Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
311/11.0TCFUN.L1.S1
Nº Convencional: 2ª SECÇÃO
Relator: SERRA BAPTISTA
Descritores: DEPOIMENTO DE PARTE
CONFISSÃO
CONFISSÃO COMPLEXA
INVERSÃO DO ÓNUS DA PROVA
Data do Acordão: 10/09/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO CIVIL - RELAÇÕES JURÍDICAS / EXERCÍCIO E TUTELA DE DIREITOS / PROVAS.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - PROCESSO / INSTRUÇÃO DO PROCESSO - PROCESSO DE DECLARAÇÃO / RECURSOS.
Doutrina:
– A. Varela, Manual do Processo Civil, pp. 540, 542.
- Lebre de Freitas, A Acção Declarativa Comum á Luz do Código de Processo Civil de 2013, p. 255, 272 e ss.; A Confissão no Direito Probatório, p. 249 e ss..
- P. Lima e A. Varela, “ Código Civil”, Anotado, vol. I, p. 320.
– Rodrigues Bastos, Notas ao CC, vol. II, pp. 139, 140.
- Vaz Serra, in Provas, Bol. 111, p. 57 e ss., e no Bol. 112, p. 52.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 352.º, 360.º, 361º.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 515.º, 722.º, N.º2, 729.º, N.º2.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-DE 12/1/99, BOL. 483, P. 160 E SS..
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ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA:
-DE 3/2/1981, C. J., ANO VI, T. 1, P. 32 E SS..
Sumário :
1. De acordo com o princípio da indivisibilidade da confissão a que alude o art. 360.º do CC, se uma declaração complexa feita em depoimento de parte, requerido pela contraparte, contiver afirmações de factos desfavoráveis ao depoente, mas também factos que lhe são favoráveis, a contraparte que se quiser aproveitar de tal confissão como meio de prova plena deve, de igual modo, aceitar a realidade dos factos que lhe são desfavoráveis. Tendo que produzir oportuna declaração em que se reserva o direito de provar o contrário dos factos que lhe são desfavoráveis. Adquirindo, então, a confissão dos factos favoráveis, mediante a prova contrária dos factos que lhe desfavoráveis, a eficácia de prova plena.

2. A indivisibilidade da confissão complexa tem, pois, como consequência a inversão do ónus da prova quanto à parte favorável ao confitente.

3. Não tendo a autora cumprido tal ónus, face à confissão complexa da ré, há que considerar também como verdadeiros os factos  favoráveis ao confitente.

4. Deve entender-se que o silêncio da contraparte, face a uma confissão complexa (feita perante si), não tomando qualquer posição, leva a que a mesma (confissão) se torne eficaz (quer quanto aos factos favoráveis, quer quanto aos desfavoráveis).

Decisão Texto Integral:
ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:




AA - TRANSPORTE DE MERCADORIAS E BETÃO, LDª veio intentar acção, sob a forma ordinária, contra BB - SOCIEDADE DE AUTO BOMBAS DE BETÃO, LDª, pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de € 31 870,00, acrescida de juros de mora, sendo os já vencidos no valor de € 2 549,00 e vincendos, até efectivo e integral pagamento.

Alegando, para tanto, e em suma:

No dia 02/06/2008 celebrou com a ré um acordo que intitularam de contrato de compra e venda de bens móveis sujeito a registo, o qual teve por objecto duas viaturas pesadas de mercadorias (autobetoneiras, uma da marca IVECO, com a matricula …-…-SG e a outra, da marca MAN, com a matricula …-…-PV), já usadas, pelo valor global de € 75 000,00.

O preço deveria ser pago, parte em dinheiro, que lhe devia ser entregue, e outra parte, mediante o pagamento a entidades terceiras de dívidas da autora para com estas.

Por conta do preço ficaram por pagar as quantias de € 20 870,07 e de € 11 000,00, pelo que a ré deve à autora este montante, que corresponde ao valor peticionado.

Sem prescindir, alegou ainda que a ré pretendeu devolver-lhe um dos veículos (IVECO) por não ter condições de pagar o preço convencionado, o que a autora não aceitou, interpelando-a, em 02/02/2011, para proceder ao pagamento do seu crédito. A ré recebeu a notificação, mas nada pagou.

Citada a ré, veio contestar, alegando, também em síntese:

Nada deve à autora, porquanto, face às dificuldades económicas com que se deparou, para continuar a cumprir o pagamento do preço conforme o acordado, contactou a autora propondo-lhe a entrega de uma das viaturas (IVECO) para desse modo as contas ficarem saldadas, ao que esta anuiu.

Em 01/01/2011, a autora levantou a referida viatura e dela tomou posse, pelo valor de € 35 000,00, tendo acordado que a viatura passaria para esfera jurídica de um terceiro, a indicar pela autora, razão pela qual não lhe foi entregue a documentação da viatura.

A A. actua de má-fé, devendo, por isso, ser condenada em multa e indemnização a fixar pelo tribunal, pois sabe que face ao acordado entre as partes nada mais lhe é devido.

A acção deve, pois, improceder.

Replicou a autora, alegando que rejeitou a proposta da ré no sentido de retomar uma das viaturas e apenas porque conhecia uma pessoa interessada na aquisição numa delas, levou a viatura IVECO para a mostrar ao interessado; quando pretendeu devolvê-la, a ré não a quis receber.

Foi proferido despacho saneador, tendo sido fixados os factos tidos por assentes e organizada a base instrutória.

Realizado o julgamento, decidiu-se a matéria de facto da base instrutória pela forma que do despacho junto de fls 68 a 71 consta.

Foi proferida a sentença que julgou a acção improcedente e absolveu a ré do pedido.

Inconformada, veio a autora, sem êxito[1], interpor recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa.

Ainda irresignada, veio a mesma autora pedir revista para este Supremo Tribunal de Justiça, formulando, na sua alegação, as seguintes conclusões:

1ª - Os quesitos 2.° e 3.° da Base Instrutória - favoráveis à R. - e, consequentemente, os pontos 9., 11. e 12. da douta sentença recorrida deveriam ter sido dados por não provados, visto que, no que a eles concerne, não se produziu, em sede de audiência de julgamento, qualquer prova minimamente capaz de suportar entendimento em sentido contrário.

2ª - De facto, o julgamento do Tribunal de 1ª Instância (quanto aos factos em questão), materializado na decisão de facto quanto à matéria controvertida e, por conseguinte, em sentença, acha-se enfermado de manifesto e grave erro quanto à interpretação e aplicação do Direito. Isto porque:

3ª - Jamais poderia o Tribunal recorrido julgar como provados os factos patentes dos quesitos 2.° e 3.º - da base instrutória - da forma que fez: com fundamento, único e exclusivo, no depoimento de parte produzido pelo legal representante da Ré.

4ª - O Tribunal cometeu sério lapso ao valorar, no sentido propalado, o supra citado depoimento e, por conseguinte, errou ao atribuir-lhe servidão para a formulação da sua convicção quanto ao julgamento de factos cuja conclusão pela sua prova ou não jamais poderia ser realizada com base na livre apreciação do depoimento de factos vertidos pelo legal representante da R. e que a esta última eram totalmente favoráveis.

5ª - Olvidou o Tribunal que o instituto processual correspondente ao depoimento de parte, visa, na sua essência, a obtenção da confissão judicial provocada, isto é, a admissão por uma das partes de um facto que lhe é desfavorável e que favorece a parte contrária e que, assim sendo, o depoimento de parte sobre factos que não são desfavoráveis a quem os presta - e que não favorecem a parte contrária - não tem valor probatório, tal como resulta directamente dos normativos previstos nos artigos 552.° a 557.° do Código de Processo Civil, que disciplinam os aspectos processuais da produção do depoimento de parte, através do qual se pode efectivar a confissão, bem como, nos artigos 352.° a 361.° do Código Civil, os quais estabelecem o regime substantivo da prova por confissão.

6ª - Sendo que, constitui, também, entendimento falacioso aquele, proferido pelo Tribunal, no sentido de que, no âmbito de declaração - não totalmente - confessória, a R. depôs quanto a factos a si favoráveis, passíveis de serem valorados enquanto elemento probatório e a favor desta. Com efeito, ao abrigo do princípio da indivisibilidade da confissão, o depoimento de parte visa a obtenção de confissão de facto desfavorável ao depoente, sendo que, quanto aos factos desfavoráveis (e nunca favoráveis!) que não constituem confissão plena mas que com ela se encontram intimamente conectados, poderá ser-lhes atribuída virtualidade confessória, por via da sua livre apreciação por parte do Tribunal. É o que se extrai do preceito do n° 4 do artigo 358º e é reiterado no artigo 361º C.Civil.

7ª - Posto isto, conclui-se que o Tribunal a quo mal andou, inclusive, no que toca à interpretação do princípio da indivisibilidade da confissão e, mormente, no que respeita aos factos que, ainda que não confessórios, se encontram com ela directamente conectados.

8ª - Isto significa que, ainda que no âmbito da confissão de um facto a si desfavorável - e favorável à A. - a R. reproduzisse factos conexos e passíveis de reverter a seu favor, não poderiam estes últimos ser valorados - contribuindo para a prova de factos cujo ónus probatório pertence ao depoente - sob pena de se desvirtuar por completo o fim que se destina o depoimento de parte.

9ª - Porém, ainda que se entendesse não serem de colher as conclusões que supra se verteram quanto ao princípio da indivisibilidade da confissão, forçoso seria concluir, mutatis mutandis, pela constatação de manifesto erro de valoração do depoimento de parte da R. e, por conseguinte, erro quanto ao julgamento da matéria de facto, um vez que:

10ª- O quesito nº 2 da base instrutória, considerado provado com base no depoimento de parte da R. é-lhe inteiramente favorável! Foi esta que o alegou como excepção ao direito invocado pela A. e era a ela que lhe cabia o ónus de prova e não à A. Posto isto, o depoimento realizado nestes termos, traduz-se num uso indevido desse meio de prova, por falta de correspondência funcional e teleológica entre o meio processual e o objecto do meio de prova fixado na lei.

11ª- Destinando-se o depoimento de parte a provocar a confissão da parte e se esta, pelo seu objecto, implica o reconhecimento de factos desfavoráveis ao depoente e favorecentes da posição da parte contrária, então bem se compreende que o depoimento só possa ser exigido quando esteja em causa o reconhecimento pelo depoente de factos cujas consequência jurídicas lhe são prejudiciais e cuja prova competiria, portanto, à parte contrária, nos termos do art. 342.° do Código Civil.

12ª- Contudo, ainda que haja sido inquirida a R. quanto a tal quesito, impunha-se a não valoração do depoimento em questão por, na verdade, ser absolutamente vazio de qualquer força probatório.

13ª- 0 depoimento prestado pela R. e que incidiu sobre o quesito 2. da base instrutória e que, reitera-se, serviu para que o tribunal o considerasse como provado, mas também os quesitos 3. e 5., é inútil, irrelevante, e não passível de ser valorado como elemento de prova, até porque, desse depoimento jamais se poderia retirar uma confissão.

14ª- Não sendo confessório (nem, tão-pouco, apresentando carácter que assim o permitisse ser) não se coloca, sequer, a possibilidade de consideração do princípio da indivisibilidade da confissão, uma vez que, para que este possa operar é conditio sine qua non que, a priori, se verifique confissão, ainda que parcial.

15ª- 0ra, aqui se deixa patenteado, expressamente e para todos os efeitos: os quesitos 2.°, 3.º e 5.° da base instrutória e, consequentemente, os pontos 9., 11. e 12. da sentença proferida constituem factos considerados provados, por força de julgamento do Tribunal a quo com base num verdadeiro "testemunho de parte".

16ª- Decisão essa que veementemente se repudia por não se afigurar correcta, justa e, por outro lado, constituir uma reversão dos princípios legais e processuais civis que regem a demanda e que, irremediavelmente, se afigura como perigosa atenta a violação da segurança e certeza jurídicas que devem nortear a decisão.

17ª- 0 Legislador, ao introduzir no Código de Processo Civil - mediante aprovação da Lei 41/2013 de 26 de Junho - o Instituto Processual previsto no artigo 466.° referente à prova por declarações das partes e estabelecendo que o Tribunal aprecia livremente essas declarações, salvo se as mesmos constituírem confissão, pretendeu expressamente, acrescentar algo de novo à regulamentação antes existente, nomeadamente, no que toca à Prova por depoimento de parte, pelo que, entende a Requerente que, aquando da realização da audiência de discussão e julgamento dos presentes autos - quando ainda se encontrava em vigor o anterior diploma - estava vedada a apreciação e valoração das declarações não confessórias resultantes do depoimento da parte e que a esta fossem favoráveis.

18ª- Entendimento contrário constitui uma violação dos princípios da segurança jurídica e da lealdade institucional, na medida em que, encontrando-se perfeitamente definido o escopo do instituto processual da prova por depoimento de parte, a Recorrente dele lançou mão, com a expectativa legítima de obter prova a si favorável e desfavorável ao depoente, tendo-se verificado precisamente o contrário, com consequências de elevada gravidade para a Recorrente, nomeadamente, a absolvição da Ré do pedido.

19ª- Sem conceder - e por mero dever de patrocínio - conclui-se, ainda, na mesma linha de raciocínio de tudo quanto se alegou que, ainda que colhesse aceitação o entendimento do Tribunal a quo, crê a A. que, do produto do depoimento de parte da R. jamais se poderia concluir pela decisão que se verificou nos presentes autos por carecer de qualquer pilar legal e factual que a suporte.

20ª- O Tribunal recorrido produziu interpretação que, com o devido respeito, não se afigura fundamentada e imparcial e insuficiente para sustentar a versão dos factos trazida aos autos pela Ré (caso os mesmos fossem de considerar).

21ª- Tendo por base as declarações da R. no âmbito do seu depoimento de parte (e reduzidas a escrito em acta de audiência de discussão e julgamento), apreciadas à luz dos ditames da ciência e da experiência comum e conciliadas com a restante prova produzida (documental e testemunhal) conclui-se que em nada estranharia (ou até mais se justificaria) decisão em sentido contrário quanto à prova dos quesitos 2.0 e 3. da base, pelo que, de tal raciocínio retira-se, ainda, outra consequência: a fundamentação do tribunal a quo - quanto à valoração daquelas declarações - está ferida de flagrante insuficiência, o que, por conseguinte, inquina o julgamento quanto à matéria de facto provada porquanto se verifica um claro lapso, não só quanto à valoração, mas também quanto à apreciação do depoimento da Ré.

22ª- Mais se demonstra como insuficiente a fundamentação do Tribunal recorrido - respeitante à valoração das declarações da R. - tendo em conta a não valoração dos depoimentos das testemunhas arroladas pela A., pelo que, o tribunal não procedeu a "avaliação em concreto (dos depoimentos das testemunhas arroladas pela A.), reconduzível a critérios objectivos e, portanto, em geral, susceptível de motivação e controlo", o que, ultimamente, se traduz em manifesto erro quanto à apreciação da prova produzida e, consequentemente em erro quanto ao julgamento da matéria considerada como provada.

23ª- O Tribunal a quo incorreu em erro ao considerar - da forma que fez - o depoimento de parte da R., enquanto elemento probatório, o qual jamais poderia deter servidão para a formulação da sua convicção quanto à matéria de facto controvertida, constante dos pontos 2., 3. e 5. da base instrutória, o que, por conseguinte, implicou manifesto erro de julgamento quanto a esses factos e, mutatis mutandis, quantos aos factos provados patentes nos pontos 9., 11. e 12. da sentença recorrida.

24ª- De tudo o que supra se expôs, conclui-se que o Tribunal a quo julgou, erradamente, como provados os factos que supra se sindicaram e, por conseguinte, não colhe, por não suportado legal e factualmente, o entendimento patenteado em sentença no sentido de que a Ré não se encontra em dívida para com a A. - relativamente ao pagamento de qualquer montante referente à venda dos camiões - por conta de dação em cumprimento (entrega de um dos veículos a fim de saldar contas).

25ª- De facto, a realidade factual e probatória a retirar da realização da diligência de julgamento é só uma: provou-se (quesito nº 1 da base instrutória) que na sequência do contrato celebrado entre as partes, permaneceram quantias por liquidar por banda da R., sendo que, cabia à R. o ónus de efectuar prova dos quesitos nº 2 e 3 e 5 da base instrutória, como forma de improcedência do peticionado pela A., o que, efectivamente - e conforme se demonstrou - não fez.

26ª- Assim sendo, tais quesitos (e sequentes pontos - factos provados ­da sentença, a eles referentes) mereciam resposta em sentido inverso, ou seja, não provados!

27ª- Pelo que, forçoso seria concluir pela procedência do pedido apresentado pela A. na presente demanda.


A recorrida não contra-alegou.


Corridos os vistos legais, cumpre, agora, apreciar e decidir.



*



Vem dado como PROVADO:

1. A A. e a ré subscreveram, no dia 2 de Junho de 2008, um contrato a que deram a designação de "contrato de compra e venda de bens móveis sujeitos a registo" conforme documento junto a fls. 6 e 7 p.p, e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais (alínea A)).

2. O contrato referido em 1. teve por objecto duas viaturas pesadas de mercadorias, usadas, denominadas "autobetoneiras", sendo uma delas da marca "IVECO", com a matrícula …-…-SG, e a outra da marca "MAN", com a matrícula …-…-PV (alínea B)).

3. No documento referido em 1. a ré declarou que tinha pleno conhecimento que tais viaturas já eram usadas e que havia sido previamente informada pela Autora do seu estado de conservação e funcionamento (alínea Q).

4. A A. comprometeu-se a diligenciar no sentido de apresentar à ré (compradora), todos os documentos necessários para o registo desses bens, o que fez (alínea D)).

5. A A. e a ré estipularam o preço da compra e venda na importância global de € 75 000,00 (setenta e cinco mil euros), conforme resulta da cláusula 4a do contrato (alínea E)).

6.   Conforme acordado pelas partes, o pagamento do preço deveria ser efectuado mediante o seguinte plano de pagamentos:

a) a importância de € 8 992,96 (oito mil novecentos e noventa e dois euros e noventa e seis cêntimos), paga através de cheque directamente à A.;

b)  a importância de € 32 485,83 (trinta e dois mil quatrocentos e oitenta e cinco euros e oitenta e três cêntimos), que a ré deveria liquidar directamente ao Centro de Segurança Social da Madeira, respeitantes a contribuições, para solver uma dívida da A., que estava explicitada no Anexo A ao contrato;

c) a importância de € 10 309,84 (dez mil trezentos e nove euros e oitenta e quatro cêntimos), que a ré deveria liquidar directamente à Direcção Geral de Contribuições e Impostos respeitantes a impostos que não foram regularizados pela A.;

d)  a importância de € 23 211,37 (vinte e três mil duzentos e onze euros e trinta e sete cêntimos), que a ré deveria liquidar directamente à sociedade comercial "CC, Ldª", referente aos fornecimentos de combustíveis que esta empresa havia efectuado à A. (alínea F)).

7. A Ré aceitou os termos estipulados, acordando na celebração do contrato (alínea G)).

8. A ré procedeu ao pagamento das seguintes quantias: a quantia de € 8992,96, através de cheque; a quantia de € 10 309,84, que era devida pela A. à Direcção Geral de Contribuições e Impostos; a quantia de € 11 615,76, à Segurança Social; a quantia de €12.211,37 à sociedade comercial "CC, Ldª" (alínea H)).

9. A ré entrou em contacto com a A. informando-a que, devido a dificuldades económicas que atravessava, não estava em condições de liquidar o remanescente do preço, pretendendo restituir-Ihe o veículo com a matrícula …-…-SG (alínea I)).

10. Na sequência do contrato referido em 1. ficaram por pagar as quantias de € 20.870,07 que não foram entregues à Segurança Social; € 11 000,00 que não foram liquidados à firma "CC, Ldª" (ponto 1.).

11. A A. anuiu ao proposto pela ré referido em 9. (ponto 2.).

12. No dia 1 de Fevereiro de 2011, o Sr. DD, legal representante da A., dirigiu-se às instalações da ré, onde levantou a viatura de marca "IVECO", com a matrícula …-…-SG, ficando saldado o valor referido em 5. (ponto 3.)

13. No dia e hora que o legal representante da sociedade A. se dirigiu às instalações da ré para levantar/retomar a viatura em causa, estavam presentes os seguintes funcionários da ré: EE; FF; GG; HH; II (ponto 4.).

14. Aquando da entrega da viatura referida em 13. a ré não entregou à A. a respectiva documentação (ponto 5.)


 *


Como é bem sabido, as conclusões da alegação do recorrente delimitam o objecto do recurso – arts 635.º, nº 4 e 639.º, nº 1 do CPC[2], bem como jurisprudência firme deste Supremo Tribunal.

Sendo, pois, as questões atrás enunciadas e que pela recorrente nos são colocadas que cumpre apreciar e decidir.


*


As quais se podem resumir à de saber se há erro de direito, por banda do Tribunal recorrido, ao persistir dar como provada a matéria de facto dos quesitos 2.º e 3.º da base instrutória, e consequentemente aos pontos 9., 11. e 12. da factualidade elencada com fundamento, único e exclusivo, no depoimento de parte produzido pelo legal representante da ré.

Ou, como também diz a recorrente ao enunciar o cerne da questão: trata-se de saber se o depoimento de parte da ré pode servir para o reconhecimento de factos que lhe são favoráveis e que por si foram alegados, constituindo, em tal enquadramento, prova única e suficiente para a procedência da sua contestação e consequente absolvição do pedido.


Pois, diz a recorrente autora, o depoimento de parte sobre factos que não são favoráveis a quem os presta, e que não favorecem a parte contrária, não têm valor probatório (arts 552.º a 557.º do CPC e 352.º a 361.º do CC[3]).

Ao dar como provada matéria de facto pela ré alegada – cujo respectivo ónus lhe incumbia – com base num depoimento de parte à mesma ré favorável, tal resulta num uso indevido de tal meio de prova, que se destina a provocar a confissão da parte, através do reconhecimento de factos desfavoráveis ao depoente, favorecentes da posição contrária.

Não sendo tal depoimento confessório, nem sequer se coloca a possibilidade da consideração do princípio da indivisibilidade da confissão.

Não sendo permitida, pelo menos à data da realização da audiência de julgamento – quando ainda vigorava o anterior CPC – a apreciação e valoração das declarações não confessórias resultantes do depoimento da parte e que a esta fossem favoráveis.

Acrescendo, ainda, diz a recorrente, que a fundamentação do Tribunal quanto à valoração das faladas declarações da parte (reduzidas a escrito), apreciadas à luz dos ditames da ciência e da experiência comum e conciliadas com a restante prova (testemunhal e documental) produzida, é insuficiente, assim estando inquinado o julgamento quanto a tal matéria de facto dada como provada.

Não tendo o Tribunal procedido à avaliação em concreto, com base em critérios objectivos, da matéria de facto considerada como provada, constante dos pontos 2., 3. e 5. da base instrutória, que mereciam a resposta de “não provado”.


Segundo a Relação (que fez vencimento) a 1ª Instância decidiu a matéria de facto inserida nos pontos 2.º, 3.º e 5.º da base instrutória socorrendo-se do regime da indivisibilidade da confissão (art. 360.º).

Ora, dizem, ainda, as senhoras Desembargadoras, confrontada a autora com a declaração complexa do legal representante da ré, que afirmou factos que lhe eram desfavoráveis e factos que lhe eram favoráveis, não prescindiu a mesma da parte confessória, nada tendo requerido, aliás, a tal respeito, sem que tivesse logrado demostrar a falta de veracidade de tais declarações (das favoráveis ao confitente), como lhe incumbia, dada a inversão do ónus da prova (arts 344.º e 360.º).

Não sendo aqui aplicável o preceituado no art. 361.º.

Sem haver insuficiência da fundamentação de facto.


Vejamos o que dizer:


No seu requerimento para produção de prova, de 6/10/2011, veio a autora requerer, além do mais, e no que ora importa, o depoimento de parte do legal representante da ré à matéria dos quesitos 1.º e 2.º da base instrutória.

Por certo para obter deste a confissão como prova plena a si favorável, sobre os factos controvertidos


Os quais têm a seguinte e respectiva redacção:

“Por conta do preço referido em E) permanecem por pagar as quantias de € 20.870,07 que não foram entregues à Segurança Social e € 11.000,00, que não foram liquidados à firma CC, Lda?”

“A autora anuiu ao proposto pela ré referido em I)[4]?”


Depoimento esse que foi admitido por despacho de 19/10/2011[5].


Na audiência de discussão e julgamento, realizada em 18/2/2013, prestou o legal representante da ré o seu depoimento de parte, estando transcrita na respectiva acta a seguinte assentada:

“Quanto ao ponto 1. da base instrutória o depoente admitiu-o integralmente.

Quanto ao ponto 2. da base instrutória referiu que contactou o legal representante da autora propondo a devolução do veículo referido na alínea I) dos factos assentes, contacto que ocorreu por telefone, tendo ficado combinado o dia e hora para a autora ir levantar o camião.

No dia 1 de Fevereiro de 2011 o legal representante da autora levou o camião e o depoente ficou convencido que a sua dívida para com a autora estava saldada.

Porém, os documentos da viatura ficaram na sua posse porque ficou combinado que seria efectuada a transmissão directamente para o potencial comprador que a autora iria contactar.

A devolução do camião foi efectuada pelo valor de € 35.000,00 e depois da sua entrega nunca mais soube o que lhe sucedeu nem foi contactado pela autora.

Quando o legal representante da autora compareceu para levar o camião apenas fizeram uma inspecção para averiguar o seu estado.”


Na acta, nenhuma posição consta ter sido tomada sobre tal assentada.


A prova dos quesitos 1.º a 5.º (quer total, quer parcial) estribou-se (apenas) no depoimento de parte do legal representante da ré, sendo desconsiderados, por nenhum conhecimento directo terem dos factos, os depoimentos testemunhais a respeito produzidos.


Dúvidas não restando que a declaração confessória sobre a matéria de facto vertida no quesito 1.º foi acompanhada da narração de outros factos que infirmando a eficácia do facto confessado, podem conduzir à extinção dos seus efeitos.

Estando-se, assim, perante uma confissão complexa (provocada[6]), já que o confitente aceita um facto (desfavorável) – não ter pago a quantia de € 20.870,07 a que, por força do contrato celebrado com a autora se obrigara a pagar – aditando a tal declaração outros factos, com aquele conexos, susceptíveis de fundamentarem uma excepção – a restituição, com a anuência da autora, de um dos camiões, ficando, assim, saldado o valor em dívida[7].


Não sendo aqui aplicável, por à data da produção de prova (ou do respectivo requerimento) tal figura não existir no nosso direito, a prova por declarações de parte, cuja valoração está sujeita à regra da livre apreciação (art. 466.º do NCPC).


Não se podendo olvidar, desde já se dirá, ter sido a ora recorrente quem, por razões de estratégia que por sua conta e risco adoptou ou por quaisquer outras, que ora não compete apurar, quem, para se aproveitar da confissão da recorrida, aliás em matéria que esta mesma tinha o ónus de provar, requereu o depoimento da contraparte.

Com certeza para daí retirar um depoimento que à mesma fosse desfavorável e que a ela, autora, favorecesse.


Mas as coisas não lhe correram de feição, pois a ré, onerada com a prova dos pontos 2. e 3. da base instrutória, afirmou factos que lhe eram favoráveis e factos que lhe eram desfavoráveis, que levaram o julgador a dar como provada a matéria ora em apreço, fulcral para o sucesso da defesa e, em consequência, para o insucesso da acção.


Ora, sendo a confissão o reconhecimento que a parte faz da realidade de um facto que lhe é desfavorável (art. 352.º)[8], a mesma, quer se trate de uma confissão qualificada[9], quer de uma confissão complexa[10], é sempre indivisível[11] e, como tal, quem dela se quiser aproveitar tem de aceitá-la na íntegra – facto favorável e desfavorável – salvo provando a inexactidão destes últimos (factos que lhe são desfavoráveis) – art. 360.º[12].


Podendo a parte nisso interessada aceitar a declaração desfavorável do confitente com a reserva do direito de provar a inexactidão dos factos ou circunstâncias que lhe são, por seu turno, desfavoráveis (e àquele depoente favoráveis).


Com efeito, de acordo com a mencionada regra da indivisibilidade da confissão[13], esta só surge se o autor se quiser dela aproveitar como meio de prova plena, tendo como consequência, a confissão complexa aceite, a inversão do ónus da prova quanto à parte favorável ao confitente.

Caso contrário, não provando a inexactidão dos factos que lhe são desfavoráveis, tem de aceitar tal confissão na íntegra.


O mencionado art. 360.º, que trata do chamado princípio da indivisibilidade[14] da confissão, respeita, pois, a uma declaração complexa que, contendo afirmação de factos desfavoráveis ao declarante, mas também de factos que lhe são favoráveis, só em parte é confessória, sendo na outra parte assertória: e, assim, dado que uns e outros desses factos são objecto da mesma declaração, entende-se que a contraparte que se queira aproveitar da parte da declaração que lhe é favorável deve igualmente aceitar a realidade dos factos que lhe são desfavoráveis.

Afirmando o declarante, por um lado, a realidade de factos constitutivos que lhe são desfavoráveis, e, por outro, a realidade dos factos que impedem, modificam ou extinguem o efeito dos primeiros[15]/[16].

Sendo certo que, ao contrário da confissão simples, tal declaração complexa só faz prova depois da parte se pronunciar, produzindo-se, assim, diferidamente o efeito da confissão, com a aceitação da parte contrária ou perante o seu silêncio.

Três vias sendo permitidas à parte contrária (à do confitente): (i) prescindir da confissão, não tendo a mesma a eficácia da prova plena, mas apenas como meio de prova sujeito à livre apreciação do julgador (art. 361.º); (ii) aceitar como tendo-se verificado os factos e as circunstâncias que lhe são desfavoráveis, ganhando, então, a confissão a eficácia de prova plena; (iii) declarar que se quer aproveitar da confissão, mas que se reserva o direito de provar a inexactidão dos factos que lhe são desfavoráveis, caso em que a confissão adquire também a eficácia da prova plena, mas a realidade de tais factos ou circunstâncias que a ela, parte contrária, são desfavoráveis só ficará completamente estabelecida se não fizer a prova do contrário. Dando-se, assim, a inversão do ónus da prova que passa a caber à contraparte[17]/[18]/[19].


A indivisibilidade da confissão complexa tem, assim, bem vistas as coisas, como consequência a inversão do ónus da prova quanto à parte favorável ao confitente[20].

Tendo a parte contrária, se não quiser ser prejudicada pela parte da confissão favorável ao confitente, de provar que ela não é verdadeira.


E, assim, não tendo a autora cumprido tal ónus, face à confissão complexa da ré, leva a que se considerem também como verdadeiros os factos alegados pelo confitente e que lhe são favoráveis, “(…) forma esta pela qual se incentiva a diligência das partes e se combate o seu silêncio por razões de política processual bem conhecidas de todos: deverem as partes dispor do processo a seu próprio risco, na esperança que da discussão entre elas nasça a luz (…).[21]


Devendo entender-se que o silêncio da parte contrária ao declarante, como já deixamos antever, não tomando posição sobre a confissão complexa de que ora curamos, e tendo em conta que o seu comportamento omissivo lhe acarreta normalmente consequências desvantajosas, sendo, ainda, certo que, de acordo com o princípio da aquisição processual, todas as provas produzidas no processo, devem, em regra, ser tomadas em apreço pelo Tribunal (art. 515.º do CPC), desde que a declaração complexa não seja feita em articulado, como ora sucede, e desde que à parte ou ao seu mandatário tenha sido dada oportunidade de se manifestar (o depoimento de parte foi prestado em audiência de julgamento, perante os mandatários das partes, com transcrição da respectiva assentada, na acta respectiva, com alegação dos mesmos quanto à matéria de facto – fls 67), podendo (e devendo) a ora recorrente, de imediato reagir ou pedir prazo para o fazer, levará a que tal confissão se torne eficaz, já que não foi feita prova (nem requerida) pela contraparte do confitente[22].


A qual só de si se poderá queixar.

Por não ter cumprido, como deveria, e caso não seja verdadeira a declaração da ré sobre a anuência da autora à sua pretensão de restituição de um dos veículos vendidos, ficando, assim, saldado o valor em dívida, o ónus que sobre si passou a impender.

Por tudo isto, sem necessidade de mais ao que se crê, a fundamentação das respostas dadas aos factos ora em crise assentou na confissão do depoente (que a própria autora provocou), de forma legítima (cfr. fls 70 e 71), de acordo com o aludido atrás versado princípio da indivisibilidade da confissão.

Sem que tivesse sido feito, contrariamente ao sustentado pela recorrente, um uso indevido deste meio de prova.

Sem que o depoimento prestado pela ré, afinal requerido apenas para prova que à mesma competia, repete-se (a existência do contrato, seu objecto e demais cláusulas com relevo para, não provasse a ré o pagamento ou forma do mesmo equivalente, já se encontrava na matéria de facto fixada pelo Tribunal) possa ser tido como inútil e irrelevante, não passível de ser valorado como elemento de prova.

Tendo o mesmo, ao invés, assumido total relevância para o desfecho da acção, bem contrário ao pela autora peticionado.


Sem que, a propósito, tenha havido qualquer erro de julgamento por banda do Tribunal recorrido (na parte que logrou vencimento).


Sendo certo que, fixada a matéria de facto pelas instâncias, não a pode este Supremo Tribunal de Justiça sindicar, estando-lhe, pois, vedada a censura, salvo a ocorrência da verificação de alguma das excepções previstas na parte final do nº 2 do art. 722.º do CPC (art. 729.º, nº 2).

O que aqui não sucede, já que, como acabámos de ver, nenhuma ofensa há, desde logo, quanto a disposição expressa da lei que fixa a força de determinado meio de prova.


*


Face a todo o exposto, acorda-se neste Supremo Tribunal de Justiça em se negar a revista, confirmando-se, assim, a decisão recorrida.

Custas pela recorrente.


Lisboa, 09 de Outubro de 2014


Serra Baptista (Relator)

Fernando Bento

João Trindade

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[1] Embora com voto de vencido de um dos senhores Juízes Desembargadores, que revogaria a sentença de 1ª instância e julgaria o pleito “em conformidade com essa outra distinta factualidade dada por provada”.
[2] Correspondentes aos anteriores arts 684º, nº 3 e 690º, nº 1 e 4.
[3] Sendo deste diploma legal todas as disposições a seguir citadas sem outra menção.
[4] É o ponto 9. dos factos antes elencados.
[5] Sendo à época vigente o CPC anterior ao actual.
[6] Pois ocorre em acto requerido pela parte contrária.
[7] À ré incumbindo o ónus da prova, quer do pagamento da quantia em dívida, quer a devolução, com a anuência da autora, de um dos camiões, assim ficando saldada a existente dívida.
[8] Ou seja, dum facto constitutivo dum seu dever ou sujeição, extintivo ou impeditivo de um seu direito ou modificativo de uma situação jurídica em sentido contrário ao seu interesse, ou, ao invés, a negação da realidade de um facto favorável ao declarante, isto é, dum facto constitutivo dum seu direito, extintivo ou impeditivo dum seu dever ou sujeição ou modificativo duma situação jurídica no sentido do seu interesse – Lebre de Freitas, A Acção Declarativa Comum á Luz do Código de Processo Civil de 2013, p. 255.
[9] Poder-se-á dizer que há uma confissão qualificada nos casos em que as circunstâncias aditadas pelo confitente alteram a fisionomia jurídica do facto reconhecido (confessado), como sucede, por exemplo, no caso de o réu reconhecer que o autor lhe entregou determinada quantia, não a título de empréstimo, como este afirma, mas sim a título de doação – A. Varela, Manual do Processo Civil, p. 540.
Dando-se tal confissão quando o reconhecimento do facto é acompanhado de modificações que alteram a sua essência ou natureza jurídica – Rodrigues Bastos, Das Relações Jurídicas, T. V, p. 120.
[10] Se a confissão for simples, limitando-se a reconhecer a veracidade do facto, nos termos do art. 352.º já citado, não se põe, por natureza, a questão da sua divisibilidade – Rodrigues Bastos, Notas ao CC, vol. II, p. 139.
[11] Tal indivisibilidade, desde logo, justifica-se como meio de estimular o confitente ao reconhecimento da verdade - Rodrigues Bastos, ob. cit., p. 140.
[12] Ac. do STJ de 12/1/99 (Miranda Gusmão), Bol. 483, p. 160 e ss.
[13] Vaz Serra, in Provas, no Bol. 112, escreveu a propósito deste princípio: “Parece dever manter-se o princípio da indivisibilidade da confissão, como meio de respeitar a intenção do confitente (que se confessa certo facto pode ser que o faça porque afirma outro que lhe restringe ou modifica o alcance) e como meio de estimular ao reconhecimento da verdade dos factos desfavoráveis ao confitente (se este sabe que a confissão vai ser aceite na sua integridade, mais facilmente será levado a confessar).” “A sua justificação (da indivisibilidade da confissão) está numa razão lógica: o facto favorável ao confitente está logicamente ligado ao favorável, constituindo ambos um todo, uma unidade, na intenção do confitente, de sorte que, se a força probatória da confissão resulta da declaração deste, o adversário pode beneficiar com ela apenas quando aceita a declaração total; e está também numa razão prática: se a confissão não fosse indivisível, poderiam muitos abster-se de confessar” – p. 52.
[14] P. Lima e A. Varela, CCAnotado, vol. I, p. 320, afirmam, a dado passo, procurando dar conta das razões deste princípio: “Se a declaração confessória é especialmente valorizada pelas grandes probabilidades que tem de ser verdadeira ou exacta uma afirmação contrária aos interesses da própria parte, não faria sentido, nem seria justo, que este crédito de sinceridade concedido ao declarante não acompanhasse a parte restante da sua declaração. Não seria justo, noutros termos, que a parte contrária pudesse sacar em seu proveito a presunção de seriedade do confitente que a lei estabelece, e a repudiasse ao mesmo tempo na parte em que a declaração contraria os seus interesses. Outra é a situação, se a parte contrária ao confitente, aceitando embora a presunção de veracidade que cobre a confissão, chama a si o encargo de demonstrar que ela não é exacta na parte favorável aos interesses do declarante”.
[15] Podendo dar-se como exemplo, o facto de o réu (declarante) reconhecer que comprou determinada coisa ao autor (tal como este afirmou no seu articulado), acrescentando que, posteriormente, modificaram o contrato que antes celebraram ou que pagou já o preço convencionado.
[16] Também o Prof. A. Varela, entre outros, dá o seguinte exemplo: O demandado confessa que recebeu a quantia que o autor alega ter-lhe emprestado; mas acrescenta que a pagou em determinada data ou que o mutuante remiu a dívida – Ob. cit., p. 540..
[17] Lebre de Freitas, ob. cit., p. 272 e ss.
[18] E, assim, se o réu confessar ter recebido a quantia que o autor afirma ter-lhe emprestado, mas acrescentando que já a restituiu ao autor, incumbirá a este provar o contrário, ou seja, que a mesma não lhe foi restituída, se quiser aproveitar-se da confissão. Sendo certo que de outro modo seria o réu que, na qualidade de devedor, haveria de provar o pagamento – A. Varela, ob. cit., p. 542.
[19] Cfr., também, Vaz Serra, ob. cit., p. 52.
[20] Vaz Serra, Provas, Bol. 111, p. 57 e ss.
[21] Ac. da RC, de 3/2/1981 (Baltazar Coelho), C. J., Ano VI, T. 1, p. 32 e ss.
[22] Lebre de Freitas, A Confissão no Direito Probatório, p. 249 e ss.