Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
1789/18.6T8PTM-A.E1.S1
Nº Convencional: 6ª SECÇÃO
Relator: RAIMUNDO QUEIRÓS
Descritores: COMPETÊNCIA INTERNACIONAL
TRIBUNAIS PORTUGUESES
TRIBUNAL DE FAMÍLIA E MENORES
REGULAÇÃO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS
RESIDÊNCIA HABITUAL
INTERESSE SUPERIOR DA CRIANÇA
Data do Acordão: 06/27/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL – ACÇÃO, PARTES E TRIBUNAL / TRIBUNAL / DISPOSIÇÕES GERAIS SOBRE COMPETÊNCIA / COMPETÊNCIA INTERNACIONAL / FACTORES DE ATRIBUIÇÃO DA COMPETÊNCIA INTERNACIONAL.
Doutrina:
- ABRANTES GERALDES, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 5.ª ed., p. 428;
- AMÂNCIO FERREIRA, Manual dos Recursos em Processo Civil, 3.ª edição, p. 133/134.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 59.º E 62.º.
REGIME GERAL DO PROCESSO TUTELAR CÍVEL (RGPTC): - ARTIGO 9.º, N.º 1.
LEI DA ORGANIZAÇÃO DO SISTEMA JUDICIÁRIO (LOSJ), APROVADA PELA LEI Nº 62/2013, DE 26-08: - ARTIGO 123.º, N.º 1, ALÍNEA D).
Referências Internacionais:
- CONVENÇÃO RELATIVA À COMPETÊNCIA, À LEI APLICÁVEL, AO RECONHECIMENTO, À EXECUÇÃO E À COOPERAÇÃO EM MATÉRIA DE RESPONSABILIDADE PARENTAL E MEDIDAS DE PROTECÇÃO DAS CRIANÇAS”, ADOPTADA EM HAIA EM 19 DE OUTUBRO DE 1996: - ARTIGO 5.º, N.º 1.
Sumário :
I- O art.º 5º nº1 da “Convenção Relativa à Competência, à Lei Aplicável, ao Reconhecimento, à Execução e à Cooperação em Matéria de Responsabilidade Parental e Medidas de Protecção das Crianças”, adoptada em Haia em 19 de Outubro de 1996, estabelece que “As autoridades jurídicas ou administrativas do Estado Contratante no qual a criança tem a sua residência habitual possuem competência para tomar as medidas necessárias à protecção da pessoa ou bens da criança”.

II- Assim, a competência internacional dos tribunais portugueses, nesta matéria, afere-se pelo critério da residência habitual da criança (arts. 59.º e 62.º do CPC)

III- O conceito de "residência habitual" - a que alude o referido art.º 5º nº1 da Convenção deve ser interpretado no sentido de que essa residência corresponda ao local onde se encontra organizada a sua vida familiar, social e escolar em termos de estabilidade e permanência.

IV- No caso em apreço, residindo os dois menores com os pais em Albufeira, Portimão, desde Novembro de 2017, os Tribunais Portugueses são internacionalmente competentes para a regulação das responsabilidades parentais, instaurada em 4 de Julho de 2018.

V- Sendo territorialmente competente o Juízo de Família e Menores de Portimão, nos termos no art.º 9º, nº 1 do Regime Geral do Processo Tutelar Cível e art.º 123º, nº 1, al. d) da Lei nº 62/2013 (LOSJ).

 

Decisão Texto Integral:

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

I. Relatório

AA instaurou contra BB acção de regulação das responsabilidades parentais dos filhos de ambos CC e DD, nascidos respectivamente a ....... e........

Após ter sido realizada conferência de pais, no qual não foi possível chegar a acordo entre os progenitores, veio a requerida suscitar a incompetência internacional dos tribunais portugueses para julgar o pleito, uma vez que, quer os pais, quer os menores, são todos de nacionalidade brasileira e, além disso, encontram-se a residir temporariamente em Portugal.

Pela M.ma Juiz “a quo” foi proferida decisão, na qual julgou improcedente a excepção dilatória invocada pela requerida e, em consequência, declarou o Tribunal de Família e Menores de Portimão como sendo internacionalmente competente para apreciar e decidir a presente acção de regulação das responsabilidades parentais.

Inconformada com tal decisão dela apelou a requerida, tendo apresentado para o efeito as suas alegações de recurso e terminando as mesmas com as seguintes conclusões:

A) O tribunal “ a quo” na sua decisão ora em recurso, apenas levou em conta para estabelecer o critério da residência habitual, dois factores, que os menores estão em Portugal desde Novembro de 2017 até á presente data, ou seja cerca de um ano e as mesmas frequentam equipamentos escolares em Portugal.

B) O Tribunal “a quo”, não levou em conta para estabelecer o critério da residência habitual, que “resulta que, apesar das crianças terem residido a maior parte da sua vida no Brasil, de as mesmas terem a nacionalidade Brasileira tal como os Pais”, de terem todos os seus familiares, os pais, os irmãos, os sobrinhos e primos, dos progenitores e dos menores, os seus amiguinhos de escola e das brincadeiras, a sua cultura ser a brasileira a sua inserção ter sido na sociedade brasileira.

C) O Tribunal “a quo”, deveria ter levado em conta no critério da residência habitual, a jurisprudência dos Tribunais Superiores acima citados, e a interpretação dada também pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, tendo – se pronunciado entre outros, nos acórdãos proferidos em 22 de Dezembro de 2010, e no acórdão de 2 de Abril de 2009.

D) A fim de que o superior interesse da criança seja respeitado da melhor forma, o conceito de residência habitual traduz uma certa integração da criança num ambiente social e familiar, pelo que para determinar a residência habitual de uma criança, além da presença física há outros factores suplementares que devem indicar que essa presença não tem carácter temporário ou ocasional.

E) Há também que levar em conta nomeadamente, a nacionalidade da criança, a sua idade, a duração, a regularidade, às condições e razões de permanência da criança no território, aos laços familiares e sociais que a criança tiver nesse Estado.

F) Aplicando-se todos esses factores se provam que os menores de seis e cinco anos, de nacionalidade brasileira, sempre viveram no Brasil, até Novembro do ano passado, ali têm todos os seus laços familiares, os avós, os tios os primos, tanto maternos como paternos, ninguém desses familiares vive em Portugal, ali estavam a ser educados, ali, estão inseridos, apenas estão em Portugal, porque o pai se quis separar da mãe, pois a manterem o vínculo conjugal, já teriam voltado, pois vieram com passagens de ida e volta para o Brasil, não estando aqui legalizados.

G) Nestes termos deverão V. Exas. revogar, a decisão, ora em Recurso, devendo ser considerado o Tribunal Português incompetente internacionalmente, para regulação das responsabilidades parentais, pela aplicação da interpretação do que se considera “residência habitual”, que a jurisprudência dos Tribunais Superiores manda aplicar, tendo a lei, no caso “sub judice”, sido mal aplicada, por não considerar o critério convenientemente, assim deverão ser levados em conta os superiores interesses dos menores. Fazendo-se a Costumeira Justiça.

Pelo requerente e pelo Ministério Público foram apresentadas contra alegações de recurso, nas quais pugnam pela manutenção da decisão recorrida.

O Tribunal da Relação confirmou integralmente a sentença de 1ª instância, considerando internacionalmente competente o Tribunal de Família e Menores de Portimão.

Inconformada com esta decisão veio a requerida interpor recurso ao abrigo do disposto no artº 629, nº 2, al. a) do CPC, com fundamento nas regras de competência internacional, formulando as seguintes conclusões:

A) O tribunal “ a quo” na sua decisão ora em Recurso, apenas levou em conta para estabelecer o critério da residência habitual, dois factores, que os menores estão em Portugal desde Novembro de 2017 até Janeiro de 2019, ou seja cerca de um ano e as mesmas frequentam equipamentos escolares em Portugal.

B) O Tribunal “ a quo”, não levou em conta para estabelecer o critério da residência habitual, que “ resulta que apesar das crianças terem residido a maior parte da sua vida no Brasil, de as mesmas terem a nacionalidade Brasileira tal como os Pais”, de terem todos os seus familiares, os pais, os irmãos, os sobrinhos e primos, dos progenitores e dos menores, os seus amiguinhos de escola e das brincadeiras, a sua cultura ser a brasileira a sua inserção ter sido na sociedade brasileira.

C) O Tribunal “ a quo”, deveria ter levado em conta no critério da residência habitual, a jurisprudência dos Tribunais Superiores acima citados, e a interpretação dada também pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, tendo – se pronunciado entre outros, nos acórdãos proferidos em 22 de Dezembro de 2010, e no acórdão de 2 de Abril de 2009.

D) A fim de que o superior interesse da criança seja respeitado da melhor forma, o conceito de residência habitual traduz uma certa integração da criança num ambiente social e familiar, pelo que para determinar a residência habitual de uma criança, além da presença física há outros factores suplementares que devem indicar que essa presença não tem carácter temporário ou ocasional.

E) Há também que levar em conta nomeadamente, a nacionalidade da criança, a sua idade, a duração, a regularidade, às condições e razões de permanência da criança no território, aos laços familiares e sociais que a criança tiver nesse Estado.

F) Aplicando-se todos esse factores se provam que os menores de seis e cinco anos, de nacionalidade brasileira, sempre viveram no Brasil, excepto entre Novembro de 2018 até Janeiro de 2019 e, ali têm todos os seus laços familiares, os avós, os tios os primos, tanto maternos como paternos, ninguém desses familiares vive em Portugal, ali estavam a ser educados, ali, estão inseridos, apenas estiveram em Portugal, porque o pai se quis separar da mãe, pois a manterem o vínculo conjugal, já teriam voltado, pois vieram com passagens de ida e volta para o Brasil, não estando aqui legalizados.

G) Acontece que enquanto o Recurso estava a correr na Relação, a Requerida e ora Recorrente foi autorizada a deslocar-se com os menores ao Brasil em Janeiro de 2019 e até à data lá continuam.

H) Entretanto e porque a Requerida, já tinha intentado no Brasil no decorrer do ano de 2018, acção de divórcio litigioso, o Tribunal de Belo Horizonte, Estado de Minas Gerais, deferiu com a data de 21 de Março de 2019, o pedido por parte da Requerida, BB, para a obtenção da guarda provisória dos menores CC e DD, tendo ficado expresso pelo mesmo Tribunal, “ de forma a preservar integralmente os interesses menoristas que não podem ficar se do artigo 7º, em caso de mudança da residência habitual da criança para outro Estado Contratante, as autoridades do Estado da nova residência habitual terão a competência”.

J) Tendo já o Tribunal Brasileiro, de Belo Horizonte, Estado de Minas Gerais, concedido a guarda provisória dos menores, atribuído á mãe e ora Recorrente, de forma a preservar os interesses dos menores. Pois os menores lá possuem as suas raízes, e aonde se encontram inseridos e está toda a sua família seja paterna ou materna.

Houve por isso violação da lei substantiva, respeitante á aplicação da Convenção de Haia, que pode consistir no erro de interpretação ou de aplicação.

Nestes termos deverão V. Exas. revogar, a decisão, ora em Recurso, devendo ser considerado o Tribunal Português incompetente internacionalmente, para regulação das responsabilidades parentais, pela aplicação da interpretação do que se considera “residência habitual”, que a jurisprudência dos Tribunais Superiores manda aplicar, tendo a lei no caso “ sub judice”, sido mal aplicada, por não considerar o critério convenientemente, assim deverão ser levados em conta os superiores interesses dos menores.

O requerido respondeu à alegação pugnando pela manutenção da decisão.

II- Apreciação do Recurso

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente (cfr. artigos 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do CPC), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cfr. artigos 608.º, n.º 2, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do CPC).

Questão Prévia

A recorrente procedeu à junção de um documento com o qual pretende demonstrar que o Tribunal de Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil, lhe atribui a guarda provisória dos menores, já depois da instauração dos presentes autos.

Vejamos:

Dispõe o artº 680º do CPC:

1. Com as alegações podem juntar-se documentos supervenientes, sem prejuízo do disposto no n° 3 do artigo 674.º e no n° 2 do artigo 682.°.

2. À junção de pareceres é aplicável o disposto no n.º 2 do artigo 651.°.

Como é sabido, é mais restrita a possibilidade de apresentação de documentos no âmbito do recurso de revista, em comparação com o regime previsto para a apelação previsto no art. 651º do CPC. A razão de ser encontra justificação no facto de o Supremo ter intervenção privilegiada em questões de direito, só excepcionalmente sendo admitido a pronunciar-se sobre questões de facto.

Como refere Abrantes Geraldes[1], “neste contexto, uma vez que está praticamente vedado ao Supremo alterar a decisão da matéria de facto provada, a aplicabilidade do preceito está para os casos em que as instâncias tenham considerado provado facto para o qual a lei exigia prova documental (v.g. escritura pública ou certidão de registo), com violação do direito probatório material, sustentando-o apenas em prova testemunhal ou em confissão, situação que pode ser regularizada, sem prejudicar o resultado, mediante a junção de documento que seja superveniente”.

O documento agora junto não se destina a provar qualquer dos factos inseridos na factualidade, mas constitui matéria nova que não foi objecto de apreciação pelo Tribunal recorrido. Ora, os recursos são meios para obter o reexame de questões já submetidas à apreciação dos tribunais inferiores, e não para criar decisões sobre matéria nova, não submetida ao exame do tribunal de que se recorre[2].

Assim, não sendo processualmente admissível a junção e revelando-se esta impertinente, importa determinar a retirada deste documento dos autos e a sua devolução à apresentante, fixando-se a correspondente multa em 1 UC (n.º 1 do artigo 27.º do Regulamento das Custas Processuais).

Questão a decidir:

O Tribunal de Família e Menores de Portimão é o internacionalmente competente para decidir sobre a regulação das responsabilidades parentais dos menores?

Factualidade provada:

1. As crianças CC e DD, nascidas em ....... e......., naturais de ......., Belo Horizonte, de nacionalidade brasileira são filhos de BB e AA, ambos de nacionalidade brasileira.

2. Os progenitores das crianças casaram entre si no dia 24 de Setembro de 2008, todavia, separaram-se em Julho de 2018 e estão separados até à presente data.

3. Os progenitores e as crianças viveram no Brasil, todavia, vieram para Portugal, de comum acordo, onde se encontram a viver desde Novembro de 2017, mais concretamente, em Albufeira.

4. As crianças frequentam equipamentos escolares em Portugal, ingressando o menor CC na escola de....... em Albufeira e o menor DD no jardim de infância de....... tendo ambos ingressado no dia 28 de Novembro de 2017.

 

III- O Direito

No caso em apreço, emerge das conclusões da alegação de recurso apresentadas pela requerida, ora recorrente, que o objecto do mesmo está circunscrito à apreciação da questão de saber se não deverá ser deferida aos tribunais portugueses a competência internacional para decidir os presentes autos de regulação do exercício das responsabilidades parentais dos menores CC e DD .

Importa desde já ter presente o que estatui o art.59º do C.P.C., relativamente à competência internacional dos Tribunais portugueses:

- Sem prejuízo do que se encontre estabelecido em regulamentos europeus e em outros instrumentos internacionais, os tribunais portugueses são internacionalmente competentes quando se verifique algum dos elementos de conexão referidos nos artigos 62.º e 63.º ou quando as partes lhes tenham atribuído competência nos termos do artigo 94º.

A “Convenção Relativa à Competência, à Lei Aplicável, ao Reconhecimento, à Execução e à Cooperação em Matéria de Responsabilidade Parental e Medidas de Protecção das Crianças”, adoptada em Haia em 19 de Outubro de 1996 - a qual vigora na nossa ordem jurídica interna por força do DL nº 52/2008 de 13 de Novembro, prevalecendo sobre as normas processuais portuguesas e vinculando internacionalmente o Estado Português (cfr. art.8º nº 2 da Constituição da República) - refere, no seu art.1º, ter por objecto:

a) Determinar qual o Estado cujas autoridades têm competência para tomar as medidas orientadas à protecção da pessoa ou bens da criança;

E, no nº 2 do mesmo artigo dispõe que:

- Para os efeitos desta Convenção, a expressão «responsabilidade parental» designa a autoridade parental ou qualquer outra relação análoga de autoridade que determine os direitos, poderes e responsabilidades dos pais, tutores ou outros representantes legais relativamente à pessoa ou bens da criança.

Esclarecendo, ainda, no seu artº3º, que:

- As medidas previstas no artigo 1.º poderão, nomeadamente, envolver:

a) Atribuição, exercício, termo ou redução da responsabilidade parental, bem como a sua delegação;

E estabelecendo, em matéria de competência, no artigo 5º, que:

1 - As autoridades jurídicas ou administrativas do Estado Contratante no qual a criança tem a sua residência habitual possuem competência para tomar as medidas necessárias à protecção da pessoa ou bens da criança.

2 - Com ressalva do artigo 7.º, em caso de mudança da residência habitual da criança para outro Estado Contratante, as autoridades do Estado da nova residência habitual terão a competência.

Dispondo o ressalvado art.7º quanto ao “caso de afastamento ou de retenção ilícita da criança”, o que não se verifica no caso dos presentes autos.

De acordo com o art. 62º do C.P.C. (para o qual remete a segunda parte do art. 59º daquele Código):

- Os tribunais portugueses são internacionalmente competentes:

a) Quando a ação possa ser proposta em tribunal português segundo as regras de competência territorial estabelecidas na lei portuguesa;

b) Ter sido praticado em território português o facto que serve de causa de pedir na ação, ou algum dos factos que a integram;

c) Quando o direito invocado não possa tornar-se efetivo senão por meio de ação proposta em território português ou se verifique para o autor dificuldade apreciável na propositura da ação no estrangeiro, desde que entre o objeto do litígio e a ordem jurídica portuguesa haja um elemento ponderoso de conexão, pessoal ou real.

Ora, da factualidade apurada nos autos - e que se encontra acima transcrita - constata-se que os dois menores, à data do requerimento de regulação do exercício das responsabilidades parentais, residiam com os pais em Portugal, mais concretamente em Albufeira, no Algarve (desde Novembro de 2017), estando devidamente integrados em equipamentos escolares que frequentam desde esta data.

E encontrando-se estas duas crianças (o CC e o DD) integradas em termos familiares, escolares e de amizades, em Albufeira, forçoso é concluir que estas têm, efectivamente, a sua residência habitual em Portugal, não sendo a mesma transitória ou ocasional.

Na verdade, a “residência habitual” de um menor é o local onde se encontra organizada a sua vida familiar em termos de maior estabilidade e permanência, onde desenvolve habitualmente a sua vida, em suma, onde está efectivamente radicado.

Por isso, teremos de concluir que os tribunais portugueses são internacionalmente competentes para a regulação das responsabilidades parentais dos menores.

 Por sua vez, para apuramento da competência territorial interna, importa apelar às disposições legais aplicáveis.

 Entre as providências tutelares cíveis previstas no Regime Geral do Processo Tutelar Cível (RGPTC) inclui-se “a regulação do exercício das responsabilidades parentais e o conhecimento das questões a este respeitantes” – cfr. art. 3º alínea c) do referido RGPTC.

E, o art. 9º do RGPTC, sob a epígrafe “Competência territorial”, estipula que:

1-Para decretar as providências tutelares cíveis é competente o tribunal da residência da criança no momento em que o processo foi instaurado.

Dispositivo que é complementado pelo artº 85º, nº 1 do Código Civil que estabelece que “o menor tem domicílio no lugar da residência da família; se a família não existir, tem por domicílio o do progenitor a cuja guarda estiver”.

Ora, da factualidade apurada nos autos constata-se que os dois menores, à data do requerimento de regulação do exercício das responsabilidades parentais (4 de Julho de 2018), residiam com os pais em Portugal, mais concretamente em Albufeira, no Algarve (desde Novembro de 2017), estando devidamente integrados em equipamentos escolares que frequentam desde esta data.

Assim, o tribunal territorialmente competente é o Juízo de Família e Menores de Portimão, nos termos art.º 123º, nº 1, al. d) da Lei nº 62/2013 (LOSJ).

IV- Decisão

 Nestes termos, nega-se provimento à revista, mantendo-se integralmente o acórdão recorrido.

Custas pela recorrente

Lisboa, 27 de Junho de 2019

Raimundo Queirós (Relator)

Ricardo Costa

Assunção Raimundo

__________

[1] ABRANTES GERALDES, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 5ª ed., p. 428,

[2] AMÂNCIO FERREIRA, Manual dos Recursos em Processo Civil, 3ª edição, p. 133/134.