Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
03B1361
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: MOITINHO DE ALMEIDA
Descritores: REVISÃO DE SENTENÇA ESTRANGEIRA
ALIMENTOS
ALEGAÇÕES
FALTA
DESERÇÃO DE RECURSO
Nº do Documento: SJ200305150013612
Data do Acordão: 05/15/2003
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: AGRAVO.
Sumário : As acções de alimentos caem no âmbito da Convenção de Bruxelas relativa à Competência Judiciária e à Execução em Matéria Civil e Comercial, não constituindo fundamento de recusa da revisão o previsto no n°2 do artigo 1100° do Código de Processo Civil.
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

1. "A", requereu contra B e ao abrigo do disposto nos artigos 1094° e seguintes, do Código de Processo Civil, a revisão da sentença de 30 de Maio de 2001, proferida pelo Tribunal de Grande Instância de Creteil, França, que decretou o divórcio do casamento entre ambos celebrado, em 8 de Agosto de 1981 , condenou o Requerido a pagar à Requerente uma "prestação compensatória" de 17 53164€, e regulou o poder paternal, relativamente à menor C, filha do casal , estabelecendo em 304,89 a pensão de alimentos a cargo do pai.

Por acórdão de 30 de Outubro de 2002, a acção foi julgada procedente.

Inconformado, recorreu B para este Tribunal, concluindo as alegações da sua revista nos seguintes termos:

1. A requerente foi notificada no âmbito da acção de revisão e confirmação de sentença estrangeira para apresentar alegações, não o tendo feito, pelo que o seu pedido, como recurso a conhecer, deve ser considerado deserto e improcedente (n°3 do art°690° por remissão do n°2 do art°1099°, ambos do C.P.C.);

2. A requerente no seu requerimento inicial pediu que fosse revista e confirmada a sentença proferida em 30/05/2001 pelo Tribunal de Grande Instância de Creteil-Rep. Francesa, que decretou o divórcio com culpa do requerido.

3. O requerido opôs-se à confirmação da sentença, por nela não constarem os factos concretos que constituem a causa do divórcio e

4. Alegou ainda ser cidadão português (art.5° e 10° da oposição) e que o resultado da acção lhe teria sido mais favorável se o tribunal estrangeiro tivesse aplicado o direito material português (arts.10° e 11° da oposição).

5. Estes factos alegados pelo requerido constituem fundamentos de impugnação do pedido de revisão e confirmação de sentença estrangeira, constantes do art.1100° n°2 do C.P.C.

6.Tendo o requerido, vencido na acção francesa, a nacionalidade portuguesa (tal como a requerente, ambos tendo casado em Portugal), deveria o tribunal estrangeiro ter resolvido a questão segundo normas de conflitos portuguesas; sendo certo que as pensões de alimentos em Portugal são pagas em mensalidades e não de uma só vez, pelo que o resultado da acção sempre seria mais favorável ao requerido se o tribunal estrangeiro tivesse aplicado o direito material português.

7. Existiam assim fundamentos de impugnação à confirmação da sentença estrangeira pelos tribunais portugueses, os quais foram alegados e que teriam como consequência a não confirmação da mesma;

8. O douto Acórdão recorrido, ao dizer que "o requerido opôs-se à confirmação da sentença por nela não constarem os factos concretos que constituem a causa do divórcio..." peca por defeito na transposição das razões de direito alegadas pelo requerido.

9. O douto Acórdão recorrido não se debruçou sobre os fundamentos de impugnação alegados pelo requerido, nomeadamente a nacionalidade portuguesa do vencido na acção revista e o facto de o resultado da acção ter sido mais favorável ao requerido se o tribunal estrangeiro tivesse aplicado o direito material português;

10. Toda a motivação decisória do Acórdão recorrido é feita apenas por referência expressa ao art°1096° do C.P.C. omitindo o art.1100° n°2 do C.P.C., invocado pelo recorrente.

11. Ao não se pronunciar sobre as razões e argumentos de direito em que o requerido funda a sua oposição na controvérsia e sobre as quais se devia pronunciar o douto Acórdão recorrido comete a nulidade prevista no art.668° n°1 d) do C.P.C.

12. O douto Acórdão recorrido violou o n°3 do art.690°, o n°2 do art.1099°, o n°2 do art;1100°, todos do C.P.C. bem como a alínea d) do art.668° do C.C.

2. São as seguintes as questões suscitadas no presente recurso: a acção devia ter sido considerada extinta, por falta de alegações da requerente (artigos 1099°, n°1 e 690°, n°3, do Código de Processo Civil) (1), violação do disposto no artigo 1100°, n° 2, do mesmo Código (2).

2.1 Falta de alegações da Requerente (artigo 1099°, n°1 do Código de Processo Civil).

A este respeito importa observar que a revisão de sentença estrangeira não é um recurso, mas processo especial a que só quanto ao julgamento são aplicáveis as regras próprias do agravo (artigo 1009°, n°2). Daí ser inaplicável o disposto no artigo 690°, n°3 que prevê a deserção do recurso por falta de alegações.

Observe-se ainda que durante o processo o Recorrente nenhuma objecção apresentou quanto à mencionada falta de alegações.

2.2. Violação do disposto no artigo 1100°, n°2 do Código de Processo Civil.

Pretende o Recorrente que se a causa fosse julgada segundo o direito português aplicável a decisão lhe teria sido mais favorável. E menciona a este respeito a condenação a uma prestação alimentar única.

Quanto a este ponto basta observar que na parte relativa aos alimentos é aplicável à revisão da sentença em causa a Convenção de Bruxelas relativa à Competência Judiciária e à Execução em Matéria Civil e Comercial (Diário da República I Série, de 30 de Outubro de 1991). Com efeito, o Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias vem entendendo que a matéria de alimentos se enquadra na noção de "matéria civil", no sentido do artigo 1° da Convenção (ver, entre outros, o acórdão de 6 de Março de 1980, no caso 120/79, Louise Cavel, RJC, 1980-3, p.731).

Ora, o fundamento de recusa de revisão previsto no n°2 do artigo 1100° do Código de Processo Civil, não está incluído nos fundamentos do não reconhecimento que o artigo 27° da Convenção estabelece.

Quanto ao mais remete-se para o acórdão recorrido (artigo 713°, n°5, do Código de Processo Civil).

Termos em que se nega provimento ao agravo.

Custas pelo Recorrente.

Lisboa, 15 de Maio de 2003

Moitinho de Almeida

Ferreira de Almeida

Abílio Vasconcelos