Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
28/14.3ZRPRT
Nº Convencional: 3ª SECÇÃO
Relator: GABRIEL CATARINO
Descritores: REVISÃO DE SENTENÇA
NATUREZA
PRESSUPOSTOS
NOVOS FACTOS
Data do Acordão: 09/11/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISÃO DE SENTENÇA
Decisão: REJEITADO O PEDIDO DE REVISÃO
Área Temática:
DIREITO PROCESSUAL PENAL – RECURSOS / RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS / REVISÃO / FUNDAMENTOS E ADMISSIBILIDADE DA REVISÃO.
Doutrina:
- Henriques Gaspar, Santos Cabral, Maia Costa, Oliveira Mendes, Pereia Madeira e Pires da Graça, Código de Processo Penal, Comentado, 2.ª edição, p. 1507;
- Nancy Carina Vernengo Pellejero, La Revisión de la Sentencia Firme en el Proceso Penal, Universitat de Barcelona, Tese Doctoral, 2015, p. 249.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO PENAL (CPP): - ARTIGO 449.º.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:


- DE 28-06-2017, PROCESSO N.º 133/12.0JDLSB.S1.
Sumário :
I. - A revisão de sentença – que o ordenamento qualifica como recurso extraordinário – constitui-se como um acção de impugnação de uma decisão condenatória ou absolutória (Henriques Gaspar; Santos Cabral; Maia Costa; Oliveira Mendes; Pereia Madeira e Pires da Graça, in Código de Processo Penal, Comentado, 2ª edição, p. 1507Código de Processo Penal, Comentado, citado infra, p. 1507) que, depois de passada em julgado, se veio a verificar haver sido proferido com ocorrência de qualquer das entorses que constituem os pressupostos alinhados no artigo 449º do Código Processo Penal.
II. - O acto de revisão não se destina, ou tem por objectivo, postergar ou cisar uma decisão ditada pelos fundamentos jurídicos ou sequer pela errónea interpretação de uma norma adjectiva, (“A revisão tem a natureza de um recurso, em regra, sobre a questão de facto. Não se trata de uma revisão do julgado, mas de um novo julgado novo sobre novos elementos de facto. Por tal motivo não parece admissível o recurso com objecto apenas de alteração da qualificação jurídica dos factos.” – ibidem, p.1507. Cfr. ainda o supra citado acórdão de 28-06-2017, prolatado no processo nº 133/12.0JDLSB.S1 - 3.ª secção, relatado pelo Conselheiro Maia Costa) antes se prefigura como um meio de derrogar a sentença (firme) por superveniência de novos meios de prova que não estiveram ao alcance do julgador ou porque o julgador tenha cometido um acto ilícito ao tempo em que teve a seu cargo a resolução do caso sob revisão e cujo acto ilícito haja ficado demonstrado em outro procedimento ou os “factos que serviram de fundamento à condenação forem inconciliáveis com os dados provados noutra sentença e da oposição resultarem graves dúvidas sobre a justiça da condenação.”
III. - Por facto novo há-de entender-se “aquele sucesso ou acontecimento que não foi possível ser conhecido pelo juiz sentenciador na instância, e sobre o qual não se se podia ter tomado conhecimento durante duramente o inquérito, nem se tenha praticado prova para a sus devida demonstração na fase da audiência (v.g. a invalidação de um testemunho, ao constatar-se que faltou à verdade na sua declaração e cujo testemunho constituiu prova acusatória («prueba de cargo») na sentença que se pretenda rever.” (Nancy Carina Vernengo Pellejero, in “La Revisión de la Sentencia Firme en el Proceso Penal”, Universitat de Barcelona, Tese Doctoral, 2015, p. 249.
IV. - Os juízos «técnicos» que constituem o conteúdo do documento apresentado como «novo meio de prova», constituem-se como «opiniões» – mais ou menos fiáveis e idóneas, pela cunhagem, formatação e pretensão «técnica» de que se mostram revestidos – que não possuem a virtualidade de se alcandorar a novos factos ou meios de prova» tal como é pressuposto e exigência do ordenamento jurídico-processual e nos termos em que se deixaram conceptualizados supra.
V. - Não pode integrar-se no conceito de «novos factos ou meios de prova», para efeitos de revisão de uma sentença transitada em julgado, um parecer que procede à análise dos mesmos factos a que o tribunal teve acesso e que obtiveram dele uma divertida análise. As análises/interpretações de realidades factuais, neste caso de feição e índole contabilística, contidas em pareceres técnicos possuem um «valor de ciência» que não vincula o tribunal, porquanto a sua apreciação se encontra na livre disponibilidade apreciativa do tribunal.
Decisão Texto Integral:

I. – RELATÓRIO.
Inconformado com o Acórdão proferido a 12 de Janeiro de 2017, pelo Juízo Central Criminal de ..., Juiz 2, do Tribunal Judicial da Comarca do ..., transitado em julgado em 03 de Maio de 2018, vem o Arguido AA interpor recurso extraordinário de revisão do, com base no disposto no artigo 449.º, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Penal, para o que “estende” o epítome conclusivo que a seguir queda extractado.
I.a). – QUADRO CONCLUSIVO.
a) No douto Acórdão proferido a 12 de Janeiro de 2017 e já transitado em julgado o Tribunal a quo, considerando os factos dados como provados, decidiu, relativamente ao Arguido AA, ora Recorrente, julgar procedente o incidente de liquidação e, em consequência, condenar o Arguido, no pagamento da quantia liquidada de € 253.233,77 (duzentos e cinquenta e três mil, duzentos e trinta e três euros e setenta e sete cêntimos) e correspondente ao património incongruente, no prazo de 10 dias a contar do trânsito em julgado da referida Decisão, sob pena de os bens arrestados serem declarado perdidos a favor do Estado;
b) É o montante apurado em sede de incidente de liquidação e a consequente condenação ao pagamento da quantia de € 253.233,77 (duzentos e cinquenta e três mil, duzentos e trinta e três euros e setenta e sete cêntimos) que suscita o presente Recurso de Revisão, considerando o Recorrente que é valor incorreto e sem qualquer correspondência com a realidade;
c) Para determinar o património incongruente do aqui Recorrente, o Tribunal a quo sustentou-se no relatório emitido pelo Gabinete de Recuperação de Ativos – Delegação do Norte, do qual resulta que o património do Arguido, ora Recorrente, entre os anos de 2010 e de 2015, apresentou um valor global de € 378.020,09 (trezentos e setenta e oito mil e vinte euros e nove cêntimos), de entre o qual consta um rendimento lícito obtido no valor de € 124.786,32 (cento e vinte e quatro mil, setecentos e oitenta e seis euros e trinta e dois cêntimos), concluindo-se então que o remanescente no valor de € 253.233,77 (duzentos e cinquenta e três mil, duzentos e trinta e três euros e setenta e sete cêntimos) é incongruente com o rendimento lícito, uma vez que se presume, nos termos do prescrito no artigo 7.º da Lei 5/2002 de 11.01, que provém de origem ilícita - (vide fls. 4829 a 4840 do processo principal);
d) Considerando o Recorrente que os elementos referentes à sua situação económico-financeira não foram analisados devida e rigorosamente pelo Gabinete de Recuperação de Ativos, solicitou a emissão de um Parecer junto de Revisor Oficial de Contas, o qual, de forma independente, rigorosa e autónoma, procedeu ao estudo e exame dos mesmos elementos que foram analisados – ou, pelo menos, deveriam ter sido - pelo Gabinete de Recuperação de Ativos – Delegação do Norte, respeitantes aos anos de 2010, 2011, 2012, 2013 e 2014 (vide Documento n.º 1);
e) O Recorrente não teve acesso ou sequer teve conhecimento do conteúdo do referido Parecer, aquando do encerramento da audiência de discussão e julgamento em Primeira Instância, ocorrido a 21 de Dezembro de 2016, porquanto a conclusão do dito documento aconteceu a 28 de Dezembro de 2016, por motivos alheios ao Recorrente (cfr. Documento n.º 2);
f) Foi, como tal, de todo impossível ao Recorrente proceder à junção desse meio de prova em sede de Primeira Instância, sendo certo que este Parecer elaborado por Revisor Oficial de Contas é um meio de prova novo e suscetível de criar dúvidas fundadas acerca da justiça da decisão, nos termos do artigo 449.º, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Penal, o qual sustenta a apresentação do presente Recurso de Revista;
g) É através deste Parecer, conjuntamente com elementos que constam já do processo, que o aqui Recorrente pretende demonstrar que o montante de € 253.233,77 (duzentos e cinquenta e três mil, duzentos e trinta e três euros e setenta e sete cêntimos), não corresponde a património incongruente, nem sequer o seu património na sua globalidade correspondeu alguma vez ao montante apurado de € 378.020,09 (trezentos e setenta e oito mil e vinte euros e nove cêntimos);
h) “Deve interpretar-se a expressão “factos ou meios de prova novos” contida na al. d), do n.º 1 do art. 449.º, do CPP, no sentido de serem aqueles que eram ignorados pelo tribunal e pelo requerente ao tempo do julgamento e, por isso, não puderam, então, ser apresentados e produzidos, de modo a serem apreciados e valorados na decisão” – vide Ac. STJ datado de 18.02.2016 (Proc. n.º 87/07.5PFLRS-A.S1);
i) “Sobre o conceito de «facto novo» ou «elemento novo de prova» para efeitos de revisão, entende-se que não é necessário o seu desconhecimento por parte do recorrente, bastando que os factos ou meios de prova não tenham sido tidos em conta no julgamento que levara à condenação, para serem considerados novos” - vide Ac. STJ datado de 04.11.2012 (Proc. n.º 365/11.9PULSB-A.S1);
j) O Gabinete de Recuperação de Ativos, ao calcular os rendimentos e valores recebidos pelo Arguido, ora Recorrente, entre os anos de 2010 e 2015, não cuidou em considerar o salário que o Recorrente efetivamente auferiu no exercício da sua atividade como militar;
k) O Recorrente esteve destacado em comissões no estrangeiro de Setembro de 2010 a Março de 2011, sendo que o montante que o Recorrente auferiu referente a salário durante o período em que esteve em comissão no estrangeiro foi manifestamente superior ao salário que auferia quando estava em Portugal ao serviço do Exército;
l) Tais valores não se encontram reflectidos nas declarações de rendimentos apresentadas pelo Recorrente nos anos de 2010 e 2011, tendo em conta que uma parte do salário que o Recorrente auferia, quando se encontrava em comissão no estrangeiro, não era sujeita a tributação – vide declarações de IRS que constam do processo principal de fls. 4811 a 4818;
m) Tais montantes nem sequer constam dos dados que foram fornecidos pelo Instituto de Segurança Social;
n) Todavia, os montantes auferidos pelo Recorrente durante o período em que esteve de comissão encontram-se devidamente retratados nas suas contas bancárias;
o) Os rendimentos auferidos individualmente pelo Recorrente durante o ano de 2010 e traduzidos na declaração de rendimentos apresentada totalizam o montante de € 14.479,91 (catorze mil, quatrocentos e setenta e nove euros e noventa e um cêntimos), sendo que nessa declaração, constam igualmente os rendimentos auferidos pela sua companheira de então no valor de € 1.436,78 (mil, quatrocentos e trinta e seis euros e setenta e oito cêntimos), perfazendo um montante global de € 15.916,69 (quinze mil, novecentos e dezasseis euros e sessenta e nove cêntimos);
p) O valor auferido pelo Recorrente referido a alínea anterior é o constante dos elementos fornecidos pelo Instituto da Segurança Social (vide fls. 4723 e 4724 do processo principal);
q) Porém, o valor efetivamente auferido pelo aqui Recorrente, enquanto militar do Exército, durante aquele ano de 2010 foi de € 21.374,03 (vinte e um mil, trezentos e setenta e quatro euros e três cêntimos), montantes estes que se encontram devidamente demonstrados da análise das contas bancárias por si tituladas (vide Parágrafos 3 e 5 de fls. 1 e 3 e fls. 1 do Anexo A do Documento n.º 1);
r) O Recorrente esteve em comissão no estrangeiro no período de tempo compreendido entre Março e Dezembro de 2010;
s) No relatório que o Gabinete de Recuperação de Ativos apresentou, é referido que foi solicitada informação junto das respetivas instituições bancárias quanto ao conteúdo das contas bancárias tituladas pelo Recorrente, informação essa que não foi tida em devida consideração, ou teria o dito Gabinete facilmente chegado ao valor de € 21.374,03 (vinte e um mil, trezentos e setenta e quatro euros e três cêntimos), montante que foi efetivamente auferido pelo Recorrente no ano de 2010, claramente espelhado nas suas contas bancárias;
t) O Gabinete de Recuperação de Ativos cingiu-se à análise da declaração de IRS que, por lapso, foi mal preenchida e não reflete de todo a realidade;
u) O Recorrente, ou melhor dito, o contabilista que preencheu a declaração de IRS do ora Recorrente, não declarou para esse efeito a totalidade dos rendimentos que aquele auferiu, dada a existência de rendimentos que se encontravam isentos de tributação, nos termos do artigo 38º, n.º 1 do Decreto-Lei nº 108/2008 de 26.06.2008 que prescreve que “Ficam isentos de IRS os militares e elementos das forças de segurança quanto às remunerações auferidas no desempenho de funções integradas em missões de carácter militar, efectuadas no estrangeiro, com objectivos humanitários ou destinadas ao estabelecimento, consolidação ou manutenção da paz, ao serviço das Nações Unidas ou de outras organizações internacionais, independentemente da entidade que suporta as respectivas importâncias”;
v) Da conjugação do teor do Parecer que aqui se junta - nomeadamente nas fls. 1 e 3 e fls. 1 do Anexo A do Documento n.º 1 - com os recibos de vencimento que já constam do processo no Apenso C, verifica-se que o valor auferido pelo Recorrente no decurso do ano de 2010 a título de salário foi de € 21.374,03 (vinte e um mil, trezentos e setenta e quatro euros e três cêntimos) e não de € 15.916,69 (quinze mil, novecentos e dezasseis euros e sessenta e nove cêntimos), existindo uma diferença positiva entre os valores efetivamente recebidos pelo Recorrente e os que foram declarados de € 5.457,34 (cinco mil, quatrocentos e cinquenta e sete euros e trinta e quatro cêntimos);
w) A existência de rendimentos auferidos pelo Recorrente isentos de tributação e, como tal, não declarados em sede de IRS, justifica a diferença positiva que se verifica, pelo que devem ser considerados justificados os respectivos recebimentos nas contas bancárias, nas quais se encontra devidamente identificada a entidade de que provêm – Exército Português (vide Parágrafo 5.º, fls. 3 do Documento n.º 1 e Documento n.º 3);
x) O Recorrente, na sua condição de militar do Exército, esteve em comissão no estrangeiro de Janeiro a Março de 2011, tendo o seu contrato de trabalho cessado em Abril de 2011, na sequência do que teve direito a uma compensação no valor de € 13.219.37 (treze mil, duzentos e dezanove euros e trinta e sete cêntimos);
y) Os rendimentos provenientes do trabalho do Recorrente, enquanto militar do Exército, durante o ano de 2011, totalizam o valor de € 23.094,20 (vinte e três mil e noventa e quatro euros e vinte cêntimos), valor que se encontra devidamente demonstrado nas contas bancárias do Recorrente – vide Parágrafos 3 e 5 de fls. 1 e 3 e fls. 1 do Anexo A do Documento n.º 1;
z) O Gabinete de Recuperação de Ativos teve acesso às contas bancárias de que é titular o Recorrente, não tendo inexplicavelmente considerado, porém, os montantes que ali se encontram reflectidos e que traduzem os pagamentos efectuados pelo Exército Português;
aa) Conclui-se que o Gabinete de Recuperação de Ativos limitou-se a fazer uma análise meramente superficial da declaração de rendimentos apresentada pelo Recorrente, a qual lamentavelmente continha lapsos e erros de preenchimento, conforme já acontecera no ano de 2010, não podendo no entanto tais falhas prejudicar o aqui Recorrente, aquando da contabilização dos seus rendimentos para efeitos de determinação de quantias provenientes de vantagem de atividade criminosa, até porque aquele Gabinete teve acesso a outros elementos que, devidamente analisados, levariam a uma contabilização justa e real;
bb) O montante dos salários auferidos pelo aqui Recorrente durante os meses de Janeiro a Março de 2011 não corresponde àquele que consta dos elementos fornecidos pelo Instituto da Segurança Social, assim como não consta igualmente dos elementos fornecidos por aquele Instituto a compensação auferida pelo aqui Recorrente (vide fls. 4723 do processo principal, em comparação com fls. 1 do Anexo A do Documento n.º 1);
cc)  Na declaração de rendimentos apresentada relativamente ao ano de 2011, o montante total dos rendimentos auferidos individualmente pelo Recorrente cifra-se em € 8.372,41 (oito mil, trezentos e setenta e dois euros e quarenta e um cêntimos), aí constando também a quantia de € 2.890,58 (dois mil, oitocentos e noventa euros e cinquenta e oito cêntimos), auferidos pela companheira do Recorrente, perfazendo o montante global de € 11.262,99 (onze mil, duzentos e sessenta e dois euros e noventa e nove cêntimos). – vide declaração de IRS que consta no processo principal a fls. 4816 a 4818;
dd) Os valores que o Recorrente auferiu enquanto esteve em comissão no estrangeiro, bem como a compensação que recebeu pela cessação do contrato de trabalho não constam da declaração de rendimentos apresentada e referente ao ano de 2011, tendo em conta que o Recorrente não declarou em sede de IRS a totalidade dos rendimentos que auferiu, tendo em conta que se encontram isentos de tributação, nos termos do artigo 38º, n.º 1, do Decreto-Lei nº 108/2008 de 26.06.2008;
ee) Da análise conjunta do Parecer ora junto com o presente Recurso e dos recibos que se encontram juntos aos autos no Apenso C, facilmente se concluí que o valor recebido pelo aqui Recorrente da parte do Exército Português é de € 23.094,20 (vinte e três mil e noventa e quatro euros e vinte cêntimos);
ff) Apesar deste valor não se encontrar refletido na declaração de rendimentos apresentada em sede de IRS, nem dos elementos fornecidos pelo Instituto da Segurança Social;
gg) Mais uma vez andou mal aquele Gabinete de Recuperação de Ativos, aquando da contabilização de valores, já que facilmente se percebe e demonstra o valor efetivamente recebido pelo Recorrente no exercício da sua profissão como militar do Exército Português, no ano de 2011;
hh) Após a cessação do contrato de trabalho com o Exército Português, o aqui Recorrente começou, a partir de Novembro de 2011, a receber na sua conta bancária subsídio de desemprego, tendo auferido, a este título e também a título de outros apoios sociais a quantia global de € 2.092,62 (dois mil e noventa e dois euros e sessenta e dois cêntimos) – vide Parágrafos 3 e 5 de fls. 1 e 3 e fls. 1 do Anexo A do Documento n.º 1;
ii) Em contraposição, da análise do extrato de remunerações apresentado pela Segurança Social, resulta que o Recorrente recebeu, a título de subsídio de desemprego e outros apoios sociais, nesse ano de 2011, o montante de € 9.833,20 (nove mil, oitocentos e trinta e três euros e vinte cêntimos) - vide fls. 4722 do processo principal, em comparação com fls. 1 do Anexo A do Documento n.º 1;
jj) Mais uma vez, existe uma crassa discrepância de valores que não foram devidamente analisados e considerados pelo Gabinete de Recuperação de Ativos, aquando da contabilização efetuada, ignorando por completo os valores constantes das contas bancárias do ora Recorrente;
kk) O rendimento que o Recorrente, por si só, auferiu proveniente do Exército, durante o ano de 2011, é manifestamente superior ao valor que declarou em sede de IRS, diferença essa que se esclarece e justifica ao analisar as contas bancárias tituladas pelo Recorrente;
ll) A existência de rendimentos auferidos pelo Recorrente isentos de tributação e, em consequência, não declarados em sede de IRS, ao que acresce as discrepâncias entre o que consta no extrato de remunerações da Segurança Social e o que foi efetivamente recebido pelo Recorrente a título de subsídio de desemprego, explica a diferença positiva verificada no valor de € 4.090,63 (quatro mil e noventa euros e sessenta e três cêntimos), devendo, como tal, os recebimentos respeitantes a este valor dar-se por justificados, correspondendo a património proveniente de origem lícita (vide Parágrafo 5.º, fls. 3 e fls. 1 do Anexo A do Documento n.º 1, em comparação com fls. 4722 e 4723 do processo principal);
mm) Durante o ano de 2012, o Recorrente encontrava-se em situação de desemprego, auferindo mensalmente o correspondente subsídio, sendo que, nesse ano, conforme decorre da análise das contas bancárias tituladas pelo Recorrente, o mesmo recebeu a título de subsídio de desemprego e outros apoios sociais, a quantia total de € 10.251,20 (dez mil, duzentos e cinquenta e um euros e vinte cêntimos) - vide Parágrafos 3 e 5 de fls. 1 e 3 e fls. 1 e 2 do Anexo A do Documento n.º 1;
nn) No entanto, o extrato de remunerações apresentado pela Segurança Social referente a 2012 refere que Recorrente recebeu a quantia de € 13.838,40 (treze mil, oitocentos e trinta e oito euros e quarenta cêntimos) a título de subsídio de desemprego e outros apoios sociais, sendo que a sua companheira auferiu a quantia de € 748,35 (setecentos e quarenta e oito euros e trinta e cinco cêntimos) a esse mesmo título, perfazendo a quantia global de € 14.586,75 (catorze mil, quinhentos e oitenta e seis euros e setenta e cinco cêntimos) - vide fls. 4718, 4721 e 4722 do processo principal e Ponto 4, al. c) de fls. 3 do Documento n.º 1;
oo) Segundo o Instituto da Segurança Social, o Recorrente, recebeu individualmente, no ano de 2012, a quantia de € 13.838,40 (treze mil, oitocentos e trinta e oito euros e quarenta cêntimos), ao invés da quantia de € 10.251,20 (dez mil, duzentos e cinquenta e um euros e vinte cêntimos), que foi o que na realidade recebeu;
pp) Esta discrepância de valores não foi devidamente considerada, analisada e averiguada pelo Gabinete de Recuperação de Ativos, que ignorou os valores efetivamente recebidos pelo Recorrente, firmando-se apenas nas declarações da Segurança Social;
qq) O aqui Recorrente auferiu igualmente, no ano de 2012, a quantia de € 1.713,36 (mil, setecentos e treze euros e trinta e seis cêntimos), que lhe foi paga pela Câmara Municipal de Felgueiras, no âmbito de um programa ocupacional para pessoas desempregadas que o Recorrente frequentou, valor devidamente refletido nas contas bancárias tituladas pelo Recorrente (vide Parágrafos 3 e 5 de fls. 1 e 3 do Documento n.º 1);
rr) Ao Recorrente foi ainda atribuída uma bolsa de estudo pela Direção Geral do Ensino Superior no valor de € 2.726,00 (dois mil, setecentos e vinte e seis euros), o qual se encontra demonstrado nas contas bancárias tituladas por aquele (vide Parágrafos 3 e 5 de fls. 1 e 3 e fls. 1 do Anexo A do Documento n.º 1);
ss) Neste ano de 2012, o Recorrente obteve também um rendimento no valor de € 2.191,26 (dois mil, cento e noventa e um euros e vinte e seis cêntimos), o qual, apesar de ter sido declarado em sede de IRS por Pedro Filipe Monteiro da Silva, foi posteriormente depositado e/ou transferido para a conta bancária do Recorrente, respeitando este valor à atividade de exploração do estabelecimento “Kiss Hot Night Club” (vide Parágrafo 4º, al. a), fls. 2 do Documento n.º 1);
tt) O Recorrente fazia diversas formações relacionadas com a área para-militar, ausentando-se da sua cidade por diversas vezes, nomeadamente para fora do País, tendo acordado com Pedro Silva que o mesmo o “representaria” no estabelecimento “Kiss Hot Night Club”, aquando das suas ausências, tratando aquele das questões relacionadas com a caixa e respetivos pagamentos referentes ao estabelecimento;
uu) Tais valores nunca pertenceram a Pedro Silva, uma vez que foram posteriormente depositados e/ou transferidos para as contas tituladas pelo ora Recorrente;
vv) Entendeu o Revisor Oficial de Contas no seu Parecer, após análise dos elementos contabilísticos respeitantes ao Recorrente, não ser possível identificar inequivocamente o valor referido em ss), não o considerando então como rendimento efetivo do Recorrente – vide Parágrafo 5.º, fls. 3 do Documento n.º 1;
ww) No que respeita ao ano de 2012, o aqui Recorrente declarou como rendimentos em sede de IRS, conjuntamente com a sua companheira de então, a quantia de € 5.475,34 (cinco mil, quatrocentos e setenta e cinco euros e trinta e quatro cêntimos) - vide declaração de IRS que consta do processo principal de fls. 4819 a 4821;
xx) A soma dos valores efetivamente recebidos pelo aqui Recorrente, considerados pelo Revisor Oficial de Contas no seu Parecer, e que se encontram espelhados nas contas bancárias de que era titular, totaliza o montante de € 14.690,56 (catorze mil, seiscentos e noventa euros e cinquenta e seis cêntimos);
yy) Existe uma discrepância entre os valores efetivamente auferidos pelo Recorrente e aqueles que foram declarados para efeitos de tributação, bem como quanto aos valores declarados pela Segurança Social e efetivamente recebidos a título de prestações de desemprego e outros apoios sociais, o que resulta numa diferença negativa de € 7.562,79 (sete mil, quinhentos e sessenta e dois euros e setenta e nove cêntimos) - vide Parágrafo 5.º, fls. 3 do Documento n.º 1;
zz) Esse valor de € 7.562,79 (sete mil, quinhentos e sessenta e dois euros e setenta e nove cêntimos) não é real, porquanto nunca foi adquirido por qualquer forma pelo Recorrente, não devendo como tal ser tido em conta para efeitos de contabilização patrimonial;
aaa) Esta diferença negativa decorre da insuficiente e/ou incorreta análise das operações constantes nos extractos bancários, que permitisse a identificação inequívoca da respectiva origem;
bbb) A 8 de Junho de 2012 o Recorrente contraiu um empréstimo junto de um familiar no valor de € 7.000,00 (sete mil euros), o qual lhe foi concedido através de transferência bancária, encontrando-se esta operação vertida nas contas bancárias do Recorrente (vide fls. 2 do Anexo B do Documento n.º 1);
ccc) A 16 de Outubro de 2012, foi concedido ao Recorrente um crédito pessoal pelo Banco Santander Totta no valor de € 8.472,55 (oito mil, quatrocentos e setenta e dois euros e cinquenta e cinco cêntimos), montante que se encontra devidamente refletido nas contas bancárias tituladas pelo Recorrente (vide fls. 2 do Anexo B do Documento n.º 1);
ddd) Ao contabilizar o património do Recorrente, o Gabinete de Recuperação de Ativos considerou os créditos solicitados como fazendo parte do ativo do aqui Recorrente, quando na verdade se cingem a dívidas – a créditos - que o Recorrente ficou a pagar, não sendo de todo de considerar aqueles valores como património do Recorrente;
eee) Estes montantes em dívida deveriam ter sido subtraído ao valor do património do Recorrente, uma vez que se trata de um património negativo necessário à constituição do ativo – vide Parágrafo 14.º, fls. 6 do Documento n.º 1;
fff) Refira-se que, na Tabela de Cálculo da Vantagem de Atividade Criminosa elaborada por aquele Gabinete, junta no Apenso C a fls. 419 e aos autos principais no relatório de fls. 4829 a 4840, encontra-se incluído no património do Recorrente como ativo adquirido um ligeiro de passageiros no valor de € 18.000,00 (dezoito mil euros), ignorando-se no entanto que, à data da elaboração dessa contabilização, o Recorrente encontrava-se a pagar um empréstimo que havia contraído junto da Sofinloc no valor total de € 20.000,00 (vinte mil euros) para adquirir a viatura em questão;
ggg) À data da elaboração dessa contabilização por parte do Gabinete de Recuperação de Ativos, existia uma dívida associada ao automóvel, conforme se comprova através da análise da providência cautelar intentada pela Sofinloc, invocando a existência de uma reserva de propriedade sobre o veículo, aquando do arresto da dita viatura no Apenso C – vide fls. 5084 do processo principal;
hhh) Não considerou aquele Gabinete o valor em dívida, incluindo sem mais o referido automóvel no “bolo” dos ativos adquiridos pelo Recorrente, ignorando a supra-referida reserva de propriedade – vide fls. 5084 do processo principal;
iii) O Gabinete de Recuperação de Ativos inseriu ainda nessa Tabela como ativo adquirido pelo Recorrente um motociclo no valor de € 4.500,00 (quatro mil e quinhentos euros), quando na realidade o Recorrente havia comprado esse motociclo cerca de cinco anos antes pelo valor de cerca de € 3.000,00 (três mil euros), estranhando-se esta divergência de valores;
jjj) Não cuidou o Gabinete de Recuperação de Ativos de tomar em consideração os montantes que o Recorrente efetivamente devia, fruto de créditos que havia solicitado, considerando erradamente valores como ativo que correspondem efetivamente a passivo, colocado dívidas como parte integrante do ativo do Recorrente, e duplicando assim o seu património;
kkk) O Recorrente auferiu durante o ano de 2013 da parte do Instituto da Segurança Social, a título de prestações de desemprego e outros apoios sociais, o montante de € 11.793,27 (onze mil, setecentos e noventa e três euros e vinte e sete cêntimos), valor que se encontra devidamente vertido nas suas contas bancárias (vide Parágrafos 3 e 5 de fls. 1 e 3 e fls. 2 e 3 do Anexo A do Documento n.º 1);
lll) O extrato de remunerações da Segurança Social refere incongruentemente que o Recorrente, juntamente com a sua companheira, recebeu a título de subsídio de desemprego e outros apoios sociais, nesse ano de 2013, o montante de € 12.585,88 (doze mil, quinhentos e oitenta e cinco euros e oitenta e oito cêntimos), indicando que o Recorrente recebeu individualmente a quantia de € 10.448,80 (dez mil, quatrocentos e quarenta e oito euros e oitenta cêntimos - vide fls. 4718 e 4721 do processo principal, em comparação com o Parágrafo 4, al. c) fls. 3 e fls 2 e 3 do Anexo A do Documento n.º 1;
mmm) Na declaração de rendimentos referente ao ano de 2013 consta que o Recorrente auferiu a título de trabalho dependente o montante de € 2.100,00 (dois mil e cem euros), sendo que a então companheira do Recorrente auferiu a quantia de € 1.010,00 (mil e dez euros), perfazendo o valor global de € 3.110,00 (três mil, cento e dez euros) – vide declaração de IRS que consta de fls. 4822 a 4824 do processo principal;
nnn) Devem igualmente ser considerados como rendimento pertencente ao Recorrente os valores declarados em sede de IRS por Pedro Filipe Monteiro da Silva, respeitante à atividade de exploração do estabelecimento “Kiss Hot Night Club” (vide Ponto 4, al. a), fls. 2 do Documento n.º 1), porquanto essas quantias nunca pertenceram a Pedro Silva, tendo sido depositadas e/ou transferidas para as contas tituladas pelo ora Recorrente;
ooo) Conforme acontecera em 2012, em virtude de se encontrar por diversas vezes ausente em formação na área para-militar, o Recorrente acordou com Pedro Silva que o mesmo o “representaria” no estabelecimento “Kiss Hot Night Club”, aquando das suas ausências, tratando aquele das questões relacionadas com a caixa e respetivos pagamentos referentes ao estabelecimento;
ppp) E tanto é que o Tribunal a quo julgou e decidiu absolver o Arguido Pedro Filipe Monteiro da Silva pelo crime de que vinha acusado, sendo certo que a relação que o mesmo mantinha com aquele bar resume-se ao descrito na alínea anterior;
qqq) O valor declarado por Pedro Silva em sede de IRS e referente à prestação de serviços de atividades hoteleiras, de restauração e bebidas foi de € 42.791,24 (quarenta e dois mil, setecentos e noventa e um euros e vinte e quatro cêntimos) - vide Parágrafo 4, al. a), fls. 2 do Documento n.º 1;
rrr) O Revisor Oficial de Contas que subscreve o Parecer junto a estes autos entendeu ser de imputar a título de rendimentos auferidos ao Recorrente a quantia de € 37.021,25 (trinta e sete mil, vinte e um euros e vinte e cinco cêntimos), na qual se engloba o valor de € 2.100,00 (dois mil e cem euros) que este auferiu a título de trabalho dependente, correspondendo o restante a valores recebidos através de depósito ou transferência bancária da parte de Pedro Silva pela exploração do estabelecimento (vide Parágrafos 4.º, al. a) e 5.º de fls. 2 e 3 do Documento n.º 1);
sss) Os rendimentos auferidos pelo Recorrente, em 2013, totalizam o valor de € 48.814,52 (quarenta e oito mil, oitocentos e catorze euros e cinquenta e dois cêntimos) – vide Parágrafos 3.º e 5.º de fls. 1 e 3 do Documento n.º 1;
ttt) Em 2013, existe discrepância entre os valores efetivamente auferidos pelo Recorrente e aqueles que foram declarados para efeitos de tributação, bem como quanto aos valores declarados pela Segurança Social e efetivamente recebidos a título de prestações de desemprego e outros apoios sociais, o que resulta numa diferença negativa no valor de € 9.672,60 (nove mil, seiscentos e setenta e dois euros e sessenta cêntimos) - vide Parágrafo 5.º, fls. 3 do Documento n.º 1;
uuu) Na contabilização do património pertencente ao Recorrente, o Gabinete de Recuperação de Ativos imputou-lhe esse valor de € 9.672,60 (nove mil, seiscentos e setenta e dois euros e sessenta cêntimos) o qual não é real, não existe, nunca foi adquirido por qualquer forma pelo Recorrente;
vvv) Baseou-se uma vez mais aquele Gabinete em informação insuficiente e errada no que concerne às operações bancárias analisadas, o que não lhe permitiu identificar inequivocamente a respetiva origem dos valores em questão;
www) No ano de 2014, auferiu o Recorrente da parte da Segurança Social a quantia de € 700,56 (setecentos euros e cinquenta e seis cêntimos), a título de abono de família, conforme espelham as contas bancárias por ele tituladas (vide fls. 1 e 3 e Anexo A fls. 3 e 4 do Doc. n.º 1);
xxx) Na declaração de IRS consta que o Recorrente auferiu o montante de € 52.329,71 (cinquenta e dois mil, trezentos e vinte e nove euros e setenta e um cêntimos), sendo que € 52.029,71 (cinquenta e dois mil e vinte e nove euros e setenta e um cêntimos) correspondem a prestação de serviços de atividades hoteleiras, restauração e bebidas, e os restantes € 300,00 (trezentos euros) correspondem a trabalho dependente – vide declaração de IRS que consta de fls. 4825 a 4828 do processo principal;
yyy) O Revisor Oficial de Contas entendeu no seu Parecer que, no que respeita à exploração do estabelecimento “Kiss Hot Night Club”, considerando todos os elementos contabilísticos analisados, a quantia que se encontra devidamente justificada é de € 23.625,25 (vinte e três mil, seiscentos e vinte e cinco euros e vinte e cinco cêntimos) – vide Parágrafo 5, fls. 3 do Documento 1;
zzz) A soma dos rendimentos auferidos no ano de 2014 pelo Recorrente totalizam o valor de € 24.325,81 (vinte e quatro mil, trezentos e vinte e cinco euros e oitenta e um cêntimos) – vide Parágrafos 3.º e 5.º de fls. 1 e 3 do Documento n.º 1 – sendo este valor aquele que se pode aferir através da análise das contas bancárias do Recorrente;
aaaa) Existe em 2014 uma discrepância entre os valores efetivamente auferidos pelo Recorrente e aqueles que foram declarados para efeitos de tributação, o que resulta numa diferença negativa no valor de € 29.003,90 (vinte e nove mil e três euros e noventa cêntimos) - vide Parágrafo 5.º, fls. 3 do Documento n.º 1;
bbbb) Em resumo, verificam-se diversas divergências no que respeita aos valores declarados em sede de IRS, bem como quanto aos rendimentos declarados pelo Instituto da Segurança Social, incluindo prestações de desemprego e outros apoios sociais, e aqueles que foram efetivamente recebidos pelo Recorrente nos anos de 2010, 2011, 2012, 2013 e 2014;
cccc) Estas discrepâncias devem-se a erros no preenchimento das declarações de rendimentos, designadamente, à confusão na classificação entre rendimentos das categorias A e B, bem como à não declaração em sede de IRS de rendimentos isentos, nomeadamente, rendimentos e compensação recebida da parte do Exército;
dddd) Verificam-se incoerências relativamente aos valores referidos pelo Instituto da Segurança Social relativamente a rendimentos e prestações por desemprego pagos pelo Exército;
eeee) Nos anos de 2010 e 2011, os valores objeto de diversas transferências bancárias realizadas pelo Recorrente, entre contas bancárias por si tituladas, foram duplamente considerados pelo Gabinete de Recuperação de Ativos;
ffff) Considerou este Gabinete o valor que saía da conta de origem e o mesmo valor que entrava na conta de destino, objeto da transferência bancária, como correspondendo a dois valores distintos, somando-os e inserindo esses valores em duplicado no “bolo” do património do Recorrente, sendo de verificar em fls. 1 e 2 do Anexo B do Documento n.º 1, os valores classificados como “Passagem”, os quais se reportam a valores duplicados referentes a transferências bancárias realizadas entre contas bancárias tituladas pelo Recorrente;
gggg) Verificaram-se diversos casos de “Passagem”, plasmados nas fls. 1 e 2 do Anexo B do Documento n.º 1, totalizando um valor duplicado, e como tal, nunca existente, de € 10.952,72 (dez mil, novecentos e cinquenta e dois euros e setenta e dois cêntimos) em 2010 e de € 1.900,00 (mil e novecentos euros) em 2011 – vide Parágrafo 3.º, fls. 1 do Documento n.º 1;
hhhh) O Parecer junto com o presente Recurso procedeu à reconciliação dos montantes recebidos nas contas bancárias do Recorrente com a origem dos mesmos (Exército, Segurança Social, Câmara de Felgueiras, Direção Geral do Ensino Superior e Bar), confrontando ainda com os rendimentos declarados em sede de IRS e as prestações sociais declaradas pela Segurança Social, o que deu origem à informação constante do Parágrafo 5.º, fls. 3 do Documento n.º 1.
iiii) Os valores efetivamente auferidos pelo Recorrente, e vertidos nas contas bancárias, de 2010 a 2014 inclusivé, são os seguintes (vide parágrafo 3, fls 1 do Documento n.º 1):
a) Exército: € 44.468,23 (quarenta e quatro mil, quatrocentos e sessenta e oito euros e vinte e três cêntimos;
b) Segurança Social: € 24.837,65 (vinte e quatro mil, oitocentos e trinta e sete euros e sessenta e cinco cêntimos;
c) Câmara Municipal de Felgueiras: € 1.713,36 (mil, setecentos e treze euros e trinta e seis cêntimos);
d) DG Ensino Superior: € 2.726,00 (dois mil, setecentos e vinte e seis euros);
e) Bar: € 60.646,50 (sessenta mil, seiscentos e quarenta e seis euros e cinquenta cêntimos);
h) Empréstimos: € 15.472,55 (quinze mil, quatrocentos e setenta e dois euros e cinquenta e cinco cêntimos);
g) Transferências entre contas: € 13.345,00 (treze mil, trezentos e quarenta e cinco euros);
h) Movimentos estornados: € 200,00 (duzentos euros);
i) Movimentos de passagem: € 12.852,72 (doze mil, oitocentos e cinquenta e dois euros e setenta e dois cêntimos);
j) Origens não identificadas: € 68.412,84 (sessenta e oito mil, quatrocentos e doze euros e oitenta e quatro cêntimos).
Total: € 244.674,85 (duzentos e quarenta e quatro mil, seiscentos e setenta e quatro euros e oitenta e cinco cêntimos);
jjjj) No que concerne ao valor de € 68.412,84 (sessenta e oito mil, quatrocentos e doze euros e oitenta e quatro cêntimos), correspondente a montante de origem não identificada, haverá que subtrair os valores que representam diferenças negativas que, como tal, se referem a valores que não existem, supra enunciados e explicados, conforme Parecer do Revisor Oficial de Contas, nos valores de € 7.562,79, € 9.672,60 e € 29.003,90, cifrando-se então o valor de origem não identificada na quantia de € 22.173,55 (vinte e dois mil, cento e setenta e três euros e cinquenta e cinco cêntimos) - vide Parágrafo 6.º, fls. 4 do Doc. n.º 1;
kkkk) Conclui o Parecer junto aos presentes autos como Documento n.º 1 que o valor de € 22.173,55 (vinte e dois mil, cento e setenta e três euros e cinquenta e cinco cêntimos) é a quantia de origem não identificada, para efeitos de apuramento da vantagem de atividade criminosa, no que respeita ao Recorrente;
A forma de apuramento do património realizada pelo Gabinete de Recuperação de Ativos encontra-se errada, porquanto “considera como património a fonte própria do mesmo – os movimentos a crédito em contas bancárias -, o que tende a duplicar o seu valor; ignora que os movimentos a crédito em contas bancárias não correspondem totalmente a fontes ilícitas; e desconsidera as dívidas eventualmente existentes que possam ter sido necessárias para a sua existência (património negativo)”. – vide Parágrafos 6 a 12, fls. 4, 5 e 6 do Documento n.º 1;
mmmm) De acordo com o Parecer elaborado por Revisor Oficial de Contas, isento e imparcial, que fundamenta o presente Recurso, os valores recebidos pelo Recorrente justificados por rendimentos e outras operações, como empréstimos ou transferências, de 2010 a 2014, ascenderam ao montante de € 222.501,30 (duzentos e vinte e dois mil, quinhentos e um euros e trinta cêntimos) - vide Parágrafo 15.º de fls. 7 do Documento n.º 1;
nnnn) Para alcançar este valor, foi subtraído ao montante de € 244.674,85 (duzentos e quarenta e quatro mil, seiscentos e setenta e quatro euros e oitenta e cinco cêntimos) o valor de € 22.173,55 (vinte e dois mil, cento e setenta e três euros e cinquenta e cinco cêntimos);
oooo) O montante de € 244.674,85 (duzentos e quarenta e quatro mil, seiscentos e setenta e quatro euros e oitenta e cinco cêntimos) reporta-se ao valor patrimonial global que o Revisor Oficial de Contas considerou como sendo o valor patrimonial a imputar ao Recorrente, no período de tempo que decorreu entre 2010 e 2014, inclusive;
pppp) Muito se indigna o Recorrente ao verificar que o Gabinete de Recuperação de Ativos, aquando da contabilização realizada, chegou ao excessivo valor total de património de € 378.020,09 (trezentos e setenta e oito mil e vinte euros e nove cêntimos);
qqqq) Os elementos analisados pelo Gabinete de Recuperação de Ativos foram os mesmos elementos que o Revisor Oficial de Contas analisou e nos quais se baseou para efetuar o seu Parecer, no qual esclarece e discrimina através de tabelas todos os valores que o levaram a concluir por um valor patrimonial global do Recorrente de € 244.674,85 (duzentos e quarenta e quatro mil, seiscentos e setenta e quatro euros e oitenta e cinco cêntimos);
rrrr) O Gabinete de Recuperação de Ativos não considerou diversos elementos de extrema importância no que concerne ao património do Recorrente, concluindo que o valores recebidos pelo Recorrente efetivamente justificados e congruentes se cifram na quantia de € 124.786,32 (cento e vinte e quatro mil, setecentos e oitenta e seis euros e trinta e dois cêntimos), quando na realidade a quantia efetivamente justificada e, portanto, de origem lícita, é de € 222.501,30 (duzentos e vinte e dois mil, quinhentos e um euros e trinta cêntimos) – vide Documento n.º 1;
ssss) Enquanto que na Tabela de Cálculo da Vantagem de Atividade Criminosa elaborada pelo Gabinete de Recuperação de Ativos, a subtração do rendimento disponível e justificado do Recorrente ao valor total do património, gera um valor proveniente de vantagem criminosa no valor de € 253.233,77 (duzentos e cinquenta e três mil, duzentos e trinta e três euros e setenta e sete cêntimos), o Parecer elaborado pelo Revisor Oficial de Contas, ora junto como Documento n.º 1, ao subtrair o valor correspondente aos recebimentos considerados lícitos (€ 222.501,30) ao património global (€ 244.674,85), gera um valor de origem não identificada de € 22.173,55 (vinte e dois mil, cento e setenta e três euros e cinquenta e cinco cêntimos);
tttt) Face às discrepâncias de valores que ora se relataram pormenorizadamente, originando uma gritante diferença de valores patrimoniais finais, parece óbvio que se suscitam graves dúvidas acerca da justiça desta condenação, ao combinarmos o novo meio de prova fundamento deste Recurso com os factos ou meios de prova que foram apreciados no processo principal (artigo 449.º, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Penal);
uuuu) O Parecer junto como Documento n.º 1 é um meio de prova novo que sustenta a apresentação do presente Recurso, nos termos do artigo 449.º, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Penal, o qual não foi produzido ou considerado durante o julgamento, pelas razões supra-explicitadas;
vvvv) O Parecer ora junto, conjuntamente com outros meios de prova, designadamente, documentos que já constam do processo não podem deixar de suscitar graves dúvidas sobre a justiça da condenação do aqui Recorrente no pagamento da quantia de € 253.233,77 (duzentos e cinquenta e três mil, duzentos e trinta e três euros e setenta e sete cêntimos);
wwww) Por tudo quanto se alega, e prova, o ora Recorrente não deve a quantia que foi condenado a pagar, porquanto não provém de origem ilícita;
xxxx) Pelo presente Recurso, o Recorrente impugna todos os valores a que se chegou no âmbito do incidente de liquidação, porquanto irreais e injustos, bem como todos os documentos onde consta a contabilização que deu origem a esses resultados, porquanto errados e/ou insuficientes;
yyyy) O Recorrente pretende que se proceda à devida e correta contabilização dos valores referentes ao seu património, apurando-se valores com base em cálculos corretos, determinando-se assim, com justiça, o que efetivamente é recebimento lícito e o que efetivamente provém de origem não identificada;
zzzz) Sempre deveria o Tribunal a quo ter indagado e verificado, até à exaustão, a justiça de tal condenação, o que se requer seja realizado neste momento;
aaaaa) Deveria o Tribunal a quo ter apurado a veracidade dos valores contabilizados, analisando e confirmando as contas e valores constantes do relatório do Gabinete de Recuperação de Ativos, apercebendo-se das irregularidades que constam da dita contabilização de valores;
bbbbb) Neste seguimento, deveria o Tribunal a quo ter decidido pela improcedência do incidente de liquidação na parte em que apura um valor que excede gritantemente o valor efetivamente proveniente de origem não identificada com base em dados e contas corretos;
ccccc) Deveria o Tribunal a quo ter decidido ainda pela absolvição do Arguido, ora Recorrente, quanto ao pagamento da quantia apurada pelo dito Gabinete como constituindo vantagem provinda de atividade criminosa, que excede o valor de origem não identificada corretamente avaliado;
ddddd) Por último, deveria o Tribunal a quo decidir pela não manutenção do arresto tal qual se encontrava estabelecido, pelo valor apreendido ser manifestamente superior ao valor de origem não identificada corretamente apurado;
eeeee) Ao invés, não cuidou o Tribunal a quo de verificar a veracidade dos factos, dando como provados factos assentes em cálculos errados;
fffff) Sempre se atente ao princípio in dubio pro reu, garantia constitucional de que o Arguido beneficia, plasmada no artigo 32.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa, mediante o qual o Tribunal deve analisar devidamente todos os factos e decidir com certeza, tendo por base provas isentas de erros; porquanto, a existência de dúvidas, exige a absolvição do Arguido;
ggggg) O Tribunal a quo aceitou sem mais a contabilização apresentada pelo Gabinete de Recuperação de Ativos, sem cuidar pela sua devida verificação, não se escusando, como era seu dever, de decidir com base em dados irregulares;
hhhhh) Nos termos do artigo 29.º, n.º 6 da Constituição da República Portuguesa “Os cidadãos injustamente condenados têm direito, nas condições que a lei prescrever, à revisão da sentença e à indemnização pelos danos sofridos”;
iiiii) Termos em que, pelo presente, se pugna pela substituição da decisão do Acórdão em crise por outro, no qual se absolva o Arguido quanto ao pagamento da quantia considerada proveniente de origem ilícita que exceda o valor de origem não identificada rigorosa e corretamente avaliado, com as legais consequências.
Nestes termos e nos melhores de Direito, que V/as. Exas. doutamente suprirão, deverá ser concedido provimento ao presente Recurso de Revisão e, em consequência, substituir o Acórdão em crise por outro que decida:
a) pela improcedência do incidente de liquidação na parte em que apura um valor que excede o valor efetivamente proveniente de origem não identificada corretamente avaliado;
b) absolver o Arguido, ora Recorrente, quanto ao pagamento da quantia considerada vantagem provinda de atividade criminosa em que foi condenado, na parte em que excede o valor de origem não identificada corretamente avaliado;
c) pela não manutenção do arresto tal qual se encontrava estabelecido, pelo facto do valor apreendido ser manifestamente superior ao valor de origem não identificada corretamente apurado;
Revogando-se, deste modo, parcialmente o Douto Acórdão recorrido.”
Na vista que lhe foi propinada, o Magistrado do Ministério Público, junto da comarca, opõe-se á revisão impetrada pelas razões que indica na peça a seguir reproduzida – cfr. fls. 384 e 385.
O arguido veio interpor recurso extraordinário de revisão de sentença do douto acórdão, com vista a que o acórdão proferido seja substituído por outro que decida pela improcedência do incidente de liquidação na parte em que apura um valor que excede o valor efectivamente proveniente de origem não identificada correctamente avaliado, e absolvendo o recorrente quanto ao pagamento da quantia considerada vantagem provinda de actividade criminosa em que foi condenado, na parte que excede o valor de origem não identificada correctamente avaliado, e pela não manutenção do arresto, tal qual se encontrava estabelecido pelo facto do valor apreendido ser manifestamente superior ao valor de origem não identificada correctamente apurado.
Fundamenta o recorrente o recurso que ora interpõe na al. d) do nº 1 do art. 449º do Código de Processo Penal, (se descobrirem novos factos ou meios de prova que, de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo, suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação).
Pressupõe, pois que se tenham descoberto, após o trânsito em julgado da decisão, novos factos, ou novos meios de prova. Antes de mais, e salvo melhor opinião, percorridas quer as motivações quer as conclusões do recurso, decorre, desde logo, que não invoca o recorrente quaisquer novos factos. Na verdade todos os factos alegados, tendentes à demonstração de que o arguido auferiu rendimentos não sujeitos a tributação ou sequer a declaração à Segurança Social constavam já dos autos. Efectivamente, de novo, o arguido apenas junta um parecer, subscrito por revisor oficial de contas, que conclui que a vantagem da actividade criminosa do recorrente é inferior à determinada no douto acórdão. Em tal parecer, sem que seja efectivamente demonstrado pelo arguido – à semelhança do que ocorreu em sede de julgamento – entra-se em linha de conta com rendimentos que o recorrente clama de lícitos, sem que exista qualquer prova que permita concluir da existência dos mesmos. Salvo melhor opinião, ainda, os rendimentos que o arguido auferiu por conta do Ministério da Defesa Nacional mostravam-se já demonstrados, em documentos juntos pelo próprio, no apenso C dos presentes autos (em certidão nos presentes autos de revisão extraordinária, a fls. 705, 706, 707, e 708), e tal como consta da decisão proferida no mencionado apenso (nestes autos a fls. 715 e ss.) mostram-se reflectidos nas declarações de IRS dos anos de 2010 e 2011, e respectivas notas de liquidação.
Pelo exposto, é de nosso parecer que o recurso deve ser julgado totalmente improcedente, na medida em que não resulta existirem factos novos ou novos meios de prova infirmem a matéria de facto fixada e a respectiva solução jurídica (um parecer técnico, salvo melhor opinião, é uma peça que contribui ou pode contribuir para esclarecer o espírito do julgador. É uma peça escrita que se junta ao processo para ser tomada pelo tribunal na consideração que merece. Destina-se a elucidar o tribunal sobre o significado e alcance de factos de natureza técnica cuja interpretação demanda conhecimentos especiais. Em termos processuais penais os pareceres não adquirem a qualidade de juízo científico para os efeitos do disposto no artigo 163.º do Código de Processo Penal. Logo o parecer deve ser apreciado livremente no conjunto da prova produzida. Os documentos que juntarem aos autos são isso mesmo: documentos. Não são relatórios periciais).”
No inerência ao disposto no artigo 454º do Código de Processo Penal, o Meritíssimo Juiz, informa que (fls. 376 a 379): “Nos presentes autos veio o arguido AA requerer a revisão do acórdão proferido a fls. 4120 e ss, datado de 12/01/2017 destes autos, pela qual foi o arguido condenado, pela prática de um crime de lenocínio, um crime de auxílio à imigração ilegal e um crime de detenção de arma proibida, na pena única de dois anos e três meses de prisão, condicionada ao cumprimento de regras de conduta.

O requerimento encontra-se motivado e contém a indicação dos meios de prova e preenche todos os requisitos de forma.

Para efeitos de revisão da sentença, o arguido alega, em síntese, que recepcionou um Parecer de um Revisor Oficial de Contas do qual resulta que o valor do património do arguido, nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013 nunca se cifrou na quantia de € 378.020,09, mas em quantia bastante inferior. Que do preferido Parecer resulta que o rendimento lícito obtido pelo arguido recorrente e que consegue facilmente justificar se cifrou em valor de € 124.786,32.

Acontece que, por motivos de doença, o Revisor Oficial de Contas viu-se impossibilitado de proceder à entrega do Parecer ao Recorrente antes da audiência de julgamento, tendo o arguido tido acesso ao mesmo sempre em data posterior a 28 de Dezembro de 2016. Invoca que este Parecer consubstancia um elemento de prova novo e susceptível de criar dúvidas fundadas acerca da decisão, nos termos do art.º 449.º, n.º 1, al. d), do Código de Processo Penal, que não pode ser ignorado pelo Tribunal.

É através deste Parecer, conjuntamente com elementos que constam já do processo, que o Recorrente pretende demonstrar que o valor do seu património na sua globalidade nunca se cifrou na quantia de € 378.020,09 e que o montante de € 253.233,77 não corresponde ao património incongruente nos termos prescritos do art.º 7.º da Lei n.º 5/2002, de 11 de Janeiro. Que a haver um património incongruente é certamente inferior, conforme o demonstra o parecer agora apresentado. Assevera que de acordo com o Parecer agora exibido, que deveria ser examinado pelo GAB, o rendimento lícito deve ser muito superior a € 124.786,32. Designadamente, porque o GAB não considerou o vencimento acrescido que o arguido efectivamente auferiu no exercício da sua actividade como militar, entre Setembro de 2010 e Março de 2011, altura em que esteve destacado em comissões no estrangeiro, sendo que tais valores não se encontram reflectidos nas declarações de rendimentos dos anos de 2010 e 2011. E assim foi porque tais valores não eram sujeitos a tributação, nem constam dos dados da Segurança Social, mas encontram-se reflectidos nas suas contas bancárias.

Pede que seja concedido provimento ao recurso de Revisão e, em consequência, substituir o Acórdão em crise por outro que decida:

a) pela improcedência do incidente de liquidação na parte em que apura um valor que excede o valor efectivamente proveniente de origem não identificada correctamente avaliado;

b) absolver o Arguido, ora Recorrente, quanto ao pagamento da quantia considerada vantagem provinda de actividade criminosa em que foi condenado, na parte em que excede o valor de origem não identificada correctamente avaliado;

c) pela não manutenção do arresto tal qual se encontrava estabelecido, pelo facto do valor apreendido ser manifestamente superior ao valor de origem não identificada correctamente apurado;

Pede que seja revogado, nesta parte, o Douto Acórdão recorrido.

Por se ter considerado que as diligências de prova eram necessárias, admitiu-se a junção da prova documental apresentada com o recurso.

Respondeu o Ministério Público pugnando pela improcedência do recurso por não existirem factos novos (tais factos novos relativos ao vencimento acrescido não declarado que o arguido terá auferido, já constava alegado nos autos) nem meios de prova novos (uma vez que apenas junta um parecer, mas não junta documentos que sustentem o carácter lícito desse montante que alegadamente recebeu a título de vencimento e que não terá sido considerado, sendo certo que que os rendimentos lícitos que auferiu já se encontravam demonstrados em documentos juntos pelo próprio arguido no apenso C a fls. 705 a 708) que infirmem a matéria de facto fixada, nem a respectiva solução jurídica, na medida em que, entende o Ministério Público, um parecer técnico é uma peça que contribui ou pode contribuir para esclarecer o espírito do julgador, destinando-se a elucidar o tribunal sobre o significado e o alcance de factos de natureza técnica cuja interpretação demanda conhecimentos especiais, mas que não adquirem a qualidade de juízo científico para os efeitos do disposto no art.º 163.º do Código de Processo Penal, pelo que deve ser apreciado livremente no conjunto da prova produzida.

Conclui que, por tais razões, o recurso deve ser totalmente improcedente.

Estabelece-se na mencionada disposição legal que: "1. A revisão de sentença transitada em julgado é admissível quando: (...) d) Se descobrirem novos factos ou meios de prova que, de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo, suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação".

Por factos ou meios de prova novos deve entender-se os que eram desconhecidos dos recorrentes à data do julgamento e não puderam ser apresentados antes deste - neste sentido, Paulo Pinto de Albuquerque, in Comentário do Código de Processo Penal, UCP, pág. 1212.

No caso em concreto, os factos novos - relativos ao vencimento acrescido não declarado mas que o arguido terá auferido -, eram conhecidos do recorrente à data do julgamento e já faziam parte dos autos.

Para melhor esclarecimento, transcrevemos uma parte do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 20-11-2008, processo nº 08P3543, in www.dgsi.pt, que constituindo o recurso de revisão um “remédio excepcional contra decisões transitadas, constitui um compromisso entre os valores da estabilidade e segurança jurídicas, sem os quais nenhum sistema jurídico subsiste, e a salvaguarda da justiça do caso, em ordem a fazer ceder aqueles, mas apenas pontualmente (nos casos taxativamente indicados) e havendo razões muito sérias, perante as exigências da segunda. (…) se o requerente só pode indicar testemunhas novas nessas situações é porque os factos novos, para efeitos de revisão, têm de ser novos também para ele: novos porque os ignorava de todo, ou porque estava impossibilitado de fazer prova sobre eles.”

Ora, no caso vertente, o recorrente não os ignorava e se não pode fazer prova deles à data do julgamento, também não o logrou fazer agora, pois que um parecer, como bem referiu o Ministério Público na sua promoção, explica, desvenda e desmistifica conhecimentos técnicos mas não constitui a prova dos alegados factos novos.

Efectivamente, para que o recorrente pudesse demonstrar rendimentos que não foram considerados e que auferiu licitamente, teria que ter vindo juntar os documentos de suporte que demonstrassem tais valores, o que não o consegue fazer com um parecer. O parecer trabalha os números e explica os fundamentos de uma determinada conclusão técnica, mas não demonstra os factos que estão na base desse parecer.

Sendo assim, concluímos que não existem factos novos trazidos pelo recorrente neste recurso extraordinário de revisão e que não fossem conhecidos à data do julgamento e, por outro lado, não juntou meios de prova novos, que desconhecesse à data do julgamento e que permitam agora colocar graves dúvidas sobre a justiça da condenação.

No caso vertente, os meios de prova invocados pelo recorrente não configuram novos meios de prova, na medida em que, como o próprio afirma e resulta dos autos, já haviam sido indicados em sede de inquérito.

Assim, e seguindo de perto o já citado Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, concluímos que “se o arguido se «esquece» de apresentar certos meios de prova em julgamento ou os negligen-cia, ou se por qualquer outra razão opta por ocultá-los, no prosseguimento de uma certa estra-tégia de defesa, escamoteando-os ao tribunal, caso venha a sofrer uma condenação, não deve obviamente ser compensado com o “prémio” de um recurso excepcional, que se destinaria afinal a suprir deficiências, voluntárias ou involuntárias, da sua defesa em julgamento, sendo de ter por inadmissível o recurso de revisão interposto ao abrigo da al. d) do n.º 1 do art.º 449.º do CPP quando os factos novos alegados sejam já do conhecimento do requerente ao tempo do julgamento.”.

Pelo exposto, por não se verificarem os respectivos pressupostos, designadamente, por em nosso entender não terem sido trazidos novos factos nem meios de prova novos que suscitassem graves dúvidas sobre a justiça da condenação, entende-se que deve ser integralmente negada pelo Supremo Tribunal de Justiça a revisão pretendida pelo recorrente (…).”

O Distinto Magistrado do Ministério Público, neste Supremo Tribunal de Justiça, emitiu diserto parecer em que opina: (sic) 
1) O condenado AA, em 21.03.2019 (fls. 86), veio, nos termos do art. 449.º, n.º 1/d) do CPP, interpor recurso extraordinário de revisão da sentença do Juízo Central Criminal de ... – Juiz 2, do Tribunal Judicial da Comarca do ... Este, proferido em 12.01.2017, nos autos de processo comum [Tribunal Colectivo], transitada em julgado no dia 03.05.2018 (fls. 87), na parte em que julgou procedente o pedido de liquidação para perda ampliada de bens a favor do Estado e, em consequência, o condenou no pagamento da quantia liquidada de € 253.233,77, correspondente ao património incongruente, no prazo de 10 dias a contar do trânsito em julgado da decisão, sob pena de os bens arrestados serem declarados perdidos a favor do Estado.
(….)Emitindo parecer, cabe dizer que a pretensão do recorrente não pode proceder.
O Supremo Tribunal de Justiça tem vindo a considerar que o recurso de revisão é um meio extraordinário de reacção contra sentenças e/ou despachos a elas equiparados transitados em julgado nos casos em que «o caso julgado se formou em circunstâncias patológicas, susceptíveis de produzir injustiça clamorosa. Visa eliminar o escândalo dessa injustiça». [[1]].
Conforme refere Paulo Pinto de Albuquerque [[2]] «só em circunstâncias “substantivas e imperiosas” (substantial compelling) devem permitir a quebra do caso julgado, de modo a que este recurso extraordinário não se transforme em uma “apelação disfarçada”.»
Ou seja, o caso julgado concede estabilidade à decisão servindo, por isso, o valor da segurança na afirmação do direito. No entanto, como o processo tem ainda como fim a realização da justiça, então, não se confere ao caso julgado um valor absoluto devendo este ceder em situações de gravíssima e comprovada injustiça.
O recurso de revisão representa, pois, a procura do adequado equilíbrio entre aqueles dois valores.
No artº 449.º do CPP estão, de forma taxativa, elencados os fundamentos da revisão.
Quanto ao invocado fundamento da alínea d), resulta do preceito que a revisão de sentença transitada em julgado é admissível quando se descobrirem novos factos ou meios de prova que, de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo, suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação.”
Para efeito da alínea d) do nº 1 do artº 449º do CPP, em relação ao que sejam factos novos ou novos meios de prova, a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça tem vindo a considerar que “não é necessário esse desconhecimento por parte do recorrente, bastando que os factos ou meios de prova não tenham sido tidos em conta, no julgamento que levara à condenação, para serem considerados novos" [[3]]
Esta orientação é, porém, com uma limitação: «os factos ou meios de prova novos, conhecidos de quem cabia apresentá-los, serão invocados em sede de recurso de revisão, desde que seja dada uma explicação suficiente, para a omissão, antes, da sua apresentação. Por outras palavras, o recorrente terá de justificar essa omissão, explicando porque é que não pode, e, eventualmente até, porque é que entendeu, na altura, que não devia apresentar os factos ou meios de prova, agora novos para o tribunal». [[4]]
Ora, no caso concreto, não surgiram quaisquer novos factos nem novos meios de prova.
A este propósito, ter-se-á de dizer que os factos relativos à demonstração dos rendimentos que o arguido auferiu já constavam dos autos aquando da audiência de julgamento e o arguido teve oportunidade de se pronunciar sobre eles, antes e no decurso do julgamento.
Efectivamente, resulta dos autos que, após o Ministério Público ter formulado o requerimento de liquidação para perda ampliada de bens a favor do Estado (fls. 634 a 637) - no qual já se descreviam os factos relativos ao rendimento global proveniente de trabalho dependente e de prestações sociais e os relativos ao património incongruente com os rendimentos “lícitos por si obtidos”, elementos baseados nos documentos analisados pelo GRA -, e após ter sido deferido tal procedimento e ordenado o arresto preventivo (fls. 640 a 646), o arguido teve acesso a todos os elementos que constavam do processo. O arguido deduziu oposição ao arresto e juntou documentos que entendeu serem pertinentes. A seguir, foi produzida prova – vide fls. 686, 688, 69, 692, 693 a 696, 705 a 709 e 713.
Apreciadas todas as provas, foi declarado e determinado «para efeitos de perda de bens a favor do Estado, que o valor liquidado e apurado, provisoriamente, a título de vantagem patrimonial da actividade ilícita indiciada, nesta fase, se fixa em € 253.233,77 (duzentos e cinquenta e três mil, duzentos e trinta e três euros e setenta e sete cêntimos), por referência à diferença entre o valor total do património do arguido / oponente e o rendimento disponível (378.20,09€ - 124.786,32€).» E foi mantido o arresto – fls. 715 a 737.

No acórdão recorrido, o tribunal pronunciou-se sobre tais factos e sobre a peticionada perda ampliada de bens (fls. 81 a 84) podendo ler-se que «(…) resulta dos factos provados ser o património total deste arguido, no valor global de €378.020,09, sendo que o rendimento lícito é de €124.786,32. Pelo que se mantem um património no valor de €253,233,77 incongruente com o rendimento lícito, pelo que se presume nos termos da Lei 5/2002 que este tem origem ilícita, sendo certo que nenhuma da factualidade foi alegada, para além da constante do apenso C, nomeadamente em sede de audiência de discussão e julgamento, ou junto ou solicitado qualquer meio de prova por forma a lograr ilidir tal presunção nos termos legalmente enunciados e transcritos supra.»

Portanto, conforme refere o Mmo Juiz na 1ª instância “todos os factos eram conhecidos do recorrente à data do julgamento e já faziam parte dos autos”.

Quanto ao parecer do revisor oficial de contas, não assiste razão ao recorrente quando invoca um meio de prova novo.

De facto, meios de prova são os que se encontram previstos no Código de Processo Penal (arts 128º a 170 do CPP). No que respeita a perícias, só valem como tal as que tenham observado os formalismos dos artigos 151º e seguintes do CPP.

Portanto, conforme bem refere o Ministério Público na 1ª instância, o parecer junto pelo recorrente não tem a força de juízo científico para os efeitos do artº 163º do CPP. [[5]]
Contudo, sempre há a ter em atenção que, como o arguido conhecia os rendimentos que obteve e de que modo os obteve, caso não concordasse com os desenvolvimentos processuais e com a prova produzida em julgamento, poderia ter requerido, ao tribunal, a produção de outros meios de prova que considerasse úteis; Ou podia requerer tempo para juntar outros meios de prova; Ou, até mesmo, ter requerido a junção do parecer que agora invoca; Ou, na impossibilidade de o juntar até ao fim do julgamento, podia justificar tal impossibilidade. E, caso o tribunal não deferisse a sua pretensão, o arguido podia opor-se através dos meios ordinários de defesa.
­­­­Se não o fez, não poderá usar, agora, o recurso de revisão como meio processual para o fazer.
De qualquer modo, importa dizer que, em face das motivações e conclusões, o que nota é que o recorrente se insurge quanto à forma como o tribunal de 1ª instância baseou a sua convicção e apreciou a prova que levou à declaração de perda alargada de bens e à manutenção do arresto.
Note-se que o que o recorrente alega é que “os elementos referentes à sua situação económico-financeira não foram analisados devida e rigorosamente pelo Gabinete de Recuperação de Activos” e que, por assim o entender, “solicitou a emissão de um Parecer junto do Revisor Oficial de Contas, o qual, de forma independente, rigorosa e autónoma, procedeu ao estudo e exame dos mesmos elementos que foram analisados – ou, pelo menos, deveriam ter sido – pelo Gabinete de Recuperação de Activos – Delegação do Norte, respeitantes aos anos de 2010, 2011, 2012, 2013 e 2014.”
Aliás, a sua alegação, no que tange a tal questão, está toda ela feita como se tratasse de uma impugnação no âmbito de um recurso ordinário.
Ou seja, o que pretende, agora, é uma repetição do julgamento onde se volte a discutir a questão da perda alargada de bens a favor do Estado, o que manifestamente não é possível.
Para além disso, no que respeita ao segundo segmento da alínea d), concorda-se com Paulo Pinto de Albuquerque quando sustenta que «as graves dúvidas sobre a “justiça da condenação” dizem respeito à imputação do crime (ou de um dos crimes, em caso de concurso de crimes) e à determinação das sanções principais e acessórias, bem como à atribuição de indemnização civil)».[[6]]
Neste sentido o Supremo Tribunal de Justiça decidiu que «será injusta a sentença que, mercê do desconhecimento de determinados factos ou meios de prova, relevantes para a condenação ou a absolvição do arguido e/ou demandado, condene em pena principal ou acessória, ou no pedido civil, quando decidiria em sentido oposto (absolvição) no caso de conhecer esses factos.» [[7]]
Também no acórdão do STJ de 5 de Novembro de 1998 se explicita que os factos «a que se refere o artº 449º nº 1 al. d) do CPP são os que, compondo o crime, devem constituir o tema da prova e os meios da prova são constituídos pelas provas que se destinam a demonstrar a verdade de quaisquer factos, ou que constituem o crime, ou que indiciam a existência ou inexistência do crime (…).» [[8]]
Ora, o instituto da perda alargada de bens a favor do Estado, previsto nos artigos 7º e 8º da mencionada Lei, tem vindo a ser considerado como uma sanção administrativa no sentido de que não tem nada a ver com o crime. [[9]]
Ou seja, é tida «como sanção não penal (…) o respectivo procedimento é autónomo, iniciando-se por um acto autónomo (a liquidação), possuindo uma estrutura própria, pelo menos probatória, de índole radicalmente diversa da do processo principal. Do ponto de vista procedimental, estamos pois perante dois processos distintos, autónomos, muito embora umbilicalmente ligados, desencadeados pelo mesmo facto, o indício da prática de um crime de catálogo, juntos numa mesma audiência. Dir-se-ia que no processo criminal, ou seja, no processo principal, se enxerta um outro processo de natureza distinta; no primeiro debate-se questão pena, no segundo questão administrativa, ou seja, ao procedimento criminal junta-se questão incidental relativa à aplicação de sanção administrativa». [[10]]
Conforme se pode ler no Acórdão do STJ, de 14.03.2018 [[11]] «”a perda alargada” não constitui uma sanção penal, pois que “a sua causa não é um facto típico, ilícito e culposo punível, mas sim um património incongruente acoplado a indícios da prática de certos crimes (a “actividades criminosas”)”; configura-se, assim, como uma medida “de natureza materialmente administrativa aplicada por ocasião de um processo penal”, que pressupõe uma condenação penal que lhe é anterior. (…) A decisão que ordena a perda alargada não é uma decisão condenatória, uma decisão que aplica uma pena ou uma medida de segurança.»
Por último, no acórdão nº 392/2015, do Tribunal Constitucional afirma-se que «a presunção de proveniência de determinados bens e a sua eventual perda em favor do Estado não é uma reacção pelo facto de o arguido ter cometido um qualquer acto criminoso. Trata-se, antes, de uma medida associada à verificação de uma situação patrimonial incongruente, cuja origem licita não foi determinada, e em que a condenação pela prática de um dos crimes previstos no artigo 1º da Lei nº 5/2002, de 11 de Janeiro tem apenas o efeito de servir de pressuposto desencadeador da averiguação de uma aquisição ilícita de bens. (…) Só haverá perda de bens em favor do Estado desde que exista condenação do arguido, transitada em julgado, por um dos crimes referidos no artigo 1º do diploma”.
Também a propósito do regime jurídico desta sanção, explica Damião da Cunha que «a declaração de perda trata-se de uma “execução” (o arresto é uma garantia de execução), e, por isso, um subterfúgio de que o legislador se mune para garantir a factibilidade da execução (…)». E que «consiste num verdadeiro confisco e é uma sanção puramente objectiva (é um procedimento in rem). Com efeito, a sua determinação (melhor dizendo, a sua quantificação) é baseada num cálculo patrimonial, matemático, não relevando, em medida alguma, quer a gravidade do ilícito, quer a gravidade da pena ou sequer o grau de participação do condenado». [[12]]
Ora, como vimos, com o presente recurso, o recorrente não põe em causa a sua condenação penal pelo crime de lenocínio (crime do catálogo). Na realidade, na sequência de ter sido julgado procedente a liquidação efectuada pelo Ministério Público, nos termos da Lei nº 5/2002, de 11.01, o que o recorrente põe em causa é a sua condenação no pagamento da quantia liquidada e correspondente ao património incongruente, sob pena de os bens arrestados serem declarados perdidos a favor do Estado.
Refere o recorrente que “é o montante apurado em sede de incidente de liquidação e a consequente condenação ao pagamento da quantia de €253.233,77 (duzentos e cinquenta e três mil, duzentos e trinta e três euros e setenta e sete cêntimos) que suscita o presente Recurso de Revisão, considerando o Recorrente que o valor é incorrecto e sem qualquer correspondência com a realidade”.
Assim, incidindo a questão colocada pelo recorrente sobre a perda de bens e a manutenção do arresto - não sobre factos ou meios de prova que levaram à condenação pela prática de um crime -, conclui-se que, fosse como fosse, o alegado “meio de prova novo” em nada modificaria a condenação do arguido pelo crime e pena que lhe foi imputado.
O mesmo será dizer que, não constituindo prova que se destine a demonstrar a verdade de quaisquer factos que constituam crime ou que indiciem a existência ou inexistência de crime, não faria suscitar dúvidas sobre a justiça da condenação.
5) Em face do exposto, porque não se mostram reunidos, os fundamentos para considerar o presente caso abrangido pela previsão do artigo 449.º, n.º 1/d) do Código de Processo Penal – e/ou de qualquer dos demais segmentos do mesmo preceito, deve ser negada a pretendida revisão.”
I.b). – QUESTÃO A MERECER APRECIAÇÃO.
Para a pretensão impetrada, exsurge como singela questão a dirimir saber se o parecer/consulta apresentada pelo arguido se constitui como novidade para o caso julgado e, se sim, se a sua substancialidade probatória é susceptível, capaz e apta a criar uma dúvida séria e insolúvel quanto à justiça da decisão (condenatória) firme e passada em julgado. 
II. – FUNDAMENTAÇÃO.
II.a). – ELEMENTOS A CONSIDERAR PARA A DECISÃO.
- O arguido, AA, foi sujeito a julgamento, em processo comum, sob acusação formulada pelo Ministério Público (cfr. fls. 168 a 192, iterada de fls. 553 a 581) [[13]], e viria a ser condenado, por acórdão proferido no Tribunal Judicial da Comarca de ... Este, Juízo Central Criminal de ... – Juiz 2, datado de 12 de Janeiro de 2017, pela prática de um (1) crime de lenocínio Previsto e punido pelo artigo 169º, nº 1 do Código Penal na pena de dois (2) anos de prisão; pela prática, em autoria material, de um (1) crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelo artigo 86º, nº 1, alínea d) da Lei nº 5/2006, na pena de nove (9) meses de prisão; e pela prática, em autoria material, de um (1) crime de auxilio à emigração ilegal previsto e punido pelo artigo 183º, nºs 1 e 2 da Lei nº 23/2007, na pena de um (1) ano e dois (2) meses de prisão; e ainda numa coima de € 500,00 pela prática da contra-ordenação prevista pelo artigo 11ºA, nº 1 e 97º, nº 1 da Lei 5/2006;
Em cúmulo jurídico das penas aplicadas foi imposta ao arguido, AA, a pena única de dois (2) anos e três (3) meses;
A pena imposta foi suspensa pelo mesmo período, sujeito às regras de conduta elencadas a fls. 159. (cfr. fls. 48 a 85 e 88 a 163) (Entretanto, o Tribunal informou – cfr. fls. 392 vº - de que “por não terem sobrevindo quaisquer razões que determinem, à luz do artigo 56º do CP, a revogação da suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido, ao abrigo do artigo 57º, nº 1 do CP, declaro extinta a pena de prisão, suspensa na sua execução, a que o arguido foi condenado.”    
(A decisão de facto que sustentou a narrada decisão condenatória comporta a facticidade que infra se deixa transcrita. Expurgou-se da transcrição a matéria relativa às condições pessoais de cada um dos arguidos, o rol de objectos relacionados nos autos de busca efectuados pelo órgão de polícia criminal (SEF) aos apartamentos onde era praticada a prostituição, a identificação das mulheres que utilizavam os apartamentos anexos ao bar para se prostituírem, a matéria de facto relativa aos demais arguidos involucrados na actividade delitiva, bem como da matéria de facto não provada. Não se circunscreve/confina a factualidade a transcrever ao âmbito do recurso – perda ampliada bens a favor do Estado – por se entender que a demais facticidade (transcrita) permite o enquadramento, ilustra e esmerila a actividade delitiva donde terão provindo os bens achados incongruentes do arguido AA).
De relevante para a decisão da causa, resultou provada a seguinte matéria de facto:
1. Em data não concretamente apurada, mas sempre anterior ao mês de Novembro de 2012, os arguidos AA e Manuel Joaquim Esteves delinearam entre si um plano, tendo em vista o fomento e facilitação do exercício da prostituição de várias mulheres, de diversas nacionalidades, no estabelecimento comercial denominado "Kiss Hot Night Club", sito na Rua Costeira da Pereirinha, n.ºs 419 a 421, na freguesia de Macieira da Lixa, no concelho de Felgueiras, na área desta comarca de ... Este.
2. Para tal, acordaram entre si que o fomento e prática de tal actividade ocorreria na moradia e no prédio contíguo a esta, sito na Rua Costeira da Pereirinha, n.º s 419 a 421, na freguesia de Macieira da Lixa, no concelho de Felgueiras, pertencentes ao arguido Manuel Joaquim Esteves.
3. Assim sendo, no dia 01-11-2012, o arguido Manuel Joaquim Esteves celebrou com o arguido AA, um contrato de arrendamento para comércio, por um período de cinco anos, relativo ao rés-do-chão do prédio urbano, inscrito na matriz urbana sob o artigo 775, sito na Rua Costeira de Pereirinha, nº 419, na freguesia de Macieira da Lixa, no concelho de Felgueiras, tendo no mesmo figurado com o arrendatário Pedro Filipe Monteiro da Silva a pedido do arguido AA, local onde o arguido AA passou a explorar, a partir de tal data e até ao dia 15-02-2015, o estabelecimento de bar com espaço de dança "Kiss Hot Night Club", mediante o pagamento ao arguido Manuel Esteves de uma renda mensal no valor de 500,00€.
4. Acresce que o arguido Manuel Esteves entregou, na mesma data, de forma não concretamente apurada, ao arguido AA seis apartamentos, que integram o edifício contíguo ao estabelecimento de bar, sito na Rua Costeira da Pereirinha, n.ºs 421, na freguesia de Macieira da Lixa, no concelho de Felgueiras, compostos por vários quartos, onde com conhecimento e permissão dos arguidos AA e Manuel Joaquim Esteves, várias mulheres, de diversas nacionalidades, nomeadamente romenas e brasileiras, mantinham relações sexuais com os clientes do estabelecimento "Kiss Hot Night Club", a troco de dinheiro.
5. Sucede que, tendo em vista aumentar o número de quartos disponíveis em tais apartamentos para a prática por tais mulheres da prostituição, a saber no - 1.° Direito, 2.° Direito, 2.° Traseiras, 3.° Esquerdo, 3.° Direito e 3.° Traseiras - cuja construção foi efectuada sem licença de construção e sem as respectivas licenças de habitabilidade emitidas pela Câmara Municipal de Felgueiras, os arguidos AA, Pedro Silva e Manuel Esteves efectuaram obras no seu interior, aumentando o número de quartos disponíveis, dividindo para o efeito as salas e os quartos já existentes, sendo que no dia 15-02-2015, os seis apartamentos dispunham, no total, de 20 quartos para a prática de actos de prostituição.
6. Neste seguimento, o arguido AA, pelo menos desde o início de Janeiro de 2013 até ao dia 15.02.2015 dedicou-se à exploração do estabelecimento "Kiss Hot Night Club" onde mulheres de diferentes nacionalidades, nomeadamente romenas e brasileiras, se dedicavam à prática de alterne e angariavam clientes para a prática da prostituição nos apartamentos contíguos àquele estabelecimento, os quais utilizavam mediante o pagamento ao arguido Daniel de €20,00 diários.
7. Por seu turno, o arguido Manuel Esteves, no mesmo período, recebia as rendas do estabeleci-mento "Kiss Hot Night Club" e apartamentos contíguos onde se praticavam os factos descritos em 6., o que era do seu conhecimento.
8. Ora, desde o início de Janeiro de 2013 até ao dia 15-02-2015, o arguido AA, manteve a trabalhar no interior de tal estabelecimento, o qual se encontrava aberto ao público todos os dias, no período compreendido entre as 15 horas e as 19 horas e as 22 horas e as 4 horas, diversas mulheres, num número diário não concretamente apurado, mas próximo de 20 aos fins de semana e férias.
9. No estabelecimento "Kiss Hot Night Club" eram organizadas as seguintes funções: a) - ao arguido Daniel Filipe Teixeira: receber telefonemas e mensagens escritas de várias mulheres prostitutas através do seu telefone com o número 910910927 e recrutá-las para trabalhar no "Bar Kiss", distribuir as mulheres pelos vários quartos dos seis apartamentos estabelecer as regras de funcionamento do estabelecimento - horário de abertura, horário de trabalho das mulheres, os pagamentos "de copos" das prostitutas, as folgas das prostitutas, controlando o funcionamento do estabelecimento através dos contactos telefónicos estabelecidos com os arguidos, Tiago Teixeira e loana Vaduva e através das imagens a que acedia no seu telemóvel captadas pelo sistema de videovigilância que instalou no interior do bar, sendo este arguido quem dava todas as indicações e ordens àqueles arguidos para o funcionamento do bar e sobre o trabalho de alterne das mulheres, deslocando-se ao mesmo, com pouca frequência e após o encerramento do mesmo;
10. b) - Ao arguido Pedro Filipe Monteiro da Silva: desempenhar as funções de segurança do bar, controlar o acesso dos clientes ao bar, entregar cartões de consumo, prestar segurança às mulheres prostitutas e aos arguidos;
11. c) - aos arguidos Tiago Teixeira e loana Vaduva: dirigir toda a actividade do estabelecimento de acordo com as instruções transmitidas pelo arguido AA, receber as mulheres no bar e nos respectivos quartos e explicar-lhes as regras de funcionamento do estabelecimento, manter no estabelecimento o equipamento necessário ao exercício do alterne e nos quartos equipamento necessário ao funcionamento do prostíbulo, especificamente lençóis, cobertores e almofadas, permanecer diariamente no estabelecimento, comunicar diariamente e por diversas vezes, por telefone, com o arguido AA, informando-o do número de clientes que se encontravam no estabelecimento, o número de mulheres que estão a trabalhar, proceder ao registo diário do número de mulheres a trabalhar no estabelecimento e o movimento da caixa, controlar os pagamentos da taxa "diária" através do preenchimento diário de um mapa elaborado pelo arguido AA para o efeito, registar o número de "subidas" aos quartos efectuado pelas mulheres com os clientes, receber os pagamentos das bebidas consumidas pelos clientes e pelas mulheres e marcadas nos cartões de consumo dos clientes, controlar a porta de emergência corta-fogo que permite o acesso ao edifício composto pelos seis apartamentos e, no final do dia, proceder à cobrança ou ao acerto das "diárias" devidas pelas mulheres prostitutas.
12. E, para permitir o fomento e a facilitação da actividade de prostituição no estabelecimento "Kiss Hot Night Club", o arguido AA organizou o mesmo da seguinte forma:
13. No acesso ao interior do estabelecimento há um segurança - o arguido Pedro Silva, que fornece um cartão de consumo, permitindo o acesso dos clientes, homens, a dois salões, onde existe um bar, uma cabine de som e zonas de dança, destinadas a shows de cariz erótico e a zonas de convívio.
14. Quando acedem a ter relações sexuais com as mulheres, o cliente e a mesma atravessam o salão principal, passam em frente da caixa registadora, onde entregam ao arguido Tiago Teixeira e/ ou loana Teixeira o cartão de consumo, o cliente paga o valor do cartão de consumo e saem do estabelecimento pela porta de emergência que existe na extremidade oposta ao balcão/bar, que acede ao parque de estacionamento e edifício de apartamentos contíguo ao Bar, regressando, posteriormente, à mesma zona de bar, onde o cliente recolhe, querendo, um outro cartão de consumo, sendo que a mulher fica livre para outro cliente.
15. Os vinte quartos onde são praticados os actos de prostituição localizam-se no prédio contíguo, composto por seis apartamentos, com uma porta de entrada à face da via pública e uma segunda entrada à cota superior, nas traseiras do edifício e acessível através do parque de estacionamento que serve o salão principal.
16. As mulheres, tal como contratado e determinado pelo arguido AA, vestem-se com roupas muito curtas, decotadas e insinuantes, esperam os clientes, todos do sexo masculino, na zona do bar, abordam-nos à medida que chegam, sugerem-lhes o consumo de bebidas, bem como o pagamento pelos clientes às mesmas de uma bebida, cujo preço revertia numa parte para as mulheres e mostram-se disponíveis para com eles terem relações sexuais, mediante o pagamento pelos clientes de um valor mínimo de 20,OO€.
17. O pagamento de tais quantias era efectuado pelos clientes às próprias mulheres com quem mantinham relações sexuais.
18. Cada mulher tinha associado um número escrito no cartão de consumo do cliente, número atribuído pelo arguido AA, ou pelos arguidos Tiago Teixeira e/ou loana Vaduva a mando e de acordo com as indicações daquele.
(…) [[14]] 20. Para tal, todas as mulheres que se prostituíam no prédio contíguo ao estabelecimento "Kiss Hot Night Cub", por forma a criar na comunidade em geral a ideia de que as mesmas estavam regularmente alojadas nos referidos apartamentos, o arguido AA elaborou um contrato de arrendamento temporário de quarto habitacional, assumindo a qualidade de senhorio o arguido Manuel Esteves e de arrendatário as mulheres, contrato que era entregue a todas as mulheres, quando chegavam ao estabelecimento pela primeira vez pelo arguido AA, ou alguém a seu mando e depois de assinado por aquelas, a este devolvido.
(…) 23. Acresce que, quando chegavam ao referido estabelecimento para trabalhar, todas as mulheres eram informadas pelo arguido AA, ou pelos arguidos Tiago Teixeira e loana Vaduva a mando daquele, das opções por este definidas para desempenharem o seu trabalho e pelas mesmas a cumprir, a saber:
24. As mulheres que trabalhassem no período da tarde tinham direito ao valor dos dois primeiros copos, sendo que, a partir daí, recebiam metade do preço das bebidas, revertendo a outra metade para o estabelecimento.
25. À noite, o valor das bebidas era dividido na proporção de 50% para a mulher e 50% para o estabelecimento.
26. Cada mulher pagava € 20,00 diários pelo uso do apartamento, valor que era pago, no final de cada noite, por acerto de contas com o que cada uma tinha a receber da actividade de alterne.
(…) 42. No dia 15-02-2015 encontravam-se, na posse e disponibilidade dos arguidos e das mulheres que ali se prostituíam, entre o mais, os seguintes objectos:
(…) 109. O arguido AA bem sabia que para deter os mencionados objectos: bastão extensível, soqueira e reprodução de arma de fogo automática, como efectivamente detinha nas circunstâncias supra descritas, necessitava de ser titular de autorização especial emitida pela autoridade competente, a Polícia de Segurança Pública, o que não era.
110. Sabia ainda o arguido AA que para deter os objectos: facas e machada, como efectivamente detinha, as mesmas eram armas brancas, sendo as mesmas, considerando a sua natureza e características aptas a ser usadas como arma de agressão e o arguido não justificou a sua posse, pelo que não as podia ter na sua posse, como efectivamente detinha.
111. O arguido AA agiu com a intenção de deter e guardar as armas referidas, cuja natureza e características bem conhecia, muito embora não se encontrasse munido da necessária autorização especial, nem justificasse a sua posse, a qual sabia ser necessário, o que lhe foi indiferente.
(…) 117. Com a referida actividade de fomento e facilitação da prostituição, o arguido AA, no período compreendido entre Janeiro de 2013 e 15-02-2015, auferiu rendimentos no valor global de pelo menos 169.600,00€.
118. O arguido AA agiu sempre livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que ao admitir e levar mulheres que se dedicavam à prostituição para o estabelecimento "Kiss Hot Night Club", como efectivamente fazia, estava a estimular como era a sua intenção a prática de relações sexuais a troco de dinheiro, com o propósito de obtenção de lucros, estando igualmente ciente que ao aproveitar-se economicamente dos relacionamentos sexuais mantidos por tais mulheres atentava contra a dignidade destas, enquanto pessoas humanas, o que lhe era indiferente.
(…) 120. Os arguidos AA e Manuel Esteves, ligados por uma finalidade comum, o fomento e facilitação da prática da prostituição em tal estabelecimento e edifício contíguo, e obtenção de lucros com tal actividade, actuaram sempre em comunhão e conjugação de esforços, planeando a forma de agir e os meios empregues.
121. Os arguidos Tiago Teixeira e loana Vaduva ao colaborarem com o arguido AA e Manuel Esteves, nomeadamente, permanecendo no Bar, fiscalizando o seu funcionamento, controlando e orientando a actividade das mulheres, transmitindo àqueles arguidos as vicissitudes no funcionamento do Bar, recebendo das mulheres os valores das "diárias" respectivas, prestaram auxílio ao funcionamento do Bar e à prática da prostituição.
(…) 123. Os arguidos AA, Manuel Joaquim Esteves, Tiago Manuel Soares Teixeira e loana Vaduva agiram de forma livre, voluntária e consciente, com conhecimento de que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei, não se abstendo, porém, de assim actuar.
124. O arguido AA foi constituído como tal a 15 de Fevereiro de 2015.
125. O arguido AA teve como rendimento global declarado, proveniente de trabalho dependente e de prestações sociais, juntamente com a sua companheira, nos seguintes períodos:
126. - no ano de 2010 - o valor de 14.711 ,27€; 127. - no ano de 2011- o valor de 22.435,28€; - 128. - no ano de 2012- o valor de 18.016,94€; 129. - no ano de 2013 - o valor de 18.076,80€; 130. - no ano de 2014- o valor de 8.557,41€; - 131. - no ano de 2015 - o valor de 52.329,71€ (a titulo de rendimento independente)
132. O arguido declarou, conjuntamente com Cristiana Sofia Marques Lapa, sua companheira, nos anos de 2010 a 2013 e no ano de 2014, a título individual, e sujeito a tributação, perante a administração tributária: - 133. - no ano de 2010- o valor global de 11.530.28€; - 134. - no ano de 2011- o valor global de 8.634,96€; - 135. - no ano de 2012- o valor global de 5.475,34€, - 136. - no ano de 2013- o valor global de 3.110,00€; - 137. - no ano de 2014- o valor global de 8.577,41€.
138. O arguido possui o seguinte património: É titular dos produtos financeiros descritos a fls. 414 do apenso C - cujo teor se dão como reproduzidos - tendo sido efectuado pelo arguido AA, nas respectivas contas bancárias os seguintes movimentos a crédito (movimentos a crédito, equivalente às entradas a crédito nas instituições bancárias, expurgadas as situações de estamo, movimentações entre contas tituladas pelo suspeito e créditos bancários), respectivamente:
139. - no ano de 2010 - o valor de 46.833,82€; - 140. - no ano de 2011 - o valor de 51.189,82€; - 141. - no ano de 2012 - o valor de 46.073,43€; - 142. - no ano de 2013 - o valor de 48.027,76€; - 143. - no ano de 2014 - o valor de 33.195,99€.
144. No ano de 2011, o arguido AA adquiriu o motociclo, de marca Honda, modelo CBR 600 FS, com a matricula 28-32-RR, estimado/avaliado no valor de €4.500,00;
145. No ano de 2010, adquiriu, com reserva de propriedade, o veículo de marca BMW, modelo 560L Série 5, com a matrícula 39-JB¬30, avaliado no valor de €18.000,00.
146. No dia 15-02-2015, o arguido AA tinha na sua posse, no interior da habitação sita na Rua da Costa, nº 513, no concelho de Amarante, a si pertencente, no interior de um cofre, o montante global de 130.200,00€ (cento e trinta mil e duzentos euros), em notas do Banco Central Europeu, valor que se encontra apreendido nestes autos.
147. Ao arguido, no total, foi-lhe apreendido/arrestado a quantia de 134.290,00€ (cento e trinta e quatro mil, duzentos e noventa euros);
148. O património total do arguido apurado ascende a 378.020,09€, do qual o montante de 124.786,32€ corresponde aos rendimentos lícitos obtidos pelo arguido [rendimento disponível parcial + nota de liquidação de IRS, referente aos anos de 2010 a 2014], correspondendo a vantagem patrimonial da actividade ilícita apurada no valor de €253.233,77 (duzentos e cinquenta e três mil, duzentos e trinta e três euros e setenta e sete cêntimos).
(…) A matéria atinente à liquidação foi determinada com base na análise da documentação junta ao apenso C, nada tendo sido alegado ou trazido aos autos pelo arguido no âmbito da audiência de discussão e julgamento, que o contrariasse.”
- Foi ordenado, e veio a ser organizado, pelo gabinete da Policia Judiciária – cfr. fls. 372 a 594 e 589 a 632) –, procedimento para recuperação de activos;
- O Ministério Público impulsionou, junto do Juízo de Instrução da Instância Central de Instrução Criminal de ..., procedimento para Liquidação de Perda Ampliada de Bens a Favor do Estado e arresto preventivo em que era pedido (sic): “A - deve o valor de € 253.233,77, ser declarado perdido a favor do Estado, por corresponder ao valor do património incongruente com rendimento licito, e, consequentemente, o arguido AA, condenado a pagar ao Estado esse montante; B – ser decretado arresto de todos e quaisquer bens que sejam encontra-dos em poder do arguido, dele pertença, que sejam suficientes para garantir o pagamento dessa quantia, designadamente, a viatura e aquantia monetária apreendida à ordem desse processo, bem como o motociclo supra referido e ainda os valores constantes nas contas bancárias de que é titular e que se encontram identificadas a fls. 414”. – cfr. fls. 634 a 637;
- Por decisão do Juiz de Instrução Criminal – Juiz 1, da Comarca de ... ..., datada de 6.11.2015, foi decidido julgar o pedido de arresto preventivo de todos e quaisquer bens pertencentes ao arguido, AA – cfr. fls. 640 a 646;
- O arguido deduziu oposição ao arresto – cfr. fls. 688 e 689 – e depois de ter produzida prova em audiência de julgamento – cfr. fls. 693 a 696 e 713 e 714 – bem como prova documental, constantes de recibos de vencimento emitidos pelo Ministério da Defesa Nacional em nome de AA – cfr. fls. 705 a 708 – foi proferida decisão (fls. 715 a 737), em que (sic): “para efeitos de perda de bens a favor do Estado, que o valor liquidado e apurado, proviso-riamente, se fixa em € 253.233,77 (duzentos e cinquenta e três mil e trinta e três euros e setenta e sete cêntimos), por referência à diferença entre o valor total do património do arguido/oponente e o rendimento disponível (€ 378.020,09-124.786,32); - que se mantém o arresto de todos e quaisquer bens (móveis e imóveis) encontrados na posse do arguido, dele pertencentes, suficientes para acautelar o pagamento da quantia de 253.233,77 (duzentos e cinquenta e três mil e trinta e três euros e setenta e sete cêntimos), entre eles, os bens arrestados: a) um motociclo, de marca Honda, modelo CBR 600 FS, com a matrícula ...-RR; b) um automóvel de marca BMW, modelo 560I, com a matrícula ...-JB- ...; c) quantia monetária arrestada no valor total de € 134.290,00 (cento e trinta e quatro mil e duzentos e noventa euros), em notas do Banco Central Europeu.”             
II.b). – PRESSUPOSTOS DE QUE DEPENDE A REVISÃO DE UMA SENTENÇA.

A lei fundamental consagra, no Título II, Capítulo I, referente aos direitos liberdades e garantias pessoais, e na parte concernente à aplicação da lei penal, “o direito a não sofrer uma condenação sem culpa (nullum crimen sine culpa), o direito a não sofrer uma pena não prevista na lei (nullum crimen sine lege) “o direito a um processo justo (nullum crimen sine processu)” [[15]], o direito à revisão da sentença penal condenatória – cfr. artigo 29º, nº 6 da Constituição da República Portuguesa. [[16]]

A realização de fins processuais como a descoberta da verdade e realização da justiça, obtenção da segurança e da paz jurídica e protecção dos direitos individuais, são comumente aceites nas ordens jurídicas de pendor democrático e cotejando e ombreando com o valor, igualmente prevalente, da segurança jurídica em que se plasma e acrisola o instituto do caso julgado. [[17]]  

A procura, e necessidade, de que a cada caso que seja submetido a julgamento corresponda uma efectiva e material-substantiva decisão justa encontra amparo na ideia de realização da justiça inerente ao adequado funcionamento das organizações jurisdicionais em que se desdobra o poder de Estado. Nesta perspectiva, admitindo a possibilidade de não materialização efectiva, em todos os casos, de uma efectiva correspondência de julgamento justo de um caso, abarcando todos os elementos, pessoais e materiais, que permitam a total percepção e compreensão do caso submetido a avaliação, a lei, na concretização do princípio de nullum crime sine culpa, admite que, depois de passado em julgado uma sentença, se possa reabrir o caso/processo e operar a revisão do caso. [[18]]

Justificando a necessidade de o sistema de justiça encontrar uma congruência entre a segurança e paz jurídica e a justiça real e material que se espera no desenvolvimento da actividade judiciária estimou-se em acórdão deste Supremo Tribunal, relatado pelo Conselheiro Santos Cabral, (sic): “Uma decomposição do normativo revela o facto de o mesmo pretender atingir o equilíbrio entre dois conceitos caros ao processo penal: - por um lado o direito a uma decisão justa, que faz parte do património de qualquer cidadão, e, por outro, a necessidade de revestir a mesma decisão judicial da estabilidade que conforta a certeza e segurança da definição jurídica e social.

Por alguma forma Figueiredo Dias nos dá notícia da necessidade de superação desta antinomia referindo que a justiça é, por certo, fim do processo penal, no sentido de que este não pode existir validamente se não for presidido por uma directa intenção ou aspiração de justiça. Isto não obsta, porém, a que institutos como o do «caso julgado», ou mesmo princípios como o “in dubio pro reo”, indiscutivelmente de reconhecer em processo penal, possam conduzir, em concreto, a condenações e absolvições materialmente injustas. Continuar a afirmar, perante hipóteses destas, que a justiça foi, em absoluto, fim do processo penal respectivo, pode ser, ainda, ideal e teoreticamente justificável- v. g. porque se argumente que as exigências de segurança surgem ainda como particular modus de realização do Direito e, por conseguinte, do «justo», quando este se lança no contexto amplo de todos os interesses sociais conflituantes -, mas é também, seguramente, renunciar à obtenção de um critério prático adequado de valoração das normas e problemas processuais.

Mais adianta o mesmo Mestre que também a segurança é fim do processo penal O que não impede que institutos como o do «recurso de revisão» contenham na sua própria razão de ser um atentado frontal àquele valor, em nome das exigências da justiça. Acresce que só dificilmente se poderia erigir a segurança em fim ideal único, ou mesmo prevalente, do processo penal. Ele entraria então constantemente em conflitos frontais e inescapáveis com a justiça; e, prevalecendo sempre ou sistematicamente sobre esta, pôr-nos-ia face a uma segurança do injusto que, hoje, mesmo os mais cépticos têm de reconhecer não passar de uma segurança aparente e ser só, no fundo, a força da tirania aos puros valores da «justiça» e da «segurança», não cedendo à tentação fácil de os absolutizar: é um facto comprovado nada haver de mais perigoso que a absolutização de valores éticos singulares, pois aí se inscreverá a tendência irresistível para uma santificação dos meios pelos fins. Importa sim reconhecer que se está aqui, como em toda a autêntica «questão-de-direito», mesmo no cerne de uma ponderação de valores conflituantes, cujo resultado há-de corresponder ao ordenamento axiológico do Direito, há-de constituir a síntese das antinomias entre justiça e segurança encontrada no degrau mais elevado da ordem jurídica. De novo, porém, surge a pergunta: como tirar desta verificação um critério prático prestável para a valoração das singulares normas e problemas processuais?

Se persistirmos em traduzir numa fórmula o resultado da ponderação de valores que no processo penal conflituam, cremos que, com razoável exactidão, poderemos ver o fim do processo penal em obstar à insegurança do direito que necessariamente existe «antes» e «fora» daquele, declarando o direito do caso concreto, i. é, definindo o que para este caso é, hoje e aqui, justo. O processo penal, longe de servir apenas o exercício de direitos assegurados pelo direito penal, visa a comprovação e realização, a definição e declaração do direito do caso concreto, hic et nunc válido e aplicável.

Esta necessidade de justiça no caso concreto e de superação de situação que encerra uma insuportável violação da mesma leva o legislador á consagração do recurso de revisão, prevendo a quebra do caso julgado e, portanto uma severa limitação ao princípio de segurança jurídica inerente ao Estado de Direito. Porém, como se referiu só circunstâncias “substantivas e imperiosas” devem permitir a quebra de caso julgado por forma a que este recurso extraordinário não se revele numa apelação “disfarçada”  

Como refere o acórdão 376/2000 do Tribunal Constitucional trata-se aí de uma exigência de justiça que se sobrepõe ao valor de certeza do direito, consubstanciado no caso julgado. Este é preterido em favor da verdade material, porque essa é condição para a obtenção de sentença que se funde na verdade material, e nessa medida seja justa. O julgamento anterior, em que se procurou, com escrúpulo e com o respeito das garantias de defesa do arguido, obter uma decisão na correspondência da verdade material disponível no momento em que se condenou o arguido, ganha autonomia relativamente ao processo de revisão para dele se separar.

No novo processo não se procura a correcção de erros eventualmente cometidos no anterior, e que culminou na decisão revidenda, porque para a correcção desses vícios terão bastado, e servido, as instâncias de recurso ordinário, se acaso tiverem sido necessárias. Isto é, os factos novos do ponto de vista processual e as novas provas, aquelas que não puderam ser apresentadas e apreciadas antes, na decisão que transitou em julgado, são o indício indispensável para a admissibilidade de um erro judiciário carecido de correcção. Por isso, se for autorizada a revisão com base em novos factos ou meios de prova, haverá lugar a novo julgamento (cf. artigo 460º do CPP), tal como, nos casos em que for admitida a revisão de despacho que tiver posto ao processo, o Supremo Tribunal de Justiça declara sem efeito o despacho e ordena que o processo prossiga, obviamente que no tribunal a quo (artigo 465º).

Compreende-se a esta luz que a lei não seja permissiva ao ponto de banalizar e, consequentemente, desvalorizar a revisão, transformando-a na prática em recurso ordinário, endoprocessual neste sentido – a revisão não pode ter como fim único a correcção da medida concreta da pena (nº 3 do artigo 449º) e tem de se fundar em graves dúvidas lançadas sobre a justiça da condenação.” [[19]/[20]]

Na materialização desse propósito, a lei processual penal inculca, no artigo 449º, a possibilidade de revisão de uma sentença penal, quando (entre outras situações), “se descobrirem novos factos ou meios de prova que, de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo, suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação.” – cfr. alínea d) do citado preceito. [[21]]

A dogmática jurídica divide-se quanto à natureza jurídico-conceptual com que se deve crismar este tipo de impugnação das decisões judiciais, propendendo uns para o qualificar como uma acção, outros como recurso e outros ainda como um misto de acção e recurso. (“Para uns será uma acção; para outros, um recurso; ainda para outros, um misto de recurso e de acção.”) [[22]] (Estima alguma doutrina estrangeira que “a revisão de sentença firme é uma acção autónoma de impugnação que persegue a revogação da coisa julgada. Não pode considerar-se, em consequência, como um recurso, pois enquanto estes perseguem uma nova cognição das questões já resolvidas mediante resoluções que todavia não são firmes, a revisão vem dirigida, em atenção a motivos taxados, contra resoluções que já ganharam firmeza. O seu fundamento cabe situá-lo na necessidade de ponderar e manter o equilíbrio entre a segurança jurídica, que deriva da coisa julgada, e o anelo de justiça, que é uma aspiração primária e fundamental que não pode sacrificar-se no altar da segurança jurídica naquelas casos de vulnerações flagrantes e insofríveis que as legislações tipificam como causas de revisão de sentença firme.”) [[23]/[24]/[25]]   
A revisão de sentença – que o ordenamento qualifica como recurso extraordinário – constitui-se como um acção de impugnação de uma decisão condenatória ou absolutória [[26]] que, depois de passada em julgado, se veio a verificar haver sido proferido com ocorrência de qualquer das entorses que constituem os pressupostos alinhados no artigo 449º do Código Processo Penal. O acto de revisão não se destina, ou tem por objectivo, postergar ou cisar uma decisão ditada pelos fundamentos jurídicos ou sequer pela errónea interpretação de uma norma adjectiva, [[27]] antes se prefigura como um meio de derrogar a sentença (firme) por superveniência de novos meios de prova que não estiveram ao alcance do julgador ou porque o julgador tenha cometido um acto ilícito ao tempo em que teve a seu cargo a resolução do caso sob revisão e cujo acto ilícito haja ficado demonstrado em outro procedimento ou os “factos que serviram de fundamento à condenação forem inconciliáveis com os dados provados noutra sentença e da oposição resultarem graves dúvidas sobre a justiça da condenação.”

O requisito axial que a lei exige e/ou faculta ao peticionante de uma acção revisora da coisa julgada e, correlatamente, para que uma sentença firme possa ser quebrada na sua inteireza institucional-legal, ou, o mesmo é dizer, para que ocorra o chamado efeito preclusivo do caso julgado, é que, como se deixou dito supra, os meios de prova, que a hão-de abalar e/ou pôr em causa, se apresentem como uma novidade na realidade histórico-processual em que o caso foi apreciado, debatido, julgado e obtido o juízo condenatório. [[28]]

Reportando-nos à situação contida na alínea d) do nº 1 do artigo 449º do Código Processo Penal, por ser a que aqui interessa, a lei concita para a procedência de um propósito processualmente manifestado de revisão de uma caso, (i) que a decisão a rever haja transitado em julgado (requisito geral); (ii) que depois do trânsito em julgado surjam factos novos [[29]/[30]]; (iii) que surjam novos meios de prova; [[31]] (iv) que esses facto novos valham ou possam influir por si (autonomamente) ou combinados com outros que hajam sido apreciados no processo; (v) que da análise, ponderação e valoração desses novos factos ou meios de prova se crie e se estabeleça, num juízo apreciativo da situação julgada, uma duvida séria e fundada sobre a justiça da condenação. [[32]]   

Concernente ao conceito de facto, e numa perspectiva tradicional, como refere Conde Correia, abarca-se “qualquer circunstância, evento ou acontecimento, que possa ser objecto de prova e que, de forma directa ou indirecta, total ou parcial, sirva as finalidades da revisão.” [[33]]   

Por facto novo há-de entender-se “aquele sucesso ou acontecimento que não foi possível ser conhecido pelo juiz sentenciador na instância, e sobre o qual não se se podia ter tomado conhecimento durante duramente o inquérito, nem se tenha praticado prova para a sus devida demonstração na fase da audiência (v.g. a invalidação de um testemunho, ao constatar-se que faltou à verdade na sua declaração e cujo testemunho constituiu prova acusatória («prueba de cargo») na sentença que se pretenda rever.” [[34]]   

Quanto ao que deve entender-se por novos meios de prova importaria talvez por incoar delimitar o que se deve entender por meio de prova.

O termo prova pode assumir, pelo menos quatro significados: “fonte di prova”; “mezzo di prova”; “elemento di prova”; e “risultato probatorio”. [[35]

Con l´espressione «mezzo di prova» si vuole indicare quello strumento processual che permette di acquisire un elemento di prova”. [[36]] Exemplo de um meio de prova é a prova por meio de testemunhas. Por seu turno “elemento di prova è il dato grezzo («gréggio» che si ricava dalla fonte di prova, quando ancora non è stato valutato dal giudice. Questi valuta al credibilità della fonte e l´attendibilità dell´elemento ottenuto, ricavandone un risultato prbatorio.” [[37]]   
Do passo que por novos elementos de prova se hão-de entender “aquelas ferramentas através das quais se prova um facto e que se traduz num meio de prova dentro do qual processo …”. “Não só brindam a oportunidade de aportar provas cujo conhecimento se tivesse apreciado depois da finalização do processo e a imposição da correspondente sentença condenatória, mas também compreendem aquelas provas cuja existência já era conhecida durante o processo e tenham sido nele objecto de valoração ainda que errónea, incompleta ou impossível de praticar como se pretende demonstrar. Mas se a prova em questão já foi devidamente praticada no juízo oral e não concorre nenhum factor que justifique novamente a sua prática (v.g. o descobrimento de uma técnica científica que possa destruir («dar al traste») a interpretação que no momento próprio foi outorgado a essa prova ou que permita a sua prática, quando no momento do processo tivesse sido possível)não serão considerados novos elementos de prova.” [[38]]     

Punctum saliens do processo revidendo consigna-se com a necessidade que advém de escandir ou glosar uma adequada interpretação quanto ao entendimento e compreensão do conceito de novidade e qual o alcance lógico-racional do termo, quando referenciado  a uma actividade jurisdicional já decorrida num procedimento judicial.

A novidade tanto pode ser consistir na prova directa (v. g. não foi o arguido quem cometeu os factos) como na prova indirecta da injustiça da condenação (v. g. foi um terceiro quem perpetrou os factos e, por isso, não pode ter sido o arguido a praticá-los).” (…) Os factos ou meios de prova alegados para efeitos de revisão não têm que ser completamente novos. A novidade tanto pode ser total como parcial. No primeiro caso, o juiz desconhece tudo aquilo que é invocado para sustentar a quebra d caso julgado. No segundo caso, que na prática parece ser a mais frequente, o juiz já conhece alguns argumentos utilizados. Como disse a Corte di Cassazione, numa decisão de 15 de Fevereiro de 1947, os elementos de prova, mesmo que em parte já fossem conhecidos pelo juiz que pronunciou a condenação, são idóneos a tornar admissível a revisão quando são capazes de excluir que o condenado tenha cometido o facto sobre o qual se funda a condenação.” [[39]]        

A propósito da novidade (absoluta e total) do facto novo e do momento em que o peticionante teve conhecimento do facto que invoca como novo para efeitos da revisão da sentença condenatória, escreveu-se no acórdão deste Supremo Tribunal de 17.02.2011, relatado pelo Conselheiro Souto Moura, que (sic): “A al. d) supra referida exige que se descubram novos factos ou meios de prova. Essa descoberta pressupõe obviamente um desconhecimento anterior de certos factos ou meios de prova, agora apresentados. Ora, a questão que desde o início se vem por regra colocando, quanto à interpretação do preceito, é a de se saber se o desconhecimento relevante é do tribunal, porque se trata de factos ou meios de prova não revelados aquando do julgamento, ou se o desconhecimento a ter em conta é o do próprio requerente, e daí a circunstância de este não ter levado ao conhecimento do tribunal os factos, ou não ter providenciado pela realização da prova, à custa dos elementos que se vieram a apresentar como novos. Na doutrina, acolheram-se ambas as posições, não interessando à economia do presente recurso expor a respectiva fundamentação. Diremos simplesmente que a posição que se tem mostrado largamente maioritária neste Supremo Tribunal é a primeira. Também temos defendido, porém, dentro dessa linha, não bastar que pura e simplesmente o tribunal tenha desconhecido os novos factos ou elementos de prova para ter lugar o recurso de revisão.

E a limitação é a seguinte: os factos ou meios de prova novos, conhecidos de quem cabia apresentá-los, serão invocáveis em sede de recurso de revisão, desde que seja dada uma explicação suficiente, para a omissão, antes, da sua apresentação. Por outras palavras, o recorrente terá que justificar essa omissão, explicando porque é que não pôde, e, eventualmente até, porque é que entendeu, na altura, que não devia apresentar os factos ou meios de prova, agora novos para o tribunal. Na verdade, existe um elemento sistemático de interpretação que não pode ser ignorado a este propósito, e que resulta da redacção do artº 453º nº 2 do C. P. P.: “O requerente não pode indicar testemunhas que não tiverem sido ouvidas no processo, a não ser justificando que ignorava a sua existência ao tempo da decisão ou que estiveram impossibilitadas de depor”. Isto é, o legislador revela com este preceito que não terá querido abrir a porta, com o recurso de revisão, a meras estratégias de defesa, ou dar cobertura a inépcias ou desleixos dos sujeitos processuais. O que teria por consequência a transformação do recurso de revisão, que é um recurso extraordinário, num expediente que se poderia banalizar. E assim se prejudicaria, para além do aceitável, o interesse na estabilidade do caso julgado, e também se facilitariam faltas à lealdade processual (cf. v. g. P.P. Albuquerque in “Comentário do Código de Processo Penal”, pag. 1198, ou os Ac. deste S. T. J. de 25/10/2007 (Pº 3875/07, 5ª Secção), de 24/9/2009 (Pº 15189/02.6. DLSB.S1, 3ª Secção), ou de 28/10/2009 (Pº 109/94.8 TBEPS-A.S1, 3ª Secção, entre vários outros).

Se esta é a problemática que mais frequentemente aflora em matéria de revisão da sentença, o presente recurso apresenta-nos um circunstancialismo diferente, porque o facto novo invocado teve lugar depois da sentença condenatória que se quer ver revista.

Ora, assim sendo, parece claro que a revisão será de recusar.

Desde logo porque a al d) do nº 1 do art. 449º do C P P utiliza a expressão “Se descobrirem novos factos ou meios de prova”. A literalidade do preceito aponta para uma descoberta, e de uma realidade que embora existente era desconhecida. Não para uma realidade nova, moldada por factos entretanto acontecidos.

Depois, a justiça da condenação, posta em causa com o que se descobriu, é a justiça da condenação a rever. O recurso em questão propõe-se reparar uma falsa visão da realidade que a sentença a rever teve. Só interessa assim ter em conta a factualidade ocorrida até à data da decisão.

E então, será ir longe demais atender, em nome da justiça, não apenas ao desconhecimento de factos que poderiam ter sido conhecidos à data da prolação da decisão, como também a uma situação sobrevinda depois da decisão, que obviamente o juiz não tinha que prever. Não fora assim, e estaria aberta a porta à invocação de um sem número de factos supervenientes, responsáveis pala criação de uma situação que veio a revelar injusta. Tudo isso constituiria motivo de revisão, e abalaria de modo insuportável o efeito de caso julgado, ou seja, a segurança das decisões. 

A justiça da condenação não poderá confundir-se com a situação em que o condenado possa ter ficado depois da condenação, em virtude de factos sobrevindos ulteriormente. 

A essa situação posteriormente criada só poderá atender-se, a nosso ver, em sede de execução da pena, porque não é a decisão que se mostra injusta, é a execução da decisão que, face ao novo condicionalismo, se veio a revelar injusta.” [[40]/[41]]

Na doutrina do país vizinho entende-se que relativamente à novidade de factos ou meios de prova “(…) que aparezcan o sobrevengan con posteridad a la primitiva condena, hay que resaltar: 1) Cualquier medio de prueba es admisible para promover la revisión, independentemente da le efectividad y transcendencia posterior para provocar la alteración de la condena primitiva, al acreditar la inocencia del reo, no bastando que puedan fundar simplemente la aplicación de una norma penal com pena menos grave de la impuesta; 2) que no es necesario que el condenado las ignorasse durante el proceso; 3) es suficiente que ante el tribunal que lo condenó o hubiesen sido alegadas ni hubiesen sido descubiertas por la investigación de oficio; 4) si hay novedad en el medio de prueba de valor, por la livre apreciación del tribunal; 5) si el hecho que se considera nuevo fuera del tal naturaleza que debiera dar lugar a su descubrimiento a la incoación de un proceso, no puede basarse en el este motivo de revisión hasta que se dicte sentencia firme en el proceso correspondiente.” [[42]]           

Uma derradeira menção ao requisito das sérias, fundadas e sofridas dúvidas sobre a justiça da condenação.

Concretamente quanto a este requisito escreveu-se no acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, de 7 de Junho de 2017, relatado pelo Conselheiro Raul Borges, em que interviemos na qualidade de Adjunto, (sic): “No que tange a este segundo pressuposto e sobre o que deverá entender-se por dúvidas graves sobre a justiça da condenação, dizia-se no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de Março de 2003, processo n.º 4407/02-5.ª Secção, in CJSTJ 2003, tomo 1, pág. 231, que os novos factos ou meios de prova têm que suscitar graves dúvidas sobre a justiça da condenação, mas nesse caso, desde que suscitem possibilidade de absolvição e já não de mera correcção da medida concreta da sanção aplicada; tudo terá de decorrer sob a égide da alternativa condenação/absolvição, que afinal plasma e condensa o binómio condenação justa (a manter-se) condenação injusta (a rever-se).
Para além de os factos ou meios de prova deverem ser novos, no sentido apontado, é, ainda, necessário que eles, por si ou em conjugação com os já apreciados no processo, sejam de molde a criar dúvidas fundadas sobre a justiça da condenação.

Já anteriormente, o acórdão deste Supremo de 11 de Maio de 2000, proferido no processo n.º 20/2000 - 5.ª Secção, se pronunciara no sentido de que “exactamente porque, tratando-se de um recurso extraordinário, o mesmo tem de ser avalizado rigorosamente, não podendo, nem devendo, vulgarizar-se, pelo que haverá que encará-lo sob o prisma das graves dúvidas, e como graves só podem ser as que atinjam profundamente um julgado passado, na base de inequívocos dados, presentemente surgidos”.(Citando este, os acórdãos de 17-04-2008, processo n.º 1307/08 - 5.ª Secção e de 07-09-2011, processo n.º 29/01.TACBC-A.S1-3.ª Secção).

(…) Os “novos factos” ou as “novas provas” deverão revelar-se tão seguros e (ou) relevantes – pela patente oportunidade e originalidade na invocação, pela isenção, verosimilhança e credibilidade das provas ou pelo significado inequívoco dos novos factos ou por outros motivos aceitáveis – que o juízo rescidente que neles se venha a apoiar não corra facilmente o risco de se apresentar como superficial, precipitado ou insensato, o que reclama do requerente do pedido a invocação e prova de um quadro de facto “novo” ou a exibição de “novas” provas que, sem serem necessariamente isentos de toda a dúvida, a comportem, pelo menos, em bastante menor grau do que aquela em que se fundamentou a decisão a rever - cfr. neste sentido, os acórdãos de 12-05-2005, processo n.º 1260/05 – 5.ª; de 23-11-2006, processo n.º 3147/06 – 5.ª; de 20-06-2007, processo n.º 1575/07 – 3.ª; de 26-03-2008, processo n.º 683/08 - 3.ª, e citando o aludido acórdão de 1-07-2004, o acórdão de 20-10-2011, processo n.º 665/08.5JAPRT-E.S1 - 3.ª Secção. [[43]]
II.c). – A SOLUÇÃO DO CASO.
Em desinência da extensa e prolixa alegação de recurso, o recorrente pede que seja (sic): “(…) concedido provimento ao presente Recurso de Revisão e, em consequência, substituir o Acórdão em crise por outro que decida: a) pela improcedência do incidente de liquidação na parte em que apura um valor que excede o valor efetivamente proveniente de origem não identificada corretamente avaliado; b) absolver o Arguido, ora Recorrente, quanto ao pagamento da quantia considerada vantagem provinda de atividade criminosa em que foi condenado, na parte em que excede o valor de origem não identificada corretamente avaliado; c) pela não manutenção do arresto tal qual se encontrava estabelecido, pelo facto do valor apreendido ser manifestamente superior ao valor de origem não identificada corretamente apurado;
Revogando-se, deste modo, parcialmente o Douto Acórdão recorrido.”
O pedido transcrito reverbera a concepção que o recorrente assume sobre os fins e alcance do recurso de revisão, qual seja a de um meio de impugnação, mediante o qual o tribunal superior se substitui ao tribunal de condenação, por meio de uma alteração, modificação ou revogação da decisão recorrida e não um meio através do qual o recorrente obtém uma decisão que permitirá ao tribunal que operou a condenação rever a decisão proferida, por qualquer dos fundamentos insertos nas alíneas a) a g) do nº 1 do artigo 449º do Código de Processo Penal. (“São dois os juízos que intervêm na revisão da sentença: o rescindente, confiado ao tribunal superior, em regra, ao STJ; e o rescisório, confiado ao tribunal recorrido, em regra a primeira instância.”) [[44]]     
Pretendendo o recorrente a modificação da matéria de facto – os elementos com que pretende abalar a condenação operada atinam com realidades factuais ou situações verificáveis mediante actividade probatória – que induziu a sua condenação na perda alargada de bens, o tribunal, caso a revisão viesse a ser concedida, teria que ser sempre o tribunal de primeira instância, dado que, estatutariamente, ao tribunal rescindente, vale dizer o Supremo Tribunal de Justiça, está vedado o conhecimento da matéria de facto, excepto quando julga em primeira ou segunda instância – cfr. artigo 46º da Lei nº 62/2013, de 26 de Agosto e artigos 432º, nº 1, alínea a) e 434º, ambos do Código de Processo Penal.
A novidade em que o arguido/recorrente assenta o pedido de revisão concentra-se num parecer produzido por um técnico de contas e reconduz-se, matricialmente, a tentar demonstrar que as operações do Gabinete de Recuperação de Activos que induziram a prova do activo incongruente apurado no património do arguido, desleixou qualificações patrimoniais – colocando como activos bens, créditos ou direitos que deveriam ser averbados na rubrica de passivo – e não assumiu réditos auferidos pelo arguido enquanto militar em comissão de serviço no estrangeiro.
O documento poderá constituir uma novidade, mas tão só temporal, porquanto os factos em que ele se escora para produzir as considerações de carácter contabilístico e fiscal e o parecer final encontravam-se disponíveis para o arguido desde muito antes do julgamento que decretou a sua condenação.
Recenseando os actos processuais pertinentes apura-se que, após a dedução do incidente de li-quidação de perda alargada de bens e pedido de arresto dos bens encontrados no património do arguido, o arguido deduziu oposição, e um dos pontos em que a ancorou foi precisamente o facto de ter prestado serviço militar, em comissão de serviço, no estrangeiro. Ainda que não tenha sido alegado no requerimento de oposição, o facto é que o tribunal na decisão do incidente, veio a dar como provados e não provados um conjunto de factos – certamente decorrentes de alegação superveniente (em audiência) – que pretendiam demonstrar que arguido tinha obtido réditos, contraído dívidas e prestado trabalho como segurança privada que sustentariam o total do montante escrutinado pelo Gabinete de Recuperação de Activos e que tinha servido de base ao pedido formulado no dito requerimento de liquidação – cfr. fls. 722 a 725 (especificamente quanto à factualidade provada e não provada para decisão do incidente).
O «novo» documento, em que o recorrente escora a sua pretensão, mais não é do que uma análise exegética, apodemo-la de «técnica», dos elementos que foram objecto de prova no incidente de liquidação.
Não incumbe a este Supremo, enquanto órgão rescindente, proceder a uma análise do documen-to «novo» apresentado pelo arguido/recorrente, mas tão só apreciar a «novidade» da prova a-presentada e, caso se viesse a confirmar/atestar a suscitada novidade, verificar se esses “novos factos ou meios de prova, de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo” eram susceptíveis de suscitar “graves dúvidas sobre a justiça da condenação.” [[45]]  
Os factos incorporados no documento [[46]] não evidenciam qualquer novidade processual, antes procuram induzir e instilar, mediante um juízo «técnico» interpretativo, rescindente daquele a que foi sujeito pelo tribunal de condenação. Os juízos «técnicos» que constituem o conteúdo do documento apresentado como «novo meio de prova», têm por base os mesmos factos apreciados pelo tribunal cuja decisão é objecto de pedido de revisão e constituem-se opiniões – mais ou menos fiáveis e idóneas, pela cunhagem, formatação e pretensão «técnica» de que se mostram revestidos – que não possuem a virtualidade de se alcandorar a novos factos ou meios de prova» tal como é pressuposto e exigência do ordenamento jurídico-processual e nos termos em que se deixaram conceptualizados supra. Não pode integrar-se no conceito de «novos factos ou meios de prova», para efeitos de revisão de uma sentença transitada em julgado, um parecer que procede à análise dos mesmos factos a que o tribunal teve acesso e que obtiveram dele uma divertida análise. As análises/interpretações de realidades factuais, este caso de feição e índole contabilística, contidas em pareceres técnicos possuem um «valor de ciência» que não vincula o tribunal, porquanto a sua apreciação se encontra na livre disponibilidade apreciativa do tribunal.
O documento apresentado pelo arguido como «novo meio de prova» cobriria e daria cevo a uma impugnação ordinária, vale dizer a um recurso ordinário que pretendesse contestar a análise interpretação «técnica» dos factos e elementos contabilísticos e financeiros que dele constam e que o tribunal tivesse efectuado no julgamento que efectuou, e não um recurso com a finalidade e objectivos que estão adstritos a um recurso de revisão. O recorrente teve tempo, desde o momento que foi decretado o arresto dos bens apreendidos e deferida a liquidação alargada de bens – 29 de Janeiro de 2016 – até ao momento em que teve lugar a prolação da decisão final – 12 de Janeiro de 2017 – de enfrentar a questão e de produzir prova que lhe permitisse contrariar a decisão (provisória) que tinha sido decretada. Os factos que sustentam o actual pedido, itera-se, foram objecto, ou constituíram fundamento, da oposição e mereceram actividade probatória – com possibilidade de contraditório – em audiência, pelo que não podem ser reintroduzidos e renovados para tentar reverter uma situação apreciativa que logrou trânsito em julgado. Os factos apresentados pelo recorrente não são «novos» quanto à sua substancialidade, mas tão só quanto à perspectiva analítica de que são revestidos e ao perfil de ajuizamento «técnico» que lhe é proposto e adossado. 
Conclui-se, em desinência do exposto, que não subsistem novos factos ou novos meios de prova hábeis para colocar em crise o julgamento que ditou o decretamento da perda alargada dos bens.                                   
       

III. – DECISÃO.
Na defluência do que foi argumentado, acordam os juízes que constituem este colectivo, na 3ª secção criminal, do Supremo Tribunal de Justiça, em:
- Negar provimento ao recurso, por manifesta improcedência, e, consequentemente, rejeitar o pedido de revisão formulado pelo recorrente;
- Condenar o recorrente nas custas, fixando a taxa de justiça em 5 Uc’s.

Lisboa. 11 de Setembro de 2019

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[1] Alberto dos Reis, “Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, 1981, pág. 158.
[2] Comentário do Código de Processo Penal, 4ª Edição actualizada, Universidade Católica Editora, pág. 1206.
[3] Vide acórdão STJ, proc. 330/04.2 JAPTM-B. S1, 5ª secção, e ainda acórdão STJ, proc. 228/07.2 GAACB-A.
S1.
[4] Vide acórdão STJ, proc. 228/07.2 GAACB-A.S1
[5] Neste sentido, vide acórdão STJ de 03.04.2019, processo nº 38/17.9 JAFAR.E1.S.1 e acórdão do STJ, de 9.07.1997, Processo n.º 606/97 - 3ª Secção
[6] Ob. Cit. pág. 1209
[7] Acórdão de 21.01.2009, processo 08P3922; vide ainda acórdão de 02.05-2012, processo 779/05.3 GBMTA-G.S1
[8] BMJ, 481, 31
[9] Neste sentido, vide Damião da Cunha, Perda de Bens a Favor do Estado, Centro de Estudos Judiciários, 2002, pág. 20
[10] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25.02.2015, Proc. 1653/12.2 JAPRT.P1.S1.
[11] Processo 22/08.3 JALRA.E1.S1
[12] Damião da Cunha, ob cit., pág. 24 e 26.
[13] O arguido AA, foi acusado, pelo Ministério Público, de: - a) quarenta (40) crimes de lenocínio previstos e punidos pelo artigo 169º, nº 1 do Código Penal; - b)  um (1) crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelo artigo 86º, nº 1, alíneas a) e d) da Lei nº 5/2006, de 23 de Fevereiro; - c) seis (6) crimes de auxilio à emigração ilegal previstos e punidos pelo artigo 183º, nºs 1 e 2 da Lei nº 23/2007, de 4 de Julho. (cfr. fls. 191).
[14] Os itens 19, 20, 27,28 e 29 identificam as mulheres que se prostituíam no anexo ao bar e que não possuíam documentação que lhes permitisse exercer actividade profissional em Portugal, como tal sem interesse para a apreensão/percepção lógico-formal do caso.
[15] Cfr. Conde Correia, João, “O “Mito do Caso Julgado” e a Revisão Propter Nova”, Coimbra Editora, 2010, pág. 182.

[16] Cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 28-06-2017, prolatado no processo nº 133/12.0JDLSB.S1 - 3.ª secção, relatado pelo Conselheiro Maia Costa.

I. O recurso extraordinário de revisão, p. e p. pelo art. 449.º, do CPP, tem assento constitucional, no art. 29.º, n.º 6, da CRP, que concede o direito à revisão da sentença aos “cidadãos injustamente condenados”. II - Este recurso constitui, pois, uma exceção ou restrição ao princípio da intangibilidade do caso julgado, que por sua vez deriva do princípio da segurança jurídica e da proteção da confiança, que constitui um elemento integrante do próprio princípio do estado de direito, princípio estrutural do nosso sistema jurídico-político (art. 2.º, da CRP). Na verdade, o valor da certeza e da segurança jurídicas, assegurado pelo caso julgado, é condição fundamental da paz jurídica que todo o sistema judiciário prossegue, como condição da própria paz social. As exceções devem, pois, assumir um fundamento material evidente e incontestável, insuscetível de pôr em crise os valores assegurados pelo caso julgado. III - A consagração constitucional do recurso de revisão funda-se na necessidade de salvaguardar as exigências da justiça e da verdade material, pois também elas comportam valores relevantes que são igualmente condição de aceitação e legitimidade das decisões jurisdicionais, e afinal daquela mesma paz jurídica. Por outras palavras: se a incerteza jurídica provoca um sentimento de insegurança intolerável para a comunidade, a intangibilidade, em obediência ao caso julgado, de uma decisão que vem a revelar-se claramente injusta perturbaria não menos o sentimento de confiança coletiva nas instituições judiciárias. IV - O recurso de revisão constitui pois um meio de repor a justiça e a verdade, derrogando o caso julgado. Mas essa derrogação, para não envolver nenhum dano irreparável na confiança da comunidade no direito, terá de ser circunscrita a casos excecionais, taxativamente indicados, e apenas quando um forte interesse material o justificar. V - O art. 449.º, do CPP permite a revisão de decisões transitadas nos casos indicados no seu nº 1, lista que se deve considerar taxativa pelas razões indicadas. VI - A al. d) admite a revisão de sentença transitada sempre que se descubram novos factos ou meios de prova que suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação. VII - Dois são os requisitos enunciados pela lei. É necessário, antes de mais, que apareçam factos ou elementos de prova novos. Mas isso não é suficiente. É necessário ainda que tais elementos novos suscitem graves dúvidas, e não apenas quaisquer dúvidas, sobre a justiça da condenação. Ou seja, as dúvidas têm que ser suficientemente fortes e consistentes para pôr a condenação seriamente em causa, sugerindo fortemente a verificação de um erro judiciário e a inocência do condenado. Só a cumulação destes dois requisitos garante a excecionalidade do recurso de revisão, só assim se justificando a lesão do caso julgado que a revisão implica.
[17]Conforme escreveu Eduardo Correia, in A Teoria do Concurso em Direito Criminal, Almedina, 1983, pág. 302, “o fundamento central do caso julgado radica-se numa concessão prática às necessidades de garantir a certeza e a segurança do direito. Ainda mesmo com possível sacrifício da justiça material, quer-se assegurar através dele aos cidadãos a sua paz jurídica, quer-se afastar definitivamente o perigo de decisões contraditórias. Uma adesão à segurança com um eventual detrimento da verdade, eis assim o que está na base do instituto”. (Em registo semelhante ver, do mesmo Autor, Caso Julgado e Poderes de Cognição do Juiz, pág. 7).”
“Figueiredo Dias (loc. cit., pág. 44) afirma que a segurança é um dos fins prosseguidos pelo processo penal, “o que não impede que institutos como o do recurso de revisão contenham na sua própria razão de ser um atentado frontal àquele valor, em nome das exigências da justiça. Acresce que só dificilmente se poderia erigir a segurança em fim ideal único, ou mesmo prevalente, do processo penal. Ele entraria então constantemente em conflitos frontais e inescapáveis com a justiça; e, prevalecendo sempre ou sistematicamente sobre esta, pôr-nos-ia face a uma segurança do injusto que, hoje, mesmo os mais cépticos têm de reconhecer não passar de uma segurança aparente e ser, só, no fundo, a força da tirania”. - Citação extractada do acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, de 8 de Novembro de 2017, prolatada no Proc. nº 630/11, 5GASXL-C.S1, relatado pelo Conselheiro Raúl Borges. (Inédito e onde o aqui relator interveio como Adjunto) 
[18] Cfr. a propósito do equilíbrio que se pretende entre a segurança jurídica e a necessidade de realização de justiça material o que foi escrito no acórdão deste Supremo Tribunal de 18.02.2016, relatado pela Conselheira Isabel Pais Martins, “O artigo 29.º, n.º 6, da Constituição da República, estatui que «os cidadãos injustamente condenados têm direito, nas condições que a lei prescrever, à revisão da sentença e à indemnização pelos danos sofridos».
Na concretização desse princípio, o Código de Processo Penal, entre os recursos extraordinários, consagra o de revisão, nos artigos 449.º e ss., que “se apresenta como um ensaio legislativo com vista ao estabelecimento do equilíbrio entre a imutabilidade da sentença decorrente do caso julgado e a necessidade de respeito pela verdade material” M. Simas Santos e M. Leal-Henriques, Código de Processo Penal Anotado, II volume, 2.ª edição, Editora Rei dos Livros, p. 1042.
O recurso de revisão, prevendo a quebra do caso julgado, contém na sua própria razão de ser um atentado frontal ao valor da segurança jurídica inerente ao Estado de Direito, em nome das exigências do verdadeiro fim do processo penal que é a descoberta da verdade e a realização da justiça. 
Com efeito, se se erigisse a segurança em fim ideal único, ou mesmo prevalente, do processo penal, “ele entraria, então, constantemente em conflitos frontais e inescapáveis com a justiça; e prevalecendo sempre ou sistematicamente sobre esta, pôr-nos-ia face a uma segurança do injusto que, hoje, mesmo os mais cépticos têm de reconhecer não passar de uma segurança aparente e ser só, no fundo, a força da tirania” Jorge de Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, I volume, Coimbra Editora, Limitada, 1974, p. 44..
“Entre o interesse de dotar de firmeza e segurança o acto jurisdicional e o interesse contraposto de que não prevaleçam as sentenças que contradigam ostensivamente a verdade e, através dela, a justiça, o legislador escolheu uma solução de compromisso que se revê no postulado de que deve consagrar-se a possibilidade – limitada – de rever as sentenças penais.” M. Simas Santos e M. Leal-Henriques, ob. cit., p. 1043.
Todavia, o recurso de revisão, dada a sua natureza excepcional, ditada pelos princípios da segurança jurídica, da lealdade processual e do caso julgado, não é um sucedâneo das instâncias de recurso ordinário. 
Só circunstâncias substantivas e imperiosas devem permitir a quebra do caso julgado, de modo a que o recurso extraordinário de revisão se não transforme em uma “apelação disfarçada” Neste sentido, também Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código de Processo Penal, 2.ª edição, Universidade Católica Editora, anotação 12. ao artigo 449º.”
[19] Disponível em www.dgsi.pt.
[20] Na doutrina e quantos aos fins da revisão, veja-se, por todos, Conde Correia, João, “O “Mito do Caso Julgado” e a Revisão Propter Nova”, Coimbra Editora, 2010, págs. 381 a 387.   

[21] A propósito dos fundamentos do recurso de revisão cfr. o acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 11 de Junho de 2003, relatado pelo Conselheiro Henriques Gaspar, em que se escreveu: “Dispõe o artigo 449º, nº 1, alínea d), do Código de Processo Penal que a revisão da sentença transitada em julgado é admissível quando «se descobrirem novos factos ou meios de prova que, de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo, suscitem graves dúvidas sobre a justiça da decisão».

O recurso de revisão constitui um meio excepcional de reapreciação de decisões transitadas em julgado, que tem o seu fundamento essencial na necessidade de evitar graves injustiças, reparando erros judiciários, para fazer prevalecer a justiça material sobre a justiça formal, ainda que com sacrifício da caso julgado. Um dos fundamentos da revisão é a existência de factos novos ou novos meios de prova, que não tenham sido apreciados no processo que levou à condenação e que, por serem desconhecidos do tribunal na data do julgamento, sejam susceptíveis de suscitar dúvidas sobre a justiça da decisão.”; ou o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 17 de Abril de 2008, relatado pelo Conselheiro Maia Costa: “I - O recurso de revisão, previsto no art. 449.º do CPP, assenta num compromisso entre a salvaguarda do caso julgado, que é condição essencial da manutenção da paz jurídica, e as exigências da justiça material. O legislador criou o recurso de revisão como mecanismo que, pretendendo operar a concordância possível entre esses interesses contraditórios, admite, em casos muito específicos e limitados, a modificação de sentença transitada. II - Trata-se, pois, de um recurso extraordinário, de um “remédio” a aplicar a situações em que seria chocante e intolerável, em nome da paz jurídica, manter uma decisão de tal forma injusta que essa própria paz jurídica ficaria posta em crise.”
[22] Amâncio Ferreira, Manual de  Recursos em Processo Civil, 6ª edição; Almedina, 2005, p. 369.
[23] Nancy Carina Vernengo Pellejero, in “La Revisión de la Sentencia Firme en el Proceso Penal”, Universitat de Barcelona, Tese Doctoral, 2015, p. 413.
[24] A autora citada na nota antecedente, refere que a embora a lei circunscreva os motivos que devem confinar a possibilidade de revisão de uma sentença penal, adianta que “sem embargo, se tivermos presente que a revisão de sentença firme persegue salvaguardar, em casos flagrantes, a justiça por cima da segurança jurídica; nada deve impedir, em nosso juízo, que a sua aplicação seja extensiva também aquelas sentenças condenatórias firmes que tenham sido ditadas no âmbito de aplicação dos juízos de faltas.” – op. loc. cit. pág. 414.  
[25]A revisão não é um recurso, ordinário nem  extraordinário, mas sim uma autónoma acção impugnativa, essencialmente porque se promove quando um processo já se encontra finalizado e não durante a pendência do mesmo, quer dizer, um “juízo de revisão”. Não nos encontramos ante um recurso em sentido estrito, mas sim ante um meio extraordinário de impugnação, que do mesmo modo que o recurso de cassação se substancia ante a Sala Segunda do Tribunal Supremo. As diferenças entre a cassação e a revisão são desde logo enormes, e não fazem senão corroborar ainda mais facto de que esta última não pode entender-se como recurso.”
No mesmo sítio referem-se as diferenças entre o recurso de revisão civil e penal, nos seguintes termos. “Existem também diferenças entre o recurso de revisão civil e o penal. Na revisão civil os motivos que a podem fundamentar são fornecidos essencialmente por situações externas ao processo, fraude, violência, mas nunca em referencia a factos ou actos que não foram aportados ao processo e que o Julgador não pudesse ter tido em conta, assim pois, a sentença é válida mas injusta, em razão de actuações das partes ou do juiz, as quais se não se tivessem produzido, teriam dado como resultado uma sentença válida e justa, de modo que a revisão só pode plantear-se “ex capite falsi”. Pelo contrário, a revisão penal pode-se referir a factos ou actos que não foram aportados para o processo e que viriam, se tal tivesse acontecido, a modificar o critério da sentença ditada pelo julgador, do que se admite tanto em razão da “falsidade”, como da “novidade”. Outra grande diferença entre as duas revisões e a que se refere às resoluções contra as que se pode interpor o recurso, pois enquanto a revisão civil se pode interpor contra sentenças absolutórias da demanda, pois se encontra legitimado para interpô-la tanto o demandante como o demandado, ao invés a revisão penal só se poderá interpor ante sentenças condenatórias.” – in Recurso de Revisión penal,  https//guiasjurídicos. Wolters.
klumer//es.
[26] Henriques Gaspar; Santos Cabral; Maia Costa; Oliveira Mendes; Pereia Madeira e Pires da Graça, in Código de Processo Penal, Comentado, 2ª edição, p. 1507Código de Processo Penal, Comentado, citado infra, p. 1507.
[27]A revisão tem a natureza de um recurso, em regra, sobre a questão de facto. Não se trata de uma revisão do julgado, mas de um novo julgado novo sobre novos elementos de facto.

Por tal motivo não parece admissível o recurso com objecto apenas de alteração da qualificação jurídica dos factos.” – ibidem, p.1507. Cfr. ainda o supra citado acórdão de 28-06-2017, prolatado no processo nº 133/12.0JDLSB.S1 - 3.ª secção, relatado pelo Conselheiro Maia Costa.

[28] Cfr. Acórdão de 14-03-2013, processo n.º 640/08.0SILSB-A.S1 - 5.ª Secção. “O recurso extraordinário de revisão, prevendo a quebra do caso julgado, contém na sua própria razão de ser um atentado frontal ao valor da segurança jurídica inerente ao Estado de Direito, em nome das exigências do verdadeiro fim do processo penal que é a descoberta da verdade e a realização da justiça.

Só circunstâncias substantivas e imperiosas devem permitir a quebra do caso julgado, de modo a que o recurso de revisão se não transforme em uma apelação disfarçada, sendo, ademais, taxativas as causas de revisão elencadas no nº 1 do art. 449.º do CPP.”
[29]O núcleo de factos elegíveis deverá ser considerado em função, quer da matéria, quer dos fins pretendidos: só são incluídos os factos compreendidos no âmbito do objecto que determina a condenação judicial e os factos susceptíveis de determinar a absolvição do condenado, a aplicação de uma moldura penal abstracta mais favorável e, em consequência, uma pena mais leve, a imposição de outra medida de segurança ou, por último, o próprio arquivamento definitivo do processo. É o caso de todos os elementos relativos à questão da culpa, como, por exemplo, as causas de exclusão da ilicitude ou da culpa. Isto é: todos os factos que forma directa ou indirecta (meros indícios) fundamentam ou excluem a punibilidade de determinada conduta” - Conde Correia, João, “O “Mito do Caso Julgado” e a Revisão Propter Nova”, Coimbra Editora, 2010, pág. 292.    
[30]O conceito de facto tanto abrange os elementos constitutivos, ou negativos do tipo legal de crime (factos principais), como qualquer outra circunstância susceptível de comprovar a veracidade ou a falsidade daqueles. O rigor científico de uma peritagem (descoberta de novos métodos, descrédito do perito, insuficiência das suas habilitações) a credibilidade de uma testemunha (o seu carácter, a sua propensão para a mentira por reiteradas condenações neste ou noutros processos, a sua boa ou má reputação ou a amplitude da sua memória) podem afectar o juízo efectuado e destruir a convicção judicial sobre a existência ou inexistência de um determinado principal.” - Conde Correia, João, “O “Mito do Caso Julgado” e a Revisão Propter Nova”, Coimbra Editora, 2010, pág. 294.   
Mais adiante – cfr. pág. 565 – este autor assela que “factos para efeitos de revisão são todos aqueles que ,demonstrando a injustiça da condenação, possam justificar a quebra do caso julgado”      
[31]Segundo uma longa tradição italiana, que logrou mesmo consagração expressa, as expressões «factos novos» e novos elementos de prova» são equivalentes. Uma vez que a lei apenas admite os factos novos, enquanto eles têm eficácia probatória, também eles devem, necessariamente, ser elementos de prova” – Cfr. Conde Correia, João, “O “Mito do Caso Julgado” e a Revisão Propter Nova”, Coimbra Editora, 2010, pág. 290.      
[32] Quanto à relevância, probidade e idoneidade dos novos factos ou dos novos meios de prova escreveu-se no acórdão deste Supremo tribunal de Justiça, de 8 de Outubro de 2015, relatado pelo Conselheiro Santos Cabral, que “Consequentemente não será uma indiferenciada "nova prova", ou um inconsequente "novo facto", que, por si só, terão virtualidade para abalar a estabilidade, razoavelmente reclamada, por uma decisão judicial transitada. Tais novos factos e/ou provas, têm assumir qualificativo correlativo da "gravidade" da dúvida que hão-de guarnecer e que constitui a essência do pressuposto da revisão que ora nos importa.
Há-de, pois, tratar-se de "novas provas" ou "novos factos" que, no concreto quadro de facto em causa, se revelem tão seguros e/ou relevantes - seja pela patente oportunidade e originalidade na invocação, seja pela isenção, verosimilhança e credibilidade das provas, seja pelo significado inequívoco dos novos factos, seja por outros motivos aceitáveis - que o juízo rescindente que neles se venha a apoiar, não corra facilmente o risco de se apresentar como superficial, precipitado ou insensato, tudo a reclamar do requerente a invocação e prova de um quadro de facto "novo" ou a exibição de "novas" provas que, sem serem necessariamente isentos de toda a dúvida, a comportem, pelo menos, em bastante menor grau, do que aquela que conseguiram infundir à justiça da decisão revidenda
Se a condenação assenta num juízo valorativo da prova produzida no qual está afastada toda a dúvida razoável sobre a existência dos pressupostos de responsabilização criminal o juízo de revisão, nesta hipótese concreta, fundamenta-se exactamente em prova de sentido contrário.
Significa o exposto que os novos factos ou meios de prova devem suscitar a dúvida sobre a forma como se formou a convicção de culpa que conduziu á condenação. A estrutura lógica subsuntiva em que assenta a decisão condenatória deve, assim, ser afectada, ser corroída, nos seus fundamentos probatórios por tal forma que a dúvida surja sobre a sua razoabilidade.
Como se refere em Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 10 de Janeiro de 2002 dúvida relevante para a revisão de sentença tem, pois, de ser qualificada; há-de elevar-se do patamar da mera existência, para subir a vertente da "gravidade" que baste.
E, se é assim, logo se vê, que não será uma indiferenciada "nova prova" ou um inconsequente "novo facto" que, por si só, terão virtualidade para abalar a estabilidade, razoavelmente reclamada, por uma decisão judicial transitada.
Há-de, pois, tratar-se de "novas provas" ou "novos factos" que, no concreto quadro de facto em causa, se revelem tão seguros e/ou relevantes - seja pela patente oportunidade e originalidade na invocação, seja pela isenção, verosimilhança e credibilidade das provas, seja pelo significado inequívoco dos novos factos, seja por outros motivos aceitáveis - que o juízo rescindente que neles se venha a apoiar, não corra facilmente o risco de se apresentar como superficial, precipitado ou insensato, tudo a reclamar do requerente a invocação e prova de um quadro de facto "novo" ou a exibição de "novas" provas que, sem serem necessariamente isentos de toda a dúvida, a comportem, pelo menos, em bastante menor grau, do que aquela que conseguiram infundir à justiça da decisão revidenda.”

[33] Cfr. Conde Correia, João, “O “Mito do Caso Julgado” e a Revisão Propter Nova”, Coimbra Editora, 2010, pág. 566. Na jurisprudência e quanto à compreensão e entendimento do que se há-de ter em consideração para efeitos de revisão de facto novo respiga-se o que adrede foi escrito num dos acórdãos supra citados, de que “ A noção de "factos novos" está, assim, tipicamente referida às circunstâncias do tempo processual da decisão; a justiça da decisão seria posta em causa se o facto relevante pudesse ter sido conhecido do tribunal do julgamento no momento da decisão. Todavia, a plasticidade da noção não afasta a consideração da novidade subsequente, quando os valores e exigências que estejam em causa assumam igual índice de validade, como muito impressivamente o presente caso revela.

(…) Todavia, se é certo que não pode ser invocada a «injustiça» contemporânea da condenação, « os factos agora invocados e considerados como novos são-no, de modo vivencial e essencial, na medida em que assumem o significado jurídico da sua consideração ou qualificação como tal, pois é legítimo afirmar-se que se tivessem sido objecto de análise e inclusão na decisão, não se colocaria agora a questão da pena acessória de expulsão, para efeitos de revisão de sentença, por ocorrência da previsão do artigo 33°, nº 1, da Constituição da República Portuguesa» (cfr. acórdão do Supremo Tribunal, de 11 de Fevereiro de 1999, no BMJ, 484-280).

«E se é defensável e lógico afirmar-se que a sentença não se esgota no momento do seu trânsito em julgado» mas «tão-só quando cessam todos os seus efeitos, então pode e deve concluir-se ser de atribuir relevância a "factos novos", que tornem a decisão verdadeiramente eivada de injustiça, no tocante aos efeitos que possa produzir enquanto não se mostra inteiramente executada».” – Henriques Gaspar.  

Quanto ao momento em que o peticionário tomou conhecimento dos factos novos veja-se o acórdão deste Supremo Tribunal de 27.01.2010, relatado pelo Conselheiro Santos Cabral, em que se sumariou: ”I - Para efeitos de revisão, os factos ou provas devem ser novos e novos são aqueles que eram ignorados pelo recorrente ao tempo do julgamento e não puderam ser apresentados antes do julgamento e apreciados neste. A “novidade” dos factos deve existir para o julgador (novos são os factos ou elementos de prova que não foram apreciados no processo) e, ainda, para o próprio recorrente. II - Se o recorrente tem conhecimento, no momento do julgamento, da relevância de um facto ou meio de prova, que poderiam coadjuvar na descoberta da verdade e se entende que o mesmo é favorável deve informar o Tribunal. Se o não fizer, jogando com o resultado do julgamento, não pode responsabilizar outrem, que não a sua própria conduta processual. Se, no momento do julgamento, o recorrente conhecia aqueles factos ou meios de defesa e não os invocou, não se pode considerar que os mesmos assumem o conceito de novidade que o recurso de revisão exige encontrando-se precludida a mesma invocação. III - Existe fundamento para a revisão, se o recorrente se encontrava afectado de patologia mental no momento da prática do crime, devendo ser valoradas num sentido que lhe é mais favorável a dúvida sobre a capacidade de agir em sua defesa no processo penal respectivo ou de estar afectada a capacidade de avaliar os seus actos e de se reger de acordo com tal avaliação, quer em termos de imputabilidade, quer de exercício do seu direito de defesa.” 
[34] Nancy Carina Vernengo Pellejero, in “La Revisión de la Sentencia Firme en el Proceso Penal”, Universitat de Barcelona, Tese Doctoral, 2015, p. 249.
[35] Cfr. Paolo Tonini, “Manuale di Procedura Penale”, Giuffrè Editore, Milano, 2008, pág. 204.  
[36] Cfr. Paolo Tonini, “”La Prova Penale”, Cedam, Quarta edizione, Milani, p. 91. “Com a expressão meio de prova quer-se indicar aquele instrumento processual que permite adquirir um elemento de prova.”
[37] Cfr. Paolo Tonini, “”La Prova Penale”, Cedam, Quarta edizione, Milani, p. 32. “elemento de prova é o dado em bruto que se extrai da fonte de prova, quando ainda não está valorado pelo juiz. Este valora a credibilidade da fonte a atendibilidade do elemento obtido, extraindo dele (ou daí) um resultado probatório.” (Tradução nossa) 
[38] Nancy Carina Vernengo Pellejero, in “La Revisión de la Sentencia Firme en el Proceso Penal”, Universitat de Barcelona, Tese Doctoral, 2015, p. 254.
[39] Conde Correia, João, “O “Mito do Caso Julgado” e a Revisão Propter Nova”, Coimbra Editora, 2010, pág. 360. Sobre a questão de saber, no plano metodológico, quem deve decidir sobre a questão da aptidão dos novos factos ou meios de prova: “o ponto de vista do juiz que decidiu (perspectiva passada); o ponto de vista do juiz que decide a admissibilidade do pedido de revisão (perspectiva contemporânea); ou o ponto de vista do juiz que, pressuposta a concessão daquela, irá, de novo, decidir o processo (perspectiva futura)”, veja-se Conde Correia, João, “O “Mito do Caso Julgado” e a Revisão Propter Nova”, Coimbra Editora, 2010, págs. 363 a 368.   
[40] Disponível em www.dgsi.pt. No mesmo sentido o acórdão de 17-12-2009, relatado pelo mesmo Juiz Conselheiro.
[41] Veja-se o acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, de 18 de Abril de 2012, relatado pelo Conselheiro Oliveira Mendes, em cujo sumário se lavrou a sequente doutrina. “I - Ao instituto de revisão de sentença penal, com consagração constitucional, subjaz o propósito da reposição da verdade e da realização da justiça, verdadeiro fim do processo penal, sacrificando-se a segurança que a intangibilidade do caso julgado confere às decisões judiciais, face à verificação de ocorrências posteriores à condenação, ou que só depois dela foram conhecidas, que justificam a postergação daquele valor jurídico. II - Como refere Maia Gonçalves, in Código de Processo Penal Anotado, notas ao art. 449.º, o princípio res judicata pro veritate habetur não pode obstar a um novo julgamento, quando posteriores elementos de apreciação põem seriamente em causa a justiça do anterior. O direito não pode querer, e não quer, a manutenção de uma condenação, em homenagem à estabilidade de decisões judiciais, à custa da postergação de direitos fundamentais dos cidadãos. III - Por isso, a lei admite, em situações expressamente previstas (art. 449.º, n.º 1, do CPP), a revisão de decisão transitada em julgado, mediante a realização de novo julgamento (art. 460.º). Tais situações são: a) Falsidade de meios de prova que tenham sido determinantes para a decisão; b) Crime cometido por juiz ou jurado, relacionado com o exercício da sua função no processo; c) Inconciliabilidade de decisões; d) Descoberta de novos factos ou meios de prova que suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação; e) Descoberta de que à condenação serviram de fundamento provas proibidas; f) Declaração, pelo TC, de inconstitucionalidade com força obrigatória geral de norma de conteúdo menos favorável ao arguido que tenha servido de fundamento à condenação; g) Sentença vinculativa do Estado Português, proferida por instância internacional, inconciliável com a condenação ou suscitadora de graves dúvidas sobre a justiça da condenação. (…) V - O fundamento de revisão de sentença da al. d) do n.º 1 do art. 449.º do CPP, novos factos ou meios de prova, implica o aparecimento de novos factos ou meios de prova, ou seja, como expressamente consta do texto legal, a descoberta de factos ou meios de prova, o que significa que os meios de prova relevantes para o pedido de revisão terão de ser processualmente novos, isto é, meios de prova que não foram produzidos ou considerados no julgamento. Nestes termos, apenas são novos os factos e os meios de prova desconhecidos pelo recorrente ao tempo do julgamento e que não tenham podido ser apresentados e apreciados na decisão. Se, ao invés, o recorrente conhecia os factos e os meios de prova ao tempo do julgamento e os podia apresentar, tais factos e meios de prova não relevam para efeitos de revisão de sentença. (…)”
[42] Aragoneses Alonso, P., “Instituciones de Derecho Procesal Penal.” Madrid, 1981, p. 534, citado por Nancy Carina Vernengo Pellejero, in “La Revisión de la Sentencia Firme en el Proceso Penal”, Universitat de Barcelona, Tese Doctoral, 2015, p. 215. No mesmo sentido a STS (Sala Penal) de 25 de febrero de 1985, em que se doutrinou “que o citado quarto motivo da revisão, é procedente quando, posteriormente à firmeza da sentença condenatória, sobrevenha o conhecimento de novos factos ou de novos meios de prova, devendo-se entender como novos, todos os factos ou meios probatórios que sobrevenham ou se revelem com posteridade à sentença condenatória, sem que seja preciso que o condenado os desconhecera durante o transcurso da causa, bastando com que não hajam sido alegados ou produzidos ante o tribunal sentenciador nem descobertos pela investigação judicial praticada de oficio, sem que por conseguinte, se repute novo ao facto o meio de prova que tendo-se posto de manifesto durante o processo, o tribunal no uso da sua faculdade de soberana apreciação, não lhe concedeu valor algum, figurando entre os ditos factos ou meios probatórios novos, citando-os à guisa de exemplo, a retractação das testemunhas, a invalidação dos seus testemunhos, a confissão de outra pessoa distinta da do condenado ou condenados, e outras provas periciais diferentes das praticadas na causa ou a invalidação dos resultados ou conclusões obtidas por aqueles como consequência de novas técnicas ou descobertas cientificas.”                    
[43] Cfr. ainda os arestos citados no acórdão transcrito, a sabe os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 09-04-2008, proferido no processo n.º 675/08-3.ª “os novos factos ou meios de prova deverão provocar graves dúvidas (não apenas quaisquer dúvidas) sobre a justiça da condenação, o que significa que essas dúvidas devem ser de grau superior ao que é normalmente requerido para absolvição do arguido em julgamento “; de 17-04-2008, processo n.º 1307/08-5.ª – “O recurso extraordinário de revisão não se destina a sindicar a correcção de decisão condenatória transitada em julgado, debruçando-se o julgador mais uma vez sobre a factualidade dada por provada e por não provada, ou sobre a prova em que se baseou”. “É preciso que passe a haver uma dúvida grave sobre a justiça da condenação, que se atribua à nova prova apresentada; ou seja, importa ver nesta nova prova elementos decisivos para poder ser sustentada a tese da inocência.”; e de 08-10-2015, processo n.º 173/14.5PAAMD.S1 - 3.ª Secção (Nos termos do art. 449.º, do CPP, novas provas ou novos factos serão aqueles que, no concreto quadro de facto em causa, se revelem tão seguros e/ou relevantes – seja pela patente oportunidade e originalidade na invocação, seja pela isenção, verosimilhança e credibilidade das provas, seja pelo significado inequívoco dos novos factos, seja por outros motivos aceitáveis – que o juízo rescidente que neles se venha a apoiar, não corra facilmente o risco de se apresentar como superficial, precipitado ou insensato, tudo a reclamar do requerente a invocação e prova de um quadro de facto “novo” ou a exibição de “novas” provas que, sem serem necessariamente isentos de toda a dúvida, a comportarem, pelo menos, em bastante menor grau, do que aquela que conseguiram infundir à justiça da decisão revidenda.”
[44]  Henriques Gaspar; Santos Cabral; Maia Costa; Oliveira Mendes; Pereia Madeira e Pires da Graça, in Código de Processo Penal, Comentado, 2ª edição, p. 1507Código de Processo Penal, Comentado, citado infra, p. 1507

[45] “Condição de procedência do recurso de revisão com fundamento na descoberta de novos factos ou novos meios de prova é, por um lado, a novidade desses factos ou meios de prova e, por outro, que tais factos ou meios de prova provoquem graves dúvidas (não apenas quaisquer dúvidas) sobre a justiça da condenação, o que significa que essas dúvidas devem ser de grau superior ao que é normalmente requerido para a absolvição do arguido em julgamento.” – Maia Costa, acórdão supra citado.
[46]Num sentido amplo, mais ligado ao direito substantivo do que ao direito processual, considera-se documento (art. 362º do Cód. Civil) todo o objecto material elaborado pelo homem capaz de reproduzir um facto, uma coisa ou até uma pessoa.
Num sentido restrito, mais vulgar na linguagem dos leigos e mais cingido ao regime processual da prova, o documento é apenas o escrito que exprime uma declaração de ciência (como a correspondência epistolar, o relatório de ume exame laboratorial, o documento de quitação) ou uma declaração de vontade (como a escritura de venda, o testamento cerrado ou público, o escrito de promessa de compra e venda, etc.” – Antunes Varela, Miguel Bezerra, Sampaio Nora, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 1984, pág. 489.