Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
2180/18.0T8OAZ.P1.S1
Nº Convencional: 6.ª SECÇÃO
Relator: ANTÓNIO BARATEIRO MARTINS
Descritores: ALEGAÇÕES DE RECURSO
CONTRA-ALEGAÇÕES
AMPLIAÇÃO DO ÂMBITO DO RECURSO
FALTA DE CONCLUSÕES
DESPACHO DE APERFEIÇOAMENTO
Data do Acordão: 09/22/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA (COMÉRCIO)
Decisão: CONCEDIDA A REVISTA.
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO
Sumário :
Tendo-se concluído a contra alegação a dizer que, “prevenindo a necessidade da sua apreciação a título subsidiário, se peticiona a ampliação do objeto do recurso nos seguintes termos: Ser declarada a anulabilidade da deliberação impugnada por violação do direito à informação e por violação do disposto no art. 11.º do pacto social da R.”, não se cumpre as especificações constantes do art. 639.º, n.º 2, do CPC, porém, não permite que se diga e considere que se está perante a situação mais grave, de total omissão de conclusões (prevista no art. 641.º, n.º 1, al. b), do CPC), não podendo assim de imediato rejeitar-se a ampliação da apelação, devendo antes, nos termos do art. 639.º, n.º 3, do CPC, convidar-se a parte a aperfeiçoar as conclusões.
Decisão Texto Integral:



Proc. 2.180/18.0T8OAZ.P1.S1

6.ª Secção

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

I – Relatório

AA, residente na Rua …., em …, na qualidade de cabeça-de-casal da herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de BB, intentou ação declarativa comum contra SUPRA – Sociedade Unida de Produtos Aglomerados Ld.ª, com sede no Lugar ..., ..., e contra CC, residente Av.ª …, …., pedindo que seja declarada nula, ou, se assim não se entender, anulada, a deliberação tomada na Assembleia Geral da primeira R. no dia 8 de Maio de 2018, na qual se decidiu a amortização da quota do sócio BB.

Alegou para tanto e em resumo:

— A sociedade Supra – Sociedade de Produtos Aglomerados, Ld.ª foi constituída por dois sócios (e irmãos): BB, entretanto falecido, e cuja herança se encontra representada nos autos pela A., e o segundo R., CC;

— No dia 8 de Maio de 2018 realizou-se assembleia geral da primeira R., na qual foi deliberado, por unanimidade do sócio com direito de voto (o sócio CC), amortizar a quota que pertencia ao sócio falecido, pelo valor que corresponderá ao valor médio que resulta dos três últimos balanços aprovados, efetuando-se o pagamento em três prestações semestrais e iguais, sem vencimento de juros, representadas por letras aceites pela sociedade e avalizadas pelo seu gerente, vencendo-se a primeira das prestações em causa seis meses depois de deliberada a amortização;

— Deliberação que, segundo a A., é inválida, pelas seguintes razões:

– A convocatória não contém o ponto de ordem de trabalhos sob a forma de cálculo do valor da contrapartida da amortização, o respetivo valor e forma de pagamento aos titulares da quota amortizanda;

– A deliberação foi tomada sem ter sido precedida do fornecimento dos elementos mínimos de informação solicitados pelos herdeiros de BB, concretamente identificados sob o artigo 36.º, da petição inicial;

– A própria deliberação não contém o valor pelo qual é efetuada a amortização da quota de BB, aludindo exclusivamente a uma fórmula de cálculo, cujo valor líquido não se mostra possível apurar já que não existem contas aprovadas da primeira R. desde 2006;

– O segundo R., CC, votou sozinho na deliberação de amortização da quota do falecido BB, impedindo que os herdeiros deste último votassem, invocando conflito de interesses, o que evidencia um voto abusivo e ainda uma atuação em abuso de direito, já que BB atuou no seu próprio interesse, com o intuito de ficar único titular das quotas societárias da R., afastando a participação dos herdeiros do sócio-gerente falecido e em detrimento do interesse social da Supra – Sociedade Unida de Produtos Aglomerados, Ld.ª;

– Os conflitos existentes em vida do sócio BB e CC, com a pendência de várias ações judiciais um contra o outro, impedem CC de votar sozinho essa deliberação, já que existe um conflito de interesses da sua parte.

Contestaram os RR., sustentando, em suma, que não ocorreu qualquer violação do direito à informação, tendo, quer o procedimento de convocação, quer a própria deliberação em assembleia geral, observado todos os requisitos formais para a sua realização, contendo a deliberação o valor da contrapartida devida pela amortização da quota (valor este que é determinável), bem como a forma de pagamento, e que o voto de CC não é abusivo já que não existe qualquer conflito de interesses entre este e a sociedade Supra – Sociedade de Produtos Aglomerados, Ld.ª, para além de que os herdeiros de BB se encontram impedidos de votar sobre a opção de amortização da quota.

Foi realizada a audiência prévia, proferido despacho saneador – que considerou a instância totalmente regular, estado em que se mantém – e enunciados o objeto do litígio e fixados os temas da prova.

Instruído o processo e realizada a audiência de julgamento, a Exma. Juíza proferiu sentença, em que julgou a ação procedente, anulando a deliberação, tomada em AG da R. realizada em 8 de maio de 2018, de amortizar a quota do sócio falecido BB.

Inconformados com tal decisão, interpuseram recurso de apelação os RR., recurso que, por Acórdão da Relação ….. de 16/06/2020, foi julgado procedente, “revogando-se a decisão recorrida e absolvendo-se os apelantes do pedido”.

Inconformada, interpõe agora a A. o presente recurso de revista, visando a revogação do acórdão da Relação e a sua substituição por decisão que repristine o sentenciado em 1.ª Instância.

Terminou a sua alegação, entre outras, com as seguintes conclusões:

(…)

1. A ampliação a título subsidiário do âmbito do recurso nos termos do disposto no art. 636 nº 1 CPC não constitui um recurso, pois não constitui uma impugnação da sentença recorrida nos termos do disposto no artigo 627.º nº 1 e 2 CPC e porque não está sujeita ao pagamento de taxa de justiça pelo facto de ter sido pedida.

2. A ampliação não é um novo recurso, mas sim uma completude do recurso interposto pela parte vencida.

3. Se o aresto impugnado entendesse ser necessário que a ampliação do objeto do recurso terminasse com conclusões, deveria ter efetuado convite ao requerente da ampliação para completar as conclusões da alegação de recurso do recorrente e parte vendida porque a ampliação integra-se nesse recurso e não constitui um recurso novo – art. 639º nº 3 CPC.4. Assim, o Acórdão recorrido fez incorretas interpretação e aplicação dos art. 633º, 636º nº 1, 639º nº 3 e 641º nº 2 alínea b) CPC e deveria apreciar e decidir a ampliação do recurso apresentada a título subsidiário pela aqui Recorrente e que era Recorrida na Apelação.

(…)”

As RR. responderam, sustentando, em síntese, que o acórdão recorrido deve ser mantido.

Terminaram a sua alegação com, entre outras, as seguintes conclusões:

“ (…)

A) A ampliação do objeto de recurso requerida pela Recorrente na 1ª instância deve permanecer rejeitada, como decidiu o Tribunal a quo, pois não apresenta conclusões violando o disposto no n.º 2 do artigo 637.º do CPC.

B) Como defende Abrantes Geraldes, em comentário ao artigo 636.º do CPC, a parte que requer a ampliação do recurso tem o ónus de suscitar as questões de facto ou de direito que foram resolvidas a seu desfavor na decisão recorrida, cabendo-lhe revelar a sua vontade de forma inequívoca nas contra alegações, maxime das respetivas conclusões, tendo sido também esse o entendimento do STJ em acórdão de 17.11.2016 na vigência do novo CPC (Processo n.º 4622/09.6TTLSB.L1.S1).

C) Não cabe o aperfeiçoamento do requerimento de ampliação do objeto de recurso pois tal não é admissível à luz do n.º 3 do artigo 639.º do CPC e ademais porque, em bom rigor, quando há total omissão de apresentação de conclusões nada há a aperfeiçoar devendo ocorrer rejeição do requerido, como resulta da alínea b) do n.º 2 do artigo 641.º do CPC.

(…)”

Obtidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.

*

II – Fundamentação de Facto

II – A Factos Provados

1.A R. Supra – Sociedade Unida de Produtos Aglomerados, Ld.ª é uma sociedade comercial por quotas, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de ..., sob o número único de matrícula e de contribuinte 000, constituída em 30.07.1986, com registo efetuado pela ap. 9 de 2.10.1986, com sede em Lugar ..., ..., ..., que se dedica ao fabrico de produtos aglomerados de cortiça, com o capital social de € 105.000,00 (cento e cinco mil euros), dividido por duas quotas, cada uma no valor nominal de € 52.500,00 (cinquenta e dois mil e quinhentos euros), uma pertencente a BB e a outra a CC, vinculando-se a sociedade pela assinatura de dois gerentes, tendo sido designados, à data da constituição da sociedade, como gerentes, os únicos sócios BB e CC.

2. Consta do pacto social da R. Supra – Sociedade Unida de Produtos Aglomerados, Ld.ª, sob o ponto Décimo Primeiro, que “Em caso de falecimento ou interdição de qualquer sócio, a sociedade poderá amortizar a respetiva quota, nos termos do artigo décimo, ou continuar com os sócios sobrevivos ou capazes e os herdeiros do sócio falecido ou o representante legal do incapaz.

Parágrafo Primeiro - Se os herdeiros de sócio falecido ou o representante legal de incapaz não quiserem continuar na sociedade, poderão exigir desta a liquidação da respetiva quota de demais direitos, nos termos do artigo décimo. (…).”

3. Segundo o ponto Décimo do pacto social da R. “No caso de falência de algum dos sócios, penhora ou adjudicação de qualquer quota a outrem, em processo de execução, ou por qualquer outro meio em que se opere a transmissão forçada da quota, a sociedade fica com o direito de a adquirir ou amortizar, pelo valor médio que resultar dos últimos três balanços aprovados. O pagamento far-se-á em três prestações semestrais e iguais, sem vencimento de juros, representadas por letras aceites pela sociedade e avalizadas pelos seus gerentes, vencendo-se a primeira destas prestações seis meses depois de deliberada a amortização ou aquisição. A amortização ou aquisição consideram-se realizadas logo que tenham sido deliberadas pela sociedade, pelo que os sócios cujas quotas tenham sido adquiridas ou amortizadas terão a haver da sociedade o preço de uma ou outra coisa.”

4. Em 25.06.2007, BB instaurou ação judicial contra CC, pedindo a destituição deste do cargo de gerente, por justa causa, da Supra – Sociedade Unida de Produtos Aglomerados, Ld.ª, a qual correu termos no Tribunal Judicial …. sob o n.º 4329/07….. e veio a ser julgada improcedente por sentença proferida em 18.11.2011.

5. Em 16.08.2010, CC intentou procedimento cautelar contra Supra – Sociedade Unida de Produtos Aglomerados, Ld.ª, pedindo a suspensão da deliberação social tomada na Assembleia Geral de 06.08.2010, que assenta na propositura de uma ação da sociedade, ao abrigo dos n.ºs 1 e 2 do artigo 75.º, do CSC.

6. Em 16.04.2016, CC intentou ação judicial contra BB pedindo a suspensão e destituição deste, por justa causa, da qualidade de gerente da sociedade da Supra – Sociedade Unida de Produtos Aglomerados, Ld.ª, e a condenação do mesmo a entregar ao Autor/Requerente as chaves das instalações da sociedade, bem como pediu a sua nomeação para o exercício das funções de gerente único da sociedade, a fim de o mesmo prosseguir o objeto social da sociedade e poder representá-la, sozinho, em todos os atos necessários à prossecução do seu fim.

7. No âmbito do processo supra referido, foi proferida sentença que julgou procedente a providência cautelar e consequentemente suspendeu BB como gerente da sociedade.

8. A decisão referida em 7. foi revogada por decisão proferida em 14.03.2017, transitada em julgado em 03.01.2018, na qual se determinou que BB assumisse de novo a gerência da sociedade Supra – Sociedade Unida de Produtos Aglomerados, Ld.ª, passando esta a obrigar-se com a assinatura dos gerentes BB e CC.

9. Quando assumiu as funções de único gerente, CC despediu os dois filhos deste sócio BB (DD e EE) que eram trabalhadores da sociedade e admitiu, como trabalhador da sociedade, o seu único filho, FF.

10. Em 30.05.2016, BB procedeu ao registo da divisão e cessão da sua quota na sociedade Supra – Sociedade Unida de Produtos Aglomerados, Ld.ª, passando a ser titular da quota no valor nominal de € 50.000,00 e o seu filho EE titular da quota no valor nominal de € 2.500,00.

11. Em 27.06.2016, CC intentou providência cautelar, a qual correu termos sob o n.º 2709/16……, deste Tribunal de Comércio ….., através da qual pediu a suspensão da eficácia do ato de divisão de quota e cessão de quota efetuado por BB, a qual veio a ser julgada procedente por decisão transitada em julgado em 20.03.2018.

12. Em 27.06.2016, CC intentou procedimento cautelar contra a sociedade Supra – Sociedade Unida de Produtos Aglomerados, Ld.ª, pedindo que seja declarada suspensa a deliberação social tomada na Assembleia Geral de 16 de Junho 2016, com todos os seus efeitos.

13. Em 18.07.2016, CC intentou ação judicial contra a sociedade Supra – Sociedade Unida de Produtos Aglomerados, Ld.ª, pedindo se decrete a nulidade ou se anulem as deliberações sociais tomadas no dia 16.06.2016, a qual foi julgada procedente por sentença transitada em julgado em 22.02.2017, que anulou as deliberações tomadas na dita assembleia geral, nomeadamente a destituição do gerente CC.

14. Na assembleia geral da sociedade Supra – Sociedade Unida de Produtos Aglomerados, Ld.ª realizada no dia 23.07.2016, CC, representado por FF, votou contra a aprovação das contas dos exercícios de 2009, 2010, 2011, 2012, 2013, 2014, 2015, o que conduziu à não aprovação das mesmas.

15. Em 19.08.2016, CC intentou ação judicial pedindo que se declarem nulas ou se anulem as deliberações sociais tomadas em 20.07.2016 na sociedade Supra – Sociedade Unida de Produtos Aglomerados, Ld.ª, a qual veio a ser julgada procedente.

16. BB faleceu no dia 11.03.2018, tendo-lhe sucedido como únicos e universais herdeiros a sua mulher, AA, e seus dois filhos, DD e EE, o que foi declarado por Escritura Notarial de Habilitação, celebrada em 20.03.2018, no Cartório da Notária GG.

17. Pela ap. …. de 21.06.2018 foi registada a cessação de funções de gerente de BB por motivo de óbito.

18. O gerente da R. CC enviou a DD carta registada, datada de 23.04.2018, e recebida por este, com o assunto “Convocatória da Assembleia da Sociedade Supra Sociedade Unida de Produtos Aglomerados, Ld.ª, com o seguinte teor: ““Na minha qualidade de gerente da sociedade, venho, nos termos da lei e dos estatutos, convocar os sócios da Supra -Sociedade Unida de Produtos Aglomerados, Ld.ª, pessoa colectiva n.º 000, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de ....  sob o mesmo número, com o capital social de cento e cinco mil euros, para se reunirem em Assembleia Geral, na sede social sita nado Parque Industrial n.º 133, freguesia de ..., concelho de ..., pelas 11:00 horas, do próximo dia 08 de Maio de 2018, com a seguinte ordem de trabalhos:

Ponto único: deliberar, nos termos do artigo 11.° dos estatutos, sobre a amortização da quota pertencente ao sócio BB, em virtude do seu falecimento.

Nos termos da lei, os direitos sociais relativos à quota do sócio falecido devem ser exercidos por um único representante comum.”

19. Em 05.05.2018, a A. remeteu ao gerente CC uma mensagem eletrónica com o assunto “pedido de informação e documentação” com o seguinte teor: “Nos termos do direito à informação previsto no artigo 214.º e seguintes do Código das Sociedades Comerciais, venho pelo presente, enquanto cabeça de casal da herança indivisa do Senhor BB, solicitar que me sejam prestadas, por escrito, durante a próxima segunda-feira (dia 7 de Maio de 2018), as seguintes informações e documentos:

i) Cópia das demonstrações financeiras (Balanço, Demonstração de Resultados, Demonstração de Fluxos de Caixa, Demonstração das alterações nos capitais próprio e notas/anexo) e relatório da gestão referentes aos anos de 2016 e 2017; ii) Balancete geral analítico antes de apuramento de resultados à data de 31 de dezembro de 2016 e 31 de dezembro de 2017;

iii) Balancete geral analítico relativo ao último mês do ano de 2018 com contabilidade encerrada;

iv) Cópia da declaração anual/Informação Empresarial Simplificada relativa ao ano de 2016;

v) Cópia da declaração de rendimentos Modelo 22 relativa ao ano de 2016;

vi) Cópia dos contratos de financiamento bancário, factoring, locação financeira/leasing ou outras formas de financiamento, celebrados nos anos de 2016, 2017 e 2018 até à presente data;

vii) Extratos contabilísticos de todas as contas da contabilidade relativos ao ano de 2016, de 2017 e de 1 de janeiro de 2018 até ao último mês com contabilidade encerrada de 2018;

viii) Informação e documentação relativa a atos de alienação ou oneração de bens ativos da Sociedade (designada mente, imóveis, máquinas e veículos, etc ...) ocorridos desde 1 de janeiro de 2016 até à presente data;

ix) Informação e documentação relativa às ações judiciais pendentes em que a Sociedade é parte;

x) Identificação de todas as contas bancárias (depósitos à ordem, depósitos a prazo, aplicações financeiras e outras) tituladas pela Sociedade e cópia dos respetivos extratos bancários relativos aos meses de dezembro de 2016, dezembro de 2017 e março de 2018;

xi) Identificação de todos os cartões de cR.dito da Sociedade e cópia dos respetivos extratos relativos aos meses de dezembro de 2016, dezembro de 201 e março de 2018;

xii) Procurações, designadamente, forenses, e fim a que se destinaram, subscritas somente por V. Exa.;

xiii) Montante do saldo atual dos suprimentos concedidos por cada sócio à Sociedade ainda não reembolsados aos sócios na presente data;

xiv) Montante dos suprimentos realizados por cada um dos sócios e dos suprimentos reembolsados a cada um dos sócios nos últimos 25 anos;

xv) Listagem dos colaboradores e trabalhadores admitidos e demitidos desde 1 de janeiro de 2016 até à presente data e cópia dos respetivos contratos de trabalho e acordos de cessação, bem como dos recibos relativos às indemnizações pagas, quando aplicável;

xvi) Listagem dos prestadores de serviços contratados desde 1 de janeiro de 2016 até à presente data e cópia dos respetivos contratos de prestação de serviços;

xvii) Listagem dos inventários da sociedade com referência a 31 de dezembro de 2016 e 2017, com detalhe de quantidade e valor por referência;

xviii) Mapa resumo das remunerações processadas (com detalhe por colaborador, por rubrica de remuneração/descontos, por mês) pela Sociedade em 2016, 2017 e em 2018 (até 30 de abril de 2018);

xix) Informação relativa a empréstimos e adiantamentos efetuados pela Sociedade a terceiros, em 2016, 2017 e em 2018 até à presente data;

xx) Cópia do mapa de responsabilidades do Banco de Portugal da Sociedade com referência a 31 de dezembro de 2016, 31 de dezembro de 2017 e 31 de março de 2018;

xxi) Relatório Único relativo ao ano de 2017;

xxii) Certidão predial e matricial dos imóveis detidos pela Sociedade;

xxiii) Mapas oficiais das depreciações e amortizações relativos aos anos de 2016 e 2017;

xxiv) Ficheiros SAFT da contabilidade e da faturação relativos aos anos de 2016, 2017 e 2018 (até ao último mês com contabilidade encerrada).

Procederei ao levantamento pelas 14 horas.”

20. Em resposta à missiva referida supra, CC remeteu à A., em 07.05.2018, mensagem eletrónica com o assunto “Resposta ao Pedido de informação e documentação com data de 04 de maio de 2018”, com o seguinte teor:

“O pedido de informação de V. Exª. foi enviado durante o fim de semana.

Como bem sabe, a SUPRA Sociedade Unida de Produtos Aglomerados, Ld.ª não se encontra em horário de funcionamento aos sábados e domingos, donde decorre que a sua missiva e respetivo conteúdo, ainda que expedida por correio eletrónico, hoje, dia 07 de maio de 2018, entrou efetivamente na esfera de conhecimento da gerência.

Ora, atenta a dimensão do pedido de informação e documentação solicitada que deve, de resto, ser avaliada pela gerência torna absolutamente impossível a reunião e subsequente disponibilização da informação por V. Exª. Solicitada dentro da janela temporal pretendida. Com efeito, a reunião dos vinte e quatro elementos informativos, muitos deles referentes a múltiplos exercícios e aos mais diversos aspetos da atividade da sociedade SUPRA Sociedade Unida de Produtos Aglomerados, Lda, não poderia, nunca, ser concretizada no espaço de tempo que mediou entre o início do horário de funcionamento das instalações da Sociedade e a hora por V. Exª. unilateralmente fixada para o levantamento.

De resto, e como V. Exª. também saberá, se é verdade que o direito à informação do sócio não pode ser recusado sem que para tal existam razões razoáveis, também o seu exercício deve obedecer a critérios de razoabilidade, sob pena de se considerar abusivo.

De todo o modo, e porque a gerência tem intenção de cumprir escrupulosamente o disposto na lei, quanto a esta matéria do direito à informação, comunica-se a V. Exª. que a informação solicitada será disponibilizada o mais rapidamente possível. Logo que se encontre compilada, ser-lhe-á imediatamente comunicada a data em que a mesma lhe poderá ser facultada”.

21. CC nunca entregou à A. ou a qualquer um dos herdeiros de BB, qualquer um dos elementos referidos em 18.

22. No dia 8 de Maio de 2018 realizou-se a assembleia geral da sociedade Supra – Sociedade Unida de Produtos Aglomerados, Ld.ª, na qual estiveram presentes CC, na qualidade de sócio titular da quota no valor nominal de € 52.500,00 e EE, na qualidade de representante comum da quota no valor nominal de € 52.500,00, pertencente em comum e sem determinação de parte ou de direito aos herdeiros do sócio BB.

23. Nessa assembleia geral CC e EE emitiram as declarações de fls. 29 a 32, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

24. Nessa assembleia geral foi deliberado, com o voto do único sócio CC, amortizar a quota do sócio falecido BB pela contrapartida correspondente ao valor médio que resulta dos três últimos balanços aprovados, efetuando-se o pagamento em três prestações semestrais e iguais, sem vencimento de juros, representadas por letras aceites pela Sociedade e avalizadas pelo seu gerente, vencendo-se a primeira das prestações em causa seis meses depois de deliberada a amortização.

25. Na sequência dessa deliberação, CC declarou “que a satisfação da contrapartida da amortização, nos termos atrás referidos, não põe em causa a integridade do capital social, continuando a situação líquida a ser superior à soma do capital e da reserva legal, destarte se cumprindo a exigência do artigo 236.º, n.º 1, do Código das Sociedades Comerciais”.

26. Ao votar do modo referido em 24., CC atuou com o propósito de evitar a transmissão da quota do falecido sócio para os seus herdeiros[1].

27. À data da deliberação encontravam-se unicamente aprovadas e depositadas na Conservatória do Registo Comercial as contas Supra – Sociedade Unida de Produtos Aglomerados, Ld.ª, referentes aos anos/exercícios de 2000 (insc. P.C. 2500 de 19.12.2001), 2004 (insc. P.C. 2632 de 7.12.2005), 2005 (Dep. 113 de 15.12.2006), 2006 (Dep. 4616 de 20.09.2007), 2007 (Dep. 3118 de 1.7.2008) e 2008 (Dep. 1177 de 27.06.2009).

28. O R. CC, por discordar dos atos de gerência do seu irmão, BB, e duvidar da veracidade da situação patrimonial da sociedade Supra – Sociedade Unida de Produtos Aglomerados, Ld.ª, não votava favoravelmente as contas que lhe eram apresentadas, o que conduziu ao referido em 14.

29. Em 11.07.2018 foram depositadas na Conservatória do Registo Comercial as contas da Supra – Sociedade Unida de Produtos Aglomerados, Ld.ª, referentes aos anos de 2017 (Dep. 1306) e 2016 (Dep. 1310).

30. Em 18.09.2018 foram depositadas na Conservatória do Registo Comercial as contas da Supra – Sociedade Unida de Produtos Aglomerados, Ld.ª, referentes aos anos de 2014 (Dep. 3323) e 2015 (Dep. 3324).

31. Em 19.09.2018 foram depositadas na Conservatória do Registo Comercial as contas da Supra – Sociedade Unida de Produtos Aglomerados, Ld.ª, referentes aos anos de 2013 (Dep. 3325), 2012 (Dep. 3326), 2011 (Dep. 3328), 2010 (Dep. 3330) e 2009 (Dep. 3331).

II – B – Factos Não Provados.

Não se provou que:

a. O R. CC não tinha acesso a informação relativa à situação patrimonial da Supra – Sociedade Unida de Produtos Aglomerados, Ld.ª, o que conduziu ao referido em 14.

*

III – Fundamentação de Direito

Versam os autos sobre uma deliberação social (tomada em AG da 1.ª R., realizada em 08/05/2018) de amortização de quota e de fixação da contrapartida da amortização, deliberação social essa que a A. reputa de eivada de vários vícios invalidantes, razão por que pede que a mesma “seja declarada nula, ou, se assim não se entender, anulável”.

Debruçando-se sobre os vários vícios invocados pela A., a sentença de 1.ª Instância afastou a verificação de todos eles, com exceção do vício de “deliberação abusiva” (previsto no art. 58.º/1/b) do CSC), terminando, como já se relatou, a anular (apenas com fundamento na verificação de tal vício) a deliberação social em causa.

Em consequência, tendo os RR. apelado do sentenciado em 1.ª instância – manifestando a sua divergência em relação ao decidido quanto à verificação do vício de “deliberação abusiva” – a A., na respetiva contra alegação, requereu a título subsidiário a ampliação do âmbito do recurso.

Ampliação esta (da apelação) que veio a ser rejeitada – e cujo objeto, por isso, não foi apreciado/conhecido – pelo Ac. da Relação sob revista, rejeição esta que a A. não aceita e cujo inconformismo se encontra sintetizado nas primeiras 4 conclusões (supra transcritas) da revista.

Sucede que não podemos[2] acompanhar e confirmar a rejeição da ampliação da apelação (requerida pela A.), o que significa que, tendo o Ac. da Relação considerado que não se verifica o vício de “deliberação abusiva”, deu a tal vício uma solução que não prejudicou a reapreciação dos outros vícios, constantes do objeto da ampliação da apelação, pelo que, não se podendo confirmar a rejeição da ampliação da apelação e não estando prejudicada a reapreciação dos vícios ali invocados, restará a este Supremo – uma vez que não poderá, face ao disposto no art. 679.º do CPC (que exceciona a aplicação do art. 665.º do CPC), substituir-se à Relação na apreciação dos vícios constantes da ampliação da apelação – revogar o decidido, quanto à rejeição da ampliação da apelação, e – não se podendo avançar na apreciação das questões suscitadas na revista[3] – mandar baixar o processo, a fim de ser proferido acórdão no seguimento da não rejeição liminar da ampliação da apelação.

E é a questão (a única que, por agora, iremos decidir): porque é que não acompanhamos o decidido quanto à rejeição da ampliação da apelação (requerida pela A.)?

A A. concluiu a sua contra alegação da apelação do seguinte modo:

“Termos em que deve ser negado provimento ao recurso e, subsidiariamente, ser admitida a ampliação do objeto do recurso (art. 636.º/1 do CPC); assim, prevenindo a necessidade da sua apreciação a título subsidiário, a recorrente peticiona a ampliação do objeto do recurso nos seguintes termos: Ser declarada a anulabilidade da deliberação impugnada por violação do direito à informação e por violação do disposto no art. 11.º do pacto social da R. Supra - Sociedade Unida de Produtos Aglomerados, Lda.”

Sendo que, antes, ao longo de 6 páginas, havia exposto[4] as razões jurídicas que, a seu ver, conduzem à verificação do vício procedimental de violação do direito à informação e do vício de conteúdo por violação do pacto social.

Em face disto, tendo em vista rejeitar a ampliação da apelação, expendeu-se na Relação:

“Nas suas contra-alegações, a apelada ampliou o âmbito do recurso, sem, contudo, apresentar conclusões. Limitou-se a pedir que fosse declarada a anulabilidade da deliberação impugnada por violação do direito à informação e do disposto no artigo 11.º do pacto social da Supra – Sociedade Unida de Produtos Aglomerados, Ld.ª, sem sintetizar as razões de tal pretensão, como se impunha.

Embora a ampliação do âmbito do recurso não se apresente como um verdadeiro recurso, não deixa de estar sujeita às mesmas exigências de forma: a ampliação do âmbito do recurso pelo apelado deve ser requerida na sua alegação (artigo 636.º, n.º 1, CPC) e deve concluir, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão (artigo 639.º, n.º 1, CPC).

E bem se compreende que assim seja, atenta a finalidade das conclusões na economia do recurso: mais do que constituírem a síntese das alegações, elas delimitam o objeto da ampliação e os poderes de cognição do Tribunal de recurso.

O CPC, contrariamente ao que sucedia no Código pregresso (artigo 690.º, n.º 4 do CPC, na redação anterior às alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto), não prevê convite à formulação de conclusões, estabelecendo, antes, no artigo 641.º, n.º 2, alínea b), que o requerimento de interposição de recurso é indeferido, designadamente, quando a alegação do recorrente não contenha conclusões.

Da conjugação do artigo 639.º, n.º 3, com o artigo 641.º, n.º 2, alínea b), CPC, resulta que a 1.ª instância deve rejeitar a ampliação do recurso; não o fazendo, cabe ao Tribunal de recurso intervir, nos termos do artigo 651.º, n.º 1, alínea b), CPC, não conhecendo do objecto da ampliação do recurso. (…)

Termos em que não se conhece do objeto da ampliação do âmbito do recurso.”

Concorda-se, como é evidente, com o que se expendeu sobre a ampliação do âmbito do recurso impor a formulação de conclusões e sobre, a partir da reforma processual de 2007, a falta de conclusões não dar lugar a despacho de aperfeiçoamento, mas sim, como resulta do art. 641.º/2/b) do CPC, à rejeição do recurso (no caso, seria à rejeição da ampliação do âmbito do recurso).

A nossa divergência está, pois, apenas em dizer-se/considerar-se que há, no caso, falta de conclusões, ou seja, que há, no caso, uma total omissão de conclusões (em relação à subsidiária ampliação do âmbito do recurso).

Estabelecendo o paralelismo com a PI, que é inepta quando falte a indicação do pedido (art. 186.º/2/a) do CPC), também só as alegações em que faltam em absoluto conclusões serão ineptas, reconduzindo-se todos os restantes comportamentos processuais a hipóteses de conclusões que se apresentam, com “geometria variável”, de forma deficiente, obscura, complexa ou com omissão das especificações referidas no n.º 2 do art. 639.º do CPC.

Será o caso das conclusões apresentadas pela A. quanto à ampliação do âmbito do recurso/apelação.

Efetivamente, concluir a dizer, como a A. fez – que, “prevenindo a necessidade da sua apreciação a título subsidiário, a recorrente peticiona a ampliação do objeto do recurso nos seguintes termos: Ser declarada a anulabilidade da deliberação impugnada por violação do direito à informação e por violação do disposto no art. 11.º do pacto social da R. Supra - Sociedade Unida de Produtos Aglomerados, Lda.” – não cumpre as especificações referidas no n.º 2 do art. 639.º do CPC, porém, não permite que se diga e considere que se está perante a situação mais grave, de total omissão de conclusões, não permite que se diga que se está perante uma situação em que não se justifica sequer a prolação dum qualquer convite.

Observa aliás, com inteira razão, a Relação que “a finalidade das conclusões, na economia do recurso, mais do que constituírem a síntese das alegações, elas delimitam o objeto da ampliação e os poderes de cognição do Tribunal de recurso”, sendo justamente esta última finalidade que o modo de concluir da A. até acaba por cumprir, na medida em que a síntese final - ser declarada a anulabilidade da deliberação impugnada por violação do direito à informação e por violação do disposto no art. 11.º do pacto social da R. – se reporta e refere às razões jurídicas expostas nas 6 páginas imediatamente anteriores, ou seja, pese embora a “imperfeição” e singeleza das conclusões da A. (em relação à pretendida ampliação do âmbito da apelação), até estamos perante uma situação em que o objeto da ampliação é bem inteligível (quer para os recorrentes quer para o tribunal).

Em todo o caso, há que, usando de rigor, respeitar o disposto no art. 639.º/3 do CPC e começar por convidar a A. a aperfeiçoar as conclusões.

É quanto basta para, como já se antecipou, revogar o Acórdão recorrido – por a rejeição da ampliação da apelação, nos termos decididos, não poder subsistir e por, em função disto, ficar por ora prejudicada a apreciação das demais questões suscitadas na revista – e mandar baixar o processo, a fim de ser proferido novo Acórdão no seguimento de convite ao aperfeiçoamento das conclusões respeitantes à ampliação da apelação.

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IV - Decisão

Pelo exposto, revoga-se o acórdão recorrido e ordena-se que, em substituição da rejeição da ampliação da apelação, se profira despacho (nos termos do art. 639.º/3 do CPC) a convidar a A. a, querendo, aperfeiçoar as conclusões respeitantes à por si requerida ampliação da apelação (após o que, seguindo o processo os seus termos, será proferido novo Acórdão).

Custas pelos RR.[5].

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Lisboa, 22/09/2021

António Barateiro Martins (Relator)

Luís Espírito Santo

Ana Paula Boularot

Sumário (art. 663º, nº 7, do CPC).

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[1] A redação de tal facto foi modificada no Ac. da Relação; e tal modificação é uma questão suscitada na revista e que agora não chegaremos, como infra de se dirá, a abordar. A anterior redação de tal ponto 26 era a seguinte: “Ao votar do modo referido em 24., CC atuou com o propósito de obter para si vantagem especial, passando a ser o único sócio detentor de quota da sociedade Supra – Sociedade Unida de Produtos Aglomerados, Ld.ª. e, como tal, ter o domínio total sobre a mesma, assim afastando os herdeiros da quota do falecido sócio BB do exercício de qualquer direito social.”

[2] Daí o modo sintético (em que se inclui a reprodução parcial das conclusões das alegações de recorrente e recorridos) como nos vimos referindo as questões jurídico-substantivas em discussão nos autos, uma vez que o presente acórdão não passa duma espécie de “decisão interlocutória” em relação ao acórdão que, após novo acórdão da Relação e nova revista, será proferido e em que, sem o obstáculo processual agora existente, será abordado o mérito das questões que, suscitadas, ainda possam ser apreciadas.

[3] Se, por ex., a Relação considerar que se verifica algum dos vícios constantes da ampliação da revista, confirmará, por diferente fundamento, o sentenciado na 1.ª Instância e quem passará a ter que recorrer de revista são os RR.; se, por ex., confirmar o sentenciado na 1.ª Instância quanto a tais vícios, passará a haver, quanto aos mesmos, “dupla conforme”, e a A. não os pode incluir, sem mais (como faz na presente revista), no objeto da nova revista.

[4] Reproduzindo o que já havia dito na PI e que, aqui, na revista, torna a repetir.

[5] Uma vez que, nas contra alegações da presente revista, se opuseram à procedência desta questão, ficando assim vencidos.