Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
8/16.4YFLSB
Nº Convencional: SECÇÃO DO CONTENCIOSO
Relator: GABRIEL CATARINO
Descritores: SUSPENSÃO DA EFICÁCIA DO ACTO
PERICULUM IN MORA
FUMUS BONI JURIS
DELIBERAÇÃO DO CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA
PLENÁRIO
CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA
VENCIMENTO
REQUISITOS
JUIZ
PREJUÍZO DE DIFÍCIL REPARAÇÃO
APOSENTAÇÃO COMPULSIVA
Data do Acordão: 03/31/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO CONTENCIOSO
Decisão: INDEFERIDA A PROVIDÊNCIA REQUERIDA
Área Temática:
DIREITO ADMINISTRATIVO - PROCESSO ADMINISTRATIVO - PROCESSOS URGENTES / PROCESSOS CAUTELARES.
ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA - ESTATUTOS PROFISSIONAIS / MAGISTRADOS JUDICIAIS.
Doutrina:
- Aroso de Almeida e Fernandes Cadilha, citados no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 30-10-2014.
- Luís Medina Alcoz, “Hacia una nueva teoria general de la causalidade en la responsabilidad civil contractual (y extracontractual): La doctrina de la pérdida de oportunidades”, Associación Española de Abogados Especializados en Reponsabilidad Civil y Seguros, n.º 30, Segundo semestre, 2009, 52-54.
- Pedro Gonçalves, “Apontamentos sobre a função e a natureza dos pareceres vinculantes", Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 0, 6 a 11.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO (CPA): - ARTIGO 148.º.
CÓDIGO DE PROCESSO NOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS (CPTA): - ARTIGOS 112.º, Nº 2 AL. A), 120.º, N.ºS 1 E 2.
ESTATUTO DOS MAGISTRADOS JUDICIAIS (EMJ) - LEI N.º 21/85, DE 30 DE JULHO: - ARTIGO 170.º, N.º1.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO:

-DE 10.10.2002, PROCESSO Nº 0135/02, DE 18.12.2002, PROCESSO Nº 01869/02 E DE 26.11.2003, PROCESSO Nº 01745/03.

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ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

-DE 10.10.2002 E DE 29 DE AGOSTO DE 2001.
-DE 10.11.2011, REFERENTE AO PROCESSO Nº 106/11.0YFLSB, TODOS DISPONÍVEIS EM WWW.DGSI.PT.
-DE 3.4.2003, NO PROC. N.º 03373, EM WWW.DGSI.PT .
Sumário :

I - As providências requeridas para evitar a execução de actos administrativos, poderão ser adoptadas, desde que, cumulativamente, seja possível configurar a possibilidade um fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal e que seja provável que a pretensão a formular nesse processo venha a ser julgada procedente (art. 120.º, n.º 1, do CPTA).
II - Para avaliar a probabilidade de sucesso da causa principal, não é desapropriado lançar mão do raciocínio empregue nos casos de perda de oportunidade por ineficiente desempenho do mandato forense, já que, em ambos os casos, uma parte do exercício e iter lógico-analítico do razoamento conecta-se ou inere-se numa relação de prognose probabilística.
III - Assim, só quando ocorrer uma séria e competente probabilidade de, segundo as regras de prognose analítica, no plano jurídico, o sujeito processual vir a obter êxito no procedimento judicial que intente é que se poderá colocar a possibilidade de vir a colher um beneficio ou uma vantagem susceptível de lhe conferir uma perspectiva sólida e consolidada de ver o seu direito ser acolhido e reconhecido na mundividência jurisdicional e, assim, poder vir a ter sucesso na providência que intentou para acautelar a tutela do direito peticionado, o que implica que, sem imiscuição no processo de ajuizamento do decisor futuro, se antolhe a perspectiva decisória do ente que irá decidir, no qua há a incoar o fim do recurso que se pretende interpor.
IV - Não se antevendo que exista uma probabilidade séria de o recorrente obter ganho de causa que propicie ao requerente a conservação da utilidade da decisão, é de concluir pela inexistência do aludido requisito.
V- A privação do vencimento é susceptível de ser ressarcível pelo que não coloca o recorrente numa situação de difícil reparação, sendo que a inerente diminuição do nível de vida não é compaginável com o perigar da satisfação das suas necessidades básicas.
Decisão Texto Integral:

I. – Relatório.

AA, Juiz de Direito, requer, ao abrigo dos artigos 168º e segs. do EMJ e 112º e segs. do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), a suspensão da deliberação do Plenário do Conselho Superior da Magistratura, de 21.12.2015, que decidiram: i) – Rejeitar as por si requeridas diligências instrutórias; ii) – Julgar improcedentes as questões suscitadas de prescrição do procedimento disciplinar e de caducidade do direito de instauração do mesmo e de tempestividade da defesa apresentada; iii) – Indeferir a arguição do impedimento em relação aos Senhores Vogais Drs. BB, CC, DD e EE; iv) – Aplicar a pena disciplinar de demissão, ao abrigo do disposto no artigo 95º, nº 1, alíneas a) e c), do Estatuto dos Magistrados Judiciais (EMJ), aprovado em anexo à Lei nº 21/85, de 30 de Julho, com o sequente suporte factual (sic):

“Em 11.02.2014 por deliberação do Conselho Permanente do CSM, na sequência de expediente remetido respeitante a atrasos processuais no Tribunal Judicial de ... foi deliberado instaurar inquérito a toda a atuação funcional do Requerente, cfr. deliberação junta com o p.a. a remeter pelo Requerido.

- Concluída a instrução do inquérito, foi deliberado em 20.05.2014 pelo Conselho Permanente do CSM a instauração de um procedimento disciplinar (ao qual foi atribuído o nº 2014-290/PD), bem como a inspeção extraordinária ao serviço prestado pelo Requerente desde 01.09.2012.

- No âmbito do referido procedimento disciplinar, em sede de Relatório Final, o Senhor Inspetor nomeado propôs o seguinte:
“a) O arquivamento dos autos quanto aos atrasos verificados nos processos discriminados no ponto 7 da acusação sob os números de ordem 1 a 5 a 25, 28, 33 a 35,37, 48, 52 a 55, 58 e 59, 61, 63 a 70 e 77.

b) Que aos demais factos provados, seja atribuída a relevância jurídico-disciplinar constante de supra nº IV.

c) Que o arguido seja punido com a pena de 120 (cento e vinte) dias de suspensão de exercício.” - (cf. relatório junto com o p.a. a juntar pelo Requerido)

- O referido relatório foi apreciado pelo Conselho Permanente que deliberou, em 10.02.2015, “concordar com a proposta do Exmo. Sr. Vogal Relator, Juiz Desembargador FF, que aqui se dá por integralmente reproduzida: “propõe-se ao Conselho Permanente do Conselho Superior da Magistratura que determine a remessa destes autos para apreciação conjunta com os autos de inquérito actualmente pendentes contra o Exmo. Sr. Juiz”, cf. deliberação junta com o p.a. a juntar pelo Requerido.

- De acordo com aquela proposta [n]o presente processo disciplinar está em apreciação factualidade compreendida nesse período temporal que consubstanciarão, de acordo com o relatório final do Exmo. Senhor Inspector, “na violação grave dos deveres de zelo e de actuação no sentido de criar no público confiança na administração da justiça, uma violação do dever de obediência e outra na violação grave dos deveres de zelo e obediência. A apreciação dessa conduta mostra-se relevante para o juízo que importa fazer no inquérito instaurado para apuramento sobre a aptidão ou inaptidão do Exmo. Sr. Juiz para o exercício de funções de juiz de direito, sendo certo que nesse inquérito terão de ser analisadas as condutas em causa neste processo”.

- A par deste procedimento disciplinar foi ainda, em 06.06.2014, instaurado procedimento disciplinar ao Requerente, a instruir pelo Senhor Desembargador GG, “em apreciação conjunta com os autos de inquérito pendente contra o mesmo Exmo. Sr. Juiz (proc. 2014-73/IN)”, cf. deliberação junta com o p.a. a juntar pelo Requerido.

- Por outro lado, em cumprimento da deliberação de 20.05.2014, referida em 2º, o serviço prestado pelo Requerente nos Juízos Criminais de ..., no ... Juízo ... do Tribunal Judicial de ... e no Círculo Judicial de ..., afecto ao serviço de instrução criminal, no período compreendido entre 01.09.2012 e 04.08.2014 foi objecto de inspecção extraordinária.

- No âmbito deste inspecção extraordinária, por douta deliberação do Conselho Plenário do CSM, em 20.01.2015, e na sequência da atribuição da classificação de “Medíocre” ao ora Requerente, foi determinada a abertura de inquérito ao Requerente “para apreciação da inaptidão (…) para o exercício de funções de juiz de direito”, cfr. deliberação junta com o p.a. a remeter pelo Requerido.

- Concluída a instrução dos autos de inquérito, em 08.04.2015, foi proposto em sede de Relatório Final de tal inquérito o seguinte: “Face a tudo quanto vem exposto, e porque os elementos colhidos no presente inquérito constituem disso indício suficiente, o Exmo. Sr. Juiz de Direito Dr. AA cometeu, com negligência grave e grave desinteresse pelo cumprimento dos seus deveres profissionais, três infracções disciplinares, por violação dos deveres profissionais de prossecução do interesse público e de zelo, e ao dever de obediência, com quebra do prestígio exigível aos magistrados judiciais e da dignidade indispensável ao exercício das correspondentes funções, infracções que são reveladoras de definitiva incapacidade de adaptação às exigências da função de Juiz de Direito (artigos 82º, 95º, nº 1, al. a) do Estatuto dos Magistrados Judiciais em conjugação com o artigo 73º, nº 2, alínea a), e) e f), 3, 7 e 8 da Lei 35/2015 [sic], de 20 de Junho”. (cf. Relatório Final junto ao p.a. a juntar pelo Requerido);

Por deliberação do Conselho Permanente de 28.04.2015, em concordância com o Relatório Final apresentado, foi deliberada a conversão do inquérito em procedimento disciplinar, cf. deliberação junta com o p.a. a juntar pelo Requerido.

- No âmbito do mesmo foi deduzida a acusação, propondo-se ao Conselho que:

“a) o arguido cometeu, com negligência grave e grave desinteresse pelo cumprimento dos seus deveres profissionais, de forma continuada, uma infracção disciplinar aos deveres de prossecução do interesse público, uma infracção ao dever de zelo, com quebra do prestígio exigível aos magistrados judiciais e dignidade indispensável ao exercício das correspondentes funções e uma infracção ao dever de obediência;

b) os factos em que se consubstanciam as infracções são reveladores de definitiva incapacidade de adaptação do arguido às exigências da função de juiz; e que

c) seja aplicada ao arguido a pena única de aposentação compulsiva, nos termos do artigo 95º, nº 1, alínea a), do Estatuto dos Magistrados Judiciais (EMJ)”.

- Em 16.07.2015, pelas 23:58, o Requerente apresentou a sua defesa por via eletrónica (para os endereços eletrónicos do CSM e do Senhor Inspetor Judicial), juntando documentos e requerendo diversas diligências.

- Porém, no Relatório Final o Senhor Inspetor considerou a referida defesa extemporânea com a seguinte fundamentação: “1. Foi dado conhecimento ao Sr. Juiz de Direito Dr. AA do teor integral da acusação deduzida, fixando-se o prazo de vinte dias para exercer, querendo, os seus direitos de defesa, como previsto nos artigos 118º nº 1 do Estatuto dos Magistrados Judiciais e 214º nº 1 da Lei 35/2014, de 29 de Junho (Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas subsidiariamente aplicável).

O aviso de recepção da carta registada enviada para notificação da acusação ao Sr. Juiz de Direito ora arguido foi assinado a 16 de Junho de 2015 (fls. 324), data em que foi entregue a carta registada que o acompanhava, pelo que o prazo se completou às vinte e quatro horas do dia 14 de Julho de 2015.

O Sr. Juiz de Direito Dr. AA apresentou a sua defesa a coberto da mensagem de correio electrónico enviada pelas 23 horas e 58 minutos do dia 15 de Julho de 2015, a qual foi dirigida ao Conselho Superior da Magistratura e ali recepcionada no dia 16 de Julho de 2015 (fls. 326). (…)

9. A notificação do teor da acusação foi efectuada para a residência que é do conhecimento oficial do Conselho Superior da Magistratura e que se mostra confirmada pelo teor das declarações prestadas pelo Sr. Juiz de Direito Dr. AA no âmbito deste processo disciplinar (fls. 299 dos autos).

Por outro lado, nenhuma dúvida existe sobre o facto de o Sr. Juiz de Direito Dr. AA se encontrar suspenso do exercício de funções desde o final do mês de Janeiro de 2015, em consequência da atribuição da classificação de serviço de “Medíocre” e até ao trânsito em julgado da decisão a proferir nestes autos.
10. Assim sendo, a sua deslocação à Região Autónoma dos ... e à cidade da ... na ilha do... – ... não encontra qualquer justificação no contexto do serviço que lhe esteja cometido, sendo certo que não foi junta prova documental de qualquer “convocatória” para ali estar presente e participar em qualquer reunião entre os dias 14 e 17 de Junho de 2015, a qual, de resto, não teria qualquer fundamento dada a sua situação de suspensão de exercício de funções”.

- Com base na matéria de facto dada como provada resultante dos factos constantes da Acusação, em sede de Relatório Final, foi, numa posição já distinta e mais consentânea com a regularização de situações entretanto levada a cabo pelo ora Requerente, proposto o seguinte: “a) Que aos factos dados como provados seja atribuída a relevância jurídico-disciplinar constante na alínea E) deste relatório final, concluindo-se que o Sr. Juiz de Direito Dr. AA cometeu três infracções disciplinares consubstanciadas na violação do dever de prossecução do interesse público, na violação do dever de zelo e na violação do dever de obediência, as quais são previstas e puníveis nos termos da norma resultante da conjugação do artigo 82º, 85º nº 1 d) e b), 89º e 87º, 94º nº 1, 92º e 99º, todos do Estatuto dos Magistrados Judiciais, e do artigo 73º nº 2 alíneas a), e) e f), nº 3, 7 e 8 da Lei 35/2014, de 20 de Junho (Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas).

b) Que pela prática das mencionadas infracções disciplinares e aos ditos deveres de prossecução do interesse público, zelo e de obediência seja aplicada ao Sr. Juiz de Direito Dr. AA a pena única de 180 (cento e oitenta) dias de suspensão de exercício”. (cf. Relatório Final junto com o p.a.)

- Em 29.09.2015 foi, de acordo com a acta inicialmente tornada pública, deliberado pelo Conselho Plenário do CSM não aprovar o projeto de decisão apresentado pela Exma. Senhora Dra. HH, que, após votação, obteve o seguinte resultado: 9 (nove) votos no sentido de ser aplicada a pena de “aposentação compulsiva”, dos Exmos. Senhores Presidente, Vice-Presidente, Dr. DD, Prof. Doutor EE, Dr. II, Dr. JJ, Dr. LL, Dr. CC, Dr. BB, e com 5 (cinco) votos a favor do projeto apresentado, dos Exmos. Senhores Dr. FF, Dra. MM, Dr. NN, Dr. OO e Dra. HH (Relatora).

- Foi ainda deliberado aplicar a pena de “Aposentação Compulsiva”, designando-se para Relator de projeto de decisão, para posterior assinatura pelos presentes, de acordo com o supra deliberado, o Exmo. Senhor Dr. LL.

- Em 07.10.2015 foi o Requerente notificado para se pronunciar sobre a aplicação da pena de demissão porquanto “o relator designado, constat[ou] que o Arguido não é subscritor da Caixa Geral de Aposentações, o que pode constituir obstáculo à aplicação da pena de aposentação compulsiva e implicar que, perante o preenchimento da previsão das alíneas a) e c) do art. 95 do EMJ, tenha de ser aplicada a pena de demissão” (cf. fls. 3 do Relatório Final).

- Pronúncia que veio a realizar em 29.10.2015, requerendo que fossem admitidos os meios de prova documentais e testemunhais melhor indicados no requerimento, com vista a demonstrar a sua aptidão para o exercício das funções de Magistrado e a total desnecessidade da aplicação de uma sanção expulsiva, e que lhe fosse, no máximo, aplicada uma pena suspensiva.

- Em 21.12.2015 veio o Requerente suscitar a caducidade e prescrição do procedimento disciplinar, requerendo “que se reconheça que havia já caducado o poder de instauração de um processo disciplinar relativamente aos factos anteriores ao mês de Maio de 2014 e já objecto do identificado processo de averiguações e regularizados em 2013 e se reconheça também ter já decorrido o prazo máximo de duração do processo disciplinar instaurado por douta deliberação de 20 de Maio de 2014 (18), com a consequência de tais factos não poderem já, devido à prescrição entretanto ocorrida, servir de base à aplicação ao signatário de uma sanção expulsiva”, arguições que posteriormente renovou (inclusive no dia 13 de janeiro de 2016) a propósito de factos em relação aos quais decorrera o prazo de 18 (dezoito) meses até ser notificado da decisão final do procedimento, notificação esta ocorrida em 13 de janeiro de 2016.

Em 21.12.2015 deliberou o Plenário do CSM: i) Rejeitar o requerimento de realização de diligências instrutórias; ii) Julgar improcedentes as questões suscitadas de prescrição do procedimento disciplinar e caducidade do direito de instauração do mesmo; iii) Indeferir a arguição do impedimento em relação aos Senhores Vogais Drs. BB, CC, DD e EE; iv) Aplicar a pena disciplinar de demissão, ao abrigo do disposto no artigo 95º, nº 1, alíneas a) e c), do EMJ.”

Em concreto, para a providência que requesta, ressuma a verificação dos pressupostos adrede – artigo 120.º n.º 1 do Código do Processo nos Tribunais Administrativos – na existência, i) de um fumus boni iuris; ii) de um periculum in mora; iii) e de que o decretamento da providência “(…) não é lesiva na perspectiva do interesse público.”

Em síntese apertada para o primeiro dos pressupostos elencados alinha as sequentes considerações: i) o procedimento disciplinar encontra-se prescrito, por exaurimento do prazo de 180 prescrito no artigo 6º, nº 6 do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores da Função Pública (EDTFP) [[1]]; ii) o direito à instauração do procedimento disciplinar caducou, por haver sido ultrapassado o prazo referido no artigo 6º, nº 2, do EDTFP [[2]]; iii) ocorreu (sic) “(…) ilegalidade da douta deliberação que determinou a aplicação da pena de demissão ao Requerente por violação do princípio constitucionalmente consagrado da unicidade estatutária [[3]]; iv) ocorre “(…) ilegalidade da douta deliberação impugnada por impedimento do Senhor Vogal Senhor Dr. BB [[4]]; v) ocorre (sic) “(…)ilegalidade da douta deliberação impugnada por falta de quórum nos termos do disposto no artigo 156º, nº 3, do EMJ [[5]]; vi) ocorre (sic) “(…) ilegalidade da douta deliberação impugnada por tempestividade da defesa apresentada [[6]]; vii) ocorre (sic) “(…) ilegalidade da douta deliberação impugnada por violação do direito de defesa do Requerente ao indeferir as diligências requeridas no seu requerimento de 29.10.2015, diligências essenciais para o apuramento da verdade [[7]]; viii) ocorre (sic) “Da ilegalidade da douta deliberação impugnada por aplicação de pena manifestamente desproporcional. [[8]]

Quanto ao segundo dos requisitos invocados - periculum in mora – pretende o requerente inculcar a ideia de que (sic) “A deliberação suspendenda, se não for objecto de suspensão, causará ao ora Requerente prejuízos não apenas de difícil reparação mas mesmo de natureza irreparável.

Quanto aos danos patrimoniais, é jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Administrativo e do Supremo Tribunal de Justiça que os prejuízos resultantes da privação de vencimentos (ou de parte deles), embora economicamente quantificáveis, são de difícil reparação, para efeitos do preenchimento do requisito do periculum in mora, se estiver indiciariamente demonstrado que essa diminuição de rendimentos põe em risco a satisfação de necessidades básicas do Requerente e do seu agregado familiar ou que, de qualquer modo, implica uma drástica diminuição do seu nível de vida.”

Finalmente para o terceiro dos requisitos elencados refere (sic) que: “(…) estando em causa uma discussão de natureza estritamente monetária, o eventual dano suportado pelo Requerido na sequência do decretamento da providência nunca será irreparável.

Por outro lado, também não é afectada a boa imagem da instituição do Requerido, até porque, neste momento, o Requerente encontra-se suspenso do exercício das suas funções.

Por sua vez, a não suspensão da douta deliberação suspendenda, como se viu, prejudica irreversivelmente os interesses do Requerente.

Citado o Conselho Superior da Magistratura – cfr. fls. 195 – contraminou a fundamentação da pretensão do requerente pela forma sequente (sic): “Quanto ao primeiro – prescrição do procedimento disciplinar 290/2015 – diremos, prima facie que assiste razão ao Requerente: de facto, já decorreram mais de 18 meses desde a referida deliberação do Permanente de 20 de maio de 2014, prazo de prescrição do procedimento disciplinar aplicável ao caso.

Contudo, aqui importa introduzir um factor de correcção: o processo disciplinar n.º 290/2015-PD perdeu autonomia assim que foi deliberada a respectiva apensação ao processo n.º 155/2015 – PD.

Por essa razão, passou a valer apenas, para marcar o termo ad quem do prazo de prescrição do procedimento, a realidade procedimental deste.

À face desta, vista a data em que ocorreu a conversão do inquérito em procedimento disciplinar, não foi atingido o limite dos dezoito meses.

(…) “Quanto ao segundo ponto – (…) há que notar que é aplicável a norma do n.º 2 do art. 6.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei n.º 58/2008, de 9.09, entretanto revogada, no dia 1 de Setembro, pelo art. 42/1, d), da Lei n.º 35/2015, de 20.06.

Nos termos dessa norma, o direito de instaurar procedimento disciplinar prescreve quando, conhecida a infracção por qualquer superior hierárquico, não seja instaurado o competente procedimento disciplinar no prazo de trinta dias.

Como facilmente se constata, o termo a quo do prazo é marcado pelo “conhecimento da infracção por qualquer superior hierárquico.”

Este segmento obriga-nos, numa análise rigorosa, a abordar os conceitos de “conhecimento da infracção” e “qualquer superior hierárquico.”

Assim, quanto ao primeiro, parece-nos óbvio que o conhecimento da infracção tem de ser de natureza psicológica.

Só esse conhecimento é relevante para que o superior hierárquico possa tomar uma decisão – e uma decisão esclarecida – acerca da relevância disciplinar dos factos e, com base nela, impulsionar o procedimento tendente ao respectivo sancionamento.

Pressupõe-se, assim, uma real e efectiva ciência da falta, única que possibilita a apreciação preparatória, indispensável à prática do ato de instauração do procedimento disciplinar.

Como a propósito se pondera no parecer do Conselho Consultivo do Ministério Público n.º 33/89, “[u]ma ciência da falta que se quisesse meramente presumida arrastaria consigo a indeterminação dos factos típicos conducentes à presunção, volvendo-se em critério de todo aleatório e ao máximo incontrolável.

Assim, o simples registo de entrada no Serviço do suporte documental que permite o conhecimento da falta – figure-se o caso de um volumoso inquérito – não pode, supomos, ser feito equivaler ao seu conhecimento real.”

A necessidade de a decisão ser esclarecida inculca ainda a ideia de também não bastar o mero conhecimento naturalístico de factos na sua materialidade, que possam ser abstractamente subsumíveis a uma norma sancionadora disciplinar – muito menos, a sua denúncia, em termos genéricos –, “antes se tornando necessário o conhecimento destes e do circunstancialismo que os rodeou, de forma a tornar possível a formulação de um juízo fundado de que integram infracção disciplinar.”

Deste modo, o cômputo do prazo apenas se inicia quando o superior hierárquico tem conhecimento de fortes indícios da prática da infracção, não bastando para tanto uma mera participação ou denúncia não suficientemente concretizada e individualizada.

Se o conhecimento da infracção, nos citados termos, apenas for revelado em inquérito, é o termo deste que constitui o dies a quo do prazo. [[9]]

Passando agora para o conceito de “qualquer superior hierárquico”, o art. 6.º/2 do EDTEFP deve conjugar-se com as normas do Estatuto dos Magistrados Judiciais que atribuem ao Conselho Superior da Magistratura, através da sua composição plenária ou da sua composição permanente, quando estejam em causa actos praticados por juízes de direito, poderes para instaurar procedimentos disciplinares (cf. arts. 149, a), e 152/2), as quais se configuram como norma especial face ao (então vigente) art. 29 do EDTEFP.

A competência para instaurar procedimento disciplinar não está atribuída, pela lei, ao presidente nem a qualquer outro membro do Conselho Superior da Magistratura, mas a este órgão qua tale – isto é, ao órgão colegial mesmo.

Do que acabamos de escrever decorre uma consequência importante: o que releva é apenas o conhecimento do Conselho, órgão colegial que funciona em plenário ou permanente, nos termos sobreditos, composto pelos membros necessários ao quórum deliberativo, ao qual compete o exercício do poder disciplinar sobre magistrados judiciais.

Por outro lado, é aplicável, também, a norma do n.º 4 do mesmo art. 6.º, de acordo com a qual “[s]uspendem o prazo prescricional referido nos números anteriores, por um período até seis meses, a instauração de processo de sindicância aos órgãos ou serviços, bem como a de processo de inquérito ou disciplinar, mesmo que não dirigidos contra o trabalhador a quem a prescrição aproveite, quando em qualquer deles venham a apurar-se infracções por que seja responsável.”

Significa isto, desde logo, que a pendência do processo de inquérito – a que o Requerente chama, impropriamente, de processo de averiguações –, suspendeu o decurso do prazo do previsto no n.º 2 do art. 6.º e que só quando foi confrontado com o relatório respectivo é que o Conselho, na sua composição Permanente, ficou em condições de decidir – conforme decidiu, logo na primeira oportunidade.

“(…) Quanto ao terceiro ponto – violação do princípio da unidade estatutária – há que dizer (…) a razão da diferença de tratamento entre magistrados judiciais subscritores da Caixa Geral de Aposentações e magistrados judiciais não subscritores da Caixa Geral de Aposentações não se situa ao nível do estatuto dos magistrados judiciais, mas do estatuto da aposentação, sendo transversal a todos os servidores do Estado.

O que se entende é que a pena de aposentação compulsiva, pela sua natureza, apenas pode ser aplicada aos magistrados judiciais que, para além de serem subscritores da Caixa Geral de Aposentações, reúnam os requisitos para a aposentação ordinária.” [[10]]

(…) Quanto ao quarto ponto – impedimento do Vogal Dr. BB – há que dizer que a questão foi, como devia ter sido (cf. art. 70/4 do Código do Procedimento Administrativa), apreciada em despacho do Exmo. Sr. Presidente do Conselho Superior da Magistratura.

Desse despacho cabia reclamação para o Plenário do órgão, conforme decorre do art. 166 do Estatuto dos Magistrados Judiciais.

(…) Quanto ao quinto ponto – deliberação tomada sem o quórum exigido pela lei –, não assiste razão ao Requerente: como resulta da ata, no momento em que a deliberação em causa foi discutida e aprovada, encontravam-se presentes o Presidente e o Vice-Presidente do Conselho Superior da Magistratura, Juízes Conselheiros .... e ..., respectivamente, e os vogais do mesmo órgão Prof. Doutor ..., Dr. ..., Dr. ..., Dr. II, Dr. ..., Juiz Desembargador Dr. ..., Juíza Desembargadora Dra...., Juiz de Direito Dr. CC, Juiz de Direito Dr. LL e Juiz de Direito Dr. ..., o que perfaz um total de doze membros.”

(…) Quanto ao sexto ponto – rejeição da defesa apresentada –, há que repristinar o que a propósito foi notado pelo Exmo. Sr. Inspector Judicial que interveio como instrutor no processo disciplinar.

De facto, foi dado conhecimento ao Requerente do teor integral da acusação deduzida, fixando-se o prazo de vinte dias para exercer, querendo, os seus direitos de defesa, como previsto nos artigos 118/1 do Estatuto dos Magistrados Judicias e 214/1 da Lei 35/2014, de 29 de Junho (Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, subsidiariamente aplicável).

O aviso de recepção da carta registada enviada para notificação da acusação ao Requerente foi assinado a 16 de Junho de 2015 (fls. 324), data em que foi entregue a carta registada que o acompanhava, pelo que o prazo se completou às vinte e quatro horas do dia 14 de Julho de 2015.

O Requerente apresentou a sua defesa a coberto de mensagem de correio electrónico enviada pelas 23 horas e 58 minutos do dia 15 de Julho de 2015, a qual foi dirigida ao Conselho Superior da Magistratura e ali recepcionada no dia 16 de Julho de 2015 (fls. 326).

No documento em que apresentou a sua defesa começou o Requerente por invocar a tempestividade desse ato, alegando, em síntese, que se encontrava na Ilha do ... entre 14 e 17 de Junho de 2015 e que só quando regressou a Lisboa teve acesso à correspondência expedida para o seu domicílio na cidade de Lisboa.

(…) Quanto ao sétimo ponto – não realização de diligências requeridas pelo Requerente em sede de procedimento disciplinar – há a dizer que a questão ficou prejudicada pelo facto de a defesa ter sido considerada intempestiva.

Não obstante isso, o Exmo. Sr. Inspector Judicial que interveio como instrutor, considerando a possibilidade de as diligências serem ordenadas oficiosamente, teve o cuidado de se pronunciar sobre o requerido na defesa.”

(…) Quanto ao oitavo ponto – desproporcionalidade da pena disciplinar aplicada face à gravidade dos factos –, cremos que o mesmo foi adequadamente apreciado na deliberação final do procedimento disciplinar.  [[11]]

(…) o CSM não conhece, nem tem obrigação de conhecer, os encargos financeiros suportados pelo Requerente, neste pressuposto impugnando o alegado.

Não pode, porém, deixar de notar que, por um lado, a eventual suspensão da eficácia do ato não pode abranger a suspensão do exercício de funções, por força do disposto no n.º 5 do art. 170 do Estatuto dos Magistrados Judiciais.

I.a) – Questão a apreciar na providência (suspensão da eficácia).

- Requisitos da Providência;

- Verificação dos pressupostos de que depende o decretamento da providência.

II. – FUNDAMENTAÇÃO.

II.A. – Elementos de Facto adquiridos para a decisão a proferir.

Conforme se alcança da contestação veiculada pelo Conselho Superior da Magistratura, mostra-se impugnada a matéria respeitante às despesas suportadas pelo requerente, pelo que a matéria a destacar para efeitos da decisão a proferir deverá cingir-se ao estado funcional-profissional do requerente, constante da deliberação do Conselho.

Assim, tem-se por adquirida para a decisão a proferir a sequente factualidade.

- O arguido, Juiz de Direito, AA, nasceu em .... em ...;

- O arguido, Juiz é ...; 

- O arguido, Juiz de Direito, AA, concluiu a licenciatura em Direito, no dia ..., na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, com a classificação de treze (13) valores;

- O arguido, exerceu as funções de Representante do Ministério Público durante cerca de quatro (4) anos;

- O arguido, depois de ter frequentado o 27º curso de Formação de Magistrados, exerceu, após o estágio profissional, funções, sucessivamente:

- No extinto Tribunal Judicial da Comarca de ..., onde tomou posse a 2 de Setembro de 2011;

- Nos extintos juízos Criminais da Comarca de ..., estando colocado no Quadro Complementar de Juízes de Direito do Distrito Judicial de ..., onde tomou posse a 18 de Setembro de 2012;

- No extinto... juízo Cível da Comarca de ..., estando colocado no Quadro Complementar de Juízes de Direito do Distrito Judicial de... onde tomou posse a 3 de Setembro de 2013, tendo ali exercido funções até 10 de Novembro de 2013;

- No extinto Círculo Judicial de ..., afecto à instrução criminal, ainda colocado no Quadro Complementar de Juízes do Distrito Judicial de ..., tendo ali exercido funções desde 11 de Novembro de 2013 e até 31 de agosto de 2014;

- Na Comarca dos ..., como Juiz auxiliar na Instância Local da ..., desde 1 de Setembro de 2014.

- A apreciação do desempenho funcional-profissional mereceu as sequentes classificações.

"Suficiente", pelo desempenho na extinta Comarca de ... entre Setembro de 2011 e agosto de 2012;

"Medíocre", pelo desempenho no âmbito do Quadro Complementar de juízes de Direito do Distrito Judicial de ... Juízos Criminais de Setúbal, ... juízo .... e na Instrução ... do Círculo judicial de ...), entre 1de Setembro de 2012 e 4 de agosto de 2014.

- No plano da apreciação das condições pessoais-profissionais, foi descrito no relatório de inspecção (Comarca de ...) que (sic):

- É um magistrado civicamente idóneo, independente, isento e portador de conduta muito digna, revelando boa capacidade para o exercício da função.

- O relacionamento com sujeitos e intervenientes processuais, outros magistrados, advogados e demais profissionais forenses e público em geral tem sido correto.

- Mostrou boa compreensão das situações concretas a resolver, sendo as suas decisões norteadas por um cuidado sentido de justiça, tendo em atenção o meio social e cultural onde a sua função foi exerci da, na qual se inseriu bem e cujas peculiaridades apreendeu.

- Apesar do pouco tempo de exercício de que dispunha aquando do seu início de funções na Comarca de ... procurou e conseguiu uma boa adaptação ao serviço, sendo um magistrado dedicado ao serviço, pontual, muito assíduo e munido de bom senso.

- A produtividade evidenciada pelos mapas estatísticos é boa, tendo logrado manter um aceitável equilíbrio entre os processos entrados e os findos.

- Na Comarca de ... teve trabalho já com alguma expressão em termos quantitativos, embora várias vezes tenha despachado ou sentenciado com uma dilação bastante grande, o que, dado o nível da pendência, não tem justificação.

- Os números revelam que a pendência processual na Comarca de ... não é elevada, estando perfeitamente ao alcance de um magistrado diligente (mesmo em inicio de carreira), pois não dá muito trabalho ao respectivo juiz na sua condução/tramitação.

- Trabalhou bastante, com significativa dedicação ao seu múnus e em boa parte com qualidade - embora tenha proferido decisões com muito atraso (algumas delas quando já tinha cessado funções na comarca) para além das incorrectas posturas no plano técnico. [[12]]

Do relatório elaborado pelo Sr. Inspector Judicial que procedeu à Inspecção Extraordinária extrai-se o seguinte quanto às suas capacidades humanas:

- Quanto à idoneidade cívica e dignidade de conduta nenhuma censura merece a prestação do Arguido, o mesmo se podendo referir quanto à sua independência e isenção;

- É desconhecido qualquer episódio que ponha em causa o seu bom relacionamento com todos;

- O seu prestígio profissional está bem longe de ter alcançado o mínimo, pois que são vários os atrasos verificados e é enorme a incapacidade revelada para que o Sr. Dr. AA seja profissionalmente considerado;

- Aparenta serenidade e tem atuado com reserva.

- Ao arguido foi aplicada a pena de demissão por deliberação (formada por maioria) do Conselho Superior da Magistratura, de 21 de Dezembro de 2015.

II.A. – Requisitos da Providência.

Nos termos do artigo 170.º, nº 1, do Estatuto dos Magistrados Judiciais (Lei n.º 21/85, de 30 de Julho, com as sucessivas alterações a que sendo sujeito, que a interposição de recurso (da deliberação a tomada por este órgão de gestão e disciplina que ofenda os direitos ou interesses de um magistrado ou funcionário judicial), não suspende a eficácia do acto (administrativo em que se consubstancia a deliberação impugnanda), “salvo quando, a requerimento do interessado, se considere que a execução imediata do acto é susceptível de causar ao recorrente prejuízo irreparável ou de difícil reparação”.

Às providências destinadas a evitar os efeitos não reparáveis ou de difícil reparação dos actos formados no Conselho Superior da Magistratura, aplica-se, subsidiariamente, as regras estabelecidas para o procedimento administrativo especifico e adrede, a saber, actualmente [[13]], as regras estatuídas nos artigos 112.º, nº 2 al. a) e 120.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA).

O artigo 170.º, nº 1, do Estatuto dos Magistrados Judiciais (EMJ), faz depender a suspensão da eficácia de um acto nele constituído que a execução imediata do acto, eventualmente, lesivo de uma situação individual e concreta de um interessado, [[14]] seja “susceptível de causar ao requerente prejuízo irreparável ou de difícil reparação".

O artigo 112.º do Código do Procedimento dos Tribunais Administrativos preceitua que “quem possua legitimidade para intentar um processo junto dos tribunais administrativos pode solicitar a adopção da providência ou das providências cautelares, antecipatórias ou conservatórias, que se mostrem adequadas a assegurar a utilidade da sentença a proferir nesse processo”, podendo, nos termos do nº 2 do mesmo preceito, as providências que seguem os tramites do Capítulo I, do Título IV do mencionado diploma legal, destinar-se, designadamente em: “a) suspensão da eficácia de um acto administrativo ou de uma norma.”  

Os actos administrativos, a determinar segundo o conceito do Código de Procedimento Administrativo (CPA) – cfr. artigo 148.º do CPA – devem assumir um conteúdo ou feição decisória, para que sejam passiveis e susceptíveis de impugnação. [[15]]    

Nos termos do n.º 1 do art. 120.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, as providências requeridas para evitar a execução de actos administrativos, poderão ser adoptadas, desde que, cumulativamente, sejam possível configurar: i) a possibilidade de um fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal; e ii) seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente.

A providência deve ser recusada quando, devidamente ponderados os interesses públicos e privados em presença, os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possa ser evitados ou atenuados pela adopção de outras providências – cfr. n.º 2 do citado artigo 120.º do CPTA.

O Requerente, para além de justificar os motivos substantivos e formais por que diverge e dissente da deliberação que aplicou a pena de demissão, alega para a economia de procedência da providência que requer: i) que o procedimento (acção/recurso) que irá instaurar poderá ter o sucesso; ii) que existe periculum in mora, porque “a deliberação suspendenda, se não for objecto de suspensão, causará ao ora Requerente prejuízos não apenas de difícil reparação mas mesmo de natureza irreparável.”; ii) que não existirão efeitos lesivos para o interesse público.

Para a primeira das razões justificadoras da pretensão o requerente alega, em síntese apertada, que (sic): i) o procedimento disciplinar instaurado encontrar-se-á prescrito, sumariamente porque entre a data da instauração do procedimento disciplinar em 29.04-2014, deliberada pelo Conselho em 20.05.2014 (apensado ao procedimento disciplinar n.º 155/2015, na sequência da deliberação de 10 de Fevereiro de 2015) e a data da deliberação que decretou a pena de demissão, em 13 de Janeiro de 2016, decorreram mais de dezoito (18) meses; ii) ocorre a caducidade do procedimento disciplinar; iii) ocorre ilegalidade que determinou a aplicação de demissão, por violação do principio da unicidade estatutária (por o arguido estar inscrito na segurança social e não na Caixa Geral de Aposentações); iv) a deliberação será nula, ou ilegal, por ocorrer impedimento de um dos elementos que interveio na formação/constituição da deliberação (no caso o Vogal, Dr. BB)); v) a deliberação seria nula por a inexistência de quórum; vi) a deliberação seria legal por não haver sido atendida a defesa apresentada no procedimento disciplinar pelo Inspector Judicial; vii) a deliberação seria nula por violação do direito de defesa do arguido (não terem sido acolhidas e aceites as diligências probatórias requeridas pelo requerente no requerimento de 29-10-2015; viii) a pena aplicada seria manifestamente desproporcionada.

Já para o segundo dos pressupostos alinhados (periculum in mora) estima que os prejuízos resultantes da privação de vencimentos (ou de parte deles), embora economicamente quantificáveis, são de difícil reparação, para efeitos do preenchimento do requisito do periculum in mora, se estiver indiciariamente demonstrado que essa diminuição de rendimentos põe em risco a satisfação de necessidades básicas do Requerente e do seu agregado familiar ou que, de qualquer modo, implica uma drástica diminuição do seu nível de vida”, abonando-se em jurisprudência adrede. [[16]

II.A.1. – Probabilidade de ganho ou sucesso da acção (procedimento) principal (fumus boni iuris ou fumus non malis iuris)

A fórmula positivada no nº 1 do artigo 120.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos “seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente” inculca a ideia de que a lei faz depender o decretamento da providência de um ganho de causa (principal), ou seja, mutatis mutandis, transfere para a sorte da acção o sucesso da providência. Vale dizer que se acção (principal) não tiver probabilidade de vir a ter êxito a providência também não poderá ter uma decisão favorável ou vantajosa para o requerente.

Pensamos que não se prefigurará extravagante, estrambólico ou totalmente desapropriado operarmos, para o requisito aposto no segmento normativo indicado, um razoamento similar aquele que se poderá efectuar para o caso de perda de oportunidade nas situações em que essa perda de oportunidade decorre de deficiente ou ineficaz exercício de um mandato judicial. Nestes casos a perda de oportunidade atina, numa elevada percentagem de raciocínio lógico-analítico, com a probabilidade que o lesado/mandante teria se a acção judicial onde o faltoso exerce o mandato viesse a obter ganho (seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente). Vale por dizer que numa situação em que se analise uma perda de oportunidade – descartamos, naturalmente, o elemento atinente ao resultado danoso – uma parte do exercício e iter lógico-analítico do razoamento conecta-se ou inere-se numa relação de prognose probabilística entre o facto gerador do dano e a possibilidade de o lesado vir a obter uma solução vantajosa e exitosa para si. No caso da providência que nos ocupa, também a lei manda atender á probabilidade de que a pretensão formulada no processo que o requerente venha a instaurar possa colher um âmbito de sucesso.

Tanto num caso como noutro a probabilidade de êxito de um caso ou acção serve como ponto de partida para o razoamento lógico-analítico a que haja de se proceder para aquilatar a consistência dos pedidos formulados (ainda que, haja que atender às diferentes pretensões e tutelas que cada uma das situações encerra e que pretendemos deixar ressaltada e vincada).         

Como tanto num caso/situação jurídico-pragmática se pode prefigurar como só aspirando o pretendente da tutela do direito a uma decisão favorável na providência jurisdicional, em curso ou a intentar, a ponderação lógica e a análise das razões de prognose probabilística poderão correr em paralelo.

A propósito da perda de chance tivemos oportunidade de escrever em acórdão recentemente relatado, e a propósito da eventualidade de um sujeito poder vir a ter ganho num recurso – que o mandatário não interpôs atempadamente – que só quando ocorrer uma séria e competente probabilidade de segundo as regras de prognose analítica, no plano jurídico, de o sujeito processual vir a obter êxito no procedimento judicial que intente é que se poderá colocar a possibilidade de vir a colher um benefício ou uma vantagem susceptível de lhe conferir uma perspectiva sólida e consolidada de ver o seu direito ser acolhido e reconhecido na mundividência jurisdicional e assim poder vir a ter sucesso na providência que intentou para acautelar a tutela do direito peticionado.

A temática da probabilidade ou expectativa fundada e técnico-juridicamente possibilista de se poder, num juízo de prognose, perspectivar uma solução favorável numa providência jurisdicional intentada para obtenção de uma tutela jurisdicional, que haja sido denegada numa primeira apreciação da questão, num órgão jurisdicional, mereceu, para efeitos de apreciação do dano fundado em perda de oportunidade uma azeda e acerba análise de Luís Medina Alcoz contra os órgãos jurisdicionais que deixam de aplicar a teoria da perda de oportunidade ou perda de chance num extenso aranzel que, data vénia, deixamos transcrito. “Há, em primeiro lugar, uma compreensão errónea do conceito de probabilidade. A probabilidade constitui uma noção chave, não só da doutrina da perda de oportunidade, mas também, num plano muito mais geral, da teoria da prova. Dada a incapacidade de alcançar um conhecimento incontrovertível no mundo da experiência, provar é apoiar a existência de factos na formulação de hipóteses válidas, não a partir a segurança total, mas sim desde a probabilidade. A actividade probatória converte-se assim um juízo de aceitabilidade dos factos em função do seu nível de probabilidade; e, por isso, a apreciação fáctica queda sujeita às regras ou critérios (positivos) com que apreciar que se alcançou um “grado de probabilidade suficiente.”

Sob esta perspectiva, a perda de oportunidade é a chave que abre a porta a um ressarcimento quando não se alcança esse grau suficiente de probabilidade e, portanto, quando não se pode ter por certo o facto da causalidade. Pois bem, resulta que, em ocasiões, se produz uma defeituosa captação jurisprudencial do problema da prova e do nexo causal. Um exemplo claríssimo é a opinião que por vezes merece la denominada doutrina dei "juízo dentro do juízo”.

A locução “juízo dentro do juízo” (trial within the trial; procés-dans-le-procés) não é mais do que uma forma plástica de expressar a exigência fundamen­tal de que se aprecie o nexo causal através de um juízo probabilístico numa concreta serie de casos de responsabilidade civil: aqueles que planteiam as actividades forenses e, em particular, os de culpa de advogados e procuradores, por falta de interposição de um recurso. Quando o cliente-prejudicado demanda ao profissional legal negligente – reclamando dele a quantidade que teria conseguido por ter obtido um pronunciamento favorável-, para apreciar se existiu ou não nexo causal entre o facto ilícito (a falta de apresentação do recurso) e o dano produzido (a não obtenção dos ganhosa esperados), haverá que determinar a probabilidade de que as pretensões frustradas tivessem sido estimadas no processo que não teve lugar. Nestas hipóteses, para valorar se há ou não causalidade e, neste aso, aplicar a teoria da perda de oportunidade, o órgão decisor está obrigado a realizar um “juízo dentro do juízo”, isto é, uma representação ideal daquilo que teria ocorrido no processo que arroje quais são as probabilidades para que pudessem ser atendidas as pretensões do cliente. Dito noutros termos, o cur­so dos acontecimentos que é preciso imaginar para averiguar se houve conexão causal é aqui o curso desse procedimento jurisdicional que não chegou a começar; e o grau de probabilidade de que o agente danoso pudesse ter sido causante do dano é o grau de prosperabilidade do recurso que não chegou sequer a plantear-se. É importante, pois, reter que o “juízo dentro do juízo” não é mais do que a aplicação particular a um âmbito concreto da realidade da regra geral de que a certeza do nexo causal se comprova através de um juízo de pronóstico de probabilidades em torno a se o facto ilícito foi condicio sine qua non.

Pois bem, no Direito espanhol há uma jurisprudência que nega a viabilidade do “juízo dentro do juízo”; uma jurisprudência que não tomou consciência de que, deste modo, se estão vulnerando regras basilares do Direito processual e da instituição ressarcitória que obrigam o juiz a pronunciar-se em torno da concorrência do nexo causal através de um exame retrospectivo de que resultem as probabilidades de que o facto ilícito gerara o menoscabo. Podem ler-se nas sentenças dos nossos Tribunais relativas a estes temas afirmações tais como que "resulta totalmente impossível saber sin introduzirmos en el resbaladizo y ab­solutamente inadmissível terreno de las conjecturas cuál hubiera podido ser el tratamento (estimatorio o desestimatorio) que habrían recibido los tres frus­trados (por la no personación del procurador de­mandado) recursos de apelación”. Deste modo, o dano (a perda dos ganhos que esperava obter o cliente) deixa de reparar-se, mas não por­que não concorra o nexo de causalidade, mas sim por­que o Alto Tribunal não quer sequer examinar se existiu ou não. Estamos, simples e lhanamente, perante casos em que a autoridade judicial expressa abertamente a sua vontade de não executar a tarefa com que decidir-se em torno ao elemento causal. 

Sem dúvida, esta tendência tem que ver com a ideia de que no processo há-de assegurar-se a verdade dos factos com absoluta certeza. Ninguém melhor que um julgador para explicar a dificuldade de predizer o resultado de um procedimento jurisdicional. Trata-se de uma dificuldade probatória que não é em absoluto privativa deste tipo de pleitos, mas nestes, ao requerer-se conhecimentos especificamente jurídicos, o juiz pode interiorizar melhor que em nenhum outro a relatividade das hipóteses que podem formular-se em torno da concorrência do facto causal. São situações (supuestos) nas quais o órgão decisor está especialmente capacitado para compreender que qualquer conjectura é falseável ou refutável. A imperfeição do conhecimento humano trona-se especialmente presente nestes pleitos, pero, ante a impossibilidade de conseguir certezas absolutas, em lugar decidir-se com pautas de probabilidade, claudica e deixa de encarar o cálculo do grau de prosperabilidade do recurso com que determinar se houve ou não nexo causal e, portanto, se pode aplicar-se ou não a teoria da perda de oportunidade. Resulta que o conhecimento judicial dos facto e a valoração de se ocorreu ou não nexo causal se baseiam, precisamente, sempre e em todo caso, nesse "resbaladizo terreno de las conjecturas", que, longe de ser "absolutamente in­admisible", é necessário e obrigado. A determinação do grau de probabilidade de uma hipótese ou conjectura é, precisamente, o veículo que orienta qualquer investigação científica e histórica e todo pronunciamento judicial sobre quaetiones facti. A probabilidade é o recurso com o que afrontar o ineludível problema da incerteza. O cálculo de probabilidade permite assim, nos assuntos planteados, depurar a medida em que o cliente tivesse vencido no hipotético processo e, deste modo, aceitar ou rechaçar a hipóteses de que o advogado ou procurador ocasionou o dano. Não cabe, portanto, renunciar ao cálculo de probabilidade, entendido como método racional imposto pelas regras da sã crítica e as normas de responsabilidade civil; método que justifica por vezes que o profissional legal fique liberado de toda responsabilidade; no entanto noutras conduz à apreciação do nexo causal ou à aplicação da teoria da perda de oportunidade porque não pode excluir-se apriori que as pretensões do cliente fossem estimadas por estar amplia e nitidamente fundadas e basear-se em circunstâncias fácticas indubitadas.” [[17]]

Numa análise de prognose de uma providência intentada por alguém para obtenção de uma solução favorável ao direito para que convoca a tutela jurisdicional, e sem e pretender a imiscuição no processo de razoamento e ajuizamento do decisor futuro (trial within the trial; procés-dans-le-procés) o facto é que, numa perspectivação arrimada ao pedido da providência, à decisão já ditada e à pretensão recursiva que a pretende impugnar, é, tenteando, possível antolhar uma perspectiva decisória da entidade (superior) que irá prolatar a decisão.

Poder-se-ia incoar a perspectivação decisória pelo fim do recurso, ou seja por aquilo a que no recurso se pode atender e qual o fim em que se circunscreve a apreciação da entidade recursiva.

Sem querermos entrar na análise do tipo de impugnação (contenciosa) em que se expressa a impugnação das deliberações do Conselho Superior da Magistratura, tem sido jurisprudência constante deste Tribunal que as impugnações contenciosas das deliberações do Conselho Superior da Magistratura, só podem se objecto de um juízo cassatório ou de anulação do acto (decisório) em que se consubstancia a deliberação objecto de impugnação.

Sendo este – embora achemos que não devesse ser – o alcance e efeito prático-material que se pode obter de uma impugnação do Conselho Superior da Magistratura, a pretensão alçapremada, pelo requerente, no recurso principal, de que rescende os tópicos basilares neste procedimento, afigura-se-nos que a sorte positiva – neste caso a anulação da deliberação – se antevê de difícil consecução.

Não cabe aqui e agora – como é palmar – proceder a uma perquirição individualizada de cada um dos fundamentos em que o requerente fundeia a sua pretensão impugnativa, mas dir-se-á, por aquilo que vem inerido na resposta produzida pelo Conselho Superior da Magistratura, que a probabilidade de poder vir a obter sucesso não será muito séria ou, pelo menos, com um grau de probabilidade suficientemente alto que permita conferir-lhe o nível ou o patamar de “assegurar a utilidade da sentença a proferir nesse processo”.    

Aventurar-nos-íamos prognosticar, que mesmo operando um juízo dentro do juízo, não se vislumbra a existência de uma oportunidade de ganho de causa que propiciasse ao requerente a conservação da utilidade da decisão que, na impugnação da deliberação, viesse a para os efeitos pretendidos. [[18]]

II.B. – Da existência de uma situação propinadora de um periculum in mora.

Estima, o requerente, que os prejuízos resultantes da privação de vencimentos (ou de parte deles), embora economicamente quantificáveis, são de difícil reparação, para efeitos do preenchimento do requisito do periculum in mora, se estiver indiciariamente demonstrado que essa diminuição de rendimentos põe em risco a satisfação de necessidades básicas do Requerente e do seu agregado familiar ou que, de qualquer modo, implica uma drástica diminuição do seu nível de vida”, abonando-se em jurisprudência adrede           

O requerente adiantou a existência de uma cópia de despesas – cfr. fls. 134 (recibo de vencimento: € 3.631,78); fls. 135 a 140 (declaração do IRS: rendimentos declarados € 44.847,45); fls. 141 a 148 (contrato de arrendamento e comprovativos de transferências bancárias, que pelo valor (€ 1.000,00), por corresponder ao valor da renda inscrito no contrato de arrendamento [cfr. cláusula 4ª], conduz à presunção de que se tratará para pagamento da renda); fls. 149 e 150 (recibo da electricidade emitido pela EDP: € 59,32); fls. 151 (Factura da Vodafone: € 29,25); fls. 151 e 153 (Factura do Gás: € 5,35); 154 e 155 (Factura da água: € 23,23); fls. 156 (Comprovativo do pagamento do IUC: € 199,30); fls. 157 (Factura da pré-inspecção de veículo: € 25,44); fls. 160 a 164 facturas de reparação de automóvel: € 2.346,40); fls. 165 e 166 (recibo da inspecção periódica de veículo: € 30,54); fls. 167 e 168 (recibo do prémio de seguro: € 166,17); 169 a 173 (renovação e licença e porte de arma: € 80.36); fls. 174 a 188 (Contrato de seguro de pessoas: € 16,35); fls. 189 (comprovativo de transferências: € 50,00).          

O Conselho Superior da Magistratura, como se disse supra, impugnou os valores alinhados pelo requerente, tendo, ainda, estimado que (sic): “Não pode, porém, deixar de notar que, por um lado, a eventual suspensão da eficácia do ato não pode abranger a suspensão do exercício de funções, por força do disposto no n.º 5 do art. 170 do Estatuto dos Magistrados Judiciais.

E, por outro, que a imediata execução da deliberação que aplicou a pena de demissão, ao retirar ao requerente a qualidade de juiz de direito, com a consequente extinção do dever de exclusividade, permite que ele exerça outra actividade profissional remunerada, assim auferindo meios que assegurem a respectiva subsistência.

No atinente à temática do periculum in mora, escreveu-se no acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, de 30-10-2014, relatado pelo Conselheiro Souto Moura, que (sic): “como referem Aroso de Almeida e Fernandes Cadilha, "deve considerar-se que o requisito do periculum in mora se encontra preenchido sempre que os factos concretos alegados pelo requerente permitam perspectivar a criação de uma situação de impossibilidade da restauração natural da sua esfera jurídica, no caso de o processo principal vir a ser julgado procedente" (in "Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos", 2005, pág. 607 e seg.).

E Vieira de Andrade considera que as providências contemplam, tanto “o periculum in mora de infrutuosidade, que exigirá, em regra, uma providência conservatória, de modo a manter a situação existente, como o periculum in mora de retardamento, que postulará uma providência antecipatória, que antecipe parcial ou mesmo totalmente, ainda que em termos provisórios a solução pretendida” (loc. cit. pág. 325. Ver ainda a nota 700 de fls. 322).”

A propósito de uma situação em que ao requerente tinha sido aplicada a pena de aposentação compulsiva, ponderou-se no acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, de 3 d Abril de 2003, relatado pelo Conselheiro Lourenço Martins, no Proc. nº 03373, que (sic): “Para Esteves de Oliveira et alii (16), ancorado na doutrina e na jurisprudência, a noção de prejuízo irreparável abarca não apenas os "prejuízos cuja dimensão (ou o correspectivo económico) é impossível ou difícil de fixar, dado o seu carácter difuso ou aleatório, como também quando seja impossível a (futura e eventual) reconstrução da situação (pretérita ou actual) hipotética - se se vier a concluir pela revogação do acto..."

(…)  É muito abundante a jurisprudência do STA (mesmo a mais recente) no sentido de que "os prejuízos resultantes da aplicação de penas disciplinares traduzidos na privação dos vencimentos, porque economicamente quantificáveis, só deverão ser considerados como de difícil reparação, para efeitos do aludido requisito positivo, se ficar indiciariamente demonstrado que essa diminuição de rendimentos possa pôr em risco a satisfação de necessidades básicas do requerente ou do seu agregado familiar, ou que, de qualquer modo, possa implicar um drástico abaixamento do seu teor de vida". [[19]/[20]]

 "No juízo a fazer acerca da presença desse risco há que ponderar os gastos previsíveis, relacionando-os com a existência e o quantitativo de outros rendimentos".

 "Invocados apenas danos decorrentes da falta total de rendimentos do requerente, o que colocaria em perigo a sua subsistência, não se mostra preenchido o requisito previsto na alínea a) do n. 1 do art. 76 da LPTA se o acto recorrido consiste na aplicação da pena de aposentação compulsiva, cuja consequência adequada, típica, provável não consiste na total privação de rendimentos, pois ao funcionário continuam a ser abonadas determinadas quantias a título de pensão de aposentação".

 E numa formulação mais favorável aos visados:

 "A privação de vencimento de funcionário (ou equiparado), definitiva ou temporariamente afastado do exercício do cargo, é causa de dano configurável como "prejuízo de difícil reparação", para efeitos da al. a) do n.º 1 do art.º 76° da LPTA, quando diminua tão acentuadamente o rendimento do agregado familiar que ponha em risco a satisfação de necessidades pessoais elementares ou mesmo de despesas que não se afastem significativamente do padrão de vida médio de famílias da mesma condição social".

Ajaezados com a jurisprudência chegada aos casos concretos, importa ressumar a facticidade saliente para efeito de sopeso da situação que vem a julgamento, temos que, i) o requerente é solteiro; ii) não tem – ou pelo menos não foi alegada situação inversa – ninguém a seu cargo; iii) as despesas que apresentou, à excepção da renda de casa – são ocasionais e sazonais, assim, por exemplo, reparações do automóvel (por ser aquela que mais vultuosa se apresentou); iv) as demais despesas são de minguado valor.

A privação do vencimento, numa situação como a que se configura na providência requestada, para efeitos de avaliação/apreciação do requisito do periculum in mora, não pode ser distendido ou deslaçado do requisito de fumus bonus iuris

Na verdade, pensamos, que sendo os dois requisitos cumulativos [[21]] só com a verificação jurídico-material (positiva) dos dois requisitos seria possível o decretamento da providência.

Expressamos supra a nossa dubiedade quanto ao sucesso da impugnação contenciosa impulsada pelo requerente.

Do mesmo passo entendemos que a privação do vencimento, porque se trata de quantitativo monetário que poderá ser ressarcível, não coloca o requerente numa situação de difícil reparação.

O requerente refere – cfr. artigo 144.º do requerimento inicial – que “a deliberação suspendenda determina, de forma inequívoca, uma diminuição drástica do nível de vida do requerente, diminuição que causará prejuízos irreparáveis, não ressarcíveis, mesmo que venha a ser dada razão à pretensão principal do requerente, e só nessa data reembolsadas as quantias peticionadas.”       

A diminuição do nível de vida não é compaginável com uma situação passível ou compaginável com um risco de satisfação de necessidades básicas do requerente. Na verdade, o requerente, apenas alude a uma drástica diminuição do seu nível de vida, o que se admite, mas em ponto nenhum do seu razoamento coloca em causa a satisfação do seu trem de vida corrente e o preenchimento das necessidades elementares da sua vivência pessoal.

Por outro lado a ressarcibilidade dos montantes que o requerente deixará de receber, ser-lhe-iam reintegrados (na totalidade), se e quando, eventualmente, a sua pretensão principal viesse a ser deferida.    

Por tudo o que se deixa exposto, somos de entender que não se mostram verificados os requisitos de que depende o decretamento da providência requestada, pelo que improcederá.

III. – DECISÃO.

Pelo que se deixa exposto, acorda-se nesta Secção de Contencioso, em:

- Indeferir a providência requerida;

- Condenar o requerente nas custas.

Lisboa,  31 de Março de 2016

Gabriel Catarino (Relator)
Tavares de Paiva
Oliveira Mendes
Pinto de Almeida
Silva Gonçalves
Sebastião Póvoas (Presidente de Secção)

      

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[1] Quedam extractadas as razões (em diacronia) da invocação deste instituto extintivo da acção disciplinar.

“(…) o processo disciplinar nº 290/2014-PD e logo, as infracções nele averiguadas e punidas, encontra-se prescrito nos termos do disposto no artigo 6º, nº 6, do EDTFP (sobre esta prescrição veja-se o douto Acórdão deste Supremo Tribunal de 17.11.2015, proferido no âmbito do Processo nº 70/15.7YFLSB, disponível em www.dgsi.pt).
- A instauração do procedimento disciplinar com o nº 290/2014-PD ao Requerente foi proposta pelo Senhor inspector em 29.04.2014 e deliberada pelo Conselho Permanente do CSM em 20.05.2014, cfr. ponto 3.04 da ata nº 13/2014.
- Processo este que viria a ser apensado ao procedimento disciplinar nº 155/2015-PD, na sequência de uma deliberação do CSM de 10 de Fevereiro de 2015, sobre a qual o Requerente não foi notificado para previamente se pronunciar.
- Ora, entre a data da deliberação da instauração do procedimento disciplinar e o dia 13 de janeiro de 2016, data em que o Requerente foi notificado da decisão final, decorreram mais de 18 meses, nos termos do disposto no artigo 6º, nº 5, do EDTFP, aplicável à data.

[2] “(…) procedimento disciplinar supra tinha já caducado o direito de instaurar o procedimento disciplinar nos termos do disposto no artigo 6º, nº 2, do EDTP que determina que [p]rescreve igualmente quando, conhecida a infração por qualquer superior hierárquico, não seja instaurado o competente procedimento disciplinar no prazo de 30 dias”.

- Ora, a deliberação suspendenda desconsidera o processo de averiguações com o nº 4/2013, apreciado pelo Conselho Plenário do CSM em 09.07.2013 (cf. as fls. 124 e ss. do processo disciplinar apenso), processo de averiguações esse cujo objeto em larguíssima medida coincide com os factos que deram origem aos procedimentos disciplinares que culminaram com as deliberações suspendendas.

- Já eram, pois, do conhecimento do CSM e há muito as alegadas infrações sub judice.

- Conhecimento esse que, note-se, verificou-se na aceção defendida pela douta deliberação suspendenda, isto é, “o que releva é apenas o conhecimento do Conselho, órgão colegial que funciona em plenário ou permanente, nos termos sobreditos, composto pelos membros necessários ao quórum deliberativo, ao qual compete o exercício do poder disciplinar sobre magistrados judiciais”.

- Sendo que o Requerido não instaurou em tempo, nos trinta dias subsequentes a esse conhecimento, o respetivo procedimento disciplinar e tal só sibi imputat.”

[3] “(…) preceitos enunciados [refere-se aos artigos 85.º, n.º 1 e 95º, ambos do Estatuto dos Magistrados Judiciais] e, acrescenta-se, de qualquer outro preceito do EMJ, não resulta qualquer diferenciação na aplicação das penas consoante se trate de magistrado inscrito na Caixa Geral de Aposentações ou magistrado inscrito na Segurança Social e consequentemente no Centro Nacional de Pensões.

- Por outro lado, muito embora o Estatuto da Aposentação (EA), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 498/72, de 9 de Dezembro, aplicado aos trabalhadores inscritos na Caixa Geral de Aposentações preveja, nos seus artigos 42º e 37º, um período mínimo de inscrição para ver reconhecido o direito à aposentação, tal exigência também não resulta do Estatuto dos Magistrados Judiciais.”

[4] “(…) o Dr. Pestana Bastos se encontrava impedido de deliberar sobre a conduta disciplinar do Requerente, nos termos do artigo 69º, nº 1, alínea a), do CPA. 

- Na verdade, o Senhor Vogal, porque era mandatário da sociedade recorrente no âmbito dos processos de recurso de contra-ordenação com os nº 658/12.8TASTB e 2542/11.3TASTB, que corriam termos (e estão ainda pendentes) no 2º Juízo Criminal da Comarca de Setúbal, processos cujas decisões finais se encontram por proferir pelo ora Requerente - que, recorde-se, passou a estar suspenso e por conseguinte impedido de proferir as decisões finais em tais processos, a cuja produção de prova presidiu e assistiu) -, era interessado, na qualidade de representante, nas doutas deliberações ora impugnadas, cf. os documentos que ora se juntam como docs. 2 e 3.”

[5] “(…) determina o artigo 156º, nº 3, do EMJ, que [p]ara a validade das deliberações exige-se a presença de, pelo menos, 12 membros”.

- Ora conforme se constata, da douta deliberação constam apenas 11 assinaturas.

- Assim, nos termos do disposto no artigo 161º, nº 2, alínea h). [s]ão, designadamente, nulos: h) As deliberações de órgãos colegiais tomadas tumultuosamente ou com inobservância do quorum ou da maioria legalmente exigidos”.

[6] “(…)Na douta acusação deduzida o Senhor Inspector Judicial concedeu ao Requerente um prazo de 20 dias úteis para apresentação da sua defesa, tendo a mesma sido remetida para a residência dos seus progenitores em Lisboa e recebida pelos mesmos no dia 15 de Junho de 2015.

- Sucede, porém, que o Requerente não se encontrava no território continental português, porquanto nos dias 14 a 17 de Junho de 2015 esteve na ilha do Faial para participar, juntamente com outros magistrados judiciais em exercício de funções na Comarca dos Açores, (…)

- Ora, ainda que o Requerente estivesse, à data, suspenso preventivamente, tinha ainda a expectativa de continuar como juiz auxiliar na instância local da Horta.
- Assim, apenas após o seu regresso a Lisboa, que teve lugar no dia 17 de Junho, é que o Requerente teve conhecimento da notificação, considerando-se apenas nesta data devidamente notificado, não podendo o Requerente ver reduzido o seu prazo de defesa por se ter deslocado à Comarca onde estava oficialmente colocado, depois de ter sido convocado pelo Senhor Juiz Presidente.”

[7] “(…) a douta deliberação impugnada que indeferiu as diligências requeridas no requerimento de 19.10.2015 é ainda nula por violação do artigo 124º, nº 1, do EMJ que determina que [c]onstitui nulidade insuprível (…) a omissão de diligências essenciais para a descoberta da verdade que ainda possam utilmente realizar-se”.

- Ora, no requerimento de 29.10.2015 o Requerente peticionou a junção de documentos e inquirição de testemunhas para prova dos factos aí alegados.
- Tais factos são essenciais para a descoberta da verdade, sendo que a sua necessidade ganhou ainda mais relevância a partir do momento em que o CSM, por maioria, não concordou com as propostas finais dos Senhores Inspectores Judiciais de aplicação de meras penas suspensivas nem com a proposta da Senhora Vogal Dra. HH (secundada por outros Membros) no sentido da aplicação de uma pena suspensiva.”

[8] “(…) quer a pena de aposentação compulsiva quer a pena de demissão são manifestamente desproporcionais, violando-se, assim, os artigos 2º,13º, 18º, nº 2, 53º e 58º e 59º da CRP, preceito que no caso em apreço, mesmo que não se admita a caducidade do direito de instaurar um procedimento disciplinar e a prescrição do procedimento em relação à quase totalidade dos factos (note-se que a grande maioria dos factos foi regularizada logo no ano 2013, estando já decorridos mais de dois anos), não é compatível com a imediata imposição ao Requerente de uma sanção expulsiva.”
[9] “(…) em abono deste nosso entendimento, os ensinamentos doutrinais de Filipe Fraústo da Silva (“Sobre o Regime Jurídico de Prescrição de Curto Prazo no Âmbito do Ministério Público”, Revista do Ministério Público, n.º 116, ps. 147 e ss.) e de Ana Fernanda Neves (O Direito Disciplinar da Função Pública, II, Lisboa: 2007, ps. 110 – 111), sendo todavia de reconhecer que esta autora defende, numa perspectiva de iure condendo, que se “deveria considerar a simples apresentação de participação ou queixa ou o directo conhecimento” do facto naturalístico.”
[10] Queda transcrita a argumentação aduzida na resposta do Conselho Superior da Magistratura.

“O próprio Estatuto dos Magistrados Judiciais admite a coexistência de magistrados judiciais subscritores da Caixa Geral de Aposentações com outros que o não sejam.

Veja-se, designadamente, o art. 67/1, que alude a magistrados judiciais aposentados e a magistrados judiciais reformados, alargando a ambos o regime da jubilação.

Nesta medida, não está em causa o princípio da unicidade estatutária.

Como também não está em causa o princípio da igualdade: a diferença de tratamento entre uns e outros magistrados judiciais tem arrimo numa razão substantiva: uns são subscritores da CGA, outros são beneficiários do regime geral da Segurança Social.

Tal autoriza que se constitua, em relação aos primeiros, o vínculo jurídico da aposentação, o mesmo não podendo suceder quanto aos segundos. Diga-se, ainda, que a tese do Recorrente – e das declarações de voto de que ela se socorre – conduziria a um resultado inócuo para os fins aqui tidos em vista: a aplicação da pena de aposentação compulsiva – ou, com mais propriedade, de reforma compulsiva –, também ela, como a pena de demissão, de natureza expulsiva.

No mais, há que remeter para a deliberação recorrida, na qual se escreveu, com inteira propriedade, que no Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local, aprovado pelo DL n.º 24/84, de 16.01, diploma que estava em vigor aquando da elaboração do EMJ – e que, por isso, era de aplicação subsidiária em matéria disciplinar, atenta a remissão operada pelo artigo 131 deste diploma –, estavam previstas as duas penas expulsivas.

A primeira era definida como a “imposição da passagem do funcionário ou agente à situação de aposentado” e a segunda como o “afastamento definitivo do funcionário ou agente do serviço, cessando o vínculo funcional.”

Ambas pressupunham a inviabilidade da “manutenção da relação funcional”, isto é, a quebra da confiança de forma irrecuperável entre o empregador público e o trabalhador.

Distinguiam-se apenas porque a demissão produzia apenas o efeito extintivo da relação jurídica de emprego público, ao passo que, na aposentação compulsiva, a esse efeito seguia-se um outro – o de constituição, com a Caixa Geral de Aposentações, da relação jurídica de aposentado.

A aplicação da pena de aposentação compulsiva pressupunha assim, em acrescento à da demissão, que o trabalhador público fosse subscritor da Caixa Geral de Aposentações – o que, até 1 de Janeiro de 2006, sucedida, obrigatoriamente, com todos os servidores do Estado, institutos públicos e autarquias locais, suas federações e uniões e zonas de turismo (artigo 1.º do Estatuto da Aposentação, aprovado pelo DL n.º 498/72, de 9.12) – e reunisse os requisitos necessários para a aposentação ordinária, conforme decorria do art. 13/10 do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local.

A pena de aposentação compulsiva só seria aplicada, conforme dispunha o art. 26/5, verificado o condicionalismo exigido pelo Estatuto da Aposentação, na ausência do qual seria aplicada a pena de demissão.

Em conformidade, o n.º 2 do artigo 42 do Estatuto da Aposentação estabelecia, como ainda faz, que a aplicação da pena de aposentação compulsiva apenas podia ocorrer depois de a Caixa Geral de Aposentações ter informado o órgão com competência disciplinar que o subscritor reunia o pressuposto do tempo de serviço exigível, nos termos do artigo 37 do mesmo diploma, para a aposentação ordinária – mais concretamente, que tinha, pelo menos, cinco anos de serviço.

A Lei n.º 60/2005, de 29.12, a pretexto da “convergência do regime de protecção social da função pública com o regime geral da segurança social no que respeita às condições de aposentação e cálculo das pensões”, revogou o artigo 1.º do Estatuto da Aposentação (artigo 9.º) e estabeleceu que, a partir da sua entrada em vigor, no dia 1 de Janeiro de 2006, a Caixa Geral de Aposentações deixaria de proceder à inscrição de subscritores (artigo 1.º/1).

Acrescentou que o pessoal que iniciasse funções a partir da referida data passaria a ser obrigatoriamente inscrito no regime geral da segurança social, no qual não existe o instituto da aposentação, mas o da reforma.

Perante este quadro legislativo, aqueles que, como o Requerente, foram nomeados após 1 de Janeiro de 2006, não reúnem o pressuposto para a constituição da relação jurídica de aposentado e, logo, não podem ser destinatários de uma pena de aposentação compulsiva.

Não deixa, aliás, de ser sintomático que o EDTEFP, entrado em vigor no dia 1 de Janeiro de 2009 (artigo 7.º da Lei n.º 58/2008, em conjugação com o artigo 23 do Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas, aprovado pela Lei n.º 59/2008, de 11.09), tenha deixando de prever a pena de aposentação compulsiva, mantendo a de demissão (artigo 18).

O que também sucede com a LGTFP (artigos 180, d), e 297).

Nesta medida, afigura-se que o artigo 95 do EMJ não pode ser interpretado de forma estanque, que abstraia de todo o demais quadro normativo; carece, designadamente, de ser interpretado em conjugação com as normas citadas do Estatuto da Aposentação, apenas permitindo a aplicação da pena de aposentação compulsiva aos magistrados judiciais que, sendo subscritores da Caixa Geral de Aposentações, reúnam, no momento da sua aplicação, os requisitos para a aposentação ordinária, o que não era o caso do Requerente.”
[11] Queda transcrita a argumentação - estimada interessante - na resposta do Conselho Superior da Magistratura.

A atribuição da classificação de Medíocre constitui um forte indício de que o magistrado judicial ao qual é atribuída revela “inaptidão” para o exercício da função.

Só assim se se compreende que importe, ipso facto, a suspensão de funções e a instauração de inquérito (artigo 34/2 do EMJ).

O juízo de valor expresso na decisão sobre a definitiva incapacidade de adaptação às exigências da função e inaptidão profissional tem de ser actual, conforme tem entendido o STJ (cfr. Ac. de 6.05.2008, processo n.º 3766/07, e Ac. de 11.12.2012, processo n.º 61/12.0YFLSB), no sentido de que não é pertinente repristinar fases históricas e ultrapassadas da prestação profissional do magistrado judicial, situadas no passado, destacando-as e cindindo-as de uma avaliação global, integrada e actualista da sua capacidade e aptidão para continuar a exercer a profissão.

Por outro lado, o preenchimento dos aludidos conceitos tem de enquadrar não só a gravidade objectiva dos comportamentos passados violadores da relação funcional, mas deve ainda ponderar, em jeito de prognose, os efeitos dessa actuação no exercício hipotético e futuro da tarefa jurisdicional em termos de definir se o juiz de direito possui as condições indispensáveis para o exercício do cargo.

Donde, no mínimo, no desenvolvimento posterior do seu múnus, nessa avaliação prospectiva, a aferição realizada deve antever que o desempenho funcional conseguirá atingir o patamar do satisfatório.

Caso essa avaliação seja negativa, o vínculo profissional deve cessar, pois, então, será incontestável que o magistrado visado pela aplicação da notação de medíocre revela uma incapacidade definitiva de adaptação às exigências da função.

Na praxis deste Conselho Superior da Magistratura, confirmada por arestos da Secção de Contencioso do STJ (cfr., inter alia, o Ac. de 14.12.2006, processo n.º 3218/06), tem sido entendido que é incapaz de se adaptar às exigências da função quem não tiver bom senso, assiduidade, produtividade razoável, capacidade de decisão, celeridade ou método, conforme se extrai do disposto no artigo 13/3 do Regulamento das Inspecções Judiciais.

Relativamente aos atrasos, já escrevemos que a tutela do direito à obtenção da decisão em prazo razoável tem consagração constitucional e busca a sua fonte no artigo 6.º da Convenção Europeia para Protecção dos Direitos do Homem.

A prontidão na administração da justiça é fundamental para que o direito à tutela judicial tenha efectiva realização e o acesso aos tribunais também se concretiza através do direito a uma decisão judicial sem dilações indevidas.

Ao deixar acumular o serviço e ao não responder em tempo razoável aos feitos judiciários colocados sob sua apreciação, o Requerente desrespeitou frontalmente os seus deveres funcionais, violando directamente, com a sua permanente inércia e incapacidade de resposta, os direitos e as expectativas dos cidadãos e dos demais utentes da justiça na obtenção de uma protecção jurídica eficaz e temporalmente adequada.”
[12] Quedam indicadas as acções referidas no relatório de Inspecção.

“Quando cessou funções em Velas (Setembro de 2012) deixou por despachar oito processos, sendo dois para prolação de decisão em processo de instrução criminal e quase todos com conclusão aberta há longos meses (cinco deles desde Novembro de 2011): - Na acção sumária 94/1O.0TBVLS demorou cerca de sete meses e meio a decidir a matéria de facto, só o fazendo em 8 de Setembro de 2012, já depois de ter cessado funções na comarca; - As poucas sentenças cíveis que proferiu tiveram lugar ou nas férias de verão ou já depois de ter cessado funções na comarca (v.g. as acções sumárias 60/10.6TBVLS, 107/11.9TBVLS e 26/11.9TBVLS e a acção sumaríssima 237/11.TrBVlS) sendo todas datadas de Setembro de 2012.
[13] Lei n.º 15/2002, de 22 de Fevereiro, actualizada pelo Decreto-lei n.º 214-G/2015, de 2 de Outubro.
[14] Actos que pelo conteúdo da decisão assumida sejam susceptíveis de produzir efeitos desvantajosos na esfera jurídica de um particular.
[15] Não são susceptíveis de desencadear uma reacção impugnativa os actos praticados no âmbito de um procedimento administrativo como, por exemplo, os pareceres (não vinculativos) – não assim os pareceres vinculativos (Cfr. Pedro Gonçalves, “Apontamentos sobre a função e a natureza dos pareceres vinculantes, Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 0, págs. 6 a 11 –, as informações ou as propostas, os actos confirmativos – excepto se se destinarem a conformar ou completar actos decisórios anteriores que sejam dotados de eficácia externa ou seja se destinem a introduzir uma definição jurídica inovadora relativamente ao acto de que dependem e cuja eficácia tendem a completar. No entanto o acto confirmativo que complete uma decisão administrativa anterior não pode ser impugnado, autonomamente, isto é não poderá ser impugnado se o interessado já procedeu à impugnação do acto de que ele depende, ou para suprir a falta de impugnação do acto principal – e opinativos, dado que são actos que embora exprimam ou assumam uma função conformadora da decisão ao longo do desenvolvimento do procedimento administrativo têm uma função não injuntiva e se consubstanciam em juízos de valor, declarações de ciência ou opiniões. 
[16] Reproduz-se a jurisprudência citada no requerimento: Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 10.10.2002, processo nº 0135/02, de 18.12.2002, processo nº 01869/02 e de 26.11.2003, processo nº 01745/03, e Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 10.11.2011, referente ao processo nº 106/11.0YFLSB, todos disponíveis em www.dgsi.pt.
[17] Cfr. Luís Medina Alcoz, “Hacia una nueva teoria general de la causalidade en la responsabilidad civil contractual (y extracontractual): La doctrina de la pérdida de oportunidades”, Associación Española de Abogados Especializados en Reponsabilidad Civil y Seguros, n.º 30, Segundo semestre, 2009, págs. 52-54.

[18] “A propósito do “fumus bonis juris” ou, em versão negativa, do “fumus non malis juris”, os autores citados, Aroso de Almeida e Fernandes Cadilha, dizem-nos que "não é necessário um juízo de probabilidade quanto ao êxito do processo principal, basta que não seja evidente a improcedência da pretensão de fundo do requerente ou a falta do preenchimento de pressupostos dos quais dependa a própria obtenção de uma pronúncia sobre o mérito da causa" (loc. cit. pág. 609).” – extraído do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 30-10-2014, relatado pelo Conselheiro Souto Moura.

[19] Cfr. acórdão do Supremo Tribunal administrativo de 10 de Outubro de 2002, relatado pelo Conselheiro Rui Botelho, cujo sumário se deixa transcrito: “I - Os prejuízos facilmente quantificáveis não são, normalmente, qualificáveis como de "difícil reparação" para os efeitos do requisito previsto na alínea a) do n.º I do art.º 76 da LPTA. II - Os prejuízos resultantes da aplicação de penas disciplinares, traduzidos na privação de vencimentos, porque economicamente quantificáveis, só deverão ser considerados como de difícil reparação, para efeitos do preenchimento desse requisito, se ficar indiciariamente demonstrado que essa diminuição de rendimentos põe em risco a satisfação de necessidades básicas do requerente ou do seu agregado familiar, ou que, de qualquer modo, implica um drástico abaixamento do seu nível de vida.”
[20] Cfr. acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 29 de Agosto de 2001, relatado pelo Conselheiro Pais Borges, de que se resgata, na parte adrede, o respectivo sumário. “II - Os prejuízos resultantes da aplicação de penas disciplinares traduzidos na privação dos vencimentos, porque economicamente quantificáveis, só deverão ser considerados como de difícil reparação, para efeitos do aludido requisito positivo, se ficar indiciariamente demonstrado que essa diminuição de rendimentos possa pôr em risco a satisfação de necessidades básicas do requerente ou do seu agregado familiar, ou que, de qualquer modo, possa implicar um drástico abaixamento do seu teor de vida. III - A gravidade da lesão a que se refere a al. b) do citado normativo há-de ser apreciada caso a caso, de acordo com o tipo de situação concreta, o que se traduz, no caso de aplicação de sanções disciplinares, na ponderação dos factos motivadores da punição e das circunstâncias em que os mesmos ocorreram.
[21] Cfr. a este propósito o acórdão deste Supremo de 3 de Abril de 2003, supra citado, “Não se levantam dúvidas sobre a exigência cumulativa dos requisitos a que alude o citado artigo 76º, entre si e conjugados com o disposto no n.º 1 do artigo 170° do EMJ Entre outros, cfr. "Cadernos de Justiça Administrativa" n° 8, p. 61/62, n° 21, p. 51; ac. do STJ de 4.07.2002 - P.º n° 1242/02 (Ribeiro Coelho), Secção do Contencioso; ac. do STJ, de 14.02.2002, P.º n° 262/02-4.. E tal orientação não tem levado a considerar inconstitucional essa norma do artigo 76° n° 1 da LPTA (11), assim interpretada.”