Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
223/12.0TBGRD.C1.S1
Nº Convencional: 2ª SECÇÃO
Relator: TOMÉ GOMES
Descritores: ESTABELECIMENTO COMERCIAL
UNIVERSALIDADE
DIREITO DE PROPRIEDADE
USUCAPIÃO
POSSE
ACÇÃO DE REIVINDICAÇÃO
AÇÃO DE REIVINDICAÇÃO
Data do Acordão: 02/22/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL – PROCESSO EM GERAL / CUSTAS, MULTAS E INDEMNIZAÇÕES / MULTAS E INDEMNIZAÇÕES – PROCESSO DE DECLARAÇÃO / RECURSOS / RECURSO DE REVISTA.
DIREITO CIVIL – DIREITO DAS COISAS / POSSE / CARACTERES DA POSSE.
DIREITO CONSTITUCIONAL – DIREITOS, LIBERDADES E GARANTIAS PESSOAIS.
Doutrina:
-FERNANDO OLAVO, Direito Comercial, Volume I, 2.ª Edição (reimpressão), 1974, p. 262;
-FERRER CORREIA, Lições de Direito Comercial, Volume I, Universidade de Coimbra, 1973, p. 201 a 203 ; Reivindicação do estabelecimento comercial como unidade jurídica, Estudos de Direito Civil Comercial e Criminal, Almedina, Coimbra, 1985, p. 255, 256, 262 e 263;
-GRAVATO MORAIS, Alienação e Oneração de Estabelecimento Comercial, Almedina, 2005, p. 70 a 76;
-MENEZES CORDEIRO, Manual de Direito Comercial, Volume I, Almedina, 2001, p. 255;
-ORLANDO DE CARVALHO, Direito das Coisas, Coimbra Editora, 1977, p. 196 ; Coimbra Editora, 2012, p. 272;
-PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, Volume III, Coimbra Editora, 2.ª Edição, 1987, p. 8.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 542.º, N.ºS 1 E 2, ALÍNEA B) E 671.º, N.º 3.
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 1252, N.º 2, 1253, N.º 2, 1257.º, N.º 2 E 1263, ALÍNEA B).
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (RCP): - ARTIGO 27.º, N.º 3.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:


- DE 05-07-2001, PROCESSO N.º 02B538, IN WWW.DGSI.PT.
Sumário :   
I. O estabelecimento comercial consubstancia-se num complexo de elementos heterogéneos, corpóreos e incorpóreos, integrados numa organização dinâmica destinada ao exercício de uma atividade económica comercial, configurável como universalidade de direito.  

II. Segundo a doutrina corrente, o estabelecimento comercial como universalidade de direito é passível de posse, de usucapião e de reivindicação da propriedade, mesmo sem o restringir aos simples objetos corpóreos.

III. A propriedade do estabelecimento comercial, enquanto universalidade de direito, não se afere em função de um ou outro elemento integrativo, mas por referência ao conjunto organizado, tanto mais que podem alguns desses elementos não pertencer em propriedade ao titular do mesmo estabelecimento, bastando que ele os possa utilizar ou ter a respetiva disponibilidade para os fins da empresa.

IV. Tendo-se provado apenas que o autor explorou o estabelecimento comercial de julho de 2001 até 2007, tendo praticado, entretanto, alguns atos de remodelação e beneficiação compatíveis com a cedência temporária do mesmo, não é lícito concluir que aquele autor exercera uma posse em nome próprio em termos da propriedade desse estabelecimento

Decisão Texto Integral:
Acordam da 2.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça:


 

I – Relatório


1. AA e cônjuge BB (A.A) instauraram, em 14/02/2012, ação declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra CC, alegando, em síntese, que:

. Os A.A. adquiriram a propriedade de um prédio urbano composto de rés-do-chão, 1.º andar e sótão, sito em Quintais …, da freguesia de …, inscrito na respetiva matriz sob o art. 529, descrito na Conservatória do Registo Predial da Guarda e inscrito a seu favor sob o número de ficha 5…/19…3;

. O referido prédio foi cedido, em 1989, pelos pais do A. para construção de um edifício destinado a comércio, o qual veio a ser construído pelo A., a expensas suas, tendo ainda adquirido os bens que compõem o respetivo recheio;

. O A. está na posse do mesmo há mais de 30 anos, de forma pública, sem oposição de ninguém e agindo como seu proprietário;

. O edifício comporta um café e um mini-mercado, ambos explorados pelo A., ininterruptamente, durante 17 anos, tendo depois o café sido encerrado;

. Após ter encerrado o café e emigrado, o A. teve conhecimento que um terceiro, sem a sua autorização e contra a sua vontade, ocupou o imóvel, alegando que o entregaria logo que os A.A. regressassem a Portugal, o que não veio a ocorrer, permanecendo o terceiro com as chaves do imóvel.

Concluíram os A.A. a pedir:

a) – o reconhecimento de que o A. é dono e legítimo possuidor, com exclusão de outrem, do sobredito prédio;

b) – o reconhecimento de que o A., mesmo que outro título não houvesse, adquiriu a propriedade do imóvel por usucapião e acessão industrial imobiliária no ano de 1989;

c) – a condenação dos R.R. a entregar ao A., livre e devoluto, o referido imóvel com todos os seus componentes, no prazo de 10 dias, sob pena de, não o fazendo, pagarem aos A.A. € 15,00 por cada dia de atraso.

2. Os R.R. apresentaram contestação-reconvenção, deduzindo ainda a intervenção principal de DD e cônjuge EE, alegando que:

. O estabelecimento de que o A. marido se arroga proprietário foi construído pelos seus pais, DD e EE, e por estes sempre explorado, tendo sido eles a suportar todas as despesas inerentes à respetiva construção e funcionamento;

. Até 2009, altura em que o imóvel em referência foi doado ao A. pelos pais, nunca aquele foi o proprietário desse imóvel, embora tenha chegado a explorar o café com expressa autorização dos seus pais, bem sabendo que não lhe pertencia;

. Após o A. ter emigrado, a sua mãe celebrou com a R. mulher, em 13/03/2008, um contrato verbal de arrendamento que abrangia o imóvel em que se situava o café, tal como a exploração deste estabelecimento, sem qualquer prazo de duração, mediante o pagamento mensal da quantia de € 150,00;  

. Muito embora a R. tivesse insistido para que esse contrato fosse reduzido a escrito, a mãe do A. recusou-se a tal, invocando não ser necessário, por haver confiança entre ambas;

. Na sequência do contrato celebrado, a R., à data desempregada, deixou de procurar emprego, tendo iniciado a exploração do café em março de 2008, à vista de todos e sem a oposição de ninguém;

. Em outubro de 2011, a ASAE ordenou o encerramento do estabelecimento pelo facto de a R. não possuir alvará em seu nome, sendo que a mesma por diversas vezes tinha pedido à mãe do A. (e continuou a pedir) para passar o alvará para o seu nome, o que esta sempre atrasou e, mais tarde, negou, tendo o café, por tal razão, se mantido encerrado;

. O estabelecimento comercial nunca foi cedido pelos progenitores do A. ao mesmo;

. Desde janeiro de 2012, os AA. e a mãe do A. impediram a R. de aceder ao café, tendo colocado um cadeado de ferro no portão de acesso.

. Agem assim os A.A. de má fé.

Concluíram os R.R. pela improcedência da ação e pela procedência da pretensão reconvencional, pedindo que:  

a) – fosse declarado que os A.A. não adquiriram por usucapião, acessão industrial imobiliária ou por qualquer outra forma prédio acima identificado;

b) – fosse declarado que os chamados DD e EE são os proprietários e os titulares do referido estabelecimento comercial “Café os Amigos”, com os fundamentos alegados pelos R.R.;

c) – fosse declarado que, entre a R. CC e a chamada DD, foi efetuado, verbalmente, o contrato de arrendamento invocado, tendo por objeto o rés-do-chão do imóvel em referência e a exploração do estabelecimento comercial denominado o Café “FF”, mediante o pagamento da renda mensal de € 150,00 por mês,

d) – fosse declarado que, apesar de tal contrato não ter sido reduzido a escrito, o mesmo é plenamente válido, por força do instituto do abuso de direito e nos termos e com os fundamentos, de facto e de direito, alegados;

e) – fossem condenados os chamados DD e marido EE a efetuarem todas as diligências necessárias em ordem à alteração da titularidade a favor da R. CC, do Alvará nº 4…/88 emitido pela Câmara Municipal da Guarda em 14/11/1988;

f) – fossem condenados os A.A. e os chamados a retirarem o cadeado que colocaram no portão de entrada do logradouro do prédio e estabelecimento comercial em causa, de forma a permitir a entrada e saída normal dos R.R. desse estabelecimento comercial;

g) – fossem condenados os A.A. e os chamados a se absterem de praticar quaisquer atos ou factos que impeçam a livre e normal entrada e saída dos R.R. de e para o estabelecimento comercial denominado Café “FF”.   

3. Os A.A. responderam a manter a posição sustentada na petição inicial e a pugnar pela inadmissibilidade da pretensão reconvencional, cuja matéria, em todo o caso, impugnaram.

4. Admitido o incidente de intervenção dos chamados, foram estes citados, nada tendo vendo dizer.

5. Findos os articulados, foi proferido despacho saneador (fls. 112-133), no âmbito do qual foi fixado o valor da causa em € 47.490,00 e admitido o pedido reconvencional, procedendo-se à seleção da matéria de facto tida por relevante com organização da base instrutória.  

6. Realizada a audiência final, foi proferida a sentença de fls. 605-653, datada de 24/02/2015, a julgar a ação e a reconvenção parcialmente procedentes decidindo-se:

A – Relativamente à ação, reconhecer que o A. é dono e legítimo possuidor, com exclusão de outrem, do prédio urbano ajuizado, mas absolvendo-se os R.R. do mais peticionado pelos A.A.; 

B – Quanto à reconvenção:

a) - declarar que, entre a R. CC e a chamada DD, foi efetuado, verbalmente, um contrato de arrendamento que teve por objeto o rés-do-chão do imóvel em referência e, simultaneamente, a exploração do estabelecimento comercial denominado o Café “FF”, mediante o pagamento da renda mensal de € 150,00, contrato esse plenamente válido;

b) - condenar os chamados DD e marido EE a efetuarem todas as diligências necessárias em ordem à alteração da titularidade a favor da R. CC, do alvará n.º 4…/88 emitido pela Câmara Municipal da Guarda em 14/11/1988;

c) - condenar os A.A. e os chamados a retirarem o cadeado que colocaram no portão de entrada do logradouro do prédio e estabelecimento comercial em questão, de forma a permitir a entrada e saída normal dos Réus desse estabelecimento comercial;

d) – condenar os A.A. e os chamados a absterem-se de praticar quaisquer atos ou factos que impeçam a livre e normal entrada e saída dos R.R. de e para o estabelecimento comercial denominado Café “FF”;

e) - absolver os A.A. reconvindos e os chamados do demais contra eles peticionado.

C) – Quanto ao pedido de condenação dos A.A., como litigantes de má fé, deduzido pelos RR., condenar aqueles a pagarem uma multa processual no valor equivalente a 6 UC e no valor indemnizatório que ainda vier a ser fixado nos termos previstos no n.º 3 do art.º 543.º do CPC.

D – Ordenar a notificação dos R.R. para, em 10 dias, virem comprovar o valor de € 2.000,00 peticionado a título de indemnização pela litigância de má fé, através da junção da respetiva prova documental.

7. Inconformados com tal decisão, os A.A. recorreram para o Tribunal da Relação de …, em sede de impugnação de facto e de direito.

8. Subsequentemente, foi proferida decisão em 1.ª instância, datada de 09/06/2015, a condenar os A.A., como litigantes de má fé, a pagar aos R.R. a indemnização de € 800,00, decisão de que os A.A. também recorreram.

9. O Tribunal da Relação, pelo acórdão proferido a fls. 921-969, datado de 12/07/2017, aprovado por unanimidade, no que aqui releva, julgou:

a) – Improcedente a primeira apelação dos A.A., confirmando, com fundamentação diversa, a sentença recorrida;

b) – Procedente a segunda apelação pelos mesmos interposta, revogando o despacho de 09/06/2015, que condenara os A.A. a pagar aos R.R. a indemnização de € 800,00 por litigância de má fé.


10. Desta feita, vêm os A.A. pedir revista, formulando as seguintes conclusões:

1.ª – O Tribunal fez errada interpretação e aplicação do direito aos factos que emergem dos autos ao não atribuir a titularidade do direito de propriedade sobre o estabelecimento comercial denominado Café FF”.

2.ª - De facto, atenta a eliminação pelo Tribunal da Relação, do art.º 32.º da matéria de facto, conjugada com a matéria de facto que resultou provada vertida nos pontos 14, 15, 16, 18 e 55 a 60 da matéria dada como provada, resultou que o estabelecimento comercial era, e é, do filho dos chamados, aqui A. AA, que:

a) - Encomendou e comprou todos os bens móveis e equipamentos que compõem e integram hoje o estabelecimento comercial: uma bancada em inox, um balcão frigorífico; um móvel com prateleiras em vidro espelhado; uma vitrina para bolos; um exaustor de fumo do tabaco; três bancos de balcão; seis mesas de inox para a esplanada.

b) - Explorou-o, prestando serviços de venda de bebidas e de cafetaria a clientes e amigos,

c) - Contratando com fornecedores a aquisição de café em grão, bebidas e outros consumíveis,

d) - Explorou o estabelecimento dele fazendo a sua fonte de rendimento e subsistência.

e) - Encomendou o telhado e mandou colocá-lo e, bem assim, aplicou mosaicos no pavimento do estabelecimento;

f) - Tinha horário de trabalho comunicado e aprovado pelo IDICT a fls... dos autos;

g) - Pagava os respetivos impostos, incluindo IVA, como explorador do estabelecimento comercial em causa;

h) - Desde 2001 que, foram processados e emitidos em nome do A., as faturas/recibos referentes à água e à eletricidade que consumia e, bem assim, todos os documentos referentes à exploração do café, nomeadamente notas de encomenda, faturas, recibos.

i) - Tudo isto, fazendo na convicção de ser o proprietário do estabelecimento e nunca atuando “com expresso consentimento e autorização dos seus pais, na convicção de que os seus pais, e não ele e esposa, eram os proprietários.”

3.ª - Ou seja, é forçoso que o universo de bens móveis comprados pelo A. e inseridos no interior do imóvel (art.º urbano 529.º da freguesia de Fernão Joanes) associado à atividade que tais bens permitiam desenvolver ao A., a inscrição de início e o prosseguimento de atividade código 52112, em que se encontrava inscrito no Serviço de Finanças da Guarda, integram o conceito jurídico de estabelecimento comercial, o qual, in casu, é pertença do A., que o reivindicou.

4.ª - Pelo que o Tribunal “a quo” fez errada aplicação do direito aos factos, pelo que devem os AA. ser declarados donos legítimos possuidores do estabelecimento comercial de café "FF"', com todas as legais consequências.

5.ª - O Tribunal da Relação manteve a condenação dos AA. como litigantes de má-fé, não por se ter provado que o A. tenha explorado o estabelecimento com o consentimento e autorização dos pais na convicção de que estes é que eram proprietários do imóvel, mas sim porque, no seu entender "os autores alegaram, falsamente, que os chamados cederam ao autor o prédio para nele construir um edifício destinado a comércio e que o autor construiu tal edifício e ali instalou os estabelecimentos de café e mercearia, pois tal matéria está em contradição com a matéria de facto provada (cfr. alíneas A) a G) dos factos não provados e factos 28 a 31, 33, 34, 36, 37, como assim, deve manter-se a condenação dos A.A. como litigantes de má-fé"

6.ª - Sucede que não podem os A.A. concordar com o teor do sobredito entendimento, porquanto:

a) - por via da presente ação, os AA, limitaram-se a exercer um direito que a lei lhes confere: a defesa do seu direito de propriedade.

b) - para o que, alegaram factos e indicaram prova, quer testemunhal, quer documental;

c) - se a prova não foi suficiente e se a sua tese não foi julgada provada e procedente, isso não significa que tenham alegado falsamente factos.

d) - Sendo certo que, o requisito do dolo ou da negligência grave, de que depende a eventual condenação da parte como litigante de má-fé, in casu, não se verifica, nem é alegado ou fundamentado pelo Tribunal, para que haja lugar à condenação dos A.A. como litigantes de má-fé.

e) - Aliás, os próprios chamados, pais do A., seriam, como efetivamente são, as únicas pessoas que poderiam ter interesse em reclamar quer a propriedade do imóvel quer a propriedade do estabelecimento comercial e não o fizeram, por entenderem e reconhecerem que, de facto, esse direito de propriedade pertence ao filho, A./recorrente na ação.

7.ª - Acresce que o acórdão recorrido sempre seria nulo, porquanto não especifica os fundamentos de direito que justificam a decisão de condenar os AA. como litigantes de má-fé, ao abrigo do disposto no art.º 674.º, n.º 1, al. c),  e art.º 615.º, n.º 1, al. b), do CPC.

    Pedem os Recorrentes que se revogue o acórdão recorrido e se substitua por decisão que confira aos A.A. o direito de propriedade sobre o estabelecimento em causa, absolvendo-se os mesmos da condenação como litigantes de má fé. 


Cumpre apreciar e decidir.


II – Delimitação do objeto da revista


Antes de mais, importa reter que, tendo a presente ação sido interposta em 14/02/2012 e as decisões impugnadas proferidas em 24/02/2015 e em 12/07/2017, respetivamente pela 1.ª instância e pela Relação, é aqui aplicável o regime recursório do CPC, na redação dada pela Lei n.º 41/ 2013, de 26-06, nos termos do respetivo art.º 5.º, n.º 1. 

Assim, verificando-se, como se verifica, que a fundamentação do acórdão recorrido é essencialmente diferente da dada pela 1.ª instância, com incidência nos segmentos decisórios sob impugnação, não ocorre dupla conforme relevante, nos termos do art.º 671.º, n.º 3, do CPC.

  

Dado o teor das conclusões dos Recorrentes, o objeto da revista tem por objeto, unicamente, as seguintes questões:

   i) – A questão sobre a invocada titularidade da propriedade do estabelecimento comercial ajuizado, denominado Café “FF”, que os A.A. se arrogam;    

ii) – A questão da condenação dos A.A. em multa, como litigantes de má fé, questão esta que ainda decorre da solução à dar à questão precedente.


III – Fundamentação


1. Factualidade como provada nas instâncias


Vem dada como provada nas instâncias a seguinte factualidade:

1.1. No dia 27/04/1987, compareceram perante Notário, que exarou por escrito as suas declarações, com a epígrafe “COMPRA E VENDA”, GG e HH, na qualidade de primeiros outorgantes, e a chamada DD, na qualidade de segunda outorgante, e declaram o seguinte:

«Declararam os primeiros outorgantes:

  Que, vendem à segunda outorgante os seguintes prédios situados na freguesia de Fernão Joanes, deste concelho: (…);  

 SEGUNDO – Prédio rústico que consta duma terra regadia com fruteira (…) sito no lugar de QUINTAIS …, (…) inscrito na respectiva matriz sob o artigo 335.»

1.2. No prédio descrito em 1.1 foi construído um edifício, onde foram instalados dois estabelecimentos comerciais, designadamente um café denominado “FF” e uma mercearia, com divisória própria e independente e com comunicação entre eles através de uma porta interior.

1.3. Após a conclusão da construção do imóvel, a chamada DD, invocando a qualidade de proprietária do mesmo, apresentou na Repartição de Finanças da Guarda o requerimento Modelo 129, destinado a participar tal prédio urbano e a criar um novo prédio com novo artigo matricial correspondente à nova realidade predial, tendo sido criado o novo prédio com o artigo matricial n.º 5…9 a partir do artigo rústico 335.

1.4. No dia 22 de dezembro de 2009, entre a DD e marido e o A. marido foi outorgada escritura pública no Cartório Notarial sito na Rua … n.º … C, em Celorico da Beira, perante a notária II, a que as partes deram o nome de “doação”, tendo declarado o seguinte:

   «Doação

  No dia vinte e dois de Dezembro de dois mil e nove, perante mim, II, notária, no Cartório, sito na Rua …, nº …C, em Celorico da Beira, compareceram como outorgantes:

  PRIMEIROS: DD, NIF 107 …, natural da freguesia da …, concelho da Guarda, e cônjuge, EE, NIF 107 …, natural da freguesia de …, concelho de Vouzela, casado sob o regime da comunhão geral, residentes na freguesia de …, concelho da Guarda.

  SEGUNDO: JJ, casado, natural da freguesia de …, concelho de Fornos e Algodres, solicitador com escritório na Rua …, nº 1, na Guarda, que outorga na qualidade de procurador de: AA, NIF 191 …, natural de …, residente habitualmente na Itália, quando em Portugal, na do Forno, freguesia de …, concelho da Guarda, casado, sob o regime da comunhão de adquiridos com BB, NIF 185 ….. (…)

   Declaram os primeiros outorgantes, que, com reserva para ambos do usufruto simultâneo e sucessivo, doam, ao representado do segundo, seu filho, por conta da quota disponível de seus bens, com cláusula de incomunicabilidade à mulher, o seguinte prédio: Urbano, sito em Quintais …, inscrito na respectiva matriz da freguesia de … sob o artigo 529, sem valor patrimonial, por se encontrar pendente de avaliação, descrito na Conservatória do Registo Predial da Guarda sob o número cinquenta e três da citada freguesia, inscrito a favor dos doadores pela apresentação três mil e três de dezanove de Agosto de dois mil e nove.

   Que atribuem à doação da nua propriedade o valor de vinte e cinco mil euros.

   Declarou o segundo outorgante, que aceita para o seu representado o contrato nos termos exarados.

   ARQUIVO: Certidão emitida a 11/04/2008, pela Câmara Municipal da Guarda, qual verifiquei ter sido emitido o alvará de licença de mercearia/café de utilização n.º 4…/88, registado sob o nº 4…/88 no respetivo livro de registos. (…)».

1.5. O referido prédio urbano, inscrito na matriz sob o artigo 529, encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial da Guarda, com o n.º 5…/19…13, sito em Quintais …, composto de rés-do-chão, 1.º andar e sótão.

1.6. Após a realização da escritura descrita em 1.4, tal prédio passou a estar inscrito, no registo predial, a favor dos autores, pela apresentação n.º 207, de 2010/04/13, a título de aquisição por doação dos chamados EE e DD.

1.7. No dia 30 de dezembro de 2011, no Cartório Notarial do notário privado KK, sito na Rua … n.º …-A na Guarda, DD e marido EE, efetuaram uma escritura pública que denominaram de “RENUNCIA DE USUFRUTO”, tendo declarado o seguinte:

«RENUNCIA DE USUFRUTO

No dia trinta de Dezembro de dois mil e onze, na Rua …, número doze – A, na Guarda e nas Instalações de Notário Privado, perante mim, KK, respectivo Notário, compareceram como outorgantes: DD, NIF 107 987 325, de setenta anos de idade e marido EE, NIF 107 …, de setenta e oito anos de idade, casados sob o regime da comunhão geral, naturais, ela da freguesia da Guarda (…), deste concelho e ele da freguesia de …., concelho de Vouzela e residentes na freguesia de …, deste concelho, titulares, ela do Cartão de Cidadão número 070…. ZZ8 válido até 17/09/2013 e ele do Bilhete Identidade número 060… de 12/07/1984 do CICC de Lisboa. Verifiquei a identidade dos outorgantes por exibição dos respectivos documentos de identificação.

 E POR ELES FOI DITO: Que pela presente escritura renunciam ao usufruto que lhes pertence no seguinte imóvel: PRÉDIO URBANO constituído por rés-do-chão e primeiro andar e sótão, sito em Quintais …, na dita freguesia de …, inscrito na matriz respectiva sob o artigo 5…9 com o valor patrimonial actual e atribuído de quarenta e cinco mil quatrocentos e noventa euros, descrito na Conservatória do registo Predial da Guarda sob o número cinquenta e três, da mesma freguesia de …, ficando a divergência de composição a dever-se a erro de inscrição matricial.»

1.8. A chamada DD assinou toda a documentação necessária e integrante do processo administrativo apresentado na Câmara Municipal da Guarda para efeitos de licenciamento administrativo da respetiva construção e emissão dos respetivos alvarás de licença de utilização e alvará sanitário do estabelecimento comercial designado “Café FF”, invocando a qualidade de proprietária e possuidora do imóvel em questão.     

1.9. No âmbito desse procedimento administrativo a Câmara Municipal da Guarda emitiu um alvará de licença de construção do prédio urbano em questão, o que fez em nome da camada DD.

1.10. A Câmara Municipal da Guarda emitiu um alvará de licença de utilização do referido prédio urbano, tendo ficado como titular do mesmo a DD.

1.11. DD, invocando a qualidade de proprietária do imóvel e dos estabelecimentos de mercearia e café, requereu na Câmara Municipal da Guarda que fosse emitido a seu favor, e em seu nome, alvará de licença sanitária para exploração dos estabelecimentos comerciais indicados em 1.2, tendo a Câmara Municipal da Guarda, em 14 de novembro de 1988, emitido a favor daquela o Alvará de Licença Sanitária n.º 4…/88:

  “Processo n.º 4.../88

  Câmara Municipal de Guarda Alvará de Licença Sanitária - Classe nº 4…/88 - LL, Presidente da Câmara Municipal de Guarda: - Faço saber, a quantos este alvará virem, que esta Câmara Municipal, em Despacho de 14 de Novembro de 1988, tendo-lhe sido apresentado o processo organizado nos termos da Portaria nº 6…5, de 30 de março de 1929, deliberou conceder a D. DD, residente em …, freguesia de …, licença para explorar

  (1) MERCEARIA E CAFÉ no lugar de …, freguesia de …, deste concelho, num prédio pertencente à própria, a confrontar do norte com Proprietário, sul com Proprietário, nascente com MM e poente com Proprietário. Para regular funcionamento do estabelecimento deve o concessionário observar todas as condições estabelecidas na lei, posturas e regulamentos sanitários, especialmente as seguintes:

  (2) - CONDIÇÕES ANEXAS E para que sirva de título, passo o presente alvará que assino e faço autenticar com o selo branco deste Município. Paços do Concelho de Guarda, em 14 de Novembro de 1988. O Presidente da Câmara.».

1.12. DD efetuou com a Câmara Municipal da Guarda/Serviços Municipalizados de Águas e Saneamento um contrato para abastecimento de água e para saneamento das águas residuais relativamente ao imóvel e estabelecimentos comerciais referidos em 1.2, invocando a qualidade de proprietária e possuidora desse imóvel e estabelecimentos.

1.13 DD efetuou com a EDP um contrato para fornecimento de energia elétrica ao mesmo imóvel e estabelecimentos comerciais, invocando a qualidade de proprietária e possuidora desse imóvel e estabelecimentos.

1.14. Foi em nome da DD que até junho de 2001, foram processados e emitidos as faturas/recibos referentes ao consumo de água e eletricidade no imóvel e estabelecimentos referidosconforme alteração da Relação

1.15. Foi em nome da DD que até junho de 2001 foram processados e emitidos todos os documentos referentes à exploração do supermercado e Café FF, nomeadamente notas de encomenda, faturas, recibos e outrosconforme alteração da Relação

1.16. A contabilidade inerente à exploração comercial desses estabelecimentos girou e foi organizada em nome da chamada DD até data não posterior a junho de 2001conforme alteração da Relação

1.17. Eliminado;

1.18. O A. explorou o estabelecimento comercial café “FF”.

1.19. A R. CC explorou, até ao dia 12/10/2011, o referido café “FF”, entrando e saindo no respetivo imóvel, limpando e lavando o respetivo espaço, comprando cafés, bebidas diversas e diversos produtos alimentares e outros produtos, os quais passou a servir aos clientes e público nas mesas e ao balcão, tal como sandes e pequenos petiscos que lá preparava e confecionava, pagando do seu bolso todos os produtos e mercadorias que adquiria para tal fim e recebendo dinheiro dos clientes com que pagava tais produtos, sendo desse dinheiro que pagava as despesas com o seu sustento e o de suas filhas.

1.20. No dia 12/10/2011, uma equipa de inspetores da ASAE – Autoridade de Segurança Alimentar e Económica da Delegação de Castelo Branco - procedeu a uma ação de fiscalização no café FF, a qual no âmbito da mesma exigiu à ré CC o Alvará de Licença Sanitária referente a esse estabelecimento comercial e com a titularidade transferida para seu nome.

1.21. Os inspetores da ASAE ordenaram o imediato encerramento do café “FF” com o fundamento da falta de declaração prévia para mudança de titularidade do Alvará referido, tendo concedido à CC prazo de 10 dias para a apresentar.

1.22. Uma vez que a R. não apresentou tal declaração, a ASAE, em consequência destes factos, instaurou contra a R. CC um processo de contra-ordenação com o NUICO: 964/11.9EACTB no âmbito do qual enviou à R. CC a notificação com a referência n.º S/10144/11/DRC de 11/11/2011, que se junta e cujo teor é o seguinte:

«ASSUNTO: NOTIFICAÇÃO – DIREITO DE AUDIÇÃO E DEFESA DE ARGUIDO NUICO: 964/11.9EACTB

Nos termos e para efeitos do disposto no artigo 50º, do Decreto-Lei n.º433/82, de 27 de Outubro, alterado e republicado pelo Decreto-Lei n.º 244/95, de 14 de Setembro, com as alterações da Lei n.º 109/2001, de 24 de Dezembro relativamente ao processo NUICO acima referido, notifico V.ª Ex.ª de que: NARRAÇÃO DOS FACTOS No dia 12-10-2011 pelas 14.30 horas no estabelecimento bebidas Denominado: Café “FF” Sito na: Rua …, n.º …, 6300-105 … Estava(m) a ser cometida(s) a(s) seguinte(s) infracção(ões) nas seguintes circunstâncias: Na data, hora e local acima referidos, uma equipa de inspectores a exercer funções na ASAE – Delegação Regional de Castelo Branco, procederam a uma acção de fiscalização ao estabelecimento de bebidas, onde estava presente a exploradora, que acompanhou o acto inspectivo. No âmbito da inspecção foi presente o alvará nº 4…/88 emitido pela Câmara Municipal da Guarda em 14/11/1988, concedendo a DD, licença para explorar um estabelecimento de bebidas, sem que a alteração de titularidade fosse efectuada, acrescentando a actual exploradora CC que a proprietária do imóvel ter-se-ia comprometido a efectuar essa alteração e que até á data não o fez. Ficou verbalmente notificada para enviar comprovativo da declaração prévia via fax o que não aconteceu. Contactada telefonicamente a exploradora disse ter-se dirigido á Câmara da Guarda e encontra-se a aguardar a decisão da autarquia para regularização da infracção. Os factos anteriormente descritos, cometidos a título de dolo (porquanto o arguido tendo consciência e sabendo que a prática daqueles factos constituíam infracção, ainda assim não obviou às consequências da mesma, conformando-se com a situação) constitui(em) contra-ordenação(ões) nos termos abaixo indicados. Infracção Falta de declaração prévia para mudança de titularidade da entidade exploradora Previsão Artigo 11º conjugado com o Artigo 1º nº 2 Alínea b) ambos do DL 234/2007 de 19.Junho Punição Artigo 21º nº 1 Alínea b) do DL 234/2007 de 19 de Junho Coima (euros) Mínimo de 300€ Mínimo de 3 000€ (…)»

1.23. Em 24 de novembro de 2011 o mandatário da R. CC, em seu nome e a pedido desta, enviou à DD a carta, cuja cópia se mostra junta a fls. 87-88, sendo o seguinte o teor da carta.

“Exmª. Senhora D. DD Rua …, n.º … 6300-105 … Registada c/AR Guarda, 24 de Novembro de 2011

Exmª. Senhora Escrevo a Vª. Exª. na qualidade de mandatário da Exmª. Srª. D. CC, residente em …, Guarda, a fim de comunicar o seguinte:

1 – Em 13 de Março de 2008 Vª. Exª. cedeu à minha constituinte o estabelecimento comercial de café, denominado “FF” sito na Rua … nº 30, em …, mediante a contrapartida mensal de 150,00 €. 2 – A minha constituinte exigiu a Vª. Exª., por diversas vezes, que lhe transferisse o alvará de utilização do referido estabelecimento comercial o que, como Vª. Exª. sabe, ou tem obrigação de saber, é um procedimento obrigatório sob pena de o estabelecimento poder vir a ser encerrado coercivamente. 3 – Sucede que no dia 11/11/2011 a minha constituinte recebeu o Ofício nº s/10144/11/DRL, (cuja cópia junto) enviado pela ASAE imputando-lhe a prática da contaordenação que lá consta, e prevista no Dec-Lei nº 234/2007 de 19 de Junho, a qual é punível com coima cujo valor mínimo é de 300,00 euros. – Do. nº 1. 4 – Assim e em face do exposto, e atendendo ao facto de a situação ter sido provocada por Vª. Exª., por se recusar, injustificadamente, a transferir o alvará, venho comunicar-lhe e exigir-lhe o seguinte: a) Deverá Vª. Exª. proceder ao reembolso da coima na qual a minha constituinte vier a ser condenada pela ASAE, cujo valor em devido tempo lhe será por mim comunicado. b) Deverá Vª. Exª. imediatamente proceder às diligências e procedimentos necessários, nomeadamente junto da Câmara Municipal da Guarda, para transferir o alvará de utilização do dito estabelecimento para nome da minha constituinte. 5 – Caso Vª. Exª. não proceda conforme exigido no ponto anterior, a minha constituinte irá propor acção judicial contra Vª. Exª. peticionando-lhe o pagamento de todos os avultados prejuízos, materiais e morais, que o encerramento do café lhe vier acarretar. Sem outro assunto de momento, subscrevo-me atenciosamente.

O Advogado.»

1.24. DD respondeu a essa carta através de carta datada de 19/1/2012 cujo conteúdo é o seguinte:

«Ex.mº Senhor DR. NN Advogado Ex.mº Senhor Doutor Serve o presente para lhe responder à sua carta do dia 24 de Novembro de 2011, relativa à D. CC. Não fui eu que cedi o café “FF” à D. CC, porquanto, o café não é meu, mas sim propriedade do meu filho AA, que o construiu e equipou de raiz em terreno que era meu, e com minha autorização. Foi um cunhado do AA (meu genro) que numa altura em que o AA emigrou para Itália e deixou o café fechado mercê da relação de confiança e amizade que tinha com o AA, sem autorização deste, deu a chave do café a uma sobrinha – D.ª CC – para o explorar a título precário, até que o AA lhe pedisse a chave. Não estou por isso na disponibilidade de pagar a coima que a ASAE vier a fixar, nem de proceder à transferência do alvará. Com os melhores cumprimentos.»

1.25. Em resposta, o mandatário da R. CC comunicou à chamada, através da carta registada, que enviou em 10 de Fevereiro de 2012 e aquela recebeu, o seguinte:

«Em resposta à sua carta de 19.01.2012 venho por esta forma dizer-lhe o seguinte:

1 – É completamente falso tudo quanto Vª. Exª. diz na carta a que ora respondo. De facto,

2 - Foi Vª. Exª. quem arrendou verbalmente à minha constituinte, Srª. D. CC, quer o estabelecimento comercial denominado Café FF, quer o imóvel no qual o mesmo está instalado, sendo completamente falso, repito, tudo quanto Vº Exª. diga em contrário.

3 – Reafirmo tudo quanto em nome da minha constituinte afirmei na minha carta de 24.11.2011 que enviei a Vª. Exª.

4 – A presente situação, derivada do facto de a minha constituinte estar impedida de abrir e explorar o referido estabelecimento comercial, está a causar-lhe gravíssimos prejuízos financeiros cujo ressarcimento, e a seu tempo, será exigido aos responsáveis por tal situação. Sem outro assunto de momento.»

1.26. Em janeiro de 2012, os A.A. e DD colocaram um cadeado de ferro no portão de acesso ao logradouro do Café FF a partir da via pública e dessa forma e por tal motivo a ré vê-se impossibilitada de entrar e aceder ao interior desse café.

1.27. O prédio referido em 1.1, no ano de 1989, tinha o valor de € 500,00.

1.28. O valor global da mão-de-obra e dos materiais utilizados para construção do edifício erguido no prédio referido em 1.1. foi superior a € 50.000,00.  

1.29. Para efeito da construção do prédio mencionado em 1.1, DD e marido contrataram um empreiteiro da construção civil a quem adjudicaram a construção do imóvel.

1.30. O qual, no âmbito e em cumprimento desse contrato, executou todas as obras referentes à edificação de tal prédio, incluindo a execução de alicerces, pilares, placas, paredes, portas e janelas, telhado, rebocos, pinturas, instalação elétrica, canalizações e outras.

1.31. Tendo DD e marido pago do seu bolso todos os materiais, mão-de-obra, projetos, licenças necessárias e inerentes à construção de tal prédio;

1.32. Eliminado;

1.33. A partir de 1988/1989 e logo que construíram o imóvel, foi a DD e o marido quem decidiu afetá-lo aos estabelecimentos comerciais indicados em 1.2.

1.34. Foi DD e seu marido quem equipou o supermercado com estantes expositores, prateleiras, balcão frigorífico, caixa registadora e diversos outros equipamentos e bens.

1.35. A chamada DD equipou o café com diverso mobiliário e máquinas até junho de 2001conforme alteração da Relação

1.36. Logo a partir da sua instalação, DD e marido passaram a explorar ambos os estabelecimentos comerciais, supermercado e café, adquirindo produtos alimentares, hortícolas e outros que vendiam ao público no supermercado, até junho de 2001 - neste último segmento, conforme alteração da Relação

1.37. E adquirindo diversas bebidas, cafés, e produtos alimentares diversos, que vendiam ao público no café “FF”, obtendo lucros e rendimentos dessa exploração, os quais faziam seus e gastavam em proveito próprio, o que fizeram até junho de 2001conforme alteração da Relação

1.38. DD contratou os serviços profissionais de um Solicitador, a quem pediu para tratar de toda a documentação necessária a que fosse feita escritura pública para transferência da propriedade do imóvel supermercado e café, a favor da filha OO e marido.

1.39. Após, DD comunicou a OO e marido que já não pretendia transferir-lhes o imóvel, tal como tinham acordado.

1.40. Em data não concretizada do ano de 2008, a chamada DD efetuou um acordo verbal com a R. mulher, CC, através do qual cedeu a esta, quer o imóvel onde se encontrava instalado o estabelecimento comercial do “Café FF”, quer e simultaneamente, a exploração deste mesmo estabelecimento.

1.41. Como contrapartida pela cedência do imóvel e do estabelecimento referido, as partes combinaram o pagamento da quantia mensal de € 150,00 a pagar pela R. CC à DD e marido, tendo de imediato a chamada dado a chave do café à R.

1.42. Não tendo as partes acordado qualquer prazo de duração desse acordo.

1.43. Aquando desse acordo verbal, CC solicitou à DD que ambas efetuassem esse acordo através de documento escrito.

1.44. DD recusou-se a isso, alegando que tal não era necessário, uma vez que ambas eram conhecidas desde sempre, amigas e familiares até e que entre elas não era necessário “contrato escrito” bastando a palavra de ambas.

1.45. Tendo DD dito para a R. CC que não se preocupasse, que não tivesse problemas, porque, enquanto ela, CC, quisesse, poderia sempre explorar o café FF e que, por falta de contrato escrito de arrendamento, DD nunca a “poria fora” e nunca poria fim ao arrendamento.

1.46. A R. CC acreditou e confiou nas palavras da DD.

1.47. Anteriormente a ter iniciado a exploração do café, CC estava desempregada.

1.48. Sabendo DD de tal circunstância, pondo o acordo celebrado termo à situação de desemprego da R.

1.49. Os atos referidos em 1.19 eram à vista de toda a gente, sem oposição de quem quer que fosse, nomeadamente de DD ou dos A.A., na convicção de exercer um direito próprio de arrendatária.

1.50. Aquando da celebração do acordo entre DD e a R., esta pediu àquela para que lhe transferisse para seu nome a titularidade o Alvará de Licença Sanitária nº 4…/88 referente ao café.

1.51. Tendo a DD lhe prometido que iria tratar da transferência do alvará.

1.52. O que até hoje não fez.

1.53. No dia referido em 1.20, a CC pediu à DD que diligenciasse imediatamente quanto à transferência da titularidade do alvará, a fim de que pudesse reabrir o café.

1.54. Jamais a chamada DD e marido cederam aos A.A. o estabelecimento “Café FF”.

1.55. O A. adquiriu e aplicou a telha no telhado do imóvel – conforme alteração da Relação

1.56. Em junho de 2003, o A. aplicou mosaicos no pavimento do estabelecimento conforme alteração da Relação

1.57. No que concerne ao estabelecimento de café-bar, em datas posteriores a julho de 2001, o A. comprou e instalou uma bancada em inox, um balcão frigorífico, um móvel com prateleiras em vidro espelhado, uma vitrina para bolos, um exaustor de fumo do tabaco, três bancos de balcão e seis mesas de inox para a esplanada – conforme alteração da Relação;   

1.58. O A. explorou o estabelecimento comercial de café desde julho de 2001 até data não determinada de 2007 conforme alteração da Relação

1.59. Contratando com fornecedores a aquisição de café em grão, bebidas e outros consumíveis conforme alteração da Relação 

1.60. Obtendo da exploração do estabelecimento os proventos para o seu sustento, o que fez entre julho de 2001 e data não determinada de 2007 conforme alteração da Relação


2. Factos dados como não provados


Foram dados como não provados os seguintes factos:

2.1. No ano de 1989, os chamados cederam ao autor o prédio descrito em 1.1 para nele construir um edifício destinado a comércio.

2.2. Eliminado;

2.3. Com a sua própria mão-de-obra, diária, e, durante todo o tempo que demorou a construção, com mão-de-obra que contratou e pagou, o A. executou as fundações.

2.4. Construiu vigas, pilares, e lajes.

2.5. Construiu as paredes, interiores e exteriores.

2.6. Com placas de “wallmate” e “roofmate” isolou as paredes exteriores e a cobertura.

2.7. Eliminado;

2.8. Eliminado;

2.9. Colocou janelas e portas em alumínio branco lacado e persianas nas aberturas.

2.10. Executou a canalização das águas potáveis e salobras.

2.11. A instalação da eletricidade e do gás.

2.12. As obras foram executadas com conhecimento dos chamados.

2.13. Logo que concluída a construção do imóvel, foi o A. quem decidiu afetá-lo aos dois comércios indicados em 1.2.

2.14. No que concerne ao estabelecimento de café-bar, a denominação “FF” foi dada pelo A. conforme alteração da Relação

2.15. Eliminado

2.16. Eliminado

2.17. Eliminado

2.18. Uma máquina de café de 4 bicos, de marca Cazia.

2.19. Uma máquina de lavar copos.

2.20. Uma máquina de fazer gelo.

2.21. Eliminado

2.22. Uma máquina registadora.

2.23. Uma aparelhagem de som.

2.24. Oito mesas redondas, com base em ferro e tampo em madeira, a imitar o granito.

2.25. Trinta e duas cadeiras do mesmo material.

2.26. Eliminado

2.27. Eliminado

2.28. Chávenas, copos, pratos e talher.

2.29. Instalou aquecimento central completo a gasóleo, composto por caldeira, depósito de combustível e 5 radiadores.

2.30. Aparelhos de ar condicionado.

2.31. Foi-lhe oferecido pela Nestlé uma arca de gelados.

2.32. E pela Delta, um moinho de café.

2.33. Comprou duas mesas de matraquilhos.

2.34. Uma mesa de snooker que colocou no 1.º andar do imóvel, este destinado a sala de jogos.

2.35. Eliminado

2.36. Servindo-os às mesas, ao balcão e na esplanada.

2.37. Eliminado

2.38. Zelando pelas normas de higiene e segurança.

2.39. Eliminado

2.40. Desde 1989, foi sempre o autor quem pagou os impostos relativos aos prédios referidos em 1 e 5).

2.41. Os atos descritos em B) a NN) foram praticados à vista de toda a gente.

2.42. Desde 1989, ininterruptamente.

2.43. Sem oposição de ninguém.

2.44. Agindo o autor como se coisa sua se tratasse.

2.45. Em 1988, os chamados contrataram os serviços profissionais de um técnico da área da engenharia civil, que elaborou o projeto referente à construção, no prédio descrito em 1.1, do edifício onde foi instalado o estabelecimento comercial designado Café FF.

2.46. E o apresentou na Câmara Municipal da Guarda para efeitos de licenciamento administrativo da respetiva construção e emissão dos respetivos alvarás de licença de utilização e alvará sanitário.

2.47. Os chamados pagaram a esse técnico do seu bolso os respetivos honorários e despesas.

2.48. Desde Abril de 1987, quando foi efetuada a escritura pública referida em 1.1, até 22 de dezembro de 2009, quando foi efetuada a escritura pública referida em 1.4, foi sempre a DD e marido que pagaram as contribuições e impostos referentes ao imóvel descrito em 1.1 e 1.5.

2.49. Para adquirir os bens elencados em 1.30 e 1.31, os chamados contraíram empréstimos bancários junto da Caixa Geral de Depósitos e Caixa de Crédito Agrícola Mútuo.

2.50. Foram os chamados que pagaram, e vêm pagando, com dinheiro próprio, as prestações mensais de tais empréstimos.

2.51. A contabilidade dos estabelecimentos comerciais era processada numa empresa de contabilidade contratada por DD.

2.52. Foi sempre DD quem pagou os impostos ao Estado, nomeadamente, IVA, IRS., inerentes e devidos pela exploração do estabelecimento.

2.53. Por volta de 2006 ou 2007, DD e marido deixaram de pagar diversas das prestações mensais dos empréstimos que contraíram para instalar os ditos estabelecimentos comerciais.

2.54. O que levou a que os gerentes dos bancos lhes exigissem os pagamentos em falta, ameaçando-os com processos judiciais.

2.55. Devido a tal situação, DD e marido efetuaram com a sua filha OO e marido desta, PP, um acordo mediante o qual estes pagariam e saldariam todas as dívidas da DD e marido nos referidos bancos e outras dívidas que os mesmos tinham e, em contrapartida, a DD e marido cediam-lhes a propriedade, quer do imóvel, quer do supermercado e do café FF.

2.56. Acordo esse de que os A.A. tiveram conhecimento.

2.57. No âmbito desse acordo, OO e marido PP pagaram ao Banco QQ e com dinheiro próprio, a dívida acumulada de cinco prestações de 200 euros cada, no total de mil euros, de que eram devedores a DD e marido.

2.58. E transferiram a quantia de 18.000,00 euros da conta a prazo para a conta à ordem, com referência à conta nº 0035…16 de que ambos eram titulares na Caixa Geral de Depósitos, agência da ….

2.59. O que fizeram para terem essa quantia disponível para, a todo o momento e logo que o acima referido acordo se concretizasse e formalizasse por escritura pública, procederem ao pagamento das dívidas da DD e marido, conforme o acordado entre eles.

2.60. O referido em 1.39 ocorreu em janeiro ou fevereiro de 2008, tendo por tal motivo DD restituído a OO a quantia referida em DDD).

2.61. Estes factos foram sempre do conhecimento dos autores.

2.62. O descrito em 1.40 ocorreu a 13 de março.

2.63. Foi acordado que a entrega do valor de € 150,00 seria feito em dinheiro ou através de depósito bancário dessa quantia numa conta bancária do Banco QQ – agência da … – de que a chamada é titular, tendo para tal efeito a DD facultado à CC o número dessa conta.

2.64. No seguimento do descrito em 1.44, CC disse a DD que fossem falar com um solicitador ou que fossem ao notário fazer tal contrato por escrito.

2.65. Aquando do relatado em 1.45, DD também referiu não valer a pena gastarem dinheiro em contratos, advogados ou notários.

2.66. A R. CC trabalhava como empregada numa fábrica de têxteis sita na localidade de …, deste Concelho da Guarda, mediante contrato de trabalho a termo o qual não foi renovado pela respetiva entidade patronal findo o respetivo prazo.

2.67. Por tal motivo, em princípios do ano de 2008, a ré CC viu-se na situação de desemprego tendo passado a procurar emprego, uma vez que tinha, e tem duas filhas menores para sustentar, além do seu próprio sustento, vivendo apenas dos rendimentos do seu trabalho.

2.68. Pelo facto de ter feito o acordo mencionado em 1.40 e ss, a R. CC deixou de procurar outros trabalhos e deixou de efetuar outros possíveis arrendamentos de café ou outros estabelecimentos comerciais.

2.69. No dia 13 de março de 2008 e na sequência do acordo atrás referido, a DD entregou à CC uma chave do portão exterior do logradouro do café.

2.70. Foi a partir desse dia que DD passou a praticar os atos descritos em 1.19.

2.71. Desde o mês de Março de 2008 e até ao mês de Abril de 2012 que sempre e ininterruptamente a ré CC pagou à DD a quantia de 150,00 euros referida em 41).

2.72. Que a DD recebeu e continua a receber, que fez suas e gastou em proveito próprio.

2.73. Com exceção de tês ou quatro meses em que aquela quantia foi paga pela CC à DD em mão e em dinheiro, a ré CC sempre fez o seu pagamento através de cheques no valor de 150,00 cada um, emitidos sobre a conta nº 18…01 de que a mesma é titular no Banco RR, agência da …, emitidos à ordem de DD, e depositados na conta do Banco QQ da … de que a DD é titular.

2.74. No verso de cada um desses cheques a ré CC escreveu sempre a declaração: “pagamento da renda do mês de (…) do Café “FF”, referindo em cada uma dessas declarações o mês a que a renda respeitava e após o que depositava o cheque.

2.75. Em Março de 2008 a ré CC exigiu à DD que lhe passasse recibos das rendas.

2.76. Tendo a chamada prometido que o iria fazer.

2.77. No “Café FF” os chamados serviam sandes, diversos petiscos e refeições ligeiras que ali confecionavam.



3. Do mérito da revista


3.1. Quanto à propriedade do estabelecimento comercial em causa

 

Os A.A. alegaram a propriedade do prédio urbano em referência, bem como a do estabelecimento comercial que nele teriam instalado, denominado Café “FF”..

A 1.ª instância, embora reconhecendo o A. como dono e possuidor do referido prédio urbano, denegou a pretensão de reconhecimento, a seu favor, da propriedade do sobredito estabelecimento comercial naquele instalado, por considerar inexistirem factos provados nesse sentido.

Por sua vez, a Relação, em sede da apelação interposta pelos A.A., apesar de ter alterado alguns dos pontos da decisão de facto por eles impugnados, considerou o seguinte:

   «Propriedade do estabelecimento comercial:

  Porfiam, também, os apelantes pela propriedade do estabelecimento comercial instalado no prédio.

  Porém, ficou provado que foram os chamados DD e marido que, construído o imóvel, ali instalaram os dois estabelecimentos comerciais, o café e mercearia, que equiparam e exploraram até Junho de 2001 (33, 34, 35, 36 e 37).

  E que só a partir de Julho de 2001 o autor passou a explorar o estabelecimento comercial de café desde Julho de 2001 até data não determinada de 2007.

  Não ficou provada, pois, qualquer forma de aquisição originária do estabelecimento pelo autor. Nem qualquer aquisição derivada (designadamente por trespasse).

   Provado ficou apenas que o autor explorou o estabelecimento de Julho de 2001 até 2007, que remodelou e beneficiou. Mas essas benfeitorias não o fazem dono do estabelecimento que já existia ou de um novo, por acessão industrial imobiliária.»


   Vem agora os Recorrentes sustentar, em síntese, que: 

 - Atenta a eliminação pelo Tribunal da Relação, do art.º 32.º da matéria de facto, conjugada com a matéria de facto que resultou provada vertida nos pontos 14, 15, 16, 18 e 55 a 60 da matéria dada como provada, resultou que o estabelecimento comercial era, e é, do filho dos chamados, aqui A. AA;

- Estribam-se assim no seguinte factualismo

 a) – o A. encomendou e comprou todos os bens móveis e equipamentos que compõem e integram hoje o estabelecimento comercial: uma bancada em inox, um balcão frigorífico; um móvel com prateleiras em vidro espelhado; uma vitrina para bolos; um exaustor de fumo do tabaco; três bancos de balcão; seis mesas de inox para a esplanada;

  b) - explorou-o, prestando serviços de venda de bebidas e de cafetaria a clientes e amigos,

 c) - contratando com fornecedores a aquisição de café em grão, bebidas e outros consumíveis,

  d) - explorou o estabelecimento dele fazendo a sua fonte de rendimento e subsistência.

 e) - Encomendou o telhado e mandou colocá-lo e, bem assim, aplicou mosaicos no pavimento do estabelecimento;

  f) - tinha horário de trabalho comunicado e aprovado pelo IDICT a fls... dos autos;

  g) - pagava os respetivos impostos, incluindo IVA, como explorador do estabelecimento comercial em causa;

  h) - Desde 2001 que, foram processados e emitidos em nome do A., as faturas/recibos referentes à água e à eletricidade que consumia e, bem assim, todos os documentos referentes à exploração do café, nomeadamente notas de encomenda, faturas, recibos.

 i) - Tudo isto, fazendo na convicção de ser o proprietário do estabelecimento e nunca atuando “com expresso consentimento e autorização dos seus pais, na convicção de que os seus pais, e não ele e esposa, eram os proprietários.

- Daí que o universo de bens móveis comprados pelo A. e inseridos no interior do imóvel, associado à atividade que tais bens permitiam desenvolver ao A., a inscrição de início e o prosseguimento de atividade código 52112, em que se encontrava inscrito no Serviço de Finanças da Guarda, integram o conceito jurídico de estabelecimento comercial, o qual é pertença do A.;

- O Tribunal “a quo” fez errada aplicação do direito aos factos, pelo que devem os AA. ser declarados donos legítimos possuidores do estabelecimento comercial de café "FF"', com todas as legais consequências.


    Vejamos. 


   Está aqui apenas em causa a questão da pretensa titularidade sobre a propriedade do estabelecimento comercial, Café “FF”, que os A.A. se arrogam.

    Não foi sequer posta em causa pelas partes nem pelas instâncias a natureza jurídica do estabelecimento comercial nem a suscetibilidade de constituir objeto de posse e de reivindicação, tal como, de resto, vem equacionado, em sede de enquadramento jurídico, na sentença da 1.ª instância.

    De todo o modo, dir-se-á que, apesar de toda a problematização doutrinária sobre a caracterização do estabelecimento comercial, se afigura consensual que o estabelecimento comercial se consubstancia num complexo de elementos heterogéneos, corpóreos e incorpóreos, integrados numa organização dinâmica destinada ao exercício de uma atividade económica comercial.


    Assim, segundo FERRER CORREIA[1]:

«[…] na sua acepção mais lata e em sentido objectivo, estabelecimento comercial vem significar o mesmo que o complexo da organização comercial do comerciante, o seu negócio em movimento ou apto para entrar em movimento.

Tal organização versa, antes de mais nada, sobre um conjunto de bens de variada natureza: coisas corpóreas, móveis ou imóveis – dinheiro, títulos de crédito, mercadorias, máquinas, mobiliário, prédios – e incorpóreas ou imateriais: patentes de invenção, modelos e desenhos industriais, marcas, o nome ou insígnia do estabelecimento, a própria firma, os próprios direitos ou relações jurídicas como instrumentos do exercício do comércio. De resto, esses bens podem não pertencer em propriedade ao titular do mesmo estabelecimento: o que importa é que ele os possa utilizar (e tenha nessa medida a sua disponibilidade) para os fins da empresa.

Em segundo lugar, o estabelecimento é, normalmente, uma organização de serviços ou de pessoas. (…) Sem esse elemento pessoal, a empresa não poderia funcionar.

Por último, como elementos necessários à vitalidade da empresa, há que aludir ainda, de um lado, “às relações com os fornecedores e os bancos, donde afluem as matérias primas e os capitais, do outro, às relações com a clientela que lhes absorve os produtos” (…). São essas relações de facto com valor económico (…) uma das manifestações mais relevantes da empresa organizada e um dos índices mais salientes da sua capacidade lucrativa, do seu aviamento»

   No mesmo sentido, ORLANDO DE CARVALHO[2] define o estabelecimento comercial ou industrial como:

«uma organização concreta de factores produtivos com valor de posição no mercado, organização, portanto, que, concreta como é, exige um complexo de elementos ou meios em que a mesma radica e que a tornam reconhecível.»       

    Também FERNANDO OLAVO[3] considera como estabelecimento comercial:

«Um conjunto de coisas corpóreas e incorpóreas, de bens e serviços, organizados pelo comerciante com vista ao exercício da sua actividade mercantil, se sorte que, em última análise, o que o compõe são os elementos aptos para o desempenho da actividade do comerciante e que este agregou e organizou para a realização de tal empresa.» 


    E quanto à natureza jurídica do estabelecimento comercial, a opinião corrente dos Autores é de que se trata não de uma mera universalidade de facto, técnica ou económica, mas de uma universalidade de direito, como tal suscetível de ser objeto de relações jurídicas.


     Nas palavras de FERRER CORREIA[4]:

 «[…] é como verdadeira unidade jurídica, e não apenas como unidade económica, que o estabelecimento comercial deve ser concebido. O direito não se limita a ver as coisas em singular: vê o conjunto, o todo – como algo de distinto da mera pluralidade das partes componentes.» 

         

    Embora nem todos os Autores estejam de acordo quanto a saber se, por exemplo, o aviamento ou o direito à clientela integram o estabelecimento, parece haver um largo consenso doutrinário no sentido de que o estabelecimento comercial como universalidade de direito é passível de posse, de usucapião e de reivindicação da propriedade, mesmo sem o restringir aos simples objetos corpóreos.[5] 

     

   Na mesma linha, no acórdão do STJ, de 05/07/2001, proferido no processo 02B538[6], foi considerado, sumariamente, que: 

  «I - O estabelecimento comercial envolve um conceito normativo, cuja identidade se revela através da funcionalidade económica e destino comercial, industrial ou agrícola, de prestação de serviço, ou outro fim empresarial lícito como objecto negocial de livre circulabilidade como individualidade de direito, e diferente da soma atomística das partes dos seus valores componentes.

 II – Não é essencial que a organização comercial esteja em movimento, essencial é que a estrutura organizativa esteja potencialmente apta ou vocacionada à funcionalidade e ao destino.»


    Tais considerações são quanto basta para considerar o estabelecimento comercial Café “FF”, aqui sob reivindicação, passível de aquisição possessória e de aquisição dominial nas suas múltiplas formas aquisitivas.

        

    Ora, em sede do fenómeno possessório, nos termos do artigo 1263.º do CC, a posse pode ser adquirida, no que aqui releva, por via originária traduzida seja em prática reiterada, com publicidade, de atos materiais correspondentes ao exercício do direito (alínea a), seja por inversão do título da posse (alínea d); ou por via derivada mediante tradição material ou simbólica da coisa, efetuada pelo anterior possuidor (alínea b).

     Em caso de tradição da coisa pelo anterior possuidor, presume-se iuris tantum que a posse continua em nome de quem a começou, como estabelece o artigo 1257.º, n.º 2, do CC.

    Por sua vez, o artigo 1252.º, n.º 2, do mesmo Código dispõe que:

   Em caso de dúvida, presume-se que a posse naquele que exerce o poder de facto, sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo 12523.º.

     Na conjugação destes dois normativos, importa ter presente o ensinamento de PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA[7], segundo o qual:

«O n.º 2 estabelece uma presunção de posse em nome próprio por parte daquele que exerce o poder de facto, ou seja, daquele que tem a detenção da coisa (corpus), salvo se não foi o iniciador da posse (referência ao n.º 2 do artigo 1257.º).»   

    Por fim, quanto à inversão do título de posse, o artigo 1265.º prescreve que:

«A inversão do título de posse pode dar-se por oposição do detentor do direito contra aquele em cujo nome possuía ou por ato de terceiro capaz de transferir a posse.


   Perante este quadro normativo, regressemos ao caso dos autos.


Antes de mais, convém lembrar que os A.A. alegaram, na petição inicial, em síntese, que:

 - o referido prédio acima identificado lhes foi cedido, em 1989, pelos pais do A. para construção de um edifício destinado a comércio, o qual veio a ser construído pelo A., a expensas suas, tendo ainda adquirido os bens que compõem o respetivo recheio;

 - o A. está na posse do mesmo há mais de 30 anos, de forma pública, sem oposição de ninguém e agindo como seu proprietário;

 - O edifício comporta um café e um mini-mercado, ambos explorados pelo A., ininterruptamente, durante 17 anos, tendo depois o café sido encerrado.


Porém, da factualidade dada como provada resulta que:

i) - A partir de 1988/1989 e logo que construíram o imóvel, foram os chamados DD e marido quem decidiu afetá-lo aos estabelecimentos comerciais indicados em 1.2 – ponto 1.33;

ii) - Foi a chamada DD e seu marido quem equipou o supermercado com estantes expositores, prateleiras, balcão frigorífico, caixa registadora e diversos outros equipamentos e bens – ponto 1.34;

iii) - A chamada DD equipou o café com diverso mobiliário e máquinas até junho de 2001 - ponto 1.35;

iv) - A chamada DD assinou toda a documentação necessária e integrante do processo administrativo apresentado na Câmara Municipal da Guarda para efeitos de licenciamento administrativo da respetiva construção e emissão dos respetivos alvarás de licença de utilização e alvará sanitário do estabelecimento comercial designado “Café FF”, invocando a qualidade de proprietária e possuidora do imóvel em questão - ponto 1.8;

v) - No âmbito desse procedimento administrativo a Câmara Municipal da Guarda emitiu um alvará de licença de construção do prédio urbano em questão, o que fez em nome da chamada DD - ponto 1.9;

vi) - A Câmara Municipal da Guarda emitiu um alvará de licença de utilização do referido prédio urbano, tendo ficado como titular do mesmo a ora chamada DD - ponto 1.10;

vii) - DD, invocando a qualidade de proprietária do imóvel e dos estabelecimentos de mercearia e café, requereu na Câmara Municipal da Guarda que fosse emitido a seu favor, e em seu nome, alvará de licença sanitária para exploração dos estabelecimentos comerciais indicados em 1.2, tendo a Câmara Municipal da Guarda, em 14 de novembro de 1988, emitido a favor daquela o Alvará de Licença Sanitária nº 4…/88 - ponto 1.11;

viii) - DD efetuou com a Câmara Municipal da Guarda/Serviços Municipalizados de Águas e Saneamento um contrato para abastecimento de água e para saneamento das águas residuais relativamente ao imóvel e estabelecimentos comerciais referidos em 1.2, invocando a qualidade de proprietária e possuidora desse imóvel e estabelecimentos - ponto 1.12;

ix) - DD efetuou com a EDP um contrato para fornecimento de energia elétrica ao mesmo imóvel e estabelecimentos comerciais, invocando a qualidade de proprietária e possuidora desse imóvel e estabelecimentos - ponto 1.13

x) - Foi em nome da DD que até junho de 2001, foram processados e emitidos as faturas/recibos referentes ao consumo de água e eletricidade no imóvel e estabelecimentos referidos - ponto 1.14, conforme alteração da Relação

xi) - Foi em nome da DD que até Junho de 2001 foram processados e emitidos todos os documentos referentes à exploração do supermercado e Café FF, nomeadamente notas de encomenda, faturas, recibos e outros –  ponto 1.15; conforme alteração da Relação

xii) - A contabilidade inerente à exploração comercial desses estabelecimentos girou e foi organizada em nome da chamada DD até data não posterior a junho de 2001ponto 1.16, conforme alteração da Relação

xiii) - Logo a partir da sua instalação, DD e marido passaram a explorar ambos os estabelecimentos comerciais, supermercado e café, adquirindo produtos alimentares, hortícolas e outros que vendiam ao público no supermercado, até junho de 2001ponto 1.36;  

xiv) - E adquirindo diversas bebidas, cafés, e produtos alimentares diversos, que vendiam ao público no café FF, obtendo lucros e rendimentos dessa exploração, os quais faziam seus e gastavam em proveito próprio, o que fizeram até Junho de 2001 – ponto 1.37;

xv) - Foi em nome da chamada DD que até junho de 2001, foram processados e emitidos as faturas/recibos referentes ao consumo de água e eletricidade no imóvel e estabelecimentos referidos – ponto 1.14;

xvi) - Foi em nome da mesma DD que até junho de 2001 foram processados e emitidos todos os documentos referentes à exploração do supermercado e Café FF, nomeadamente notas de encomenda, faturas, recibos e outros – ponto 1.15.

xvii) - A contabilidade inerente à exploração comercial desses estabelecimentos girou e foi organizada em nome da chamada DD até data não posterior a junho de 2001 - ponto 1.16.


   Deste acervo factual extrai-se, claramente, que não foi o aqui A. marido mas sim que foram os seus pais, ora chamados, quem instalou e iniciou a exploração do estabelecimento comercial, denominado Café “FF”, tendo prosseguido nessa exploração até junho de 2001.

      Acresce que o prédio urbano onde se encontra instalado aquele estabelecimento só foi doado pelos ora chamados ao seu filho, aqui A. marido, com reserva de usufruto dos doadores, por escritura outorgada em 22/12/ 2009 (ponto 1.4 da factualidade provada), usufruto a que os mesmos chamados vieram a renunciar por escritura de 30/12/2011 (ponto 1.7).

     É certo que se encontra provado que o A. marido explorou o referido estabelecimento desde julho de 2001 (pontos 1.57 a 1.60 da factualidade provada) até data indeterminada de 2007, quando ainda nem sequer era proprietário do prédio ajuizado, não se apurando a que título exerceu tal exploração.

    Mas o que não sofre dúvida é que os chamados não transferiram para o A. o sobredito estabelecimento a título de alienação definitiva, como bem se alcança do ponto 1.4 da factualidade provada, donde consta que jamais a chamada DD e marido cederam aos A.A. o estabelecimento “Café FF”.

     De tudo isso é lícito concluir, com segurança, que os A.A. não figuram nem como iniciadores da posse do estabelecimento em causa, nos termos e para os efeitos do artigo 1252.º, n.º 2, do CC, nem sequer como adquirentes da posse, por aquisição derivada, dos chamados, nos termos dos artigos 1257.º, n.º 2, e 1263.º, alínea b), do mesmo diploma.

        

     Pretendem, ainda assim, os Recorrentes alicerçar a sua posse na factualidade resultante da “eliminação” do ponto 32 da decisão de facto constante da sentença e na alteração da matéria de facto vertida nos pontos 1.55 a 1.60 acima consignados, introduzidas pela Relação

Do ponto 32 dado por “eliminado” constava que:

Sempre que o autor explorou o estabelecimento e ocupou o imóvel fê-lo com o expresso consentimento e autorização dos seus pais, na convicção de que os seus pais, e não ele e esposa, eram os proprietários de tal imóvel.  

Por sua vez, os pontos alterados passaram a ter o seguinte teor:      

 i) - O A. adquiriu e aplicou a telha no telhado do imóvel - ponto 1.55;  

 ii) - Em junho de 2003 o A. aplicou mosaicos no pavimento do estabelecimento – ponto 156;

 iii) - No que concerne ao estabelecimento de café-bar, em datas posteriores a julho de 2001, o A. comprou e instalou uma bancada em inox, um balcão frigorífico, um móvel com prateleiras em vidro espelhado, uma vitrina para bolos, um exaustor de fumo do tabaco, três bancos de balcão e seis mesas de inox para a esplanada – ponto 1.57

 iv) - O A. explorou o estabelecimento comercial de café desde julho de 2001 até data não determinada de 2007 – ponto 1.58;

v) - Contratando com fornecedores a aquisição de café em grão, bebidas e outros consumíveisponto 1.59;  

vi) - Obtendo da exploração do estabelecimento os proventos para o seu sustento, o que fez entre Julho de 2001 e data não determinada de 2007 – ponto 1.60.


Ora, como resulta do acima exposto, a propriedade do estabelecimento comercial, enquanto universalidade de direito, não se afere em função de um ou outro elemento integrativo, mas em referência ao conjunto organizado, tanto mais que podem alguns desses elementos não pertencer em propriedade ao titular do mesmo estabelecimento, bastando que ele os possa utilizar ou ter a respetiva disponibilidade para os fins da empresa.

Sucede que os atos em destaque são perfeitamente compatíveis, por exemplo, com uma cedência temporária da exploração do estabelecimento, não implicando, necessariamente, uma posse do estabelecimento em nome próprio.

Seja como for, o certo é que a factualidade provada, conjugada com os factos dados como não provados, não consubstancia, minimamente, qualquer materialidade que integre o corpus e animus de uma posse exercida pelo A. marido em nome próprio sobre o referido estabelecimento, como universalidade jurídica, quer em termos de prática reiterada, quer como aquisição derivada da posse; nem tão pouco com uma situação que seja subsumível à aquisição originária da inversão do título de posse ou a aquisição dessa propriedade por via de acessão.       

Como, aliás, bem se refere no acórdão recorrido, ficou apenas provado, em síntese, que “o autor explorou o estabelecimento de julho de 2001 até 2007, que remodelou e beneficiou. Mas essas benfeitorias não o fazem dono do estabelecimento que já existia ou de um novo, por acessão industrial imobiliária.»      

Assim sendo, sem necessidade de mais considerações, conclui-se pela improcedência, neste particular, as razões invocadas pelos A.A.


3.2. Quanto à condenação dos A.A. como litigantes de má fé


Os A.A. foram condenados, em 1.ª instância, numa multa equivalente a € 6 UC, como litigantes de má fé.

Essa condenação foi mantida pela Relação ainda que com base em fundamentação diversa.

Neste capítulo, no acórdão recorrido, foi considerado o seguinte:

   «Litigância de má fé:

   O tribunal condenou os autores como litigantes de má fé a pagarem uma multa processual no valor equivalente a 6 UCs e no valor indemnizatório que viesse a ser fixado nos termos previstos no n.º 3 do art. 543 do CPC.

   Pugnam os apelantes pela revogação da decisão.

   Porém, não podem proceder os fundamentos que invocam para pedir essa revogação. Com efeito, não se provou que o autor tivesse actuado sempre com o animus de proprietário quer do imóvel quer do estabelecimento comercial, nem que, quando a ré foi explorar o café a título precário, ela o tivesse feito por ordem do cunhado do A.. Nem é pelo facto de serem proprietários do imóvel e terem recorrido à acção para obter a entrega do café que ficam isentos de qualquer reprovação.

   A sentença censurou o facto de o autor ter alegado o que alegou por ter actuado não com animus de proprietário mas de utilização consentida pelos seus pais, tendo, ainda, omitido na sua alegação a exploração legítima do café pela ré, quando se provou que a ré explorou o café até 12.10.2011.

   É verdade que não se provou que o autor tenha explorado o estabelecimento com o consentimento e autorização dos pais na convicção de que estes é que eram proprietários do imóvel. Nem parece que o autor tenha omitido a ocupação do café pela ré (não se podendo asseverar que tivesse consciência de que a exploração do café era legítima).

   Não obstante, os autores alegaram, falsamente, que os chamados cederam ao autor o prédio para nele construir um edifício destinado a comércio e que o autor construiu tal edifício e ali instalou os estabelecimentos de café e de mercearia, pois tal matéria está em contradição com a matéria de facto provada (cfr. alíneas A), a G) dos factos não provados e factos 28 a 31, 33, 34, 36, 37).

 Como assim, deve manter-se a condenação dos autores como litigantes de má fé.»


      Ora o comportamento dos A.A. aqui destacado pela Relação afigura-se censurável, em face da factualidade inequívoca de que foram os ora chamados, pais do A., que instalaram o estabelecimento em causa e que o prédio urbano em referência só foi doado ao A. marido em 2009, factos estes que os A.A. não podiam ignorar.

Acresce ainda terem os A.A. alegado, sob o artigo 2.º da petição inicial, de forma que se afigura obscura, que «cerca do ano de 1989, os pais cederam-lhe [ao A. marido] o rústico atrás descrito (…)», não especificando sequer o tipo e a forma de tal “cedência”. E note-se que foi este o esteio em que os A.A. assentaram então a sua tese sobre a posse usucapível do prédio e do estabelecimento reivindicados.   

     Assim, não se pode deixar de qualificar aquele comportamento como omissivo e deformador de factos nucleares para a decisão da causa, imputável aos A.A., pelo menos a título de negligência grave, nos termos do artigo 542.º, n.º 1, e 2, alínea b), do CPC e do artigo 27.º, n.º 3, do RCP, não se mostrando desproporcionado o montante que foi fixado.   

     Termos em que também aqui improcedem as razões dos Recorrentes.


IV – Decisão


Pelo exposto, acorda-se em negar a revista, confirmando-se a decisão recorrida.

As custas do recurso ficam a cargo dos Recorrentes.  


Lisboa, 22 de fevereiro de 2018


Manuel Tomé Soares Gomes (Relator)

Maria da Graça Trigo

Maria Rosa Tching

___________


[1] In Lições de Direito Comercial, Vol. I, Universidade de Coimbra, 1973, p201-203, e estudo intitulado Reivindicação do estabelecimento comercial como unidade jurídica, in Estudos de Direito Civil Comercial e Criminal, Almedina, Coimbra, 1985, pp. 255 e segs. (255-256).     
[2] In Direito das Coisas, Coimbra, 1977, p. 196.
[3] In Direito Comercial, Vol. I, 2.ª Edição (reimpressão), 1974, p. 262.
[4] In Estudos de Direito Civil Comercial e Criminal, Almedina, Coimbra, 1985, p. 262.
[5] Vide neste sentido, entre outros, FERRER CORREIA, loc. cit. p. 263; ORLANDO DE CARVALHO, Direito das Coisas, Coimbra Editora, 2012, p 272; MENEZES CORDEIRO, Manual de Direito Comercial, I Vol. Almedina, 2001, p. 255; GRAVATO MORAIS, Alienação e Oneração de Estabelecimento Comercial, Almedina, 2005, pp. 70-76.    
[6] Relatado pelo Juiz Cons. Neves Ribeiro, acessível na Internet – http:www.dgsi.pt.jstj.
[7] In Código Civil Anotado, Vol. III, Coimbra Editora, 2.ª Edição, 1987, p. 8, nota 2.