Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
11/17.7T8CVL.C1.S1
Nº Convencional: 4ª SECÇÃO
Relator: FERREIRA PINTO
Descritores: NULIDADE DE SENTENÇA
DEVERES LABORAIS
INFRAÇÃO DISCIPLINAR
PROCEDIMENTO DISCIPLINAR
SANÇÃO DISCIPLINAR
Data do Acordão: 01/23/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA
Área Temática:
DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO – PROCESSO CIVIL / PROCESSO DE DECLARAÇÃO / PROCESSO COMUM / SENTENÇA / ARGUIÇÃO DE NULIDADES DA SENTENÇA.
DIREITO DO TRABALHO / CONTRATO DE TRABALHO / CESSAÇÃO DE CONTRATO DE TRABALHO / DESPEDIMENTO POR INICIATIVA DO EMPREGADOR / MODALIDADES DE DESPEDIMENTO / DESPEDIMENTO POR FACO IMPUTÁVEL AO TRABALHADOR.
Doutrina:
- Júlio Gomes, Direito do Trabalho, Volume I, Relações Individuais do Trabalho, Coimbra Editora, 2007, p. 896,;
- Maria do Rosário Palma Ramalho, Tratado de Direito do Trabalho, Parte II, Situações Laborais Individuais, 4.ª Edição, Almedina, p. 611 e 612;
- Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 18. ª Edição, Almedina, 2017, p. 591;
- Pedro Ferreira de Sousa, O Procedimento Disciplinar Laboral, 2016, Almedina, p. 6/58;
- Pedro Furtado Martins, Cessação do Contrato de Trabalho, 4.ª Edição revista e atualizada, Principia, 2017, p. 209.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO DO TRABALHO (CPT): - ARTIGO 77.º, N.º 1;
CÓDIGO DO TRABALHO (CT): - ARTIGO 357.º, N.º 4.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

- DE 27-02-2002, PROCESSO N.º 02S2239, IN WWW.DGSI.PT.


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ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO:

- DE 21-05-2012, PROCESSO N.º 1212/09.7TTGMR.P1, IN WWW.DGSI.PT.


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ACÓRDÃO DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL:

- DE 30-09-2003, ACÓRDÃO N.º 439/03, PROCESSO N.º 186/03, IN WWW.TRIBUNALCONSTITUCIONAL.PT.

Sumário :
I - Sendo o requerimento de interposição do recurso omisso quanto às nulidades do acórdão, constando apenas a sua invocação e fundamentação na atinente alegação de recurso, a arguição não é atendível, por incumprimento do disposto no artigo 77.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho.

II - O diferente enquadramento jurídico dos factos imputados ao trabalhador na nota de culpa, permanecendo estes inalterados, não consubstancia a invocação de factos novos proibida pelo artigo 357º, n.º 4, do Código do Trabalho.
Decisão Texto Integral:

Processo n.º 11/17.7T8CVL.C1.S1 – (Revista) – 4ª Secção[1]

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça.

            - Relatório[2]:

               AA, com o benefício do Apoio Judiciário, na modalidade de pagamento faseado da taxa de justiça, interpôs, em 03 de janeiro de 2017, nos termos do artigo 170.º do Código Processo do Trabalho[3], no Tribunal Judicial da Comarca de Castelo Branco, Juízo do Trabalho da Covilhã, a presente Ação declarativa, sob a forma de processo comum, emergente de contrato de trabalho, contra a “BB”, pedindo que seja dada sem efeito a sanção disciplinar de repreensão escrita, por desobediência e desrespeito ao superior hierárquico que por esta lhe foi aplicada.

                Para tanto alega, em síntese, que:
               - Quer o “Relatório” quer o “Despacho” que lhe foram enviados, não contêm os normativos violados;
               - Foi punido pela violação dos deveres do trabalhador plasmado no art.º 128º, n.º 1, alínea c), do Código do Trabalho[4], que dispõe que o trabalhador deve “realizar o trabalho com zelo e diligência”;
               - Na nota de culpa, não lhe é imputado qualquer facto praticado no exercício de funções de … que não tenha realizado com zelo e diligência, acabando por ser punido com uma sanção disciplinar por desobediência e desrespeito a superior hierárquico;
               - Não consta na nota de culpa a violação do dever de obediência, pelo que a decisão disciplinar, em causa, encontra-se ferida de invalidade.

               Realizou-se a audiência de partes, que se frustrou, por as partes não se terem conciliado.


               A Ré contestou dizendo, em resumo, que o autor violou, realmente, o dever de obediência a que estava obrigado, com a consequente necessidade da sanção disciplinar aplicada, sendo que não se verifica a invalidade da decisão disciplinar invocada pelo autor, e concluindo pela improcedência da ação e sua consequente absolvição do pedido.


                Findos os articulados, não se realizou a audiência preliminar, proferiu-se despacho de saneamento do processo e dispensou-se a sua condensação.

                Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida em 21 de junho de 2017, a seguinte sentença:

               - “Julga-se procedente a presente ação e em consequência dá-se sem efeito a sanção disciplinar de repreensão escrita, aplicada pela ré BB ao autor AA.”

 

               Inconformada com o teor desta decisão, a Ré interpôs recurso de apelação, que por acórdão de 25 de maio de 2018, foi julgada procedente e, em consequência, revogou-se a sentença recorrida, julgou-se a ação improcedente e dela se absolveu a Ré.

               Inconformado ficou agora o Autor que recorreu de revista e apresentou a sua alegação, com umas conclusões prolixas e, por isso, obscuras e ininteligíveis.

               Tendo sido convidado, nos termos do artigo 639º, n.º 3, do Código de Processo Civil[5], a apresentar novas conclusões, agora sintéticas, concluiu do seguinte modo:

1) Dispõem os artigos 635º, n.º 4, e 639º n.ºs 1 e 2 do CPC, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26/6 - NCPC - aplicável “ex vi” do artigo 87º, n.º 1, do CPT, que é pelas conclusões que se delimita o objeto do recurso.

Assim,

2) O Recorrente recebeu uma nota de culpa contra si deduzida, acusando-o de não exercer com zelo e diligência as suas funções (relembra-se que o mesmo exercia as funções de … na Central … da Recorrida) violando o previsto no artigo 128º n.º 1 al. c) do Código do Trabalho.

3) Em sede decisória do Processo Disciplinar, é considerado o facto de a ordem ter sido transmitida, ao trabalhador, em dois momentos sendo acrescida a gravidade da desobediência e desrespeito ao sr. Comandante seu superior hierárquico” punindo o Recorrente por ter desobedecido a uma ordem de superior hierárquico.

4) Entendemos que os factos são os mesmos, contudo, na nota de culpa a entidade patronal considera que está em causa a violação do dever de zelo e diligência do trabalhador e, na decisão, a violação a ordens diretas do superior hierárquico.

5) Se conjugarmos o teor da imputação e constante da nota de culpa com a constante da decisão, podemos concluir, salvando sempre o devido respeito e que é muito, que o aqui recorrente foi confrontado com um facto novo na decisão que aplica a sanção disciplinar, facto que não lhe foi anteriormente dado a conhecer e, relativamente ao qual não pode exercer o contraditório.

6) Em sede de julgamento a 1ª Instância decidiu julgar procedente a ação e em consequência dar sem efeito a sanção disciplinar de repreensão escrita, aplicada pela Recorrida BB ao Recorrente AA.

7) Contudo, o Douto Acórdão recorrido conclui por não se verificar licitude na recusa do apelado a cumprir a ordem que lhe foi dirigida, quando o que está em causa é o facto de o Recorrente ter sido ouvido em processo disciplinar por não exercer com zelo e diligência as suas funções e em decisão instrutória do Processo Disciplinar ser punido por violação a ordens diretas do superior hierárquico, conforme vertido nos artigos imediatamente anteriores.

8) Decidindo, assim, no sentido de julgar a apelação procedente, revogando-se a decisão recorrida e julgando-se improcedente a ação, dela se absolvendo a ré.

9) Os factos descritos na Nota de Culpa, reafirmados no Relatório e na Decisão Disciplinar não configuram qualquer infração no disposto no art.º 128.º, n.º 1, alínea c), do CT, que respeita ao dever de realização do trabalho com zelo e diligência e não à recusa de realização de tarefas laborais.

10) Dispõe a alínea e), do n.º 1, do art.º 128.º do CT, que o trabalhador "[...] deve cumprir as ordens e instruções do empregador respeitantes à execução […] no trabalho, que não sejam contrárias aos seus direitos e garantias".

11) Resulta dos pontos de facto assentes n.ºs 4, 5 e 15, que o Recorrente AA, foi admitido em 2007, para exercer as funções de ..., contudo, em 2010, por razões de falta de saúde para as exercer, passou a desempenhar as funções de ….

12) A aqui Recorrida BB reafectou o Recorrente às funções de … – a partir de 2010 - por ter reconhecido que o mesmo não possuía as condições de saúde necessárias para desempenhar as funções de ....

13) Contudo, desempenhando o aqui Recorrente AA, as funções de …, a aqui Recorrida BB que o colocou na Central …, pretendia que o mesmo exercesse, tarefas próprias de ..., sem o consentimento do aqui Recorrente.

14) Assim, considerando as tarefas incluídas na categoria profissional de … - que o aqui Recorrente AA se encontrava vinculado a realizar - que a aqui Recorrida BB lhe atribuiu - por falta de saúde para as funções de ..., não “a quo” alcança que o Recorrente AA tenha desrespeitado ou incumprido quaisquer ordens ou instruções emitidas pela Recorrida BB.

15) Entende o Recorrente, salvando sempre o devido respeito e que é muito, que se verifica um vício, suscetível de inquinar o procedimento disciplinar e que determina a sua invalidade, por analogia com o disposto nos artigos do Código do Trabalho.

16) Uma vez que o trabalhador não deve obediência a ordens ou instruções sempre que estas exorbitam os poderes ou que atinjam direitos ou garantias do empregado (artigo 128.º, alínea e), parte final, CT).

17) Em face do exposto, parece-nos que o Tribunal “a quo”, ao decidir como o fez violou os supracitados artigos do Código do Trabalho.

18) Enferma, assim, a douta decisão do vício de nulidade, conforme dispõe o artigo 615º, n.º 1, alínea d), do CPC, tendo sido violado a referida disposição legal, bem como a abundante jurisprudência já existente.

Termina, pedindo se conceda a revista:

- Com fundamento na errada aplicação do direito aos factos apreciar a nulidade arguida.

- Caso, assim se não entenda, deverá ser dado provimento ao recurso, substituindo o acórdão recorrido por outro que mantenha a decisão da 1ª Instância.

A Ré não contra-alegou.

Parecer do Ministério Público:

           A Exma. Senhora Procuradora-Geral Adjunta, nos termos do artigo 87º, n.º 3, do CPT, emitiu parecer no sentido de que a revista deve ser julgada improcedente porque:

- Tendo o recorrente invocado somente nas alegações de recurso a nulidade, em que entende incorrer o acórdão do Tribunal, nos termos do artigo 77º, n.º 1, do CPT, dela não se pode conhecer;

- O diferente enquadramento jurídico dos factos imputados ao trabalhador na nota de culpa, permanecendo estes inalterados, não consubstancia qualquer invocação de factos não constantes da nota de culpa;

- Fazendo parte do objeto contratual consensualmente modificado, a que o autor estava obrigado, o desempenho das funções de ..., ainda que pontual e acessório, pelo que a não prestação do serviço de transporte, de um doente do Centro de Saúde para ..., na falta de outros ..., conforme lhe fora superiormente determinado, ordem essa absolutamente legítima, reconduzindo-se ao incumprimento do dever de exercer as suas funções e de realizar com zelo e diligência as funções que lhe estavam cometidas, integra a violação do dever de zelo e diligência consagrado no artigo 128º, n.º 1, CT, pelo qual foi sancionado disciplinarmente.

                               Notificado o parecer às partes, só o recorrente se pronunciou sobre o seu conteúdo, afirmando discordar do mesmo.

                               Da revista:

                        Enquadramento jurídico adjetivo:

                        Tendo a ação sido proposta em 03 de janeiro de 2017 e o acórdão recorrido sido proferido em 25 de maio de 2018, são aqui aplicáveis os Códigos de Processo Civil e do Trabalho, nas suas versões atuais.

                               Questões a decidir:

a) Nulidade da sentença nos termos do artigo 615º, n.º 1, alínea d), do CPC –“omissão de pronúncia”;

b) (I)licitude da sanção disciplinar, por invalidade do procedimento disciplinar;

c) Inexistência de qualquer infração disciplinar.

                Fundamentação:

            - Da matéria de facto:

            As instâncias deram como provada a seguinte factualidade:


“1. O Autor intentou nos termos do disposto no artigo 170º do Código do Processo de Trabalho Ação de Impugnação Judicial de Decisão Disciplinar.

2. Tal Ação correu termos na 2ª Secção de Trabalho J1 deste Tribunal sob o número de processo 976/16.6T8CVL, tendo a Ré sido absolvida da instância.

3. Nos autos de processo disciplinar instaurado pelo Comandante dos BB contra o Autor, foi deduzida "NOTA DE CULPA" pelo já mencionado Comandante, referindo que:
        "Artigo 1.º - O arguido, no dia 23 de fevereiro prestava a sua atividade de bombeiro na Central do Quartel dos BB.

        Artigo 2.º - Na circunstância encontrava-se sob as ordens e instruções do Comando BB.

        Artigo 3.º - No referido dia 23 de fevereiro o Comando, por seu “e-mail” emitido às 11:47 dirigiu ao arguido a seguinte ordem: "Em virtude de ter surgido um número elevado de serviço de transporte e não haver ...s disponíveis, e ter aparecido um transporte do Centro de Saúde para …, venho por este meio e tal como já fiz verbalmente solicitar ao Sr. AA que execute o referido transporte e peça ao Sr. CC que o fique a substituir na Central, como ainda fez durante toda a tarde a substituir o operador DD e há dias a substituir o operador EE.

O Comandante

FF"

        [Artigo 4º] - No mesmo dia o arguido, em resposta ao comando, enviou-lhe um “e-mail” às 15:00 com os seguintes dizeres:

       "Acuso a receção do presente “e-mail”. Em relação ao conteúdo do mesmo, queiram Vossas Exas. compreender que não faz parte no âmbito do desempenho da minha categoria profissional efetuar serviços de transporte, ainda assim, também não é do meu conhecimento a existência de uma escala de serviço prevista para quando exista falta de ...s, para evitar situações desagradáveis e porque é benéfico para ambas as partes, queiram pois clarificar esta situação.

Os melhores cumprimentos.

AA"

       Artigo 5.º - Os factos descritos em 3º e 4º representam uma violação do dever do arguido previsto no artigo 128º, n.º 1, al. c), do Código do Trabalho […]."

4. Ora, o Autor foi admitido ao serviço da Ré para exercer as funções de ... em 01/07/2007.

5. Por motivos de falta de saúde o Autor deixou de exercer as funções de ... e passou a exercer as funções de ....

6. Os restantes Operadores da Central (...s) recebem, para efetuar quando necessário as funções de ..., para além do seu salário, uma prestação remuneratória fixa mensal, conforme consta do ANEXO A - QUADRO DE PESSOAL afixado na Ré.

7. O Relatório junto com a notificação do Despacho n.º COM/01/2016 refere no penúltimo parágrafo “ ... reforçam o facto de a ordem lhe ter sido transmitida em dois momentos […] sendo acrescida a gravidade da desobediência e desrespeito ao Sr. Comandante seu superior hierárquico ”.

8. No dia 23 de fevereiro de 2016 o Comandante dos Bombeiros, Sr. FF, deu ordem ao A. para efetuar um transporte do Centro de Saúde de … nos termos que constam do artigo 5º da [petição inicial], com referência ao art.º 3º da Nota de Culpa e que aqui se dão por reproduzidos.

9. Na circunstância dos autos de processo disciplinar, o A. encontrava-se a prestar serviço na Central ... dos BB.

10. [O] A. como os restantes operadores da Central, quando necessário, exercem também as tarefas de ... sendo que, na circunstância não havia ... disponíveis.

11. Os Operadores da Central encontram-se sob as ordens diretas do Comando dos Bombeiros

12. O Comando dispõe de poder disciplinar sobre os Operadores da Central, além de outros, sob o seu Comando.

13. O autor recusou-se a prestar o serviço pela forma que consta igualmente do artigo 5º da petição inicial com referência ao artigo 4º da Nota de Culpa e aqui se dá por integralmente reproduzido

14. As tarefas de ..., quando necessárias, também são exercidas por todos os operadores da Central, não sendo o A. remunerado com uma prestação mensal fixa por auferir uma remuneração correspondente à sua categoria profissional de origem, a de ....

15. Razões de saúde que justificaram em 2010 a colocação do A. na “Central”, sendo frequentes as queixas do A. por não integrar a escala de serviço dos piquetes, conduzindo veículos pesados e acudindo a situações mais exigentes, tais como acidentes de viação, transporte urgente de doentes, incêndios, etc. a fim de por essa forma auferir acréscimos remuneratórios.”

               

~~~~~~~

            - Do direito:

                a). Nulidade da sentença nos termos do artigo 615º, n.º 1, alínea d), do CPC –“omissão de pronúncia”;

               Diz o Autor que o acórdão recorrido padece do vício da nulidade por omissão de pronúncia.

               Estipula o artigo 77º, n.º 1, do CPT, que a arguição de nulidades quer da sentença quer dos acórdãos é feita expressa e separadamente no requerimento de interposição de recurso, sob pena delas não se conhecer.

               É jurisprudência consolidada desta Secção Social e Supremo Tribunal que “[s]endo o requerimento de interposição do recurso de revista omisso quanto às nulidades do acórdão, constando apenas a sua invocação e fundamentação na alegação de recurso, a arguição não é atendível, por incumprimento do disposto no artigo 77.º, n.º 1, do CPT[6].

               

                Esta norma não é inconstitucional.

Na verdade, o Tribunal Constitucional já se pronunciou sobre a mesma, no Acórdão n.º 439/03, de 2003.09.30, proferido no Processo n.º 186/03 – 2ª secção[7], no sentido de:

- "Não julgar inconstitucional, face ao disposto nos artigos 2º, 20º, 205º, e 207º da Constituição da República Portuguesa, e ao princípio da proporcionalidade, a norma constante do art.º 77º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 480/99, de 9 de Novembro, na interpretação segundo a qual, devendo o requerimento de interposição do recurso de agravo ser logo acompanhado das respetivas alegações, numa única peça processual, as nulidades da sentença recorrida não podem ser conhecidas pelo Tribunal Superior, caso tenham sido apenas arguidas, expressa e separadamente, na parte das alegações e não na parte do requerimento de interposição do recurso."

               No caso em apreço, a arguição da nulidade feita, apenas, na peça única [de alegação/arguição], sem haver, no requerimento de interposição do recurso, qualquer referência à sua invocação, não está feita com nominação expressa e de modo distinto e separado das alegações.

               Não se mostram, deste modo, efetuadas de forma explícita, declarada e isoladamente, a concretização da nulidade e a da alegação do recurso.

               Assim sendo, não se toma conhecimento da nulidade invocada, uma vez que, não tendo sido dado cumprimento ao estabelecido no artigo 77º, n.º 1, do CPT, a sua arguição é inatendível, por extemporaneidade.

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              b). (I)licitude da sanção disciplinar, por invalidade do procedimento disciplinar:

               O artigo 357º, n.º 4, do CT, determina que, na decisão de despedimento por facto imputável ao trabalhador, devem ser “ponderadas as circunstâncias do caso, nomeadamente as referidas no n.º 3 do artigo 351 º, a adequação do despedimento à culpabilidade do trabalhador e os pareceres dos representantes dos trabalhadores, não podendo ser invocados factos não constantes da nota de culpa ou da resposta do trabalhador, salvo se atenuarem a responsabilidade.”

               Por sua vez, o artigo 382º, n.º 2, alínea d), do CT, dispõe que, no despedimento por facto imputável ao trabalhador, o procedimento disciplinar é inválido se “a comunicação ao trabalhador da decisão de despedimento e dos seus fundamentos não for feita por escrito, ou não esteja elaborada nos termos do n.º 4 do artigo 35 […].”

               A mesma norma, na alínea a), determina a invalidade, também, do procedimento do despedimento, quando “faltar a nota de culpa, ou se esta for escrita ou não contiver a descrição circunstanciada dos factos imputados ao trabalhador."

               

                O princípio do contraditório é um princípio geral e comum a todos os direitos sancionatórios, nomeadamente do direito sancionatório laboral.

Ora, a lei não exige um procedimento formal para a aplicação ao trabalhador de uma sanção conservatória, mas exige, sempre, que se salvaguarde o direito de defesa do trabalhador.

               É o que resulta do artigo 329º, n.º 6, do CT, dispondo, apenas, que nenhuma sanção disciplinar pode ser aplicada sem audiência prévia do trabalhador.


               Acresce que, sendo aplicada uma sanção, de acordo com o seu n.º 7, pode o trabalhador, ainda, defender-se através de reclamação para o escalão hierarquicamente superior ao que aplicou a sanção, ou do recurso a um processo de resolução de litígio, quando previsto em IRCT ou na lei, sem prejuízo sempre do direito de ação judicial,

               Contudo, quer a doutrina quer a jurisprudência, para melhor salvaguarda do direito de defesa do trabalhador, têm entendido que também deve existir um procedimento disciplinar, prévio à aplicação das sanções, mesmo conservatórias.
A única exceção admitida, para alguns autores, dado o seu imediatismo, é na aplicação da sanção disciplinar da repreensão oral, também, chamada de mera repreensão – artigo 328º, n.º 1, alínea a), do CT.
               
               Para Júlio Gomes, o Código do Trabalho não regula em detalhe o procedimento disciplinar na parte referente às sanções conservatórias[8].
“A este respeito, o Código limitou-se a estabelecer a obrigatoriedade de audiência prévia do trabalhador. É de lamentar este silêncio, tanto mais que se poderia discutir, face ao princípio da liberdade de forma, que impera no contrato de trabalho, se este procedimento terá, pelo menos, que obedecer à forma escrita. Não existe, em rigor, um fundamento legal para tal exigência, a não ser que tal se possa retirar da própria expressão procedimento e, sobretudo, do escopo que esta procedimentalização, ou ritualização, do exercício do poder disciplinar tem, como técnica para o controlo do exercício deste poder, prevenindo a sua utilização arbitrária. Admitimos, contudo, que certas sanções disciplinares muito leves - é, o caso por exemplo, de meras repreensões – possam ser aplicadas sem qualquer, procedimento disciplinar e escrito prévio.”

               

               Para Maria do Rosário Palma Ramalho[9], “[n]o nosso sistema jurídico, a exigência do processo disciplinar é aplicável a todas as sanções disciplinares, o que no caso da sanção de repreensão oral não faz grande sentido, uma vez que esta sanção se consubstancia num juízo de censura imediata e direta do empregador. Para a aplicação das restantes exige-se, para a aplicação de qualquer sanção disciplinar, a existência de um processo disciplinar, para assegurar, eficazmente, o direito de defesa do trabalhador.”


               Existem, assim, dois tipos de processo disciplinar, denominados de “procedimento”, tendo em conta a sanção que o empregador pretende aplicar:
               - O procedimento disciplinar comum, previsto para a aplicação das sanções conservatórias e reguladas no artigo 329º;
               - O procedimento disciplinar para a aplicação da sanção de despedimento por facto imputável ao trabalhador, regulado nos artigos 353º e seguintes.
               
                Apesar desta dualidade de procedimentos, os princípios gerais do direito sancionatório laboral aplicam-se comummente aos dois, mas o procedimento para aplicação de sanção conservatória não é tão exigente, como o procedimento para o despedimento, em relação à nota de culpa, à qualificação da infração disciplinar e à necessidade de fundamentação.
               O procedimento disciplinar inicia-se com a nota de culpa que, nos termos do artigo 353º, n.º 1, do CT, deve ser deduzida por escrito e conter uma descrição circunstanciada dos factos que são imputados ao trabalhador.
               Devendo-se descrever fundamentadamente as circunstâncias de tempo, modo e lugar dos factos que, na perspetiva do empregador, integram a infração que imputa ao trabalhador, não chega, pois, a indicação de comportamentos genéricos, vagos e imprecisos.
               A sua falta - desta descrição circunstanciada – dá lugar, em princípio, à invalidade do procedimento, nos termos do artigo 382º, n.º 2, alínea a), do CT.
               Segundo o critério da adequação funcional”, adotado maioritariamente quer pela doutrina quer pela jurisprudência, não se verifica a invalidade do procedimento, apesar das imprecisões e generalidades da nota de culpa, da falta de factos relevantes para a decisão, mas não da dos essenciais, da falta da qualificação jurídica dos factos ou quando aquela se mostra errada, etc., quando o trabalhador demonstra, através da sua resposta, que compreendeu e conheceu, de forma precisa, os factos que lhe foram imputados e que entendeu, convenientemente, a acusação que lhe foi feita[10].  
               
Deste modo, terá que se aferir perante cada situação concreta se a nota de culpa é apta a permitir que o trabalhador compreenda os factos que lhe são imputados e dos mesmos se possa defender.
             Isto, porquanto a concretização de factos na nota de culpa visa, ao fim e ao resto, permitir ao trabalhador apreender os factos de que é acusado e proporcionar-lhe a defesa dos mesmos, ou seja, tem por óbvia finalidade permitir a este o perfeito conhecimento dos factos que lhe são atribuídos, a fim de poder organizar adequadamente a sua defesa.

Para Monteiro Fernandes[11], ”[a] doutrina dos tribunais em matéria de idoneidade funcional da nota de culpa coloca o acento tónico na aptidão funcional da nota de culpa enquanto suporte de defesa do arguido.”

               Acresce que de acordo com o artigo 357º, n.º 4, do CT, na decisão disciplinar não podem ser invocados factos não constantes da nota de culpa, e que, nos termos do artigo 387º, n.º3, do CT, na ação especial de impugnação da sanção disciplinar aplicada, o empregador só pode invocar factos e fundamentos constantes da decisão disciplinar comunicada ao trabalhador.
                Por outro lado, o empregador não é obrigado a indicar, na nota de culpa, as normas jurídicas violadas.

                Conforme decidiu o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 21.05.2012[12] “[d]os normativos acima citados não resulta a obrigação de o empregador ter de inserir na nota de culpa as normas jurídicas violadas pelos factos que nela imputa ao trabalhador. E também não existe, como dissemos, qualquer sanção para essa violação.
               A nota de culpa tem algumas semelhanças com a acusação prevista no mundo processual penal.               Ambas têm o papel fulcral de delimitar o ”thema decidendum”, ou seja, é nelas que devem ser inseridos os factos concretos imputados ao arguido como forma de assegurar a plenitude da defesa, garantindo a este que apenas tem que defender-se dos factos acusados, e não de outros, e que apenas poderá ser «condenado» pelos factos constantes nas referidas peças.
               No entanto, tendo em conta os valores que estão em jogo, a nota de culpa não reveste o rigor que a lei exige à acusação penal. […].”

               Aliás, como diz Pedro Furtado Martins[13], não se deve sobrevalorizar a exigência da nota de culpa conter uma descrição circunstanciada dos factos que são imputados ao arguido “sob pena de a mesma se poder tornar inultrapassável, a ponto de ser mais difícil elaborar uma nota de culpa do que deduzir uma acusação em processo penal. “.

               Ora, é jurisprudência deste Supremo Tribunal que a irregularidade da nota de culpa derivada da insuficiente descrição dos factos imputados ao trabalhador deve ser apreciada à luz de um "critério de adequação funcional".

               Por todos, veja-se o acórdão de 27.02.2002, do Supremo Tribunal de Justiça, proferido no Processo n.º 02S2239, em www.dgsi.pt, segundo o qual “a exigência legal de que a nota de culpa contenha uma descrição circunstanciada dos factos que são imputados ao arguido tem por óbvia finalidade permitir a este o perfeito conhecimento dos factos (faltas disciplinares) que lhe são atribuídos, a fim de poder organizar adequadamente a sua defesa, daí que, embora elaborada deficientemente a nota de culpa, se constatar, através da defesa apresentada pelo arguido, que o mesmo entendeu convenientemente a acusação, deverá considerar--se sanado aquele vício, em virtude de se mostrar alcançado o fim tido em vista com aquela exigência legal.”

~~~~~~
               
                Consta no artigo 5º, da decisão, que os factos descritos em 3º [“e-mail” do Comandante] e 4º [resposta do Autor] representam a violação do dever do arguido previsto no artigo 128º, n.º 1, alínea c), do CT.

Do “Relatório” e da “Proposta” do Instrutor do procedimento disciplinar, acolhidos na sentença, consta o seguinte:

(…)

“Na sua defesa o arguido alega que o Sr. Comandante já havia falado com ele ainda antes do envio do “e-mail” – as funções que lhe estavam a ser determinadas eram estranhas à sua categoria profissional – referiu que o Sr. Comandante devia procurar outra solução – As tarefas que lhe estavam a ser pedidas justificam o pagamento de uma remuneração fixa mensal que a ele não é paga – nunca o Sr. Comandante lhe referiu que não havia ... disponíveis.

Vê-se, assim, que a ordem dada pelo Sr. Comandante foi primeiramente verbal e só depois remetida por “e-mail”.
De acordo com a informação do Presidente da Associação a categoria profissional pela qual o arguido é pago é de ... e, como tal, pago com remuneração superior:

Tais alegações em nada contribuem para infirmar os factos constantes da nota de culpa e, ao contrário, reforçam o facto de a ordem lhe ter sido transmitida em dois momentos e por meios diferentes sendo acrescida a gravidade da desobediência e do desrespeito ao Sr. Comandante, seu superior hierárquico.

Por assim ser, o instrutor mantém na íntegra a Nota de Culpa quanto aos factos e quanto ao direito propõe a aplicação ao arguido de uma sanção de repreensão escrita registada.”

                Alega o Recorrente o seguinte:

               Recebeu uma nota de culpa contra si deduzida, acusando-o de não exercer com zelo e diligência as suas funções […] e de violar o previsto no artigo 128º, n.º 1, alínea c), do CT, tendo, na decisão, sido considerado o facto de a ordem lhe ter sido transmitida, em dois momentos sendo “acrescida a gravidade da desobediência e desrespeito ao Sr. Comandante, seu superior hierárquico”, sendo, pois, punido por ter desobedecido a uma ordem de superior hierárquico.
               Continua dizendo que, apesar dos factos serem os mesmos, quer na nota de culpa quer na decisão, naquela considera-se em causa a violação do dever de zelo e diligência do trabalhador e nesta a violação a ordens diretas do superior hierárquico.
Conclui, assim, que foi confrontado com um facto novo na decisão, facto que não lhe foi anteriormente dado a conhecer e, relativamente ao qual, não pôde exercer o contraditório.

               No caso, provou-se que o Relatório junto com a notificação da decisão disciplinar refere no penúltimo parágrafo “[...] reforçam o facto de a ordem lhe ter sido transmitida em dois momentos […] sendo acrescida a gravidade da desobediência e desrespeito ao Sr. Comandante seu superior hierárquico” – artigo 7º, da matéria de facto provada.

               Ora, comparada a decisão disciplinar, que concordou e acolheu todo o relatório e a proposta do Instrutor, com a nota de culpa, verifica-se que não houve qualquer alteração factual e nem qualquer alteração jurídica dos factos imputados e praticados pelo arguido.

               As afirmações do Autor decorrem do Relatório do Instrutor, quando diz que as suas alegações “em nada contribuem para infirmar os factos constantes da nota de culpa e, ao contrário, reforçam o facto de a ordem lhe ter sido transmitida em dois momentos e por meios diferentes sendo acrescida da gravidade da desobediência e do desrespeito ao Sr. Comandante, seu superior hierárquico”.

               Contudo, apesar dessas considerações, a circunstância de a ordem ter sido transmitida ao arguido em dois momentos e por meios diferentes, ou seja, quanto à reiteração da conduta disciplinar do arguido, com o consequente agravamento da sanção, já constava da nota de culpa.
                Na verdade, no seu “e-mail”, que integra a nota de culpa, o Comandante fez constar, expressamente [” venho por este meio e tal como já fiz verbalmente solicitar ao S. AA (...)], que já havia dado ao Autor a mesma ordem, antes e de forma verbal – artigo 3º, dos factos provados,
Assim sendo, na nota de culpa já figurava que a ordem dada ao Autor, para executar o transporte do doente do Centro de Saúde para …, foi proferida em dois momentos e por meios diversos – ponto 8, dos factos provados.

                Quer na nota de culpa quer na decisão disciplinar, apesar dos factos imputados ao Autor, se referirem ao seu não acatamento da ordem que lhe foi dada pelo Comandante, para efetuar o citado transporte, em ambas o enquadramento jurídico feito pela Ré, em termos de identificação do dever considerado infringido, foi o mesmo, ou seja, o de ter violado o dever previsto no artigo 128º, n.º 1, alínea c), do CT – dever de zelo e de diligência.

               Ora, constando na decisão disciplinar que se mantinha, na íntegra, a nota de culpa quer quanto aos factos quer quanto ao direito, “não se procedeu na proposta de decisão, que viria a ser acolhida na decisão disciplinar, a qualquer espécie de alteração em relação aos factos aduzidos na nota de culpa, nem mesmo [...] em relação ao enquadramento jurídico que dos mesmos nela se tinham efetuado em termos de identificação do dever do trabalhador que se considerava infringido pela conduta do mesmo”, como se diz no acórdão recorrido.
               
               Acresce que o Autor, ao contrário do que alega, exerceu o contraditório quanto ao que refere ser “um facto novo”, tendo-o exercido no “e-mail” de resposta ao do seu Comandante, onde diz que não cumpria o que lhe fora determinado.
Não o cumpria por a ordem ser ilegítima, uma vez que, por um lado, efetuar serviços de transporte não fazia parte das funções da sua categoria profissional, e, por outro lado, não ser do seu conhecimento a existência de uma escala de serviço prevista para quando existisse falta de ....
               
               De tudo o exposto resulta que o que se pretende com o disposto no artigo 357º, n.º 4, do CT, no que concerne à relação entre os factos aduzidos na nota de culpa e aqueles que depois se invocam na decisão disciplinar, é impedir que o trabalhador seja surpreendido com a introdução na decisão disciplinar de factos que não lhe foram anteriormente dados a conhecer e em relação aos quais não pode exercer o contraditório.
                O que não aconteceu no caso em apreço.
               Tendo em consideração o “critério da adequação funcional” da nota de culpa, e o facto de nela não ser obrigatória a indicação das normas jurídicas violadas, conclui-se que o diferente enquadramento jurídico dos factos que aí são imputados ao trabalhador, permanecendo estes inalterados, não consubstancia invocação de qualquer facto novo.

               Inexiste, assim, a apontada invalidade do procedimento disciplinar e, consequentemente, a sanção disciplinar aplicada ao Autor é lícita.

///

            c). Inexistência de qualquer infração disciplinar:

           

           Alega, por fim, o Recorrente que, considerando os factos assentes, não praticou qualquer infração disciplinar, nomeadamente, as consagradas no artigo 128º, n.º 1, alíneas c) e e), do CT.

               

                Para o efeito, diz que realizou sempre o seu trabalho com zelo e diligência e que não ofendeu, naquele dia, o dever de obediência à ordem do seu Comandante porque tinha deixado, por razões de falta de saúde, de ser de ..., passando a ser ....

                Assim, a ordem que lhe foi dada era ilegítima e, por isso, não lhe era devida obediência.

            Também aqui carece de razão.

                Da matéria de facto provada resulta que o Autor foi admitido ao serviço da Ré, em 01.07.2007, para exercer as funções de ..., mas que, por motivos de falta de saúde, deixou, em 2010, de exercer essas funções, passando a exercer as funções de ..., tendo sido colocado como “Operador”, na “Central ...” – pontos 4, 5 e 15.

                Cabendo, nos termos do artigo 115º, n.º 1, do CT, às partes determinar por acordo a atividade para que o trabalhador é contratado, no caso em apreço, o contrato de trabalho inicialmente acordado foi consensualmente modificado, tendo o Autor passado a exercer funções de ....

               Ora, ficou assente que o Autor, como os restantes Operadores da Central, exercem também as tarefas de ..., quando necessário, ou seja, quando não existem ...s disponíveis e a título acessório e pontual – pontos 6 e 10.

               Para os compensar, por essa disponibilidade, todos os ...s auferiam mensalmente, para além do seu salário, uma prestação fixa, à exceção do Autor, porque este auferia uma remuneração correspondente à categoria profissional de ..., sua categoria de origem – pontos 5, 15 e 10.

                E nem se diga que o seu estado de saúde o não permitia, pois era ele próprio quem se queixava, com frequência, por não integrar a escala de serviço dos piquetes, conduzindo veículos pesados e acudindo a situações mais exigentes, tais como acidentes de viação, transporte urgente de doentes, incêndios, a fim de, por essa forma, auferir acréscimos remuneratórios – ponto 15.

               Provou-se que os “Operadores da Central” se encontram sobre as ordens diretas do Comando dos Bombeiros e que na circunstância, em que a ordem foi dada não havia qualquer ... disponível, conforme constava no “Quadro de Pessoal” – pontos 6, 10 e 11.

~~~~~~

               

               Deste modo, a ordem que foi dada, verbalmente e via “e-mail”, pelo Comandante dos Bombeiros, para o Autor efetuar o transporte de um doente, do Centro de Saúde para …, foi uma ordem legítima, à qual o Recorrente devia obediência, dado que fazia parte do objeto do seu contrato, consensualmente modificado, o desempenho de funções de ..., agora acessória e casuisticamente.

               Recusando-se a fazer esse transporte, e não sendo ilegítima a ordem que lhe foi dada por quem tinha poderes para o efeito, praticou o Recorrente infração disciplinar pela qual foi sancionado com uma repreensão escrita registada.

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                Deliberação:
• Pelo exposto acorda-se em não se tomar conhecimento da invocada nulidade do acórdão recorrido e em se negar a revista.

Custas da revista pelo Recorrente, sem prejuízo do benefício do Apoio Judiciário, na modalidade que lhe foi concedida.

• Registe.

Anexa-se sumário do acórdão.

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Lisboa, 23.01.2019

Ferreira Pinto  (Relator)
Chambel Mourisco
Pinto Hespanhol

_________________
[1] - Registo n.º 29/2018 – (FP) CM/PH.
[2] - Relatório feito com base nos das instâncias.
[3] - Doravante CPT.
[4] - Doravante CT.
[5] - Doravante CPC.
[6] http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/d5d23dfc667638378025823d00368670?OpenDocument&Highlight=0,nulidade,artigo,77,CPT – Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22.02.2018, proferido no Processo n.º 8948/15.1T8CBR.C1.S1, no qual somos 1º Adjunto.
[7] - http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20030439.html.

[8] - Direito do Trabalho, Volume I, Relações Individuais do Trabalho, Coimbra Editora, 2007, página 896, relativamente ao artigo 371º, n.º 1, do T/2003, que equivale agora ao artigo 329º, n.º 2, do CT/2009.
[9] - Maria do Rosário Palma Ramalho, Tratado de Direito do Trabalho, Parte II - Situações Laborais Individuais, 4ª edição, Almedina, páginas 611/612.
[10] - Pedro Ferreira de Sousa, O Procedimento Disciplinar Laboral, 2016, Almedina, páginas 56/58.
[11] - Direito do Trabalho, 18ª edição, Almedina, 2017, página 591.
[12] - http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/21286a955b8b11b580257a0d0038fd28?OpenDocument. Proferido no Processo n.º 1212/09.7TTGMR.P1.
[13] - Cessação do Contrato de Trabalho, 4ª edição revista e atualizada, Principia, 2017, página 209.