Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
17074/16.5T8LSB.L1.S1
Nº Convencional: 1ª SECÇÃO
Relator: ALEXANDRE REIS
Descritores: DEPÓSITO BANCÁRIO
BANCO DE PORTUGAL
RESOLUÇÃO
DESPACHO SANEADOR
CONHECIMENTO DO MÉRITO
NEGÓCIO JURÍDICO
INVALIDADE
Data do Acordão: 02/27/2018
Votação: MAIORIA COM * VOT VENC
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: ANULADA A SENTENÇA PROFERIDA NA 1ª INSTÂNCIA
Área Temática:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL – PROCESSO DE DECLARAÇÃO / GESTÃO INICIAL DO PROCESSO E DA AUDIÊNCIA PRÉVIA .
Doutrina:
-Alberto dos Reis, Código de Processo Civil, Anotado, III, 4.ª edição, p. 189 e 190;
-Antunes Varela, Manual do Processo Civil, 2.ª edição, p. 385;
-Mafalda Miranda Barbosa, Boletim de Ciências Económicas, FDUC, Volume LIX, p. 104.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGO 595.º, N.º 1, AL. B).
REGIME GERAL DAS INSTITUIÇÕES DE CRÉDITO E SOCIEDADES FINANCEIRAS, APROVADO PELO DL N.º 298/92, DE 31 DE DEZEMBRO.
Legislação Comunitária:
REGULAMENTO DO PARLAMENTO EUROPEU E CONSELHO N.º 1022/2013/EU.
REGULAMENTO DO CONSELHO N.º 1024/2013/EU.
Referências Internacionais:
DIRECTIVA DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO N.º 2014/49/EU.
DIRECTIVA DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO N.º 2014/59/EU.
REGULAMENTO DO BANCO CENTRAL EUROPEU N.º 468/2014/EU.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:


- DE 26-09-2017;
- DE 02-11-2017, AMBOS IN WWW.DGSI.PT.
Sumário :

Em acção declarativa, o pedido de condenação do Banco B a pagar determinado crédito com fundamento na invalidade do contrato de subscrição de instrumentos financeiros celebrado com o Banco A e na transição, deste para aquele, do depósito bancário em consequência de medida de resolução bancária do Banco de Portugal, não deve ser resolvida imediatamente no despacho saneador – art. 595.º, n.º 1, al. b), do CPC – se os factos subjacentes à invalidade permanecem controvertidos e a solução de direito proposta merece plausibilidade.

Decisão Texto Integral:
                                                                                             

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:
           


AA, BB e CC intentaram acção contra “Banco DD SA, GG SA, e Fundo de Resolução”, pedindo a condenação destes a pagar-lhes, solidariamente, as quantias de € 500.000, acrescida de juros, de € 20.000, a título de danos não patrimoniais, e, ainda, a de € 11.202,54 ao A marido, a título de danos patrimoniais.
Alegaram, para tanto, em suma:
- em 21/02/2014, o EE, por intermédio dum seu funcionário e gestor da conta bancaria dos AA, deslocou-se ao local de trabalho dos AA marido e filho, e convenceu-os a aplicarem € 500.000 em papel comercial emitido pela “FF SA”, sem lhes prestar as informações necessárias sobre tal produto e assegurando-lhes a ausência de risco e o retorno absoluto do capital investido, bem como uma taxa de juro anual nominal de 4.15% (uma rentabilidade superior à que vinham usufruindo), por um período de 9 meses, com data de reembolso em Novembro seguinte;
- Os AA, que não são investidores nem têm qualquer experiência relacionada com subscrição de instrumentos financeiros e desconheciam a FF, acreditaram na informação prestada pelo EE, pela confiança que detinham nele – induzidos pela “grandeza do EE”, transmitida publicamente, da publicidade do aumento de capital social – e no seu funcionário, bem como nas explicações dadas sobre o balanço e nos resultados das demonstrações da capacidade financeira e da solidez daquela empresa, constantes da ficha técnica e da nota informativa (de 16/01/2014), apresentando de capitais próprios de valores de 3 mil milhões de euros;
- No dia 25/02/2014, os AA entregaram ao funcionário do EE a quantia de 500.000, para depósito na sua conta à ordem e no dia 27/02/2014 o EE emitiu o documento de operação subscrição do dito papel comercial, no referido valor total de € 500.000;
 - Mais tarde, através das notícias veiculadas pela comunicação social, os AA tomaram conhecimento de que o EE regista um prejuízo económico estrondoso e que as demonstrações sobre a situação económica e financeira da FF apresentada na nota informativa não correspondiam à realidade da empresa, tendo sido “forjadas” de forma a convencer a subscrição do papel comercial;
- O que levou os AA a entrar de imediato em contacto com o R GG, através do gestor de conta, de forma a serem elucidados sobre o estado em que se encontrava o seu depósito de € 500.000;
 - O EE, o GG e o funcionário do EE e posteriormente do GG, todos, mantiveram a posição de garantir aos AA o retorno absoluto do capital investido e a taxa de juro anual nominal de 4.15%, e de que era nulo o risco do investimento que lhes fora proposto;
- Mais tarde, mais uma vez através das notícias veiculadas pela comunicação social, os AA tomaram conhecimento de várias decisões tomadas pelo BdP, como sejam: (1) a determinação, em 14/2/2014, da proibição ao EE de comercialização de instrumentos de dívida do grupo GES, entre as quais a FF SA; (2) em Março de 2014, a determinação ao EE da criação da provisão de 700ME para assegurar o reembolso do papel comercial e a apresentação de uma garantia do seu pagamento, tendo o EE dado como tal a companhia de seguros Tranquilidade; (3) em Julho de 2014, o BdP e o EE afirmaram que foi criada uma provisão que assegurava o pagamento integral do papel comercial e o BdP, através do seu Governador, afirmou que, em caso de falência do EE, os investidores de papel comercial estavam salvaguardados e assumiu a dificuldade dos clientes distinguirem DPs de papel comercial; (4) em 3/8/2014, a medida de resolução do EE e a transferência da generalidade da atividade deste para o (banco de transição) GG, criado especialmente para o efeito; (5) e a utilização, para apoio à medida de resolução, do Fundo de Resolução, com domínio total sobre o GG, enquanto detentor único do respectivo capital social;
- Deste modo, os AA foram aliciados pelo EE, no dia 21/02/2014, ao depósito na sua conta à ordem de € 500.000 para a subscrição de papel comercial daquela FF, quando este bem sabia que já se encontrava proibido de o fazer e que as contas que apresentou da FF não correspondiam à realidade, sendo que os AA desconheciam ambos esses factos;
- Aquando da resolução do EE, o GG informou os seus clientes de que a garantia e provisão passaram para si (banco de transição) e que mantinha a intenção de pagar;
- Nada foi reembolsado aos AA na data estipulada (25/11/2014), nem posteriormente;
- O gestor da conta pertencente aos AA onde foi depositado o montante supra identificado (€ 500.000) transitou para o GG, continuando a ser gestor até à presente data da mesma conta, que se mantém activa no GG;
- No ano de 2015, o GG deu conhecimento aos AA de que a sociedade emitente do papel comercial (FF), pertencente ao grupo do EE (GES), se encontrava em processo de insolvência;
- Esse processo de insolvência foi interposto pela própria FF, que fixou a data de 22/01/2014 como sendo a que a mesma começou a ser incapaz de cumprir as suas responsabilidades, realidade que o EE já conhecia em Janeiro de 2014.
Com tais fundamentos, os AA concluíram que o EE os conduziu de forma ilícita e fraudulenta à dita subscrição do papel comercial, agindo deliberada e conscientemente com o propósito de os enganar e de os fazer perder o montante de € 500.000, fruto das poupanças que fizeram durante as suas vidas de trabalho.

Os RR contestaram.

Em sede de saneador, foi declarada extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide, quanto ao R Banco DD, entretanto declarado insolvente, e o Sr. Juiz, por entender que os autos continham já todos os elementos necessários para uma decisão de mérito sem necessidade de prova adicional, proferiu logo decisão, absolvendo os demais RR dos pedidos formulados pelos AA.

A Relação julgou improcedente a apelação que os AA haviam interposto dessa decisão, a qual acabou por confirmar (excepto quanto a custas), mas afirmando que importava declarar extinta a instância por impossibilidade superveniente da lide quanto ao R GG, em conformidade com o disposto no artigo 277º e) do CPC, e concluindo que, consequentemente, o R Fundo de Resolução também não poderia ser responsabilizado, uma vez que, mesmo na perspectiva defendida pelos AA, este só seria responsável se aquele (NB) também o fosse.

Desse acórdão da Relação, os AA interpuseram recurso de revista, cujo objecto delimitaram com a questão de saber se inexiste inutilidade superveniente no que respeita ao R GG, suscitada nas seguintes conclusões (sic):
1. Salvo o devido respeito, que é muito, o mui douto Acórdão Recorrido, ao julgar extinta a instância por inutilidade superveniente da lide do prosseguimento dos autos quanto ao GG, não fez uma correta aplicação da lei substantiva e da lei processual, violando o disposto no artº 277º alínea e) do Código de Processo Civil, uma vez que os Recorrentes não se podem conformar com a fundamentação e decisão.
2. O presente recurso submetido à apreciação dos Venerandos Conselheiros, vem interposto do Acórdão da Relação que julgou a apelação parcialmente improcedente e em consequência decidiu pela extinção da instância por inutilidade da lide, no que respeita ao GG.
3. Os fundamentos do Acórdão recorrido em síntese defendem que por via das deliberações adotadas pelo Banco de Portugal (BdP), existiu, uma retransmissão com efeitos retroativos da medida de resolução, para o EE, radicando sempre na esfera jurídica do EE e não na esfera do Banco de transição (NB), para tanto fundamentaram o Acórdão da seguinte forma:
4. O Tribunal da Relação fundamentou-se nas deliberações da medida de resolução, nas clarificações e ajuste do perímetro, em concreto na sub alínea (vii) da alínea b) do anexo 2, e que se transcrevem do texto do Acórdão: de 03 de agosto de 2014: ... «O Banco de Portugal integrou na categoria de “Passivos Excluídos” – responsabilidade do EE perante terceiro que constitua passivos ou elementos extra patrimoniais do EE que se mantiveram na sua esfera jurídica, não tendo sido transferidos para o GG – “quaisquer responsabilidades ou contingências, nomeadamente as decorrentes de fraude, ou da violação de disposições ou determinações, regulatórias, penais ou contraordenacionais”; de 11 de agosto de 2014 “quaisquer responsabilidades ou contingências decorrentes de dolo, fraude, violações de disposições regulatórias, penais ou contraordenacionais”; 29 de dezembro de 2015: “quaisquer obrigações, garantias, responsabilidades ou contingências assumidas na comercialização, intermediação financeira, processo contratação e distribuição de instrumentos: financeiros emitidos por quaisquer entidades, sem prejuízo de eventuais créditos não subordinados, cuja posição devedora não seja excluída por alguma das subalíneas anteriores designadamente as sub alíneas (iii) e (v) que fossem exigíveis à data da medida de resolução em virtude de o respetivo prazo já se ter vencido ou sendo os créditos condicionais, em virtude de a condição (desde que apenas desta dependesse o respetivo vencimento) já se ter verificado e cumulativamente (b) resultassem de estipulações contratuais (negócios jurídicos bilaterais) anteriores a 30 de junho de 2014, que tenham cumprido as regras para a expressão da vontade de vinculação contratual do EE e cuja existência se posso comprovar documentalmente nos arquivos do EE, em termos que permitam o controlo e fiscalização das decisões tomadas”.
5. Foi com base nesta exposição (subalínea vii) que o Tribunal da Relação entendeu e concluiu que não houve transferência para o NB da responsabilidade na comercialização financeira do produto Financeiro comercializado aos Recorrentes ipelo SES;
6. Com o qual discordamos, por varias razões: (1) não existiu uma decisão judicial que apreciasse, a situação em concreto dos factos carreados para os autos. Ou seja, desconhecemos qual a decisão e o enquadramento dos factos ocorridos na data da aplicação financeira, tendo em mente que nessa data existia um impedimento à venda da aplicação, imposto pelo BdP ao EE; por desconhecer o enquadramento jurídico atribuído à aplicação à data de 3 agosto de 2014, data da resolução. Existiu dolo, a fraude, violação das disposições regulamentares e penais, contraordenacionais, aplicáveis no que diz respeita ao momento (27/02/2014), momento em que foi vendida a aplicação financeira descrita nos autos e consta dos factos apurados?; (2) por o BdP nos termos em que procede às varias clarificações, na verdade não excluiu esta concreta aplicação financeira da responsabilidade do NB; (3) por na data da resolução, quer na data em que se realizou a venda (posterior à data da proibição de venda imposta pelo BdP), o respetivo prazo de vencimento do crédito, ainda não se encontrava vencido, o qual só se venceu em Novembro de 2014; (4) por os presentes autos não se encontrarem descritos na decisão do BdP;
7. Perante a inexistência quer de uma decisão judicial que enquadre juridicamente os factos carreados para os autos, sobre a proibição da venda pelo BdP ao EE, quer da inexistência de exclusão pelo BdP do crédito dos Recorrentes, quer o não vencimento do crédito na data de resolução, não se descortina do douto Acórdão, em qual alínea da resolução, da retransmissão, enquadra o Tribunal da Relação, os factos carreados para os autos pelos Recorrentes. Pergunta-se existiu dolo? Fraude? O que é que existiu? Não sabemos.
8. A discordância com o Acórdão prende-se com a decisão proferida no ponto B), em que conclui o seguinte: “(…) B) Em particular clarificar não terem sido transferidos do EE para o NB, inter alia:
9. (…) qualquer responsabilidade que seja objeto dos processos em anexo entre os quais o BdP incluiu expressamente os presentes autos;”
10. Discorda-se em absoluto com a conclusão do Tribunal da Relação, em virtude de que nem o presente processo está descrito em anexo à deliberação, (aliás a deliberação é datada de 29 de dezembro de 2015 e os presentes autos deram entrada no ano de 2016), nem se encontra este auto expressamente incluído nessas deliberações tomadas pelo
correta aplicação do direito, violando o disposto nos artº, 118º nº 1 al.a), o artº, 122º nº 2, os artº, 501º a 504º todos do Código das Sociedades Comerciais, aplicável por força do 145º nº 10, violou o disposto no artº. 145º D nº 1 al. c), 145º H todos do RGICSF, uma vez, que independentemente das deliberações tomadas pelo BdP, as mesmas não podem estar acima das normas jurídicas aplicáveis às Sociedades Comerciais, no presente caso, das sociedades anónimas, da cisão, da irretroatividade das leis (artº. 12º do CC), cuja violação colocaria em causa o principio basilar da Segurança Jurídica, o que no presente caso permitia uma decisão diferente, no sentido de serem os Recorridos responsáveis solidários (do EE na reclamação de créditos pendente no processo nº 18588/16.2T8LSB), pelo reembolso das quantias investidas em papel comercial pelos Recorrentes, em data posterior à data da proibição de venda e com vencimento em data posterior à data de resolução,
12. Mais considerou o Douto Acórdão, que qualquer responsabilidade decorrente da violação dos deveres por parte do EE da comercialização e intermediação financeira, designadamente o dever de informação, em data anterior a 03/08/2014 por via das deliberações tomadas pelo BdP ficariam excluídas.
13. Assim atendendo aos factos apurados, sobre a data de comercialização e liquidação a debito que remontam à data de 25/02/2014 (ponto 2 dos factos apurados), ou seja, em data anterior a 03/08/2014, entendeu o Tribunal da Relação excluir a responsabilização do GG, concluindo pela extinção da instância por inutilidade superveniente da lide quanto a este R. GG;
14. Contrariamente ao decidido, entendem os Recorrentes que a responsabilidade dos Recorridos, vai muito além das medidas tomadas pelo BdP em termos de transmissão, medida de resolução, retransmissão tomada pelo BdP, mas sim advém de apesar de à data da comercialização existir uma proibição pelo BdP de venda de papel comercial, o EE vendeu aos AAA o papel comercial.
15. Entendem os Recorrentes que sobre esta questão em concreto não se pronunciou o Tribunal e não a enquadrou nas medidas tomadas pelo BdP.
16. O GG responde pelo valor depositado na conta do EE, por aplicação das normas comerciais vigentes na ordem jurídica interna, do primado da segurança jurídica, dos deveres da CMVM e do Banco de Portugal em fiscalizar e supervisionar as entidades financeiras, para que situações como a ora submetida a apreciação deste douto tribunal inexistissem, sem nunca nos esquecermos da separação de poderes essencial à segurança jurídica.
17. Ao contrário do decidido, os Recorrentes não têm dúvidas de que o GG é responsável pelo reembolso e como tal o Tribunal da Relação não poderia ter decidido pela extinção da instância.
18. Por ultimo e apenas por mera cautela, sem se conceder, entendem os recorrentes que a enquadrar a comercialização como válida, então as manifestações publicitadas pelo BdP, pelo GG e pela CMVM, sobre a constituição de uma provisão imposta pelo BdP ao EE, a transferência dessa provisão para o GG constituem manifestações claras e vinculativas de assunção da obrigação por parte do GG do reembolso do capital investido pelos Recorrentes.
19. Pode-se afirmar porque público e notório que o BdP impôs ao EE a criação de uma provisão patrimonial com a intenção clara e especifica de reembolsar os clientes que investiram em papel comercial do grupo EE e que essa provisão transitou para o GG.
20. Ora, relativamente à responsabilidade do GG, tal como supra já referido é fundamento da mesma, a assunção pelo próprio GG da obrigação do pagamento dos montantes investidos em papel comercial e, caso assim não se entenda, da garantia do seu pagamento, já após a aplicação da medida de resolução, para além e fora do âmbito desta.
21. Além de que, a própria responsabilidade assumida pelo EE de reembolso do papel comercial ESI e FF transferiu-se para o GG, S.A., nos termos da própria deliberação adotada pelo BdP e do perímetro de transferência por este definido em 04 de Agosto de 2014, pois que o EE registou nas suas contas uma provisão precisamente para fazer face ao reembolso da dívida GES subscrita por clientes, no valor de € 588,6 milhões, dos quais 446 milhões visavam fazer face ao reembolso da dívida emitida pela ESI e FF.
22. Com efeito, a constituição de uma provisão constitui reconhecimento da sua responsabilidade nos termos do direito comercial;
23. E a verdade é que do Balanço Previsional do GG à data da Deliberação de 03 de Agosto de 2014 consta essa provisão, o que significa que a responsabilidade para a qual foi constituída também foi transmitida ao GG.
24. Além de que, para a constituição do capital do GG, foi tido em consideração a dita provisão e a respetiva responsabilidade, pois que aquela provisão corresponde a uma rúbrica do balanço que concorreu para aferir daquele valor.
25. Acresce ainda que, a clarificação do BdP no que se refere à não transmissão para o GG de “quaisquer passivos ou elementos extrapatrimoniais do EE que (…) fossem contingentes ou desconhecidos”, convém ter presente que o passivo referente à obrigação de reembolso do papel comercial ESI e FF não era – e não é – contingente, nem era desconhecido, foi sim vendido aos Recorrentes em incumprimento pelo EE da decisão de proibição emanada pelo BdP, e a data de reembolso aos AAA ora recorrentes dos valores investidos, ocorreu a 22 de Novembro de 2014, ou seja, em data posterior à constituição do GG e por conseguinte deveria ser o NB responsável pelo reembolso.
26. Da decisão tomada pelo BdP decorre a constituição do GG SA e o assumir da transferência para o GG de ativos, passivos, e elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão do EE, e como tal inexiste inutilidade superveniente no que respeita ao GG SA, o que se requer ao Supremo Tribunal de Justiça.

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Importa apreciar e decidir a enunciada questão, para o que releva o antecedentemente relatado e a seguinte matéria de facto tida por assente pela 2ª instância:
1 - Em 25/2/2014 os AA entregaram a um funcionário do EE a quantia de € 500.000,00 para aquisição de papel comercial emitido pelo FF
2-Após a entrega destes cheques, no dia 27/2/2014 o EE emitiu um documento com o seguinte teor” Aviso nº 1010647 de 27/02/2014, origem DEO/Serviços de títulos, Tipo de Movimento: Liquidação a Débito, moeda EUR, Dossier de títulos nr 000141469965, tipo de operações Compra/ Subscrição em OTC ; Nr de ordem 21/02/2014 1012134, espécie FF 40ª EM código ISIN PTR34AJM1196, natureza do valor e forma de Apresentação L-PAPEL COMERCIAL M-ESCRT (NOMIM). Data da liquidação 27/02/2014, data valor 27/02/2014, contraparte EEI–Banco DD de Investimento, Valor nominal 50.000.00 .Montante Nominal 500.000,00 .Preço unitário 100.000000000% .Valor líquido de 500.00,00€ .Total liquidado € 500.000.

RELATIVAMENTE AO RÉU BANCO DD, SA, EM LIQUIDAÇÃO:
1º - Por deliberação do Banco Central Europeu, de 13/07/16, foi revogada a autorização do Banco DD, S.A. (“EE”) para o exercício da actividade de instituição de crédito.
2º - Desta deliberação não foi interposto recurso para o Tribunal Geral da União Europeia.
3º - Na sequência da comunicação de revogação, acima referida, o Banco de Portugal requereu a liquidação do Banco DD, tendo este requerimento sido distribuído à 1ª Secção de Comércio da Instância Central de Lisboa, J1, com o nº 18588/16.2T8LSB.
4º - Em 21/07 foi proferido despacho de prosseguimento da liquidação judicial, fixando-se o prazo de 30 dias para a reclamação de créditos.
5º - Os AA reclamaram o seu crédito na liquidação com o nº 18588/16.2T8LSB.

RELATIVAMENTE AO RÉU GG, SA.
1º-No dia 3 de Agosto de 2014 o Banco de Portugal proferiu a seguinte deliberação:
Ponto Um: Constituição do GG, SA
É constituído o GG, SA, ao abrigo do nº 5 do artigo 145º - G do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-lei n.º 298/92, de 31 de Dezembro, cujos Estatutos constam do Anexo 1 à presente deliberação.
 Ponto Dois: Transferência para o GG, SA, de activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão do Banco DD, SA.
 São transferidos para o GG, SA, nos termos e para os efeitos do disposto no nº 1 do artigo 145º - H do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de Dezembro, conjugado com o artigo 17º - A da Lei Orgânica do Banco de Portugal, os activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão do Banco DD, SA, que constam dos Anexos 2 e 2A à presente deliberação.
Ponto Três: Designação de uma entidade independente para avaliação dos activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão transferidos para o GG, SA.
Considerando o disposto no n.º 4 do artigo 145.º-H do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de Dezembro, o Conselho de Administração designa a sociedade ... & Associados - Sociedade de Revisores de Contas, Lda (PwC SROC), para, no prazo de 120 dias, proceder à avaliação dos activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão transferidos para o GG, SA.”
4º -Por deliberação do Banco de Portugal de 11 de Agosto de 2014, foi rectificado o anexo 2 à deliberação de 3 de Agosto, considerando excluídos os seguintes:
“(v) Quaisquer responsabilidades ou contingências, nomeadamente as decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contra-ordenacionais;
(vi) Quaisquer responsabilidades ou contingências do EE relativas a acções, instrumentos ou contratos de que resultem créditos subordinados perante o EE;
 (vii) Quaisquer obrigações, garantias, responsabilidades ou contingências assumidas na comercialização, intermediação financeira e distribuição de instrumentos de dívida emitidos por entidades que integram o Grupo DD, sem prejuízo de eventuais créditos não subordinados resultantes de estipulações contratuais anteriores a 30 de Junho de 2014, documentalmente comprovadas nos arquivos do EE, em termos que permitam o controlo e fiscalização das decisões tomadas”.
5º - No dia 29 de Dezembro de 2015, em sessão ordinária do Conselho de Administração do Banco de Portugal, (…) foi adoptada a seguinte deliberação (deliberação contingências) relativa ao ponto da agenda “Clarificação e retransmissão de responsabilidades e contingências definidas como passivos excluídos nas subalíneas (v) a (vii) da alínea (b) do n.º 1 do Anexo 2 à Deliberação do Banco de Portugal de 3 de agosto de 2014 (20 horas), na redacção que lhe foi dada pela Deliberação do Banco de Portugal de 11 de agosto de 2014 (17 horas)”:
 DELIBERAÇÃO
Nos termos do n.º 1 do artigo 146.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de Dezembro (RGICSF), a presente deliberação é considerada urgente, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo do artigo 124.º do Código do Procedimento Administrativo, não havendo lugar a audiência prévia dos interessados.
Enquadramento
 1. A deliberação do Banco de Portugal de 3 de agosto de 2014 (20:00 horas), com as clarificações e ajustamentos introduzidos pela deliberação de 11 de agosto de 2014 (17:00 horas) - doravante a “Deliberação de 3 de agosto”, para efeitos dos considerandos seguintes - que determinou a constituição do GG, S.A. (“GG”), determinou igualmente a transferência de um conjunto de activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão do Banco DD, S.A. (“Banco DD” ou “EE”) para o GG, descritos no Anexo 2 da mesma Deliberação de 3 de agosto.
2. O RGICSF estabelece, em conformidade com a legislação europeia na matéria, que os accionistas e credores da instituição objecto de resolução devem assumir os prejuízos da referida instituição.
3. Um dos princípios do RGICSF impõe que os recursos do fundo de resolução não sejam utilizados para assumir directamente os prejuízos da instituição de crédito objecto de resolução.
4. O Banco de Portugal dispõe de um poder legalmente conferido que pode ser exercido a todo o tempo antes da revogação da autorização do EE para o exercício da actividade ou da venda do GG, para determinar transferências adicionais de activos e passivos entre o GG e o EE (o “Poder de Retransmissão”). O Poder de Retransmissão encontra-se previsto no Capítulo III (Resolução) do Título VIII do RGICSF, tendo ficado expressamente estabelecido no número 2 do Anexo 2 da Deliberação de 3 de agosto.
Fundamentos para a clarificação e para o exercício do Poder de Retransmissão.
5. A versão original da Deliberação de 3 de agosto, publicada em 3 de agosto de 2014, dispunha o seguinte na alínea (b) do n.º 1 do Anexo 2: “As responsabilidades do EE perante terceiros, que constituam passivos ou elementos extrapatrimoniais, serão integralmente transferidas para o GG SA, com excepção das seguintes (Passivos Excluídos) … (v) Quaisquer responsabilidades ou contingências decorrentes de dolo, fraude e violação de disposições regulatórias, penais ou contra-ordenacionais.”
6. A versão alterada da Deliberação de 3 de agosto, publicada em 11 de agosto de 2014, dispunha o seguinte na alínea (b) do n.º 1 do Anexo 2: “As responsabilidades do EE perante terceiros, que constituam passivos ou elementos extrapatrimoniais, serão integralmente transferidas para o GG SA, com excepção das seguintes (Passivos Excluídos) …
(v) Quaisquer responsabilidades ou contingências, nomeadamente as decorrentes de fraude ou violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contra-ordenacionais.”
7. O Banco de Portugal considerou ser proporcional e de interesse público não transferir para o banco de transição as responsabilidades contingentes ou desconhecidas do EE (incluindo responsabilidades litigiosas relativas ao contencioso pendente e responsabilidades ou contingências decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contra-ordenacionais), independentemente de se encontrarem ou não registadas na contabilidade do EE nos termos da subalínea (v) a (vii) da alínea (b) do n.º 1 do Anexo 2 da Deliberação de 3 de agosto, uma vez que a certeza relativamente às responsabilidades do banco de transição é essencial para garantir a continuidade das funções críticas desempenhadas pelo GG e que anteriormente tinham sido desempenhadas pelo EE.
8. A legitimidade processual do EE tem vindo a ser questionada ou enjeitada em processos judiciais em que este é parte, com base na alegada transferência para o GG das responsabilidades que se discutem naqueles processos, em que o EE era réu a 3 de Agosto de 2014 e que respeitam a factos anteriores à aplicação da medida de resolução ao EE e por efeito da aplicação desta.
9. Importa clarificar que o Banco de Portugal, enquanto autoridade pública de resolução, decidiu e considera que todas as responsabilidades contingentes e desconhecidas do EE (incluindo responsabilidades litigiosas relativas ao contencioso pendente e responsabilidades ou contingências decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contra-ordenacionais), independentemente de se encontrarem ou não registadas na contabilidade do EE, estão abrangidas pelas subalíneas (v) a (vii) da alínea (b) do n.º 1 do Anexo 2 da Deliberação, não tendo sido, portanto, transferidas para o GG.
10. Alguns tribunais solicitaram ao Banco de Portugal que este lhes comunicasse o seu entendimento, enquanto entidade de resolução, sobre a não transferência de responsabilidades e contingências do EE para o GG, ao abrigo das subalíneas (v) a (vii) da alínea (b) do n.º 1 do Anexo 2 da deliberação de 3 de agosto.
11. Esses pedidos não foram efectuados na maior parte dos processos pendentes em tribunal, que se relacionam com responsabilidades ou contingências não transferidas para o GG.
12. Se o número de processos pendentes nos tribunais judiciais e a diferente orientação nas decisões até hoje tomadas conduzirem a que, de modo significativo, não venha a ser reconhecida adequadamente a selecção efectuada pelo Banco de Portugal (enquanto autoridade pública de resolução) dos activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão transferidos do EE para o GG (decisão sobre o «perímetro de transferência»), pode ficar comprometida a execução e a eficácia da medida de resolução aplicada ao EE, a qual, entre outros critérios, se baseou num critério de certeza quanto ao perímetro de transferência.
13. Foi esse critério de certeza que permitiu calcular as necessidades de capital da instituição de transição, o GG, e foi com base nesse cálculo que o Fundo de Resolução realizou o capital da instituição de transição.
14. Caso viessem a materializar-se na esfera jurídica do GG responsabilidades e contingências por força de sentenças judiciais, o GG seria chamado a assumir obrigações que de modo algum lhe deveriam caber e cuja satisfação não foi pura e simplesmente tida em consideração no montante do capital com que aquele banco de transição foi inicialmente dotado.
15. Este risco pode materializar-se ainda antes do trânsito em julgado das decisões judiciais se, de acordo com as regras contabilísticas, for entendido que, não obstante a decisão do Banco de Portugal, aquela materialização é provável.
16. Nos termos da lei, a decisão do Banco de Portugal sobre o perímetro de transferência só pode ser alterada através dos meios processuais previstos na legislação do contencioso administrativo, de acordo com o artigo 145.º-AR do RGICSF (correspondente ao artigo 145.º-N do RGICSF, em vigor à data de aplicação da medida de resolução ao EE).
17. Questionar o referido perímetro de transferência fora do contencioso administrativo constitui um desvio à competência dos tribunais administrativos, legalmente estabelecida, e impede que o Banco de Portugal exerça a prerrogativa que a lei lhe confere de afastar, por motivo de interesse público, a execução de sentenças desfavoráveis, iniciando-se de imediato o procedimento tendente à fixação da indemnização de acordo com os trâmites definidos no Código do Processo nos Tribunais Administrativos. 18. Decisões de tribunais judiciais que, directa ou indirectamente, ponham em causa o perímetro de transferência neutralizam este mecanismo contencioso (e compensatório), legalmente previsto, de impugnação das decisões do Banco de Portugal, enquanto autoridade pública de resolução, e comprometem a execução e a eficácia da medida de resolução.
19. Tem a presente deliberação o seguinte objectivo:
a. Clarificar o tratamento das responsabilidades contingentes e desconhecidas do EE (incluindo responsabilidades litigiosas relativas ao contencioso pendente e responsabilidades ou contingências decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contra-ordenacionais), independentemente da sua natureza (fiscal, laboral, civil ou outra) e de se encontrarem ou não registadas na contabilidade do EE, nos termos da subalínea (v) da alínea (b) do n.º 1 do Anexo 2 da Deliberação de 3 de agosto;
b. Se e na medida em que quaisquer responsabilidades contingentes e desconhecidas ou incertas do EE à data de 3 de agosto (incluindo responsabilidades litigiosas relativas ao contencioso pendente e responsabilidades ou contingências decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contra-ordenacionais), independentemente de se encontrarem ou não registadas na contabilidade do EE e que devessem ter permanecido na sua esfera jurídica nos termos da Deliberação de 3 de agosto, sejam atribuídas ao GG, proceder à sua retransmissão, mediante o exercício do Poder de Retransmissão, das referidas responsabilidades contingentes e desconhecidas (incluindo responsabilidades litigiosas relativas ao contencioso pendente e responsabilidades ou contingências decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contra-ordenacionais) para o EE; e
c. Determinar que, de acordo com o disposto no n.º 7 do artigo 145.º-P e nos n.os 2, 3 e 4 do artigo 145.º-G do RGICSF, o EE e o GG tomem as medidas previstas nesta deliberação por forma a conferir-lhe eficácia plena.
20. Face ao exposto e de forma a garantir a continuidade das funções essenciais desempenhadas pelo GG, encontram-se reunidos os pressupostos para o exercício do Poder de Retransmissão, conforme previsto nesta deliberação, exercício que se afigura extremamente necessário, urgente e inadiável. O Conselho de Administração do Banco de Portugal, ao abrigo da competência conferida pelo RGICSF para seleccionar os activos e passivos a transferir para o banco de transição, delibera o seguinte:
A) Clarificar que, nos termos da alínea (b) do número 1 do Anexo 2 da deliberação de 3 de agosto, não foram transferidos do EE para o GG quaisquer passivos ou elementos extrapatrimoniais do EE que, às 20:00 horas do dia 3 de agosto de 2014, fossem contingentes ou desconhecidos (incluindo responsabilidades litigiosas relativas ao contencioso pendente e responsabilidades ou contingências decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contra-ordenacionais), independentemente da sua natureza (fiscal, laboral, civil ou outra) e de se encontrarem ou não registadas na contabilidade do EE;
B) Em particular, desde já se clarifica não terem sido transferidos do EE para o GG os seguintes passivos do EE:
(i) Todos os créditos relativos a acções preferenciais emitidas por sociedades-veículo estabelecidas pelo EE e vendidas pelo EE;
(ii) Todos os créditos, indemnizações e despesas relacionados com activos imobiliários que foram transferidos para o GG;
(iii) Todas as indemnizações relacionadas com o incumprimento de contratos (compra e venda de activos imobiliários e outros), assinados e celebrados antes das 20h00 do dia 3 de agosto de 2014;
(iv) Todas as indemnizações relacionadas com contratos de seguro de vida, em que a seguradora era o EE – Companhia de Seguros de Vida, S.A.;
(v) Todos os créditos e indemnizações relacionados com a alegada anulação de determinadas cláusulas de contratos de mútuo, em que o EE era o mutuante;
(vi) Todas as indemnizações e créditos resultantes de anulação de operações realizadas pelo EE enquanto prestador de serviços financeiros e de investimento; e
(vii) Qualquer responsabilidade que seja objecto de qualquer dos processos descritos no Anexo I. C) Na medida em que, não obstante as clarificações acima efectuadas, se verifique terem sido efectivamente transferidos para o GG quaisquer passivos do EE que, nos termos de qualquer daquelas alíneas e da Deliberação de 3 de agosto, devessem ter permanecido na sua esfera jurídica, serão os referidos passivos retransmitidos do GG para o EE, com efeitos às 20 horas do dia 3 de agosto de 2014;
D) O Conselho de Administração do EE e o Conselho de Administração do GG praticarão todos os actos necessários à implementação e eficácia das clarificações e retransmissões previstos na presente deliberação. Em particular e de acordo com o disposto no n.º 7 do artigo 145.º-P e nos n.os 2, 3 e 4 do artigo 145.º-G do RGICSF, o GG e o EE devem:
(a) Adoptar as medidas de execução necessárias à adequada aplicação da medida de resolução aplicada pelo Banco de Portugal ao EE, bem como de todas as decisões do Banco de Portugal que a complementam, alteram ou clarificam, incluindo a presente deliberação;
(b) Praticar todos os actos, sejam estes de natureza procedimental ou processual, nos processos em que sejam parte de modo a dar adequada execução às decisões do Banco de Portugal referidas em (a), incluindo aqueles que sejam necessários para reverter actos anteriores que tenham praticado contrários aquelas decisões;
(c) Para efeito de cumprimento do disposto na alínea (b), requerer a imediata junção da presente deliberação aos autos em que sejam parte;
(d) Adequar os seus registos contabilísticos ao disposto nas decisões do Banco de Portugal referidas em (a); e
(e) Abster-se de qualquer conduta que possa por em causa as decisões do Banco de Portugal referidas em (a).
E) Aprovar a ata da presente deliberação em minuta, com vista à sua execução imediata, nos termos do nº 4 e para os efeitos do n.º 6 do artigo 34.º do Código do Procedimento Administrativo.”
6º - No dia 29 de Dezembro de 2015, em sessão ordinária do Conselho de Administração do Banco de Portugal, foi adoptada a seguinte deliberação (deliberação perímetro) relativa ao ponto da agenda “Transferências, retransmissões e alterações e clarificações ao Anexo 2 da deliberação de 3 de agosto de 2014 (20.00h)”:
DELIBERAÇÃO
«Nos termos do n.º 1 do artigo 146.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de Dezembro (RGICSF), a presente deliberação é considerada urgente, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo do artigo 124.º do Código do Procedimento Administrativo, não havendo lugar a audiência prévia dos interessados. Esta dispensa é igualmente justificada à luz do disposto nas alíneas c) e d) do artigo 124.º do Código do Procedimento Administrativo.
Enquadramento
1. A deliberação do Banco de Portugal de 3 de agosto de 2014 (20:00h), com as clarificações e ajustamentos introduzidos pela deliberação de 11 de agosto de 2014 (17:00 horas) - doravante a “Deliberação de 3 de agosto” para efeitos dos considerandos seguintes – que determinou a constituição do GG, S.A. (“GG”), determinou igualmente a transferência de um conjunto de activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão do Banco DD, S.A. (“Banco DD” ou “EE”) para o GG, descritos no Anexo 2 à mesma Deliberação de 3 de agosto. 2. Após 3 de agosto, e à medida que tem vindo a ser disponibilizada informação adicional, o Banco de Portugal, na qualidade de autoridade de resolução, tem vindo a aprofundar o conhecimento da situação financeira do conjunto de activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão do GG.
3. O RGICSF estabelece, em conformidade com a legislação europeia na matéria, que os accionistas e credores de uma instituição objecto de medida de resolução devem suportar os prejuízos dessa mesma instituição.
4. Um dos princípios do RGICSF impõe que os recursos do fundo de resolução não sejam utilizados para assumir directamente os prejuízos da instituição de crédito objecto de resolução.
5. O Banco de Portugal dispõe de um poder legalmente estabelecido que poderá ser exercido a todo o tempo antes da revogação da autorização do EE para exercício da actividade ou da venda do GG, para determinar transferências adicionais de activos e passivos entre o GG e o EE (o “Poder de Retransmissão”). O Poder de Retransmissão encontra-se previsto no Capítulo III (Resolução) do Título VIII do RGICSF, tendo ficado expressamente previsto no número 2 do anexo 2 da Deliberação de 3 de agosto.
6. São necessárias clarificações adicionais quanto aos activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão transferidos do EE para o GG e alterar o Anexo 2 da deliberação de 3 de agosto para reflectir estas clarificações.
7. É desejável clarificar que quaisquer contingências fiscais passivas, quer presentes ou futuras, resultantes de dívidas fiscais, constituídas ou por constituir, relativas a factos tributários anteriores a 3 de agosto de 2014 deverão permanecer na esfera jurídica do EE.
8. Sem prejuízo das deliberações do Conselho de Administração do Banco de Portugal de 22 de Dezembro de 2014, de 11 Fevereiro de 2015 e de 15 de Setembro de 2015, todas relativas à «Responsabilidade ...» (tal como definida na deliberação de 15 de Setembro de 2015), o Banco de Portugal deve adicionalmente determinar que, por se tratar de uma responsabilidade de natureza equiparável a obrigações, dirigida a, e subscrita por, investidor(es) qualificado(s), tal responsabilidade (bem como todas as responsabilidades com esta conexas) deve permanecer na esfera jurídica do EE, pelo que na eventualidade de, por decisão transitada em julgado, se determinar que a Responsabilidade ... não se encontra abrangida pela subsubalínea (c) da subalínea (i) da alínea (b) do n.º 1 do Anexo 2 da Deliberação de 3 de agosto ou se determinar que essa responsabilidade pertence ao GG, tal responsabilidade (bem como todas as responsabilidades com esta conexas) é retransmitida para o EE.
9. Na medida em que, e não obstante as clarificações e alterações constantes desta deliberação, um ativo ou passivo tenha sido transferido para o GG que devesse ter permanecido na esfera jurídica do EE, ou tenha permanecido na esfera jurídica do EE, mas que devesse ter sido transferido para o GG, o Poder de Retransmissão é exercido para conferir eficácia às clarificações e alterações constantes desta deliberação.
10. Considerando que, desde a aplicação da medida de resolução ao EE e também na presente data foram tomadas pelo Conselho de Administração do Banco de Portugal várias deliberações que produziram efeitos na selecção de activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão transferidos para o GG, a qual estava originalmente expressa no Anexo 2 da Deliberação de 3 de agosto, revela-se oportuno e adequado proceder-se a um esforço de consolidação, actualizando o referido Anexo 2 às mencionadas deliberações.
O Conselho de Administração do Banco de Portugal, ao abrigo da competência conferida pelo RGICSF para seleccionar os activos e passivos a transferir para o banco de transição e do disposto no n.º 2 do Anexo 2 da Deliberação de 3 de agosto, delibera o seguinte:
 A) A subalínea (vii) da alínea (b) do n.º 1 do Anexo 2 passa a ter a seguinte redacção: “Quaisquer obrigações, garantias, responsabilidades ou contingências assumidas na comercialização, intermediação financeira, processo de contratação e distribuição de instrumentos financeiros emitidos por quaisquer entidades, sem prejuízo de eventuais créditos não subordinados, cuja posição devedora não seja excluída por alguma das subalíneas anteriores, designadamente as subalíneas (iii) e (v), que (a) fossem exigíveis à data da medida de resolução em virtude de o respectivo prazo já se ter vencido ou, sendo os créditos condicionais, em virtude de a condição (desde que apenas desta dependesse o respectivo vencimento) já se ter verificado, e cumulativamente (b) resultassem de estipulações contratuais (negócios jurídicos bilaterais) anteriores a 30 de Junho de 2014, que tenham cumprido as regras para a expressão da vontade e vinculação contratual do EE e cuja existência se possa comprovar documentalmente nos arquivos do EE, em termos que permitam o controlo e fiscalização das decisões tomadas.”
B) A alínea (d) do n.º 1 do Anexo 2 passa a ter a seguinte redacção: “São transferidos na sua totalidade para o GG SA todos os restantes elementos extrapatrimoniais do EE, com excepção dos relativos ao Banco DD Angola SA, ao DD Bank (Miami), ao DD Bank (Líbia) e dos relativos às entidades cujas responsabilidades perante o EE não foram transferidas nos termos da subalínea (v) da alínea (a) do n.º 1 e, com efeitos a partir de 29 de Dezembro de 2015, ao EE Finance, Limited;”
C) É aditado um n.º 10, com a seguinte redacção: “Transferem-se ainda para o GG quaisquer créditos já constituídos ou por constituir reportados a factos tributários anteriores a 3 de agosto de 2014, independentemente de estarem ou não registados na contabilidade do EE.”
D) A Administração do EE deve, para efeitos de cumprimento de quaisquer formalidades que se julguem necessárias, exercer as suas competências, praticar os actos e tomar as iniciativas adequadas para garantir as transferências de valores a receber e créditos para o GG decorrentes das contingências fiscais activas, actualmente identificadas ou futuras, resultantes de créditos fiscais já constituídos ou por constituir, reportados a factos tributários anteriores a 3 de Agosto de 2014, independentemente de se encontrarem ou não registadas na contabilidade.
E) É aditado um novo n.º 11, com a seguinte redacção: “O disposto nas subalíneas (v) a (vii) da alínea (b) do n.º 1 do presente Anexo devem ser interpretadas à luz das clarificações constantes do Anexo 2C”.
F) É aditado um novo Anexo 2C à deliberação de 3 de agosto, com a redacção constante da deliberação relativa à “Clarificação e retransmissão de responsabilidades e contingências definidas como passivos excluídos nas subalíneas (v) a (vii) da alínea (b) do n.º 1 do Anexo 2 à Deliberação do Banco de Portugal de 3 de agosto de 2014 (20 horas), na redacção que lhe foi dada pela Deliberação do Banco de Portugal de 11 de agosto de 2014 (17 horas)”, adoptada pelo Conselho de Administração do Banco de Portugal na presente data;
G) Sem prejuízo das deliberações do Conselho de Administração do Banco de Portugal de 22 de Dezembro de 2014, de 11 Fevereiro de 2015 e de 15 de Setembro de 2015, todas relativas à «Responsabilidade ...» (tal como definida na deliberação de 15 de Setembro de 2015), o Banco de Portugal determina adicionalmente que, por se tratar de uma responsabilidade de natureza equiparável a obrigações, dirigida a, e subscrita por, investidor(es) qualificado(s), tal responsabilidade (bem como todas as responsabilidades com esta conexas) deve permanecer na esfera jurídica do EE, pelo que na eventualidade de, por decisão transitada em julgado, se determinar que a Responsabilidade ... não se encontra abrangida pela subsubalínea (c) da subalínea (i) da alínea (b) do n.º 1 do Anexo 2 da Deliberação de 3 de agosto ou se determinar que essa responsabilidade pertence ao GG, tal responsabilidade (bem como todas as responsabilidades com esta conexas) é retransmitida para o EE;
H) É aditada uma subalínea (ix) à alínea (b) ao n.º 1 do Anexo 2, com a seguinte redacção: “A Responsabilidade ...”.
I) Na medida em que qualquer activo, passivo ou elemento extrapatrimonial que, nos termos de qualquer das alíneas anteriores, devesse ser transferido para o GG, mas que, de facto, tenha permanecido na esfera jurídica no EE, são, pela presente, os referidos activos, passivos ou elementos extrapatrimoniais transferidos do EE para o GG, com efeitos a 3 de Agosto de 2014 (20.00h);
J) Na medida em que qualquer activo, passivo ou elemento extrapatrimonial que, nos termos de qualquer uma das alíneas anteriores, devesse ter permanecido na esfera jurídica do EE mas que foram, de facto, transferidos para o GG, são, pela presente, os referidos activos, passivos ou elementos extrapatrimoniais retransmitidos do GG para o EE, com efeitos a 3 de agosto de 2014 (20.00h); K) O Conselho de Administração do EE e o Conselho de Administração do GG devem tomar todas as medidas necessárias à execução eficaz das clarificações, ajustamentos, transferências e retransmissões previstos na presente deliberação.
L) É anexada à presente deliberação uma versão revista e consolidada do Anexo 2 da Deliberação de 3 de agosto de 2014, a qual incorpora:
a. As clarificações e alterações constantes da presente deliberação;
b. As deliberações do Conselho de Administração do Banco de Portugal, adoptadas na presente data, relativas à “Retransmissão de obrigações não subordinadas do GG, S.A., para o Banco DD, S.A.” e à “Retransmissão das acções representativas da totalidade do capital social do EE Finance, Limited do GG, S.A., para o Banco DD, S.A.”;
c. As deliberações do Conselho de Administração do Banco de Portugal de 22 de Dezembro de 2014, de 11 Fevereiro de 2015 e 15 de Setembro de 2015, todas relativas à Responsabilidade ..., e de 13 de maio de 2015, relativa a eventuais obrigações contraídas e garantias prestadas perante terceiros pelo EE, relacionadas com a comercialização de instrumentos de dívida do GES;
d. O Anexo 2 da Deliberação de 3 de agosto será alterado e rectificado de modo a revestir a forma estabelecida no anexo da presente deliberação, incluindo o aditamento dos Anexos 2B e 2C.
M) Aprovar a ata da presente deliberação em minuta, com vista à sua execução imediata, nos termos do nº 4 e para os efeitos do n.º 6 do artigo 34.º do Código do Procedimento Administrativo.”
7º - Por deliberação de 29/12/2015, denominada “retransmissão” o BdP determinou o seguinte:
“A) Todos os direitos e responsabilidades do GG decorrentes de dívida não subordinada enumerados no Anexo I desta deliberação (excluindo os detidos pelo GG), juntamente com todos os passivos, contingências e elementos extrapatrimoniais, na medida em que estejam relacionados com os referidos instrumentos de dívida incluindo (i) a emissão, comercialização e venda dos mesmos, e (ii) decorrentes de documentos contratuais ou outros instrumentos, celebrados ou emitidos pelo banco e com conexão com esses instrumentos, incluindo documentos de programa ou subscrição, ou quaisquer outros actos do banco praticados em relação a esses instrumentos, em data anterior, simultânea ou posterior à data das respectivas emissões são, pela presente, retransmitidos do GG para o EE, com efeitos a partir da data da presente deliberação.
B) O Conselho de Administração do EE e o Conselho de Administração do GG devem praticar os actos necessários à execução eficaz das retransmissões previstas na presente deliberação.
C) A retransmissão ora determinada não pretende conferir a quaisquer contrapartes e terceiros quaisquer novo direitos nem permitir o exercício de quaisquer direitos que, na ausência da referida retransmissão, não existissem nem pudessem ser exercidos relativamente aos activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão do GG, do EE ou os assim transferidos do GG para o EE, incluindo quaisquer direitos de cessação, resolução ou direitos de determinar reembolsos antecipados, convenções de compensação ou netting/compensação, ou resultar em (i) qualquer incumprimento, (ii) alteração de condições, direitos ou obrigações, ou (iii) sujeitar a aprovação, (iv) direito a accionar garantias, (v) direito de efectuar retenções ou neeting/compensação entre quaisquer pagamentos ou créditos decorrentes dos referidos activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão (…)”.
*
Como é sabido, o âmbito do recurso, para além dos eventuais casos julgados formados nas instâncias, é confinado pelo objecto (pedido e causa de pedir) da acção, pela parte dispositiva da decisão impugnada desfavorável ao impugnante e pela restrição feita pelo próprio recorrente, quer no requerimento de interposição, quer nas conclusões da alegação (art. 635º do CPC).
Portanto, em face do objecto da acção, do conteúdo da decisão impugnada e das conclusões da alegação dos recorrentes, apenas se trata aqui de saber se, ao invés do decidido pela Relação, os autos devem prosseguir em relação ao R GG, para apurar da eventual responsabilidade deste, atendendo aos termos em que os AA configuraram o seu pedido e respectiva causa de pedir.

Esta mesma Secção proferiu, no passado dia 18/1, acórdão ([1]) na revista 18084/15.5T8LSB.L1.S2, em que também era recorrido o GG e em que a questão fulcral nela colocada consistia, igualmente, em saber se o estado do processo permitia que se conhecesse imediatamente do mérito da causa, sem necessidade de mais provas. Daí que passemos a seguir de perto o expendido em tal aresto.

Como resulta do disposto no art. 595º, nº 1, b), do CPC, o despacho saneador pode destinar-se a conhecer-se imediatamente do mérito da causa, quando para tal não haja necessidade de mais provas do que aquelas que já estão adquiridas no processo, circunscrevendo-se a controvérsia a questões de direito, eventualidade em que não há necessidade de que o processo seja submetido a instrução.

No entanto, suscitando o conhecimento do mérito da causa, quase sempre, questões de direito e de facto, é consensual que os tribunais façam uso prudente e cauteloso desse poder, porquanto, a segurança não deve ser sacrificada à celeridade ([2]): Antunes Varela ([3]), afirma que normal é que o juiz, não estando ainda realizada a parte fundamental da instrução do processo, não possa conhecer da matéria no momento em que profere o despacho saneador; excepcional é que, com o encerramento dos articulados, o julgador tenha à sua disposição todos os factos que interessam à resolução da questão do direito exclusivamente suscitada pelas partes, ou encontre nos autos todos os elementos de prova essenciais ao julgamento da matéria de facto envolvida no litígio.

No caso, o Tribunal de 1ª instância, na fase do despacho saneador, considerou que dispunha já de todos os elementos que lhe permitiam conhecer do mérito da acção, o que fez, tendo concluído pela improcedência da acção em relação ao R recorrido GG. E o desfecho obtido no acórdão da Relação foi, porém, o da extinção da instância, ainda que nele se tenha entendido, igualmente, não haver necessidade de mais provas.

Para tanto, referiu-se nesse acórdão:

«Sublinhe-se, adicionalmente, que, de acordo com o que consta das deliberações acima aludidas, se, porventura, alguma responsabilidade relacionada com as pretensões deduzidas nos presentes autos se pudesse ter, por algum meio ou em algum momento, considerada por transmitida para o GG, S.A., a mesma sempre seria de considerar retransmitida – com efeitos retroactivos à data da medida de resolução – para o EE, radicando, sempre, na esfera jurídica desta entidade e, não, na do banco de transição.

Em face de tudo o exposto, a potencial imputação de qualquer responsabilidade que pudesse decorrer em razão da eventual violação de deveres por parte do EE na comercialização e intermediação financeira, nomeadamente violação do dever de informação, em data anterior a 03-08-2014, mostra-se, em todo e em qualquer caso, por via das deliberações tomadas pelo Banco de Portugal, absolutamente excluída, qualquer o título de responsabilização em que se pretendesse fundar a correspondente pretensão.».

Segundo os recorrentes o acórdão recorrido não apreciou «a situação em concreto dos factos carreados para os autos», atinentes aos invocados «dolo, fraude, violação das disposições regulamentares e penais, contraordenacionais, aplicáveis no que diz respeita ao momento (27/02/2014), momento em que foi vendida a aplicação financeira descrita», pelo que não lhes deu oportunidade para demonstrarem em sede de audiência de julgamento que o GG responde pelo valor por eles depositado na conta do EE.

Mais alegam os recorrentes que, mesmo «a enquadrar a comercialização como válida, então as manifestações publicitadas pelo BdP, pelo GG e pela CMVM, sobre a constituição de uma provisão imposta pelo BdP ao EE, a transferência dessa provisão para o GG constituem manifestações claras e vinculativas de assunção da obrigação por parte do GG do reembolso do capital investido», o mesmo se retirando da «assunção pelo próprio GG da obrigação do pagamento dos montantes investidos em papel comercial e, caso assim não se entenda, da garantia do seu pagamento, já após a aplicação da medida de resolução, para além e fora do âmbito desta».

Vejamos.

Dúvidas não restam que os autores se propõem demonstrar que o crédito a que se arrogam emerge de um contrato que reputam como inválido, em virtude de dolo ou erro provocado por violação dos deveres de informação por parte da instituição bancária e de outras disposições regulamentares.

Ora, atendendo ao modo como os AA estruturam a sua pretensão ressarcitória, agora (apenas) contra o R NB, e a provar-se toda a matéria por eles alegada e acima sinopticamente relatada, poderá aqui suscitar-se «a questão de saber se, no que concerne aos riscos a suportar na sequência duma medida de resolução bancária, os mesmos devem ser colocados a par dos investidores cujo risco é titulado por contrato que não padece de qualquer vício», como se disse no referido acórdão de 18/1.

Na verdade, o reconhecimento da tese dos AA importará a invalidade do negócio subjacente à subscrição dos questionados instrumentos financeiros e, por via disso, a subsistência dos depósitos efectuados na conta titulada pelos AA no então EE, os quais, assim sendo, teriam transitado para o R NB, por força das deliberações que conformaram a medida de resolução que incidiu sobre aquela instituição de crédito.

Foi o que, igualmente, se concluiu no acórdão que vimos seguindo:

«Na verdade, nada na disciplina legal da medida de resolução obsta a que o regime privatístico seja convocado no quadro de actuação de uma instituição bancária objecto de uma medida de resolução (cfr. Mafalda Miranda Barbosa, in Boletim de Ciências Económicas, FDUC, vol. LIX, pág.104).

Assim, podem ser impugnados negócios que se integrem no perímetro de transferência determinada pelo Banco de Portugal, desde que para isso haja fundamento.

Se é certo que o contrato cria um risco para o investidor, também nos parece certo que esse risco só é por ele titulado se o contrato não padecer de qualquer vício que o perturbe ab initio (cfr. ob. cit., pág.89).

A assunção de um risco pelo investidor só corresponde a um ideal de justiça se o negócio que lhe subjaz for válido.

Note-se que, subjacente a um empréstimo obrigacionista, está, no fundo, um contrato de mútuo.

Os deveres de esclarecimento e aconselhamento em relação ao potencial investidor emergem como uma decorrência da boa fé, dependendo a sua intensidade das idiossincrasias do investidor.

Como é evidente, os deveres de informação serão diferentes consoante os sujeitos envolvidos, requerendo especial atenção os investidores não qualificados, a quem deve ser prestada toda a informação necessária para proporcionar uma decisão de investimento esclarecida.

O erro vício, previsto nos arts. 251º e 252º, do C.Civil, pressupõe que a vontade real se tenha formado em consequência do erro.

Isto é, se não fosse o erro, a pessoa não teria pretendido realizar o negócio, ou, pelo menos, não o teria realizado nos termos em que o efectuou.

Mas enquanto no art. 251º se prevê que o erro que recai sobre os motivos determinantes da vontade se refira à pessoa do declaratário ou ao objecto do negócio, no art.252º prevê-se o caso de tal erro não se referir nem àquela pessoa, nem a este objecto (cfr. o nº1, do art.252º).

O nº2 deste último artigo, por seu turno, estabelece um regime diferente para o caso de o erro incidir sobre a base do negócio, ou seja, sobre circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar.

Tais erros do declarante são causa de anulação da respectiva declaração negocial, como resulta dos citados artigos.

A anulabilidade pode ser arguida, sem dependência de prazo, tanto por via de acção como por via de excepção, enquanto o negócio não estiver cumprido (art.287º, nº2, do C.Civil).

A anulação do negócio tem efeito retroactivo, devendo ser restituído tudo o que tiver sido prestado (art.289º, nº1, do C.Civil).

Sendo o investidor titular de uma conta com depósito junto do banco objecto da medida de resolução e tendo a execução da ordem de subscrição das obrigações sido feita à conta do saldo existente, como aconteceu no caso dos autos, a anulação do negócio pode implicar, a nosso ver, a reconversão do crédito num saldo.

Caso em que se poderá, então, considerar que tal crédito consubstancia um verdadeiro depósito, transmissível para a instituição de transição, na medida em que não tenha sido excluída essa transmissão pela medida de resolução.

Na verdade, o credor de que se fala agora, sendo-o, só o é na medida em que, por uma questão de justiça, se procura apagar a relação negocial que existia anteriormente (cfr. Mafalda Miranda Barbosa, ob.cit., pág.132, e, ainda, a mesma autora, in «Os Limites da Medida de Resolução», FDUC, pág.34).

Por outro lado, atendendo ao modo como os autores estruturaram a sua pretensão indemnizatória, esta também se funda na responsabilidade pela violação da confiança, quando sustentam que o GG se comprometeu a resolver a situação e a reembolsá-los.

Isto é, o pedido também se baseia nessa via de responsabilidade, cuja plausibilidade não pode ser liminarmente afastada

Na verdade, os AA alegaram vários factos – designadamente os relativos a afirmações sobre a criação de uma provisão que assegurava o pagamento integral do papel comercial, a salvaguarda e a garantia de que essa provisão passara para o banco de transição e que este mantinha a intenção de pagar, bem como a assunção da dificuldade dos clientes não institucionais, vítimas de más práticas comerciais, distinguirem DPs de papel comercial – estribados nos quais sustentaram que o NB se comprometeu a resolver a situação e a reembolsá-los. O que significa que o pedido se baseia também nessa terceira via da responsabilidade civil, cuja plausibilidade, segundo nos parece, não pode ser liminarmente afastada ou, pelo menos, deixar de ser encarada – pois há quem aceite essa 3ª via de responsabilidade civil, para além da contratual e da extracontratual –, o que também não sucede no acórdão recorrido.

Também sobre esta vertente se pronunciou o citado acórdão nos seguintes termos:

«Para esse tertium genus seriam reconduzidas, designadamente, as hipóteses de responsabilidade pela confiança e pela violação de deveres decorrentes da boa fé numa relação contratual.

Poderá, assim, questionar-se um eventual direito a uma indemnização com fundamento em responsabilidade pela confiança, com base na prestação de informações incorrectas ou contraditórias, geradoras de uma confiança normativamente justificada.».

«(…) O que poderá traduzir, eventualmente, um reconhecimento da responsabilidade do GG, a implicar, até, que se questione se os passivos abarcados por tais provisões poderão reputar-se de “contingentes” ou de “desconhecidos”.».
Em suma, a nosso ver, o julgador, quando proferiu o despacho saneador, ainda não tinha à sua disposição todos os factos que interessam à resolução das várias questões de direito suscitadas na presente acção. O que implica que a sentença proferida na 1ª instância não pode deixar de ser anulada, por violação da disciplina processual, uma vez que conheceu imediatamente do mérito da causa sem que se verificassem os requisitos a que alude a al.b), do nº1, do art.595º, do CPC.
Por conseguinte, perante o reconhecimento de que estado do processo não permitia que se conhecesse imediatamente do mérito da causa, sem necessidade de mais provas, deverá o processo prosseguir na 1ª instância, tendo em vista o apuramento da matéria de facto precedentemente referenciada.

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Decisão:
Pelo exposto, acorda-se em anular a sentença proferida na 1ª instância, bem como todo o processado subsequente, devendo o processo prosseguir seus regulares termos apenas contra o R “GG SA, para apuramento da matéria de facto atrás mencionada, com o pertinente alcance em sede de solução de direito.

Custas pela parte vencida a final.



Lisboa, 27/02/2018


Alexandre Reis

Lima Gonçalves

Cabral Tavares* (com Declaração de Voto)


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[1] Relatado pelo Conselheiro Roque Nogueira e subscrito pelo relator do presente acórdão.
[2] Cfr. Alberto dos Reis, in “Código de Processo Civil, Anotado”, III, 4ª ed., pp.189 e 190.
[3] In “Manual do Processo Civil”, 2ª ed., p.385.


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Declaração de Voto

1. Votei vencido – confirmaria o acórdão da Relação.

2. Assente, como evidenciado no presente acórdão, que «Dúvidas não restam [de] que os autores se propõem demonstrar que o crédito a que se arrogam emerge de um contrato que reputam como inválido, em virtude de dolo ou erro provocado por violação dos deveres de informação por parte da instituição bancária e de outras disposições regulamentares».

Considerou-se, todavia, que «o reconhecimento da tese dos AA importará a invalidade do negócio subjacente à subscrição dos questionados instrumentos financeiros e, por via disso, a subsistência dos depósitos efectuados na conta titulada pelos AA no então AA, os quais, assim sendo, teriam transitado para o R BB, por força das deliberações que conformaram a medida de resolução que incidiu sobre aquela instituição de crédito» (realce acresc.).

Entendimento esse precisado, com remissão para anterior acórdão desta secção, do dia 18 do passado mês de Janeiro, nos seguintes termos: «A anulação do negócio tem efeito retroactivo, devendo ser restituído tudo o que tiver sido prestado (art. 289º, nº1, do C.Civil). Sendo o investidor titular de uma conta com depósito junto do banco objecto da medida de resolução e tendo a execução da ordem de subscrição das obrigações sido feita à conta do saldo existente, como aconteceu no caso dos autos, a anulação do negócio pode implicar, a nosso ver, a reconversão do crédito num saldo. Caso em que se poderá, então, considerar que tal crédito consubstancia um verdadeiro depósito, transmissível para a instituição de transição, na medida em que não tenha sido excluída essa transmissão pela medida de resolução» (realce acresc.).

Considerou-se, por outro lado, que os AA. cumulativamente fundaram o seu pedido na responsabilidade pela violação da confiança, «cuja plausibilidade, segundo nos parece, não pode ser liminarmente afastada ou, pelo menos, deixar de ser encarada – pois há quem aceite essa 3ª via de responsabilidade civil, para além da contratual e da extracontratual –, o que também não sucede no acórdão recorrido».

Daí decidir-se pela anulação da sentença proferida na 1ª instância e pelo prosseguimento do processo para apuramento da matéria de facto, «com o pertinente alcance em sede de solução de direito».

3. Não acompanho, com o devido respeito, a posição que fez vencimento.

3.1. A deliberação do Banco de Portugal, de 3 de Agosto de 2014, que aplicou a medida de resolução ao Banco AA, SA (AA) e procedeu à constituição da instituição de transição, o BB, SA (NB), teve em vista a salvaguarda da solidez financeira da instituição de crédito, dos interesses dos depositantes, da estabilidade do sistema financeiro, nos termos regulados nos arts. 139º, 140º, 145º-A e ss. do RGICSF (à altura, conforme alterações e aditamentos produzidos no diploma pelo DL 31-A/2012, de 10 de Fevereiro, assim justificados no respetivo preâmbulo: «(…) o Estado Português assumiu o compromisso de reforçar os regimes de intervenção em situações de potencial ou efectivo desequilíbrio financeiro de instituições de crédito, antecipando-se mesmo, na linha do efectuado por outros Estados-Membros da União Europeia, tais como o Reino Unido, Alemanha, Holanda, Irlanda, Bélgica e Grécia, ao futuro enquadramento comunitário em questões chave consideradas como de especial relevância para a promoção da confiança no sistema financeiro nacional»; arts. 145º-C e ss., na redação operada pela Lei 23-A/2015, de 26 de Março, com a ulterior transposição das Diretivas do Parlamento Europeu e do Conselho, 2014/49/UE e 2014/59/UE).

3.2. No que ora interessa e no que respeita aos poderes funcionais do Banco de Portugal quanto à seleção de ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão a transferir para o banco de transição (arts. 145º-G e 145º-H do RGICSF, na redação vigente à data; arts. 145º-O e 145º-Q, após a Lei 23-A/2015), nos termos das subalíneas (v) e (vii) da alínea (b) do (nº 1 do) Anexo 2 da mesma deliberação, já na redação emergente da deliberação, do dia 11 seguinte, que clarificou e ajustou o perímetro das transferências para o NB, mantiveram-se no AA quaisquer responsabilidades ou contingências, nomeadamente as decorrentes de dolo, fraude, violação de disposições regulatórias, penais ou contraordenacionais, bem como quaisquer obrigações, garantias, responsabilidades ou contingências assumidas na comercialização, intermediação financeira e distribuição de instrumentos de divida emitidos por entidades que integram o Grupo Espirito Santo, (…).

3.3. Prosseguindo, quase à outrance, na produção de clarificações e ajustamentos, a deliberação de 29 de Dezembro de 2015 – “Perímetro” introduziu novas alterações às referidas subalíneas republicando o Anexo 2; tais subalíneas deverão ser interpretadas à luz das clarificações constantes do Anexo 2C, anexo esse por aquela resolução aditado à deliberação de 3 de Agosto, com a redação constante da deliberação relativa à “Clarificação e retransmissão de responsabilidades e contingências definidas como passivos excluídos nas subalíneas (v) a (vii) da alínea (b) do n.º 1 do Anexo 2 à Deliberação do Banco de Portugal de 3 de agosto de 2014 (20 horas), na redação que lhe foi dada pela Deliberação do Banco de Portugal de 11 de agosto de 2014 (17 horas)”.

No então aditado Anexo 2C, decidiu-se, na generalidade, na alínea A), «Clarificar que, nos termos da alínea (b) do número 1 do Anexo 2 da deliberação de 3 de agosto, não foram transferidos do AA para o BB quaisquer passivos ou elementos extrapatrimoniais do AA que, às 20:00 horas do dia 3 de agosto de 2014, fossem contingentes ou desconhecidos (incluindo responsabilidades litigiosas relativas ao contencioso pendente e responsabilidades ou contingências decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contraordenacionais), independentemente da sua natureza (fiscal, laboral, civil ou outra) e de se encontrarem ou não registadas na contabilidade do AA» e «Em particular, desde já se clarifica não terem sido transferidos do AA para o BB os seguintes passivos do AA: (…) Todas as indemnizações e créditos resultantes de anulação de operações realizadas pelo AA enquanto prestador de serviços financeiros e de investimento» – alínea B), subalínea (vi).

Por outro lado, na alínea C), dispôs-se: «Na medida em que, não obstante as clarificações acima efetuadas, se verifique terem sido efetivamente transferidos para o BB quaisquer passivos do AA que, nos termos de qualquer daquelas alíneas e da Deliberação de 3 de agosto, devessem ter permanecido na sua esfera jurídica, serão os referidos passivos retransmitidos do BB para o AA, com efeitos às 20 horas do dia 3 de agosto de 2014».

Iguais clarificações, nos exatos termos e localização, constam da deliberação da mesma data – “Contingências”.

Determinou-se instrumentalmente, nestas duas últimas deliberações, que «o Conselho de Administração do AA e o Conselho de Administração do Novo Banco devem tomar todas as medidas necessárias à execução eficaz das clarificações, ajustamentos, transferências e retransmissões previstos», especificando-se que devem «praticar todos os atos, sejam estes de natureza procedimental ou processual, nos processos em que sejam parte de modo a dar adequada execução às decisões do Banco de Portugal (…), incluindo aqueles que sejam necessários para reverter atos anteriores que tenham praticado contrários aquelas decisões», entre aqueles atos vindo referida a imediata junção aos autos em que sejam parte dessas mesmas deliberações.

3.4. A descrita intervenção do Banco de Portugal, enquanto entidade apenas estatutariamente sujeita às orientações e instruções do Banco Central Europeu (arts. 1º e 3º da LOBP), com a prática de atos no exercício de funções públicas de autoridade, quadra-se no âmbito dos arts. 101º e 102º da Constituição, das citadas disposições do RGICFS, do Regulamento do Parlamento Europeu e Conselho 1022/2013/UE, do Regulamento do Conselho 1024/2013/UE, do Regulamento do BCE 468/2014/UE, dos arts. 17º e 17º-A da LOBP.

3.5. Não se discute que o crédito dos AA. emergente do negócio subjacente à subscrição dos instrumentos financeiros em causa (papel comercial emitido pela CC), enquanto crédito relativo a ações preferenciais emitidas por sociedades-veículo estabelecidas pelo AA e vendidas pelo AA [subalínea (i) da alínea B) do Anexo 2C à deliberação do Banco de Portugal, de 3 de Agosto de 2014], não foi transferido para o NB – ou, tendo-o sido, foi retransmitido para o AA.

3.6. Pretendendo os AA. demonstrar que o negócio subjacente deve ser anulado por violação dos deveres de informação e de diversas disposições regulamentares por parte da instituição bancária, considerou-se no acórdão que, em virtude da visada anulação, o crédito poderia passar a consubstanciar um verdadeiro depósito e, nos próprios termos das deliberações que conformaram a medida de resolução, transmissível para a instituição de transição (supra, 2).

A retroatividade da anulação do negócio, nos termos do nº 1 do art. 289º do CC, obriga à restituição das prestações efetuadas, como se o negócio não tivesse sido realizado.

Obrigação essa pela qual será responsável a contraparte no negócio – no caso, o AA.

As deliberações do Banco de Portugal, nos passos antes transcritos [subalíneas (v) e (vii) da alínea (b) do nº 1 do retificado Anexo 2 e alíneas A), B), subalínea (vi) e C) do aditado Anexo 2.C à deliberação de 3 de Agosto de 2014; alíneas A), B), subalínea (vi) e C) da deliberação de 29 de Dezembro de 2015 – Contingências], são claras, não suscitando dúvidas interpretativas, no sentido de que qualquer responsabilidade do AA na matéria não é transferida para o NB – nesta linha de entendimento, recentes acórdãos, de 26 de Setembro e de 2 de Novembro de 2017 (disponíveis, bem como o adiante citado, em http://www.dgsi.pt/jstj).

Em vista dos termos em que a medida de resolução foi conformada – depois, clarificada e ajustada –, não poderá validar-se a tese da transmissão da obrigação para o NB, em resultado da pretendida anulação do negócio; consequentemente, mostrar-se-á inútil o prosseguimento do processo para apuramento da matéria de facto.

3.7. Citados no acórdão, a fundar a decisão, dois estudos de Mafalda Miranda Barbosa.

Diz-se, no segundo deles, a concluir: «A eficácia da medida de resolução fica dependente da capacidade que a entidade responsável pela sua aplicação tenha de poder conformar livremente o seu conteúdo. No tocante à transferência de parte dos ativos e passivo para uma instituição de transição, é fundamental que tal entidade possa selecionar com base da determinação do valor do passivo e do ativo os créditos e obrigações a transferir. Simplesmente, essa liberdade não é absoluta, devendo respeitar não só a teleologia do regime da resolução, como também os princípios normativos e a conformação das relações privadas que, antes da intervenção, se estabeleceram entre o banco e os diversos sujeitos que com ele interagiam».

O Banco de Portugal, através das sucessivas deliberações respeitantes à medida de resolução aplicada ao AA, veio, com crescente rigidez, fixar o perímetro de exclusão da transmissão dos créditos indemnizatórios, indiferenciada e aglutinadamente os tratando.

Procedimento dinâmico, em vista, designadamente, do «número de processos pendentes nos tribunais judiciais e [d]a diferente orientação nas decisões até hoje tomadas», na defesa do quadro de gestão previsional então desenhado, sob pena de ficar «comprometida a execução e a eficácia da medida de resolução aplicada ao AA, a qual, entre outros critérios, se baseou num critério de certeza quanto ao perímetro de transferência (…) que permitiu calcular as necessidades de capital da instituição de transição, o BB, e foi com base nesse cálculo que o Fundo de Resolução realizou o capital da instituição de transição. Caso viessem a materializar-se na esfera jurídica do BB responsabilidades e contingências por força de sentenças judiciais, o BB seria chamado a assumir obrigações que de modo algum lhe deveriam caber e cuja satisfação não foi pura e simplesmente tida em consideração no montante do capital com que aquele banco de transição foi inicialmente dotado» (considerandos para enquadramento da deliberação de 29 de Dezembro de 2015 – Contingências, acima referida).

O procedimento em causa e os sucessivos atos de autoridade dele resultantes, sujeitos à observância de determinados requisitos e enquanto dotados de eficácia externa lesiva dos direitos e interesses legalmente protegidos de terceiros, poderão, obviamente, ser judicialmente sindicados, como é próprio do Estado de Direito.

Compete tal sindicância à jurisdição administrativa (arts. 12º e 145º-AR do RGICSF; art. 39º da LOBP) – neste sentido, além dos arestos já citados, acórdão de 30 de Março de 2017.

Lisboa, 27 de Fevereiro de 2018.

( J. Cabral Tavares )