Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
048564
Nº Convencional: JSTJ00012708
Relator: J CIPRIANO
Descritores: EMBARGOS DE EXECUTADO
OPOSIÇÃO
TITULO EXECUTIVO
EXEQUIBILIDADE
ARGUIÇÃO
EXECUÇÃO
UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Nº do Documento: SJ19350723048564
Data do Acordão: 07/23/1935
Votação: MAIORIA COM 2 VOT VENC
Referência de Publicação: DG IªS 03-08-1935; COL OF ANO34,188; RT 35,232
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PARA O PLENO
Decisão: UNIFORMIZADA JURISPRUDÊNCIA
Indicações Eventuais: ASSENTO 7/1935
Área Temática: DIR PROC CIV - PROC EXEC.
Legislação Nacional: CPC876 ARTIGO 5 ARTIGO 129 PAR1 ARTIGO 130 N5 ARTIGO 131 PARUNICO ARTIGO 145 ARTIGO 798 ARTIGO 912 ARTIGO 917.
D 21287 DE 1932/05/26 ARTIGO 34 ARTIGO 94 ARTIGO 95 ARTIGO 102 N1 ARTIGO 173.
CEXF13 ARTIGO 84 ARTIGO 86.
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO STJ DE 1932/06/24 IN COL OF ANO31 PAG172.
Sumário :
O executado pode em embargos, quando admissiveis, arguir a inexequibilidade do titulo, desde que não tenha usado da oposição facultada pelo artigo 173 do Decreto n. 21287, de 26 de Maio de 1932.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

Numa acção de letra proposta por A contra B foi proferida sentença que condenou o reu a pagar ao autor a quantia de 8000 escudos, juros a razão de 30 por cento ao ano, desde o vencimento e o mais legal. O reu apelou da sentença; mas o autor, porque o recurso não teve efeito suspensivo, requereu a execução, em que a importancia exequenda foi liquidada em 17363 escudos e 58 centavos. A final, por julgamento definitivo no acordão de folhas... da acção, a condenação foi diminuida quanto aos juros e quanto as despesas extrajudiciais. Baixaram os autos a 1 instancia; e ai o reu, B, foi alegar que o autor lhe movera execução da sentença que julgara a acção, e para evitar a penhora nessa execução pagara extrajudicialmente e directamente ao autor a quantia de 27564 escudos e 40 centavos e mais 1000 escudos, como consta dos recibos que juntou; e pediu que os autos fossem ao contador para ser liquidado o que a mais pagou, o que foi deferido, apurando-se que o reu pagou a mais 18031 escudos e 38 centavos.
Requereu depois o mesmo reu que A fosse citado para pagar esta importancia ou nomear bens a penhora; e o executado deduziu embargos em que alegou:


1 - Que a execução não tem titulo legal em que se funde, porque assenta numa liquidação baseada apenas no requerido pelo embargado;
2 - Que o meio processual empregado e incompetente;
3 - Que o documento de folhas... da acção resultou de um acordo ou transacção, livremente ajustada e que mutuamente desobrigou o autor e o reu na acção a que respeitou. Isto e : o acordo ou transacção modificou a obrigação declarada na sentença, que anteriormente fora dada a execução.
Os embargos foram rejeitados in limine por não serem baseados em algum dos fundamentos do artigo 912 do Codigo do Processo Civil. Interposto recurso para a Relação e depois para este Supremo Tribunal, foi aqui proferido o acordão de folha... em que se julgou que o artigo 173 do Decreto n. 21287, concedendo ao executado a faculdade de, em simples requerimento, deduzir, dentro de cinco dias a contar da citação, oposição por fundamento de o titulo exequendo não ter força executiva, não o inibe de em embargos oportunos alegar tambem o fundamento da inexequibilidade do titulo.


O exequente B recorreu para o tribunal pleno por aquele acordão estar em oposição sobre o mesmo ponto de direito com o acordão deste Supremo Tribunal de 24 de Junho de 1932, publicado na Colecção Oficial, ano 31, p. 172. E de conhecer o recurso.


O executado alegou nos seus embargos que a execução se não funda em titulo legal; que o meio empregado e incompetente, isto e: que se empregou o processo especial de execução em caso em que a lei o não admite; e que em acordo ou transacção extrajudicial posterior a sentença modificou a obrigação declarada na referida sentença.


Anteriormente as reformas das leis de processo iniciadas pelo Decreto n. 12353 eram radicalmente diversas as consequencias inerentes as nulidades supriveis e insupriveis: estas anulavam inexoravelmente tudo o que se tivesse processado desde que elas se verificassem (paragrafo 1 do artigo 129 do Codigo do Processo Civil); as supriveis so anulavam o acto respectivo e os termos subsequentes que dele dependessem absolutamente.
Agora parece ser admitida uma especie de nulidades mixtas porque, embora se lhes continue a chamar insupriveis, todavia podem ser sanadas em certos casos e por determinados modos (Decreto n. 21287, artigo 34 e seus numeros), ou ate em todos os casos, se ao juiz escapar o seu conhecimento no despacho regulador (citado decreto, artigo 102, n.
1), como se tem julgado e doutrinado.


Tambem pela disposição do artigo 131 do Codigo do Processo Civil as nulidades insupriveis, por isso mesmo que o eram, podiam ser arguidas pela parte em qualquer estado do processo; agora o reu so podera deduzi-las na contestação, como materia de defesa (artigo 94 do mesmo decreto), so lhe sendo admitida posterior arguição de nulidade, ainda que insuprivel, que for superveniente ou que mostre ter chegado ao seu conhecimento depois da data da contestação (artigo 95).


O paragrafo unico do ja citado artigo 131 do Codigo do Processo Civil autoriza os tribunis de qualquer categoria a conhecer das nulidades insupriveis sem dependencia de reclamação dos interessados.
Tem-se julgado que, não obstante a obrigação imposta ao juiz de 1 instancia pelo n. 1 do artigo 102 da Reforma, os tribunais não estão proibidos de conhecer, sem dependencia de reclamação, das nulidades insupriveis que não devam considerar-se excepcionalmente sanadas por força de alguma disposição especial expressa nas leis reformadoras do processo.
Assim não parece admissivel que um processo especial, que a lei expressamente declara de todo inadequado para o caso em que foi empregado com contravenção do disposto no n. 5 do artigo 130 do Codigo do Processo Civil, possa vingar sem possibilidade de interferencia oficiosa dos tribunais, ainda que em obediencia ao preceituado no n. 5 do artigo 34 da Reforma, principalmente quando, como nestes embargos aconteceu, não foi proferido despacho regulador.


Por outro lado não e de admitir que uma arguição de nulidade insuprivel inoportunamente feita pelo interessado deva inibir os tribunais do exercicio da acção, que a lei lhes atribue de conhecerem dela oficiosamente; quando muito devera considerar-se a arguição inoportuna como se ela não tivesse sido feita.


Ora o artigo 798 do Codigo do Processo Civil enumera os titulos que podem servir de base a execução; e alem desses so podem ser admitidos outros a que leis especiais expressamente deram força executiva. Se, pois, for dado a execução um titulo que não seja algum dos mencionados no artigo 798 ou em alguma lei especial, da-se nulidade insuprivel de emprego do processo especial de execução para caso em que a lei o não admite, ou seja a inexequibilidade do titulo.


A sentença passada em julgado, ou aquela que estiver recorrida, quando o recurso não tiver efeito suspensivo, e o titulo executivo por excelencia, e por isso o artigo 912 do Codigo do Processo Civil nesse caso so admite ao executado embargos por algum dos fundamentos ali expressos; o artigo 917 porem admite outros fundamentos de embargos quando a execução se não fundar em sentença.


Assentou-se no acordão recorrido em que não se trata de execução da sentença proferida no processo principal, mas sim da execução de um recibo consequente a um alegado acordo ou transacção que não foi judicialmete julgada valida. O executado tinha por isso a faculdade de embargar a execução, nos termos do artigo 917, por qualquer fundamento; e nada o impedia de nesses embargos arguir, ainda que inoportunamente, a inexequibilidade, ou seja a nulidade insuprivel do emprego de processo especial em caso que o não admite, porque a circunstancia da inoportunidade da arguição não pode impedir os tribunais de conhecer da nulidade independentemente de ela ser ou não reclamada.
O juiz na 1 instancia rejeitou in limine os embargos, por entender que não eram admissiveis em vista do artigo 912 do Codigo do Processo Civil (despacho de folha...), e o acordão da Relação, a folha..., confirmou o despacho por partir do mesmo equivoco, mas o acordão agora recorrido definitivamente decidiu que a execução se não baseia numa sentença, mas sim em uns recibos sem qualquer autenticidade, ou num acordo ou transacção cuja validade não foi judicialmente declarada, nos termos do artigo 145 do Codigo do Processo Civil, e por isso os embargos são de admitir, de conformidade com o artigo 917 do mesmo Codigo.
O executado não tinha usado oportunamente da faculdade que lhe concedia o artigo 173 da Reforma; mas podia ainda reclamar nos embargos, que eram de admitir, a nulidade insuprivel que os tribunais ainda estavam a tempo de conhecer.


Em caso identico assim o permite tambem o Codigo das Execuções Fiscais, nos artigos 84 e 86.


No acordão recorrido notou-se a singularidade de se ter enxertado esta execução num processo em que inteiramente se mudou de aspecto a posição das partes sem que tenha sido por qualquer modo alterada a decisão condenatoria.


O recorrente na sua minuta não considera este caso como singular e aponta certos outros casos que reputa identicos; mas não quis reparar, em que em todos aqueles que cita, a mudança de posição das partes resulta de decisão definitiva, que tenha modificado outra anterior, enquanto que aqui a execução foi baseada em documentos particulares, e pretendeu-se modificar ou condicionar a decisão condenatoria por um suposto acordo ou transacção extrajudicial, sem força de julgar.


Por estes fundamentos negam provimento no recurso, confirmam o acordão recorrido e estabelecem o seguinte Assento:


O executado pode em embargos, quando admissiveis, arguir a inexequibilidade do titulo, desde que não tenha usado da oposição facultada pelo artigo 173 do Decreto n. 21287, de 26 de Maio de 1932.



Lisboa, 23 de Julho de 1935

J. Cipriano - Silva Monteiro - Crispiniano - Pires Soares - B. Veiga - Mendes Arnaut - Ponces de Carvalho - A. Osorio de Castro - Arez -
- J. Soares - A. Campos - Amaral Pereira -
- Alexandre de Aragão - Carlos Alves (vencido).
Anteriormente as reformas processuais a inexequibilidade do titulo-base da execução, ora se enquandrava na nulidade insuprivel do n. 5 do artigo 130 do Codigo do Processo Civil, ora na ilegitimidade do executado. A existencia das duas correntes na jurisprudencia e suficiente para mostrar como as soluções eram duvidosas. Realmente a questão não era de processo, mas de fundamento e e legitimo o devedor.
As duvidas foram resolvidas pelas reformas do processo criando a oposição por inexequibilidade do titulo (decreto n. 21287, artigo 173), que ficou constituindo uma categoria processual distinta de qualquer daqueles e autonoma, com forma de dedução, prazo e recurso proprios.
Não se compreende no 912 do Codigo do Processo porque a enumeração e taxativa, nem no 917 porque não extingue nem modifica a obrigação, pois nunca constituiu uma questão de fundo. E que não e fundamento de embargos di-lo o citado artigo 173, por so resolver os outros fundamentos.

O argumento "faculdade" não colhe, porque facultativos são os meios de defesa, o da economia processual prova demais, o direito fiscal não e subsidiario e e especial, e as analogias não são invocaveis em processo.
A doutrina do assento autoriza um novo fundamento de embargos e uma cumulação de processos proibida pelo artigo 5 do Codigo do Processo Civil. Tais são as razões por que, sem necessidade de maior desenvolvimento, lhe neguei a minha adesão. - E. Santos (vencido pelos mesmos fundamentos).