Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
940/15.2T8VFR.P1.S1
Nº Convencional: 4.ª SECÇÃO
Relator: PEDRO BRANQUINHO DIAS
Descritores: VIOLAÇÃO DAS REGRAS DE SEGURANÇA
ACIDENTE DE TRABALHO
ÓNUS DA PROVA
Data do Acordão: 09/07/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA.
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO.
Sumário :

I. Não tendo a Ré Seguradora logrado provar que a entidade patronal do sinistrado violou as regras de segurança do trabalho, conforme havia alegado, só ela poderá ser responsabilizada pelo pagamento da totalidade da pensão anual a que o Autor tem direito, nos termos da Lei dos Acidentes de Trabalho.

II. Com efeito, segundo jurisprudência constante do STJ, a prova dos pressupostos do agravamento da responsabilidade pelos danos causados em acidente de trabalho, nos termos do art. 18.º n.º 1, da LAT, recai sobre a parte que o invoca.

Decisão Texto Integral:


Proc. n.º 940/15.2T8VFR.P1.S1, da 4.ª S.

(Revista)

Acordam, em Conferência, na Secção Social, do Supremo Tribunal

de Justiça

I. Relatório

1. A Ré Lusitânia – Companhia de Seguros, S.A. interpôs o presente recurso de revista do acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 15/12/2021, que julgou procedente o recurso de apelação da Ré patronal Urbigreen – Construções Unipessoal, LDA, relativamente à impugnação sobre a decisão da matéria de facto e também procedente sobre a matéria de direito, e, em consequência, revogou a sentença recorrida na parte da violação das regras de segurança, absolvendo a referida Ré e confirmando, no mais, a sentença recorrida.

Apresentou as seguintes Conclusões, que passamos a transcrever:

1.ª - As presentes Alegações de Recurso visam impugnar a decisão proferida pelo Tribunal “a quo” no que à responsabilidade da recorrente diz respeito, atenta a matéria de facto dada como provada nos presentes autos.

2.ª - O que não entendemos e não podemos aceitar de maneira nenhuma, porquanto, entende a ora Recorrente, ser de concluir pela existência de nexo de causalidade entre a omissão daquele conjunto de deveres e a ocorrência do acidente que vitimou o sinistrado, impondo-se, assim, concluir que o acidente verificado deve ser imputado à violação de regras de segurança por parte da entidade empregadora, nos termos do art. 18º, nº 1 2ª parte, da Lei dos Acidentes de Trabalho.

3.ª - Da matéria dada como provada, no que concerne à caracterização do local, equipamentos de segurança e dinâmica do acidente de trabalho (arts. 8.º e 17.º (nova redação) a 21.º do elenco de factos provados), permite aferir a forma como se encontrava montado o andaime no local da obra (no piso superior do edifício, sobre o terraço privativo de duas frações, atravessando o muro divisório entre estas) e as condições que este apresentava no que se refere a materiais e equipamentos coletivos de proteção (estrutura de andaime em ferro, com guarda-corpos a cerca de 92cm, tábua em madeira).

4.ª - De acordo com a matéria de facto provada, verificamos que o andaime encontrava-se dotado de um guarda corpos, mas colocado de forma irregular, situado a uma altura de 92 cm, quando, deveriam ter sido colocados no mínimo 2 guarda corpos na horizontal, respetivamente, a 90 cm e 45 cm, o que oferecia maior proteção pelo espaço vazio existente entre as duas barras de proteção, sendo que, do douto acórdão proferido, consta como matéria provada a existência de um único guarda corpos, situado a 92 cm a contar da plataforma (entenda-se, prancha em madeira apenas pousada em cima do andaime !!!).

5.ª - Ou seja, verifica-se que a tábua utilizada como plataforma para os trabalhadores estava meramente pousada na estrutura do andaime e não fixada a esta, consubstanciando uma violação grave das normas de segurança para trabalhos em altura.

6.ª - Assim dos factos provados, é possível verificar e concluir que o andaime não estava dotado de guarda corpos que oferecessem segurança para a execução de trabalhos em altura, porquanto, possui um espaço vazio de cerca de 92 cm entre a prancha de madeira e a barra de proteção, existindo assim um espaço livre desprotegido, suficientemente largo para através dele passar o vulto humano.

7.ª - Por outro lado, o andaime não estava fixo à parede, nem as tábuas utilizadas para suportar os trabalhos em altura se encontravam presas à estrutura metálica daquele, antes repousando simplesmente em cima do travejamento metálico, e de forma sobreposta conforme matéria dada como provada, não oferecendo assim a necessária estabilidade para a execução de trabalhos.

8.ª - Note-se, aliás, que o sinistrado não se encontrava a trabalhar sozinho em cima da estrutura do andaime, mas acompanhado da testemunha AA, o que representa um perigo acrescido, sobretudo nas condições descritas, de ausência de fixação do andaime à parede a intervencionar e de fixação das tábuas à estrutura do andaime, bem como da inexistência dos guarda corpos necessários para o efeito.

9.ª - Apenas pelo supra referido, entenda a Recorrente que, quer a falta de fixação do andaime à parede do edifício, quer a sobreposição das tábuas de suporte dos trabalhadores e a sua ausência de ligação fixa à estrutura metálica do andaime contribuíram para aumentar a instabilidade da estrutura, sendo aptas a provocar o desequilíbrio do trabalhador, que caiu no espaço vazio entre a plataforma e a barra de proteção, o que se verificou no acidente em causa nos autos.

10.ª - Assim sendo, resta concluir que a queda ocorreu por entre prancha de madeira e a barra guarda corpos localizada a 92 cms, a qual possuía um espaço vazio de cerca de 92 cm, através do qual passava o corpo humano.

11.ª - No caso sub iudice, apurou-se que a entidade empregadora não assegurou que o guarda corpos do andaime (equipamento de proteção coletiva) estivesse devidamente montado por forma a evitar zonas desprotegidas e não diligenciou pela devida fixação, quer da plataforma de madeira à estrutura metálica do andaime, quer de toda a estrutura do andaime à parede, de forma a evitar a oscilação do andaime e o desequilíbrio do sinistrado.

12.ª - Em face da factualidade apurada, estão em causa as seguintes prescrições legais em matéria de segurança no trabalho:

I. Art. 14.º do Decreto-Lei n.º 50/2005, 25 de fevereiro, que transpõe para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 89/655/CEE, do Conselho, de 30 de Novembro, alterada pela Directiva n.º 95/63/CE, do Conselho, de 5 de Dezembro, e pela Directiva n.º 2001/45/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de Junho, relativa às prescrições mínimas de segurança e de saúde para a utilização pelos trabalhadores de equipamentos de trabalho: “1 – Os equipamentos de trabalho e os respectivos elementos devem ser estabilizados por fixação ou por outros meios sempre que a segurança ou a saúde dos trabalhadores o justifique.

II. Artigo 42.º do DL nº 50/2005, de 25 de fevereiro (Plataformas do andaime): “1 – As dimensões, forma e disposição das plataformas do andaime devem ser adequadas ao trabalho a executar e às cargas a suportar, bem como permitir que os trabalhadores circulem e trabalhem em segurança. 2 – As plataformas do andaime devem ser fixadas sobre os respetivos apoios de modo que não se desloquem em condições normais de utilização. 3 - Entre os elementos das plataformas e os dispositivos de proteção coletiva contra quedas em altura não pode existir qualquer zona desprotegida suscetível de causar perigo. 4 - As partes do andaime que não estejam prontas a ser utilizadas, nomeadamente durante a montagem, desmontagem ou reconversão do andaime, devem ser assinaladas por meio de sinalização de segurança e saúde no trabalho, nos termos da legislação aplicável, e convenientemente delimitadas de modo a impedir o acesso à zona de perigo.

III. Art. 26.º do DL nº 41820 de 11 de agosto de 1958: “As tábuas de pé serão solidamente fixadas à estrutura, não podendo utilizar-se pregos para esse efeito”.

13.ª - No caso concreto, temos que o Equipamento de Proteção Coletiva montado no local (andaime com guarda corpos), não se encontrava fixo à parede, por forma a evitar a oscilação, nem o guarda corpos prevenia o risco de queda em altura, na medida em que entre a barra metálica de proteção existia um vão de 92 cm, que permitia a passagem do corpo humano.

14.ª - Sempre se dirá que, ainda que o referido andaime não dispusesse, de origem, de uma barra intermédia (ou de duas barras situadas a 90 cm e a 45 cm da plataforma), tal não eximia a Entidade Empregadora de verificar antecipadamente a adequação do equipamento às normas de segurança vigentes, sobretudo num caso, como o presente, em que não eram adequados certos EPI’s individuais (designadamente arnês), sendo a proteção dos trabalhadores garantida unicamente por via de Equipamentos de Proteção Coletiva.

15.ª - De facto, não é suficiente para o cumprimento das prescrições legais em matéria de segurança a simples montagem de um andaime com guarda corpos. É necessário que os mesmos salvaguardem, de forma efetiva, o risco de queda em altura e que a estrutura esteja devidamente fixada por forma a evitar oscilações suscetíveis de provocar o desequilíbrio dos trabalhadores.

16.ª - No caso concreto tal não foi observado, pelo que é manifesto que resultaram violadas as prescrições legais em matéria de segurança citadas, violação que é imputável à entidade empregadora, ora recorrida.

17.ª - Quanto ao nexo de causalidade, entende a ora Recorrente que, quer de um ponto de vista naturalístico, quer jurídico, a violação das referidas regras legais foi causa adequada da produção do acidente.

18.ª - Com efeito, e como se encontra explanado na matéria de fato dada como provada, temos que a queda do trabalhador de uma altura de 1,90m foi provocada pelo desequilíbrio deste, no contexto de utilização de um andaime que não se encontrava fixo à parede, que dispunha de plataformas de madeira colocadas de forma meramente sobreposta (sem estarem fixas à estrutura) e tinha uma abertura de 92 cm entre a prancha de madeira e a barra de protecção que funcionavam como guarda corpos.

19.ª - A probabilidade de uma queda ocorrer nestas circunstâncias era, pois, elevada. De um ponto de vista naturalístico (à luz das regras da experiência comum e da lógica) e jurídico (tendo em vista as premissas da teoria da causalidade adequada) a omissão pela entidade empregadora de cumprimento dos deveres legais referidos, respeitantes à utilização de um andaime, deverá, pois, ser considerada causa adequada do dano. Não fosse a existência de uma abertura irregular entre as barras, criando uma zona de desproteção suficientemente larga para permitir a passagem do corpo humano, e de um andaime e uma plataforma não devidamente fixados e aptos a criar estabilidade, a queda – e logo os danos – não teria ocorrido.

20.ª - Resulta assim provado que o andaime estava dotado de guarda corpos (facto 17), mas para que fique claro, isso não basta para cumprir os requisitos da norma acima apontada.

21.ª - É sempre necessário o andaime encontrar-se travado, devidamente fixo e escorado à parede de forma a não abanar para evitar o desequilíbrio dos trabalhadores.

22.ª - Para proteger os trabalhadores contra quedas em altura das plataformas de trabalho, os andaimes não podem ter qualquer zona desprotegida suscetível de causar perigo, significando isto que não basta que estejam dotados de guarda corpos, sendo também sempre necessário que tenham uma guarda intermédia e rodapé, bem como estarem travados, fixos e escorados à parede de forma a não abanar para evitar o desequilíbrio dos trabalhadores.

23.ª - A razão é óbvia, o guarda corpos apenas protege de queda ao nível da parte superior do corpo dos trabalhadores. Se o andaime apenas estiver equipado com esta proteção, caso o trabalhador esteja a trabalhar agachado ou tropece e caia na própria plataforma, há o elevado risco de cair pelo espaço aberto entre o guarda-corpos e a base daquela.

24.ª - No caso concreto o andaime não dispunha daquelas proteções, não estando assim eficazmente protegido o risco contra quedas em altura.

25.ª - Pois bem, atendendo a todo o quadro factual que se evidenciou, feita essa ponderação, cremos ser forçoso concluir que a completa omissão pela entidade empregadora de cumprimento dos deveres de identificar os riscos, designadamente, de queda em altura, bem assim de organizar e planear o trabalho de modo a eliminá-los ou, pelo menos, a reduzi-los tanto quanto possível, em conformidade com as regras legais definidas para o efeito, levou a que a probabilidade objectiva de ocorrer um acidente de trabalho, designadamente, de queda em altura, devido a essa omissão de medidas, fosse muito elevada.

26.ª - Nesta consideração, conclui-se pela existência de nexo de causalidade entre a omissão daquele conjunto de deveres e a ocorrência do acidente que vitimou o sinistrado, em consequência procedendo esta linha de argumentação da recorrente, que implica uma decisão diferente da ora recorrida.

27.ª - Ora dos factos provados, resulta resumidamente que o acidente ocorreu em virtude da falta de guarda corpos devidamente colocados no andaime (por forma a evitar a existência de um vão de 92 cm entre a prancha de madeira e a barra de proteção) e à falta de fixação, quer da plataforma de madeira onde circulavam os trabalhadores, quer do andaime, não sendo necessária – nem adequada – em concreto a utilização de um cinto de segurança ou arnês, dada a altura de 1,90m em que decorriam os trabalhos, que não permitiria o bloqueio da queda do trabalhador antes de atingir o solo.

28.ª - Entende a Recorrente ter-se verificado nexo de causalidade entre a omissão daquele conjunto de deveres e a ocorrência do acidente que vitimou o sinistrado, impondo-se, assim, concluir que o acidente verificado deve ser imputado à violação de regras de segurança por parte da entidade empregadora, nos termos do art. 18º, nº 2, da Lei dos Acidentes de Trabalho.

29.ª - Assim, o julgador do Tribunal “a quo” mui doutamente deveria ter concluído pela omissão/ violação de um conjunto de deveres de segurança e pela existência de nexo de causalidade entra essa violação e a ocorrência do acidente que vitimou o sinistrado, impondo-se, assim, concluir que o acidente verificado deve ser imputado à violação de regras de segurança por parte da entidade empregadora, nos termos do art. 18º, nº 2, da Lei dos Acidentes de Trabalho.

30.ª - Pelo exposto, entendemos que o douto Acórdão fez uma incorreta apreciação da matéria de fato dada como provada e não provada, procedeu a uma deficiente interpretação e aplicação do direito, razão pela qual se entende que o mesmo deverá ser revogado, e em consequência a sua substituição, por uma decisão em conformidade com o supra alegado.

31.ª - Ao decidir como decidiu, o douto Acórdão recorrido violou, designadamente e entre outras disposições legais, o disposto nos artigos 18.º n.º 1 2ª parte e 79.º n.º3 da Lei dos Acidentes Trabalho, Lei nº 98/2009, de 4 de Setembro, artigos 14.º e 42.º do Decreto-Lei n.º 50/2005, 25 de fevereiro, artigo 26.º do DL nº 41820 de 11 de agosto de 1958, a Lei 102/2009, de 10 de Setembro.

Termos em que e nos demais de direito deverá conceder-se provimento ao presente recurso interposto e em consequência revogando-se o douto Acórdão recorrido, mantendo-se o decidido na douta sentença proferida pelo Tribunal de 1ª Instância.

Assim se fazendo JUSTIÇA.

2. Contra-alegou a recorrida Urbigreen, sustentando, em síntese, que não obstante entender que, em face das circunstâncias concretas em que estava a ser executado o trabalho em causa por parte do sinistrado, não houve qualquer imprudência, mas ainda que se verificasse ter existido omissão desse dever de prudência, tal não poderia ser associada à inobservância de preceitos legais e regulamentares ou de diretivas de entidades competentes, pelo que o recurso da recorrente deverá ser jugado improcedente, mantendo-se a sua absolvição de todos os pedidos.

3. Por despacho de 11/02/2022, o Senhor Juiz Desembargador relator admitiu o recurso de revista em questão.

4. O Senhor Procurador-Geral Adjunto emitiu, em 19/04/2022, douto parecer no sentido de ser negada a revista e confirmado o acórdão recorrido, não tendo nenhuma das partes exercido o contraditório.

5. Realizada a Conferência, cumpre, agora, apreciar e decidir.

II. Objeto do recurso

Em face do teor das Conclusões apresentadas pela recorrente e do conteúdo da decisão recorrida, está apenas em causa saber-se se o acidente sofrido pelo Autor deve ou não ser imputado à violação das regras de segurança por parte da entidade empregadora, nos termos do art. 18.º n.º 1, da Lei dos Acidentes de Trabalho.

III. Fundamentação

1. As instâncias deram como provados os seguintes factos (Transcrição):

 

1. O Autor, BB, nasceu em .../.../1962.

2. BB foi contratado para exercer por conta, sob as ordens e direção e fiscalização da Ré Urbigreen, Lda, funções de servente, mediante o pagamento da retribuição mensal base de € 485,00 x 14 meses.

3. No dia 09 de agosto de 2014, pelas 15:00 horas, o A. encontrava-se nessa qualidade, e durante a sua prestação laboral, no local de trabalho sito na Rua ..., ....

4. No referido dia e hora, a 2ª Ré, no âmbito da sua atividade, estava a executar o trabalho de cobertura de um prédio em material de “capoto”, sendo que o Autor ao serviço daquela se encontrava a aplicar a última demão de argamassa por cima daquele material.

5. No momento em que estava a executar o seu trabalho, posicionado por cima de uma prancha, o Autor caiu, tendo ficado inconsciente.

6. Em consequência da queda supra referida, o Autor esteve com Incapacidade Temporária Absoluta desde 10.08.2014 até 06.03.2015.

7. Urbigreen, Construções Unipessoal, Lda, celebrou com a Lusitânia, Companhia de Seguros, SA um contrato de seguro do ramo de acidentes de trabalho, titulado pela apólice ...47, nos termos do qual aquela transferiu para esta a responsabilidade infortunística por acidentes que envolvessem o Autor, pelo salário de € 485,00 x 14 meses.

(Da base Instrutória)

8. A prancha referida em 5.º estava colocada a uma altura de cerca de 1,90 metros.

9. Como consequência necessária e direta do acidente, o A. sofreu traumatismo crânio encefálico e trauma facial e torácico, apresentando hematoma epidural temporal direito com cerca de 10mm de espessura, com fratura da escama do temporal adjacente e extensão ao rochedo e base do crânio, com ar endocraniano; pequenos focos de contusão temporais direitos; fratura da arcada zigomática direita + parede lateral da órbitra direita com enfisema e hemossinuses fenoidal; hemotímpano direito; fratura do 1/3 médio da clavícula direita; fratura de arcos costais 4º - 7º dts.

10. Em consequência da queda descrita em 5.º, em 27-08-2014, foi diagnosticada ao Autor uma luxação inveterada da 1ª falange do polegar da mão esquerda, o que motivou uma cirurgia de correção, realizada no dia seguinte pelo serviço médico da 1ªRé.

11. Em consequência das lesões supra descritas o A. padeceu também de cefaleias, tonturas e dores intensas ao nível da região torácica e da mão esquerda.

12. Ainda como consequência necessária e direta da queda, o A. apresenta hoje sequelas de fratura de costelas, alterações auditivas, alterações de equilíbrio, acufenos e rigidez do polegar esquerdo interfalângica.

13. As quais o afetam, consequente, necessária e diretamente de uma desvalorização permanente para o trabalho de 55,99%.

14. Desde o dia 06 de março de 2015, data em que lhe foi dada alta clínica.

15. Aquando da execução do trabalho que ocasionou a queda, o Autor não utilizou cinto de segurança disponibilizado pela Entidade Empregadora.

16. A entidade empregadora não promoveu a realização de exames de saúde ao Autor aquando da sua admissão.

 17. O andaime em que o Autor laborava possuía guarda corpos com duas barras colocadas a 25 cm e 92 cm de altura, a contar da plataforma Alterado pelo Tribunal da Relação para:

17. O andaime em que o Autor laborava possuía guarda-corpos com 92 cm de altura, a contar da plataforma.”.

18. A prancha em que se encontrava o Autor era de madeira.

19. A referida prancha encontrava-se colocada por cima de um andaime, a cerca de 1,90m de altura.

20. O andaime que o Autor utilizava encontrava-se montado entre dois terraços, com pranchas em madeira, não se encontrando fixadas ou travadas à estrutura do andaime, para não se mexerem ou originarem o desequilíbrio do trabalhador.

21. O andaime não se encontrava travado, fixo e escorado à parede de forma a não abanar para evitar o desequilíbrio do Autor.

22. Em virtude do supra referido em 17.º a 21.º, quando o Autor se encontrava a trabalhar naquelas circunstâncias, o andaime moveu-se, o que originou o desequilíbrio do Autor e a queda no solo.

Eliminado.

23. A entidade empregadora não procedeu à elaboração do plano de segurança e saúde em obra, antes do início da execução da obra.

24. A entidade empregadora não informou previamente o trabalhador sobre o plano de segurança e saúde ou fichas de procedimento de segurança, no que diz respeito aos trabalhos por si executados e a fazer cumprir as suas especificações.

25. Nem alertou o Autor para qualquer tipo de falha.

  26. A prestação de trabalho referida em 2.º da matéria assente teve por base a celebração de sucessivos acordos intitulados “contratos a termo certo”, com a duração de 3 meses cada, no período compreendido entre 04.06.2014 e 31.12.2015.

27. O Autor encontra-se presentemente a prestar trabalho como servente na sociedade A..., Lda.

Factos não provados:

1. O Autor, decorridos quase dois anos após o acidente, ainda manifestava queixas referidas em 11.º.

2. Após a data da alta clínica, o Autor continuou a trabalhar para a 2ª Ré até ao dia 31 de dezembro de 2015.

3. Nesse período, a única limitação do Autor verificada pela 2ª Ré, no exercício das funções que lhe estavam confiadas, relacionou-se com a perda de acuidade auditiva do ouvido direito.

4. A queda descrita em 5.º dos Factos assentes foi consequência da falta de formação por parte da entidade empregadora.

5. A queda descrita em 5.º dos Factos assentes foi consequência da falta de elaboração de plano de segurança por parte da entidade empregadora.

6. A queda descrita em 5.º dos Factos assentes foi consequência da falta de elaboração de fichas de procedimento de segurança

7. A entidade empregadora não promoveu o devido acesso ao piso do andaime que se encontrava a ser utilizado, aquando do acidente de trabalho do aqui Autor.

8. A prancha em que se encontrava o Autor encontrava-se em mau estado de conservação.

9. O Autor não usava qualquer equipamento de proteção.

10. O andaime não estava regulado com sapatas em madeira, por forma a tentar vencer a inclinação do terreno e a irregularidade do piso, o que aumentara a instabilidade do mesmo.

11. A entidade empregadora não promoveu a realização de exames de saúde ao Autor antes do início da execução da obra.   

Nota: não se incluiu na matéria de facto provada e não provada a segunda parte do art. 13.º da Base Instrutória por se tratar de matéria conclusiva.

2. Ora, atenta tal matéria de facto dada como assente, é inequívoco que não se fez prova de que a entidade empregadora, a Ré Urbigreen, tenha violado, no caso em análise, as regras de segurança e saúde no trabalho, conforme alega a ora recorrente, pelo que afastada fica a responsabilidade agravada prevista no art. 18.º n.º 1, da LAT.

Na verdade, como bem observa o Senhor Procurador-Geral Adjunto, no seu desenvolvido parecer, a jurisprudência deste Supremo Tribunal tem, de forma constante, vindo a salientar de que o ónus da prova dos pressupostos do agravamento da responsabilidade pelos danos causados em acidente de trabalho recai sobre a parte que o invoca[1].

Nesta conformidade, bem andou a decisão recorrida em ter considerado, in casu, a Ré Seguradora a única responsável pelo pagamento da totalidade da pensão anual a que o Autor tem direito, nos termos da Lei dos Acidente de Trabalho.

IV. Decisão

Em face do exposto, acorda-se em negar a revista e, em consequência, confirmar-se o acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 15/12/2021.

Custas pela recorrente.

Anexa-se sumário (art. 663.º n.º 7, do C.P.C.)

Notifique.

Lisboa, 07/09/2022

(Processado e revisto pelo Relator)

Pedro Branquinho Dias (Relator)

Júlio Manuel Vieira Gomes

Ramalho Pinto

________________________________________________


[1] Cfr., com interesse, entre outros, os acórdãos do STJ de 25/10/2018, 1/3/2018 e 13/10/2016, cujos relatores são os Senhores Conselheiros Gonçalves Rocha, Ferreira Pinto e Pinto Hespanhol, nos processos, respetivamente, n.ºs 92/16.0T8BGC.G1.S2, 750/15.7T8MTS.P1.S1 e 443/13.0TTVNG.G1.S1, todos disponíveis em www.dgsi.pt.