Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
1187/09.2TDLSB.L2-A.S1
Nº Convencional: 3ª SECÇÃO
Relator: PIRES DA GRAÇA
Descritores: ACÓRDÃO PARA FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Data do Acordão: 11/15/2012
Votação: UNANIMIDADE
Referência de Publicação: DR I SÉRIE, Nº 4, 07.01.2013, P. 44
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Decisão: FIXADA JURISPRUDÊNCIA
Área Temática:
DIREITO CIVIL - DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / FONTES DAS OBRIGAÇÕES / RESPONSABILIDADE CIVIL / MODALIDADES DAS OBRIGAÇÕES / OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAÇÃO / NÃO CUMPRIMENTO / FALTA DE CUMPRIMENTO E MORA IMPUTÁVEIS AO DEVEDOR.
DIREITO CONSTITUCIONAL - DIREITOS E DEVERES SOCIAIS.
DIREITO PENAL - APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DO CÓDIGO PENAL / EXTINÇÃO DA RESPONSABILIDADE CRIMINAL / RESPONSABILIDADE CIVIL EMERGENTE DE CRIME.
DIREITO PENAL ECONÓMICO - DIREITO PENAL TRIBUTÁRIO / INFRACÇÕES TRIBUTÁRIAS.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - PROCESSO DE EXECUÇÃO / EXECUÇÃO PARA PAGAMENTO DE QUANTIA CERTA.
DIREITO PROCESSUAL PENAL - SUFICIÊNCIA DO PROCESSO PENAL - SUJEITOS DO PROCESSO - FASES PRELIMINARES / NOTÍCIA DO CRIME - INQUÉRITO / ENCERRAMENTO DO INQUÉRITO - SENTENÇA - RECURSOS.
Doutrina: - ABÍLIO NETO, "Código de Processo Civil", Anotado, 16.8. ed., p. 630, nota 15.
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Legislação Nacional: CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 397.º, 483.º, 486.º, 497.º, 563.º, 566.º, Nº 2, 805º Nº 3.
CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO (CPPT), APROVADO PELO DL N.º 433/99, DE 26-10: - ARTIGOS 155.º, N.º4, 162.º, 286.º.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGO 813.º.
CÓDIGO DE PROCESSO PENAL (CPP): - ARTIGOS 7.º, 40.º, 71.º, 72.º, 74.º, 75.º, 77.º, 78.º, 82.º, 84.º, 243.º, 277.º A 283.º, 377.º, 401.º, 402.º, 403.º.
CÓDIGO PENAL (CP): - ARTIGOS 8.º, 128.º, 129.º.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGO 63.º.
DL Nº 103/80, DE 9-5: - ARTIGO 6.º
DL Nº 411/91, DE 17-10: - ARTIGO 16.º.
DL N.º 398/98, DE 17-12 - LEI GERAL TRIBUTÁRIA (LGT): - ARTIGOS 20.º, N.º2, 34.º.
DL Nº 42/2001, DE 9-2.
LEI N.º 15/2001, DE 5-6 - REGIME GERAL DAS INFRACÇÕES TRIBUTÁRIAS (R.G.I.T.): - ARTIGOS 2.º, 3.º, 9.º, 106.º, 107.º.
LEI N.º 32/2002, DE 20-12: - ARTIGO 47.º.
LEI N.º 4/2007, DE 16-1: - ARTIGOS 51.º, N.º2, 57.º.
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

-ACÓRDÃO DO PLENÁRIO DAS SECÇÕES CRIMINAIS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA, DE 16 DE OUTUBRO DE 1997, IN BMJ, 470º, 33.
-DE 15-09-2010, PROC. Nº 322/05.4TAEVR.E1.S1, 3ª SECÇÃO; DE 04-02-2010, PROC. Nº 106/01.9IDPRT.S1, 3ª SECÇÃO; DE 11-12-2008, PROC. Nº 3850/08, 5.ª SECÇÃO; TODOS DISPONÍVEIS EM WWW.DGSI.PT .
-DE 10.05.1955; DE 29.11.1955; DE 10.12.1996, IN ACÓRDÃOS DO S.T.J., IV, TOMO 3, 202; DE 07.05.1997, PROCESSO N. 1234/96; DE 11.06.1997, PROCESSO NO 331/97- 3. SECÇÃO; DE 25.02.1998, PROCESSO N. 97/98; DE 07.06.2000, PROCESSO N. 117/2000 – 3ª SECÇÃO; DE 12.01.2000, PROCESSO N. 1146/99 – 3ª SECÇÃO; DE 12.01.2000, PROCESSO N. 599/99 – 3ª SECÇÃO; DE 15.11.2001, PROCESSO N. 2626/01 – 5ª SECÇÃO; DE 06.06.2002, PROCESSO N.º1671/02 - 5.ª SECÇÃO; DE 11.12.2008; DE 29.10.2009; DE 4.02.2010, PROCESSO N.º 106/01.9IDPRT.S1, 3ªSECÇÃO; DE 15.09.2010, PROCESSO N.º 322/05.4TAEVR.E1.S1.
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-ASSENTO 7/99, DE 17 DE JUNHO DE 1999, DIÁRIO DA REPÚBLICA I- A SÉRIE DE 3 DE AGOSTO DE 1999.
-ACÓRDÃO DE FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA Nº 1/2002 DE 12 DE MARÇO DE 2002, DR 117 SÉRIE I-A, DE 2002-05-21, DECLARAÇÃO DE RECTIFICAÇÃO N.º 22/2002, DE 05 DE JUNHO DE 2002, DR 146 SÉRIE I-A, DE 2002-06-27.
-ACÓRDÃO DE FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA N.º 3/2002 DE 17.01.2002, PROC. 342/2001, D.R. 54 SÉRIE I-A, DE 2002-03-05.
-ACÓRDÃO DE FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA N.º 2/2005, DE 16.02.2005, DR, Nº 63, SÉRIE I-A, DE 2005-03-31.

ACÓRDÃOS DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL:
-Nº 211/2007, DE 21 DE MARÇO;
-N.º 522/2008, DE 29 DE OUTUBRO.

ACÓRDÃOS DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA:

-DE 28-03-2012, PROC. N.º 1133/10.0IDLRA.C1; DE 08-02-2012,PROC. N.º 4/02.9IDMGR.C1; DE 02-11-2005, PROC. N.º 2296/05; DE 13-06-2007, PROC. N.º 11773/04.1TDLSB.C1; DE 09-07-2008, PROC. N.º 81/05.0IDMGR.C1; DE 01-10-2008, PROC. N.º 187/06.9IDACB.C1; DE 11-02-2009 ,PROC. N.º 930/04.0TACBR-A.C1; DE 08-11-2011, PROC. N.º 668/09.2TDLSB.L1-5; DE 15-12-2009, PROC. N.º 11110/05.8TD.LSB.L1-5; DE 03-12-2009, PROC. N.º 7133/07.0TDLSB.L1-9; TODOS DISPONÍVEIS EM WWW.DGSI.PT .

ACÓRDÃOS DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA:

-DE 08-05-2012, PROC. N.º 2149/07.0TAFAR.E1; DE 17-01-2012 PROC. N.º 3/09.0IDFAR.E1; DE 08-11-2011, PROC. N.º 151/09.6TALGS.E1;DE 12-07-2011, PROC. N.º 384/08.2TALGS.E1; DE 22-11-2011, PROC. N.º 405/09.1TATVR.E1; DE 27-09-2011, PROC. N.º 185/09.0TABJA.E1; DE 20-09-2011, PROC. N.º 532/08.2TAABF.E1; DE 19-04-2005, PROC. N.º 2686/04-1; DE 09-12-2003, PROC. N.º 2318/03-1; TODOS DISPONÍVEIS EM WWW.DGSI.PT .

ACÓRDÃOS DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES:

-DE 21-11-2011, PROC. N.º 1453/07.1TAVCT.G2; DE 23-11-2009, PROC. N.º 214/03.1LDBRG; DE 19-07-2007, PROC. N.º 857/07-1 ; DE 22-06-2005, PROC. N.º 921/05-1; TODOS DISPONÍVEIS EM WWW.DGSI.PT .

ACÓRDÃOS DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO:

-DE 13-06-2012, PROC. N.º 1970/07.3TAGDM.P1; DE 01-02-2012, PROC. N.º 109/10.2TAPFR.P1; DE 23-11-2011, PROC. N.º 2237/07.2TAMTS.P1; DE 22-06-2011, PROC. N.º 378/05.0TALSD.P1; DE 23-02-2011, PROC. N.º 690/06.0TAMCN.P1; DE 12-03-2003, PROC. N.º 0212572; TODOS DISPONÍVEIS EM WWW.DGSI.PT .
Sumário :
«Em processo penal decorrente de crime de abuso de confiança contra a Segurança Social, p. e p. no artº 107º nº 1, do R.G.I.T., é admissível, de harmonia com o artº 71.º, do C.P.P., a dedução de pedido de indemnização civil tendo por objecto o montante das contribuições legalmente devidas por trabalhadores e membros dos órgãos sociais das entidades empregadoras, que por estas tenha sido deduzido do valor das remunerações, e não tenha sido entregue, total ou parcialmente, às instituições de segurança social.»
Decisão Texto Integral:

           Acordam no Supremo Tribunal de Justiça
         -

No processo nº 1187/09.2TDL.SB.LA-, do Tribunal da Relação de Lisboa, veio o arguido AA, id. nos autos, interpor recurso de fixação de jurisprudência, em 31 de Janeiro de 2012 (via fax), do acórdão proferido pela 3ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa, em 14 de Dezembro de 2011, e transitado em julgado em 23 de Janeiro de 2012,  formulando as seguintes conclusões:
“1.       No acórdão recorrido é exposto o entendimento que o Principio da Adesão - art. 71º e 72º do CPP - permite por si só a apreciação do pedido de indemnização cível enxertada em processo penal deduzido pela Segurança Social referentes a cotização não liquidadas muito embora a responsabilidade criminal não esteja em apreciação.
2.         O Acórdão enunciado contrasta clamorosamente com o Acórdão proferido em 23 de Março de 2010 pela 2ª Secção Criminal da Tribunal da Relação de Évora, no processo 628/07.8TAELV.EI, que desenvolve o entendimento que um pedido de indemnização cível formulado pela Segurança Social não tem natureza civil e que por isso extravasa o Principio da Adesão e o atinente regime o que obsta ao seu conhecimento.
3.         Quando é deduzido o pedido de indemnização cível, a administração fiscal já dispunha de um título executivo porque ele é um dos pressupostos da reacção penal;
4.         O título executivo reporta-se aos danos indemnizáveis, de acordo com as normas fiscais, ou seja, à prestação retida e juros de mora e tem por sujeitos da obrigação os responsáveis pelo imposto;
5.         A natureza da prestação em dívida não se altera pela interposição de um processo-crime;
6.         Reflexo desta constatação é o artº 9º do RGIT que refere que o “cumprimento da sanção aplicada não exonera do pagamento da prestação tributária devida e acréscimos legais;
7.         Tal significa que o dever de pagamento não radica na prática do crime mas na relação contributiva, que lhe é anterior e subsiste e só paralelamente lhe é atribuída dignidade penal;
8.         A natureza da divida não ser resultado da vicissitude decorrentes da aplicação de uma normal penal, porque o princípio é de que acção civil enxertada mantêm a sua potencial autonomia;
9.         A viabilidade do pedido de indemnização cível ser deduzido nos termos do art. 72.º CPP depende da natureza civilística do facto gerador da indemnização;
10.       Não tendo essa natureza a acção é inviável sem que seja necessário buscar considerações sobre a natureza do ilícito penal do facto;
11.       Temos que não é pelo facto de aquela precisa indemnização ter sido exigida anteriormente, no âmbito de um enxerto civil, quando permitida a sua autonomização que se deve aplicar necessariamente o regime substantivo civil;
12.       Este só é de aplicar como decorrência da natureza civil da obrigação até porque a natureza da divida decorre da relação jurídica ou da fonte de onde emerge a obrigação;
Assim,
13.       A obrigação de pagamento das contribuições e acréscimos legais à Segurança Social emerge de relações jurídica administrativa - tributária especial e rege-se pela legislação de direito público;
14.       O princípio da Adesão ao processo penal (art. 71 e ss CPP) apenas admite a formulação e conhecimentos de pedidos de indemnização cível conexa com o facto crime, portanto indemnização cuja obrigação se situe no âmbito das relações jurídicas privadas;
15.       A competência material dos tribunais judiciais determina-se pela sua não atribuição a outra ordem jurisdicional. Nesta medida ainda que se admita a emergências de danos civis advindo do incumprimento de obrigações tributárias, esses danos nunca se podem confundir com as consequências tributárias fixadas para esse incumprimento;
16.       Só podem ser dedutíveis pedidos de indemnização cível quando o facto ilícito tributário causou danos indemnizáveis na esfera jurídico privada de algum lesado;
17.       Só assim se respeitam as regras de delimitação de competências próprias de cada ordem jurisdiciona1 e se evita que a esfera jurisdicional civil, comum, invada a esfera jurisdicional administrativa tributária especial;
18.       As dívidas de contribuições à Segurança social não emergem de responsabilidade civil contratual, nem de responsabilidade civil extracontratual. O mesmo significa que não emerge de negócio jurídico celebrado entre entidade empregadora e a Segurança Social nem emerge de facto ilícito extra-negocial no sentido do disposto do 483º CC. Estas têm por fonte a própria lei, que se inscreve no direito público, designadamente na Lei de Bases da Segurança Social e legislação complementar, não se regendo pela lei civil;
19.       As prestações e juros de emergentes da relação tributária entre o arguido e a Segurança Social especialmente depois do processo de reversão está sob a alçada da Secção de Processos Executivos de Lisboa, estando a referida relação jurídica sujeita ao Principio da legalidade tributária, pelo que o incumprimento das obrigações estabelecidas, quer nos seus pressupostos, quer nas suas consequências subordinam-se às normas de direito administrativo-tributário pré-existente à data da prática do facto danoso;
20.       Só à jurisdição administrativa-tributária cabe a apreciação da conduta danosa e a fixação dos seus efeitos;
21.       Em consequência, o pedido de indemnização cível formulado pela Segurança Social extravasa o Principio da adesão e o explanado regime jurisdicional, pelo que se verifica uma excepção dilatória inominada, que determina o arquivamento do pedido erradamente dito de cível, o que obsta ao seu conhecimento.
Nestes termos e nos melhores de Direito que V. Exas doutamente suprirão, deverá conceder-se provimento ao recurso, revogando-se o Acórdão recorrido, declarando a absolvição do Recorrente do pedido de indemnização cível deduzido.
E assim se fará justiça!”

-
 Cumprido o disposto nos artigos 439º e 440º do CPP, veio este Supremo Tribunal, por acórdão de 12 de Julho de 2012, concluir pela oposição de julgados, prosseguindo o recurso, nos termos da 2ª parte do artigo 441º nº 1, e cumprindo-se o disposto no artº 442º nº 1, ambos do CPP.

-
             Notificados os sujeitos processuais para apresentarem no competente prazo as alegações escritas, apresentaram alegações:

            O Recorrente, concluindo:

“A) A competência material dos tribunais judiciais determina-se pela sua não atribuição a outra ordem jurisdicional. Nesta medida ainda que se admita a emergências de danos civis advindo do incumprimento de obrigações tributárias, esses danos nunca se podem confundir com as consequências tributárias fixadas para esse incumprimento;
B) Só podem ser dedutíveis pedidos de indemnização cível quando o facto ilícito tributário causou danos indemnizáveis na esfera jurídico-privada de algum lesado;
C) Só assim se respeitam as regras de delimitação de competências próprias de cada ordem jurisdicional e se evita que a esfera jurisdicional civil, comum, invada a esfera jurisdicional administrativa-tributária especial;
D) As dívidas de contribuições a Segurança Social, per si, não emergem de responsabilidade civil contratual, nem de responsabilidade civil extracontratual. O mesmo significa que não emerge de negócio jurídico celebrado entre entidade empregadora e a Segurança Social nem emerge de facto ilícito extra-negocial no sentido do disposto do 483° CC. Estas têm por fonte a própria lei, que se inscreve no direito público, designadamente na Lei de Bases da Segurança Social e legislação complementar, não se regendo pela lei civil;
E) Logo, extravasa-se o Principio da Adesão quando é atribuída natureza de obrigação civil a qualquer obrigação extra-penal conexa com a infracção criminal, pe1o que, deste Princípio necessariamente se exclui a efectivação de responsabilidade financeira, tributária disciplinar ou administrativa porquanto nestes casos há uma independência de ordenamentos jurídicos;
F) As prestações e juros de emergentes da relação tributária entre o contribuinte e a Segurança Social especialmente depois do processo de reversão está também sujeita ao Princípio da Legalidade tributária, pelo que o incumprimento das obrigações estabelecidas, quer nos seus pressupostos, quer nas suas consequências subordinam-se as normas do direito administrativo-tributário pré existente a data da pratica do facto danoso;
G) Só à jurisdição administrativa-tributária cabe a apreciação da conduta danosa e a fixação dos seus efeitos;
H) Em consequência, o pedido de indemnização cível formulado pela Seguradora Social e assente na não entrega tempestiva de prestações tributárias extravasa o Principio da adesão e o explanado regime jurisdicional, pelo que no caso em que seja deduzido verifica-se uma excepção dilatória inominada, que determina o arquivamento do pedido erradamente dito do cível, o que obsta ao seu conhecimento;
                                                           E assim se fará justiça!”

O Ministério Público, concluindo da seguinte forma:

“1. A possibilidade da jurisdição penal se pronunciar, ao abrigo das normas do artigo 71.º e seguintes do Código de Processo Penal, sobre o objecto da acção cível dependente de causa penal, restringe-se às consequências, com natureza materialmente civil, do crime.
2. O devedor substituto tem a obrigação tributária de deduzir, à remuneração do trabalhador, o montante da contribuição por este devida à Segurança Social, e de proceder à sua entrega a esta.
3. A obrigação tributária de entrega nasce logo que a entidade patronal deduz, na remuneração do trabalhador, a contribuição.
4. A partir de momento em que a obrigação de entrega se vence e não é cumprida, verifica-se o prejuízo decorrente desse incumprimento, traduzido em não entrada do valor da respectiva contribuição, nos cofres da Segurança Social, na data em que deveria ter ocorrido.
5. No crime de abuso de confiança contra a Segurança Social, p. e p. no artigo 107.º do RGIT, o comportamento do agente, que no caso é uma omissão pura, integrador do tipo de ilícito e do tipo de culpa, consiste em não entregar, dolosamente, à Segurança Social, no vencimento da obrigação tributária que sobre ele impende enquanto devedor contributivo substituto, o valor das contribuições devidas pelos trabalhadores e membros dos órgãos sociais à Segurança Social, que deduzira das remunerações destes.
6. A incriminação da omissão da obrigação tributária devida surge, nomeadamente, como uma forma de constranger o devedor tributário substituto ao cumprimento, ainda que tardio, dessa obrigação.
7. A consumação deste ilícito penal ocorre com a não entrega, dolosa, à Administração Tributária, das prestações a esta devidas, isto é, logo que se mostre violada a obrigação do devedor tributário substituto, ou seja, logo que termine o prazo para cumprimento do respectivo dever tributário de entrega, pois que a condição objectiva de punibilidade prevista no artigo 105.°, n.º 4 , do RGIT, aplicável ao crime de mera inactividade previsto no artigo 107.º, n.º 1, por força do seu n.º 2, não pertence nem ao tipo de ilícito, nem ao de culpa.
8. A mesma conduta omissiva - não entrega, pelo devedor tributário, substituto à Segurança Social, da contribuição deduzida - é valorada, simultaneamente, em sede tributária e em sede penal.
9. A violação da obrigação tributária de entrega não é anterior ao comportamento criminoso, pois que este consiste precisamente nessa violação.
10. A responsabilidade tributária e a responsabilidade penal não têm causas diversas. Radicam-se em normas distintas, de natureza tributária e de natureza penal, mas a conduta omissiva é a mesma.
11. Com a criminalização da conduta violadora da referida obrigação tributária não emerge - no que concerne aos valores contributivos, juros tributários e acréscimos legais - qualquer consequência que consubstancie um dano, para a Administração, diferente daquele que é inerente ao simples incumprimento da obrigação tributária (dano tributário), ou seja, a não entrada nos cofres da Segurança Social do montante das contribuições, cuja entrega devia ter sido feita e não foi. Assim, da prática do crime não decorre uma diminuição do património desta.
12. Danos de natureza civil, mas que não são valores da dívida tributária, poderão, porventura, resultar da referida omissão de entrega e, nesse caso, serem susceptíveis de integrar um pedido de indemnização civil em processo penal.
13. Não pode falar-se em dano civil, decorrente da prática do crime de abuso de confiança, p. e p. no artigo 107.° do RGIT, relativamente a valores de contribuições descontadas aos trabalhadores e não entregues à Segurança Social.
14. A condenação em indemnização civil não traz vantagem em responsabilizar solidariamente o devedor tributário subsidiário, pois que, só podendo o processo penal tributário prosseguir depois de assente definitivamente a dívida tributária, como consta dos artigos 42.°, n.º 4, e 47.°, n.º 1, do RGIT, muito antes de ter lugar essa condenação dispunha já a Administração Tributária de título executivo para executar a dívida no património do devedor principal e, por efeito do mecanismo da reversão, fazer pagar-se pelo património do devedor tributário subsidiário.
15. O nosso entendimento não implica, para a Segurança Social, qualquer diminuição das garantias legais que visam efectivar os interesses que lhe compete promover e acautelar.
16. A solução que defendemos afigura-se mais harmónica com os ordenamentos de direito administrativo-tributário, civil e penal, quer substantivo quer processual, convocados no presente recurso extraordinário, não conflituando assim com o princípio da adesão consagrado no art. 71.° do Código de Processo Penal, uma vez que o pedido de pagamento de valores respeitantes a contribuições à Segurança Social, juros sobre os mesmos e acréscimos legais extravasa o âmbito da adesão; e obvia, por outro lado, a um sem número de dificuldades, perplexidades e incompatibilidades de direito substantivo e processual, com que a referida jurisprudência se confronta.
17. Não constituindo a falta de pagamento de valores correspondentes a contribuições em dívida, juros e demais acréscimos um dano decorrente da prática do crime de abuso de confiança contra a Segurança Social, tendo essa matéria natureza tributária, é inadmissível, em acção cível enxertada em processo penal, a dedução de pedido do pagamento desses valores, por a mesma estar reservada à jurisdição fiscal.
É este o sentido em que a jurisprudência deve ser fixada."

            O Instituto de Segurança Social, concluindo nos seguintes termos:
“1º
No processo penal deve ser arbitrada indemnização não só quando os factos preenchem os requisitos da responsabilidade criminal, mas ainda quando, não existindo responsabilidade criminal, os factos preenchem os requisitos da responsabilidade civil conexa, de âmbito menor.
Por outro lado, recorde-se que a indemnização, no caso, não assenta na responsabilidade contratual, mas, como acima se evidenciou, nos mesmos pressupostos da responsabilidade penal (acto ilícito} ainda que de âmbito menor, por prescindir apenas do pressuposto (dolo) bastando para a verificação da responsabilidade civil a mera culpa.
O art. 377º, n.º 1, do CPP, obriga â condenação do arguido e/ou do responsável civil, na indemnização, mesmo em caso de absolvição penal, sempre que o pedido de indemnização se vier a mostrar fundado.
No caso dos autos, verificando-se a descriminalização das condutas dos arguidos, sendo extinta a sua responsabilidade criminal, ao demandado passa a ser aplicável o estatuto de parte civil, sendo que o ora Recorrente viu ser atingida a tutela das suas expectativas legítimas.
Do mesmo modo, atente-se no n.º 1 do artigo 73.º do CPP, que refere:
«O pedido de indemnização civil pode ser deduzido contra pessoas com responsabilidade meramente civil e estas podem intervir voluntariamente no processo penal».
Pode ler-se no douto acórdão do TRL) proferido no processo n.º 5573/2007-3, e publicado in www.dgsi.pt.
«O ora recorrente deduziu tempestivamente nos autos, o pedido de indemnização civil e com fundamento na responsabilidade civil conexa com a criminal, mais concretamente, por facto ilícito extracontratual ou aquiliana; o que significa que a extinção desta não implica, sem mais a extinção daquela responsabilidade civil» (cfr. citado Assento n° 7/99).
Por outro lado, refira-se que o Despacho ora recorrido viola ainda o acórdão de fixação de jurisprudência n.º 3/2002 do STJ, que estabeleceu a seguinte jurisprudência:
«Extinto o procedimento criminal por prescrição, depois de proferido o despacho a que se refere o artigo 311º do Código de Processo Penal mas antes de realizado o julgamento, o processo em que tiver sido deduzido pedido de indemnização civil prossegue para conhecimento deste».
O citado acórdão de fixação de jurisprudência aplica-se ao despacho ora recorrido que determinou a extinção da responsabilidade penal imputada nos autos aos arguidos, por efeito da descriminalização das suas condutas.
E tal como bem refere o STJ “A lei indica com suficiente clareza, que os Acórdãos para fixação de jurisprudência têm um peso próprio, que lhes ê dado pelo facto de provirem do Plenário das Secções Criminais do Supremo Tribunal de Justiça. Há, pois, que lhes conceder o benefício, para não dizer a presunção, de que foram lavrados após ponderação exaustiva, face à legislação, à doutrina e à jurisprudência existentes sobre o assunto”.
Deste modo, embora os tribunais sejam livres de seguirem, a jurisprudência que julgam mais adequada, já que o STJ não “faz lei” parece despropositado tomar outro caminho que não o acolhido no Plenário do STJ, a não ser que se invoquem argumentos novos, não considerados na decisão que fixa a jurisprudência, ou que, considerando a legislação no seu todo, a jurisprudência fixada se mostre já ultrapassada» (Cfr acórdão do STJ, n.º 04P711, datado 29/04/2004, no qual foi relator o Exmo. Senhor Juiz Conselheiro Santos Carvalho, disponível in www.dgsi.pt.).
10º
Da mesma forma, encontra-se igualmente inobservado o n.º 3 do artigo 445.º do CPP que dispõe:
«A decisão que resolver o conflito não constitui jurisprudência obrigatória para os tribunais judiciais, mas estes devem fundamentar as divergências relativas à jurisprudência fixada naquela decisão», e no acórdão de fixação de jurisprudência nº 3/2002 do STJ, bem como, não fundamenta porque diverge do STJ.
11°
Uma vez que está em causa responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos (crime de abuso de confiança contra a Segurança Social), nos termos do artigo 483.º
12°
Como sustenta o Acórdão da Relação do Porto de 28/02/2007, o pedido civil que é deduzido e conhecido no processo crime de abuso de confiança não respeita a qualquer acto de natureza tributária, mas sim à obrigação de indemnizar por danos causados, baseada na responsabilidade civil por facto ilícito e culposo, nos termos do art. 483.°, n.º 1, do Código Civil, que se subsume - como vimos - no principio da adesão.
13°
Nos termos dos arts. 283.º e  284.° do CPP os factos indiciariamente criminosos são fixados na Acusação deduzida pelo Ministério Público (e/ou pelo Assistente, desde que não importe alteração substancial daqueles), constituindo-se assim como limite nec pus ultra do pedido de indemnização civil emergente desses mesmos factos. Esta é a razão pela qual foi correcta a condenação do ISS,IP em custas sempre que o pedido civil deduzido incluiu factos que não constavam da Acusação, Novos factos criminosos deverão - isso sim - merecer tratamento autónomo, um novo Inquérito, uma nova Acusação, etc.
14°
Ainda que esteja a correr termos uma execução na Secção de Processos Executivos do Instituto de Segurança Social, IP., abreviadamente designado por SPE mantêm o interesse em agir em sede de pedido de indemnização civil num processo por crime de abuso de confiança, como aliás sustenta o Acórdão da Relação de Lisboa de 03/03/2010, destruindo o argumento da inexistência de tal interesse pelo facto de o ISS,IP estar munido de um título executivo contra os arguidos, título esse que segundo uns poucos definiria com suficiente precisão os seus direitos.
15°
O título executivo na SPE e a sentença condenatória não se referem à mesma obrigação, pois a responsabilidade pelo pagamento das contribuições não se confunde com a responsabilidade civil emergente da eventual prática do crime de abuso de confiança contra a segurança social, como sustenta o Prof. Germano Marques da Silva ("Direito Penal Tributário - Sobre as Responsabilidades das Sociedades e dos seus Administradores Conexas com o Crime Tributário", Lisboa 2009).
16°
Não se pode dizer que o demandante ISS, IP pretende usar o processo declarativo para definir um direito que já se encontrava estabelecido em termos idênticos num título com manifesta força executiva, como o que está presente nas execuções nas SPE, porque tal não corresponde à verdade.
17º
Como refere o Acórdão da Relação do Porto de 25/02/2009, a causa de pedir invocada no pedido civil deduzido pelo ISS, IP não é a obrigação legal que impendia sobre os arguidos de descontar nas remunerações dos trabalhadores da sociedade arguida as suas contribuições obrigatórias para a segurança social e de as entregar à respectiva entidade, bem como a percentagem que por lei cabe à entidade patronal, mas antes o facto ilícito de que os arguidos estão acusados em co-autoria e que constitui o crime de abuso de confiança previsto e punido no n.º 1 do art, 107.º do RGIT.
18°
Assim, a causa de pedir subjacente ao titulo no processo executivo é o incumprimento da obrigação legal de entregar as prestações devidas à segurança social, enquanto que a causa de pedir subjacente ao pedido de indemnização civil é a responsabilidade civil emergente da prática do crime de abuso de confiança em relação à segurança social que a acusação imputa em co-autoria aos arguidos.
19°
Ora a boa jurisprudência (v.g. Acórdãos de STJ de 11/12/2008 e de 29/10/2009) sustenta que a indemnização pedida nos processos crime por abuso de confiança contra a segurança social não se destina como vimos a liquidar uma obrigação tributária para com a segurança social, sendo antes fixada segundo critérios da lei civil, apesar de os factos geradores da obrigação de indemnizar e da obrigação tributária poderem ser parcialmente coincidentes não podendo naturalmente ser confundidos os seus fins e regimes.
20°
Nem há identidade da causa de pedir, pois a pretensão deduzida nas execuções nas SPE e a pretensão formulada nos pedidos de indemnização civil não procedem do mesmo facto jurídico (cfr. art.º 498.º, n.º 4, do CPC), o que determina a impossibilidade de verificação de litispendência.
21°
Estamos perante causas de pedir diferentes no processo executivo e no pedido de indemnização civil no processo-crime, os sujeitos a quem é imputada responsabilidade são distintos.
22°
Como enuncia o Acórdão da Relação de Lisboa de 03/03/2010, a responsabilidade do gerente da sociedade é, quanto às obrigações perante a segurança social, de natureza subsidiária (arts. 22º n.º 3 e 24º da LGT), só se efectivando como enunciam os Acórdãos do STJ de 26/01/2006 e de 11/12/2008, por reversão do processo de execução nas SPE, o que está sujeito aos condicionalismos previstos na lei (art.º 23.º ns. 1 e 2 da LGT).
23°
Não é demais sublinhar, como faz o Acórdão da Relação de Évora de 30/06/2004: nos termos do art.º 162.º do CPPT a execução na SPE só pode ser intentada contra a sociedade, devedora originária, só depois poderá reverter.
24°
Por outro lado, na responsabilidade civil por facto ilícito o arguido gerente, como co-autor, responde solidariamente com a sociedade arguida pelo pagamento da indemnização por danos causados à segurança social, nos termos do art. 497.º do Código Civil - art.º 3.° do RGIT, arts. 8.º e 129,° do CP, razão pela qual, para obter titulo executivo contra todos os arguidos - incluindo os não susceptíveis de figurar originariamente no título na SPE - sempre o ISS, IP terá que formular o pedido civil contra todos no processo crime (Neste sentido, Cf. António Santos Abrantes Geraldes, Temas Judiciários, vol. I, Almedina, 1998, págs. 232-234, e Abílio Neto, Código De Processo Civil Anotado, 16.ª ed., pág. 630, nota 15.).
25º.
Como afirma o Acórdão da Relação do Porto de 25/02/2009, faz toda a diferença em termos de garantias de exequibilidade patrimonial por parte da segurança social.
26º
Como também decidiu o acórdão da Relação de Coimbra de 13/06/2007, a existência de titulo executivo ou título de igual valor, não impede que se demandem os arguidos no enxerto civil deduzido em processo penal, Sendo embora o titulo executivo presente nas SPE equiparável ã sentença criminal, a verdade é que, como refere o Acórdão da Relação de Guimarães de 21/10/2002, o valor de um e outra são diferentes, pois enquanto que a oposição à execução baseada em sentença só pode ter por base algum dos fundamentos do art.º 813.º do CPC, na execução baseada no titulo emitido pela segurança social, os fundamentos de oposição são muito mais alargados, como resulta do art,º 286.° do C.P.Tributário.
27.º
Ê que o título executivo de que a Segurança Social dispõe nas SPE não lhe garante os mesmos direitos de exequibilidade relativamente ao gerente, cuja responsabilidade é meramente subsidiária, isto é, só pode fazer reverter a execução contra este depois de executado o património da sociedade.
28.º
Enquanto que, obtendo uma sentença condenatória que o responsabilize solidariamente pelo pagamento das mesmas prestações, o assistente pode accioná-lo imediatamente e a título principal e executar desde lodo o seu património individual, sem qualquer moratória.
29°
A única consequência é que o assistente não poderá servir-se ao mesmo tempo dos dois títulos executivos para cobrar a mesma quantia (podendo contudo utilizar os dois títulos executivos para cobrar quantias distintas), cobrando-a através de um dos títulos, o outro fica inutilizado.
30°
E, como alerta o Acórdão da Relação do Porto de 25/02/2009, não se diga que, com o reconhecimento dos créditos a favor do Estado em dois processos diferentes, acarreta prejuízo para a Arguida, pois que esse prejuízo só se efectivará com o pagamento em duplicado. E, desde que pague uma vez, a arguida poderá então requerer, nessa altura, a extinção da divida, pelo pagamento. E se por mero absurdo pagasse duas vezes, sempre poderia alegar o enriquecimento sem causa por parte do Estado.
31°
Por último são distintos os mecanismos prescricionais previstos para as execuções fiscais (art.º 49º n.º 1 da Lei de Bases da Segurança Social e 175.º CPPT), e para os processos criminais (art.º 21.º do RGITL pelo que podemos dizer, quanto ao efeito que a prescrição do procedimento em curso nas SPE terá na responsabilidade civil emergente da prática de crime de abuso de confiança contra a segurança social, que o mesmo é nenhum.
32°
Não configura excepção à regra o facto de a legislação tributária permitir ao demandante obter o pagamento das quantias em dívida por outros meios, concretamente pela execução fiscal,
33°
Não obstante o Instituto ser portador dum título executivo, a verdade é que a responsabilidade da Sociedade demandada assume, a natureza de responsabilidade subsidiária e a responsabilidade conjunta dos gerentes assumirá a natureza de responsabilidade solidária.
34°
Resulta inequivocamente, após a factualidade dada como provada, por sentença proferida no Tribunal de 1ª. Instância confirmada por Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, que estão preenchidos todos os pressupostos da responsabilidade civil por factos ilícitos, impondo-se a condenação solidária dos arguidos.
Nestes termos e nos melhores de Direito que V. Exas doutamente suprirão, deverá ser mantida a Mui Douta Sentença proferida no âmbito do presente processo, mantida e confirmada por Acórdão do Tribunal da Relação, e na qual o Recorrido se louva,
Assim se fazendo por Vossas Excelências, serena, sã e objectiva JUSTIÇA”


Colhidos os vistos legais, e reunido o Pleno, cumpre deliberar.


Sobre a oposição de julgados

Uma vez que o acórdão que reconheceu a existência de oposição de julgados não vincula o pleno das secções criminais, há que reapreciar a mesma questão.

Reapreciando:
           
Consta do acórdão recorrido, proferido em 14 de Dezembro de 2011, pela 3ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, no proc. nº 1187/09.2TDLSB.L2, transitado em julgado em 27 de Janeiro de 2012:

I
Por Sentença proferida nestes Autos foram os demandados AA e “TPSI - Tecnologia de Ponta em Sistemas de Informação Lda." condenados solidariamente no pagamento à Segurança Social de uma indemnização no valor de €12.312,48, acrescido dos correspondentes juros moratórios e compensatórios vencidos e vincendos, à taxa legal até integral pagamento.
Previamente a esta condenação, foi proferida decisão, já transitada em julgado, que declarou extinto, por descriminalização, o procedimento criminal contra os demandados pela prática de um crime de abuso de confiança à Segurança Social.
[…]
O recorrente impugnou a Sentença proferida nestes Autos por entender, em síntese, que esta não o poderia ter condenado no pagamento do pedido cível deduzido pelo demandante em virtude de considerar que "só à jurisdição administrativa-tributária cabe a apreciação da conduta danosa e a fixação dos seus efeitos pelo que o pedido de indemnização cível formulado pela Recorrida extravasa o Princípio da adesão e o explanado regime Jurisdicional.
O pedido de indemnização cível formulado pela Segurança Social extravasa o Princípio da adesão e o explanado regime jurisdicional, pelo que se verifica uma excepção dilatória inominada, que deveria ter determinado a absolvição do Recorrente do pedido cível deduzido.”
Entende este Tribunal da Relação carecer esta argumentação do necessário suporte legal.
Na verdade, cabendo exclusivamente à jurisdição administrativa-tributária a apreciação e conhecimento das obrigações advenientes das relações jurídicas tributárias, o procedimento criminal da competência dos Tribunais Judiciais pode albergar também um pedido cível de indemnização pelos danos resultantes de uma dada conduta criminal.
Este é, aliás, o entendimento dominante da Jurisprudência: «(...) XLII - A competência do tribunal criminal para conhecer da acção penal e da conexa acção cível enxertada não se confunde com a competência dos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal em processo de execução.
XLIII - Nestes casos não está em causa apurar da responsabilidade do recorrente perante os credores sociais, quando pela inobservância culposa das disposições legais ou contratuais destinadas à protecção desses credores, o património social se tome insuficiente para a satisfação dos respectivos créditos - n. º1 do art. 78. do CSC -, mas de apurar a sua responsabilidade civil pela prática de ilícito de natureza criminal que não foi objecto de condenação, que não exige o preenchimento dos pressupostos referidos.
XLIV - O tribunal criminal tem competência em razão da matéria para julgar a acção cível interposta pelo ISS, não havendo lugar neste tipo de processos à figura da reversão» (1) [1 n° 657/08.4 TDLSB.Ll, Relatora Des. Ma Luz Baptista]
Nestes Autos, a conduta do Arguido ao não entregar à Segurança Social as quantias que lhe são devidas constitui a causa de pedir na acção cível enxertada.
A lei processual penal estatui como regra geral o princípio da adesão obrigatória do pedido cível ao procedimento criminal - artigos 71º e 72º do CPP.
E muito embora a sua responsabilidade criminal não esteja em apreciação uma vez que por decisão transitada em julgado, foi descriminalizada a sua conduta, mantém-se a competência do Tribunal criminal para a apreciação da vertente civil dos factos em causa.
            […]
VI
Termos em que se acorda em, negando provimento ao recurso, confirmar integralmente a Sentença recorrida.
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça nos mínimos legais.”

Por sua vez explicita o acórdão fundamento, proferido pelo Tribunal da Relação de Évora, em 25 de Março de 2010, no proc. nº 628/07.8TAELV.E1, transitado em julgado em 29 de Abril de 2010: 

I – Relatório:
Em processo comum, com intervenção do Tribunal Singular, foram pronunciados:
G. Ldª, e P., residente, em Elvas,
Pela prática de um crime de abuso de confiança contra a Segurança Social, na forma continuada, p. e p. pelos artºs 107º, 105º/1, 2, 4 alíneas a) e b) e 7, e 7º/1 e 3, todos da Lei n.º 15/2001, de 05/07, com as alterações introduzidas pelas Leis nº.s 107-B/2003, de 31/12, e 53-A/2006, de 29/12.
Foi deduzido pedido de indemnização civil pelo Instituto da Segurança Social, I.P., Centro Distrital de Portalegre, contra ambos os arguidos, com fundamento em que o arguido P., em nome e com proveito da sociedade G., não entregou à demandante os valores que descontou nos salários dos trabalhadores desta, a título de contribuições para a Segurança Social, relativas a vários meses, entre Março de 2005 e Julho de 2006, no montante de € 5.254,14, peticionado, bem como os juros, a calcular nos termos do artº 16º do DL 411/91, de 17/10.
 […]
Realizado julgamento:
a) - O arguido P foi condenado pela prática, em autoria material, de um crime de abuso de confiança contra a Segurança Social, na forma continuada, p. e p. pelos artºs. 30º/2 e 79º/1 do CP, e 105º/1 e 7, 107º e 7º/3, do R.G.I.T., na pena de 80 dias de multa, à razão diária de € 3,00, o que perfaz a quantia total de € 240,00, a que correspondem, subsidiariamente, 53 dias de prisão.
b) A arguida G…, Ldª, foi condenada pela prática, em autoria material e na forma continuada, de um crime de abuso de confiança contra a Segurança Social, p. e p. pelos arts. 30º/2 e 79º/1 do CP, e 105º/1 e 7, 107º e 7º/1 todos do R.G.I.T., na pena de 200 dias de multa, à razão diária de € 6,00, o que perfaz a quantia total de € 1.200,00.

c) Ambos os demandados civis foram condenados no pagamento ao Instituto de Segurança Social, I.P. – Centro Distrital de Segurança Social de Portalegre, da quantia de € 3.195,38, acrescida dos juros de mora vencidos e vincendos até integral pagamento.
II- Questões a decidir:
[…]
As questões colocadas pelos recorrentes, arguidos, são:
A) Quanto à condenação de natureza criminal:
[…]
B) Quanto à condenação no pedido de indemnização civil a questão colocada reconduz-se à inadmissibilidade do pedido de indemnização civil (conclusões JJJ) a final).
[…]
V- Fundamentos de direito:
A) Quanto à condenação de natureza criminal:
[…]
Em conclusão: Está provada a materialidade da conduta, consistente na dedução, por parte dos arguidos, dos montantes das contribuições devidas à Segurança Social sobre os salários e na sua não entrega à Segurança Social, até ao dia 15 dos meses seguintes a que respeitavam, nem nos 90 dias subsequentes; está provado que os arguidos agiram dessa forma, com consciência e intenção de benefício próprio, apesar de saberem do dever de entrega. Tanto basta para se mostrar preenchido o tipo doloso e ilícito p. e p. no dito artº 107º/1 do RGIT, por parte de ambos os arguidos.
***
B) Quanto à condenação no pedido de indemnização civil:
[…]
A) Da inadmissibilidade do pedido de indemnização civil:
 […]
Em conclusão:
1) A obrigação de pagamento das contribuições e acréscimos legais a favor da Segurança Social emerge de relação jurídica administrativa-tributária especial e rege-se pela legislação de direito público;
2) O princípio da adesão ao processo penal e o atinente regime constante dos artigos 71º e segs, do CPP, apenas admite a formulação e conhecimento de pedido de indemnização de natureza civil conexa com o facto crime, portanto indemnização cuja obrigação se situa no âmbito das relações jurídicas privadas.
3) Consequentemente, o pedido de indemnização civil formulado pela Segurança Social extravasa esse princípio da adesão e o atinente regime, pelo que se verifica uma excepção dilatória inominada, que determina o arquivamento do pedido erradamente dito cível, o que obsta ao seu conhecimento.
Assim se resolve a questão, a nosso ver, respeitando os diversos factores de interpretação da norma (artº 129º/CP). A solução defendida tem, além do mais, a capacidade de resolver as múltiplas questões que se vêm colocando na decorrência do entendimento de que o pedido de indemnização civil relativo ao pagamento das prestações tributárias e juros (ou melhor, de valor equivalente) é dedutível em sede de enxerto no processo penal (ou autonomamente, o que é indiferente).
Retomando ao caso concreto, resulta evidente que o pedido de indemnização civil deduzido se reporta ao pagamento das contribuições devidas e juros, estes a calcular nos termos do artº 16º do DL 411/91, de 17/10.
As referidas prestações e juros emergem da relação tributária que se estabeleceu entre a Segurança Social e a arguida sociedade, não tendo que ver com qualquer pretensão indemnizatória de índole jurídico-privada.
Essa relação está sujeita ao princípio da legalidade tributária, pelo que o incumprimento das obrigações que lhe subjazem se subordina, quer nos seus pressupostos, quer nas suas consequências, às normas de direito administrativo-tributário pré-existentes à data da prática do facto danoso (que não coincide com o momento da consumação do crime de abuso de confiança).
Apenas à jurisdição administrativa-tributária cabe a apreciação da conduta danosa e a fixação dos seus efeitos. Não é pois admissível o pedido de indemnização formulado, no âmbito do processo de adesão, por não ser o meio próprio para o efeito, pelo que se impõe a revogação da sentença recorrida quanto à condenação no pedido de indemnização civil, o que determina que não se conheça do pedido indemnizatório deduzido.
Face à conclusão retirada não há lugar à apreciação das questões colocadas pelos recorrentes como fundamento da revogação da decisão, porque prejudicadas.
VI- Decisão:
Acorda-se, pois, concedendo parcial provimento ao recurso, em:
- Manter a condenação penal contida na decisão recorrida;
- Revogar a sentença recorrida quanto à condenação em pedido de indemnização civil, de que não se conhece, por ser inadmissível a sua dedução em face do princípio de adesão.
Custas criminais pelos recorrentes, fixando-se a taxa de justiça em 3 ucs.
Custas do recurso, na parte relativa ao pedido de indemnização civil, pelo recorrido, Instituto da Segurança Social, I.P., Centro Distrital de Portalegre.”
Ambos os acórdãos - recorrido e fundamento – pronunciaram-se,  em recurso, sobre a condenação havida dos demandados em pedido de indemnização civil, tendo por objecto as quantias referentes a prestações devidas e não entregues à Segurança Social,  constituindo aliás, tal conduta omissiva, crime de abuso de confiança contra a Segurança Social.

            No acórdão recorrido considerou-se que “a conduta do Arguido ao não entregar à Segurança Social as quantias que lhe são devidas constitui a causa de pedir na acção cível enxertada.
A lei processual penal estatui como regra geral o princípio da adesão obrigatória do pedido cível ao procedimento criminal - artigos 71º e 72º do CPP.
E muito embora a sua responsabilidade criminal não esteja em apreciação uma vez que por decisão transitada em julgado, foi descriminalizada a sua conduta, mantém-se a competência do Tribunal criminal para a apreciação da vertente civil dos factos em causa.“
E veio a negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida.

Já, porém, o acórdão fundamento, considerou que “Apenas à jurisdição administrativa-tributária cabe a apreciação da conduta danosa e a fixação dos seus efeitos. Não é pois admissível o pedido de indemnização formulado, no âmbito do processo de adesão, por não ser o meio próprio para o efeito (…)”.
E, assim, decidiu revogar a sentença recorrida quanto à condenação em pedido de indemnização civil” de que não conheceu, “por ser inadmissível a sua dedução em face do princípio de adesão.”

Ambos os acórdãos – recorrido e fundamento - assentaram pois, em situação de facto idêntica atinente a pedido de indemnização civil em processo penal, decorrente de ilícito penal fiscal, relativo ao valor de prestações tributárias devidas, e não entregues à Segurança Social, perfilhando soluções de direito opostas, no domínio da mesma legislação, sobre a exigência dos respectivos montantes em pedido de indemnização civil.

Conclui-se, pois, pela oposição entre os julgados.


Identificação do objecto do presente recurso:

A questão objecto do presente recurso centraliza-se exclusivamente na admissibilidade ou não do pedido de indemnização civil em processo penal, que tenha por objecto o ressarcimento da quantia correspondente ao montante de contribuições - prestações tributárias, incluindo os respectivos juros - devidas e não entregues à Segurança Social, contempladas no artº 107º nº 1, do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT), cuja conduta omissiva constitui de crime de abuso de confiança contra a Segurança Social.
 A questão consiste em saber se o valor dessas contribuições, devidas e não entregues à Segurança Social, que integram a materialidade desse ilícito penal fiscal, pode ser reclamado em processo penal desencadeado por tal crime, face ao princípio da adesão, ou se o ressarcimento do referido valor por tais dívidas à Segurança Social, não pode constituir objecto de pedido de indemnização civil em processo penal, por ser da exclusiva competência da jurisdição administrativa fiscal a sua liquidação e cobrança.

Explicitando de outra forma:
Cabendo embora exclusivamente à jurisdição administrativa-tributária a apreciação e conhecimento das obrigações advenientes das relações jurídicas tributárias, isso não obsta a que esteja incluído na competência material dos tribunais judiciais o conhecimento do pedido cível de indemnização pelos danos resultantes de uma dada conduta criminal, formulado pela Segurança Social nos termos do artigo 71.º do Código de Processo Penal?”

Ou ainda como questiona a Exma Magistrada do Ministério Público em suas doutas alegações:
“O pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime de abuso de confiança contra a segurança social, previsto e punido no artigo 107.° do RGIT, pode incluir valores de contribuições deduzidas e não entregues à segurança social?”

Posição da Jurisprudência

A jurisprudência quase unânime, vai no sentido de que a competência do tribunal criminal para conhecer da acção penal e da conexa acção cível enxertada não se confunde com a competência dos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal, em processo de execução., tendo o tribunal criminal competência em razão da matéria para julgar a acção cível interposta pelo Instituto de Segurança Social (ISS.IP)
As acções que têm por objecto os actos tributários de liquidação e execução de tributos, e as acções de indemnização resultante da prática de crimes fiscais, têm causas de pedir e pedidos diferentes.
Pelos danos causados pelos crimes tributários respondem os agentes do crime não nos termos da Lei Geral Tributária, mas nos termos da lei civil
No pedido civil deduzido em processo penal, atinente à prática de um crime de abuso de confiança contra a Segurança Social [artigo 107.º, do RGIT], a fonte da obrigação é a responsabilidade civil decorrente da prática de um crime e não a lei que define a obrigação de entregar certas quantias à Segurança Social.
A qualificação como crime do acto do agente confere uma substancial especificidade à causa de pedir do enxerto cível: o facto jurídico concreto que a enforma não se identifica com o mero incumprimento de uma obrigação fiscal, mas com o incumprimento portador dos elementos objectivo-subjectivos do crime de abuso de confiança contra a Segurança Social.

Servem de exemplo, entre outros, os seguintes acórdãos – todos disponíveis em www.dgsi.pt - dos seguintes tribunais:

Supremo Tribunal de Justiça
           
            Acórdão de 15-09-2010, Proc. nº 322/05.4TAEVR.E1.S1, 3ª secção; Acórdão de 04-02-2010, Proc. nº 106/01.9IDPRT.S1, 3ª secção; Acórdão de 11-12-2008, Proc. nº 3850/08, 5.ª secção;     

Tribunal da Relação de Guimarães

Acórdão de 21-11-2011, Proc. n.º 1453/07.1TAVCT.G2; Acórdão de 23-11-2009, Proc. n.º 214/03.1LDBRG; Acórdão de 19-07-2007, Proc. n.º 857/07-1 ; Acórdão de 22-06-2005, Proc. n.º 921/05-1.

Tribunal da Relação do Porto

Acórdão de 13-06-2012, Proc. n.º 1970/07.3TAGDM.P1; Acórdão de 01-02-2012, Proc. n.º 109/10.2TAPFR.P1; Acórdão de 23-11-2011, Proc. n.º 2237/07.2TAMTS.P1; Acórdão de 22-06-2011, Proc. n.º 378/05.0TALSD.P1; Acórdão de 23-02-2011, Proc. n.º 690/06.0TAMCN.P1; Acórdão de 12-03-2003,  Proc. n.º 0212572. 

Tribunal da Relação de Coimbra

Acórdão de 28-03-2012, Proc. n.º 1133/10.0IDLRA.C1; Acórdão de 08-02-2012,Proc. n.º 4/02.9IDMGR.C1; Acórdão de 02-11-2005, Proc. n.º 2296/05; Acórdão de 13-06-2007, Proc. n.º 11773/04.1TDLSB.C1; Acórdão de 09-07-2008, Proc. n.º 81/05.0IDMGR.C1; Acórdão de 01-10-2008, Proc. n.º 187/06.9IDACB.C1, Acórdão de11-02-2009 ,Proc. n.º 930/04.0TACBR-A.C1; Acórdão de 08-11-2011, Proc. n.º 668/09.2TDLSB.L1-5; Acórdão de 15-12-2009, Proc. n.º 11110/05.8TD.LSB.L1-5; Acórdão de 03-12-2009, Proc. n.º 7133/07.0TDLSB.L1-9. 

Tribunal da Relação de Évora

Acórdão de 08-05-2012, Proc. n.º 2149/07.0TAFAR.E1; Acórdão de 17-01-2012 Proc. n.º 3/09.0IDFAR.E1; Acórdão de 08-11-2011, Proc. n.º 151/09.6TALGS.E1; Acórdão de 12-07-2011, Proc. n.º 384/08.2TALGS.E1; Acórdão de 22-11-2011, Proc. n.º 405/09.1TATVR.E1; Acórdão de 27-09-2011, Proc. n.º 185/09.0TABJA.E1; Acórdão de 20-09-2011, Proc. n.º 532/08.2TAABF.E1; Acórdão de 19-04-2005, Proc. n.º 2686/04-1; Acórdão de 09-12-2003, Proc. n.º 2318/03-1. 

Por sua vez, a tese oposta, encontra-se aqui legitimada pelo acórdão fundamento, proferido pelo Tribunal da Relação de Évora, em 25 de Março de 2010, no proc. nº 628/07.8TAELV.E1, ao entender que a apreciação do pedido de indemnização civil deduzido pela Segurança Social referente ao pagamento de indemnização, correspondente ao valor das prestações em dívida, acrescidos de juros, “pressupõe, necessariamente, duas circunstâncias: a adequação do meio (enxerto civil em processo crime) ao fim visado (pedido de indemnização) e a natureza civil do pedido.”
Segundo esta tese:
- O princípio da adesão limita-se à unificação de procedimentos criminais e civis e restringe-se ao âmbito civil das consequências dos factos com relevância penal. Dele se exclui a efectivação da responsabilidade disciplinar, administrativa, financeira e tributária, casos em que há uma independência de acções. Ora, o regime dos artºs 71º e segs do CPP, que traduz o princípio da adesão, apenas adjectiva o artigo 129º/CP;
- A relação jurídica que está subjacente ao crime de abuso de confiança contra a Segurança Social tem a natureza de jurídica administrativa-tributária (artº 11º/a), do RGIT) - e daí que, na execução por dívida de contribuições à Segurança Social, as questões jurisdicionais sejam da competência dos Tribunais Tributários (artº 62º do ETAF). Resulta de um acto de gestão pública, praticado no exercício de uma função pública para os fins de direito público da pessoa colectiva, ou seja, é regido pelo direito público e, consequentemente, por normas que atribuem à pessoa colectiva pública poderes de autoridade (ius imperii) para tais fins.
- Essa relação está sujeita ao princípio da legalidade tributária, pelo que o incumprimento das obrigações que lhe subjazem se subordina, quer nos seus pressupostos, quer nas suas consequências, às normas de direito administrativo-tributário pré existentes à data da prática do facto danoso (que não coincide com o momento da consumação do crime de abuso de confiança).
- Apenas à jurisdição administrativa-tributária cabe a apreciação da conduta danosa e a fixação dos seus efeitos. Não é pois admissível o pedido de indemnização formulado, no âmbito do processo de adesão, por não ser o meio próprio para o efeito
- A dívida de contribuições à Segurança Social não emerge de responsabilidade civil contratual, nem emerge de responsabilidade civil extracontratual. O mesmo vale por dizer: não emerge de negócio jurídico celebrado entre a entidade empregadora e a Segurança Social, nem emerge de facto ilícito extra-negocial no sentido do disposto no artigo 483º/CC. Tem sim por fonte a própria lei, que se inscreve no direito público, designadamente o DL nº 103/80 de 09/05 (Lei de Bases da Segurança Social), o DL nº 42/2001, de 09/02 e legislação complementar. A dívida de contribuições à Segurança Social não se rege pela lei civil.
- O regime da dívida e da sua cobrança obedece a regras específicas constantes desse acervo de direito público, designadamente:
1) A obrigação de pagamento das contribuições e acréscimos legais a favor da Segurança Social emerge de relação jurídica administrativa-tributária especial e rege-se pela legislação de direito público;
2) O princípio da adesão ao processo penal e o atinente regime constante dos artigos 71º e segs, do CPP, apenas admite a formulação e conhecimento de pedido de indemnização de natureza civil conexa com o facto crime, portanto indemnização cuja obrigação se situa no âmbito das relações jurídicas privadas.
3) Consequentemente, o pedido da de indemnização civil formulado pela Segurança Social extravasa esse princípio da adesão e o atinente regime, pelo que se verifica uma excepção dilatória inominada, que determina o arquivamento do pedido erradamente dito cível, o que obsta ao seu conhecimento.

Equacionada a questão, cumpre apreciar e decidir.

Antes de mais, convém, para melhor compreensão da questão in judicio efectuar uma breve panorâmica sobre a relação jurídica tributária.

I
A relação jurídica tributária
A Lei Geral Tributária
O Decreto-Lei n.º 398/98, de 17-12-98 - DR n.º 290/98 SÉRIE I-A, - com subsequentes actualizações -  aprovou a Lei Geral Tributária (LGT), que enuncia e define os princípios gerais que regem o direito fiscal português e os poderes da administração tributária e garantias dos contribuintes.[1]
Integram a relação jurídica tributária:
a) O crédito e a dívida tributários;
b) O direito a prestações acessórias de qualquer natureza e o correspondente dever ou sujeição;
c) O direito à dedução, reembolso ou restituição do imposto;
d) O direito a juros compensatórios;
e) O direito a juros indemnizatórios.[2]

Na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis.[3]
Consideram-se relações jurídico-tributárias as estabelecidas entre a administração tributária, agindo como tal, e as pessoas singulares colectivas e outras entidades legalmente equiparadas a estas.[4]
O sujeito activo da relação tributária é a entidade de direito público titular do direito de exigir o cumprimento das obrigações tributárias, quer directamente quer através de representante.[5]
 O sujeito passivo é a pessoa singular ou colectiva, o património ou a organização de facto ou de direito que, nos termos da lei, está vinculado ao cumprimento da prestação tributária, seja como contribuinte directo, substituto ou responsável.[6]
Constitui obrigação principal do sujeito passivo efectuar o pagamento da dívida tributária.
São obrigações acessórias do sujeito passivo as que visam possibilitar o apuramento da obrigação de imposto, nomeadamente a apresentação de declarações, a exibição de documentos fiscalmente relevantes, incluindo a contabilidade ou escrita, e a prestação de informações.[7]

A substituição tributária verifica-se quando, por imposição da lei, a prestação tributária for exigida a pessoa diferente do contribuinte e, é efectivada através do mecanismo da retenção na fonte do imposto devido.[8]

Salvo disposição da lei em contrário, quando os pressupostos do facto tributário se verifiquem em relação a mais de uma pessoa, todas são solidariamente responsáveis pelo cumprimento da dívida tributária.
No caso de liquidação de sociedades de responsabilidade ilimitada ou de outras entidades sujeitas ao mesmo regime de responsabilidade, os sócios ou membros são solidariamente responsáveis, com aquelas e entre si, pelos impostos em dívida.[9]

A responsabilidade tributária abrange, nos termos fixados na lei, a totalidade da dívida tributária, os juros e demais encargos legais.
Para além dos sujeitos passivos originários, a responsabilidade tributária pode abranger solidária ou subsidiariamente outras pessoas, sendo que a responsabilidade tributária por dívidas de outrem é, salvo determinação em contrário, apenas subsidiária.
As pessoas solidárias ou subsidiariamente responsáveis poderão reclamar ou impugnar a dívida cuja responsabilidade lhes for atribuída nos mesmos termos do devedor principal, devendo, para o efeito, a notificação ou citação conter os elementos essenciais da sua liquidação, incluindo a fundamentação nos termos legais.[10]
Sobre a responsabilidade dos membros de corpos sociais e responsáveis técnicos, o Artigo 24º da referida Lei, determina:
1 — Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:
a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;
b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.
2 — A responsabilidade prevista neste artigo aplica-se aos membros dos órgãos de fiscalização e revisores oficiais de contas nas pessoas colectivas em que os houver, desde que se demonstre que a violação dos deveres tributários destas resultou do incumprimento das suas funções de fiscalização.
3 — A responsabilidade prevista neste artigo aplica-se também aos técnicos oficiais de contas em caso de violação dolosa dos deveres de assunção de responsabilidade pela regularização técnica nas áreas contabilística e fiscal ou de assinatura de declarações fiscais, demonstrações financeiras e seus anexos

A responsabilidade subsidiária efectiva-se por reversão do processo de execução fiscal.
A reversão contra o responsável subsidiário depende da fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal e dos responsáveis solidários, sem prejuízo do benefício da excussão.
Caso, no momento da reversão, não seja possível determinar a suficiência dos bens penhorados por não estar definido com precisão o montante a pagar pelo responsável subsidiário, o processo de execução fiscal fica suspenso desde o termo do prazo de oposição até à completa excussão do património do executado, sem prejuízo da possibilidade de adopção das medidas cautelares adequadas nos termos da lei.
A reversão, mesmo nos casos de presunção legal de culpa, é precedida de audição do responsável subsidiário nos termos da presente lei e da declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação.
O responsável subsidiário fica isento de juros de mora e de custas se, citado para cumprir a dívida tributária principal, efectuar o respectivo pagamento no prazo de oposição, mas não prejudica a manutenção da obrigação do devedor principal ou do responsável solidário de pagarem os juros de mora e as custas, no caso de lhe virem a ser encontrados bens.[11]

Em caso de substituição tributária, a entidade obrigada à retenção é responsável pelas importâncias retidas e não entregues nos cofres do Estado, ficando o substituído desonerado de qualquer responsabilidade no seu pagamento.[12]

O pagamento das dívidas tributárias pode ser realizado pelo devedor ou por terceiro.
O terceiro que proceda ao pagamento das dívidas tributárias após o termo do prazo do pagamento voluntário fica sub-rogado nos direitos da administração tributária, desde que tenha previamente requerido a declaração de sub-rogação e obtido autorização do devedor ou prove interesse legítimo.[13]

A cobrança da prestação tributária suspende-se no processo de execução fiscal em virtude de pagamento em prestações ou reclamação, recurso, impugnação da liquidação e oposição à execução que tenham por objecto a ilegalidade ou inexigibilidade da dívida exequenda.
A suspensão da execução nesse âmbito, depende da prestação de garantia idónea nos termos das leis tributárias, podendo a administração tributária exigir ao executado o reforço da garantia no caso de esta se tornar manifestamente insuficiente para o pagamento da dívida exequenda e acrescido.[14]

O procedimento tributário, compreende toda a sucessão de actos dirigida à declaração de direitos tributários, designadamente:[15]
a) […]
b) A liquidação dos tributos quando efectuada pela administração tributária;
c) […]
d) […]
e) […]
f) As reclamações e os recursos hierárquicos;
g)[…]
h) A cobrança das obrigações tributárias, na parte que não tiver natureza judicial.

O processo de execução fiscal tem natureza judicial, sem prejuízo da participação dos órgãos da administração tributária nos actos que não tenham natureza jurisdicional, sendo garantido aos interessados o direito de reclamação para o juiz da execução fiscal dos actos materialmente administrativos praticados por órgãos da administração tributária.[16]

                                   O Código de Procedimento e de Processo Tributário

Há que ter ainda em conta o Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 433/99, de 26 de Outubro, que se aplica, sem prejuízo do disposto no direito comunitário, noutras normas de direito internacional que vigorem directamente na ordem interna, na lei geral tributária ou em legislação especial, incluindo as normas que regulam a liquidação e cobrança dos tributos parafiscais:
a) Ao procedimento tributário;
b) Ao processo judicial tributário;
c) À cobrança coerciva das dívidas exigíveis em processo de execução fiscal;
d) Aos recursos jurisdicionais.

O procedimento tributário compreende, para efeitos do presente Código:
[…]
b) A liquidação dos tributos, quando efectuada pela administração tributária;
[…]
g) A cobrança das obrigações tributárias, na parte que não tiver natureza judicial;
h)[…]
i) Todos os demais actos dirigidos à declaração dos direitos tributários.[17]

A cobrança das dívidas tributárias pode ocorrer sob as seguintes modalidades:
a) Pagamento voluntário;
b) Cobrança coerciva.[18]

A concessão da moratória ou a suspensão da execução fiscal fora dos casos previstos na lei, quando dolosas, são fundamento de responsabilidade tributária subsidiária, a qual depende de condenação disciplinar ou criminal do responsável.[19]

O processo judicial tributário compreende:[20]
a) A impugnação da liquidação dos tributos, incluindo os parafiscais e os actos de autoliquidação, retenção na fonte e pagamento por conta;
[…]
n) O recurso, no próprio processo, dos actos praticados na execução fiscal;
o) A oposição, os embargos de terceiros e outros incidentes e a verificação e graduação de créditos;
p) O recurso contencioso do indeferimento total ou parcial ou da revogação de isenções ou outros benefícios fiscais, quando dependentes de reconhecimento da administração tributária, bem como de outros actos administrativos relativos a questões tributárias que não comportem apreciação da legalidade do acto de liquidação;
q) Outros meios processuais previstos na lei.
[…]

A nível da execução fiscal
O processo de execução fiscal abrange a cobrança coerciva das seguintes dívidas:[21]
a) Tributos, incluindo impostos aduaneiros, especiais e extrafiscais, taxas, demais contribuições financeiras a favor do Estado, adicionais cumulativamente cobrados, juros e outros encargos legais;
b) Coimas e outras sanções pecuniárias fixadas em decisões, sentenças ou acórdãos relativos a contra-ordenações tributárias, salvo quando aplicadas pelos tribunais comuns.
2 — Poderão ser igualmente cobradas mediante processo de execução fiscal, nos casos e termos expressamente previstos na lei:
a) Outras dívidas ao Estado e a outras pessoas colectivas de direito público que devam ser pagas por força de acto administrativo;
b) Reembolsos ou reposições.

Considera-se, para efeito do Código, órgão da execução fiscal o serviço periférico local da administração tributária onde deva legalmente correr a execução ou, quando esta deva correr nos tribunais comuns, o tribunal competente.[22]

Compete ao tribunal tributário de 1ª instância da área onde correr a execução, depois de ouvido o Ministério Público nos termos do presente Código, decidir os incidentes, os embargos, a oposição, incluindo quando incida sobre os pressupostos da responsabilidade subsidiária, a graduação e verificação de créditos e as reclamações dos actos materialmente administrativos praticados pelos órgãos da execução fiscal. [23]
Esta situação, contudo, não se aplica quando a execução fiscal deva correr nos tribunais comuns, caso em que cabe a estes tribunais o integral conhecimento das questões referidas [24]
As dívidas exigíveis em processo executivo poderão ser pagas em prestações mensais e iguais, mediante requerimento a dirigir, no prazo de oposição, ao órgão da execução fiscal, só não é aplicável às dívidas de recursos próprios comunitários e às dívidas liquidadas pelos serviços por falta de entrega, dentro dos respectivos prazos legais, de imposto retido na fonte ou legalmente repercutido a terceiros, salvo em caso de falecimento do executado, contando-se nesse caso o prazo para o requerimento do pagamento a partir da citação nos termos do n.º 4 do artigo 155.º
É excepcionalmente admitida a possibilidade de pagamento em prestações das dívidas referidas, requerido no prazo de oposição, sem prejuízo da responsabilidade contra-ordenacional ou criminal que ao caso couber, quando esteja em aplicação plano de recuperação económica de que decorra a imprescindibilidade da medida, desde que se preveja a substituição dos administradores e gerentes responsáveis pela não entrega das prestações tributárias em causa.
O pagamento em prestações pode ser autorizado desde que se verifique que o executado, pela sua situação económica, não pode solver a dívida de uma só vez, não devendo o número das prestações exceder 36, mas podendo ser alargado até 60 se a dívida exequenda exceder 50 unidades de conta no momento da autorização.[25]
II
A relação contributiva no sistema previdencial de segurança social
            O artº 63º da Constituição da República Portuguesa estabelece no nº1 que todos têm direito à segurança social, e afirma no nº 2 que incumbe ao Estado organizar, coordenar e subsidiar um sistema de segurança social […]
 A Lei n.º 4/2007 de 16 de Janeiro - que revogou a Lei n.º 32/2002, de 20 de Dezembro, mas, até revogação expressa, manteve em vigor as disposições legais e regulamentares aprovadas ao abrigo das Leis n.º 28/84, de 14 de Agosto, n.º 17/2000, de 8 de Agosto -. aprovou as bases gerais do sistema de segurança social e definiu as bases gerais em que assenta o sistema de segurança social, adiante designado por sistema, bem como as iniciativas particulares de fins análogos.
Todos têm direito à segurança social, que é efectivado pelo sistema e exercido nos termos estabelecidos na Constituição, nos instrumentos internacionais aplicáveis e na presente lei.[26]
O sistema previdencial visa garantir, assente no princípio de solidariedade de base profissional, prestações pecuniárias substitutivas de rendimentos de trabalho perdido em consequência da verificação das eventualidades legalmente definidas.[27]
São abrangidos obrigatoriamente pelo sistema previdencial, na qualidade de beneficiários, os trabalhadores por conta de outrem ou legalmente equiparados e os trabalhadores independentes.[28]
O sistema previdencial abrange o regime geral de segurança social aplicável à generalidade dos trabalhadores por conta de outrem e aos trabalhadores independentes, os regimes especiais, bem como os regimes de inscrição facultativa abrangidos pelo n.º 2 do artigo 51.º[29]
O sistema previdencial deve ser fundamentalmente autofinanciado, tendo por base uma relação sinalagmática directa entre a obrigação legal de contribuir e o direito às prestações.[30]
São condições gerais de acesso à protecção social garantida pelos regimes do sistema previdencial a inscrição e o cumprimento da obrigação contributiva dos trabalhadores e, quando for caso disso, das respectivas entidades empregadoras. [31]
À determinação do montante das quotizações e das contribuições alude o Artigo 57.º[32]
As entidades empregadoras são responsáveis pelo pagamento das quotizações dos trabalhadores ao seu serviço, devendo para o efeito proceder, no momento do pagamento das remunerações, à retenção na fonte dos valores correspondentes.[33]
As quotizações e as contribuições não pagas, bem como outros montantes devidos, são objecto de cobrança coerciva nos termos legais.[34]
Como já referia LOPES DIAS, sobre o regime anterior: “A relação jurídica contributiva é, portanto, uma obrigação “ex lege” e nasce ou constitui-se com o facto tributário (artº 36º, nº1 da LGT), ou seja, quando se verificarem os pressupostos de facto previstos na lei, que no caso se dá com o início do exercício da actividade profissional (artº 60º, nº 2 da Lei nº 17/2000), tornando-se certa ou líquida com a declaração da entidade empregadora, exigível no termo do prazo definido na lei, extinguindo-se no acto do pagamento ou por outra causa legalmente equiparada.
            Como se verifica, esta relação entre sujeitos (ente público – sujeito activo, e entidade empregadora/trabalhador – sujeitos passivos), em que ao sujeito activo assiste o direito de exigir do sujeito passivo uma certa quantia, é em tudo semelhante à relação jurídica tributária (Cfr. artº 1º, nº 2 da LGT).
Igualmente as contribuições visam não só a satisfação das necessidades financeiras das instituições competentes para o pagamento das prestações substitutivas de rendimentos de trabalho perdidos, em virtude de contingências previstas na lei, ou compensatórias de certos encargos, mas também visam a promoção da justiça social e a correcção das desigualdades na distribuição da riqueza e do rendimento (artº 5º, nº 1 da Lei Geral Tributária)”. [35]
E, mais adiante: “aquela relação jurídica nasce a partir de uma outra relação jurídica constituída no domínio de outro ramo do Direito - uma relação jurídica laboral – fazendo incidir sobre o rendimento colocado à disposição do sujeito passivo (salário ou remuneração), uma taxa contributiva.
Esta imputação do objecto a uma pessoa ou entidade determina a sua capacidade contributiva e, em princípio, a consequente qualidade de sujeito passivo.
Dissemos “em princípio”, porque embora geralmente o sujeito passivo seja o titular da capacidade contributiva (artº 18º, nº 3 da Lei Geral Tributária), pode acontecer que outras pessoas, que não o contribuinte ou sujeito passivo, sejam legalmente responsáveis pelo cumprimento da obrigação contributiva (ou tributária), ou seja, quando outro sujeito se substitui àquele relativamente ao qual se verificou o facto tributário. Trata-se, como se sabe, da figura da substituição tributária (artº 20º da Lei Geral Tributária), caso em que o sujeito passivo “torna-se estranho à relação tributária no sentido de que não é parte desta relação por não lhe poder ser exigido o comportamento devido pelo sujeito activo.”
Esta responsabilidade do substituto tributário legitima-se através da retenção na fonte (artºs 20º nº 2, e 34º da Lei Geral Tributária), pois “o substituto só será admissível se efectivamente se vier substituir ao sujeito passivo propriamente dito, pagando o imposto ao Estado com rendimentos ou riqueza do sujeito dotado de capacidade contributiva.”
A retenção na fonte é uma técnica, uma “operação financeira pela qual determinado indivíduo detém, para efeito de entrega ao Estado, um determinado montante (...) antes de proceder ao pagamento de uma quantia que deva a outrem.”[36]
Todavia, a lei é expressa no sentido de responsabilizar exclusivamente as entidades empregadoras pelo pagamento quer das contribuições por si devidas, quer das cotizações correspondentes aos trabalhadores ao seu serviço, devendo “descontar” nas remunerações a estes pagas o valor daquelas cotizações (artº 47º, da Lei nº 32/2002).[37]
A respeito do instituto da substituição é relevante notar que grande parte da doutrina considera que ela é típica do Direito Fiscal, não se podendo reconduzir a institutos jurídicos de outros ramos do Direito. Mas na relação jurídica contributiva, como vimos, também é a entidade empregadora responsável pelo pagamento das cotizações correspondentes aos trabalhadores ao seu serviço, utilizando igualmente a técnica da retenção na fonte (artº 47º, nº 1 da Lei nº 32/2002, de 20 de Dezembro).
O certo é que a substituição, em qualquer dos casos, é uma obrigação “ex lege” e altera a vertente passiva da obrigação.[38]
III
            O Regime Especial de Execução de Dívidas ao Sistema de Solidariedade e Segurança Social

Decorrente da aprovação da anterior Lei de Bases da Solidariedade e Segurança Social - Lei nº 32/2002, o Decreto-Lei nº 42/2001, procedeu à criação das secções de execução tendo em vista uma maior celeridade ao processo de cobrança coerciva, que tanta falta vinha fazendo à Segurança Social, para poder arrecadar, no mais breve espaço de tempo, as contribuições devidas e não cobradas.[39]
            O Regime Especial de Execução de Dívidas ao Sistema de Solidariedade e Segurança Social, passou pois, a constar do Decreto-Lei nº 42/2001, de 9 de Fevereiro, que criou as secções de processo executivo do sistema de solidariedade e segurança social, define as regras especiais daquele processo e adequa a organização e a competência dos tribunais administrativos e tributários.[40]
O presente diploma aplica-se ao processo de execução de dívidas à segurança social.
Para efeitos do presente diploma, consideram-se dívidas à segurança social todas as dívidas contraídas perante as instituições do sistema de solidariedade e segurança social pelas pessoas singulares e colectivas e outras entidades a estas legalmente equiparadas, designadamente as relativas a contribuições sociais, taxas, incluindo os adicionais, juros, reembolsos, reposições e restituições de prestações, subsídios e financiamentos de qualquer natureza, coimas e outras sanções pecuniárias relativas a contra-ordenações, custas e outros encargos legais.[41]

É competente para a instauração e instrução do processo de execução de dívidas à segurança social a delegação do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social do distrito da sede ou da área de residência do devedor.
Para efeitos do número anterior, as instituições de solidariedade e segurança social remetem as certidões de dívida à delegação do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social competente.[42]

São títulos executivos as certidões de dívida emitidas, nos termos legais, pelas instituições de solidariedade e segurança social.[43]

Compete ao tribunal tributário de 1.ª instância da área onde corre a execução decidir os incidentes, os embargos, a oposição, incluindo quando incida sobre os pressupostos da responsabilidade subsidiária, a graduação e a verificação de créditos e as reclamações dos actos materialmente administrativos praticados pelos órgãos de execução.
Das decisões dos tribunais de 1.ª instância cabe recurso nos termos da lei.[44]

Ao processo de execução das dívidas à segurança social aplica-se, em tudo o que não estiver regulado no presente diploma, a legislação específica da segurança social, a Lei Geral Tributária e o Código de Procedimento e de Processo Tributário.[45]

Têm personalidade e capacidade judiciárias para o processo de execução de dívidas à segurança social as instituições do sistema de solidariedade e segurança social, as pessoas singulares e colectivas e outras entidades a estas legalmente equiparadas., mas a legitimidade para reclamar os créditos da segurança social em processo executivo a correr nos tribunais comuns pertence ao Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, através das respectivas delegações.[46]
Nos tribunais comuns e nos tributários, as instituições do sistema de solidariedade e segurança social são representadas por mandatário judicial, nomeado pela delegação competente do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social.[47]

 A competência para autorização de pagamento em prestações das dívidas em processo de execução é do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social.[48]

IV
            O crime de abuso de confiança contra a Segurança Social

Em termos de criminalização, como assinala Lopes Dias: - “Poderemos mesmo dizer que, por causa de alguma ligeireza ou esquecimento do legislador no tratamento da intelecção do bem jurídico e dos critérios de legitimação, se mostraram tão ineficazes as sucessivas criminalizações no domínio da Segurança Social, pelo menos desde que foi publicado o Decreto-Lei nº 511/76, de 3 de Julho, o qual dispunha no seu artº 5º: “As entidades empregadoras que não efectuem o pagamento das contribuições dos beneficiários do regime geral de previdência descontadas nos respectivos salários, estarão sujeitas às sanções previstas no artigo 453º do Código Penal, se houver abuso de confiança.”
Tal intervenção do direito penal mantém-se ainda na redacção do artº 6º do Decreto-Lei nº 103/80, de 9 de Maio, que estabeleceu o novo regime jurídico das contribuições para a previdência. Este será, sem dúvida, um exemplo da forma como a intervenção do direito penal tem apenas um “valor promocional do bem jurídico”, (para utilizar uma expressão da Drª Anabela Rodrigues), errada do ponto de vista do enquadramento dogmático das infracções fiscais.
Mas as imprecisões técnicas continuaram, ainda no âmbito da Segurança Social, com a Lei de Bases do Sistema (Lei nº 28/84, de 14 de Agosto), onde se preceituava no seu artº 46º, nº 3, que “o desvio, pelas entidades empregadoras, das importâncias deduzidas nas retribuições a título de contribuições para o regime geral é punido, nos termos da legislação geral, como crime de abuso de confiança.”
De facto, a eficácia desta disposição foi igualmente nula, na medida em que “a diferença de sentido atribuído às expressões «desviar» e «apropriar» determinou na generalidade dos casos, sentenças de absolvição por parte dos tribunais.”
Na sequência do enquadramento criminal dos ilícitos tributários com a publicação do Decreto-Lei nº 20-A/90, de 15 de Janeiro, que aprovou o regime jurídico das infracções fiscais não aduaneiras (RJIFNA), foi alargado implicitamente aos ilícitos contributivos da segurança social o tipo de crime de abuso de confiança fiscal.
Não consta, porém, nenhuma decisão judicial tomada na vigência deste diploma no âmbito da segurança social...
Apenas com a entrada em vigor do Decreto-Lei nº 140/95, de 14 de Junho veio a ser introduzido no RJIFNA um capítulo II denominado “Dos crimes contra a Segurança Social”, onde se inseriam, nomeadamente, os crimes de “fraude à segurança social”, “abuso de confiança em relação à segurança social” e “frustração de créditos da segurança social”[49]

Na verdade o Decreto-Lei nº 140/95, de 14 de Junho introduziu no RJIFNA o capítulo II etiquetado “Dos crimes contra a Segurança Social”, e no artº 27º-B do RJIFNA, o crime de abuso de confiança em relação à segurança social
A Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, ao aprovar o Regime Geral das Infracções Tributárias (designado pela sigla RGIT), criou num único diploma, sob a designação de “Crimes Tributários”, os crimes aduaneiros, fiscais e contra a segurança social, diploma este que está presentemente em vigor, -  e que, tem como penas aplicáveis aos crimes tributários a prisão e a multa – Art.ºs 87º a 107º[50]                                                               
Os crimes contra a segurança social estão tipificados nos artigos 106.º( Fraude contra a segurança social), e 107.º (Abuso de confiança contra a segurança social)

Refere COSTA PINTO,”a generalidade dos crimes tributários visa em última instância proteger realidades patrimoniais afectas a finalidades de direito público: de forma genérica, o erário público e o património da segurança social. Em regra, o legislador orienta a selecção típica dos factos em função dessa idoneidade lesiva ou do dano patrimonial efectivo, embora noutros casos seja relevante (normalmente em termos instrumentais) a violação de deveres de colaboração, de lealdade e de informação dos agentes económicos.”[51]

O Artigo 107.º Abuso de confiança contra a segurança social, dispõe:
1 - As entidades empregadoras que, tendo deduzido do valor das remunerações devidas a trabalhadores e membros dos órgãos sociais o montante das contribuições por estes legalmente devidas, não o entreguem, total ou parcialmente, às instituições de segurança social, são punidas com as penas previstas nos n.ºs 1 e 5 do artigo 105.º [pena de prisão até três anos ou multa até 360 dias, ou “quando a entrega não efectuada for superior a (euro) 50 000, a pena é a de prisão de um a cinco anos e de multa de 240 a 1200 dias para as pessoas colectivas.”]
2 - É aplicável o disposto nos n.ºs 4, 6 e 7 do artigo 105.º [52]

Como resulta do Acórdão deste Supremo Tribunal, de 4-2-2010, proc. nº 106/01.9IDPRT.S1, 3ªsecção:
“- No crime de abuso de confiança fiscal, previsto no art. 105.º do RGIT, objecto da omissão de entrega, total ou parcial, é a prestação tributária, conceito referido no art. 1.º, n.º 1, al. a), e definido no art. 11.º, al. a), do RGIT, englobando os impostos e outros tributos cuja cobrança caiba à administração tributária, abrangendo o art. 105.º três tipos de prestações pecuniárias cuja não entrega faz recair sobre o agente a responsabilidade penal por tal crime – para além da prestação tributária deduzida nos termos da lei, prevista no n.º 1, o objecto é “alargado” pela definição extensiva dos n.ºs 2 e 3 (aqui abrangendo prestações com natureza parafiscal) do citado preceito legal.[53]

 No crime de abuso de confiança contra a segurança social objecto da omissão de entrega, total ou parcial, é o montante das contribuições devidas ao sistema de solidariedade e segurança social – art. 1.º, n.º 1, al. d), e definidas no art. 11.º, n.º 1, al. a), in fine, do mesmo RGIT, como tributos parafiscais cuja cobrança caiba à administração da segurança social, abrangendo, nos termos do n.º 1 do art. 107.º, o montante das contribuições legalmente devidas por trabalhadores e membros de órgãos sociais, deduzido pela entidade empregadora, do valor das remunerações devidas a uns e outros.
No crime de abuso de confiança contra a segurança social, a acção positiva pressuposto da subsequente conduta típica omissiva, consubstanciada no desconto, na retenção na fonte, das contribuições deduzidas no valor das remunerações pagas aos trabalhadores, incide sobre um valor, consistindo a subsequente omissão, estruturante do crime, na não entrega, no desvio, no descaminho de uma quantia pecuniária, que por via dessa omissão deixa de integrar, como direito de crédito, a esfera jurídica patrimonial da administração da segurança social.
Em ambas as infracções estão em causa créditos de impostos ou de tributos fiscais ou parafiscais devidos ao Estado, estabelecendo-se uma relação entre o Estado - Administração Fiscal ou Estado - Administração da Segurança Social, enquanto sujeito da relação jurídica tributária, titular do direito de exigir o cumprimento das obrigações tributárias, titular do crédito do imposto ou do direito de crédito de quotizações/contribuições; por outro lado, o sujeito passivo que, nos termos da lei, está vinculado ao cumprimento da prestação tributária, seja como contribuinte directo, substituto ou responsável.
Acresce que na interpretação do art. 107.º, mesmo antes de 2009, estava sempre presente na determinação da penalidade aplicável a necessidade de chamada à colação do critério do valor, o que se impõe, pois as contribuições deduzidas têm uma dimensão económica, traduzida em valor pecuniário, o qual se reflecte na qualificação do crime em termos de maior ou menor gravidade e demais aspectos, o que se reconduz a patrimonialidade. Independentemente da catalogação e definição do bem jurídico tutelado, o que está em causa em ambos os casos é a arrecadação de receitas, o património tributário.
Pressupõem, ambos os crimes uma relação em que intercedem três sujeitos: o Estado - Administração Fiscal, titular do direito do crédito de quotizações; o contribuinte originário propriamente dito, que é o sujeito substituído, e, por último, um terceiro, o substituto, o único sujeito em posição de cometer o crime.
Quer o art. 105.º, quer o art. 107.º, têm em vista situações de substituição tributária, mas no primeiro caso, seja a substituição própria ou imprópria, não se reconduzindo aos casos em que é usada a técnica de retenção na fonte do imposto devido.
Em ambos os casos estamos perante crimes omissivos, crimes de mera inactividade, em que a omissão integradora do ilícito é antecedida de uma acção, de um comportamento actuante, positivo, de facere, consubstanciado numa conduta legal, de prévia dedução (obrigação de retenção), no caso da segurança social, do valor das remunerações devidas a trabalhadores e membros de órgãos sociais, que conduz a que o substituto se converta num depositário das quantias deduzidas, figurando como um intermediário no processo de arrecadação da receita, constituindo-se na obrigação de entrega do retido, consubstanciando-se na não entrega, total ou parcial, do que estava obrigado a entregar à administração tributária ou às instituições de segurança social.
Assentam ambos os crimes numa conduta bifásica, seguindo-se a uma primeira fase de actuação perfeitamente lícita – a dedução – que funciona como seu pressuposto, uma outra traduzida numa omissão.
            A opção do legislador na solução do artº 27º-B do RJIFNA foi a de acentuar a lesão patrimonial como resultado típico, ao centrar a ilicitude no dano causado ao erário público, ou da segurança social, e, portanto, primacialmente no desvalor do resultado, impondo que, para a consumação típica do abuso de confiança a não entrega das contribuições retidas fosse acompanhada de apropriação, a qual se traduz necessariamente, na inversão do título de posse ou detenção, passando o agente a comportar-se relativamente à coisa, que recebera “uti alieno”, como “ uti dominus”.
            “Noutros termos, o propósito de restituição só exclui a apropriação se o agente não se tiver colocado na situação de impossibilidade fáctica – expressa, nomeadamente, na falta ou insuficiência de meios patrimoniais – de pagar, entregar ou restituir”[54]
            Com o RGIT houve “mudança do estatuto normativo do facto.”
Como salienta COSTA ANDRADE, “também do lado da Segurança Social desapareceram da estrutura típica da incriminação as referências à lesão da propriedade, já sob a forma de apropriação ou descaminho, já sob a forma de uma intenção de obter vantagem indevida ou de causar prejuízo, fórmula que, […] se confunde, não raro, com a mesma apropriação”.[55]
Com efeito, “A conduta agora sancionada penalmente já não corresponde a uma apropriação de bens patrimoniais alheios, não configurando, como tal, aquela danosidade social própria da figura do abuso de confiança como um dos crimes paradigmáticos contra a propriedade. Nem sequer se exige - como acontecia na versão originária do RJIFNA - uma intenção de apropriação. Para se consumar o crime, basta agora a mera violação do dever legal de entrega tempestiva das prestações deduzidas ou retidas. “[56]
            Como se assinala nas alegações do Ministério Público:
            “Assim, o comportamento do agente, que no caso é uma omissão pura, integrador do tipo de ilícito e do tipo de culpa, consiste em não entregar, dolosamente, à Segurança Social, no vencimento da obrigação tributária que sobre ele impende enquanto devedor contributivo substituto, o valor das contribuições devidas pelos trabalhadores e membros dos órgãos sociais à Segurança Social, que deduzira das remunerações destes.”
V
O princípio da adesão – o pedido de indemnização civil em processo penal

O pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime é deduzido no processo penal respectivo, só o podendo ser em separado, perante o tribunal civil, nos casos previstos na lei.[57]
           
            Refere MAIA GONÇALVES:
            “A prática de uma infracção criminal é possível fundamento de duas pretensões dirigidas contra os seus agentes, uma acção penal, para julgamento, e, em caso de condenação, aplicação das reacções criminais adequadas, e uma acção cível, para ressarcimento dos danos patrimoniais e não patrimoniais a que a infracção tenha dado causa.
            A unidade de causa impõe entre as duas acções uma estreita conexão. Mas é certo que se não confundem, e por isso mesmo se tem discutido se deverão ser objecto do mesmo processo, ou se deverão antes ser decididas em processos autónomos, e mesmo em jurisdições diferentes.
            Assim, apareceram os sistemas da identidade, o da absoluta independência e o da interdependência, também designado por sistema da adesão.
            a) O sistema da identidade só pode ter hoje um interesse histórico. Apelidando-o de sistema da confusão total, Figueiredo Dias, Sobre a reparação de perdas e danos em processo penal, estudo in memoriam do Prof. Beleza dos Santos, Bol. da Fac. de Dir. de Coimbra, 1966, pág. 88 e separata, diz que corresponde a uma fase de evolução em que se confunde ainda o direito penal como o civil e a uma concepção do processo penal onde não está ainda presente o interesse da sociedade na punição do culpado, mas apenas o interesse da vítima em obter vingança e reparação, indicando um estádio primitivo das legislações.
            b) O sistema da absoluta interdependência arranca das diferentes finalidades que as acções penal e cível se propõem realizar. É o sistema perfilhado pelas legislações inglesas, americana e brasileira. Vejam-se, entre nós, sobre este sistema, Cavaleiro de Ferreira, Curso, I págs 16-17; Castanheira Neves, Sumários, pág. 74 e Figueiredo Dias, loc. cit. pág. 89 e Direito Processual Penal, I, 540 e segs.
c) O sistema da interdependência ou da adesão é perfilhado pela maioria das legislações e comporta um sem número de cambiantes que têm como denominador comum a possibilidade ou, obrigatoriedade de juntar a a acção cível à penal, permitindo que o juiz penal decida também a acção cível.”[58]

A indemnização de perdas e danos emergentes de crime assumia-se, na tradição jurídica portuguesa, como uma consequência jurídica de carácter penal, dimensão de política criminal ligada à reacção criminal.
            É o que testemunhava o artº 75º § 3º do Código Penal de 1886.
O arbitramento oficioso da indemnização era uma consequência jurídica do crime que não se identificava com a indemnização civil, quer nos fins, quer nos fundamentos, nem tinha que coincidir com o seu montante.
Na verdade, embora fosse legalmente possível o exercício da acção cível em conjunto com a acção penal, conforme artºs 29º a 34º do Código de Processo Penal de 1929, - referindo-se o artº 29º à indemnização por perdas e danos - já o artº 34º referindo-se à reparação por perdas e danos determinava que o juiz, no caso de condenação, arbitrará aos ofendidos uma quantia como reparação por perdas e danos, ainda que lhe não tenha sido requerida.
            O quantitativo da indemnização era determinado segundo o prudente arbítrio do julgador, que atenderia à gravidade da infracção, ao dano material e moral por ela causado, à situação económica e à condição social do ofendido e do infractor. § 2º

No domínio do direito anterior ao Código Penal de 1982, a reparação por perdas e danos arbitrada em processo penal tinha natureza especificamente penal. Com efeito, na medida em que se postergava o princípio da necessidade do pedido e se considerava a indemnização como um efeito necessário da condenação penal, definiam-se critérios próprios da sua avaliação, distintos dos estabelecidos pela lei civil (arts. 34.º. e 450.º., n. 5, do CPP de 1929) e não se previa a possibilidade de transacção ou de renúncia ao direito e, desistência do pedido.

Era esta a posição dominante da jurisprudência, bem como de vária doutrina da Escola de Coimbra – Figueiredo Dias, Castanheira Neves e Eduardo Correia,

Porém, a doutrina dominante considerava a indemnização arbitrada como de natureza civil, - Vaz Serra, Cavaleiro de Ferreira, Gomes da Silva e Pereira Coelho.[59]

Passando a ser determinada de acordo com os pressupostos e critérios, substantivos, da lei civil, por força da norma do art. 128.º do CP de 1982 (reproduzida posteriormente, no art. 129.º, do CP/95), a reparação passou  a considerar-se, como pura indemnização civil que, sem embargo de se lhe reconhecer uma certa função adjuvante, não se confunde com a pena.

No plano do direito adjectivo, o actual Código de Processo Penal (CPP), mantendo o sistema de adesão, veio conferir àquela acção de indemnização pela prática de um crime, formalmente enxertada no processo penal, a estrutura material de uma autêntica acção cível, acolhendo, inequivocamente, os princípios da disponibilidade e da necessidade do pedido (arts. 71º, 74. a 77. e 377, do CPP) e prescrevendo que a decisão final, ainda que absolutória, que conheça do pedido cível, constitui caso julgado nos termos em que a lei atribui eficácia de caso julgado às sentenças civis (art. 84. do CPP).
            Este efeito não penal da condenação ligada, porém, à prática de crime – a fonte ou causa de pedir era o crime mas a indemnização assentava nos pressupostos de natureza cível - continuou a afirmar-se no universo jurídico-criminal português, de forma que pelo acórdão do Plenário das Secções Criminais do Supremo Tribunal de Justiça, de 16 de Outubro de 1997, in BMJ, 470º, 33, mesmo quando por aplicação da amnistia se extingue a acção penal, e apesar de ainda não ter sido deduzida acusação, poderá o ofendido requerer o prosseguimento da acção penal, para apreciação do pedido cível, nos termos do artº 12º nº 2 da Lei nº 23/91 de 4 de Julho.
            Também o artigo 7º nº 1 da Lei 15/94 de 11 de Maio, veio explicitar que a amnistia não extingue a responsabilidade civil emergente de factos amnistiados.[60]
A amnistia não extinguia pois a responsabilidade civil emergente dos factos amnistiados, e sendo a amnistia aplicável em processo penal pendente, o lesado que ainda não tivesse sido notificado para deduzir pedido cível, tinha de ser notificado para, se quiser, e no prazo de dez dias, deduzir o pedido cível oferecendo prova nos termos do processo declarativo sumário.
            De igual modo, também nos casos de extinção do procedimento criminal por prescrição.
O acórdão de fixação de Jurisprudência n.º 3/2002 de 17.01.2002, Proc. 342/2001, D.R. 54 SÉRIE I-A, de 2002-03-05, veio dispor que: - “Extinto o procedimento criminal, por prescrição, depois de proferido o despacho a que se refere o artigo 311.º do Código de Processo Penal mas antes de realizado o julgamento, o processo em que tiver sido deduzido pedido de indemnização civil prossegue para conhecimento deste. “

Como resulta claramente do disposto dos arts. 128º. e 129º. do actual CP, versões respectivamente de 1982 e 1995, a indemnização de perdas e danos, ainda que emergente de crime, deixou de constituir pois, um efeito penal da condenação (como sucedia no CP/1886 -art. 76., § 3.) para passar a ser regulada pela lei civil, assumindo, pois, a natureza de uma obrigação civil em sentido técnico, nos termos do art. 397º., do Código Civil, com o seu regime específico.

Seria legalmente inadmissível no processo penal e ao tribunal criminal faleceria competência, em razão da matéria, para dele conhecer, caso o pedido cível não se fundasse em indemnização por danos ocasionados pelo crime ou não se fundamentasse na responsabilidade civil do agente pelos danos que, com a prática do crime causou, pois que a acção cível que adere ao processo penal é a que tem por objecto a «indemnização por perdas e danos emergentes do crime», e só essa (arts. 128º do CP/82 e 129.º do CP/95.).[61]
Consequentemente, pelos danos causados por um facto que não é susceptível de integrar um tipo legal de crime e que viola, exclusivamente, um crédito ou uma obrigação em sentido técnico, não pode pedir-se a respectiva indemnização no processo penal.
O tribunal criminal, é incompetente, em razão da matéria, para conhecer da pura responsabilidade civil contratual.[62]

Na verdade, o artigo 129º do Código Penal (CP) (sob o epíteto de Responsabilidade civil emergente de crime), dispõe expressamente: “A indemnização de perdas e danos emergentes de crime é regulada pela lei civil.”
            Isto significa, por outro lado, que a atribuição da indemnização em processo penal é regulada quantitativamente nos seus pressupostos pela lei civil e não já por critérios da lei penal, como sucedia no velho Código de 1886
No Código Civil consagra-se basicamente a concepção clássica de que a responsabilidade civil tem a função de reparar os danos causados e não fins sancionatórios.[63]
Dada a sua função essencialmente reparadora ou reintegrativa, o instituto da responsabilidade civil está sempre submetido aos limites da eliminação do dano, o que significa que, inexistindo este, inexiste obrigação de indemnizar (art. 483. do CC). Portanto, nunca pode haver condenação cível, em processo penal, quando se não provar a existência do dano invocado pelo autor do respectivo pedido. [64]
           
A dedução do pedido cível em processo penal é a regra e a dedução em separado a excepção (v. artºs 71º, 72 e 75 do C.P.P.), sem prejuízo de quando as questões suscitadas pelo pedido de indemnização inviabilizarem uma decisão rigorosa ou forem susceptíveis de gerar incidentes que retardem intoleravelmente o processo penal, o tribunal pode, oficiosamente ou a requerimento, remeter as partes para os tribunais civis. – nº 3 do artº 72º
O princípio da adesão em processo penal é de tal forma abrangente, que, nos crimes de acusação particular, a lei retira efeitos penais do comportamento assumido pelo lesado em matéria cível, quando afirma no nº 2 do artº 72º que no caso de o procedimento depender de queixa ou de acusação particular, a dedução do pedido perante o tribunal civil pelas pessoas com direito de queixa ou de acusação vale como renúncia a esse direito.
Embora o processo civil defina vários aspectos do regime da acção enxertada, como da definição da legitimidade das partes, é a acção penal que verdadeiramente suporta, orienta e conforma todo o rito processual, marcando definitivamente a cadência de intervenção dos demandantes civis na causa e os principais aspectos de forma a observar no seu desenrolar, sem esquecer a diligência para que conflui todo o processo: a audiência de julgamento, como o indicam as circunstâncias: de ser a data da acusação o termo a quo da dedução do pedido cível - arts, 77º, n. 1 e 75º; da intervenção processual do lesado se restringir à sustentação e à prova do pedido de indemnização civil, competindo-lhe correspondentemente, os direitos que a lei confere aos assistentes - art. 74., n. 2; dos demandados e os intervenientes terem posição processual idêntica à do arguido quanto à sustentação e à prova das questões civis julgadas no processo - art. 74. n, 3; da falta de contestação não ter efeito cominatório - art. 78.º, n, 3; do tribunal poder, oficiosamente ou a requerimento dos interessados, remeter as partes para os tribunais civis quando as questões suscitadas pelo pedido de indemnização civil inviabilizarem uma decisão rigorosa ou forem susceptíveis de gerar incidentes que retardem intoleravelmente o processo penal – art. 82.º, n. 3; do art. 401.º, n, 1, c), conferir às partes civis legitimidade para recorrer "da parte das decisões contra cada um proferidas"; do art. 402., n, 2, b), estatuir que, em geral, o responsável civil, ainda que não seja recorrente, beneficia do recurso do arguido, sendo certo que a inversa também é verdadeira, como resulta da alínea seguinte – c) do mesmo artigo; do art. 403º nº 2, a), estabelecer, em matéria de limitação do recurso, a possibilidade de recurso autónomo da decisão penal relativamente à civil. [65]
           
Sem prejuízo de que o artº 72º nº 1 do Código de Processo Penal, confere ao ofendido a faculdade de deduzir em separado o pedido de indemnização civil, perante o tribunal civil, quando ocorram determinadas situações processuais, indicadas nas suas alíneas, ou seja, quando:
a) O processo penal não tiver conduzido à acusação dentro de oito meses a contar da notícia do crime, ou estiver sem andamento durante esse lapso de tempo;
b) O processo penal tiver sido arquivado ou suspenso provisoriamente, ou o procedimento se tiver extinguido antes do julgamento;
c) O procedimento depender de queixa ou de acusação particular;
d) Não houver ainda danos ao tempo da acusação, estes não forem conhecidos ou não forem conhecidos em toda a sua extensão;
e) A sentença penal não se tiver pronunciado sobre o pedido de indemnização civil, nos termos do artigo 82º nº 3:
f) For deduzido contra o arguido e outras pessoas com responsabilidade meramente civil, ou somente contra estas haja sido provocada, nessa acção, a intervenção principal do arguido;
g) O valor do pedido permitir a intervenção civil do tribunal colectivo, devendo o processo penal correr perante o tribunal singular;
h) O processo penal correr sob a forma sumária ou sumaríssima;
i) O lesado não tiver sido informado da possibilidade de deduzir o pedido civil no processo penal ou notificado para o fazer, nos termos dos artigos 75º nº 1, e 77º, nº 2.

São situações de concordância prática entre a normalidade do procedimento (incluindo-se a celeridade processual) e, por vezes, a inevitável morosidade processual, ou existência de situações excepcionais, que possibilitam a dedução do pedido de indemnização civil em separado.

            A própria teleologia do citado artº 75º do C.P.P. ao impor o dever de informação ao lesado, pela autoridade judiciária pretende acautelar desde logo o exercício do direito do lesado na dedução do referido pedido de indemnização civil em processo penal.
O artº 75º do C.P.P. na redacção anterior à referida lei 59/98, impunha o dever de informação, estabelecendo que no primeiro acto em que intervier no processo penal pessoa que se saiba ter legitimidade para deduzir pedido de indemnização civil, deve ela ser informada pela autoridade judiciária da possibilidade de o fazer valer no processo penal e das formalidades a observar, explicitando agora a actual redacção do preceito que logo que, no decurso do inquérito, se tomar conhecimento da existência de eventuais lesados, devem estes ser informados, pela autoridade judiciária ou pelos órgãos de polícia criminal, da possibilidade de deduzirem pedido de indemnização civil em processo penal e das formalidades a observar, acrescentando por sua vez o nº 2 do preceito que quem tiver legitimidade para deduzir pedido de indemnização civil deve manifestar no processo, até ao encerramento do inquérito, o propósito de o fazer.[66]    
           


O acórdão de fixação de jurisprudência nº 1/2002 de 12 de Março de 2002, decidiu que não pode recorrer-se da decisão da Relação sobre pedido de indemnização civil, se for irrecorrível a parte criminal[67]
Porém, esta jurisprudência veio a ser contrariada pela Lei nº 48/2007, de 29 de Agosto, que aditou ao artº 400º do CPP, o actual nº 3 do seguinte teor:
“Mesmo que não seja admissível recurso quanto à matéria penal, pode ser interposto recurso da parte da sentença relativa à indemnização civil.
Porém, o recurso da parte da sentença relativas a indemnização civil só é admissível desde que o valor do pedido seja superior à alçada do tribunal recorrido e a decisão impugnada seja desfavorável para o recorrente em valor superior a metade dessa alçada.” [68]

O artigo 377º nº 1 do Código de Processo Penal, determina que a sentença, ainda que absolutória, condena o arguido em indemnização civil sempre que o pedido respectivo vier a revelar-se fundado, sem prejuízo do disposto no artigo 82º nº 3.
            Não havia porém unanimidade quanto ao campo de aplicação deste artigo.
            Escrevia Maia Gonçalves: “Este artigo exige que haja sentença, portanto decisão que conheça, a final, do objecto (cfr. artº 97º, 1, al. a)). É, portanto, necessário que tenha havido julgamento: se o processo não chegou a julgamento, por extinção da responsabilidade criminal em momento anterior, não pode condenar-se na indemnização aqui prevista” e, aduzia ainda que: “Este artigo tem campo de aplicação privilegiado nos casos em que há responsabilidade civil objectiva mas a responsabilidade penal inexiste por falta de culpa (v.g. acidente de viação, com morte, que se provou, em julgamento, ter sido causado por caso fortuito inerente ao funcionamento do veículo) mas abrange outros casos, como o de sentença absolutória por amnistia da infracção”[69].
            Mas, já em 1996, o Supremo Tribunal de Justiça, dava uma interpretação restritiva à norma, no sentido de que o nº 1 do artº 377º do CPP só pode funcionar quando esteja em causa uma situação de responsabilidade civil extracontratual, mas já não quando se configura um caso de responsabilidade civil contratual.[70]
            E, o denominado Assento nº 7/99 de 17 de Junho de 1999, veio a fixar, nos termos do artigo 445º do Código de Processo Penal, a seguinte jurisprudência: “Se em processo penal for deduzido pedido cível, tendo o mesmo por fundamento um facto ilícito criminal, verificando-se o caso previsto no artº 377º nº 1 do Código de Processo Penal, ou seja, a absolvição do arguido, este só poderá ser condenado em indemnização civil se o pedido se fundar em responsabilidade extra-contratual ou aquiliana, com exclusão da responsabilidade civil contratual.”[71]
            Escreveu-se a dado passo no referido Aresto, gerado pela oposição de julgados na Relação de Coimbra sobre a mesma questão: “ É que, aceitando-se, muito embora, que o nosso direito positivo impõe um regime de adesão obrigatória, tal diz respeito ao pedido de indemnização por perdas e danos resultantes de um facto punível, ou seja, de um ilícito criminal.
            Por outro lado, e recorrendo ao ensinamento de Eduardo Correia (Processo Criminal, pp. 212 e segs.) o acórdão vai encontrar a explicação da dependência da acção civil perante a acção penal. No fundo, de ambas provirem da mesma causa material.
            Outra ideia muito importante que aceitamos e que está bem patente no acórdão recorrido é que o regime de adesão não implica uma acção cível qualquer, mas tão-somente um pedido de indemnização civil para ressarcimento de danos causados por uma conduta considerada como crime”
            E, mais adiante: “o nº 1 do artº 377º do Código de Processo Penal, quando manda condenar a indemnização civil, tem como pressuposto que esta indemnização resulte de um facto ilícito criminal e, no fundo, tendo como base o já citado artigo 483º do Código Civil. Daí a alusão a que o pedido seja fundado: não é qualquer pedido, mas sim o fundado na responsabilidade aquiliana”.
Só o pedido de indemnização civil «fundado na prática de um crime» pode ser «deduzido no processo penal respectivo» (art . 71.º, do CPP), mas a sentença, ainda que haja  absolvição criminal do arguido condena este em indemnização civil «sempre que o pedido respectivo vier a revelar-se fundado».
Como se disse, em conclusão, no mesmo Aresto:
“1.ª No nosso direito positivo, a questão da indemnização a fixar pela prática de um crime consiste no sistema da adesão obrigatória da acção civil à acção penal, com algumas excepções expressas na lei (artigos 71.º e 72.º do Código Penal);
2.ª Em face do artigo 377.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, verifica-se a autonomia entre a responsabilidade civil e a responsabilidade criminal, mas isso não impede que, mesmo no caso de absolvição da responsabilidade criminal, o Tribunal conheça da responsabilidade civil, mas que tem necessariamente a mesma causa de pedir, ou seja, os mesmos factos que são também pressuposto da responsabilidade criminal;
3.ª Não pode concluir-se do artigo 129.º do Código Penal que a reparação civil arbitrada em processo penal é um efeito da condenação, mas sim que este normativo apenas remete para o artigo 483.º do Código Civil;
4.ª Esta responsabilidade civil, que poderá exclusivamente ser apreciada em processo penal (se o pedido for aí deduzido), refere-se tão-somente àquela que emerge da violação do direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios, com dolo ou mera culpa e da qual resultem danos, ficando, portanto, excluída a responsabilidade contratual (artigo 483.º do Código Civil).”
Assim, se o pedido tem de se fundar «na prática de um crime», mas a absolvição (do crime) não obsta à condenação do arguido no pedido - se «fundado» - de indemnização, o fundamento da condenação não será obviamente a «prática de um crime», mas, segundo o assento 7/99 de 17JUN (D.R. I-A 3AGO99), a «responsabilidade extracontratual ou aquiliana», ainda que (eventualmente) não criminosa. [72]

            O pedido de indemnização civil é deduzido pelo lesado, entendendo-se como tal a pessoa que sofreu danos ocasionados pelo crime, ainda que se não tenha constituído assistente, devendo manifestar no processo, até ao encerramento do inquérito o propósito de deduzir o pedido de indemnização civil- artº 74º nº 1 e 75º nº 3 do CPP.
A causa de pedir no pedido de indemnização deduzido por força do art. 71 do CPP, é a prática de um crime.
Assim, só os lesados directa ou indirectamente com a sua prática podem ser demandantes, e os acusados ou terceiros que sejam responsáveis civilmente pela reparação dos respectivos danos, demandados.[73]
"Lesado" é toda a pessoa (singular ou colectiva) que, de acordo com o direito civil, tenha sofrido, por efeito do crime, prejuízos no seu património material ou moral.
Quando o legislador utiliza a expressão "danos ocasionados pelo crime", pressupõe que entre o delito e os prejuízos indemnizáveis, exista um nexo de causalidade.
A responsabilidade civil do arguido, a apreciar em processo penal, se não é sempre consequência de uma condenação por infracção penal, tem no entanto por suporte a imputação de um crime, com verificação dos seus elementos constitutivos e de uma subsunção à fattispecie legal.[74]   

Como se assinalou no Acórdão nº 3/2002, de 17 de Janeiro de 2002: [75]

“Não obstante a lei e a doutrina apontarem para que a ilicitude civil mesmo quando conexa com a ilicitude criminal não perde a sua natureza fundamentalmente privada, o paralelismo não pode ir ao ponto de esquecer a intensidade da violação e o consequente dano que normalmente anda associado à ilicitude penal, a exigir uma reacção que a tenha em conta, ao menos em termos de tempo, na reposição que vem da indemnização.
O jurisconsulto do século XVI, Julius Clarus (27) já dizia: «Maior enim et dignior est causa criminalis, quam civilis, et ubi una causa est maior altera, non possunt duae actiones simul cumular».
Acentuam-se hoje as virtualidades da autonomia do processo penal, com mais poderes de investigação e por isso com crescentes possibilidades de atingir a verdade material.
Sendo mais simples que o comum processo civil, contém uma ideia de preferência, dando, por essa mesma razão, «uma especial protecção do lesado ofendido» (28).
E «sem essa simplificação não há economia, não há benefício para o ofendido, não há incentivo para o uso da adesão penal».
Isto não impede que o princípio dispositivo, pelo menos em parte, tenha lugar no processo de adesão, pois que, «ao lesado é que cabe dizer, e sempre, se há ou não há processo de adesão».
Salienta Figueiredo Dias (29) que a despeito de a adesão ser em princípio obrigatória (agora com mais excepções no novo Código de Processo Penal) e ainda que as partes devam ser «consideradas sujeitos do processo penal num sentido eminentemente formal, já de um ponto de vista material são sujeitos da acção civil que adere ao processo penal e que como acção civil permanece até ao fim».
No direito italiano (30), onde o princípio da adesão consagrado no Código de Processo Penal de 1988 e menos incisivo do que entre nós, reconhece-se que os poderes atribuídos à pessoa ofendida, de «adesão» à actividade do Ministério Público ou de «controlo» da mesma, «uma espécie de contributo para o exercício ou prosseguimento da acção penal», constituem pressuposto da escolha da sede onde quer fazer valer a pretensão civil (31).
O Tribunal Constitucional (32), pronunciando-se sobre o disposto no artigo 400º, n.º 2, do Código de Processo Penal, em termos de avaliar da constitucionalidade ou não do regime do processo penal comparado com o do processo civil, ao suscitar-se a disparidade de recursos relativamente ao pedido cível formulado num e noutro caso, afirmou a justificação da desigualdade, e salientou: «é a existência de uma profunda conexão entre os dois ilícitos resultantes da unidade do facto gerador, tanto da responsabilidade civil como da criminal, que justifica a apreciação no mesmo processo da questão criminal e da questão civil. Assim, o julgamento em processo penal do pedido de indemnização civil tem de implicar que se apliquem a este pedido as regras do processo penal quanto ao recurso, para que o sistema seja dotado de coerência e de racionalidade da questão criminal e da questão civil».[76]

VI
Quid inde

Na dimensão normativa do exclusivismo da jurisdição administrativa-fiscal, entronca a tese explicitada pelo acórdão fundamento, que se sintoniza na obrigação de pagamento das contribuições e acréscimos legais a favor da Segurança Social e, em conclusão, considera:
“1) A obrigação de pagamento das contribuições e acréscimos legais a favor da Segurança Social emerge de relação jurídica administrativa-tributária especial e rege-se pela legislação de direito público;
2) O princípio da adesão ao processo penal e o atinente regime constante dos artigos 71º e segs, do CPP, apenas admite a formulação e conhecimento de pedido de indemnização de natureza civil conexa com o facto crime, portanto indemnização cuja obrigação se situa no âmbito das relações jurídicas privadas.
3) Consequentemente, o pedido de indemnização civil formulado pela Segurança Social extravasa esse princípio da adesão e o atinente regime, pelo que se verifica uma excepção dilatória inominada, que determina o arquivamento do pedido erradamente dito cível, o que obsta ao seu conhecimento.
Assim se resolve a questão, respeitando os diversos factores de interpretação da norma (artº 129º/CP). A solução defendida tem, além do mais, a capacidade de resolver as múltiplas questões que se vêm colocando na decorrência do entendimento de que o pedido de indemnização civil relativo ao pagamento das prestações tributárias e juros (ou melhor, de valor equivalente) é dedutível em sede de enxerto no processo penal (ou autonomamente, o que é indiferente).

Retomando ao caso concreto, resulta evidente que o pedido de indemnização civil deduzido se reporta ao pagamento das contribuições devidas e juros, estes a calcular nos termos do artº 16º do DL 411/91, de 17/10.
As referidas prestações e juros emergem da relação tributária que se estabeleceu entre a Segurança Social e a arguida sociedade, não tendo que ver com qualquer pretensão indemnizatória de índole jurídico-privada.
Essa relação está sujeita ao princípio da legalidade tributária, pelo que o incumprimento das obrigações que lhe subjazem se subordina, quer nos seus pressupostos, quer nas suas consequências, às normas de direito administrativo-tributário pré-existentes à data da prática do facto danoso (que não coincide com o momento da consumação do crime de abuso de confiança).
Apenas à jurisdição administrativa-tributária cabe a apreciação da conduta danosa e a fixação dos seus efeitos. Não é pois admissível o pedido de indemnização formulado, no âmbito do processo de adesão, por não ser o meio próprio para o efeito, pelo que se impõe a revogação da sentença recorrida quanto à condenação no pedido de indemnização civil, o que determina que não se conheça do pedido indemnizatório deduzido.”

Porém, com o devido respeito, o thema decidendum configura-se como um falso ou aparente problema, e a argumentação do acórdão-fundamento não se revela subsistente.

Pois que:

A jurisdição administrativa –fiscal, tem de facto a sua autonomia, específica, perante a jurisdição comum, que é a jurisdição regra, genérica.
Mas o complexo normativo - e sua exequibilidade - da jurisdição administrativa fiscal, não afasta nem colide com o modo de funcionamento da jurisdição comum.
Cada jurisdição tem as suas regras próprias, e assume determinada competência.
Nenhuma delas se impõe à outra, nem se anulam no modo do seu exercício.
O cerne da questão não está na natureza da relação jurídica, nem na determinação da jurisdição competente, mas na disponibilidade metodológica de consecução de fins conferida por cada jurisdição.

O Tribunal Constitucional já se pronunciou em diversos acórdãos, entre os quais o Ac. 522/2008, de 29 de Outubro de 2008, acerca do artigo 212.º, n.º 3, da Constituição “(que, antes da revisão constitucional de 1997, correspondia ao artigo 214.º, n.º 3, este introduzido na revisão 1989), segundo o qual compete aos tribunais administrativos e fiscais o julgamento das acções e recursos contenciosos que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais.”
Como se referiu nesse Acórdão:
“Este preceito constitucionalizou uma jurisdição administrativa autónoma, tornando os tribunais administrativos e fiscais os tribunais comuns para o julgamento de litígios emergentes de relações jurídicas administrativas e fiscais.
O Tribunal Constitucional já foi várias vezes chamado a pronunciar-se sobre o alcance desta reserva constitucional de jurisdição administrativa, tendo reiteradamente sustentado o entendimento, assim resumido no Acórdão n.º 211/07:
«(…) a introdução, pela revisão constitucional de 1989, no então artigo 214.º, n.º 3, da Constituição, da definição do âmbito material da jurisdição administrativa, não visou estabelecer uma reserva absoluta, quer no sentido de exclusiva, quer no sentido de excludente, de atribuição a tal jurisdição da competência para o julgamento dos litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais. O preceito constitucional não impôs que todos estes litígios fossem conhecidos pela jurisdição administrativa (com total exclusão da possibilidade de atribuição de alguns deles à jurisdição “comum”), nem impôs que esta jurisdição apenas pudesse conhecer desses litígios (com absoluta proibição de pontual confiança à jurisdição administrativa do conhecimento de litígios emergentes de relações não administrativas), sendo constitucionalmente admissíveis desvios num sentido ou noutro, desde que materialmente fundados e insusceptíveis de descaracterizar o núcleo essencial de cada uma das jurisdições.»
Também a doutrina perfilha este entendimento − cfr., entre outros, GOMES CANOTILHO, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7ª ed., Coimbra, 676-677; VIEIRA DA ANDRADE, A Justiça Administrativa (Lições), 8ª ed., Coimbra, 2006, 112-114.
Dentro desta linha, a jurisprudência constitucional pronunciou-se no sentido da não inconstitucionalidade de normas que atribuem competência aos tribunais judiciais para decidirem, nomeadamente, as seguintes questões:
i) Fixação do valor global da indemnização na expropriação litigiosa (Acórdão 746/96);
ii) Recursos das deliberações do plenário do Conselho Superior da Magistratura (Acórdãos n.ºs 347/97 e 421/2000);
iii) Acções referidas no artigo 45.º, n.ºs 1 e 2, da Lei de Bases do Ambiente (Acórdão n.º 458/99);
iv) Recursos dos despachos que concedam ou recusem patentes, depósitos ou registos (Acórdão n.º 550/2000);
v) Impugnação dos actos dos conservadores do registo predial (Acórdão n.º 284/2003);
vi)  Litígios em que figure como parte a REFER – Rede Ferroviária Nacional, E.P., mesmo no caso das acções em que estejam em causa relações jurídico-administrativas (Acórdão n.º 211/07);
Como se explanou no Ac. 347/97, de 29 de Abril de 1997, do Tribunal Constitucional:
                   “10. A autonomização organizacional do exercício da jurisdição administrativa liga-se, hoje, fundamentalmente, à necessidade de preparação especializada do juiz apto a dirimir os litígios jurídico-administrativos. Tal necessidade está associada à autonomia dogmática e à complexidade técnica do Direito Administrativo, ao seu rápido desenvolvimento, à importância da definição jurisprudencial dos princípios gerais e à vantagem genérica da submissão dos casos a juízes com sensibilidade para os limites do controlo dos actos praticados no exercício da liberdade de decisão administrativa (cf., neste sentido, Sérvulo Correia, Contencioso Administrativo, 1990, p. 130 e ss.).
                   Pode dizer-se, deste modo, que os tribunais administrativos são os tribunais comuns em matéria administrativa (neste sentido, cf. Vieira de Andrade, Direito Administrativo e Fiscal, 1995, p. 12, e também, ainda que com reservas, Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª ed., 1993, p. 814). Contudo, tal asserção não impede a admissão de tribunais fora da estrutura jurisdicional administrativa com competência para dirimir litígios jurídico administrativos. Neste sentido, escreve Vieira de Andrade:"(...)”
                    Assim, o preceito - artigo 214º, nº 3, da Constituição - contém a mera definição da área própria (do âmbito‑regra) da "nova" ordem judicial administrativa e fiscal no contexto da organização dos tribunais, sem com isso pretender necessariamente estabelecer uma reserva material absoluta.
                   Dessa definição do âmbito-regra (que corresponde à justiça administrativa em sentido material) deriva para o legislador ordinário tão somente a obrigação de respeitar o núcleo essencial da organização material das jurisdições - por exemplo, seria inconstitucional a opção do legislador ordinário pelo sistema italiano, remetendo para os tribunais judiciais o julgamento de todas as questões relativas a direitos subjectivos dos particulares.
                  Mas só isso: não fica proibida a atribuição pontual a outros tribunais do julgamento (por outros processos) de questões substancialmente administrativas, sendo certo que essas "remissões" orgânico-processuais (muitas delas tradicionais) podem ter justificações diversas, devendo por isso, incluir-se na margem de escolha política e, portanto, de liberdade constitutiva própria do poder legislativo (...) - ob.cit., p. 11.”

            Por sua vez, escreve-se no acórdão do Tribunal Constitucional nº 211/2007, de 21 de Março:
“Como diz VIEIRA DE ANDRADE (A Justiça Administrativa - (Lições), 8.ª edição, pág. 113) essa definição constitucional do "âmbito-regra que corresponde à justiça administrativa em sentido material, deve ser entendida como uma garantia institucional, da qual deriva para o legislador ordinário tão-somente a obrigação de respeitar o núcleo essencial da organização material das jurisdições". O preceito constitucional proíbe a descaracterização ou desfiguração da jurisdição administrativa, enquanto jurisdição própria ou principal nesta matéria. Mas não fica proibida a atribuição pontual do julgamento de questões substancialmente administrativas aos tribunais judiciais, admitindo-se a razoabilidade dessas "remissões", que podem ter justificações diversas e muitas delas tradicionais na nossa organização judiciária – por exemplo, a apreciação das decisões das autoridades administrativas em matéria de contra-ordenações, os litígios relativos à indemnização por expropriação, o contencioso de actos de registo e notariais –, e designadamente naquelas situações de fronteira em que há dúvidas de qualificação ou zonas de intersecção entre as matérias administrativas e as restantes.
             Em termos práticos, significa isto que, perante norma legal a definir concretamente qual a jurisdição competente, há que indagar qual a natureza da relação jurídica de que emerge o litígio e, se se concluir que possui natureza administra­tiva, se impõe averiguar se a solução descaracteriza a jurisdição administrativa, enquanto jurisdição própria ou principal nesta matéria.”

No âmbito temático que nos ocupa, não é a adequação do meio ao fim visado, nem, como se disse, a natureza da relação jurídica que são pressupostos do pedido de indemnização civil.
Objecto do pedido de indemnização civil não é a obrigação de pagamento das contribuições e acréscimos legais a favor da Segurança Social, que emerge de relação jurídica administrativa-tributária especial e rege-se pela legislação de direito público, mas sim a indemnização pelo valor do dano, que imediatamente corresponde ao montante em dívida pelo incumprimento dessas contribuições.
            Não é a natureza das dívidas ou dos valores pecuniários em dívida, que define o princípio da adesão ao processo penal, mas sim o dano, embora não qualquer dano, mas, o dano emergente de crime.

O artigo 129º do Código Penal ao referir que «a indemnização de perdas e danos emergentes de crime é regulada pela lei civil» significa de forma clara que permite a indemnização por perdas e danos, quando esta indemnização seja emergente de crime, sendo essa indemnização regulada pela lei civil,
            Não é a natureza da prestação que constitui o dano.
            O dano tem origem no prejuízo, in casu, causado pelo incumprimento da prestação em falta, e identificado no seu valor ou montante, e que por esse incumprimento constitui crime.

Concorda-se com o Ministério Público em suas doutas alegações quando explicita:
“2
O devedor substituto tem a obrigação tributária de deduzir, à remuneração do trabalhador, o montante da contribuição por este devida à Segurança Social, e de proceder à sua entrega a esta.
A obrigação tributária de entrega nasce logo que a entidade patronal deduz, na remuneração do trabalhador, a contribuição, e vence-se no 15º dia do mês seguinte àquele a que disser respeito a remuneração, incorrendo o devedor substituto, que não fez a entrega, em mora 1 [1 Cf. o artigo 10.°, n.º 2, do Dec.-Lei n.º 199/99, de 08/06, vigente à data da prática dos factos, posteriormente revogado pela Lei n.º 110/2009, de 16/10.]
A partir de momento em que a obrigação de entrega se vence e não é cumprida, verifica-se o prejuízo decorrente desse incumprimento, traduzido em não entrada do valor da respectiva contribuição, nos cofres da Segurança Social, na data em que deveria ter ocorrido.
3.
Na sequência do que já deixámos referido sobre o crime de abuso de confiança contra a Segurança Social, conclui-se que a consumação deste ilícito penal ocorre com a não entrega, dolosa, à Administração Tributária, das prestações a esta devidas, isto é, logo que se mostre violada a obrigação do devedor tributário substituto, ou seja, logo que termine o prazo para cumprimento do respectivo dever tributário de entrega 2 [2 Cf. o artigo 5.°, n.º 2, do RGIT], pois que a condição objectiva de punibilidade prevista no artigo 105.°, n.º 4, 3 [3 Na versão originária da Lei n.º 15/2001, de 05/06], do RGIT, aplicável ao crime de mera inactividade previsto no artigo 107.°, n.º 1, por força do seu n.º 2, não pertence nem ao tipo de ilícito, nem ao de culpa 4. [4 Cf. o acórdão de fixação de jurisprudência nº 6/2008, do Supremo Tribunal de Justiça, processo n.º 4080/07-3.a secção, publicado no DR Série I, n.º 94, de 15/04/2008.]”
4.
Verifica-se, assim, que:
a) a mesma conduta omissiva - não entrega, pelo devedor tributário substituto à Segurança Social, da contribuição deduzida - é valorada, simultaneamente, em sede tributária e em sede penal.
b) a violação da obrigação tributária de entrega não é anterior ao comportamento criminoso, pois que este consiste precisamente nessa violação.
A responsabilidade tributária e a responsabilidade penal não têm, pois, causas diversas.
Radicam-se, sim, em normas distintas, de natureza tributária e de natureza penal, mas, repetimos, a conduta omissiva é a mesma.
5,
A incriminação da omissão tributária devida surge fundamentalmente como uma forma de constranger o devedor tributário substituto ao cumprimento, ainda que tardio, dessa obrigação 5, [5  Em conformidade com o objectivo principal dos crimes fiscais: recebimento completo de impostos e de contribuições.
Quanto à especificidade do bem jurídico no ilícito penal tributário, cf. o acórdão de fixação de jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, de 12 de Setembro de 2012, proferido no processo n.º 139/09.7IDPRT.P1-A.Sl, que desenvolvidamente sobre ele se pronunciou.]
Intenção esta também revelada:
- na condição de punibilidade estabelecida no artigo 105.°, n.º 4, do RGIT (na sua versão original);
- na suspensão da execução da pena de prisão aplicada, prevista no artigo 14.°, n,º 1, do mesmo diploma legal, condicionada ao pagamento da «prestação tributária e acréscimos legais». “

A natureza tributária do crime, por referência à natureza tributária da prestação, cuja omissão de entrega o constitui, não inibe que o valor do(s) dano(s) emergente(s), imediatamente integrados pelo valor da prestação tributária em falta, e respectivo acréscimos legais, não possa ser deduzido em acção penal tendo por objecto crime tributário, sob pena de inutilização de toda a teleologia e dogmática do princípio da adesão em processo penal.
            Se o incumprimento da prestação causador do dano é de natureza tributária, e fundamento de crime, o ressarcimento do dano, pode ser feito em processo de execução fiscal, mas havendo processo penal, o pedido de indemnização civil emergente de crime deve ser deduzido em processo penal, tendo este a primazia, pois se o dano resulta do incumprimento e se o incumprimento constitui crime, o dano é-lhe conexo, ainda emergente de crime.[77]

Aliás, a própria jurisdição fiscal admite essa realidade:
A conjugação do disposto no artigo 3º do RGIT e no artigo 8º do C P confere e confirma a mesma consonância de aplicação (salvo disposição em contrário), das regras do direito penal comum – constantes da parte geral do Código Penal, onde se integra o artigo 129º - aos crimes tributários.[78]
A unidade e harmonia do ordenamento jurídico-penal está ainda em não contemplar quer no CP, quer no RGIT, ou em leis penais, norma ou normas impeditivas da aplicação aos crimes tributários da dogmática do artigo 129º do Código Penal.
O que legitima a conclusão, como bem observa Germano Marques da Silva, que, “pelos danos causados pelos crimes tributários respondem os agentes do crime e respondem não nos termos da Lei Geral Tributária, mas nos termos da lei civil”.[79]
Com efeito, como supra se referiu, conforme Código de Procedimento e Processo Tributário: - Considera-se, para efeito do Código, órgão da execução fiscal o serviço periférico local da administração tributária onde deva legalmente correr a execução ou, quando esta deva correr nos tribunais comuns, o tribunal competente.

E, sobre a competência dos tribunais tributários:
 1 -Compete ao tribunal tributário de 1.ª instância da área onde correr a execução, depois de ouvido o Ministério Público nos termos do presente Código, decidir os incidentes, os embargos, a oposição, incluindo quando incida sobre os pressupostos da responsabilidade subsidiária, a graduação e verificação de créditos e as reclamações dos actos materialmente administrativos praticados pelos órgãos da execução fiscal.
2-O disposto no presente artigo não se aplica quando a execução fiscal deva correr nos tribunais comuns, caso em que cabe a estes tribunais o integral conhecimento das questões referidas no número anterior.

Nos tribunais comuns e nos tributários, as instituições do sistema de solidariedade e segurança social são representadas por mandatário judicial, nomeado pela delegação competente do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social.

O Acórdão deste Supremo n.º 2/2005, de 16.02.2005, [80] fixou jurisprudência no sentido de que: «Em processo por crime de abuso de confiança contra a segurança social, previsto e punido no artigo 107.º do Regime Geral das Infracções Tributárias, o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social tem legitimidade para se constituir assistente.»
Como aliás referiu este Acórdão, a dado passo: “diversamente do que acontece em regra com os impostos, que constituem receitas do Estado, não afectas a fins específicos, as contribuições para a segurança social destinam-se aos fins específicos da mesma, de que beneficiam apenas alguns cidadãos.
Algumas das prestações sociais constituem, aliás, a contrapartida das quotizações dos trabalhadores.
Em conclusão: é de considerar que as contribuições devidas à segurança social constituem créditos de que é titular o IGFSS, sem embargo de se considerar a existência de um interesse público na recolha de receitas para o sistema de segurança social.
[…]
No caso das contribuições para a segurança social é inquestionável a existência de um interesse público na sua recolha, quer por imperativo constitucional para assegurar o direito à segurança social (artigo 63.º da Constituição) quer porque o Estado se vê obrigado a transferir fundos para a segurança social quando são insuficientes as receitas próprias desta.
Tratando-se de um crime de abuso de confiança contra a segurança social, previsto e punido no artigo 107.º do RGIT, envolvendo a privação do IGFSS de receitas próprias para prossecução dos seus fins específicos, parece evidente que com a incriminação se quis proteger de modo particular o interesse que a cobrança dessas receitas representa para o referido Instituto, surgindo o interesse do Estado num outro plano - o de garante do direito constitucional à segurança social.”

A privação das contribuições, cuja entrega foi omitida, representa sempre um prejuízo, por diminuição de receita para a Segurança Social.
            A dedução do pedido de indemnização civil em processo penal, não depende do ‘aval’ de outros ordenamentos jurídicos; estes não determinam, quer a legitimidade, quer a viabilidade daquele.
            Por isso, não há que fazer cotejo, ou comparação de ordenamentos jurídicos, nomeadamente do processo penal com outros ramos do direito, nomeadamente com processo tributário, de execução fiscal, para aquilatar da legalidade do pedido de indemnização civil em processo penal.

O facto de existir a possibilidade legal de a administração fiscal ou a Segurança Social dispor de duas vias de cobrança, uma com base no título executivo por si emitido e outra com base no título executivo civil, não significa que possa haver um duplo recebimento, que constituiria então enriquecimento sem causa, uma vez que o decidido numa poderá constituir oposição à execução na outra, requerendo-se a extinção da dívida pelo pagamento, não beliscando a harmonia com a unidade do sistema jurídico.[81]
Aliás, como refere GERMANO MARQUES DA SILVA “A indemnização corresponde sempre ao pagamento do imposto evadido e consequentemente pago o imposto não é mais devida a indemnização ou paga a indemnização não é mais devido o imposto. Tenha-se em conta que o credor da obrigação é o mesmo e que a responsabilidade civil se destina a satisfazer o interesse do credor da prestação tributária que foi frustrado pela prática do facto ilícito criminal.”[82]

A competência material exclusiva da jurisdição criminal para o julgamento de processos penais, além de convocar o princípio da adesão, afirma o princípio da suficiência penal, nos termos do artº 7º do CPP.
O princípio da suficiência do processo penal consagra a autonomia da jurisdição penal para conhecer de todas as questões, mesmo que não penais que possam influir na apreciação da causa penal, uma vez que «O processo penal é promovido independentemente de qualquer outro e nele se resolvem todas as questões que interessarem à decisão da causa.»[83]
Mesmo quando, para se conhecer da existência de um crime, for necessário julgar qualquer questão não penal que não possa ser convenientemente resolvida no processo penal, pode o tribunal suspender o processo para que se decida esta questão no tribunal competente.
            A suspensão pode ser requerida, após a acusação ou o requerimento para abertura da instrução, pelo Ministério Público, pelo assistente ou pelo arguido, ou ser ordenada oficiosamente pelo tribunal. A suspensão não pode, porém, prejudicar a realização de diligências urgentes de prova.
            O tribunal marca o prazo da suspensão, que pode ser prorrogado até um ano se a demora na decisão não for imputável ao assistente ou ao arguido.[84]
Conforme nº 4 do artº 7º do CPP: […] O Ministério Público pode sempre intervir no processo não penal para promover o seu rápido andamento e informar o tribunal penal. Esgotado o prazo sem que a questão prejudicial tenha sido resolvida, ou se a acção não tiver sido proposta no prazo máximo de um mês, a questão é decidida no processo penal.

Situação esta que em nada colide, outrossim é corroborada com o regime do processo penal tributário.
            O princípio da suficiência do processo penal não significa qualquer usurpação de jurisdição administrativa-tributária pelos tribunais comuns.

Com efeito,
O Regime Geral das Infracções Tributárias aplica-se às infracções das normas reguladoras, entre outras, das prestações tributárias; e das contribuições e prestações relativas ao sistema de solidariedade e segurança social, sem prejuízo do regime das contra-ordenações que consta de legislação especial.[85]
O incumprimento da obrigação contributiva pode constituir infracção criminal conforme artº 2º do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT),[86]

A parte III do RGIT consagra no capítulo III os crimes fiscais e no capítulo IV, os crimes contra a Segurança Social: - Artigo 106.º Fraude contra a segurança social; Artigo 107.º Abuso de confiança contra a segurança social.

Como supra se referiu, são aplicáveis subsidiariamente: quanto aos crimes e seu processamento, as disposições do Código Penal, do Código de Processo Penal e respectiva legislação complementar; quanto à responsabilidade civil, as disposições do Código Civil e legislação complementar[87]

            O capítulo I da Parte II do RGIT refere-se ao processo penal tributário:
A notícia de crime tributário adquire-se por conhecimento próprio do Ministério Público ou dos órgãos da administração tributária com competência delegada para os actos de inquérito, por intermédio dos órgãos de polícia criminal ou dos agentes tributários e mediante denúncia, e é sempre transmitida ao órgão da administração tributária com competência delegada para o inquérito.
A denúncia contém, na medida do possível, a indicação dos elementos referidos nas alíneas do nº 1 do artigo 243.º do Código de Processo Penal.[88]

Adquirida a notícia de um crime tributário procede-se a inquérito, sob a direcção do Ministério Público, com as finalidades e nos termos do disposto no Código de Processo Penal.[89]
Sem prejuízo de a todo o tempo o processo poder ser avocado pelo Ministério Público, a competência para os actos de inquérito a que se refere o n.º 2 do artigo 40.º presume-se delegada, sendo relativamente aos crimes contra a segurança social, nos presidentes das pessoas colectivas de direito público a quem estejam cometidas as atribuições nas áreas dos contribuintes e dos beneficiários.[90]

No caso de ser intentado procedimento, contestação técnica aduaneira ou processo tributário em que se discuta situação tributária de cuja definição dependa a qualificação criminal dos factos, não será encerrado o inquérito enquanto não for praticado acto definitivo ou proferida decisão final sobre a referida situação tributária; não sendo concluídas as investigações enquanto não for apurada a situação tributária ou contributiva da qual dependa a qualificação criminal dos factos, cujo procedimento tem prioridade sobre outros da mesma natureza.[91]

Se estiver a correr processo de impugnação judicial ou tiver lugar oposição à execução, nos termos do Código de Procedimento e de Processo Tributário, em que se discuta situação tributária de cuja definição dependa a qualificação criminal dos factos imputados, o processo penal tributário suspende-se até que transitem em julgado as respectivas sentenças.[92]

A administração tributária ou da segurança social assiste tecnicamente o Ministério Público em todas as fases do processo, podendo designar para cada processo um agente da administração ou perito tributário, que tem sempre a faculdade de consultar o processo e ser informado sobre a sua tramitação.[93]

Somente a sentença proferida em processo de impugnação judicial e a que tenha decidido da oposição de executado, nos termos do Código de Procedimento e de Processo Tributário, uma vez transitadas, constituem caso julgado para o processo penal tributário apenas relativamente às questões nelas decididas e nos precisos termos em que o foram. [94]

Concluídas as investigações relativas ao inquérito, o órgão da administração tributária, da segurança social ou de polícia criminal competente emite parecer fundamentado que remete ao Ministério Público juntamente com o auto de inquérito, sendo certo, porém, que não serão concluídas as investigações enquanto não for apurada a situação tributária ou contributiva da qual dependa a qualificação criminal dos factos, cujo procedimento tem prioridade sobre outros da mesma natureza. [95]
Recebido o auto de inquérito e respectivo parecer, o Ministério Público procede nos termos dos artigos 277.º a 283.º do Código de Processo Penal, tendo em conta o disposto no artigo seguinte. [96]

Por outro lado, não interessa discutir se há excepções à regra de que a cada crime corresponde um dano indemnizável, decorrentes da aptidão da conduta criminosa para gerar danos.
O que interessa para efeitos do pedido de indemnização civil é que haja dano emergente de crime,
 O artº 129º do CP divide-se em três proposições:
            -A indemnização por perdas e danos (e, por isso quaisquer perdas e quaisquer danos)
            -Emergentes de crime (que sejam decorrentes da conduta considerada criminosa – omissiva ou activa)
            -É [a indemnização] regulada pela lei civil

A indemnização civil não exige necessariamente uma relação creditícia de natureza jurídico-privada, o que se torna necessário é que haja dano emergente de crime, para que esse dano seja indemnizável, em processo penal - que é sempre motivado pelo ilícito criminal -, segundo os critérios da lei civil.  

A utilização pelo legislador da expressão "danos ocasionados pelo crime", pressupõe que entre o delito e os prejuízos indemnizáveis, exista um nexo de causalidade.
É necessário que exista nexo de causalidade entre a omissão e o dano, uma vez, que a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão. – artº 563º do C.C.
Decorre do art. 483, do CC, que são elementos da responsabilidade civil extracontratual o facto, a ilicitude, a imputação do facto ao lesante, o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano.
As simples omissões dão lugar à obrigação de reparar os danos, quando, independentemente dos outros requisitos legais, havia, por força da lei ou de negócios jurídicos, o dever de praticar o acto omitido, conforme  artº 486º do C.C.
Como refere ANTUNES VARELA: “A obrigação de reparar um dano supõe a existência de um nexo causal entre o facto e o prejuízo; o facto, lícito ou ilícito, causador da obrigação de indemnizar deve ser a causa do dano, tomada esta expressão no sentido preciso de dano real e não de mero dano de cálculo.”[97]
E citando VAZ SERRA: “O problema não é um problema de ordem física ou, de um modo geral, um problema de causalidade tal como pode ser havido nas ciências da natureza, mas um problema de política legislativa.: saber quando é que a conduta do agente deve ser tida como causa do resultado, a ponto de ele ser obrigado a indemnizar. Ora, sendo assim, parece razoável que o agente só responda pelos resultados para cuja produção a sua conduta era adequada, e não por aqueles que tal conduta, de acordo com a sua natureza geral e o curso normal das coisas, não era apta para produzir e que só se produziriam em virtude de uma circunstância extraordinária”[98]
Como salienta ALMEIDA COSTA, não há que “ressarcir todos e quaisquer danos que sobrevenham ao facto ilícito, mas tão-só os que ele tenha na realidade ocasionado, os que possam considerar-se pelo mesmo produzidos (art. 563.º). O nexo de causalidade entre o facto e o dano desempenha, consequentemente, a dupla função de pressuposto da responsabilidade e de medida da obrigação de indemnizar”.[99]

A imputação do facto ao lesante pode fazer-se a título de dolo ou de mera negligência.
Nos casos de mera culpa há que considerar que a culpa para efeitos de responsabilidade civil não tem que coincidir com a culpa para efeitos de responsabilidade criminal.[100]
           
Por outro lado, os arts. 566º nº 2 e 805º nº 3, do Código Civil, prevêem duas obrigações distintas:
- A decorrente do art. 566º, nº 2, destina-se a permitir - concretizando a teoria da diferença segundo a qual a indemnização deve colocar o lesado em situação o mais possível correspondente à que existiria se não tivesse ocorrido o evento que obriga à reparação;
 - A decorrente de crédito ilíquido - 805º nº 3 - possibilita que a indemnização em dinheiro tenha como referência temporal a data mais recente que puder ser atendida pelo Tribunal (geralmente considerada como sendo a do encerramento da discussão em primeira instância, atento o disposto no art. 663º, n. 1, do C PC.),
            Os critérios da lei civil são critérios substantivos, de natureza obrigacional, na fixação da indemnização que, por esse facto, não se confundem com a natureza da relação jurídica, a que são alheios na sua forma e concretização.
            O que está em causa para efeitos de pedido de indemnização civil não são os procedimentos de exequibilidade, concretização ou reparação da relação jurídica geradora de dano, mas a fixação de indemnização por esse dano, desde que emergente de conduta danosa, ilícita, típica e punível.

A responsabilidade civil do arguido, a apreciar em processo penal, se não é sempre consequência de uma condenação por infracção penal, tem, no entanto, originariamente, por suporte a imputação de um crime, com verificação dos seus elementos constitutivos e de uma subsunção à fattispecie legal, ainda que posteriormente possa vir haver absolvição, o que não invalida o conhecimento do pedido de indemnização civil face ao princípio da adesão, com fundamento em responsabilidade extracontratual.

Considerando a natureza e os fins do processo penal, o princípio da adesão não impõe assim, que a natureza de qualquer obrigação extrapenal conexa com a infracção criminal, tenha necessariamente de revestir a natureza de relação jurídica civil, embora a sua violação, constituindo crime, possa integrar dano, que possa considerar-se emergente de crime.

O que o artº 71º do CPP impõe, é bastante simples: «O pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime é deduzido no processo penal respectivo, só o podendo ser em separado, perante o tribunal civil, nos casos previstos na lei.”
            Diríamos que se a fonte da obrigação de indemnização é a responsabilidade civil, como se perfila no artº 483º do Código Civil, constitui apenas critério metodológico de fixação da indemnização, já que a causa de pedir, está no dano emergente de crime, ou melhor na conduta constitutiva da ilicitude criminal, que produziu dano e que não deixará de ser apreciada, em termos de responsabilidade extracontratual, ainda que haja absolvição ou extinção do procedimento criminal.

 Da mesma forma que a natureza da prestação em dívida não se altera pela interposição de um processo criminal, a dedução neste do pedido de indemnização civil referente ao valor dessa prestação, não perde a validade e viabilidade próprias daquela prestação, tanto mais que o próprio artº9.º do RGIT determina que «o cumprimento da sanção aplicada não exonera do pagamento da prestação tributária devida e acréscimos legais».
“A obrigação tributária é autónoma relativamente à responsabilidade penal pela prática do crime tributário e autónoma é também da obrigação de indemnização pelos danos emergentes do crime tributário, ainda que entre a dívida tributária, a responsabilidade pelo crime e pela indemnização dos danos provocados pelo crime existam estreitas conexões”[101]
 A omissão do dever de pagamento da prestação tributária e acréscimos legais, subsiste e constitui a ilicitude.
 Ao incumprimento da relação contributiva é atribuída dignidade penal, pressupondo a ilicitude a definição - determinação - da dívida tributária, cujo valor gera imediatamente dano,  a liquidar pela lei fiscal e a ser reclamado em processo penal, havendo-o.
A dívida tributária subjacente à infracção criminal, e cujo incumprimento a integra, constitui dano emergente de crime, porque emerge da constituição deste, visto que integra a materialidade da ilicitude típica.
Como salienta GERMANO MARQUES DA SILVA “se o facto constitutivo do crime não é o facto gerador da dívida de imposto (da obrigação tributária) pode ser e é frequentemente a causa do não pagamento, da falta de cumprimento da obrigação tributária, e nessa medida é causa de dano para a administração tributária.”[102]
            Refere este mesmo Autor:”a dívida tributária existe e o seu fundamento, a sua causa, é autónoma do crime, mas o dano resultante do não pagamento ou mora é causado pela perpetração do facto do crime.”[103]
A omissão de pagamento de contribuições devidas à Segurança Social ao constituir crime, pela não entrega dessas contribuições, traduzidas em montante pecuniário, constitui um dano, por esse facto (não entrega) emergente de crime, dano esse que sendo integrado por uma substancialidade patrimonial, assenta num facto ilícito, e por isso, sujeito à regra do artº 129º do Código Penal.
            Daqui decorre, por outro lado, que em caso de dívida tributária que não integre crime, não constitui dano emergente de crime e, neste caso competente para liquidação e cobrança da mesma é apenas a competente a entidade tributária, através dos mecanismos tributários próprios, como o processo executivo fiscal,
            São realidades distintas que não se confundem, a liquidação e cobrança de dívida fiscal, por via fiscal, em execução fiscal, e o pedido de indemnização resultante da prática de crimes fiscais, que de per se, obedecem a causas de pedir diferentes, podendo gerar pedidos também diferentes.
É que como salienta GERMANO MARQUES DA SILVA. “o valor do dano causado à administração tributária corresponde, em regra, ao valor da prestação tributária em falta, mas a causa do dano é outra, é a prática do crime. Pode até suceder que o crime não tenha causado prejuízo equivalente ao da prestação tributária em dívida, ou porque não existe qualquer prestação tributária em dívida ou porque o prejuízo causado pelo crime foi inferior ao do valor da prestação tributária devida. Nem o RGIT nem a LGT afastam a regra geral constante dos arts. 483º a 498º do Código Civil, aplicáveis por remissão do art. 129º do Código Penal, porque nunca se referem aos danos emergentes do crime, salvo quando o art. 3º, al. c), do RGIT manda aplicar subsidiariamente as disposições do Código Civil. A unidade e coerência do sistema impõem que se distinga a responsabilidade pelo pagamento do imposto (responsabilidade tributária), sendo então aplicável a legislação tributária, nomeadamente a Lei Geral Tributária, e a responsabilidade emergente do crime, consequência civil resultante da prática do ilícito criminal causador de dano à administração tributária ou à administração da segurança social.”[104]
O objecto do pedido de indemnização civil não é a dívida tributária qua tale, mas o prejuízo, gerador de responsabilidade civil e do dever de indemnizar, nela fundamentado, emergente da conduta danosa e imputada, integrante da prática do crime de abuso de confiança fiscal, constitutiva de responsabilidade por factos ilícitos, submetida ao regime dos artºs 129º do CP e  483º, e segs do CC. e consubstanciada na não entrega à Segurança Social, entrega essa legalmente obrigatória, de determinada quantia integrante da prestação tributária,  e que, por omissão dolosa, lhe provocou, assim, o prejuízo correspondente.
A responsabilidade por factos ilícitos, decorrente da prática de um crime, não se confunde assim, com a responsabilidade administrativa-tributária.
O pedido de indemnização civil em processo penal, no crime de abuso de confiança contra a Segurança Social, não tem por objecto a definição e exequibilidade de acto tributário, mas sim a obrigação de indemnização por danos emergentes da conduta danosa que o integra, com fundamento na responsabilidade por factos ilícitos que daí surge nos termos dos artºs 483 e segs. do Código Civil.
 
Nem a questão das diferentes responsabilidades tributárias – solidária e subsidiária – se coloca, uma vez que a reversão é privativa do processo tributário, aplicável apenas quando o processo de execução fiscal for accionado, e de harmonia com os respectivos pressupostos ou condicionantes.
            Na verdade, é juridicamente pertinente o que se colhe nas doutas alegações do Demandante Instituto de Segurança Social, IP, (ISS, IP), no sentido de que:
O título executivo na Secção de Processos Executivos do Instituto de Segurança Social, I.P.- abreviadamente designado por SPE. e a sentença condenatória não se referem à mesma obrigação, pois a responsabilidade pelo pagamento das contribuições não se confunde com a responsabilidade civil emergente da eventual prática do crime de abuso de confiança contra a segurança social, como sustenta o Prof. Germano Marques da Silva ("Direito Penal Tributário - Sobre as Responsabilidades das Sociedades e dos seus Administradores Conexas com o Crime Tributários, Lisboa 2009).”
Ainda que esteja a correr termos uma execução numa SPET o IS8, IP mantém o interesse em agir em sede de pedido de indemnização civil num processo por crime de abuso de confiança.
A causa de pedir subjacente ao titulo no processo executivo é o incumprimento da obrigação legal de entregar as prestações devidas à segurança social, enquanto que a causa de pedir subjacente ao pedido de indemnização civil é a responsabilidade civil emergente da prática do crime de abuso de confiança em relação à segurança social.
Não se pode dizer que o demandante ISS, IP pretende usar o processo declarativo para definir um direito que já se encontrava estabelecido em termos idênticos num título com manifesta força executiva, como o que está presente nas execuções nas SPE.
Como se sustenta nos Acórdãos do STJ de 11/12/2008 e de 29/10/2009 a indemnização pedida nos processos crime por abuso de confiança contra a segurança social não se destina a liquidar uma obrigação tributária para com a segurança social, sendo antes fixada segundo critérios da lei civil, apesar de os factos geradores da obrigação de indemnizar e da obrigação tributária poderem ser parcialmente coincidentes, não podendo naturalmente ser confundidos os seus fins e regimes.
Por outro lado, na responsabilidade civil por facto ilícito o arguido gerente, como co-autor, responde solidariamente com a sociedade arguida pelo pagamento da indemnização por danos causados à segurança social, nos termos do art. 497.° do Código Civil, art.º 3.º do RGIT, arts. 8.° e 129.° do CP, razão pela qual, para obter título executivo contra todos os arguidos - incluindo os não susceptíveis de figurar originariamente no titulo na SPE - sempre o ISS,IP terá que formular o pedido civil contra todos no processo crime (Neste sentido, (CC. António Santos Abrantes Geraldes, Temas Judiciários, vol. I, Almedina, 1998, págs. 232-234, e Abílio Neto, Código de Processo Civil Anotado, 16.8. ed., pág. 630, nota 15.)).
Estamos perante causas de pedir diferentes no processo executivo e no pedido de indemnização civil no processo-crime, os sujeitos a quem é imputada responsabilidade são distintos.
Nos termos do art.° 162.° do CPPT a execução na SPE só pode ser intentada contra a sociedade, devedora originária, só depois é que poderá reverter.
E isto, faz toda a diferença em termos de garantias de exequibilidade patrimonial por parte da Segurança Social.
Na execução baseada em título emitido pela segurança social, os fundamentos de oposição são muito mais alargados, do que os previstos no CPC em oposição à execução baseada em sentença, que só pode ter por base algum dos fundamentos do art.º 813.° do CPC,  -v. art. ° 286. do CPT..
Ê que o título executivo de que a Segurança Social dispõe nas SPE não lhe garante os mesmos direitos de exequibilidade relativamente ao gerente, cuja responsabilidade é meramente subsidiária, isto é, pode fazer reverter a execução contra este depois de executado o património da sociedade, enquanto que, obtendo uma sentença condenatória que o responsabilize solidariamente pelo pagamento das mesmas prestações, o assistente pode accioná-lo imediatamente e a titulo principal e executar desde modo o seu património individual, sem qualquer moratória.

Em processo penal, para efeitos do princípio da adesão, “Deve considerar-se que qualquer terceiro que viole uma obrigação ou de alguma forma colabore com o devedor em tal violação, é responsável, nos termos gerais, pelos prejuízos causados, desde que se verifiquem os requisitos da imputação delitual.”[105]
Na verdade, o pedido de indemnização civil pode ser deduzido contra pessoas com responsabilidade meramente civil e estas podem intervir voluntariamente no processo penal, mas a intervenção voluntária impede as pessoas com responsabilidade meramente civil de praticarem actos que o arguido tiver perdido o direito de praticar.[106]

            Em síntese, como salienta GERMANO MARQUES DA SILVA:[107]
            “Nem o RGIT nem a LGT afastam a regra geral constante dos arts. 483º a 498º do Código Civil, aplicáveis por remissão do artº129º do Código Penal.
[…] A unidade e coerência do sistema impõem que se distinga a responsabilidade pelo pagamento do imposto (responsabilidade tributária), sendo então aplicável a legislação tributária, nomeadamente a Lei Geral Tributária, e a responsabilidade emergente de crime, consequência civil resultante da prática do ilícito criminal causador de dano à administração tributária ou à administração da segurança social.
[…] A dívida tributária existe e mantém-se independentemente da prática do crime tributário, mas se o crime causar danos os seus agentes são responsáveis pela indemnização dos danos dele emergentes nos termos gerais.
Do exposto decorre que pelos danos causados pelos crimes tributários respondem os agentes dos crimes e respondem não nos termos da Lei Geral Tributária, mas nos termos da lei civil.
Assim, o administrador da empresa que seja também agente do crime, não responderá subsidiariamente, mas solidariamente, como solidariamente respondem todos os demais agentes nos termos do que dispõe o artº 497º do Código Civil.”

Ou parafraseando o já decidido por este Supremo Tribunal[108]
“De acordo com o art. 129.º do CP, a indemnização de perdas e danos emergentes de um crime é regulada pela lei civil.
Desde cedo a jurisprudência entendeu que tal norma só determina que a indemnização seja regulada “quantitativamente e nos seus pressupostos” pela lei civil, remetendo para os critérios da lei civil relativos à determinação concreta da indemnização, não tratando de questões processuais, que são reguladas pela lei adjectiva penal, nomeadamente nos seus arts. 71.º a 84.º – Acs. do STJ, de 12-12-84, BMJ n.º 342, pág. 227; de 06-03-85, BMJ n.º 345, pág. 213; de 13-02-86, Proc. n.º 38028; de 06-01-88, BMJ n.º 373, pág. 264; de 12-01-95, CJSTJ 95, tomo 1, pág. 181; de 09-06-96, Proc. n.º 6/95; de 10-12-96, CJSTJ 96, tomo 3, pág. 202 e BMJ, n.º 462, pág. 294; de 09-07-97, CJSTJ 97, tomo 2, pág. 260; de 14-11-2002, Proc. n.º 3316/02 - 5.ª; de 24-11-2005, Proc. n.º 2831/05 - 5.ª; de 07-03-2007, Proc. n.º 4596/06 - 3.ª; de 25-06-2008, Proc. n.º 449/08 - 3.ª; de 03-09-2008, Proc. n.º 3982/07 - 3.ª; de 15-10-2008, Proc. n.º 1964/08 - 3.ª; de 29-10-2008, Proc. n.º 3373/08 - 3.ª; de 05-11-2008, Proc. n.º 3266/08 - 3.ª; de 10-12-2008, Proc. n.º 3638/08 - 3.ª [a interdependência das acções significa independência substantiva e dependência (a «adesão») processual da acção cível relativamente ao processo penal]; de 18-02-2009, Proc. n.º 2505/08 - 3.ª; de 25-02-2009, Proc. n.º 3459/08 - 3.ª; de 15-04-2009, Proc. n.º 3704/08 - 3.ª; e de 18-06-2009, Proc. n.º 81/04.8PBBGC.S1 - 3.ª.
Como resulta do art. 3.º, al. c), do RGIT, quanto à responsabilidade civil, são aplicáveis subsidiariamente, as disposições do CC e legislação complementar.
Nestes casos de responsabilidade civil conexa com a criminal, a mesma tem a sua génese no crime, sendo um crime o seu facto constitutivo, a causa de pedir da pretensão ressarcitória.
A competência do tribunal criminal para conhecer do pedido cível conexo com a acção penal decorre da responsabilidade civil extracontratual do agente que cometa o facto ilícito e culposo.
Os crimes tributários são julgados nos tribunais criminais, e não nos tribunais administrativos e fiscais.
Sendo diversos os sujeitos numa e noutra demanda – pelo menos, os originários – e a causa de pedir (a pretensão deduzida nas execuções fiscais e a pretensão formulada no presente processo não procedem do mesmo facto jurídico – cf. art. 498.º, n.º 4, do CPC), bem como o pedido, pois a indemnização aqui impetrada não se destina a liquidar uma obrigação tributária para com a segurança social, nem se poderá colocar a questão de configuração da excepção dilatória da litispendência.
Mesmo que o demandante use dessa opção, não haverá lugar a condenação em custas, nos termos do art. 449.º, n.º 2, al. c), do CPC, pois que o título de cobrança não tem manifesta força executiva contra o responsável subsidiário, de tal modo que há que fazê-lo intervir no processo, e por outro lado, a acção enxertada tem uma configuração e alcance muito mais amplo do que a exercitada no executivo, pois não está em causa uma presunção legal de culpa, mas uma imputada, em sede criminal, intenção criminosa.
A competência do tribunal criminal para conhecer da acção penal e da conexa acção cível enxertada não se confunde com a competência dos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal em processo de execução.
Nestes casos não está em causa apurar da responsabilidade do demandado perante os credores sociais, quando pela inobservância culposa das disposições legais ou contratuais destinadas à protecção desses credores, o património social se torne insuficiente para a satisfação dos respectivos créditos – n.º 1 do art. 78.º do CSC –, mas de apurar a sua responsabilidade civil pela prática de ilícito de natureza criminal mesmo que não seja objecto de condenação, que não exige o preenchimento dos pressupostos referidos.
O tribunal criminal tem competência em razão da matéria para julgar a acção cível interposta pelo ISS, não havendo lugar neste tipo de processos à figura da reversão
A substituição tributária verifica-se quando, por imposição da lei, a prestação tributária for exigida a pessoa diferente do contribuinte.
A substituição tributária é efectivada através do mecanismo da retenção na fonte do imposto devido.
A responsabilidade subsidiária efectiva-se por reversão do processo de execução fiscal.
A reversão contra o responsável subsidiário depende da fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal e dos responsáveis solidários, sem prejuízo do benefício da excussão.
A reversão, mesmo nos casos de presunção legal de culpa, é precedida de audição do responsável subsidiário nos termos da presente lei e da declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação.
As pessoas colectivas e as sociedades são criminalmente responsáveis pelas infracções previstas no RGIT, quando cometidas pelos seus órgãos ou representantes, em seu nome e no interesse colectivo, responsabilidade que não exclui a responsabilidade individual dos respectivos agentes (art. 7.º, n.°s 1 e 3, do RGIT).
Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:
a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício de seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;
b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.
Sobre a extensão da legitimidade passiva na execução fiscal, mais concretamente sobre o chamamento à execução dos responsáveis subsidiários, rege o n.º 2 do art. 153.º do CPPT, aprovado pelo DL 433/99, de 26-10, republicado em anexo ao DL 15/2001.
Tal chamamento depende da verificação de qualquer das seguintes circunstâncias: inexistência de bens penhoráveis do devedor e seus sucessores, ou fundada insuficiência, de acordo com os elementos constantes do auto de penhora e outros de que o órgão da execução fiscal disponha, do património do devedor para a satisfação da dívida exequenda e acrescido.
E de acordo com o art. 159.º do mesmo CPPT, no caso de substituição tributária e na falta ou insuficiência de bens do devedor, a execução reverterá contra os responsáveis subsidiários.
Com a reversão o que ocorre é uma modificação subjectiva da instância, uma ampliação do âmbito subjectivo da instância executiva, através da intervenção de um terceiro (à luz do título executivo extrajudicial donde promana a execução fiscal – certidão extraída do título de cobrança – art. 162.º, al. a), do CPPT), mas que também é sujeito passivo da relação tributária, como “responsável” (art. 18.º, n.º 3, in fine, da LGT), vinculado ao cumprimento da prestação tributária, nos termos do n.º 2 do art. 23.º da LGT e art. 153.º, n.º 2, do CPPT, ou seja, no caso de não haver bens penhoráveis do devedor e seus sucessores ou insuficiência de bens penhoráveis do devedor principal e dos responsáveis solidários.
A execução reverte assim contra pessoa distinta da que figura no título executivo como devedor, ocorrendo quanto a ela, não os pressupostos do facto tributário, mas da responsabilidade, operando-se a extensão da obrigação de cumprimento da prestação tributária a pessoa diversa do contribuinte directo.

Estão excluídos da jurisdição administrativa e fiscal os recursos e as acções que tenham por objecto actos relativos ao inquérito e instrução criminais e ao exercício da acção penal.
A figura de reversão, própria do processo executivo tem por objectivo chamar à acção executiva quem à luz do título executivo não é parte (cfr. arts. 55.º, n.º 1, do CPC, e 153.º, n.ºs 1 e 2, do CPPT), situação completamente diversa daquela em que há demandado ab initio, numa acção com estrutura declarativa, sendo contra si invocada uma concreta causa de pedir e formulado um pedido concreto, que pode impugnar nos termos gerais consentidos em processo penal.
Na execução fiscal o devedor substituto não figura no título de cobrança do tributo.

Ao optar pelo exercício da acção conjunta o demandante pretende obter decisão condenatória que, transitada em julgado, assume o papel de título executivo, com a configuração própria do art. 467.º do CPP.
 Aqui o devedor é demandado a título principal, tendo por base a autoria de um crime de que emerge uma conexa responsabilidade civil delitual – art. 6.º do RGIT – sendo o pedido baseado na obrigação de indemnizar pelos danos causados pela prática de facto ilícito e culposo – art. 483.º do CC.
Mais do que uma presunção legal de culpa (art. 23.º, n.º 4, da LGT), invocável em sede de responsabilidade tributária, aqui o pedido de indemnização fundamenta-se na prática de um facto que à data constituía crime doloso, pois o crime em questão é apenas previsto na forma dolosa (não estando expressamente prevista a punição por negligência, os factos integradores de crime só podem ser punidos se praticados com dolo – art. 13.º do CP), sendo o pedido substanciado numa causa de pedir de matriz diversa – não em responsabilidade tributária, mas responsabilidade criminal e responsabilidade civil decorrente da prática de um crime, uma responsabilidade extra contratual, delitual ou aquiliana.
Sendo certo que o ISS, pode instaurar processo de execução fiscal possuindo para tal título executivo, podendo ainda nessa sede requerer a reversão, reunidos que sejam os necessários requisitos, nada impede que faça uso da faculdade conferida em processo penal do princípio da adesão.
A competência do tribunal criminal para conhecer do pedido cível conexo com a acção penal decorre da responsabilidade civil extracontratual do agente que cometa o facto ilícito e culposo. Neste quadro legal, que é o aplicável, não há lugar a qualquer reversão.
Assim, o tribunal criminal tem competência em razão da matéria para julgar a acção cível interposta pelo IGFSS, não havendo lugar neste tipo de processos à figura da reversão, nem se mostrando violados os arts. 212.º da CRP, e 1.º, n.º 1, do ETAF.”


Termos em que, decidindo:
 
Acorda-se em fixar a seguinte jurisprudência:

«Em processo penal decorrente de crime de abuso de confiança contra a Segurança Social, p. e p. no artº 107º nº 1, do R.G.I.T., é admissível, de harmonia com o artº 71.º, do C.P.P., a dedução de pedido de indemnização civil tendo por objecto o montante das contribuições legalmente devidas por trabalhadores e membros dos órgãos sociais das entidades empregadoras, que por estas tenha sido deduzido do valor das remunerações, e não tenha sido entregue, total ou parcialmente, às instituições de segurança social.»


Mantêm-se a decisão recorrida, nos termos da jurisprudência ora fixada — artigo 445.º, n.º 2, do CPP.

Cumpra-se o artigo 444.º, n.º 1, do Código de Processo Penal.


Supremo Tribunal de Justiça, 15 de Novembro de 2012

Pires da Graça (Relator)
Raul Borges
Isabel Pais Martins
Manuel Braz
Carmona da Mota
Pereira Madeira
Santos Carvalho
Henriques Gaspar
Rodrigues da Costa
Armindo Monteiro
Arménio Sottomayor
Santos Cabral
Oliveira Mendes
Souto de Moura
Maia Costa
Noronha Nascimento


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[1] Declaração de Rectificação nº 7-B/99, de 27/02, Lei n.º 100/99 de 26 de Julho; Lei n.º 3-B/2000 de 4 de Abril, Lei n.º 30-G/2000 de 29 de Dezembro, Lei n.º 16-A/2002 de 31 de Maio; Lei n.º 32-B/2002 de 30 de Dezembro; Dec.-Lei n.º 160/03, de 19 de Julho, Lei nº 107-B/2003 de 31 de Dezembro, Lei 55-B/2004, de 30 de Dezembro) Lei n.º 60-A/2005, de 30 de Dezembro, Dec-Lei.nº 238/2006, de 20 de Dezembro, Lei 53-A/2006, de 29 de Dezembro, Lei n.º 67-A/2007, de 31 de Dezembro, Lei n.º64-A/2008, de 31 de Dezembro, Lei n.º94/2009, de 1 de Setembro, Lei n.º 37/2010, de 2 de Setembro; Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro; Lei 64-B/2011 de 30 de Dezembro, Dec-Lei.nº 32/2012, de 13 de Fevereiro, sendo a última alteração efectuada pela Lei nº 20/2012, de 14/05
[2]   Artigo 30º
[3] . Artigo 11º nº1
[4] .-Artigo 1º nº 2
[5] . Artigo 18º nº 1
[6] Nº 3 do Artigo 1º, cujo n.º 4 dispõe — Não é sujeito passivo quem:
a) Suporte o encargo do imposto por repercussão legal, sem prejuízo do direito de reclamação, recurso ou impugnação nos termos das leis tributárias;
b) Deva prestar informações sobre assuntos tributários e terceiros, exibir documentos, emitir laudo em processo administrativo ou judicial ou emitir o acesso a imóveis ou locais de trabalho.
[7] Artigo 31º nº 1
[8] Artigo 20.º
[9] Artigo 21.º
[10] Artigo 22.º
[11] Artigo 23.º
[12] Artigo 28.º- sem prejuízo do disposto nos números seguintes.
2 —Quando a retenção for efectuada meramente a título de pagamento por conta do imposto devido a final,  cabe ao substituído a responsabilidade originária pelo imposto não retido e ao substituto a responsabilidade subsidiária, ficando este ainda sujeito aos juros compensatórios devidos desde o termo do prazo de entrega até ao termo do prazo para apresentação da declaração pelo responsável originário ou até à data da entrega do imposto retido, se anterior..
3 - Nos restantes casos, o substituído é apenas subsidiariamente responsável pelo pagamento da diferença entre as importâncias que deveriam ter sido deduzidas e as que efectivamente o foram.

[13] Artigo 41.º
[14] Artigo 52.º
[15] Artigo 54º- contemplado no CAPÍTULO I, do TÍTULO III
[16] Artigo 103.º
[17] Artigo 44.º
[18] Artigo 78.º
[19] Artigo 85.º
[20] Artigo 97.º
[21] Artigo 148.º

[22] Artigo 149.º
[23] Artigo 151.º nº 1- Sobre a competência dos tribunais tributários., 
[24] N º2 do citado Artigo 151º
Paradigmático é ainda o que se encontra estabelecido no Artigo 180.º sobre o Efeito do processo de recuperação da empresa e de falência na execução fiscal:
1 — Proferido o despacho judicial de prosseguimento da acção de recuperação da empresa ou declarada falência, serão sustados os processos de execução fiscal que se encontrem pendentes e todos os que de novo vierem a ser instaurados contra a mesma empresa, logo após a sua instauração.
2 — O tribunal judicial competente avocará os processos de execução fiscal pendentes, os quais serão apensados ao processo de recuperação ou ao processo de falência, onde o Ministério Público reclamará o pagamento dos respectivos créditos pelos meios aí previstos, se não estiver constituído mandatário especial.
3 — Os processos de execução fiscal, antes de remetidos ao tribunal judicial, serão contados, fazendo-se neles o cálculo dos juros de mora devidos.
4 — Os processos de execução fiscal avocados serão devolvidos no prazo de oito dias, quando cesse o processo de recuperação ou logo que finde o de falência.
5 — Se a empresa, o falido ou os responsáveis subsidiários vierem a adquirir bens em qualquer altura, o processo de execução fiscal prossegue para cobrança do que se mostre em dívida à Fazenda Pública, sem prejuízo das obrigações contraídas por esta no âmbito do processo de recuperação, bem como sem prejuízo da prescrição.
6 — O disposto neste artigo não se aplica aos créditos vencidos após a declaração de falência ou despacho de prosseguimento da acção de recuperação da empresa, que seguirão os termos normais até à extinção da execução.
[25] Artigo 196.º (Pagamento em prestações e outras medidas), da SECÇÃO IV (Do pagamento em prestações).
O número de prestações mensais previstas pode ser alargado até 120 desde que cumulativamente se verifiquem as seguintes condições:
a) A dívida exequenda exceda 500 unidades de conta no momento da autorização;
b) O executado preste garantia idónea;
c) Se demonstre notória dificuldade financeira e previsíveis consequências económicas

[26] Artigo 2º nºs 1 e 2
[27] Artigo 50.º, sobre os objectivos do sistema previdencial que consta do CAPÍTULO III
[28]Nº 1 do Artigo 51.ao definir o âmbito pessoal, estabelecendo, por suja vez, o nº 2:
2—As pessoas que não exerçam actividade profissional ou que, exercendo-a, não sejam, por esse facto, enquadradas obrigatoriamente nos termos do número anterior, podem aderir à protecção social definida no presente capítulo, nas condições previstas na lei.
O âmbito material é dado pelo Artigo 52.º que dispõe:
A protecção social integra as seguintes eventualidades:
a) Doença;
b) Maternidade, paternidade e adopção;
c) Desemprego;
d) Acidentes de trabalho e doenças profissionais;
e) Invalidez;
f) Velhice; e
g) Morte.
2—O elenco das eventualidades protegidas pode ser alargado, em função da necessidade de dar cobertura a novos riscos sociais, ou reduzido, nos termos e condições legalmente previstos, em função de determinadas situações e categorias de beneficiários.
[29] Artº53º.
[30] O Artigo 54.º, que estabelece o princípio da contributividade.
[31] Artigo 55.º
As obrigações dos contribuintes encontram-se plasmadas no Artigo 56.º
1—Os beneficiários e, no caso de exercício de actividade profissional subordinada, as respectivas entidades empregadoras, são obrigados a contribuir para os regimes de segurança social.
2—A obrigação contributiva das entidades empregadoras constitui-se com o início do exercício da actividade profissional dos trabalhadores ao seu serviço.
3—A lei define o modo e as condições de concretização da obrigação contributiva e das demais obrigações dos contribuintes perante o sistema.
4—A lei estabelece ainda, nos casos de incumprimento das obrigações dos contribuintes, o regime do respectivo suprimento oficioso pelos serviços da segurança social.
[32] Artigo 57:
 1—O montante das quotizações dos trabalhadores por conta de outrem e das contribuições das entidades empregadoras é determinado pela aplicação das taxas legalmente previstas às remunerações que, nos termos da lei, constituam base de incidência contributiva.
2—A lei define os critérios e as condições de registo de remunerações por equivalência à entrada de contribuições, designadamente quanto à relevância jurídica, ao valor a registar e ao respectivo período de registo.
3—As taxas contributivas são fixadas, actuarialmente, em função do custo de protecção das eventualidades previstas, sem prejuízo da possibilidade de adequações, designadamente em razão da natureza das entidades contribuintes, das situações específicas dos beneficiários ou de políticas de emprego.

4—A lei pode prever mecanismos de adequação do esforço contributivo, justificados pela alteração das condições económicas, sociais e demográficas, designadamente mediante a conjugação de técnicas de repartição e de capitalização.

Por sua vez o Artigo 58. refere-se aos limites contributivos.
[33] Artº 59, nº 1, estabelecendo o nº 2
2—São nulas as cláusulas do contrato, individual ou colectivo, pelo qual o trabalhador assuma a obrigação de pagar, total ou parcialmente, as contribuições devidas pela entidade empregadora.
[34] Artigo 60º sobre a restituição e cobrança coerciva das contribuições ou prestações
[35] ANTÒNIO MANUEL VALENTE LOPES DIAS, Considerações sobre o enquadramento dogmático dos crimes contra a Segurança Social, trabalho realizado no âmbito do curso de pós-graduação em Direito Penal Económico Europeu, do Instituto de Direito Penal Económico Europeu, da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra verbo jurídico ® 2005, p. 8
[36] A.V.LOPES DIAS, ibidem, pág.. 9
[37] A.V.LOPES DIAS, ibidem, pág. 6
[38] A.V.LOPES DIAS, ibidem, pág.. 9
[39] O diploma encontra-se actualizado de acordo com os seguintes diplomas: - Decreto-Lei nº 112/2004, de 13 de Maio; Lei nº 64-A/2008, de 31 de Dezembro; e Lei nº 3-B/2010, de 28 de Abril.
[40] Consta do preâmbulo do diploma:
Nos termos do artigo 38º da Lei nº 3-B/2000, de 4 de Abril, ficou o Governo autorizado a legislar no sentido da criação, no âmbito do sistema de solidariedade e segurança social, de secções de processos competentes para a execução de dívidas à segurança social, competindo-lhe igualmente, e em simultâneo, adequar a organização e competência dos tribunais administrativos e fiscais àquela nova realidade.
No seguimento da aprovação de uma nova Lei de Bases da Solidariedade e Segurança Social, e no momento em que o processo de reforma institucional deste sistema se encontra já numa fase final d implementação, importa dar mais um passo decisivo no sentido do reforço da eficácia operacional do aparelho administrativo da segurança social através da concretização da autorização legislativa acima mencionada.
Mediante a criação de secções de execução autónomas, devidamente integradas no sistema, confere- se maior celeridade ao processo de cobrança coerciva na medida em que se agilizam os mecanismos e procedimentos tendentes à sua efectivação.
Os objectivos a prosseguir pelas secções de processos não põem em causa a experiência entretanto adquirida e, nesta 1.ª fase, o quadro legislativo de fundo deverá manter-se o existente para o procedimento e o processo tributários.
Reafirma-se este princípio em várias disposições do presente diploma, que mais não pretendem que aplicar o disposto no Código de Procedimento e de Processo Tributário ao sistema de solidariedade e segurança social.
Desse modo se dará continuidade ao trabalho já realizado, deixando para mais tarde e depois de algum tempo de prática a alteração do quadro legislativo em vigor.
Da mesma forma se estabelece o regime jurídico especial que consagra a autonomia da execução das contribuições e das dívidas à segurança social, sem prejuízo quer da possível coligação da segurança social com a Fazenda Pública como exequentes, quer da apensação dos respectivos processos de execução. Fica já traçado o regime jurídico especial do processo de execução das dívidas à segurança social.
Às delegações do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, enquanto órgãos próprios do sistema, é atribuída a competência para a instauração e instrução dos processos de execução de dívidas ao sistema de solidariedade e segurança social.
Este novo processo de execução entronca com o processo judicial de execução fiscal já instituído.
Daí que a autorização legislativa preveja também a adequação da organização e da competência dos tribunais administrativos e tributários para o caso de se entender que aquelas são alteradas.
Com o presente diploma visam-se dois objectivos primaciais: por um lado, aproveitar a experiência e as sinergias que a prática com a administração fiscal sempre proporciona e, por outro, ganhar autonomia que facilite uma maior celeridade e eficiência na cobrança das dívidas à segurança social e, desse modo, combater a evasão e a fraude contributivas.

[41] Artigo 1º
[42] Artigo 3º
[43] Artigo 7º, nº 1
2 - As certidões referidas no número anterior devem indicar o órgão de execução ou a instituição que as tiverem extraído, com a assinatura devidamente autenticada, data em que foram passadas, nome e domicílio do devedor, proveniência da dívida e indicação, por extenso, do seu montante, da data a partir da qual são devidos juros de mora e da importância sobre que incidem, com discriminação dos valores retidos na fonte, se for o caso.
3 - Carece de força executiva, devendo ser devolvido à entidade que o tiver extraído ou remetido, o título a que falte algum dos requisitos obrigatórios.
4 - Ao título executivo deve ser junto o extracto da conta corrente, quando for caso disso.
[44] Artigo 5º
Consideram-se, para efeitos do presente diploma, órgãos de execução as secções de processos das delegações do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social.
[45] Artigo 6º
[46] Artigos.8º e 9º
Artigo 10º
As instituições do sistema de solidariedade e segurança social podem coligar-se, em processo de execução, às instituições do sistema fiscal.
 A coligação é decidida pelos membros do Governo competentes, com faculdade de delegação.
O processo de execução é instaurado e instruído pelo maior credor
É permitida a apensação de execuções nos termos do disposto no artigo anterior.- Artigo 11º
[47] Artigo 12º
[48] Artº 13º
[49] A.V.LOPES DIAS, ibidem, págs 4 a 6.
[50] Lei com actualizações posteriores, sendo as últimas pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro e Lei n.º 20/2012, de 14 de Maio.
Na parte III, sob o epíteto “Das infracções tributárias em especial” o RGIT, consagrou nos seguintes capítulos as seguintes espécies de crimes tributários
Capítulo I – Crimes tributários comuns
Capítulo II - Crimes Aduaneiros
Capítulo III - Crimes Fiscais
Capítulo IV - Crimes Contra a Segurança Social

[51] Frederico de Lacerda da Costa Pinto, Crimes tributários – Portugal, Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa
[52] Artigo 105.º Abuso de confiança:
1 - Quem não entregar à administração tributária, total ou parcialmente, prestação tributária de valor superior a (euro) 7500, deduzida nos termos da lei e que estava legalmente obrigado a entregar é punido com pena de prisão até três anos ou multa até 360 dias. (Redacção da Lei n.º64-A/2008, de 31 de Dezembro)
2 - Para os efeitos do disposto no número anterior, considera-se também prestação tributária a que foi deduzida por conta daquela, bem como aquela que, tendo sido recebida, haja obrigação legal de a liquidar, nos casos em que a lei o preveja.
3 - É aplicável o disposto no número anterior ainda que a prestação deduzida tenha natureza parafiscal e desde que possa ser entregue autonomamente.
4 - Os factos descritos nos números anteriores só são puníveis se:
a) Tiverem decorrido mais de 90 dias sobre o termo do prazo legal de entrega da prestação;
b) A prestação comunicada à administração tributária através da correspondente declaração não for paga, acrescida dos juros respectivos e do valor da coima aplicável, no prazo de 30 dias após notificação para o efeito.
(Redacção da Lei 53-A/2006, de 29 de Dezembro)
5 - Nos casos previstos nos números anteriores, quando a entrega não efectuada for superior a (euro) 50 000, a pena é a de prisão de um a cinco anos e de multa de 240 a 1200 dias para as pessoas colectivas.
6 - Revogado. Redacção da Lei n.º64-A/2008, de 31 de Dezembro.
7 - Para efeitos do disposto nos números anteriores, os valores a considerar são os que, nos termos da legislação aplicável, devam constar de cada declaração a apresentar à administração tributária.
De harmonia com o Acórdão n.º 6/2008, de 09.04.2008, DR 94 SÉRIE I de 2008-05-15
«A exigência prevista na alínea b) do n.º 4 do artigo 105.º do RGIT, na redacção introduzida pela Lei n.º 53-A/2006, configura uma nova condição objectiva de punibilidade que, por aplicação do artigo 2.º, n.º 4, do Código Penal, é aplicável aos factos ocorridos antes da sua entrada em vigor. Em consequência, e tendo sido cumprida a respectiva obrigação de declaração, deve o agente ser notificado nos termos e para os efeitos do referido normativo [alínea b) do n.º 4 do artigo 105.º do RGIT].»
Por sua vez, o Acórdão n.º 8/2010, de 14 de Julho de 2010, DR 186 SÉRIE I de 2010-09-23 veio fixar jurisprudência, no sentido de que, a exigência do montante mínimo de 7500 euros, de que o nº 1 do art. 105º do Regime Geral das Infracções Tributárias - RGIT (aprovado pela Lei nº 15/2001, de 5 de Junho, e alterado, além do mais, pelo art. 113º da Lei nº 64-A/2008, de 31 de Dezembro) faz depender o preenchimento do tipo legal de crime de abuso de confiança fiscal, não tem lugar em relação ao crime de abuso de confiança contra a segurança social, previsto no art. 107º nº 1 do mesmo diploma.»
[53] Artigo 11.º Definições
Para efeitos do disposto nesta lei consideram-se:
a) Prestação tributária: os impostos, incluindo os direitos aduaneiros e direitos niveladores agrícolas, as taxas e demais tributos fiscais ou parafiscais cuja cobrança caiba à administração tributária ou à administração da segurança social;
b) Serviço tributário: serviço da administração tributária ou da administração da segurança social com competência territorial para proceder à instauração dos processos tributários;
c) Órgãos da administração tributária: todas as entidades e agentes da administração a quem caiba levar a cabo quaisquer actos relativos à prestação tributária, tal como definida na alínea a);
d) Valor elevado e valor consideravelmente elevado: os definidos nas alíneas a) e b) do artigo 202.º do Código Penal;
e) Mercadorias em circulação: as mercadorias desde a entrada no País ou saída do local de produção até entrarem na posse do consumidor final, não se considerando na posse deste as existentes em explorações agrícolas, estabelecimentos comerciais ou industriais ou suas dependências, quando se destinem ao comércio;
f) Meios de transporte em circulação: os meios de transporte, terrestres, fluviais, marítimos e aéreos, sempre que não se encontrem, respectivamente, estacionados em garagens exclusivamente privadas, ancorados, atracados ou fundeados nos locais para o efeito designados pelas autoridades competentes e estacionados nos hangares dos aeroportos internacionais ou nacionais, quando devidamente autorizados.
[54] Manuel da Costa Andrade - O abuso de confiança fiscal e a insustentável leveza (de um acórdão) do Tribunal Constitucional, Instituto de Direito Penal Económico e Europeu, Textos doutrinais, Volume III, p. Direito Penal Económico e Europeu, Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, p. 242
[55] Idem, ibidem, p. 238.
[56] Manuel da Costa Andrade e Susana Sousa - As Metamorfoses e desventuras de um crime (abuso de confiança fiscal) irrequieto, Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 17º - nº 1, Coimbra Editora, p. 54, referindo os mesmos Autores que “numa perspectiva que tome as receitas fiscais do Estado como bem jurídico a proteger ou, ao menos, como objecto da acção típica, não pode deixar de se reconhecer que uma tal configuração típica se encontra desmesuradamente adiantada face ao objecto de tutela. E, consequentemente, exageradamente distanciada da matriz que lhe pode emprestar a indispensável dignidade penal. “
[57] artº 71º do Código de Processo Penal - C.P.P. - quer antes quer depois da revisão operada pela Lei nº 59/98 de 25 de Agosto
[58] MANUEL LOPES MAIA GONÇALVES; Código de Processo Penal Anotado – Legislação Complementar, 17ª edição – 2009, p. 220, nota 3
[59] v. v.g. Acº do STJ de 10 de Maio e de 29 de Novembro de 1955, BMJ, nºs 49, 323º e 52, 577
[60] Por sua vez, o nº 3 do preceito determina que o lesado não constituído assistente e, o assistente ainda não notificado para deduzir pedido cível, sê-lo-á, para querendo, em dez dias, deduzir o pedido cível, nos termos do número anterior, sob pena de o dever fazer em separado no foro cível.
Quem já haja deduzido tal pedido pode, no prazo de 10 dias seguidos, contados a partir da notificação que para tanto lhe deve ser feita, requer o prosseguimento do processo, apenas para apreciação do mesmo pedido, com aproveitamento implícito da prova indicada para efeitos penais. (artº 7º nº 4 da Lei 15/94).

[61] vvg. Ac. do STJ de 25.02.1998, Processo n. 97/98 e, de 12.01.2000, Processo n. 1146/99 – 3ª Secção
[62]  Ac. do STJ de 12.01.2000, Processo n. 599/99 – 3ª Secção
[63] Arts. 483., n. 1, e 562º, entre outros). Ac. do STJ, de 07.06.2000, Processo n. 117/2000 - 3.a Secção
[64] Ac. do STJ de 12.01.2000, Processo n. 1146/99- 3.ª
[65] Ac. do STJ, 15.11.2001, Processo n. 2626/01 – 5ª Secção

[66] Segundo o artº 77º nº1 do mesmo diploma, na redacção anterior à Lei 59/98 quando apresentado pelo Ministério Público ou pelo assistente, o pedido é deduzido na acusação ou no prazo em que esta deve ser formulada.
Fora dos casos previstos no número anterior, o pedido é deduzido, em requerimento articulado, até cinco dias depois de ao arguido ser notificado o despacho de pronúncia ou, se o não houver, o despacho que designa dia para a audiência. (nº 2 do preceito).
Com a Lei 59/98, o nº 2 do preceito passou a ter a seguinte redacção:- O lesado que tiver manifestado o propósito de deduzir pedido de indemnização civil, nos termos do artigo 75º nº 2, é notificado do despacho de acusação, ou, não o havendo, do despacho de pronúncia se a ele houver lugar, para querendo, deduzir o pedido, em requerimento articulado, no prazo de vinte dias.
E, o nº 3 do mesmo normativo passou a dispor: Se não tiver manifestado o propósito de deduzir pedido de indemnização ou se não tiver sido notificado nos termos do número anterior, o lesado pode deduzir o pedido até dez dias depois de ao arguido ser notificado o despacho de acusação ou, se o não houver, o despacho de pronúncia.
Com a proposta de lei 109/X que alterou o Código de Processo Penal, este prazo passou a ser de vinte dias
O que a lei baliza é o termo do prazo de apresentação do pedido cível, e não o seu início.- v. C.J. XVII, tomo 5, 246.
Não pode ser ultrapassado tal prazo.
Relativamente ao prazo de apresentação do pedido de indemnização civil inserido na lei, já escrevia Maia Gonçalves: “ Este prazo poderá parecer excessivamente reduzido mas na realidade não o é, já que o lesado que deduz ele próprio o pedido pode fazê-lo em qualquer momento, até aquele que foi apontado, portanto mesmo durante o inquérito, e até logo quando da apresentação da queixa. Em tal caso o requerimento com o pedido de indemnização ficará logo no processo para, oportunamente, seguir seus termos” - Código de Processo Penal anotado, 1999, 10ª edição, p. 227, nota 2.
Também o Acórdão do Tribunal Constitucional nº 611/94, D.R., II Série, de 5-1-95, não julgou inconstitucional a norma do artº 77º nº 2 do C.P.P.,e, considerava que para a dedução do pedido indemnizatório a parte dispunha “para isso não apenas dos cinco dias contados a partir da notificação ao arguido, mas de todos os que decorreram a partir da comissão do crime pelo qual aquele foi acusado.”

[67] Diário da República nº 117 de 21 de Maio
[68] artº 400º nº 2 do CPP, e sem prejuízo do que vem sendo discutido sobre a situação da “dupla conforme”.
[69]ibidem, p. 672, nota 2, -
[70] v. Ac. do S.T.J. de 10 de Dezembro de 1996 in Acs do S.T.J., IV, tomo 3º, 202
[71] in Diário da República I- A Série de 3 de Agosto de 1999
[72] Ac. do STJ de 06.06.2002, Processo n.o 1671/02 - 5.ª Secção.
[73] Ac. do STJ de 11.06.1997, Processo no 331/97- 3. Secção
[74] Ac. do STJ de 07.05.1997, Processo n. 1234/96-
[75] Diário da República - I SÉRIE-A N.º 54 — 5 de Março de 2002,

[76] (28) Ribeiro Faria, op. cit., pp. 131 e 218.
(29) «Sobre os sujeitos processuais no novo Código de Processo Penal», CEJ, Jornadas de Direito Processual Penal, Almedina, 1988, p. 15.
(30) Cf. artigos 74º a 95.º, 427º, 538.º a 542º, 578.º, 651.º, 652.º e 654º do Códice di Procedura Penale, aprovado em 22 de Setembro de 1988.
(31) Ibidem, Paolo Della Sala, p. 1111.
(32) Acórdão n.º 320/2001/TC, de 4 de Julho de 2001, inserto no Diário da República, 2.ª série, de 7 de Novembro de 2001.

[77] Refere o acórdão fundamento: - “Dívidas à Segurança Social são aquelas que o artº 2º do DL nº 42/2001 de 09/02 declara como tais;
- É pelas regras constantes daquele acervo de direito público que se calcula o valor das contribuições. E o mesmo sucede com a mora e a taxa de juros de mora (cf. artº 16º do DL 411/91, de 17/10). A taxa de juros é idêntica à das dívidas ao Estado [42];
- Na falta de pagamento pelo empregador, isto é, na falta de auto-liquidação, a Segurança Social tem de proceder à liquidação, de cujo acto o contribuinte tem de ser notificado, antes da instauração da execução [43];
- Após conhecimento da dívida liquidada, pode ser efectuada a dação em pagamento, pelo devedor, por qualquer administrador ou por terceiro – artº 87º do CPPT [44];
- Terminado o prazo para pagamento voluntário das contribuições, a Segurança Social tem o dever de passar certidão da dívida, que constitui o título executivo – artº 7º, do DL nº 42/200, de 09/02. A certidão deve obedecer às formalidades e ao conteúdo que os vários itens desse artº 7º impõem. Esse título demonstra a existência da dívida;
- Esse «título executivo constitui o documento comprovativo da obrigação cujo cumprimento se pretende e é, simultaneamente, constitutivo do direito da entidade exequente» [45];
- O processo de Execução de Dívidas à Segurança Social, tipificado no DL nº 42/2001, tem especificidades em relação ao processo de execução tributário e corre por uma das Secções de processo executivo (actualmente 18, tantas quantas as capitais de distrito), secções essas que têm competência para instauração e instrução dos processos executivos (artºs 3º e 4º do DL). Esse tipo de processo rege-se sucessivamente pelo dito DL, pela legislação específica da Segurança Social, pela LGT e pelo CPTT (artº 6º do DL). Tal processo tem natureza fundamentalmente administrativa e os actos contenciosos são julgados pelo Tribunal Tributário – artº 62º do ETAF [46];
- É no próprio processo executivo que à entidade exequente compete declarar a reversão contra os responsáveis subsidiários, o que sucederá quando o património do devedor originário, excutido, seja insuficiente – artºs 23º e 24º da LGT e 157º a 159º do CPPT [47].”
Porém, isto é assim a nível da jurisdição fiscal, que não colide com o princípio da indemnização civil em processo penal, quando haja acusação por crime fiscal e atento o disposto quer no artº 2º e 3º do RGIT e nos artºs 149º e 151º do CPPT.
[78] Refere o artº 3º al. a) do RGIT, a nível do direito subsidiário
São aplicáveis subsidiariamente:
a) Quanto aos crimes e seu processamento, as disposições do Código Penal, do Código de Processo Penal e respectiva legislação complementar;
b) […]
C- Quanto à responsabilidade civil, as disposições do Código Civil e legislação complementar
d) […]
O artº 8º do Código Penal estabelece: “As disposições deste diploma são aplicáveis aos factos puníveis pelo direito penal militar e da marinha mercante e pela restante legislação de carácter especial, salvo disposição em contrário.”


[79] (in “Responsabilidade Penal das Sociedades e dos seus Administradores e Representantes”, Editorial Verbo, 2009, pág. 456
[80] DR, nº 63, SÉRIE I-A, de 2005-03-31
[81] v. citados artºs 149º e 151º do CPPT.
[82] GERMANO MARQUES DA SILVA, Direito Penal Tributário, Universidade Católica Editora, p. 326
[83] Nº 1 do artº 7,º do CPP.
[84] Nºs 2, 3 e 4 do artº 7º do CPP.
[85] Lei nº 15/2001, de 5 de Junho, Artº 1º, als. A) e d)
[86] O artº 2º dispõe sobre o conceito e espécies de infracções tributárias, estabelecendo:
1 - Constitui infracção tributária todo o facto típico, ilícito e culposo declarado punível por lei tributária anterior.
2 - As infracções tributárias dividem-se em crimes e contra-ordenações.
3 - Se o mesmo facto constituir simultaneamente crime e contra-ordenação, o agente será punido a título de crime, sem prejuízo da aplicação das sanções acessórias previstas para a contra-ordenação.
[87] Supra referido Artº 3º, als a) e c
[88] Artigo 35.º, nºs 1, 2 e 5
[89] Artº 40º nº 1.
[90] Artº 41º nº 1 e al. c).
[91] Artº 42º, nºs 2 e 4
[92] Artigo 47.º nº 1
[93]  Artigo 50.º
2 — Em qualquer fase do processo, as respectivas decisões finais são sempre comunicadas à administração tributária ou da segurança social
[94] Artigo 48.º
[95] Artigo 42º, nºs 3 e 4
[96] Artigo 43º
O Artigo 44º versa sobre “Arquivamento em caso de dispensa da pena”
[97] PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, Volume I, 4ª Edição revista e actualizada, com a colaboração de M. Henrique Mesquita, Coimbra Editora, Limitada, p. 578, nota 1.
[98] PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA, ibidem, p.578, nota 1.
[99] ALMEIDA COSTA, Direito das Obrigações, 11.ª Edição Revista e Actualizada, Livraria Almedina, 2008, pags. 524 e segs..
[100] Face ao art. 487. do CC, para efeitos de responsabilidade civil, é ao lesado que incumbe provar a culpa do autor da lesão, salvo havendo presunção legal de culpa.

[101] GERMANO MARQUES DA SILVA, Direito Penal Tributário, Universidade Católica Editora, 2009, p. 314 e seg.
[102] Idem, ibidem, p. 317
[103] Idem, ibidem, p. 317.
[104] (ob. citada, pág. 455)
[105] idem, ibidem, p.318.
[106] artº 73º nºs 1 e 2 do C.P.P
MAIA GONÇALVES; Código de Processo Penal, Anotado – Legislação Complementar, 17ª edição, 2009, p. 229, nota 2, esclarece:
“A faculdade de deduzir em processo penal o pedido de indemnização civil contra pessoas que não têm responsabilidade penal, mas só responsabilidade civil e de estas últimas pessoas poderem intervir voluntariamente no processo penal, que agora se generaliza, não era perfilhada pelo CPP de 1929. Foi, porém, perfilhada no Direito Estrada, pelo artº 67º do Código da Estrada.
Por isso se entendia que o sistema de adesão que a nossa lei perfilhava era mais profundo no Direito Estradal e, por vezes, que de lege ferenda era preferível a doutrina do Código da Estrada.[…].”
[107] Germano Marques da Silva, Direito Penal Tributário, 2009, pags 121 a 124
[108] Acórdão de 15-09-2010, Processo: 322/05.4TAEVR.E1.S1, v. também Acórdão de 04-02-2010, proc. nº 106/01.9IDPRT.S1