Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
3145/17.4T8LRA.C1.S2
Nº Convencional: 6ª SECÇÃO
Relator: ANA PAULA BOULAROT
Descritores: NOMEAÇÃO JUDICIAL DE ADMINISTRADOR
ANULAÇÃO DE DELIBERAÇÃO SOCIAL
DESIGNAÇÃO DE ADMINISTRADORES
Data do Acordão: 06/18/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO DAS SOCIEDADES – SOCIEDADES ANÓNIMAS / ADMINISTRAÇÃO, FISCALIZAÇÃO E SECRETÁRIO DA SOCIEDADE / CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO / DESIGNAÇÃO.
Doutrina:
- Menezes Cordeiro, Código Das Sociedades Comerciais Anotado, 2.ª edição, p. 1056;
- Paulo Olavo Cunha, Direito Das Sociedades Comerciais, 6.ª edição, p. 837 e 838.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DAS SOCIEDADES COMERCIAIS (CSC): - ARTIGO 391.º, N.ºS 1 E 4.
Sumário :

I Os administradores são eleitos pela assembleia geral, nos termos do artigo 391º, nº1 do CSComerciais, e mantêm-se em funções até nova eleição/designação.

II Qualquer acionista poderá requerer a nomeação judicial de um administrador casotenham decorrido mais de 180 dias sob o termo do prazo pelo qual foram eleitos os anteriores, sem que a sociedade tenha efectuado nova eleição.

III Se a eleição tiver sido efectuada, mas a respectiva deliberação for objecto de impugnação, não há lugar a qualquer nomeação judicial de administrador, porquanto a anterior administração mantém-se em funções nos termos do nº4 do artigo 391º do CSComerciais.

(APB)

Decisão Texto Integral:

ACORDAM, NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

I C, requereu, ao abrigo do n.º 1 do artigo 394.º do Código das Sociedades Comerciais, a nomeação judicial de administrador para a sociedade, SA.

Justificou o pedido alegando, em síntese, o seguinte:

1.           O mandato do conselho de administração da requerida terminou em 31 de Dezembro de 2014;

2.           Na assembleia geral anual da requerida realizada em 29 de Junho de 2015 foram eleitos os órgãos sociais para o triénio de 2015 a 2017, mas a execução da deliberação que elegeu os órgãos sociais foi suspensa por decisão já transitada em julgado, proferida no âmbito da providência de suspensão de deliberações sociais que correu termos sob o n.º …;

3.            A acção de anulação da referida deliberação, que corre termos no juízo de comércio de Leiria sob o n.º…, encontra-se a aguardar sentença.

O requerente indicou P para o cargo de administrador.

Citado em representação da requerida, em virtude de ser o representante do fiscal único da sociedade, L & Associados, SROC, J, pronunciou-se contra a nomeação de administrador, alegando em síntese:

1.            Que o pedido configurava abuso de direito;

2.           Que após o termo do mandato dos órgãos sociais para o triénio 2012-2014 foram validamente designados novos órgãos sociais por deliberação da assembleia geral de 29 de Junho de 2015, apesar de o requerente ter impugnado tal deliberação;

3.           Que ainda não há decisão transitada em julgado sobre a validade das deliberações tomadas na assembleia de 29 de Junho de 2015;

4.           Que desde a sua eleição em 29 de Junho de 2015 até ao trânsito em julgado da decisão do STJ sobre a suspensão da execução da deliberação os órgãos mantiveram-se em plenas funções;

5.            Que é desnecessária a nomeação judicial de um administrador e que a nomeação comporta riscos e prejuízos para a sociedade.

foi proferida sentença que, julgando procedente o pedido, decidiu nomear G, como administrador da sociedade S, S.A., até que se procedesse à eleição do conselho de administração da referida sociedade ou fosse julgado improcedente o pedido de nulidade/anulabilidade das deliberações tomadas, designadamente a eleição dos administradores para o triénio 2015/2018, por decisão transitada em julgado.

A requerida não se conformou com a sentença e interpôs o presente recurso de apelação, o qual veio a ser julgado procedente com a revogação da sentença recorrida.

Irresignado com este desfecho recorre agora o Autor, de Revista, apresentando as seguintes conclusões:

- Por sentença proferida no proc. N° … foi julgado procedente o pedido de nomeação judicial de administrador judicial para a Ré e sua consequente nomeação;

- Porque se encontra sem nomeação de órgãos sociais há já bem mais de 180 dias;

- Assim era quando a referida deliberação de nomeação se encontrava suspensa;

- Assim é no presente, em que a deliberação já foi declarada nula, e, portanto, inválida e inapta a produzir os seus efeitos;

- Ao não ter ordenado a produção de prova documental complementar, designadamente providenciando saber se havia ou não já transitado em julgado a decisão relativa à ação principal de anulação, o Venerando Tribunal violou o art. 662° CPC;

- O acórdão recorrido violou também o art. 674°, n° 3 do CPC;

- Por ter ofendido um documento autêntico e com força probatória plena;

- Deve a decisão sobre a matéria de facto ser alterada;

- Julgando-se novamente a causa, nos termos e para os efeitos do art. 682°, n°3 CPC;

- Ainda que assim não se considere, deve o Colendo Tribunal concluir pelo preenchimento dos requisitos exigidos pelo art. 394°, n° 1 CSC;

- Mesmo que se parta do pressuposto factual (incorreto) de que a deliberação de nomeação de novo conselho de administração se encontrava unicamente suspensa na sua execução (e não havendo assim sido decidida da sua invalidade), sempre deverá ser equiparada para efeitos de aplicação do art. 394° CSC a não ter havido qualquer deliberação de eleição válida;

- Pois que, encontrando-se suspensa a deliberação, não está apta a produzir os efeitos a que se destina;

- E é assim por existir um "risco sério" de que a deliberação seja (como foi) inválida;

- Não havendo razão para diferenciar as circunstâncias;

- Se assim não fosse, e citando o douto acórdão de que ora se recorre, então "a consequência é a mesma";

- Não revestindo a procedência da providência cautelar de suspensão da deliberação social qualquer utilidade prática;

- O que não se concede;

- Nestes termos, deve o douto acórdão recorrido ser revogado na parte em que julga procedente a inexistência de fundamento para nomeação de administrador judicial à Ré e substituída por decisão que julgue improcedente o recurso de apelação apresentado.

Nas suas contra alegações a Recorrida pugna pela manutenção do julgado.

II O único problema que se põe no âmbito do presente recurso é o de saber se se mostra violado o disposto no artigo 394º do CSComerciais.

As instâncias declararam como assentes os seguintes factos:

1. A Requerida é uma sociedade anónima constituída em 1969, com o capital social de 1.000.000,00€ (um milhão de euros) e que se tem dedicado, pelo menos, à actividade de extracção de argilas, areias, caulinos e outros inertes, conforme certidão permanente junta como documento nº 1 a fls.10 verso a 14.

2. O mandato para o triénio de 2012-2014 dos membros Conselho de Administração (“CA”) composto por três membros, sendo que tais cargos ocupados pelos também accionistas L C, J C e A C terminou a 31 de Dezembro de 2014, conforme certidão permanente junta como documento nº 1 a fls.10 verso a 14.

3. Os referidos membros, na prática, têm-se mantido em funções.

4. O Requerente foi designado para o cargo de Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Requerida, sendo secretariado pelo Ilustre Advogado - Dr. H.

5. A Requerida tem como fiscal único a sociedade “L–, SROC” representada pelo Dr. J conforme certidão permanente junta como documento nº 1 a fls.10 verso a 14.

6. O Requerente é titular de 59.950 acções no valor de 5,00 € (cinco euros) cada, o que perfaz uma participação no valor nominal de € 299.750,00 que corresponde a 29,975% do capital social da Requerida.

7. O remanescente da participação social da Requerida (cerca de 70% do capital social) está distribuído da seguinte forma: a) L C - titular de 69.900 acções, o que perfaz uma participação no valor nominal de € 349.500,00, correspondente a 34,95% do capital social – Presidente do Conselho de Administração; b) J C - titular de 70.000 acções, o que perfaz uma participação no valor nominal de € 350.000,00, correspondente a 35% do capital social - Vogal do Conselho de Administração; c) A C - titular de 100 acções, o que perfaz uma participação no valor nominal de € 500,00, correspondente a 0,05 % do capital social– Vogal do Conselho de Administração; d) A M – titular de 50 acções, o que perfaz uma participação no valor nominal de € 250,00, correspondente a 0,025 % do capital social.

8. No dia 29 de Junho de 2015, realizou-se assembleia geral anual da Requerida, com a seguinte ordem de trabalhos: Ponto um: Deliberar sobre relatório de gestão e as contas do exercício; Ponto dois: Deliberar sobre a proposta de aplicação de resultados; Ponto três: Apreciação geral da administração e da fiscalização da Sociedade; Ponto quatro: Eleger os órgãos sociais para o triénio 2015 a 2017, conforme Acta nº 90 junta a fls. 678 a 682 e que se dá por integralmente reproduzida.

9. Na sequência da AG de 29/06/2015, foram tomadas deliberações entre as quais a eleição de órgãos sociais para o triénio 2015/2018, conforme Acta nº 90 junta a fls. 678 a 682 e que se dá por integralmente reproduzida.

10. O Requerente intentou Providência Cautelar especificada de Suspensão de Deliberação Social, processo n.º …., que correu os seus termos no Tribunal Judicial da Comarca de Leiria – Inst. Central – 1ª Sec. Comércio – J1.

11. A referida providência cautelar foi decretada procedente pelo Venerando Tribunal da Relação de Coimbra, cuja decisão já transitou em julgado e cujo Acórdão se encontra junto como documento nº 2 a fls.15 a 33, que se considera integralmente reproduzido, suspendendo-se as deliberações tomadas na AG de 29/06/2015, entre as quais a eleição de órgãos sociais.

12. A acção principal de anulação das referidas deliberações sociais intentada pelo Accionista C M contra a sociedade S corre os seus termos no Juízo de Comércio de Leiria - Juiz 2, processo n.º …., sendo que à data a decisão não transitou em julgado, encontrando-se em recurso para o Venerando Tribunal da Relação de Coimbra.

13. Encontram-se juntas a fls.34 e 35 missivas do requerente para L C e J C datadas de 03 de Março de 2017, que se consideram integralmente reproduzidas, em que em conclusão diz: “gostaria que me informassem da V/ disponibilidade para discutirmos e tentarmos o consenso na constituição do conselho de administração da S”.

14. Encontra-se junta a fls. 36 uma convocatória para Assembleia Geral Anual da Sociedade requerida subscrita por J P (director financeiro da Requerida) na qualidade de Presidente da Mesa e que se considera integralmente reproduzida, e que havia sido eleito na AG de 29/06/2015, cujas deliberações se encontram suspensas.

15. Encontra-se junta a fls.37 e 38 carta, datada de 17 de Maio de 2017, do Requerente ao conselho de administração em funções à data em que, além do mais que se considera reproduzido, solicitou que dessem sem efeito a referida convocatória, e, tendo em conta tal missiva, foi dada sem efeito a convocatória para a Assembleia Geral.

16. O requerente intentou processo cautelar tendente à anulação da referida convocatória (de que posteriormente veio a desistir) – conforme fls.39 a 49.

17. O Requerente subscrevendo na qualidade de Presidente da mesa, procedeu à publicação de uma convocatória para a AG anual da Requerida, para o dia 19 de Junho de 2017, pelas 10h00 horas, no Cartório Notarial de …, com a seguinte ordem de trabalhos: «Ponto Um: Deliberar sobre o relatório de gestão e as contas do exercício da sociedade findo em 31 de Dezembro de 2016; Ponto Dois: Deliberar sobre a proposta de aplicação de resultados da sociedade relativos ao exercício findo em 31 de Dezembro de 2016; Ponto Três: Proceder à apreciação geral da Administração e Fiscalização da sociedade; Ponto Quatro: Eleição de corpos sociais para o mandato a terminar em 31 de Dezembro de 2019; Ponto Cinco: Deliberar sobre outros assuntos de interesse para a sociedade.», conforme documento junto aos autos, com a petição inicial como documento nº 8 a fls. 49 verso e 50.

18. Nesse mesmo documento encontra-se designada a segunda data para a realização da Assembleia, nomeadamente, para o dia 5 de Julho de 2017, pelas 10h00 no Cartório Notarial da Batalha.

19. Em 16 de Junho de 2017 o requerente C M procedeu à correcção da convocatória tendo alterado a segunda data da Assembleia Geral para o dia 10 de Julho de 2017, pelas 10h00 no Cartório Notarial de …, conforme documento nº 7 junto com a contestação e que se dá por integralmente reproduzido.

20. A convocatória referida foi publicada no site https://publicacoes.mj.pt/Pesquisa.aspx e, ainda, enviada por correio registado com aviso de recepção para o domicílio dos accionistas –cfr. fls.50 verso a 56;

21. As referidas cartas foram devolvidas com a indicação “objecto não reclamado”-cfr. 53, 54 e 56.

22. Os restantes accionistas e membros, à data, do CA alegaram que o Requerente não tinha poderes para convocar a assembleia geral da Requerida, porquanto o seu mandato havia terminado em 2014.

23. No dia 19/06/2017 no cartório notarial de …, o único presente foi o accionista Requerente – conforme lista de presenças junta como doc. n.º 10 a fls.56 verso.

24. Na referida assembleia geral, o Requerente, no âmbito do ponto três da ordem de trabalhos, deliberou a destituição de todos os membros do conselho de administração invocando justa causa-cfr. ata da Assembleia junta como doc. n.º 11 a fls. 57 a 59, que se considera integralmente reproduzida.

25. A referida ata foi levada a registo (provisório) pela notária Dra. S – que secretariou a Assembleia.

26. Ficaram por deliberar e apreciar, na primeira reunião da Assembleia Geral (19 de Junho), os restantes pontos da ordem de trabalhos, pelo facto de o requerente na qualidade de Presidente da Mesa da Assembleia ter considerado como não verificado o quórum necessário.

27. Na segunda data (10 de Julho), encontrava-se presente: o Requerente, na qualidade de Presidente da Mesa e accionista (representado pelo seu mandatário), o accionista J C e o accionista L C (representado pela sua mandatária) – conforme lista de presenças junta como doc. n.º 12 a fls. 60.

28. Encontra-se junta a fls. 61 a 62 denominada “ACTA AVULSA”, que se considera integralmente reproduzida onde consta, que “Constatada a ausência do secretário da sociedade, pelo representante do accionista foi dito o seguinte: Face à ausência nesta Assembleia Geral do Secretário da Sociedade, venho requerer ao Presidente da Mesa a substituição do mesmo pela Notária deste Cartório Notarial, nos termos do artigo 63º, nº 6, do CSC. O presidente da Mesa colocou, então, a deliberação do assunto à votação pela Assembleia a votação, tendo obtido apenas o voto favorável do accionista C M e desfavorável dos demais, razão pela qual não é aceite a substituição requerida”.

29. A deliberação social referida no ponto 24.º não foi objecto de procedimento cautelar, mas acção de anulação de deliberação social, cujo processo corre seus termos no Juízo de Comércio de Leiria - Juiz 3, proc. n.º …-cfr. certidão de fls.578 a 649.

30. Os referidos accionistas L C e J C enviaram missiva datada de 19 de Abril de 2017, para J P na qualidade de Presidente da Mesa da Assembleia (resultado de deliberação suspensa) para a convocação da Assembleia Geral Anual (cfr. fls.704 verso a 705).

31. Desde o término do referido mandato no fim de 2014, pelo menos, os referidos accionistas apresentaram uma lista de titulares candidatos aos órgãos sociais

32. Os referidos accionistas responderam, em 17 de Março de 2017, à missiva que lhe foi enviada pelo Requerente e referida em 13.º nos termos vertidos a fls. 691 verso e 692, informando da disponibilidade para tentar ultrapassar a questão em crise, mediante certos pressupostos, a saber: “1- Retirada imediata de todas as acções judiciais que se encontram pendentes, intentadas pelo accionista C M contra a S, S.A. 2- Encetar uma base de negociação para a cedência das suas acções, como foi informado em 2014; 3- Numa fase inicial, dados os naturais constrangimentos pessoais que esta situação tem implicado, serem os contactos preparatórios efectuados entre os representantes das partes, aceitando e sugerindo os actuais mandatários judiciais.”

33. No âmbito do Processo de Inquérito Judicial, intentado pelo requerente contra a , que correu termos sob o nº …, na 1ª Secção do Comércio da Comarca de Leiria, conforme sentença transitada junta a fls. 693 verso a 704 e que se dá por integralmente reproduzida, o Tribunal julgou improcedente o Inquérito Judicial requerido.

34. O Tribunal considerou provado que “O autor está “especialmente relacionado” com outras sociedades concorrentes da S, SA, como seja a S e C cuja «propriedade de facto» lhe é atribuída pelos demais operadores do mercado, não só pelas relações familiares e de amizade com os membros das respectivas administrações, mas acima de tudo por se ter apresentado pública e comercialmente associado à actividade destas sociedades concorrentes, especialmente na angariação de clientela fidelizada à S, SA, a par da sociedade A M, S.A., de que é presidente do conselho de administração”

35. Os demais accionistas tiveram conhecimento, pelo menos, no dia 10 de Julho de 2017, que a sociedade S, S.A. teria reunido e deliberado em Assembleia Geral no dia 19 de Junho de 2017, no Cartório Notarial de …

36. Os accionistas L e J C, em resposta, enviaram carta, em 06-06-2017, no âmbito da qual informam o requerente, C M que não tem legitimidade para a convocação da referida Assembleia Geral, tendo em conta a cessação do seu mandato em 31-12-2014 (cfr. fls.708 a 709).

37. Encontra-se registado pela Ap.3/20150616 alterações ao contrato social-artigos alterados: 5º, nº 1, 11º, 12º, nº 3 e 15º, nº 1, alínea a).

38. Encontra-se junto aos autos a fls. 715 a 718 documento denominado “PACTO SOCIAL”.

39. Na Assembleia Geral aludida em 24.º, impugnada judicialmente, o accionista C M deliberou a destituição de todos os membros do Conselho de Administração da S, SA tendo por fundamento, o facto de o Conselho de Administração não ter procedido à elaboração e submissão aos órgãos competentes do relatório de gestão, das contas do exercício e demais documentos de prestação de contas referente ao exercício de 2016, até 31 de Maio de 2017, bem como pelo facto de o Conselho de Administração se ter recusado disponibilizar ao accionista C M o relatório de gestão, as contas bem como a certificação legal de contas elaborada pelo Fiscal Único.

40. Encontra-se junto aos autos relatório de gestão referente ao exercício de 2016, até 31 de Maio de 2017 certificado pelo ROC e que se considera integralmente reproduzido (cfr. fls.719 verso a 734).

41. Pelo menos, por missiva enviada pelo Sr. C M, na qualidade de Presidente da Mesa da Assembleia Geral datada de 12 de Junho de 2017, recepcionada em 19-06-2017, pelas 15h43 o Conselho de Administração foi interpelado para enviar a documentação preparatória da Assembleia Geral, conforme documento de fls.735 verso a 737 que se dá por integralmente reproduzido.

42. Os administradores em funções são pessoas idóneas, com capacidade de negócio.

43. O accionista L C, exerce o cargo de gestor da sociedade, desde 1989 e o accionista J C, administrador desde 1994 (Cfr. certidão permanente junta como documento nº 1 a fls.10 verso a 14).

44. São como sempre foram reconhecidos como gestores, com bons conhecimentos na área de gestão empresarial e na área funcional concreta de exploração de inertes, nomeadamente, argilas, areias e caulinos.

45. A S, SA é reconhecida como uma empresa de referência no sector.

46. Juntamente com as suas respectivas esposas, uma delas também accionista e administradora (AC), prestaram a sua garantia pessoal, através de aval de operações financeiras, junto de instituições bancárias e fornecedores.

47. Tem ocorrido na sociedade requerida uma redução do passivo e das responsabilidades vencidas junto do Banco de Portugal, com a melhoria das ratios de autonomia financeira, de liquidez total, de solvabilidade e de EBITDA com melhoria do crédito mal parado e dos créditos incobráveis.

48. Nas bases de dados económico-financeiras, nomeadamente, na D & B, a requerida está classificada como verde, tendo tido uma variação positiva de 16 para 83, em 100, conforme documento de fls.737 verso a 738 que se dá por integralmente reproduzido.

49. A requerida S tem desenvolvido actividade de transportes em retorno de mercadorias de terceiros e que representará, pelo menos, 18% do volume de facturação da Requerida.

50. O accionista, J C é titular de certificado de capacidade profissional para transportes rodoviários de mercadorias, nacionais ou internacionais, conforme documento de fls.738 verso que se dá por reproduzido.

51. Desde 2003 até Setembro de 2014, sempre o Requerente, por si ou pessoa designado, partilhou o Conselho de Administração com os administradores L e J C.

52. Pela Ap. 3/201220405 10:27:23UTC foi inscrita a recondução de membros dos órgãos sociais, tendo o prazo de duração do mandato, o triénio 2012/2014.

 53.º Pela Ap. 1/20150629 16:59:09UTC foi inscrita (provisório por natureza) designação de membros dos órgãos sociais, tendo o prazo de duração do mandato, o triénio 2015/2018-data da deliberação-29-06-2015.

53.Pela Ap. 22/20170619 16:47:32UTC foi inscrita (provisório por natureza) cessação de funções (destituição) de membros dos órgãos sociais e secretário-data da deliberação-19-06-2017.

Não se provou:

1. Que os accionistas J C, L C e A C soubessem que o Acórdão que decretou a suspensão das referidas deliberações sociais se encontrava transitado em julgado aquando da publicação de convocatória para a assembleia geral anual da Requerida

2. Que os presentes autos sejam uma tentativa de pressão e desestabilização da S, S.A e dos seus órgãos sociais, no âmbito de uma estratégia do Requerente em tentar monopolizar através de si e de sociedades comerciais concorrentes por si controladas, directa e indirectamente, o mercado de fornecimento das argilas e caulinos, para seu exclusivo proveito pessoal.

3. Que para a assembleia referida tenham sido convocados o Fiscal Único e o Secretário da Mesa.

4. Que o relatório de gestão referido tenha estado sempre disponível para consulta, nas instalações da S e que o requerente soubesse;

5. Que o accionista C M condicionasse a gestão da S (situação que aconteceu até ao mês de Setembro de 2014, data em que o administrador por si indicado renunciou ao cargo de Administrador), pois não era independente e beneficiava o grupo económico A M, S.A.

Insurge-se o Recorrente contra a decisão plasmada no Aresto impugnado porquanto na sua tese foi violado o artigo 394° CSComerciais e o artigo 662° CPCivil, já que a deliberação onde teve lugar a nomeação de administradores foi declarada nula pelo Tribunal da Relação, decisão essa que já se encontrava transitada em julgado aquando da prolação do acórdão ora recorrido, facto que o Tribunal não podia ignorar, quer face à alegação do ora Recorrente quer ao abrigo dos seus poderes instrutórios.

Vejamos, então.

O Acórdão recorrido sustentou a sua decisão na seguinte linha argumentativa:

«[O] segundo fundamento do recurso é constituída pela alegação de que o fundamento que serviu para justificar a nomeação judicial de administrador não se encontra preenchido.

Para bem se perceber a linha argumentativa da recorrente, importa recordar as razões, de facto e de direito, que levaram a sentença sob recurso a nomear um administrador para a requerida.

Em sede de facto, teve em consideração a seguinte realidade:

1. Que a requerida era uma sociedade anónima cuja administração era exercida por um conselho de administração;

2. Que estava inscrita no registo comercial a recondução dos membros dos órgãos sociais para o triénio 2012/2014;

3. Que a designação dos órgãos sociais para o triénio 2015/2017 encontrava-se suspensa por força de decisão cautelar transitada em julgado e que estava pendente acção de anulação da respectiva deliberação.

Com base nesta realidade, a sentença afirmou que se encontravam preenchidos os pressupostos para que fosse nomeado um administrador judicial até se proceder à eleição do conselho de administração ou até que se julgasse improcedente o pedido de nulidade/anulabilidade das deliberações incluindo tal eleição, conforme o disposto na parte final do n.º 1 do artigo 394.º do Código das Sociedades Comerciais.

A recorrente contestou esta fundamentação com base na seguinte linha argumentativa:

1. Que foram eleitos órgãos sociais para o triénio 2015-2017, em 29 de Junho de 2015;

2. Que apesar de tal deliberação de nomeação se encontrar suspensa por acórdão transitado em julgado, até à data da prolação da sentença recorrida ainda não havia sido proferida acórdão transitado em julgado, que considerasse nulas ou anuladas as deliberações tomadas na assembleia de 29 de Junho de 2015;

3. Que estando suspensa a deliberação de eleição dos órgãos sociais de 29 de Junho de 2015 e enquanto se aguardasse pela resolução judicial do litígio, mantinham-se em funções os titulares do conselho de administração em funções à data daquela deliberação.

Como se vê pela exposição efectuada, a recorrente não põe causa a realidade em que assentou a decisão recorrida. Com o que ela não concorda é com o entendimento de que essa realidade integre a previsão da norma que serviu de fundamento à decisão recorrida [2.ª parte do n.º 1 do artigo 394.º do Código das Sociedades Comerciais]. Com efeito:

1. A decisão recorrida tem implícito o entendimento de que o tribunal pode nomear um administrador à sociedade não só quando tenham decorrido mais de 180 dias sobre o termo do prazo por que foram eleitos os administradores sem se ter efectuado nova eleição, mas também quando, embora se tenha efectuado, a deliberação que aprovou a nova eleição tenha sido suspensa na sua eficácia por decisão transitada em julgado, proferida em procedimento de suspensão de deliberações sociais;

2. O recurso labora com base na interpretação de que não há lugar à nomeação judicial de administrador quando se tenha efectuado nova eleição do conselho de administração dentro do prazo de 180 dias após o termo do prazo por que foram eleitos anteriores administradores, ainda que a deliberação que tenha elegido o novo conselho tenha sido suspensa na sua execução por decisão transitada em julgado, proferida em procedimento de suspensão de deliberações sociais; nesta hipótese há que aguardar pelo trânsito em julgado decisão que se pronunciar sobre a validade da deliberação.

Sendo esta, no essencial, a divergência da recorrente em relação à sentença, a resposta à questão suscitada por esta divergência passa necessariamente pela interpretação do n.º 1 do artigo 394.º do CSC, na parte em que dispõe que qualquer accionista pode requerer a nomeação judicial de um administrador quando tenham decorrido mais de 180 dias sobre o termo do prazo por que foram eleitos os administradores sem se ter efectuado nova eleição.

A norma acabada de transcrever está relacionada com o princípio de que os administradores são designados por um período limitado (n.º 3 do artigo 391.º do CSC) e com o princípio de que, “embora designados por prazo certo, os administradores mantêm-se em funções até nova designação, sem prejuízo do disposto nos artigos 394.º…” (n.º 4 do mesmo preceito).

O n.º 1 do artigo 394.º introduz uma limitação à permanência dos administradores no cargo depois de terminado o respectivo mandato, dizendo que, quando se mantiverem em funções por mais de 180 dias sobre o termo do prazo por que foram eleitos sem se ter efectuado nova eleição, qualquer accionista pode requerer a nomeação judicial de administrador, até se proceder à eleição daquele conselho.

A hipótese a que se refere a lei é, pois, a de a assembleia geral anual posterior ao termo do mandato não proceder, no prazo de 180 dias a contar de tal termo, à eleição de novos administradores [eleição prevista na alínea d) do n.º 1 do artigo 376.º do CSC].

A siituação em causa na presente acção é diferente da prevista na lei. Com efeito, na presente acção, teve lugar a eleição de novo conselho de administração dentro dos 180 dias posteriores ao termo do mandato do conselho eleito para o triénio 2012-2014. Sucedeu apenas que a deliberação que aprovou a eleição do novo conselho de administração foi suspensa na sua execução por decisão judicial, já transitada em julgado, proferida em procedimento de suspensão de deliberação social.

Embora a execução da deliberação que aprovou a eleição do novo conselho de administração tenha sido suspensa por existir a probabilidade séria de ser contrária à lei [n.º 1 do artigo 380.º combinado com o n.º 1 do artigo 368.º, ambos do CPC], enquanto não houver decisão sobre a invalidade da eleição, não há fundamento legal para equiparar a eleição “suspeita” a uma eleição não efectuada. 

Não se ignora que tanto a suspensão da execução da deliberação como a não eleição de novo conselho tem como consequência a manutenção em funções do anterior conselho de administração.

Apesar de a consequência ser a mesma, não é de sujeitar a situação dos autos ao regime do n.º 1 do artigo 394.º do CSC visto que o objectivo dele não é o de evitar que os administradores se mantenham em funções por mais de 180 dias depois de terminado o respectivo mandato, qualquer que seja a causa por que se mantêm em funções.

Resulta do n.º 1 do artigo 394.º, quer quando menciona, como única causa da manutenção em funções, o facto de não se ter efectuado novo eleição, quer quando estabelece, como prazo para o exercício das funções do administrador nomeado judicialmente, a eleição do novo conselho de administração, que o que se quer prevenir com a solução nele exposta é que um conselho de administração se mantença em funções por um período dilatado por falta de eleição do novo conselho de administração. A solução visa promover a eleição do novo conselho de administração.

Interpretado o n.º 1 do artigo 394.º do CSC com o sentido e alcance expostos, é de concluir que, no caso, não assistia ao autor a faculdade de requerer a nomeação judicial de um administrador.».

A interpretação encetada pelo segundo grau no que tange ao disposto no artigo 394º, nº1 do CSComerciais, não se nos oferece qualquer dúvida, sendo este o sentido e alcance único da norma, cfr Menezes Cordeiro, Código Das Sociedades Comerciais Anotado, 2ª edição, 1056; Paulo Olavo Cunha, Direito Das Sociedades Comerciais, 6ª edição, 837/838.

O apontado ínsito legal é claro preciso e conciso, prevendo que, além do mais se possa requerer a nomeação judicial de um administrador, «[q]uando tenham, de corrido mais de 180 dias sobre o termo do prazo por que foram eleitos os administradores sem se ter efectuado nova eleição (…)».

Na espécie, a questão suscitada, transcende aquela previsão normativa, nela não encontrando qualquer respaldo, porquanto, sendo os administradores designados pela assembleia geral, nos termos do artigo 391º, nº1 do CSComerciais, o que foi feito para o triénio 2015/2017, na altura da propositura da acção, embora a deliberação social que elegeu os novos administradores estivesse suspensa, não se encontrava a sociedade Requerida, aqui Recorrente, numa situação de ausência de cumprimento da última parte do preceituado no artigo 394º, nº1 do mesmo diploma, isto é, que estivesse há mais de cento e oitenta dias sem se ter efectuado a nova eleição do conselho de administração: a nova eleição foi efectuada, mas a deliberação subjacente à mesma, foi objecto de impugnação, o que implicou que os administradores eleitos para o triénio anterior, que haviam cessado funções, continuaram a desempenhá-las, nos termos do nº4 do artigo 391º do CSComerciais.

Quer dizer, o Recorrente ao intentar a presente acção fez tábua rasa daqueloutra que visava a nulidade da deliberação tomada, sendo que, a decisão da mesma, implicará a repetição da eleição ocorrida, mantendo-se em funções até à nova designação, os administradores cessantes.

A eventual decisão de nulidade da deliberação ocorrida na Assembleia Geral de 29 de Junho de 2015, onde se tomaram deliberações várias, entre as quais a eleição de órgãos sociais para o triénio 2015/2018, conforme Acta nº 90 junta a fls. 678 a 682, suscitada na acção que  corre os seus termos no Juízo de Comércio de Leiria - Juiz 2, processo n.º 1253/16.8T8LRA, em nada interfere com a decisão produzida nesta acção, não se verificando a situação prevenida no artigo 674º, nº3 do CPCivil, uma vez que o Tribunal recorrido não considerou provado (ou não provado) qualquer facto essencial, para cuja prova a Lei impusesse um específico meio probatório tabelado.

As situações em tela são manifestamente diversas: nesta acção o Recorrente pretende que seja nomeado um administrador para a sociedade Requerida, por esta não ter encetado as démarches legalmente impostas para a eleição dos seus corpos sociais nos cento e oitenta dias subsequentes ao termo do mandato dos anteriores, o que se viu ter sido feito (embora impugnado); naqueloutra, o aqui Recorrente, ali Autor, pôs em causa a bondade da deliberação social tomada pela aqui Recorrida, ali Ré, na eleição dos corpos sociais para o triénio 2015/2017, o que se mostra resolvido nessa acção, devendo ser a mesma objecto de cumprimento, com a renovação da Assembleia Geral e nova deliberação social, procedendo-se à eleição dos corpos sociais.

Improcedem, in totum, as conclusões de recurso.

III Destarte, nega-se a Revista mantendo-se a decisão plasmada no Acórdão impugnado.

Custas pelo Recorrente.

Lisboa, 18 de Junho de 2019

Ana Paula Boularot (Relatora)

Pinto de Almeida

José Rainho