14,74/dia, pelo período de 450 dias (factos 32. a 34.).
É patente que a cessação ilícita de uma relação laboral causa, naturalmente, um abalo na personalidade moral do trabalhador.
Ponto é que os danos patrimoniais causados mereçam, pela gravidade que assumem, a tutela do direito – cfr. artigo 496.º do Código Civil.
No caso específico do A., entendemos que o estado de preocupação e angústia em que ficou por ter ficado desempregado em consequência do despedimento, embora também causados pelo facto de estar fisicamente diminuído em consequência do acidente de trabalho, traduz-se em consequências no seu estado psicológico e anímico que não constituem meros incómodos e se revestem de gravidade sendo, por isso, merecedoras da tutela do direito.
Pelo que deverão ser ressarcidos estes danos causados pelo acto ilícito da R. ora recorrida.”

Sustenta a recorrente que não há fundamento de facto para a condenação em danos não patrimoniais, mas não podemos dar-lhe razão.

Efectivamente, resulta do n.º 1 do artigo 389.º do Código do Trabalho de 2009, que sendo o despedimento declarado ilícito, a entidade empregadora é condenada a indemnizar o trabalhador por todos os danos causados, patrimoniais e não patrimoniais [alínea a)].

Por seu turno, estabelece o n.º 1 do artigo 496.º do Código Civil que na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.

E conforme resulta do n.º 3 do mencionado preceito, a indemnização por danos não patrimoniais será fixada equitativamente, devendo o tribunal considerar as circunstâncias referidas no artigo 494.º do mesmo Código, o qual prevê que, na fixação do valor da indemnização há que ter em conta o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso.

Atento o exposto, e tendo resultado provado que em consequência da situação de desemprego provocado pela denúncia ilícita do contrato de trabalho o trabalhador sofreu preocupação e angústia em relação ao seu futuro, situação agravada pelas limitações físicas resultantes da incapacidade advinda do acidente de trabalho de que tinha sido vítima ao serviço da recorrente, temos de acompanhar a decisão do acórdão que considerou estes danos merecedores de tutela.

 Na verdade, tendo-se tratado dum acidente relativamente grave, pois foi-lhe atribuída uma IPP de 15%, é perfeitamente natural que, com a cessação do contrato, o trabalhado tivesse passado a ver o seu futuro com preocupação, pois com as limitações resultantes desse acidente mais difícil lhe será arranjar novo trabalho compatível com a sua capacidade funcional.

Por outro lado, sendo casado e tendo um filho a seu cargo, a angústia em relação ao futuro é perfeitamente justificada.

Assim sendo, nenhum reparo merece a decisão recorrida nesta parte.

3.6----

No ponto 5.5. do dispositivo, foi a R condenada a pagar ao trabalhador as retribuições (de base), prémio de assiduidade mensal e subsídio de alimentação, vencidas e vincendas desde 25 de Maio de 2015 (conforme rectificação de fls. 256) até ao trânsito em julgado do presente acórdão.

Sustenta a recorrente que não podem ser considerados os valores que pressupõem a efectividade de funções e de serviço, nomeadamente o prémio de assiduidade mensal e o subsídio de alimentação.


Conforme resulta do artigo 389º, nº 1 do Código do Trabalho de 2009, sendo o despedimento declarado ilícito, o empregador é condenado a indemnizar o trabalhador por todos os danos patrimoniais causados.

Por isso, tem o trabalhador direito a receber as retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do Tribunal, conforme advém do seu artigo 390º, nº 1,também chamadas “retribuições intercalares”.
No seu cômputo entendeu a Relação atender à retribuição de base que o trabalhador auferia mensalmente (€ 715,44), ao prémio de assiduidade no montante mensal de € 24,94, e ao subsídio de alimentação no montante diário de € 5,37.
Conforme é jurisprudência pacífica, as retribuições intercalares abrangem todas as prestações que seriam devidas ao trabalhador caso não tivesse ocorrido o despedimento, vendo-se neste sentido os acórdãos deste Supremo Tribunal e desta Secção Social de 15/2/2006, recurso nº 2844/05; de 24/2/2010, recurso nº 333/07.5TTMai-A.S1; e de 17/6/2010, recurso nº 173/07.1TTMAI.S1, dentre muitos outros.
Especificamente, e quanto ao subsídio de alimentação, tem-se entendido que, embora assuma na maior parte dos casos a natureza de prestação regular e periódica, só é considerado retribuição na parte em que excede os montantes pagos a este título, competindo ao trabalhador alegar e provar o valor desse excesso, vendo-se neste sentido os acórdãos deste Supremo Tribunal de 27/5/2010, recurso nº 467/06.3TTCBR.C1.S1.
E por isso, o subsídio de refeição não está incluído nas retribuições intercalares devidas ao trabalhador ilicitamente despedido, salvo na parte em que o valor recebido excede os gastos normais que o trabalhador suporta com a sua alimentação quando vai trabalhar, conforme doutrina do acórdão deste Supremo Tribunal de 1/4/2009, recurso nº 3048/08, desta 4ª Secção.
      
Assim sendo, o subsídio de alimentação auferido pelo trabalhador não deve incluir-se no cômputo das retribuições intercalares, procedendo a revista nesta parte.

3.7----

A recorrente impugna também a decisão recorrida na parte em que incluiu o prémio de assiduidade no cômputo das retribuições intercalares devidas ao trabalhador, alegando para tanto que se trata duma prestação que pressupõe a efectividade do serviço.
Vem provado que à data da cessação do contrato de trabalho o recorrido auferia € 24,94 de prémio de assiduidade mensal.
No entanto, e conforme doutrina advinda do acórdão deste Supremo Tribunal de 18 de Janeiro de 2012, no processo nº 1947/08.1TTLSB.L1.S1, trata-se dum incentivo pecuniário que visa combater o absentismo e premiar a assiduidade do trabalhador.
Por isso, reveste-se de natureza notoriamente aleatória e ocasional, não integrando a retribuição do trabalhador.
E nesta linha, não pode o mesmo ser considerado no cômputo das retribuições intercalares, procedendo também a revista nesta parte.     

Em suma: procede a revista apenas na parte em que se ordenou que no cômputo das retribuições intercalares se atenda ao subsídio de alimentação e ao prémio de assiduidade auferidos pelo trabalhador, revogando-se o acórdão recorrido quanto a estes pontos. 

4----

Termos em que se acorda em conceder parcialmente a revista, revogando-se o acórdão recorrido na parte em que se ordenou que no cômputo das retribuições intercalares se atenda ao subsídio de alimentação e ao prémio de assiduidade auferidos pelo trabalhador, e mantendo-se quanto ao mais.

As custas da revista ficam a cargo da recorrente na proporção de 8/10; e a cargo do A na proporção de 2/10.

Nas instâncias mantém-se a condenação em custas na proporção do respectivo decaimento.


Anexa-se sumário do acórdão.


Lisboa, 22 de Fevereiro de 2017   


Gonçalves Rocha - Relator


Leones Dantas


Ana Luísa Geraldes

---*---


Sumário

Contrato a termo
Validade
Remissão abdicativa
Danos não patrimoniais
Retribuições intercalares
Subsídio de alimentação
Prémio de assiduidade

I Para que se possa afirmar a validade do termo resolutivo aposto ao contrato é necessário que se explicitem no seu texto os factos que possam reconduzir ao motivo justificativo indicado e que tais factos tenham correspondência com a realidade.

II - A invocação no contrato de um “aumento de encomendas do mercado escocês”, sem mais qualquer concretização, constitui uma justificação genérica e vaga que não permite ao tribunal efectuar um juízo de adequação da justificação à hipótese legal e à duração estipulada para o contrato.

III – Considera-se celebrado por tempo indeterminado o contrato a termo e a sua renovação por período deferente da duração inicial, quando o seu texto não contém factos concretizadores dos acréscimos temporários de trabalho que nele foram invocados.

IV – A declaração de “nada mais ter a receber” do empregador “seja a que título for”, constante de um “acordo” assinado pelo trabalhador no dia em que cessou o contrato a termo que vigorara, não consubstancia uma remissão abdicativa se o trabalhador ao efectuá-la apenas estava a receber as quantias legalmente devidas na perspectiva do contrato a termo que vigorara, pois não tendo havido negociações prévias em que a questão da renúncia a tal impugnação tivesse sido discutida, não se pode depreender da declaração do trabalhador que fosse sua vontade renunciar à faculdade de impugnar a validade do termo do contrato, tanto mais que nenhuma quantia lhe era paga para o compensar, minimamente que fosse, da renúncia a esse direito.

V- Conforme resulta do n.º 1 do artigo 496.º do Código Civil na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.

VI- Tendo resultado provado que em consequência da situação de desemprego provocado pela denúncia ilícita do contrato de trabalho o trabalhador sofreu preocupação e angústia em relação ao seu futuro, situação agravada pelas limitações físicas resultantes da IPP de 15% resultante dum acidente de trabalho sofrido ao serviço da empregadora, justifica-se a atribuição duma compensação por danos não patrimoniais que foi fixada em 2 000 euros.

VII- Sendo o despedimento declarado ilícito tem o trabalhador direito a receber as retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do Tribunal, abrangendo as retribuições intercalares todas as prestações que seriam devidas ao trabalhador caso não tivesse ocorrido o despedimento.

VIII- O subsídio de refeição não está incluído nas retribuições intercalares devidas ao trabalhador ilicitamente despedido, se ele não alegou nem provou o valor que excede os gastos normais que o trabalhador suporta com a sua alimentação quando vai trabalhar.
IX- Constituindo o prémio de assiduidade um incentivo pecuniário que visa combater o absentismo e premiar a assiduidade do trabalhador, a sua atribuição reveste natureza notoriamente aleatória e ocasional, não podendo por isso ser considerado no cômputo das retribuições intercalares devidas ao trabalhador ilicitamente despedido.     

Processo n.º 2236/15.0T8AVR.P1.S1

4.ª Secção

Revista

Data do acórdão – 22/2/2017

Gonçalves Rocha
Leones Dantas
Ana Luísa Geraldes

_______________________________________________________
[1] - ‘Direito do Trabalho’, 13.ª Edição, pg. 319.
[2] No mesmo sentido vejam-se os acórdãos desta Secção Social de 14-4-2010, recurso n.º 977/06.2TTCBR.C1.S1; e o Acórdão de 24 de Fevereiro de 2015, Processo nº 178/12.0TTCLD.L1.S1.
[3]  Neste sentido veja-se Júlio Gomes, Direito do Trabalho, Vol. I, Coimbra Editora, 599.
[4] Vide Monteiro Fernandes in Direito do Trabalho, 13.ª edição, Coimbra, 2006, p. 319.
[5] Vide Carlos Alberto da Mota Pinto, in teoria geral do Direito Civil, 4.ª edição por António Pinto Monteiro e Paulo Mota Pinto, 2.ª reimpressão, Coimbra, 2012, p.444 e Joana Vasconcelos, in ob. citada, p 316.