Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
046791
Nº Convencional: JSTJ00012724
Relator: ALBUQUERQUE BARATA
Descritores: EXPROPRIAÇÃO POR UTILIDADE PUBLICA
AVALIAÇÃO
RENDIMENTO
UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Nº do Documento: SJ19321220046791
Data do Acordão: 12/20/1932
Votação: MAIORIA COM 4 VOT VENC
Referência de Publicação: DG IªS 04-01-1933 ; COL OF ANO31 PAG320 ; RLJ ANO 64,298
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PARA O PLENO
Decisão: UNIFORMIZADA JURISPRUDÊNCIA
Indicações Eventuais: ASSENTO 13/1932
Área Temática: DIR ADM.
Legislação Nacional: L DE 1912/07/26 ARTIGO 16 PAR3 PAR6 PAR8 PAR9 A.
L 671 DE 1917/04/06 ARTIGO 5.
L 1631 DE 1924/07/16 ARTIGO 1 PAR9.
D 21287 DE 1932/05/26 ARTIGO 74.
CPC876 ARTIGO 281.
D 12353 DE 1926/09/22 ARTIGO 66.
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO STJ DE 1928/12/21 IN COL OF ANO27 N10 PAG318.
ACÓRDÃO STJ DE 1931/10/30 IN COL OF ANO31 N8 PAG215.
Sumário :
O rendimento efectivo, a que se refere o paragrafo 6 do artigo 16 da Lei de 26 de Julho de 1912 e o artigo 5 da
Lei n. 671, de 6 de Abril de 1917, deve ser determinado pelos peritos em harmonia com as bases legais e as correcções previstas no paragrafo 9 do citado artigo 16.
Decisão Texto Integral:
Acordam os do Conselho no Supremo Tribunal de Justiça, em secções reunidas:

A e sua mulher, B e outros recorreram, no prazo legal, para o tribunal pleno do acordão proferido por este Supremo Tribunal de Justiça em 24 de Novembro de 1931, o qual se ve a folha ..., e em que foi decidido que nos processos de expropriação por utilidade publica, quando a intervenção dos peritos seja necessaria, estes, nos termos do paragrafo 6 do artigo 16 da lei de 26 de Julho de 1912, regulada pelo artigo 5 da lei n. 671, de 6 de Abril de 1917, tem de tomar como base da avaliação o "rendimento efectivo" do predio a avaliar, ou seja a renda legal, isto e, a que o senhorio recebe dos inquilinos, sem aplicação de qualquer dos correctivos indicados na alinea a) do paragrafo 9 do artigo 16 da citada lei de 1912.


A aplicação de tais correctivos, segundo o acordão em recurso, tem lugar so quando a base para a avaliação seja o rendimento colectavel e não o rendimento efectivo, que e o caso dos autos.


Alegaram os recorrentes que sobre este mesmo ponto de direito ja este Supremo Tribunal tinha decidido em sentido diametralmente oposto, nos acordãos de 21 de Dezembro de 1928 e 30 de Outubro de 1931, publicados na Colecção Oficial, respectivamente no ano 27, n. 10, paginas 318 a 320, e ano 31, ns. 8 e 9, paginas 215 e 216, pois neles se julgou que o rendimento efectivo a atender não era o que resultava da renda legal mantida pelas leis do inquilinato, mas sim o proveniente duma justa renda ou rendimento em regime de livre locação.


Os recorrentes, na sua minuta, desenvolveram os fundamentos do recurso e concluiram pela revogação do acordão recorrido, sendo integralmente confirmada, quer para os donos do predio, quer para os seus inquilinos comerciais e industriais, a sentença de 1 instancia, proferida em 8 de Agosto de 1930, a qual decorre a folha....


A recorrida não contraminutou.


E manifesta a contradição existente entre o julgado no acordão em recurso e o decidido nos acordãos anteriores, citados pelos recorrentes, e sobre o mesmo ponto de direito, pelo que o recurso e competente (artigo 66 do decreto n. 2353, de 22 de Setembro de 1926).


Ponderado, discutido tudo, e


Considerando que, como no acordão em recurso se reconhece, na hipotese dos autos a intervenção dos peritos era necessaria, por o rendimento colectavel do predio a expropriar ser inferior ao seu "rendimento efectivo";


Considerando que, assim, tinha de se atender ao determinado no paragrafo 6 do artigo 16 da lei de 26 de Julho de 1912 e ainda ao preceito do artigo 5 da lei de 6 de Abril de 1917, que se limitou a definir o que se deve entender por rendimento efectivo;


Considerando que este artigo, referindo-se a rendimento em media dos ultimos tres anos, não aludiu ao rendimento colectavel, nem podia aludir, sob pena de se considerar modificada a disposição citada (lei de 26 de Julho de 1912), o que o acordão recorrido contesta;


Considerando que a lei de 1912, no paragrafo 9 do artigo
16, estabelece as correcções a que, nas avaliações, os peritos tem de atender e, evidentemente, essas correcções são aplicaveis em regra e não somente quando a base para a avaliação seja o rendimento colectavel, como no acordão recorrido se diz;


Considerando que se o contrario se entendesse seria, na hipotese dos autos, incompreensivel a intervenção dos peritos, porque tudo se limitaria, para a fixação do rendimento efectivo, a uma elementar operação aritmetica, da competencia do contador;


Considerando que as leis que regulam o problema grave do inquilinato, cuja acuidade se vai modificando, procuraram e procuram garantir o direito de habitação, mas sem terem em vista destruir os principios basilares do direito de propriedade;


Considerando que bem se compreende que o legislador, perante o grave risco de perturbações sociais, restringisse, temporariamente, o exercicio de um direito dos proprietarios, exercicio que podia levar a abusos perigosos; mas,


Considerando que justificação não teria que ele, estando em vigor os principios fundamentais que garantem o direito de propriedade, permitisse expropriações injustas, dando-se aos expropriados menos que o valor das cousas que legitimamente lhes pertencem;


Considerando que bem procederam os peritos atendendo, na sua avaliação, ao que estabelece o citado paragrafo 9 do artigo 16 citado na lei de 26 de Julho; e


Considerando que bem procedeu o juiz baseando-se no resultado da avaliação;
Por tudo, dando provimento ao recurso, revogam o acordão recorrido, para vigorar, em tudo, a sentença da 1 instancia, e, concluindo nos termos do artigo 66 do decreto n. 12353, de 22 de Setembro de 1926, estabelecem o seguinte assento:


O rendimento efectivo, a que se refere o paragrafo 6 do artigo 16 da lei de 26 de Julho de 1912 e o artigo 5 da lei n. 671, de 6 de Abril de 1917, deve ser determinado pelos peritos em harmonia com as bases legais e as correcções previstas no paragrafo 9 do citado artigo 16.


Lisboa, 20 de Dezembro de 1932

Albuquerque Barata (Visconde de Olivã)

Amaral Pereira-
Ponces de Carvalho
Mendes Arnaut
J. Soares
Silva Monteiro
B. Veiga
E. Santos
E. Arez
A. Garção -
C.Gonçalves (votei a doutrina dos acordãos de 30 de Outubro de 1931, 28 de Junho e 8 de Novembro de 1932)

A. Brandão (se antes de o artigo 33 do decreto n. 21694 determinar que "nos tribunais superiores as declarações de voto serão sempre fundamentadas" tantas vezes o fiz, com mais razão agora a importante materia de propriedade deve justificar o meu de vencido em acordão do tribunal pleno, nos termos do artigo 1176 do Codigo do Processo Civil (decreto n. 21287), lei vigente.

Dispõe o paragrafo 6 do artigo 16 da lei de 26 de Julho de 1912:
"A base da avaliação do predio sera o seu rendimento, sem redução de encargos de qualquer natureza. O rendimento sera o que consta da matriz predial, excepto se os peritos averiguarem que este e inferior ao rendimento efectivo; neste caso averiguar-se-a o rendimento efectivo, fazendo-se oficiosamente comunicação do facto a repartição competente".
Veio depois o artigo 5 da lei n. 671 determinar que este rendimento efectivo do paragrafo 6 transcrito era o da media dos ultimos tres anos. Averiguou-se que o rendimento do predio constante da matriz predial era inferior ao efectivo, e consequentemente tinha de se averiguar qual era a media do seu rendimento efectivo nos ultimos tres anos, para servir de base a avaliação.


O mesmo paragrafo 6 fala em "os peritos averiguarem" - "neste caso averiguar-se-a o rendimento efectivo", e não em que os peritos procederão a avaliação do predio, o que e diferente.


No proprio artigo 16, quando o legislador quis que a avaliação fosse livre, sem sujeição ao rendimento efectivo, determinou-o expressamente, com clareza, e não mandou averiguar esse rendimento, ou descobri-lo segundo quaisquer elementos legitimos de informação.


Assim e que o seu paragrafo 8 dispõe:


"Se o predio não estiver inscrito, sera avaliado pela forma legal do processo;...".
Nesta hipotese, que não e a dos autos, em que o legislador mandou avaliar e não averiguar o rendimento, e que os peritos tem a liberdade de proceder a avaliação pela forma legal do processo, ou seja a lei geral, sem sujeição a medida do rendimento efectivo dos ultimos tres anos.


Rendimento efectivo e o que, na realidade, se recebe, e não um ideal, ou que possivelmente se podera receber em circunstancias economicas diversas, se não houver restrições a propriedade.


O juiz, indo alem dos quesitos propostos pelos proprios expropriados, propos aos peritos o seguinte:


"Qual o valor do predio se o senhorio ou dono pudesse livremente da-lo de arrendamento?"


Como eles respondessem que esse valor era de 758018 escudos, nesta quantia fixou a indemnização por sentença, mantida por outra em embargos.
Tal quesito foi ofensivo da lei, que manda averiguar, para servir de base a avaliação, o rendimento efectivo, ou seja o que se recebeu, e não o que se poderia receber em regime de liberdade de rendas.
Da doutrina do assento resulta nada mais nem menos do que esta incongruencia e falta de justiça relativa:


Se o proprietario vender um predio urbano por seu consenso, particularmente, estando cativo a rendas impostas por lei, decerto recebera por ele um preço menor, vista a restrição a propriedade, do que se a transferencia lhe for imposta por utilidade publica.
Melhor se compreenderia que o preço fosse menor no caso forçado de interesse publico.


O acordão recorrido negou provimento ao recurso contra o acordão da Relação que, atendendo ao rendimento efectivo, fixou legalmente a indemnização aos proprietarios em 376509 escudos, alterando a referida sentença.
Cumprindo-me somente interpretar e aplicar a lei, votei que agora tambem se negasse provimento ao recurso para o tribunal pleno, sem ir manter a, para mim, ilegal doutrina da sentença, que pelo criterio de propriedade liberta de rendas impostas por lei, embora isto não suceda, fixou a indemnização em 753018 escudos.


Expõe o paragrafo 9 do artigo 16 da citada lei de 1912:
"avaliação do predio sobre a base do rendimento colectavel sofrera as seguintes correcções:".


Estabeleceu o assento que este paragrafo 9 e aplicavel ao caso de o rendimento efectivo servir de base para a avaliação, quando dos seus proprios e expressos termos se ve que so se aplicam as correcções quando a avaliação tem por base o rendimento colectavel, e ja se viu que este não e de atender em hipoteses como a dos autos, em que e inferior ao efectivo.


Leia-se o paragrafo 6 atras transcrito.


Mas ha mais ainda.


Depois de ser vencido, sustentei que mesmo perante o criterio do acordão não era devida esta indemnização de sentença.


Eu explico:


O paragrafo 3 do artigo 16 da citada lei de 1912 dispõe:


"A tentativa de conciliação far-se-a indicando o expropriante quanto oferece, e o expropriado quanto pede de indemnização; dentro destes limites procurara o juiz a conciliação, consignando-se no auto a oferta, o pedido e o resultado da tentativa".

Corresponde a materia deste auto a petição inicial da acção e, se não fosse isso, não teria o legislador necessidade de nele mandar inserir o pedido.
No auto de tentativa de conciliação, a folha... do apenso, os expropriados pediram 600000 escudos de valor real, fora o estimativo, e pelo inquilino comercial João Antonio Iglesias Rodrigues foi declarado que achava suficiente a indemnização oferecida, visto não ter esperanças de obter mais, e por isso a aceitava."
Apesar disto, mantem-se a sentença que deu aos expropriados mais de 600000 escudos pedidos, pois o valor estimativo não e atendivel por lei, a qual tambem deu muito mais ao referido inquilino do que a quantia de 6220 escudos e 69 centavos, que a expropriante lhe ofereceu, e ele aceitou.
Isto depois de na sentença, a folha... do apenso, se ter declarado que nenhum inquilino comercial aceitou a indemnização oferecida, quando aquele a aceitou, com ela concordou, vindo, apesar disto, contestar os embargos da expropriante, e não tendo sido posto fora deles, como devia, por ter aceitado a oferecida.
Desde o paragrafo 9 do artigo 1 da lei n. 1631, de 16 de Julho de 1924, cujo preceito passou para as tabelas dos decretos n. 10291, artigo 74, e n. 13978, artigo 103, em nenhum processo os interessados podem obter o reconhecimento de direitos ou creditos superior ao valor declarado da causa.
O mesmo preceituou o artigo 74 do decreto n. 21287.
Por esta orientação legislativa e porque o artigo 281 do Codigo do Processo Civil não permite condenar em mais do que o pedido, e os expropriados na tentativa de conciliação,so pediram 600000 esc. concordando o inquilino referido com o oferecido, 6220 escudos e 69 centavos, sustentei, mesmo dado provimento ao recurso, embora contra o meu voto, que mais lhes não devia ser fixado de indemnização.
E pelo exposto, salvo o sempre devido respeito pela opinião contraria, o que nem mesmo era essencial declarar, por outra não ser a presunção, entendo não ser feliz a doutrina do acordão, mostrando quam dificil e legislar ou o que em materia de assentos a isso tem uma certa equivalencia. - J. Alfredo Rodrigues (vencido) - A. Campos (vencido) - Vieira Ribeiro (vencido) - Alexandre de Aragão (vencido).