Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
893/08.3TCSNT.L1.S1
Nº Convencional: 7ª SECÇÃO
Relator: MARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA
Descritores: NULIDADE DE ACÓRDÃO
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
INUTILIDADE SUPERVENIENTE DA LIDE
OBRIGAÇÃO SOLIDÁRIA
APROVEITAMENTO DO RECURSO AOS NÃO RECORRENTES
RECURSO POR ADESÃO
ACEITAÇÃO TÁCITA
PERDA DO DIREITO DE RECORRER
Nº do Documento: SJ
Data do Acordão: 10/08/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - PROCESSO DE DECLARAÇÃO / SENTENÇA ( NULIDADES ) / RECURSOS.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (NCPC) / 2013: - ARTIGOS 608.º, N.º 2, 615.º, N.º 1, AL. D), 631.º, N.º1, 632.º, N.OS 2 E 3, 634.º, N.º 2, 666.º, N.º 1.
Sumário :
I - Não enferma de nulidade por omissão de pronúncia o acórdão da Relação que declarou extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, sem apreciar a desistência do pedido e o requerimento em que a interveniente declarou pretender assumir a posição de recorrente principal no recurso interposto pela ré, aderindo às alegações apresentadas por esta, já que o conhecimento destas questões ficou prejudicado pela referida declaração de extinção – arts. 608.º, n.º 2, 615.º, n.º 1, al. d) e 666.º, n.º 1, do NCPC (2013).

II - Tendo a ré e a interveniente principal sido condenadas solidariamente no pagamento de uma quantia indemnizatória, o recurso interposto pela primeira aproveita à segunda não recorrente, sem que haja necessidade de adesão ao recurso por parte desta – art. 634.º, n.º 2, do NCPC.

III - Se a parte vencida em 1.ª instância pretender obter a alteração da sentença – através de recurso que interpôs ou que lhe aproveita – e, simultaneamente, quiser cumprir, desde logo, a condenação (prevenindo a hipótese de insucesso do recurso e evitando a acumulação de juros), tem de esclarecer que esse cumprimento não significa aceitação da decisão já que o pagamento espontâneo ao vencedor da quantia em que o vencido foi condenado, desacompanhado da mencionada indicação, constitui um facto inequivocamente incompatível com a vontade de recorrer – art. 632.º, n.os 2 e 3, do NCPC.

IV - Tendo a interveniente, não recorrente, procedido ao mencionado pagamento sem qualquer reserva, aceitando, dessa forma, a condenação, ficou afastado o benefício que poderia retirar do recurso interposto pela ré que, assim sendo, só a esta passou a poder aproveitar.

Decisão Texto Integral:
Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça:



1. AA instaurou uma acção contra BB - Energia, S.A. e CC, S.A. pedindo a sua condenação solidária no pagamento de uma indemnização de uma quantia não inferior a € 250.000,00 por danos não patrimoniais e de € 26.984.60 por danos patrimoniais, bem como a suportar prejuízos decorrentes de danos futuros.

Para o efeito, e em síntese, alegou ter sido vítima de uma electrocussão resultante de indevida colocação dos cabos de média/alta tensão que passam pela cobertura do prédio onde funciona a sociedade de que é sócio e gerente, e ainda que as rés são responsáveis pela instalação e manutenção dos referidos cabos

As rés contestaram. BB - Energia, S.A. requereu a intervenção da Companhia de Seguros DD, S.A. e da Companhia de Seguros EE, S.A. (que veio a ser incorporada na anterior, cuja denominação foi alterada para FF Companhia de Seguros, S.A., cfr. despacho de fls. 520), por ter celebrado contratos de seguro relativos à sua actividade de exploração da rede eléctrica. A intervenção foi admitida pelo despacho de fls. 209; as intervenientes contestaram.

O autor desistiu do pedido contra CC, S.A.; a desistência foi homologada (decisão de fls. 520.).

A acção foi julgada parcialmente procedente, pela sentença de 16 de Abril de 2014, de fls. 558. BB - Energia, S.A. e FF Companhia de Seguros, S.A. foram condenadas solidariamente no pagamento de € 20.000,00 por danos não patrimoniais e de € 25.984,60 por danos patrimoniais, com juros de mora, contados desde a citação até integral pagamento.

BB - Energia, S.A. recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa, em 6 de Junho de 2014, a fls. 592, requerendo que fosse atribuído efeito suspensivo ao recurso.

Pelo requerimento de fls. 637, de 14 de Julho seguinte, o autor veio comunicar que a Companhia de Seguros lhe pagou a quantia em que as rés foram condenadas, encontrando-se “devidamente indemnizado” e conformado com a sentença, sendo “de parecer que o recurso interposto pela ré BB é inconsequente”. Junta carta da FF, com data de 12 de Junho de 2014, na qual se diz: “De acordo com a sentença junto anexamos recibo de indemnização, em nome do seu cliente, no valor de € 55.186,95 (capital de € 46.984,60 e juros € 8.202,35). Sem outro assunto de momento (…)”.

Em 22 de Julho de 2014, a fls. 643, BB - Energia, S.A. e FF Companhia de Seguros, S.A. vêm esclarecer que a Companhia de Seguros pagou porque “o recurso apresentado” não tem “efeito suspensivo” e que o mesmo se mantém e deve ser admitido. O autor objectou que “foi pago o montante em que as rés foram condenadas sem condições, excepto de que se considerava nada mais poder exigir da ré ”.

O recurso foi admitido, com efeito apenas devolutivo, pelo despacho de fls. 651, de 20 de Outubro de 2014.

2. A fls. 661, em 20 de Novembro de 2014, o autor veio desistir do pedido contra a BB - Energia, S.A.., por não querer receber em duplicado e reiterar que “não mantém interesse no litígio pendente”. A fls. 664, em 2 de Dezembro de 2014, FF Companhia de Seguros, S.A. opôs-se à desistência e observou que o recurso interposto por BB - Energia, S.A. lhe aproveita. À cautela, requereu “a assunção da posição de recorrente principal no recurso em curso, aderindo e subscrevendo inteiramente as alegações apresentadas pela Ré Recorrente BB - Distribuição, SA”.

Pelo acórdão de fls. 678, de 12 de Fevereiro de 2015, rectificado pelo acórdão de fls. 719, de 21 de Maio de 2015, o Tribunal da Relação de Lisboa decidiu:

“No caso dos autos, o autor, ora apelado, informou que já recebeu a quantia em que as rés foram condenadas pela sentença e que nada mais pretende receber.

Deste modo, o efeito jurídico que o autor pretendia obter tornou-se supervenientemente inútil, pelo que se impõe decidir sobre a inutilidade superveniente da lide e não sobre o mérito da causa, como pretende a apelante.

Do exposto decorre, tendo ainda em atenção que é ao autor que cumpre delimitar o objecto do processo, a inutilidade superveniente da lide, porquanto o seu objecto se mostra esgotado”.

Em 27 de Fevereiro de 2015, a fls. 687, FF Companhia de Seguros, S.A. requereu a rectificação do acórdão, apontando inexactidões.


3. Em 19 de Março de 2015, a fls. 692, FF, Companhia de Seguros, SA recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça. Nas alegações que apresentou, formulou as seguintes conclusões:


«I. Foi proferido acórdão pela Relação que declara extinta a instância por inutilidade superveniente da lide.

II. Refere-se no Relatório do acórdão, no parágrafo oitavo, que "A ré FF não se pronunciou quanto ao requerimento do Autor, referindo-se ao requerimento do autor em que este, já depois de apresentadas as alegações de recurso pela ré BB, informa o Tribunal do pagamento recebido da ré FF, daí retirando que o recurso da BB seria inconsequente.

III. Sucede que, como consta dos autos, a ré FF se pronunciou acerca do referido requerimento do Autor (como aliás, não poderia deixar de o fazer, uma vez que, ao pagar ao Autor, se limitou a cumprir uma sentença exequível, atento o efeito meramente devolutivo do recurso apresentado).

IV. Fê-lo efectivamente e conjuntamente com a ré BB, através do requerimento apresentado aos autos em 2014.07.22, e co-subscrito através do Citius pelas mandatárias das duas rés e cujo teor aqui se dá por reproduzido.

V. Tal requerimento vem referido no acórdão, erroneamente, como sendo da autoria única da ré BB, quando na realidade foi subscrito pelas duas rés, o que constituiu lapso manifesto nos termos do art. 614.° n.o 1 do CPC;

VI. Pelo que devendo o oitavo parágrafo do relatório do acórdão não é exacto e no início do parágrafo seguinte deveria constar "As rés BB e FF pronunciaram-se (...)”; da mesma forma, onde se lê na "fundamentação de direito do acórdão "A questão que se coloca nesta fase processual consiste em saber se o processo deve prosseguir os seus termos, como pretende a Ré BB,(...)'; deveria constar "A questão que se coloca nesta fase processual consiste em saber se o processo deve prosseguir os seus termos, como pretendem as Rés BB e FF (…)' (sublinhado nosso); ainda na terceira página do acórdão, no segundo parágrafo onde se lê "O montante pago pela ré seguradora foi efectuado como modo de extinção da obrigação e não, como pretende a ré BB, pelo facto de o recurso apresentado não ter efeito suspensivo (...), deveria, pelas mesmas razões, constar "O montante pago pela ré seguradora foi efectuado como modo de extinção da obrigação e não, como pretendem as rés BB e FF, pelo facto de o recurso apresentado não ter efeito suspensivo ( ... )' (sublinhado nosso).

VII. No Relatório do acórdão omite-se completamente a referência aos dois requerimentos juntos aos autos e anteriores ao acórdão a quo, a saber o requerimento do Autor de desistência do pedido face à ré BB e o requerimento de exercício do contraditório e de interposição de recurso de apelação da ré FF.

VIII. A omissão, para além de referência, estende-se à própria pronúncia sobre o teor, designadamente, do requerimento de interposição de recurso por parte da ora Recorrente.

IX. Tal omissão constitui, ao abrigo do disposto no art. 615.º n.o 1 al. d), causa de nulidade do acórdão, o que se argui para os devidos efeitos.

X. Efectivamente, o acórdão recorrido apenas se pronuncia sobre a questão de "saber se o processo deve prosseguir os seus termos (…) ou se o mesmo deve ser remetido à conta, conforme a pretensão do autor.".

XI. Conclui o acórdão que "No caso dos autos (. . .) o efeito jurídico que o autor pretendia obter tornou-se supervenientemente inútil pelo que se impõe decidir sobre a inutilidade superveniente da lide e não sobre o mérito da causa, (. .. ) Do exposto decorre, (...) a inutilidade superveniente da lide, porquanto o seu objecto se mostra esgotado.", "O montante pago pela ré seguradora foi efectuado como modo de extinção da obrigação e não como pretendem as rés BB e FF (de acordo com a rectificação supra requerida) "pelo facto de o recurso não ter efeito suspensivo' e ainda" “Verificado o facto, o tribunal não conhece o mérito da causa, limita-se a a declarar a extinção."

XII. Ora, sobre o pagamento efectuado ao autor pelo ré FF, já tiveram as rés oportunidade de esclarecer (cfr. requerimento de 1024.07.22) que o mesmo consistiu no cumprimento de sentença exequível, por razões, designadamente, de índole financeira, uma vez que, em caso de o recurso não obter provimento, o pagamento não comportaria juros de mora desde a data em que se pagou.

XIII. A decisão de extinção da instância com base no pagamento (entenda-se, cumprimento da sentença), viola o disposto no artigo 647.° do CPC, norma que atribui efeito devolutivo à sentença no caso dos autos.

XIV.   Note-se que, apesar da interposição de recurso pelas rés, o autor poderia, caso a ré não tivesse pago, requerer a execução da sentença (uma vez que esta seria exequível) dando inclusivamente início a diligências de penhoras de bens das rés.

XV. A ser como consta da fundamentação do acórdão a quo:

d) não seria possível a uma parte cível condenada em primeira instância, simultaneamente, recorrer da sentença e, à cautela cumprir a sentença;

e) b) não seria possível à parte vencedora e recorrida executar a sentença; em resumo

f) Não haveria qualquer distinção entre efeito suspensivo e efeito meramente devolutivo dos recursos.

XVI. Termos em que, deverá o acórdão recorrido, por violar a lei processual – art- 647.° do CPC – ser revogado e prosseguir a instância, ser o recurso apresentado pela Ré Fidelidade admitido nos termos requeridos pela ora Recorrente no requerimento de 2014.12.02, seguindo-se os ulteriores trâmites processuais.».


Não houve contra-alegações.


4. Em 21 de Maio de 2015, a Relação de Lisboa proferiu o acórdão de fls. 716, no qual se decidiu:


«No acórdão de 12 de Fevereiro de 2015 onde consta:

“A ré FF não se pronunciou quanto ao requerimento do autor. A ré BB pronunciou-se, referindo que o montante pago ao autor pela ré FF decorre do facto de o recurso apresentado não ter, nos termos das várias alíneas do nº 3 do artigo 647º do Código de Processo Civil, efeito suspensivo”.

Passa a constar:

A ré BB – Energia, SA e a interveniente FF Companhia de Seguros SA pronunciaram-se quanto ao requerimento do autor, referindo que o montante foi pago ao autor pela FF pelo “ facto de o recurso apresentado não ter, nos termos das várias alíneas do nº 3 do artigo 647º do Código de Processo Civil, efeito suspensivo”.»


Este acórdão esclareceu, ainda, no que toca à omissão de pronúncia invocada, que:


 «O acórdão é omisso quanto a tal requerimento e à resposta da ré FF, pois é inútil a sua apreciação, pelo facto de ter sido declarada extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, ou seja, esta solução torna inútil a apreciação da desistência do pedido.

Efectivamente, dos autos consta a fls. 638 cópia da carta registada com A/R de 12 de Junho de 2014 enviada pela ré FF ao mandatário do autor onde consta apenas o seguinte:

De acordo com a sentença junto anexamos recibo de indemnização, em nome de seu cliente, no valor de € 55.186,95 (capital de € 46.984,60+ juros € 8.202,35)”.

A fls. 639 foi junta cópia do cheque naquele montante, datado de 17 de Junho de 2014 e a fls. 640 consta uma cópia da Nota de Liquidação elaborada pelos serviços da ré FF, mencionando que se trata de uma Liquidação Tipo “Indemnizações”.

Em lado nenhum desses documentos vem referido que o pagamento ao autor daquela quantia se deve “ ao facto de o recurso apresentado não ter, nos termos das várias alíneas do nº 3 do artigo 647º do Código de Processo Civil, efeito suspensivo”.»


E que:

«No que respeita à adesão da ré FF ao recurso interposto pela ré BB, também não houve pronúncia por parte do acórdão pelas mesmas razões acima referidas, ou seja – repete-se – tendo sido declarada extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, esta solução torna inútil a apreciação do pedido em que a ré FF adere ao recurso interposto pela ré BB.

Mas se este argumento não for suficiente, sempre diremos que o requerimento de adesão formulado pela ré FF foi apresentado em 02 de Dezembro de 2014, fora do litisconsórcio necessário, invocando, por isso mesmo, as disposições das alíneas b) e c) do nº 2 do artigo 634º do Código de Processo Civil.

Todavia, como consta do nº 3 do mesmo preceito, a adesão ao recurso só pode ter lugar até ao início do prazo referido no nº 1 do artigo 657º.

(…) Ora, de acordo com os mencionados preceitos, a adesão ao recurso é intempestiva, pois só poderia ter lugar até 12 de Novembro de 2014 e foi apresentada em 02 de Dezembro de 2014»


O recurso foi admitido, como revista e com efeito meramente devolutivo.


5. Os factos relevantes para a apreciação do presente recurso constam do relatório deste acórdão.


6. Para além de requerer a rectificação do acórdão de 12 de Fevereiro de 2015, o que foi decidido pelo acórdão de 21 de Maio, a recorrente coloca as seguintes questões, de que agora cumpre conhecer:

– Nulidade do acórdão recorrido;

– Significado e consequências, no recurso de apelação, do pagamento efectuado pela FF, Companhia de Seguros, SA.


7. Como se viu, a recorrente alega que o acórdão de 12 de Fevereiro de 2015 omitiu completamente a referência dois requerimentos juntos aos autos e anteriores ao acórdão a quo, a saber o requerimento do Autor de desistência do pedido face à ré BB e o requerimento de exercício do contraditório e de interposição de recurso de apelação da ré FF.” (concl. VII). E que a omissão, para além de referência, estende-se à própria pronúncia sobre o teor, designadamente, do requerimento de interposição de recurso por parte do ora Recorrente” (concl. VIII).

No acórdão de 21 de Maio, o Tribunal da Relação de Lisboa decidiu que tal omissão não constitui nulidade, porque a respectiva apreciação ficou prejudicada com a inutilidade superveniente da lide.

Esta afirmação não merece qualquer censura, uma vez que a Relação considerou que, recebida a quantia pelo autor, que comunicou nada mais pretender receber, o efeito jurídico que o autor pretendia obter tornou-se supervenientemente inútil”; nesta perspectiva, não teria realmente qualquer utilidade apreciar, nem a desistência do pedido relativamente à BB, nem o requerimento da Companhia de Seguros FF, no sentido de “assunção da posição de recorrente principal no recurso em curso, aderindo e subscrevendo inteiramente as alegações apresentadas pela Ré Recorrente BB, SA” (requerimento de 2 de Dezembro de Dezembro de 2014, fls. 664) – artigos 666º, nº 1 e 615º, nº 1 d), lido em conjunto com o preceito que o pressupõe, o nº 2 do artigo 608º, todos do Código de Processo Civil.

Improcede, portanto, a arguição de nulidade. Mas cumpre observar que não se pode entender que tenha havido, nem uma interposição de recurso de apelação por parte da FF, Companhia de Seguros, SA, como esta pretende, nem uma adesão ao recurso interposto pela BB, como entendeu a Relação – sendo certo que, se de verdadeira adesão se tratasse, teria sido extemporânea, como se a Ralação observou.

Com efeito, da leitura atenta da sentença resulta que a ré BB – Distribuição – SA e a interveniente FF, Companhia de Seguros, SA foram condenadas solidariamente no pagamento da indemnização que está em causa neste recurso (€ 20.000,00 por danos não patrimoniais e € 25.984,60 por danos patrimoniais, com juros de mora, contados desde a citação até integral pagamento).

Sendo assim, o recurso interposto por BB – Distribuição – SA aproveitava a FF, Companhia de Seguros, SA, sem necessidade de adesão, nos termos do disposto na al. c) do nº 2 do artigo 634º do Código de Processo Civil. O significado útil que o requerimento de 2 de Dezembro de 2014 poderia ter era antes o de a FF, Companhia de Seguros, SA vir assumir a posição de recorrente principal, nos termos do nº 5 do mesmo artigo 634º, o que seria especialmente relevante face à desistência do pedido em relação à ré BB – Distribuição – SA.

Seja como for, improcede a nulidade arguida.


8. A recorrente sustenta novamente que o pagamento não foi efectuado como modo de extinção da obrigação”, como entendeu a Relação, mas que antes se explica pelo efeito meramente devolutivo do recurso de apelação e, portanto, pela intenção de cumprir uma sentença exequível e de evitar a acumulação de juros, caso o recurso não tivesse êxito.

Mas não tem razão, porque o pagamento foi efectuado sem que a FF, Companhia de Seguros, SA tivesse por qualquer forma, mais ou menos expressa ou tácita, esclarecido que esse pagamento não significava aceitação da decisão constante da sentença.

Está fora de questão que é diferente que um recurso tenha efeito meramente devolutivo ou, também, efeito suspensivo; e é certo que a parte vencida em 1ª Instância pode, simultaneamente, cumprir a condenação e interpor recurso, naturalmente se estiverem verificados os demais pressupostos de recorribilidade, para além do vencimento (nº 1 do artigo 631º do Código de Processo Civil); tal como é certo que, tendo efeito meramente devolutivo o recurso interposto de uma sentença condenatória, a parte vencedora pode executá-la – verificados os demais requisitos, claro

 Nada disso conflitua com a necessidade de a parte vencida que, simultaneamente, quer obter a alteração da sentença, em recurso que interpôs ou que lhe aproveita, e quer desde logo cumprir, prevenindo a hipótese de insucesso do recurso e evitando nomeadamente a acumulação de juros, esclarecer que o pagamento não significa aceitação da decisão.

Assim resulta com toda a clareza do disposto nos nºs 2 e 3 do artigo 632º do Código de Processo Civil: “Não pode recorrer quem aceitar a decisão depois de proferida” (nº 2), podendo ser tácita a aceitação, entendendo-se por aceitação tácita “a que deriva da prática de qualquer facto inequivocamente incompatível com a vontade de recorrer” (nº 3) – como é, manifestamente, o pagamento espontâneo ao vencedor da quantia em que o vencido foi condenado, desacompanhado de qualquer indicação de que esse pagamento não significa aceitação.

No caso concreto, não há a mais leve indicação de que o pagamento, pela FF, Companhia de Seguros, SA, não significasse a aceitação da condenação; veja-se a sua carta de 12 de Junho de 2014 – nessa altura, o recurso interposto apenas pela BB – Distribuição, SA já estava pendente –, com cópia a fls. 838. Muito pelo contrário: diz-se expressamente na carta que o pagamento se faz “de acordo com a sentença, anexamos recibo de indemnização …”., “sem outro assunto”.

A partir do momento em que pagou sem reserva, a FF, Companhia de Seguros, SA aceitou a condenação determinada em 1ª Instância. Não teria direito de recorrer, se ainda estivessem em tempo – nº 2 do artigo 632º citado – e, ostensivamente, deixou de aproveitar do recurso interposto pela ré BB - Energia, S.A..

Manteve-se, assim, um recurso que apenas poderia aproveitar à ré BB - Energia, S.A., porque a FF, Companhia de Seguros, SA, afastara o benefício que poderia retirar do recurso, procedendo ao pagamento. E nenhuma anomalia decorre desta restrição, pois se trata de um caso de litisconsórcio voluntário.


9. Tendo o autor desistido do pedido relativamente a essa ré, compreende-se que não tivesse utilidade a manutenção de um recurso que só a ela poderia aproveitar.

Dir-se-á que essa desistência não foi homologada; mas a FF, Companhia de Seguros, SA é estranha a essa falta, que nunca a poderia atingir, por ter procedido ao pagamento com as consequências já analisadas.


Assim sendo, e, na verdade, em consequência desse pagamento, o recurso de apelação não poderia ter qualquer utilidade para a recorrente; tornou-se, portanto supervenientemente inútil.

           

10. Nestes termos, nega-se provimento ao recurso.


Custas pela recorrente.


Lisboa, 08 de Outubro de 2015


Maria dos Prazeres Beleza (Relatora)

Salazar Casanova

Lopes do Rego