Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
5903/09.4TVLSB.L1.L1.S1
Nº Convencional: 1ª SECÇÃO
Relator: GABRIEL CATARINO
Descritores: UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Data do Acordão: 12/11/2012
Votação: UNANIMIDADE COM * DEC VOT
Referência de Publicação: DR, I SÉRIE, 14, 21.01.2013, P. 433
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: ACÓRDÃO DE UNIFORMIZAÇÃO
Decisão: UNIFORMIZADA JURISPRUDÊNCIA
Sumário :
“Tendo o aval sido prestado de forma irrestrita e ilimitada, não é admissível a sua denúncia por parte do avalista, sócio de uma sociedade a favor de quem aquele foi prestado, em contrato em que a mesma é interessada, ainda que, entretanto, venha a ceder a sua participação social na sociedade avalizada.”
Decisão Texto Integral:

I. – RELATÓRIO.

AA, interpôs recurso para uniformização de jurisprudência, com fundamento em contradição de decisões proferidas neste processo e num outro proferido a 02-12-2008, deste Supremo Tribunal.

Para o desiderato por que propugna, consignou, a final, o acervo conclusivo que a seguir se deixa extractado.

1. “Em Novembro de 2007, o ora recorrente cedeu a sua participação social na empresa I..., Lda. e disso mesmo deu conhecimento, via telefax e pessoalmente, ao Gerente do Balcão da Agência do BES da Castanheira do Ribatejo.
2. Na mesma comunicação de 03.01.2008, à qual juntou certidão comercial da sociedade onde demonstrou a venda da sua participação social, declarou expressamente que pretendia liberar o seu nome enquanto avalista, ou em qualquer outra qualidade, dos contratos de abertura de crédito em conta-corrente, bem como de qualquer outra garantia anexa ao aludido contrato (livrança), ou a futuras operações financeiras da I..., Ld.ª
3. Nos termos da jurisprudência do STJ, nomeadamente do acórdão de 29.10.2002, em que foi relator o Venerando Conselheiro Oliveira Barros e do acórdão de 02.12.2008 do STJ em que foi relator o Venerando Conselheiro Paulo Sá, é admissível a denúncia do aval.
4. E em consequência a declaração enviada pelo aqui recorrente à recorrida em 03.01.208 é valida e serve como denúncia.
5. Sendo que posteriormente a esta denúncia, recebida e conhecida, não podia vir a recorrida a preencher e accionar essas livranças, como o fez.
6. Em sede de Apelação, veio o Tribunal da Relação de Lisboa pronunciar-se, dando parcial provimento à pretensão do recorrido.
7. Com efeito. o Tribunal da Relação (através de Acórdão de 30.11.2010 que se dá aqui por integralmente reproduzido) cingiu o pleito a duas questões (o sublinhado é nosso):

8. se o autor tem direito a liberar-se da obrigação de aval por denúncia. e desde quando este produz efeitos:
9. se, em caso de resposta afirmativa os autos contêm todos os elementos que permitam conhecer do pedido de indemnização formulado na p. i veio autor.
10. E perante a factualidade, o Acórdão do tribunal a quo dispõe que: “4. A questão que se coloca prende-se com a validade da denúncia da obrigação de aval operada pela comunicação acima referenciada”':
11. Continuando: "Enquanto causa de extinção do negócio jurídico, a denúncia tem como seu campo de aplicação os contratos de execução continuada e duradoura, em que as partes não estabelecem um prazo fixo de vigência. Como a vigência do contrato ilimitada no tempo seria contrária à liberdade económica das partes, que não se compadece com a criação de vínculos perpétuos ou de duração indefinida, admite-se neste caso a denúncia a todo o tempo – cfr. Meneses Leitão, Direito das Obrigações, VoI. III, pag. 101.
12. Adiante: "Encontramo-nos, por isso, em presença de contratos com prazo mas automaticamente renováveis, não tendo sido convencionada a não denunciabilidade da obrigação de aval pelo prestador deste':
13. Concluindo nesta parte: “Daí que se reconheça a possibilidade legal do avalista/autor se desvincular unilateralmente dessa obrigação".
14. Tendo a declaração de denúncia chegado ao poder do beneficiário no dia 03.01.2008, a declaração tomou-se eficaz (artigo 224.º, n1, do CC)
15. Deste modo, o autor tem direito a que se declare o mesmo liberado das garantias prestadas no âmbito dos contratos de financiamento e livranças por si avalizadas, a produzir efeitos desde o termo dos prazos de 180 e 90 dias previstos em cada um daqueles contratos e que se encontrem em curso na data da denúncia (3.01.2008), impondo-se a condenação do réu a reconhecer tal” (o negrito é nosso). [ O hiato na numeração – do número 15 para o 35 – corresponde à numeração indicada nas conclusões, tendo-se optado pela sua manutenção. ]

35. Perante a Decisão do Tribunal da Relação de Lisboa veio a sociedade comercial BES, SA a recorrer de revista para este Alto Tribunal.
36. Tendo o Acórdão ora recorrido dado provimento à pretensão da sociedade comercial BES, SA e revogado a Decisão do Tribunal da Relação de Lisboa.

37. Para o efeito, a decisão recorrida fundamenta que existe uma diferença substancial entre aval e fiança.
38. Sendo que a obrigação do avalista é directa e independente e a do fiador é sempre acessória.

39. "Como se extrai da definição de denúncia supra extractada esta figura ou instituto jurídico só é exercitável e admissível para as situações em que a relação contratual arranque de um contrato duradouro e em que uma das partes, por declaração unilateral de vontade receptícia, pretenda pôr termo".

40. "Não se constituindo o aval um contrato, mas um acto jurídico unilateral, não receptício, autónomo, abstracto e com as mesmas características de uma obrigação cambiária não se prefigura correcto, em nosso aviso, que possa ser objecto de denúncia" .
41. Por isso mesmo, tendo em conta excertos da decisão de que se recorre, a mesma concedeu revista e revogou a decisão do Tribunal da Relação de Lisboa.
42. Por isso mesmo, atendendo ao que ficou atrás exposto, existem manifestamente decisões contraditórias, sobre a mesma questão fundamental de direito, da admissibilidade de denúncia do aval, proferidas pelo ST].
43. As decisões do ST], atrás citadas e nas quais se estribou o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, e o Acórdão em sentido contrário do STJ, proferido no âmbito dos presentes autos.
44. Não havendo jurisprudência uniformizada a este respeito.

45. Daí que, de acordo com o disposto no artigo 7630 do CPC, se requer a Vs. Exas. uma Decisão do Pleno das Secções Cíveis que decida de acordo com a pretensão do ora recorrente e de forma uniformizar a jurisprudência do STJ a este respeito.
Em contra-alegações, o recorrido, Banco ..., S.A. repontou a pretensão do recorrente tendo, dessumido o acervo conclusivo que a seguir queda extractado.

1. “Em 22 de Setembro de 2009 AA propôs acção que correu termos pela 10.ª Vara Cível de Lisboa, 1.ª Secção, sob o número de processo 5903/09.4 TVLSB, em que pedia a liberação da garantia prestada no âmbito de dois contratos de financiamento celebrados em 2006 e 2007, um primeiro de € 70.000,00, e outro de € 30.000,00, para apoio à tesouraria, celebrados entre a sociedade " I...-Imobiliária e Construção, Lda" e o Banco ..., SA.
2. Para garantia do efectivo e integral cumprimento de todas as responsabilidades que adviessem para a sociedade do não cumprimento de qualquer obrigação resultante de cada um dos acima identificados contratos, AA e outros, entregaram ao BES duas livranças em branco avalizadas, que o banco ficou desde logo autorizado a preencher, pelas quantias que se mostrassem devidas.
3. Nessa acção, AA, pedia a liberação da garantia prestada no âmbito dos identificados contratos e bem assim a condenação do BES no pagamento da quantia de € 25.000,00 a título de danos morais – uma vez que em 03 de Janeiro de 2008, o ora recorrido, havia enviado um fax ao BES, no qual informava que, em virtude de ter cedido a sua participação na sociedade " I...-Imobiliária e Construção, Lda ", pretendia ser liberado da sua qualidade de avalista nas indicadas livranças.
4. Em primeira instância foi proferida sentença, que julgou a acção improcedente por não provada, tendo em consequência sido o BES absolvido da totalidade do pedido.
5. Inconformado com esta decisão, interpôs o ora Recorrente recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa.
6. O Acórdão de 30 de Novembro de 2010, veio a julgar parcialmente procedente a apelação, revogando a sentença proferida em primeira instância, declarando " o autor liberado das garantias prestadas no âmbito dos contratos de financiamento ( .. .) e livrança em causa".
7. Considerou a Relação de Lisboa, ao abrigo do princípio da livre denunciabilidade dos contratos por termo indeterminado, que a pretensão do ora Recorrido AA era válida.
8. Deste acórdão da Relação foi interposto recurso pelo Banco ..., tendo o acórdão ora recorrido concedido a revista e, consequentemente, reposta a decisão proferida em 1.a instância.
9. Estabelece o artigo 30.º LULL, ex vi art. 77.º do mesmo diploma que, «o aval é o acto pelo qual um terceiro ou um signatário da letra (ou livrança) garante o pagamento desse título por parte de um dos respectivos subscritores.»
1O. Não se encontra prevista na LULL, a denúncia como modo de fazer extinguir a obrigação do avalista. Pelo que não pode o intérprete encontrar no respectivo sistema nacional outras causas extintivas para além das previstas na LULL.

11. Não tem pois, na perspectiva do ora Recorrido, qualquer fundamento a criação por via jurisprudencial de causas extintivas do aval que não têm a menor aderência ao estabelecido na convenção que o regula: A Lei Uniforme sobre as Letras e Livranças (LULL).
12. O aval é o negócio cambiário unilateral e abstracto que tem por conteúdo uma promessa de pagar e por função a garantia desse pagamento. O aval pode ser prestado por um terceiro ou por um signatário da letra, art. 30.º/2 LULL e tem de ser prestado a favor de um dos obrigados – (In, Pedro Pais de Vasconcelos, Direito Comercial, Títulos de Crédito, pág. 74)
13. Pelo que a confiança que o aval traduz, não se compagina com a possibilidade da sua denúncia pelo avalista. O aval é um valor de "per si" autónomo da realidade que lhe subjaz.
14. Acresce, que a posição do avalista, como a de qualquer outro interveniente na letra é também autónoma. O aval subsiste mesmo que o acto do avalizado seja nulo por qualquer razão que não o vício de forma, art. 32.º /2 da LULL.
15. Donde esclarece e bem o douto Acórdão de 10 de Maio de 2011 que: "A obrigação firmada pelo avalista é perante a obrigação cartular e não perante a relação subjacente (...) o avalista não se obriga perante o avalizado mas sim perante o titular da letra ou da livrança constituindo uma obrigação autónoma e independente e respondendo, como obrigado cartular, pelo pagamento da quantia titulada na letra ou livrança. "
16. Desta forma, justifica-se a opção do legislador pela manutenção da garantia prestada " mesmo no caso de a obrigação que ele garantiu ser nula por qualquer razão que não seja um vício de forma "-cfr. Art. 32.0 da LULL.
17. Donde que decidiu e bem o douto Acórdão Recorrido que:
" A relação cambiária constituída permanece independente às mutações ou alterações que se processem na relação subjacente não acompanhando as eventuais transformações temporais e/ou de qualidade da obrigação causal. Os efeitos da obrigação cartular assumida pelo avalista destacam-se da obrigação subjacente segregando um feixe de obrigações e deveres que, do nosso ponto se vista não são passíveis de denúncia. "

“ (...) O aval (. . .) não pode ser reconvertível a um contrato consensuado entre o avalista e qualquer dos demais obrigados cambiários e que, et pour cause, possa ser objecto de denúncia. "

" Não se constituindo o aval um contrato, mas um acto jurídico unilateral, não receptício, autónomo, abstracto e com as mesmas características de uma obrigação cambiária não se prefigura correcto, ( .. ) que possa ser objecto de denúncia." ( os sublinhados são nossos.)

18. Pelo que, de acordo com o disposto no artigo 7630 do CPC, se requer a V. Exas. que conceda provimento às presentes Contra-Alegações, mantendo-se a decisão proferida no douto Acórdão recorrido, nomeadamente, que se mantenha revogada a decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Lisboa, repondo-se a decisão proferida em 1.ª instância, que julgou improcedente o pedido de condenação do ora Recorrido em liberar o ora Recorrente AA do aval prestado e uniformizar-se a Jurisprudência quanto a esta questão de direito neste mesmo sentido.”
Foi reconhecida a oposição dos acórdãos supra mencionados – cfr. despacho de fls. 91 a 95 – que, para a economia do presente acórdão, adquire a seguinte dimensão de direito material, enunciada, aliás, pelo recorrente: É admissível a denúncia de um aval prestado pelo sócio de uma firma (avalizada), pelo facto de haver cedido as quotas de que era detentor na firma avalizada?

II. – Fundamentação.

II.A. – De facto.

Vem adquirido das instâncias a sequente factualidade:

A 23 de Outubro de 2006 o BES, a “I... – Imobiliária e Construção, Lda.”, na qualidade de cliente, AA, BB e CC e DD, na qualidade, qualquer um deles, de " Prestador de garantia da livrança", subscreveram o instrumento junto por cópia a fls. 26-31, denominado" financiamento n.º EC 020529/06", cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido.

No referido instrumento ficou consignado na parte relativa a "Condições particulares" o seguinte:

" 1. Crédito: Montante máximo global de € 30.000,00

2. Finalidade: a) apoio de tesouraria

(...)

Disponibilização imediata (...)

8. Utilização

Regime de utilização: utilização livre Reutilização: crédito reutilizável

(...)

13. Garantias de crédito: Livrança subscrita pelo cliente e avalizada".

No referido instrumento ficou consignado na parte relativa a "Condições Gerais" o seguinte:

" (...)

17. Garantias I Disposições comuns

§ 1. Para efeitos do contrato, considera-se abrangida pelas estipulações referentes às garantias a livrança entregue ao BES com a data de preenchimento e valor em branco, esteja ou não avalizada.

§ 2. Todas as garantias constituídas e indicadas nas condições particulares, destinam-se a garantir o bom pagamento de todas as responsabilidades que advêm para o cliente do não cumprimento pontual e integral de qualquer obrigação resultante do contrato bem como de suas alterações, prorrogações, aditamentos ou reestruturações, nomeadamente, e entre outras, o reembolso de capital, o pagamento de juros remuneratórios e moratórios, despesas judiciais ou extrajudiciais, honorários de advogados, solicitadores e custas, bem como saldos devedores de quaisquer contas bancárias de que o cliente seja titular ou co-titular que tenham como origem obrigações resultantes do contrato.

(...)

19. Livrança

(...)

§ 2. O BES fica autorizado pelo cliente e pelo(s) avalista(s), caso existam, a preencher a livrança com uma data de vencimento posterior ao vencimento de qualquer obrigação garantida e por uma quantia que o cliente lhe deva ao abrigo do contrato".

A 07 de Agosto de 2007 o BES, a “I... – Imobiliária e Construção, Lda.” na qualidade de cliente, AA, BB e CC e DD, na qualidade, qualquer um deles, de " Prestador de garantia da livrança", subscreveram o instrumento junto por cópia a fls. 32-37, denominado" financiamento n.º EC 010484/07", cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido.

No referido instrumento ficou consignado na parte relativa a "Condições particulares" o seguinte:

" 1. Crédito: Montante máximo global de € 70.000,00

2. Finalidade: a) apoio de tesouraria

(...)

5. Disponibilização imediata

(...)

8. Utilização

Regime de utilização: utilização livre Reutilização: crédito reutilizável

(...)

13. Garantias de crédito: Livrança subscrita pelo cliente e avalizada".

No referido instrumento ficou consignado na parte relativa a "Condições Gerais" o seguinte:

" (...)

17. Garantias I Disposições comuns

§ 1. Para efeitos do contrato, considera-se abrangida pelas estipulações referentes às garantias a livrança entregue ao BES com a data de preenchimento e valor em branco, esteja ou não avalizada.

§ 2. Todas as garantias constituídas e indicadas nas condições particulares, destinam-se a garantir o bom pagamento de todas as responsabilidades que advêm para o cliente do não cumprimento pontual e integral de qualquer obrigação resultante do contrato bem como de suas alterações, prorrogações, aditamentos ou reestruturações, nomeadamente, e entre outras, o reembolso de capital, o pagamento de juros remuneratórios e moratórios, despesas judiciais ou extrajudiciais, honorários de advogados, solicitadores e custas, bem como saldos devedores de quaisquer contas bancárias de que o cliente seja titular ou co-titular que tenham como origem obrigações resultantes do contrato.

(...)

19. Livrança

(...)

§ 2. O BES fica autorizado pelo cliente e pelo(s) avalista(s), caso existam, a preencher a livrança com uma data de vencimento posterior ao vencimento de qualquer obrigação garantida e por uma quantia que o cliente lhe deva ao abrigo do contrato".

A fls. 51-52 está junta cópia de um instrumento de livrança n.º ..., com os seguintes dizeres:

- no espaço destinado ao " Emissor/Tomador ", impresso, Banco ...

- no espaço reservado a" Local de Pagamento ", um NIB;

-no espaço destinado a " Local e Data de Emissão", Lisboa, 2006.04.04;

- no espaço destinado ao vencimento, 2009-08-28.;

- no espaço destinado a " Importância ", € 37.002,53;

- no espaço destinado ao valor, " Caução ";

- no espaço destinado à assinatura do subscritor, um carimbo com os dizeres I... Imob e Const, Lda com duas assinaturas;

- no local destinado a nome e morada do subscritor, consta, I... - Imobiliária e Construção, Lda. ( ... ).

- No verso do referido instrumento e a seguir aos dizeres" Bom por aval à firma subscritora " constam várias assinaturas, sendo a primeira delas a de AA.

- A fls. 53-54 está junta cópia de um instrumento de livrança n.º ..., com os seguintes dizeres:

- no espaço destinado ao " Emissor/Tomador ", impresso, Banco ...

- no espaço reservado a " Local de Pagamento ", em branco;

- no espaço destinado a" Local e Data de Emissão", Lisboa, 2007.08.07.;

- no espaço destinado ao vencimento, 2009-08-28.;

- no espaço destinado a" Importância ", € 85.350,97;

- no espaço destinado ao valor, " Caução ";

- no espaço destinado à assinatura do subscritor, um carimbo com os dizeres I... Imob e Const, Lda. com duas assinaturas;

- no local destinado a nome e morada do subscritor, consta, I... - Imobiliária e Construção, Lda. ( ... ).

No verso do referido instrumento e a seguir aos dizeres "Bom por aval à firma subscritora" constam várias assinaturas, sendo a primeira delas a de AA.

- Com a data de 03.01.08. o autor enviou ao balcão da Ré de Castanheira do Ribatejo o fax que constitui fls. 10, com o seguinte teor:

"Assunto: Avales I...

Como é do vosso conhecimento no início de Novembro do ano transacto cedi as quotas respeitantes a 35% do capital social da I... ao Sr. EE (conforme certidão comercial que já têm ao vosso dispor).

Enquanto sócio da “I...”, e nessa qualidade, concedi alguns avales pessoais para determinadas operações financeiras da referida empresa com a vossa instituição, uma vez que, como é lógico, estou completamente alheado da gestão, e não obstante de confiar na mesma, não faz qualquer sentido a manutenção das referidas garantias pessoais.

Em face do exposto e uma vez que as linhas de crédito estão a ser renovadas, venho pelo presente solicitar-lhes que retirem o meu aval das referidas operações. (...)"

- Com a data de 23 de Julho de 2009, o autor enviou ao Presidente do Conselho de Administração a carta de fls. 13-14, cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido.” [ Queda transcrito troço da missiva enviada pelo demandante ao Presidente do Conselho da Administração do BES. “(…) o ora signatário, AA (…) foi, até Novembro de 2007, sócio de uma sociedade comercial por quotas denominada I... – Imobiliária e Construção, Lda.”, pessoa colectiva n.º 506.940,373, com sede na Urbanização ....

No âmbito da actividade societária nos anos de 2006 e 2007, para garantir o apoio à tesouraria da empresa, a I..., Lda. recorreu ao crédito junto do BES (Balcão de Castanheira do Ribatejo) através da contratação de duas contas correntes caucionadas (sediadas na conta do BES nº ...) no valor global de € 100.000,
O ora signatário, enquanto sócio da I..., Lda. assinou os enunciados contratos de crédito.
No entanto, em Novembro de 2007, o signatário cedeu a sua participação social na empresa I..., Lda. e disso mesmo deu (por fax e pessoalmente) conta no Balcão do BES da Castanheira do Ribatejo. Na mesma comunicação (de 03.01.2008, onde juntou certidão comercial da empresa onde demonstrou a venda da participação social declarou expressamente que não pretendia ver o seu nome num aval ligado à futuras operações financeiras da I... Lda.".
Explicando para o efeito que uma vez que as linhas de crédito do BES à empresa estavam a ser renovados o seu nome ou eventual aval pessoal não deveria constar em futuros contratos. Ou seja, nas renovações contratuais dos créditos. (…) ]
II.B. – De Direito.

II.B.1. – Natureza, Função e Finalidade do Aval.

O aval é um acto jurídico cuja função é a de garantir o pagamento do crédito cambiário, tendo como finalidade essencial reforçar a segurança do tomador na definitiva satisfação do crédito inscrito no título em que o aval é prestado. [ Cfr. Pedro Alfonso Labriega Villanueva, “El aval. Fianza sui generis o Garantia Cambiária Típica”, publicado no Boletín Mexicano de Derecho Comparado, Año XXXVII, n.º 110, Mayo-Agosto de 2004, págs. 611-661. Vide ainda Piedrabuena Molina, Pilar, in “El Aval en la Letra de cambio como garantia” – Derecho Del Mercado Financeiro – Operaciones Bancárias de Gestión; Garantias; Operações Bursátiles”, Vol.II, pág. 443. “O aval bancário cumpre uma função de garantia, já que mediante o aval se incrementa a segurança do documento cambiário na sua primordial finalidade que é o pagamento, assim como uma importante função económica, pois ao aumentar as possibilidades de que a letra seja paga, facilita a sua transmissão e desconto, isto é, a sua circulação no tráfico jurídico mercantil.” / “O aval constitui uma garantia para o pagamento da letra, ou seja, para a extinção do crédito cambiário, não para a extinção da outra dívida de um concreto obrigado cambiário; (…) tem sempre natureza mercantil e carácter solidário e, finalmente, opera quando a letra se vence e não haja sido paga, independentemente do alcance dos incumprimentos do obrigado principal. A fiança, ao invés, pode ser civil ou mercantil e há-de constar ou poder deduzir-se o seu carácter solidário em cada caso concreto. O avalista resulta garante perante ad incertam personam (…) enquanto que na fiança se é devedor perante uma pessoa determinada.” - Cfr. Blanco Campaña, Jesus, in “Aval bancário y aval como contrato de Garantia” – Comentários a Jurisprudência de Derecho Bancário y Cambiário”, vol. I, pág. 176. ] Na definição de Pedro Pais de Vasconcelos “o aval pode ser definido como “o negócio jurídico cambiário unilateral e abstracto que tem por conteúdo uma promessa de pagar a letra e por função a garantia desse pagamento”. [ Cfr. Pais de Vasconcelos, Pedro, in “Direito Comercial – Títulos de Crédito”, AAFDL, Lisboa, 1988/1989, pag. 74, citado em “Nos 20 anos do Código das Sociedades – Homenagem aos Profs. Doutores A. Ferrer Correia, Orlando de Carvalho e Vasco Lobo Xavier”, vol. III, Coimbra Editora, 2007, pág. 950 e do mesmo autor “Direito Comercial - Parte geral, Contratos Mercantis, Títulos de Crédito”, vol. I, Almedina Coimbra, Pág. 339. Vide ainda Piedrabuena Molina, Pilar, in op. loc. cit., pág. 443 que define o aval “[como] uma garantia pessoal cambiária dada para o cumprimento da obrigação que compete à pessoa avalizada, isto é como uma declaração cambiária cuja função directa e exclusiva é de garantir o pagamento da letra de cambio.”] Poder-se-á, assim, definir o aval como o negócio cambiário típico, por força do qual se oferece aos tomadores do título cambiário a garantia de uma pessoa, o avalista, formalmente dependente da de outro obrigado no título, o avalizado, mas configurada num plano substancial com carácter autónomo.

A garantia oferecida pelo avalista constitui-se ao mesmo tempo acessória e autónoma. [ Oliveira Ascensão diverge da posição que confere ao aval uma posição de obrigação acessória, fazendo notar que “se a obrigação se mantém, mesmo que a “obrigação garantida” seja nula por qualquer razão que não seja por vício de forma (art.32.º/2ª §) isso significa que não é acessória.”. Explicitando a ideia o autor adianta que não existirá contradição entre o que vem estabelecido no citado artigo 32.º, 2.º § da LULL e o estatuído 1.º § quando refere que o avalista é “responsável da mesma maneira que a pessoa afiançada”. Na verdade “o 1.º § dá a medida objectiva da obrigação do avalista, que é independente da realidade jurídica da obrigação do avalizado” (…) “se a obrigação do avalizado dá apenas a medida objectiva da obrigação do avalista mas é independente da deste, a obrigação não é acessória.” No mesmo sentido – de que o aval não é uma garantia da obrigação avalizada, mas garantia do pagamento de um titulo de crédito – parece ser a posição de Paulo Cunha, citado por Paulo Sendin e Evaristo Mendes, in “Natureza do aval e a questão da necessidade ou não de protesto para accionar o avalista do aceitante”, Almedina, Coimbra, 1991, pág. 39, quando citando o indicado Autor referem que “[se] a nulidade da obrigação avalizada não destrói a obrigação do avalista, (é porque) … a obrigação do avalista é uma responsabilidade que garante … o pagamento da letra e não constitui uma mera responsabilidade da letra por parte de uma certa pessoa: o avalizado. Responde-se objectivamente pelo pagamento da letra, não se responde subjectivamente, ou seja pelo pagamento dela por parte da pessoa avalizada.” Sendin, Paulo já tinha expresso essa posição em “Letra de Câmbio – L.U. de Genebra – Obrigações Cambiárias”, vol. II, Universidade Católica Portuguesa, Almedina, pág. 749, quando afirma que “a acessoriedade do aval não significa a acessoriedade da obrigação do avalista em relação à obrigação do avalizado. O aval é, antes, uma garantia do cumprimento da letra pelo sacado no vencimento. Portanto, uma garantia do cumprimento pontual do direito de crédito cambiário.” ] Acessória porque se apoia, pelo menos formalmente, em outra obrigação cambiária, a do avalizado, autónoma porque é válida ainda que a obrigação garantida resulte nula por qualquer causa que não seja vício de forma e porque o avalista não poderá opor excepções pessoais ao beneficiário do aval. [ Cfr. por todos o recente acórdão deste Supremo Tribunal de 13-04-2011: “O aval é o acto pelo qual uma pessoa estranha ao título cambiário, ou mesmo um signatário – art. 30.º da LULL – garante, por algum dos co-obrigados no título, o pagamento da obrigação pecuniária que este incorpora.

O aval é, pois, uma garantia dada pelo avalista à obrigação cambiária e não à relação extracartular.
O aval é uma garantia autónoma (não é uma fiança): a obrigação do avalista é, por um lado, subsidiária ou acessória de outra obrigação cambiária ou da obrigação de outro signatário; no entanto, o aval é também um verdadeiro negócio cambiário, origem de uma obrigação autónoma; o dador de aval não se limita a responsabilizar-se pela pessoa por quem dá o aval, mas assume a responsabilidade do pagamento da letra.
O avalista não detém uma posição acessória em relação à obrigação garantida, tanto assim é que a sua vinculação como garante se mantém ainda que seja nula a obrigação garantida – art. 32º da LULL – por qualquer motivo que não seja um vício de forma.”]
Para Oliveira Ascensão o aval funciona como uma obrigação autónoma e não como garantia, dado que pelo aval o avalista contrai uma responsabilidade (jurídica) distinta da do avalizado, não estando, sequer, dependente da validade da obrigação garantida “nem mesmo da obrigação do afiançado”. [ Cfr. Oliveira Ascensão, José, in “Direito Comercial - Títulos de Crédito”, Vol. III, AAFDL, 1962, págs. 165 a 175./ Cfr. na doutrina espanhola Piedrabuena Molina, Pilar, in op. loc. cit. pág. 444, que relativamente à natureza jurídica do aval entende que “[o] aval, do mesmo modo que a obrigação cambiária que garante, está constituído por uma declaração de vontade, formal, unilateral e não receptícia, que se incorpora no titulo e circula com ele, pelo que o tomador pode contar não só com o património do obrigado principal, mas também com o património do avalista que não pode valer-se das excepções que eventualmente correspondam ao avalizado com carácter pessoal, dada a natureza abstracta e formal do aval.” ]

Caberá conferir os distintos tipos ou classes de aval, de acordo com diversos critérios de classificação de desigual importância ou transcendência jurídica.

Assim, por exemplo, segundo o momento em que sejam subscritos, os avales poderão ser anteriores ou posteriores ao vencimento e denegação do pagamento da letra produzindo em ambos os casos plenos efeitos; segundo poderão ser prestados por um terceiro ou prestados por um assinante da letra, esteja o avalista ou não obrigado no título,

A classificação mais importante é a que contrapõe os avales gerais ou plenos aos avales limitados. Não se reconhece, em principio, outra limitação que a referida à quantidade avalizada no chamado aval parcial. [ Cfr. Sendin, Paulo, in “Letra de Câmbio – L.U. Genebra – Obrigações Cambiárias”, Vol. II, Universidade Católica Portuguesa, Almedina, Coimbra, pág. 788. cfr. ainda Piedrabuena Molina, Pilar, op. loc. cit., págs. 444 e 445. ] Há, no entanto, quem considere que, por não estar expressamente proibido na lei, são admissíveis os avales limitados a tempo (quer dizer que a reclamação contra o avalista se coloca dentro de um prazo fixado), a pessoa (quer dizer que seja uma pessoa concreta e determinada - o beneficiário do aval - a que se dirija o avalista) e a caso ou condição.

Quanto à natureza jurídica do aval o debate doutrinal centrou-se durante algum tempo na concepção do aval como uma especialidade ou modalidade da fiança. A dependência substancial que, conforme tal concepção, guardaria a obrigação do avalista com a do avalizado cuja inexistência determinaria, necessariamente, a ineficácia do aval, supunha uma restrição tão severa à eficácia deste como instrumento de garantia do crédito cambiário que forçou muitos autores a manter interpretações quase correctoras inspiradas na afirmação de uma independência entre ambas as obrigações. [ Cfr. a este propósito (evolução histórica do aval) Sendin, Paulo e Mendes, Evaristo, in “Natureza do aval e a questão da necessidade ou não de protesto para accionar o avalista do aceitante”, Almedina, Coimbra, 1991, págs. 17 a 45; e ainda Gonçalves, Fernando, Alves, Manuel João, Francisco, Arlindo José e Alves Pinto, Fernando Amadeu, in “Regime Jurídico do Aval e outras Garantias Pessoais”, Almedina, págs. 13 a 29. ] A posição doutrinal mais recente, bem como a jurisprudência, tem vindo a afirmar a natureza autónoma e independente do aval relativamente à obrigação avalizada, ainda que formalmente dependente. [ Cfr. neste sentido o Ac. deste Supremo Tribunal de 01-07-2003 (Conselheiro Azevedo Ramos), in www.stj.pt em que se doutrinou “A obrigação do avalista é materialmente autónoma, ainda que formalmente dependente.” ]

O aval dá-se em função de uma obrigação garantida, circunstância que haverá de ter, em princípio, um reflexo formal no título cambiário (o aval deverá indicar quem avaliza) e que se traduz numa consequência fundamental: o avalista responde tão só ante os tomadores do título ou seja, perante aqueles a quem responde o avalizado.

O aval é considerado como valorizador da assinatura do sacado, endossantes ou aceitantes, aos quais brindou com uma confiança tal que valoriza a sua exteriorização cambiária objectiva, com um acto de pura garantia. Encerra, pois, objectivos peculiares, privativos e imanentes ao seu carácter de obrigação cambiária, qual seja a celeridade pela rápida circulação do documento e segurança. [ Cfr. quanto ao aspecto da valorização pessoal que o aval confere ao direito de crédito cambiário veja-se Sendin, Paulo, in “Letra de Câmbio – L.U. de Genebra - Obrigações Cambiárias”, vol. II, Universidade Católica Portuguesa, Almedina, pág. 721 a 732 em especial “[a] declaração de confiança pessoal do avalista, a favor do destinatário do valor patrimonial do direito cambiário, que se encontra ou se aceita com a operação avalizada, tem o sentido de que um terceiro, não autor dessa operação, reconhece e declara que o direito cambiário enquanto direito pessoal do autor da operação garantida - fundamentando o seu valor patrimonial na manifestação de confiança pessoal do sacador, ou de determinado endossante, ou confirmando-o no seu prévio reconhecimento pelo aceite do sacado - é digno de crédito. É segura a expectativa da sua realização pelo pagamento do sacado no vencimento da letra.” ]

Tratando-se de uma garantia pessoal, o aval, insere-se dentro das garantias pessoais de coordenação, em oposição às chamadas garantias pessoais de subordinação. A doutrina soe ubicar nesta segunda categoria as garantias acessórias, onde a subordinação provoca a acessoriedade jurídica da obrigação da garantia relativamente à obrigação garantida, de que é exemplo clássico a fiança. Já na primeira categoria se enquadram as que se relacionam com as necessidades do crédito e a mostra mais recente são as garantias bancárias, as quais se tornam consubstanciais ao endosso e ao aval. A própria lei cambiária considera os obrigados, em via de regresso, garantes no sentido de que contraem uma responsabilidade cambiária reflexa pela sua intervenção no documento cambiário, sem desconhecer que a dívida principal compete a outro sujeito participante na relação cartular.

O aval surge-nos, assim, como um acto pelo qual uma pessoa que não está obrigada por qualquer razão a pagar uma letra (ou outro título de crédito) aceita fazê-lo para garantir a responsabilidade de um dos obrigados, sacador, subscritor ou endossante. Parece, por outro lado, acertado conceber esta figura como um acto unilateral (de vontade não receptício) conferido por escrito na letra, ou em folha anexa a ela, vinculado a uma obrigação cartular formalmente válida, que converte quem a outorga, em responsável cambiário no pagamento do documento.

O aval tem um regime próprio e diferente da fiança e como todo o giro cambiário – baseado no princípio da literalidade – deve constar do título (directamente ou porque a lei se encarrega de integrar ou presumir certas menções).

Numa conceptualização dicotómica poder-se-iam evidenciar como traços distintivos do aval relativamente à fiança, os seguintes [ Segue-se, nesta análise, muito de perto (quase a par e passo) a exposição/análise constante do estudo de Pedro Alfonso Labriega Villanueva, “El aval. Fianza sui generis o Garantia Cambiária Típica”, publicado no Boletín Mexicano de Derecho Comparado, Año XXXVII, n.º 110, Mayo-Agosto de 2004, págs. 611-661. ]:

- O aval não conforta (respalda) a obrigação de uma pessoa determinada, constituindo-se antes uma garantia objectiva do pagamento, total ou parcial, argumento pelo qual não pode limitar-se a tempo, a caso ou pessoa, por não lhe poder ser colocada ou estar sujeito a qualquer condição. Não procede neste caso o benefício da excussão, já que a obrigação do avalista é autónoma e a sua validade e legitimação dos credores cambiários não está subordinada a diligências ou trâmites prévios.

O aval é uma garantia cambiária unilateral, não receptícia, abstracta, formal e escrita; espontânea e independente; pode ser parcial e configura um direito literal autónomo. Unilateral porquanto decorre da literalidade, autonomia, abstracção dos títulos de crédito que suprimem perante terceiros as defesas que se sustentam da inexistência de discernimento livre ou de causa, pelo que resulta juridicamente transcendente para criar responsabilidade a existência material do acto cambiário ainda que lhe falte a causa ou existam vícios de vontade do avalista. O referido pronunciamento voluntário torna-se incondicional, irrevogável e obriga tão só pela manifestação externa da sua existência jurídica perante qualquer tomador determinado ou a determinar. Não receptícia significa que não necessita de aceitação para que possa gerar todos os efeitos, o que exclui poder considerar-se o aval como um contrato.

O aval apresenta-se como uma garantia, dado que refere precisamente a sua desvinculação substancial com os actos cambiários e cujo fim é desempenhar funções cambiárias principais distintas (para circulação do título, o endosso; para a sua satisfação, a aceitação) e de que o aval não surge como consequência de tais transacções mas sim por um acto espontâneo alheio ao curso normal (natural) do título de crédito.

Ao tratar-se de um acto cambiário a obrigação que nasce do aval é abstracta, isto é, prescinde da causa na sua relação circulatória. A qualificação da garantia pessoal fundamenta-se na adição (aglutinação) de um novo sujeito a uma ligação objectiva prévia e não ao nexo pessoal entre o avalista e o avalizado. Efectivamente, o aval, qual garantia objectiva não se vincula com a pessoa nem com a obrigação avalizada, mas tão só porque, singelamente, é uma garantia de pagamento de uma obrigação que objectivamente emerge do título. De modo que a abstracção do aval é idêntica às demais obrigações cambiárias posto que esta dá vida justamente a uma relação cartular dessa qualidade, independente e diferente.

É um acto jurídico que deve revestir uma forma e deve ser escrito como meio de exteriorização. Toda a obrigação cambiária reveste a forma escrita pelo que também o aval deve assumir forma escrita.

É independente, porque a lei considera válido o aval ainda que a obrigação avalizada seja nula, a menos que a referida nulidade seja puramente formal. Na verdade, o aval persiste e produz efeitos legais ainda que a obrigação do avalizado seja nula, o que não acontece com a fiança, pois que o vício da obrigação afiançada afecta a fiança civil, convertendo-a em nula ou anulável. Se a obrigação principal está afectada de nulidade absoluta, a fiança também se verá afectada;

Ainda que ambas assegurem o cumprimento de dívidas pecuniárias, o aval é uma obrigação autónoma, materialmente, enquanto que a fiança é acessória de outra principal – a fiança não pode constituir-se sem uma obrigação válida. Isto significa que o aval consigna duas obrigações distintas com dois devedores e a fiança somente uma obrigação, mas com dois devedores;

O aval é sempre comercial já que provêm de acto de comércio. A fiança segue a materialidade da obrigação garantida.

O aval não deriva da lei nem de decisões judiciais, tendo sempre a sua origem na vontade do avalista, sendo por isso que se diz que tem um valor objectivo, porquanto o avalista obriga-se a si mesmo, mediante a sua assinatura. A fiança é legal, judicial ou voluntária;

O exercício da responsabilidade contra o avalista não exige a excussão nem a interpelação judicial prévia do avalizado; a fiança civil admite a divisão ou a excussão prévia;

Não se permite ao avalista que se valha das excepções pessoais do avalizado, já que a sua obrigação é independente e o direito do terceiro é autónomo; o fiador pode opor as mesmas excepções que o afiançado sempre e quando não sejam pessoais do mesmo devedor;

O avalista que paga tem acção cambiária contra o avalizado e os que respondem perante este, implicando o exercício de um direito autónomo e literal como legítimo portador do título e é evidente que os devedores se tornam solidários; o fiador é um credor por sub-rogação e a sua repetição não pode prosperar se não interpõe excepções que incumbiam ao devedor principal ou pagou sem ser interpelado ou deixou de avisar o obrigado principal;

O aval não pode ser sujeito a condição; a fiança pode;

O aval é irrevogável; o fiador pode retractar-se em determinados casos;

O aval tem como referente uma operação bancária determinada; a fiança pode vincular-se a operações futuras e indeterminadas, ou até a uma soma certa ou incerta;

O aval surge mediante declaração cartular; a fiança é derivada de um convénio;

Se o avalista se torna insolvente o portador do título não pode solicitar um substituto; na fiança é possível suplantá-lo ou substitui-lo ou se se trata de co-fiadores a parte correspondente ao insolvente rateia-se entre os demais que possuam solvência. [ Para Cassiano dos Santos, Filipe, in “Direito Comercial Português – Dos actos de comércio às empresas: o regime dos contratos e mecanismos comerciais no direito português”, Coimbra Editora, 2007, pág. 259, “[o] aval é, pois, uma garantia, mas com um regime peculiar em relação à fiança: 1.º) o avalista responde nos mesmos termos em que responde o avalizado, isto é, a sua obrigação tem a mesma extensão e conteúdo (art. 32-I), não gozando do benefício da excussão prévia – não há responsabilidade subsidiária (art. 32.º-I); 2.º) o aval mantém-se ainda que a obrigação garantida seja nula, salvo se a nulidade for de vício de forma (art. 32.º-II); 3.º) o avalista que pague fica com o direito de obter o pagamento do avalizado, mas também daqueles contra os quais o avalizado poderia obter o pagamento, se tivesse sido ele a pagar (art. 32.º-III), o que é sempre o caso do aceitante, se não for ele o avalizado - mas, se for, o avalista já não poderá demandar ninguém que não seja o avalizado (e aceitante), pois o aceitante também não pode demandar outro obrigado, por ser ele que tem de pagar a letra, em última instância.” ]

Como deflui do que vem sendo escrito quanto aos traços fundantes do aval e da sua afinidade/diferença com figuras jurídicas afins, maxime a fiança, a maioria, se não a quase totalidade dos autores, qualifica o aval como um acto jurídico unilateral, não receptício, autónomo, independente e formal e que se constitui como uma garantia cambiária com as características imanentes a este tipo de relações (cartulares), a saber a abstracção, a literalidade e a autonomia. “O avalista assume uma obrigação cambiária ao estampar o seu nome no título; ele promete o pagamento da letra, tal como o faz qualquer obrigado cambiário (mais precisamente como o promete o obrigado por quem outorga o aval); por outras palavras, o garante assume uma obrigação de autonomia e abstracção do título. Assim enquanto que na fiança o elemento acessoriedade, logicamente dominante em toda a relação de garantia, se manifesta na sua mais completa eficiência e se mantém por lei firme em todas as suas consequências lógicas, no caso do aval, no que se atina às relações entre garante e garantido, nas quais deveria também dominar a acessoriedade, as ditas relações encontram-se, necessariamente, modificadas por outro imprescindível componente, a autonomia da obrigação. A autonomia absorve a acessoriedade, dado que a relação de acessoriedade só subsiste nas sobreditas relações – e não pode deixar de sobreviver, dado o carácter de garantia que o aval implica – no seu aspecto formal, decisiva em matéria cambiária: o que equivale a afirmar que a obrigação do garante não pode funcionar se não existe como formalmente válida a obrigação cambiária do avalizado”.

A maioria dos autores coincide em que o aval se trata de “um acto pelo qual um terceiro ou um signatário da letra garante o pagamento dela por parte de um dos subscritores”. [ Cfr. Ferrer Correia, in “Lições de Direito Comercial - Letra de Câmbio”, vol. III, 1966, págs. 196, 198 e segs. (citado por França Pitão, in “Letras e Livranças - Lei Uniforme sobre Letras e Livranças - Anotada”, Almedina, Coimbra, 2002, pág. 181). ] Como a lei requer que o aval esteja referido a uma obrigação formalmente existente tendem para que isso signifique uma acessoriedade formal que nada comunica, nos seus efeitos, à materialidade da obrigação que se torna cambiária e por fim independente.

Trata-se, outrossim, de uma garantia objectiva para pagamento do título sem vinculação com a obrigação avalizada, excepto quanto à existência desta. Elimina-se, pois, o carácter subjectivo (este é a vinculação com a obrigação de uma determinada pessoa) do aval para se tornar objectivo (quer dizer uma obrigação abstracta, conforme a literalidade do documento). Trata-se de uma garantia cambiária típica, dado que a obrigação do avalista se encontra desligada do avalizado; a obrigação deste torna-se abstracta e literal como direito autónomo para o portador do documento, se bem que existindo uma obrigação formal com o acto avalizado se considere como um nexo de posição, sem que se requeira uma substancial posição entre ambas as obrigações cambiárias. Em virtude disso, o avalista assume uma obrigação directa e pessoal, não com o do seu avalizado, e portanto responde, directa e pessoalmente, perante o credor cambiário, pelo pagamento do título e não pelo cumprimento deste. O avalista não assegura que o avalizado pagará, mas sim que o título será pago; não participa da obrigação de outros, mas, ao invés, fá-la própria (non alienae obligationi accedit sed alienam facit propriam); a designação da pessoa a favor a quem se presta o aval tem tão só a finalidade de fazer assumir ao avalista uma responsabilidade cambiária de igual grau que a do avalizado.

II.B.2. – Indeterminabilidade do negócio jurídico (aval).

Uma das divergências axiais que colhe oposição na jurisprudência ancora na indeterminabilidade do negócio jurídico que consubstancia a constituição do aval do recorrente.

A questão da indeterminabilidade, para o caso da fiança foi objecto de tratamento no Acórdão Uniformizador deste Supremo Tribunal n.º 4/2001, de 23 de Janeiro de 2001, e publicado no DR, I Serie A, n.º 57, de 08-033-2001. Na doutrina fixada “[é] nula por indeterminabilidade do seu objecto, a fiança de obrigações futuras, quando o fiador se constitua garante de todas as responsabilidades provenientes de qualquer operação em direito consentida, sem menção expressa da sua origem ou natureza e independentemente da qualidade em que o afiançado intervenha.”

Tratava-se no caso julgado no AUJ n.º 4/2001 de uma situação em que os sócios de uma empresa haviam operado a denúncia de uma fiança omnibus e pretendiam através de uma carta dirigida ao banco desvincular-se da responsabilidade fidejussória assumida mediante a fiança, por haverem cedido as quotas de que eram detentores na sociedade afiançada.

Na crítica que fez a este aresto [ Cfr. Januário Costa Gomes, Manuel, in “Estudos de Direito das Garantias - O mandamento da determinabilidade na Fiança omnibus e o AUJ n.º 4/2001”, Almedina, 2004, págs. 109 a 137.], o Prof. Januário Costa Gomes desenvolve [ Januário Costa Gomes, Manuel, in op. loc. cit. págs. 125 a 133. ] a questão da determinabilidade/indeterminabilidade para defender que o artigo 280.º do Código Civil não pode deixar de ser conjugado com o artigo 400.º, n.º 1 do mesmo livro de leis. Na medida em que “[à] priori, não veríamos impedimento a que a prestação do fiador fosse determinada pelo credor e devedor, uma vez que na sua previsão genérica, o art. 400/ 1 é, em principio, passível de ser aplicado a qualquer negócio jurídico; em tese geral a determinação per relacionem satisfaz o requisito da determinabilidade.” [ Quanto à diferença classificativa que o autor estabelece entre determinabilidade vertical e horizontal veja-se do mesmo Autor “Assunção Fidejussória da Divida – sobre o sentido e o âmbito de vinculação como fiador”, Almedina, Coimbra, 2000, págs. 597 e segs. e 621 e segs.] E mais adiante acrescenta este autor que a exigência de “[uma] rápida e mecânica aplicação do disposto no art. 280/1 é o facto de como também já dissemos, a exigência formulada no art. 280.º/1(…) não ser estática, insensível às peculiaridades dos negócios específicos.” [ Januário Costa Gomes, Manuel, in op. loc. cit. pág. 129.]

No estudo que vimos citando o Autor examina num apartado – “A sorte da fiança após a cessão de quotas pelo fiador omnibus” [ Januário Costa Gomes, Manuel, in op. loc. cit. págs. 121 a 125.] – que a cessão de quotas por parte de um sócio não pode conduzir à caducidade podendo, no entanto, ser efectuada mediante denúncia ou resolução por justa causa. [ Januário Costa Gomes, Manuel, in op. loc. cit. págs. 117 e 124. ]

Na análise a que procede relativamente à eventual aplicação do AUJ n.º 4/2001, ao aval de uma livrança em branco posteriormente preenchida, a Prof.ª Carolina Cunha [ Cunha, Carolina, “Letras e Livranças – Paradigma Actuais e Recompreensão de um Regime”, Almedina, 2012, págs. 599 a 601. ], aquiescendo com a doutrina fixada no aresto, estima que a jurisprudência (restritiva) que considera inaplicável a doutrina do acórdão “[apoia-se] numa asserção circular: como o aval só “existe” depois de preenchido o título, uma vez preenchido o título já não “subsiste” qualquer indeterminação. Pelo contrário, [acrescenta a autora] o que está em causa é a função da garantia desempenhada pela própria subscrição em branco mesmo antes do titulo ser preenchido e, concomitantemente, a ausência de limites à incerteza em que semelhante garantia é prestada. Também aqui deve avultar, portanto, aquela “preocupação em proteger o dador de garantia face a uma divida não previamente abarcável” que conduz à exigência de um mínimo de determinabilidade – não obviamente no título já preenchido, mas sim no acordo relativo ao seu preenchimento.” [ A autora cita em abono da jurisprudência contrária à tese da aplicabilidade da doutrina do acórdão uniformizador ao aval de uma livrança em branco posteriormente preenchida os arestos deste Supremo Tribunal de 06-03-2007, relatado pelo Conselheiro Faria Antunes) e de 01-07-2003, os dois em www.stj.pt.]

Ensaiando uma resposta à problemática que atina com o thema decidendum – consequências da cessão da participação social do sócio cambiariamente vinculado como garante -a Autora [ Cfr. Cunha, Carolina, “Letras e Livranças – Paradigma Actuais e Recompreensão de um Regime”, Almedina, 2012, págs. 610 a 619.] coloca a questão nos seguintes termos: “pode o subscritor em branco que cedeu a sua participação social e se desligou da vida societária vir a ser incomodado, porventura anos depois, quando o credor decide preencher e accionar o titulo?”, para responder com a solução adiantada pelo Prof. Januário Costa Gomes, a propósito da fiança, no estudo supra citado, ou seja de que lhe pareceria pertinente chamar à colação a doutrina a propósito da fiança, quando refere que “à luz das regras de interpretação dos negócios jurídicos, pensar que os mesmos sócios que aceitaram subscrever termos de fiança preparados pelo Banco, quiseram manter-se vinculados mesmos depois de cederem a terceiros as respectivas participações sociais – mesmo depois de deixarem de ter interesses na empresa ou sequer contactos com a mesma.”

Mais adiante a mesma autora refere que lhe parece “[razoável] admitir que em certas circunstâncias possa vir a ser reconhecida uma faculdade de desvinculação unilateral do acordo de preenchimento ao sócio garante que cede a sua quota, faculdade que a jurisprudência tende a construir como denúncia (com que circunscreve aos contratos de duração indeterminada) mas que alguma doutrina qualifica como resolução por justa causa, fundada na inexigibilidade de o garante permanecer vinculado por uma relação duradoura”, para de seguida, e depois de afirmar que “[o] sócio permanece responsável pelas dividas constituídas até à extinção da garantia” e referir que o reconhecimento de semelhante faculdade implica “[uma] ponderação da interface que, através do acordo de preenchimento, se estabelece com a relação jurídica pela sociedade. Nos financiamentos bancários típicos, como a abertura de crédito simples ou em conta corrente, o fluxo financeiro que determina a divida cambiariamente garantida depende das solicitações feitas pela sociedade em cada momento – o que confere pleno sentido à tese segundo a qual a cessação da qualidade de sócio implica uma inexigibilidade de permanecer vinculado como garante.” [ Cfr. Cunha, Carolina, “Letras e Livranças – Paradigma Actuais e Recompreensão de um Regime”, Almedina, 2012, pág. 613 e Januário Costa Gomes, in Januário Costa Gomes, Manuel, in “Estudos de Direito das Garantias – O mandamento da determinabilidade na Fiança omnibus e o AUJ n.º 4/2001”, Almedina, 2004, pág. 124.]

A razoabilidade ou plausibilidade da solução apontada pode conflituar, em primeiro lugar, com a própria natureza do aval, incondicional e irrestrito, a menos que seja dado de forma parcial, e, correlatamente, com o direito pessoal de garantia que estava constituído pelo aval para pagamento do valor patrimonial inserto do direito de crédito cambiário, de harmonia com o acordo de preenchimento pactuado.

Quanto à primeira objecção não se configura razoável que uma garantia, materialmente autónoma e independente da obrigação creditícia que propinou a sua emissão, possa ser denunciada como um contrato duradouro, ou sequer como um negócio unilateral duradouro. O aval, em distinção da obrigação fidejussória, não acompanha a relação obrigacional do avalizado destinando-se a criar uma garantia perante o tomador do título de crédito de que o título será pago na data do vencimento ou nos termos em que o pacto de preenchimento foi acordado. Repontar-se-á, em contraposição ao que foi asserido, que o aval no caso de abertura de contrato de abertura de conta simples ou de conta corrente firmado entre uma sociedade e uma instituição bancária e em que os sócios intervêm como garantes prestando o aval em titulo de crédito a preencher por aquela, nos termos do pacto de preenchimento acordado, está, inextrincavelmente, conexionado com a obrigação subjacente pelo que a extinção da responsabilidade, maxime pela cessão de quotas de que era detentor na sociedade avalizada por parte de um sócio, conduz, inelutavelmente, à desresponsabilização do sócio relativamente à obrigação subjacente bem como à garantia cambiária que lhe está associada ou que tem para com aquela uma relação de acessoriedade. Pensamos, como já adiantamos supra, que o aval, como garantia que se destina a garantir o pagamento do valor patrimonial inserto no título de crédito não pode ter o mesmo tratamento que a garantia fidejussória ou a fiança. Na verdade o avalista, contrariamente ao que acontece ao obrigado fidejussório, não responde perante o credor nos mesmos termos que este mas sim, e tão só, cria um direito de regresso perante o sacado correspondente ao que haja pago ao tomador do título pelo incumprimento pelo sacado da obrigação inscrita no título. [ “A relação obrigacional, a existir, é subjacente não ao aval, mas ao eventual direito de reembolso do avalista pelo que houver pago pela sua obrigação de regresso (…). Dito de outra forma, o débito do avalista, quando exista e pelo acordo havido, não é causa da sua garantia cambiária de aval, mas sim garantia da imediata realização, pelo direito comum, do seu eventual direito de reembolso.” - vide neste sentido Sendin, Paulo, in ““Letra de Câmbio – L.U. de Genebra - Obrigações Cambiárias”, vol. II, Universidade Católica Portuguesa, Almedina, pág.732. ]

A segunda objecção que poderia ser formulada ou oposta à razoabilidade da proposta de solução adiantada no estudo citado poderia ser a seguinte. Suponhamos que todos os sócios de uma sociedade se responsabilizavam mediante o aval pelo pagamento de uma livrança, cujo preenchimento haviam acordado com a instituição credora, e que todos os sócios cediam as respectivas quotas. Neste caso seria razoável que mediante acto unilateral de todos e cada um dos sócios ocorresse uma desvinculação unilateral da obrigação cambiária do aval prestado para garantia do direito de crédito cambiário, expresso no valor patrimonial do título de crédito, de acordo com o pacto de preenchimento? Ou, numa hipótese mais perversa que um dos sócios cedesse simuladamente a sua participação social e tendo a cessão sido registada no pacto a viesse a exibir e impulsar como causa de uma denúncia de uma aval prestado? Ou ainda que a cessão fosse efectuada a quem não tinha património capaz e bastante para suportar a execução do título de crédito avalizado.

Em nosso juízo a desvinculação unilateral, na situação hipotisada, dessoraria totalmente a garantia prestada e deixaria o tomador do título de crédito sem qualquer garantia de que o crédito concedido viesse a ser pago. Dir-se-á, como ficou apontado na solução adiantada que os avalistas, no caso os sócios da sociedade avalizada, sempre seriam responsáveis pelos créditos já vencidos. Com se disse supra o aval pode ser quantitativamente limitado caso em que o avalista se compromete a pagar só uma parte do crédito avalizado. Só que, como é doutrina unânime esta limitação tem que ficar expressa no momento em que o aval é prestado. [ “As formas por que pode fazer constar na letra a limitação do aval são a determinação da cifra máxima a que o avalista limita a garantia, ou ainda, a indicação de uma determinada percentagem em relação à importância total.” – cfr. Piedrabuena Molina, Pilar, op. loc. cit., pág. 445. ] Não tendo o avalista limitado quantitativamente a importância por que se comprometia a prestar o aval, afigura-se-nos de difícil conciliação com a própria natureza do aval e da obrigação cambiária constituída perante o tomador do título de crédito.

Acresce que, sendo o aval uma garantia autónoma e incondicional não se vê como se poderia fazê-la retroagir a um momento anterior àquele que consta a data do vencimento ou consensuada no acordo de preenchimento. A doutrina espanhola, malgrado na Ley Cambiaria y del Cheque não fazer menção, ao contrario do que acontecia com o estatuído no art. 487.º do Código Comercial, admite que o aval possa ser limitado no tempo, só que essa limitação vem adscrita de uma condição, a saber “[que] se faça a determinação do termo com data posterior ao vencimento da letra, já que um aval outorgado a prazo anterior ao vencimento da letra não teria nenhuma eficácia, pois o credor cambiário não pode exigir a ninguém o pagamento da letra antes da data do vencimento.” [ Piedrabuena Molina, Pilar, op. loc. cit. , pág. 446.] Tendo sido acordado que o aval era outorgado para garantir o montante que viesse a ser apurado, caso não fosse pago e houvesse que preencher a livrança, ao limitar temporalmente a um momento anterior aquele em que o acordo de preenchimento estabelecia, estar-se-ia a frustrar o carácter incondicional e intemporal do aval, dado que quanto ao primeiro requisito far-se-ia condicionar a garantia pessoal outorgada pelo avalista à sua condição, não de garante pessoal, mas de garante enquanto sócio da sociedade avalizada, postergando, deste modo, uma das características do aval, e ao segundo, estar-se-ia a fazer retroagir o momento temporal do aval a uma data aleatória e dependente de uma vicissitude ou factor indeterminável e fortuito.

A ser possível a desvinculação unilateral dos sócios, mediante declaração dirigida ao tomador do titulo, qual a confiança que sobraria numa relação jurídica estabelecida entre este e aquele a quem o aval é pedido. Não se olvidará que o avalista garante o pagamento do direito de crédito cambiário, não relativamente ao avalizado, mas perante o tomador do título de crédito. É perante este que o avalista assume a obrigação de pagar o crédito cambiário, caso o sacado não o venha a fazer e não perante o avalizado. A garantia é prestada para garantia do direito cambiário e não para pagamento da obrigação creditícia que foi incorporada no título. O aval não cumpre uma garantia da obrigação do avalizado mas sim uma garantia de satisfação do direito de crédito cambiário que o título incorpora.

A ser possível e plausível a solução proposta, frustrar-se-ia a função de garante cambiário que o aval desempenha e representa, deixando ao livre alvedrio e arbítrio do obrigado cambiário a sorte do direito cambiário, destruindo com ela a responsabilização que o credor cambiário busca na prestação desta garantia cambiária. Não pode, em nosso juízo, o credor do direito de crédito ficar à mercê das vicissitudes e variações das posições sociais que em cada momento vigoram numa sociedade e dos interesses particulares que os sócios decidam em cada momento para o destino societário. Ao prestar uma garantia bancária, os sócios devem ter a noção clara de que se estão a responsabilizar, pessoal e cambiariamente, pelo pagamento do direito de crédito que se comprometeram a satisfazer no caso de o avalizado o não fazer. Daí que não lhes seja lícito, e seja susceptível de frustrarem uma das funções axiais da garantia pessoal que se constitui pelo aval, que se possam desvincular, unilateralmente, da obrigação cambiária que assumiram.

Dir-se-á que o credor cambiário sempre se poderá opor à denúncia ou à resolução por justa causa, na terminologia que preferimos, e fazendo-o inviabiliza ou pelo menos pode reagir e opor-se às razões alegadas pelo avalista para se desvincular da sua posição de garante cambiário. Atendendo à estrutura ontológica em que o aval se consubstancia, cremos ser difícil configurar essa possibilidade, no entanto, não sendo o local adequado para uma discussão desse tipo, deixaremos a questão para uma ponderação futura.

II.B.3. – Denúncia da relação de avalista.

A denúncia é um acto declaratório unilateral, receptício destinado a pôr fim a uma convergência de vontades anteriormente estabelecida e que se destinava a perdurar.

Na definição que dela é feita por Proença Brandão “a denúncia pode ser definida como o poder exercido por normal declaração unilateral receptícia, livre ou vinculada, de extinguir ex nunc e dentro de certos prazos, um contrato duradouro stricto sensu. Tal faculdade surge como corolário evidente da interdição de perpetuidade contratual e da consequente defesa da liberdade individual, não visando, assim, sancionar qualquer estado contratual alterado na sua execução”. [ “A Resolução do Contrato no Direito Civil”, Coimbra Editora, ]

A questão que vem colocada atina com o facto de, revestindo o aval a natureza, as finalidades e as características que se deixaram enunciadas, é possível ao avalista operar validamente a sua denúncia, por ter deixado de ocupar a posição social que possuía quando prestou o aval.

Em acórdão recente deste tribunal [ Na apelação o autor contesta este entendimento, invocando, nomeadamente, o decidido no acórdão do STJ proferido no dia 2-12-2008: “I – O aval, como autêntico acto cambiário, origina uma obrigação autónoma, que se mantém mesmo no caso de a obrigação que ele garantiu ser nula por qualquer razão que não seja um vício de forma.

II – A livrança em branco destina-se, normalmente, a ser preenchida pelo seu adquirente imediato ou posterior, sendo a sua entrega acompanhada de poderes para o respectivo preenchimento de acordo com o denominado "pacto ou acordo de preenchimento".
III – É indiferente que o avalista tenha dado ou não o seu consentimento ao preenchimento da livrança. Com efeito, esse acordo apenas diz respeito ao portador da livrança e ao seu subscritor, não sendo o avalista sujeito da relação jurídica existente entre estes, mas apenas sujeito da relação subjacente à obrigação cambiária do aval, relação essa constituída entre ele e o avalizado e que só é invocável no confronto entre ambos.
IV – No caso em apreço, não obstante o montante da obrigação e a data do seu eventual vencimento não estivessem determinadas à data em que o executado deu o seu aval, a obrigação era determinável, nos termos do acordo de preenchimento. Assim, não ocorre qualquer violação do disposto no art. 280.º do CC.
V – Embora o aval seja irrevogável, é admissível a sua denúncia até ao momento do preenchimento do título, em situações como a dos autos, em que a livrança é decorrente de um contrato de abertura de crédito com um prazo inicial de 6 meses, que foi sendo renovado 16 vezes, por prazos idênticos e sucessivos, já tendo decorrido cerca de 4 anos e meio sobre a aposição do aval.
VI – A denúncia basta-se, então, com a simples comunicação ao Banco exequente da vontade e do pedido feito pelo avalista de "ser retirado" da livrança o seu aval, isto independentemente do fundamento que foi invocado (a circunstância de ter deixado de ser sócio e renunciado à gerência da sociedade subscritora da livrança).
VII – Tendo a declaração de denúncia chegado ao poder do Banco beneficiário, a mesma tomou-se eficaz (art. 224.º, n.º 1, do CC).” ] foi decidido que era possível no caso em que o aval tinha sido prestado numa livrança decorrente de um contrato de abertura de crédito o avalista desligar-se da obrigação cambiária que tinha contraído perante o tomador da letra, independentemente da qualidade que possuísse na sociedade comercial mutuária.
Em nosso juízo, e salvo o devido respeito, não se constituindo o aval como um contrato, ou seja, um acordo entre o avalista e o avalizado, ou o tomador do titulo cambiário, não poderá desligar-se do vínculo que constituiu mediante uma declaração de vontade (receptícia) devendo responder como obrigado cambiário. “[…] além de não ser subsidiária, a obrigação do avalista não é senão imperfeitamente uma obrigação acessória relativamente ao avalizado. Trata-se de uma obrigação materialmente autónoma, embora dependente da última quanto ao lado formal. De facto a lei estabelece o princípio de que a obrigação do avalista se mantém, ainda que a obrigação garantida seja nula, salvo por vício de forma.” [ Op. loc. cit. (França Pitão), pág. 196. ]

Tratando-se de uma obrigação autónoma, independente da relação subjacente, não poderá, em nosso juízo, o avalista valer-se da renovação/prorrogação do contrato de abertura de crédito para se desobrigar de uma obrigação que, pela sua abstracção e literalidade, se emancipou da relação subjacente para subsistir como obrigação independente e autónoma. O avalista não é responsável ou não se obriga ao cumprimento da obrigação constituída pelo avalizado mas tão só ao pagamento da quantia titulada no título de crédito. A obrigação firmada pelo avalista é perante a obrigação cartular e não perante a relação subjacente. [ Cfr. Ac. do STJ de 19-06-2007, in www.stj.pt de que deixa extractada a parte interessante. “Poderia dizer-se tão-somente que, inexistindo vício de forma, se mantêm a obrigação dos avalistas, “ex vi” da segunda parte do artigo 32º da LULL.

Dir-se-á, contudo, que a razão de ser desta norma, é ser o aval um acto cambiário que desencadeia uma obrigação independente, autónoma. (cfr. o Prof. Ferrer Correia, ob. cit. 197 ss, o fazer notar que a responsabilidade do avalista não é subsidiária da do avalizado, mas solidária, pelo que o avalista não goza do beneficio da excussão prévia; e ainda para o facto da nulidade intrínseca da obrigação avalizada não se comunicar à do avalista, tendo este direito de regresso contra os signatários anteriores ao avalizado; cf. ainda, v.g, os Acórdãos do STJ de 27 de Maio de 2004 - 04 A1518 - e de 24 de Outubro de 2002 - 02 A2976).
O avalista não é sujeito da relação jurídica existente entre o portador e o subscritor da livrança mas apenas da relação subjacente à obrigação cambiária estabelecida entre ele e o seu avalizado.
É uma garantia de natureza pessoal que gera uma obrigação autónoma pois o avalista responsabiliza-se pela pessoa que avaliza, assumindo a responsabilidade, abstracta e objectiva, pelo pagamento do título.
Assim sendo, o avalista é responsável, nos mesmos termos em que o é a pessoa por ele garantida por qualquer acordo de preenchimento concluído entre o subscritor e o portador, não podendo invocar a excepção do preenchimento abusivo (cf. v.g, os Acórdãos do STJ de 6 de Março de 2007 - 07 A205 - e de 11 de Dezembro de 2003 - 03 A3529), sabido que o ónus da prova do preenchimento abusivo sempre caberia ao obrigado cambiário demandado, nos termos do artigo 342º nº 2 do Código Civil por integrar um facto impeditivo, modificativo ou extintivo do direito emergente do titulo de crédito. (cf. ainda, o Acórdão desta conferência de 14 de Dezembro de 2006 - 06 A2589).
Também não pode o avalista apor quaisquer outras excepções do seu avalizado ao portador, salvo qualquer causa extintiva da obrigação decorrente das relações entre ambos.]
Do que ficou dito supra, o avalista não se obriga perante o avalizado mas sim perante o titular da letra ou da livrança, constituindo uma obrigação autónoma e independente e respondendo, como obrigado cartular, pelo pagamento da quantia titulada na letra ou livrança. A circunstância de ocorrerem vicissitudes na relação subjacente não captam a virtualidade de se transmitirem à obrigação cambiária pelo que esta se mantém inalterada e plenamente eficaz, podendo o beneficiário do aval agir, mediante acção cambiária, perante o avalista para obter a satisfação da quantia titulada na letra. A circunstância de a relação subjacente se modificar ou possuir contornos de renovação não induz ou faz seguir que esses efeitos se repercutam ou obtenham incidência jurídica na relação cambiária. A relação cambiária constituída permanece independente às mutações ou alterações que se processem na relação subjacente, não acompanhando as eventuais transformações temporais e/ou de qualidade da obrigação causal. Os efeitos da obrigação cartular assumida pelo avalista destacam-se da obrigação subjacente segregando um feixe de obrigações e deveres que, do nosso ponto de vista, não são passíveis de denúncia.

O asserido arranca da funcionalidade do aval e percute-se na estrutura ôntica deste modelo de garantia, que revestindo as características que lhe são apontadas supra, não são passíveis de ser redutíveis a relações contratuais ou de concertação de vontades. O aval constituindo-se como uma figura jurídico-comercial distinta de outras garantias pessoais, maxime da fiança, não pode ser reconvertível a um contrato consensuado entre o avalista e qualquer dos demais obrigados cambiários e que, et pour cause, possa ser objecto de denúncia.

Como se extrai da definição de denúncia supra extractada esta figura ou instituto jurídico só é exercitável e admissível para as situações em que a relação contratual arranque de um contrato duradouro e que uma das partes, por declaração unilateral de vontade receptícia, pretenda pôr termo. [ cfr. Ac. deste Supremo Tribunal de 31-03-2009, in www.stj.pt., cujo sumário, na parte interessante queda transcrito: “3. Não são transponíveis para o aval as razões que determinaram o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência nº 4/2001, relativo à fiança genérica de obrigações futuras; 4. Não podem ser invocadas como causa suficiente de ineficácia do aval prestado, nem a perda da qualidade de sócio da sociedade avalizada, nem a renúncia à gerência, por parte do avalista; 5. Independentemente de poder ser interpretada no sentido de exprimir a vontade unilateral de pôr fim a um contrato de constituição do aval, não pode ser tratada como denúncia uma declaração dirigida pelo avalista apenas ao beneficiário da livrança; 6. A responsabilidade do avalista mede-se pela responsabilidade do avalizado.

Não se constituindo o aval um contrato, mas um acto jurídico unilateral, não receptício, autónomo, abstracto e com as mesmas características de uma obrigação cambiária não se prefigura correcto, em nosso aviso, que possa ser objecto de denúncia.

Volvendo ao caso concreto, temos que o recorrente pediu em tribunal que “[a] ré fosse condenada a proceder à liberação do autor da garantia prestada no âmbito dos contratos e livrança em apreço, a produzir efeitos desde a data da recepção da comunicação do autor.”

Na desinência do que ficou exposto, concluímos que:

- Tendo o aval sido prestado de forma irrestrita e ilimitada não é admissível a sua denúncia por parte do avalista, ainda que este tenha cedido a sua participação social na sociedade avalizada.

III. - Decisão.

Pelo exposto, decide-se, em plenário das secções cíveis, neste Supremo Tribunal de Justiça, em:

- Manter o acórdão recorrido;

- Fixar jurisprudência no seguinte sentido:

- “Tendo o aval sido prestado de forma irrestrita e ilimitada, não é admissível a sua denúncia por parte do avalista, sócio de uma sociedade a favor de quem aquele foi prestado, em contrato em que a mesma é interessada, ainda que, entretanto, venha a ceder a sua participação social na sociedade avalizada.”

- Condenar o recorrente nas custas.

Lisboa, 11 de Dezembro de 2012 - Gabriel Catarino (Relator) - Azevedo Ramos - Silva Salazar - Sebastião Póvoas - Moreira Alves - Nuno Cameira - Alves Velho - Pires da Rosa - Bettencourt de Faria - Sousa Leite - Salreta Pereira - Pereira da Silva - João Bernardo - João Camilo - Paulo Sá (com declaração de voto anexa) - Maria dos Prazeres Pizarro Beleza - Oliveira Vasconcelos - Fonseca Ramos - Garcia Calejo (com declaração de voto que junto) - Serra Baptista - Helder Roque - Salazar Casanova - Álvaro Rodrigues - Lopes do Rego - Orlando Afonso - Távora Victor - Sérgio Poças - Gregório Silva Jesus - Fernandes do Vale - Granja da Fonseca - Fernando Bento - Martins de Sousa - Marques Pereira - João Trindade - Tavares de Paiva - Silva Gonçalves - Abrantes Geraldes - Ana Paula Boularot - António Joaquim Piçarra – Noronha Nascimento (Presidente)

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Declaração de voto


Subscrevo o acórdão, com a seguinte declaração de voto:

Entendo, em primeiro lugar, salvo o devido respeito pelo entendimento contrário, que não se verificam os pressupostos da uniformização de jurisprudência, uma vez que no acórdão-fundamento, de que fomos relator, a concreta questão de direito não é a mesma que aqui se apresenta.

Defendeu-se no acórdão-fundamento que “Embora o aval seja irrevogável, é admissível a sua denúncia até ao momento do preenchimento do título, em situações como a dos autos, em que a livrança é decorrente de um contrato de abertura de crédito com um prazo inicial de 6 meses, que foi sendo renovado 16 vezes, por prazos idênticos e sucessivos, já tendo decorrido cerca de 4 anos e meio sobre a aposição do aval.”

Ora, no caso em apreço, não existe um quadro factual idêntico, a justificar a denúncia, tal como aí a defendi.

Não se está perante a mesma questão, apenas porque em ambos os casos se pretendeu justificar a validade e eficácia da denúncia, com a comunicação ao tomador do facto de se ter deixado de ser sócio da firma avalizada.

Depois, se não tenho dúvidas em subscrever o acórdão, atenta a factualidade provada, não acompanho a fundamentação que exclui a possibilidade de denúncia do aval, em quaisquer circunstâncias, não se acolhendo o entendimento de constituir “um princípio geral de direito, só derrogável por expressa disposição legal, a livre denunciabilidade” das obrigações por tempo indeterminado.

Se o quadro factual dos presentes autos permitisse configurar esta situação, teria que votar vencido, reafirmando:

“Violenta, contrária à vontade presumível das partes, e, sobretudo, contrária à ordem pública uma vinculação de duração indefinida – tendencialmente perpétua –, é inerente às relações jurídicas de duração indefinida (sem prazo de duração) a faculdade de pôr-lhes termo mediante denúncia”, pelo que, nesse quadro, para a denúncia ser válida e eficaz bastaria a simples comunicação ao Banco, que a recebeu, da vontade e do pedido feito pelo avalista de “ser retirado” da livrança o seu aval, isto independentemente do fundamento que foi invocado (a circunstância de ter deixado de ser sócio e renunciado à gerência da sociedade subscritora da livrança).

De qualquer modo, se a vinculação à doutrina do acórdão uniformizador impedir, de futuro, a defesa da possibilidade da denúncia, em casos idênticos aos contemplados no acórdão-fundamento, o recurso à resolução com justa causa ou ao abuso de direito acobertará similar decisão.

Lisboa, 11 de Dezembro de 2012

Paulo Sá

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Declaração de voto

Fui adjunto no acórdão deste STJ de 2-12-2008 (relator Cons. Paulo Sá) que decidiu pela possibilidade de denúncia do aval por parte do avalista (se bem com uma factualidade algo diversa da dos presentes autos). Porém, reflectindo e reconsiderando a questão, decidi aderir em pleno à fundamentação e resolução do presente acórdão uniformizador.
Garcia Calejo